ANTICORPOS MONOCLONAIS DIRIGIDOS A ANTÍGENOS
LIPÍDICOS ESTÁGIO-ESPECÍFICOS DE FORMAS
PROMASTIGOTAS DE
Leishmania (Leishmania) amazonensis
Tese apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Biologia Molecular da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, para obtenção do Título de Mestre em Ciências
Peder, Leyde Daiane de
Anticorpos monoclonais dirigidos a antígenos lipídicos estágio-específicos de formas promastigotas de Leishmania (Leishmania) amazonensis /Leyde Daiane de Peder – São Paulo/SP
xvii, 117 f.,2006
Tese (Mestrado) Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Medicina. Programa de Pós-Graduação em Biologia Molecular
Título em inglês: Monoclonal antibodies directed to stage-specific lipids
of Leishmania (Leishmania) amazonensis promastigotes
Trabalho realizado no Setor de Imunoquímica de Glicoconjugados da Disciplina de Biologia Molecular, Departamento de Bioquímica da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, com auxílios financeiros concedidos pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Esta tese é dedicada aos meus pais, Maurizio e Maria Amélia, sem os quais eu não estaria aqui, e também ao meu irmão Jhonata.
AGRADECIMENTOS
A Profa. Dra. Anita H. Straus, pela oportunidade de ser sua aluna, pelo ensino e pela orientação;
Ao Prof. Dr. Helio K. Takahashi, pelos conhecimentos e pela orientação;
Às amigas Kaori e Kelly, companheiras de república, que tanto me ajudaram no desenvolvimento desse trabalho.
A todos os amigos do laboratório de Glicolipídeos, e sem os quais a tarefa de desenvolver essa tese não teria sido tão agradável, Cristina, Dra. Érika, Dr. Marcos, Fernando, Loriane, Luciana, Lia, Paloma e Silvio;
Aos amigos que pelo Laboratório passaram, Christiane, Fernanda, Carlos, Urdiel e Marcílio;
Aos amigos do laboratório de Hepatologia Experimental, Profa. Dra. Maria Kouyoumdjian, Dra. Marcia e Hercília;
À D. Elza e D. Valdite pelo apoio;
Aos amigos, Marina e Paulo, e também aos professores do Laboratório de Imunologia Clínica da Universidade Estadual de Maringá, em especial a Profa. Dra. Thaís G. V. Silveira, sem a qual eu não teria seguido este nobre caminho;
Ao meu grande amigo, Alex;
Aos meus tios, Matias, Lindamar, Edith, Terezinha, Romilda e Aguimar, e aos meus primos, Célio, Cynthia, Ana Paula, Luís Carlos, Gabriel, Luiza, Alexandro e Renata, por sempre ter torcido por mim e por me proporcionar momentos tão agradáveis em sua presença;
A minha segunda família, D. Cida e Sr. Olavo, Marileide, Ana Caroline, Daniele, Vanderlei, Luciana, Fernanda e Eloísa pelo força e apoio;
SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS...xii
LISTA DE ESQUEMAS...xiv
LISTA DE FIGURAS...xv
LISTA DE TABELAS...xvii
RESUMO...xviii
INTRODUÇÃO...1
1. Leishmaniose...1
1.1. Ciclo biológico de Leishmania spp...4
1.2. Transformação de amastigotas em promastigotas de Leishmania spp. in vitro....4
1.3. Cultura de amastigotas axênicos de Leishmania spp...6
2. Principais componentes de membranas biológicas...7
2.1. Moléculas de superfície de Leishmania spp...10
2.1.1. Lipofosfoglicanos (LPGs)...11
2.1.2. Proteínas ancoradas via Glicofosfoinositol (GPIs)...13
2.1.3. Glicoinositolfosfolipídeos (GIPLs)...14
2.2. Esfingolipídeos...16
2.2.1. Glicoesfingolipídeos (GSLs)...18
2.2.2. Inositol fosforilceramida (IPC)...20
OBJETIVOS...22
MATERIAIS...23
1. Parasitas...23
3. Meios de cultura...24
4. Anticorpos secundários...25
5. Padrões...25
5.1. Padrões de fosfolipídeos...25
5.2. Padrões de glicolipídeos...25
6. Reagentes...26
7. Solventes...26
8. Sílicas e resinas...26
9. Outros Materiais...26
10. Aparelhos...27
MÉTODOS...29
1. Cultura e isolamento de parasitas...29
1.1. Cultura de formas promastigotas de Leishmania (L.) amazonensis...29
1.2. Obtenção de formas amastigotas de L. (L.) amazonensis...29
1.3. Obtenção de amastigotas axênicas...30
2. Cultura e produção de hibridomas...30
2.1. Produção dos anticorpos monoclonais (mAbs) 1 e LST-2...30
2.2. Obtenção do fluido ascítico...33
3. Cultura de macrófagos peritoneais de camundongo...33
4. Infecção de macrófagos peritoneais por formas promastigotas de L. (L.) amazonensis...34
5. Diferenciação de formas amastigotas para promastigotas...34
6. Cromatografia em camada delgada de alta resolução (HPTLC)...35
7. Extração e purificação de glicolipídeos e fosfolipídeos...36
7.2. Purificação de glicolipideos/fosfolipídeos de formas
promastigotas de L. (L.) amazonensis...36
7.3. Purificação de inositol fosforilceramida (IPC) de L. (L.) amazonensis.....37
7.3.1. Hidrólise alcalina...38
7.3.2. HPTLC – Preparativa...38
8. Análise por cromatografia gasosa acoplada a espectrometria de massa (GC/MS)...39
9. Imunocoloração de placas de HPTLC...42
10. Radioimunoensaio em fase sólida (RIA)...43
10.1. RIA utilizando antígenos. glicolipídeos/fosfolipídeos adsorvidos em placa de 96 poços...43
10.2. RIA utilizando parasitas fixados com glutaraldeído...43
11. ELISA...44
12. Oxidação com m-periodato de sódio...45
13. Marcação de proteína A com 125I...46
14. Imunofluorescência Indireta...46
15. Dosagem de carboidratos...47
RESULTADOS...48
1. Curva de crescimento e perfis de fosfolipídeos e glicolipídeos de formas promastigotas de L. (L.) amazonensis...48
2. Identificação de inositolfosforil ceramida (IPC) em formas promastigotas de L. (L.) amazonensis...53
3. Anticorpos monoclonais contra inositolfosforil ceramida (IPC) e glicolipídeos de L. (L.) amazonensis...57
4. Caracterização do mAb LST-1...61
6. Efeito da oxidação com m-periodato de sódio do antígeno de L. (L.) amazonensis na reatividade com os mAbs 1 e
LST-2...66
7. Imunofluorescência indireta...68
7.1. Promastigotas de L. (L.) amazonensis fixados...68
7.2. Promastigotas de L. (L.) amazonensis não fixados...70
8. Reatividade dos mAbs LST-1 e LST-2 com amastigotas isoladas de lesão de pata de hamster e amastigotas axênicas de L. (L.) amazonensis...72
9. Reatividade dos mAbs LST-1 e LST-2 com diferentes tripanossomatídeos...76
9.1. Imunofluorescência indireta dos mAbs LST-1 e LST-2....77
9.2. Radioimunoensaio com parasitas fixados com glutaraldeído...77
9.3. Reatividade dos mAbs LST-1 e LST-2 com glicolipídeos extraídos de diferentes parasitas...80
9.3.1. Reatividade do mAb LST-2 com glicolipídeos extraídos de diferentes tripanossomatídeos por RIA...80
9.3.2. Reatividade dos mAbs LST-1 e LST-2 com glicolipídeos extraídos de tripanossomatídeos por HPTLC...82
10. Análise de expressão de antígenos de L. (L.) amazonensis reconhecidos pelos anticorpos monoclonais LST-1 e LST-2....86
10.1. Cinética de expressão de antígenos de L. (L.) amazonensis durante a diferenciação celular de forma amastigota para a forma promastigota...86
10.2. Expressão de antígenos glicolipídeos em cultura de macrófagos infectados com formas promastigotas de L. (L.) amazonensis...88
DISCUSSÃO...92
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...103
LISTA DE ABREVIATURAS
BSA: albumina sérica bovina CMH: monohexosil ceramida CDH: dihexosil ceramida C:M: clorofórmio:metanol
C:M:W: clorofórmio:metanol:água CTH: trihexosil ceramida
DEAE: dietilaminoetil
EDTA: ácido etilenodiamino tetraacético ELISA: “Enzyme-linked immunosorbent assay”
Galp: galactopiranose
GC/MS: cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de
massa
GIPL: glicoinositolfosfolipídeo GL: glicolipídeos
Globo: globosídeo
GPI: glicosilfosfatidilinositol GSL: glicoesfingolipídeo
IFI: imunofluorescência indireta
IPA:Hex:água: Isopropanol:Hexano:água
IPC: inositol fosforilceramida
HAT: hipoxantina/aminopterina/timidina
HPTLC: cromatografia de alta resolução em camada delgada HT: hipoxantina/timidina
LIT: “liver infusion tryptose” LPG: lipofosfoglicano
mAb: anticorpo monoclonal
mPPG: proteofosfoglicano ligado à membrana
NaBH4: borohidreto de sódio
NaIO4: meta-periodato de sódio
P/S: penicilina/estreptomicina
PBS: tampão fosfato de sódio 0,01 M, pH 7,2, contendo NaCl
0,15 M
PPG: proteofosfoglicano PC: fosfatidilcolina
PE: fosfatidiletanolamina PI: fosfatidilinositol PL: fosfolipídeos
PS: fosfatidilserina
LISTA DE ESQUEMAS
Esquema 1. Representação esquemática de moléculas de
superfície de Leishmania spp. ...12
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Ciclo biológico da Leishmania spp...5
Figura 2. Estrutura de glicerolipídeos e
esfingolipídeos...9 Figura 3. Curva de crescimento de formas promastigotas de L. (L.) amazonensis...49 Figura 4. Perfil de fosfolipídeos de promastigotas de L. (L.) amazonensis mantidos em cultura durante 6 dias...51 Figura 5. Distribuição de fosfolipídeos e IPC em promastigotas durante o crescimento...52 Figura 6. Perfil de glicolipídeos de promastigotas de L. (L.) amazonensis mantidos em cultura de 1 a 6 dias...54 Figura 7. Perfil de fragmentação dos principais ácidos graxos
metil éter (FAMEs)encontrados no IPC de L. (L.)
amazonensis...56 Figura 8. Fracionamento dos lipídeos de formas promastigotas de L. (L.) amazonensis por cromatografia em sílica gel 60...58 Figura 9. Fracionamento dos lipídeos de formas promastigotas de L. (L.) amazonensis por cromatografia em DEAE-Sephadex...60 Figura 10. Reatividade do mAb LST-1 com diferentes frações de
lipídeos purificados de formas promastigotas de L. (L.)
amazonensis ...61 Figura 11. Imunocoloração das diferentes frações de lipídeos
extraídas e purificadas de promastigotas de L. (L.)
amazonensis com mAb LST-2...64 Figura 12. Imunocoloração das diferentes frações de lipídeos
extraídas e purificadas de promastigotas de L. (L.)
Figura 13. Reatividade dos mAbs LST-1 e LST-2 com IPC e
glicolipídeos purificados de L. (L.) amazonensis, tratados ou
não com m-periodato de sódio...67 Figura 14. Imunofluorescência indireta de formas
promastigotas de L. (L.) amazonensis com LST-1 e LST-2...69
Figura 15. Imunofluorescência indireta de formas
promastigotas de L. (L.) amazonensis não fixadas com
LST-1...71 Figura 16. Reatividade dos mAbs LST-1 e LST-2 com formas
amastigotas e promastigotas de L. (L.) amazonensis...73
Figura 17. Imunocolororação dos glicolipídeos/fosfolipídeos purificados de formas amastigotas axênicas, amastigotas
isoladas de lesão de hamster e de promastigotas de L. (L.)
amazonensis, com os mAbs LST-1 e LST-2...75 Figura 18. Reatividade do mAb LST-2 com antígenos glicolipídeos extraídos de tripanossomatídeos...81 Figura 19. Imunocoloração dos extratos lipídicos de diferentes tripanossomatideos com mAb LST-1 ...83 Figura 20. Imunocoloração dos extratos lipídicos de diferentes tripanossomatideos com o mAb LST-2 ...84 Figura 21. Reatividade dos mAbs LST-1 e LST-2 com L. (L.) amazonensis durante a diferenciação amastigota-promastigota...87 Figura 22. Imunofluorescência indireta do mAb LST-2 com
macrófagos infectados com formas promastigotas de L. (L.)
amazonensis ...89 Figura 23. Imunofluorescência indireta do mAb LST-2 com
macrófagos infectados com formas promastigotas de L. (L.)
LISTA DE TABELAS
Tabela I. Análise de derivados trimetilsililados e de FAMEs da fração de IPC por GC/MS...55
Tabela II. Reatividade dos anticorpos monoclonais LST-1 e LST-2 com diferentes tripanossomatídeos, por imunofluorescência indireta...78
RESUMO
Com o intuito de obter informações sobre a expressão de
lipídeos de formas promastigotas de Leishmania (Leishmania)
amazonensis, parasitas foram analisados durante o crescimento logarítmico e estacionário quanto à composição de glicolipídeos e fosfolipídeos. Em paralelo, dois anticorpos monoclonais (mAbs), denominados LST-1 e LST-2, foram produzidos, caracterizados e utilizados neste estudo.
A expressão de fosfolipídeos em promastigotas durante o crescimento logarítmico e estacionário foi analisada por cromatografia em camada delgada de alta resolução (HPTLC). O
extrato lipídico total de promastigotas de L. (L.)
amazonensis apresenta fosfatidilinositol (PI),
fosfatidilserina (PS), fosfatidilcolina (PC),
fosfatidiletanolamina (PE), Liso-PI e inositol
fosforilceramida (IPC), este último caracterizado por cromatografia gasosa acoplada a espectrometria de massa, contendo esfingosina (d18:1) e ácidos graxos, principalmente ácido esteárico (C18:0) e ácido palmítico (C16:0). Enquanto
as proporções molares de IPC, PS, PE, Liso-PI aumentaram com
manteve constante durante o crescimento logarítmico e estacionário.
Os mAbs LST-1 e LST-2 foram produzidos contra a fração enriquecida em glicolipídeos e IPC de formas promastigotas de L. (L.) amazonensis. Os dois anticorpos pertencem a classe IgM. O mAb LST-1, por imunocoloração de placas de HPTLC, reconhece um componente lipídico acídico, eluído da coluna de DEAE-Sephadex com acetato de sódio 0,2 M, que apresenta migração cromatográfica característica de IPC, o qual é resistente à hidrólise alcalina e é corado com reagente de Dittmer-Lester. Já, o mAb LST-2 foi reativo com a fração de glicolipídeos não retida na coluna de DEAE-Sephadex, e
visibilizada nas placas de HPTLC com orcinol/H2SO4.
Por IFI, os dois mAbs mostraram alta reatividade com
formas promastigotas de L. (L.) amazonensis. O tratamento dos
glicolipídeos reconhecidos por LST-2 encontram-se na superfície do parasita. Por imunofluorescência indireta com LST-1 e LST-2 verificou-se que amastigotas isoladas de lesão não são reconhecidos pelos mAbs, e por outro lado, forte fluorescência foi detectada com amastigotas axênicos. Por cromatografia em placas de HPTLC, de extratos lipídicos purificados de amastigotas, verificou-se que os amastigotas
isolados de lesão de animais infectados por L. (L.)
amazonensis, apresentam diferentes perfis cromatográficos de glicolipídeos e fosfolipídeos em relação aos promastigotas e aos amastigotas axênicos. Enquanto os amastigotas isolados de lesão são ricos em glicoesfingolipídeos, os amastigotas
axênicos e promastigotas apresentam glicoinositolfosfolipídeos (GIPLs) reconhecidos pelo mAb
LST-2 e IPC reconhecido pelo mAb LST-1.
O mAb LST-1 apresentou reatividade com formas
promastigotas de todas as espécies de Leishmania analisadas,
e também com formas epimastigotas de T. cruzi. Nestes
parasitas, foi observado que LST-1 reconhece especificamente IPC, sendo o resíduo de inositol e a ceramida essenciais para a reatividade do mAb LST-1.
Já, o mAb LST-2, por imunofluorescência indireta, apresentou forte marcação somente com formas promastigotas ou
componentes glicolipídicos denominados bandas a, b, c, e d,
que correspondem a GIPLs. A porção carboidrato é fundamental para a reatividade do mAb LST-2.
Analisando-se macrófagos infectados com promastigotas de L. (L.) amazonensis, verificou-se por imunofluorescência indireta com o mAb LST-2, que os promastigotas durante a adesão/infecção de macrófagos, secretam ou transferem para os macrófagos os antígenos glicolipídicos, reconhecidos pelo mAb LST-2. Forte fluorescência na superfície de macrófagos infectados é observada já na primeira hora de infecção, e com o decorrer da infecção (até 4 horas) observa-se, somente nos macrófagos infectados, pequenas vesículas fluorescentes, que não correspondem a fagossomos contendo os parasitas.
Assim, nesta tese, foi demonstrado que amastigotas isolados de lesão em relação a amastigotas axênicas e
promastigotas de L. (L.) amazonensis apresentam padrões
INTRODUÇÃO
1. Leishmaniose
As leishmanioses são doenças infecto-parasitárias que acometem o homem, são causadas por várias espécies de
protozoários do gênero Leishmania, que são transmitidos pela
picada de fêmeas, infectadas, de dípteros da sub-família
Phlebotominae. Estes parasitas, conforme revisado por Levine
et al (1980) pertencem a: Ordem: Kinetoplastida;
Sub-ordem: Trypanosomatina; Família: Trypanosomatidae;
Gênero: Leishmania.
A doença pode apresentar diferentes formas clínicas,
dependendo da espécie de Leishmania envolvida e da relação do
parasita com seu hospedeiro (Saravia et al, 1989). As formas clínicas são classificadas como:
Leishmaniose cutânea: também conhecida como “Úlcera de
elevadas, endurecidas e fundos com tecido de granulação grosseira.
Leishmaniose mucosa: apresenta-se sob forma
úlcero-infiltrante que acomete geralmente a mucosa nasal e oral. É de difícil tratamento e cura. Na maioria dos casos ocorre em um intervalo de tempo variável após a instalação da lesão cutânea inicial. Os fatores que contribuem para que uma doença, inicialmente cutânea, evolua para essa forma tardia não são de todo conhecidos, mas sabe-se que a demora na cicatrização da lesão primária e tratamento inicial inadequado podem estar associados.
Leishmaniose cutânea difusa: é considerada uma variante
anérgica da forma cutânea. Caracteriza-se pela presença de
parasitas em nódulos cutâneos múltiplos, distantes do sítio
de inoculação primária (Marzochi & Marzochi, 1994), sem envolvimento visceral. As lesões, via de regra, não cicatrizam espontaneamente e são classicamente não
responsivas ao tratamento medicamentoso.
Leishmaniose visceral: manifesta-se por febre pouco elevada,
sejam devido ao tropismo que os parasitas inoculados possuem pelos fagócitos mononucleares do baço, fígado, nódulos linfáticos e medula óssea, e eventualmente também para outros órgãos. Essa forma é considerada imunossupressora, e também é conhecida como Calazar.
Segundo estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), a leishmaniose ocorre em 88 países e sua notificação é compulsória em apenas 30 deles. Do total de casos já registrados de leishmaniose tegumentar, 90% ocorreram em apenas seis países: Irã, Arábia Saudita, Síria e Afeganistão, no Velho Mundo, Brasil e Peru, na América do Sul (Desjeux, 1999). A incidência de leishmaniose no Brasil tem aumentado em praticamente todos os estados, sendo que nos últimos anos, o Ministério da Saúde registrou média anual de 35 mil novos casos de Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA) no país (CENEPI/Ministério da Saúde, 1999).
1.1. Ciclo biológico de Leishmania spp.
O gênero Leishmania compreende protozoários, com um
ciclo de vida digenético (heteroxênico), vivendo alternadamente em insetos vetores, os quais são responsáveis pela transmissão dos parasitas de um mamífero a outro, e em hospedeiros vertebrados. Nos insetos vetores a forma promastigota (procíclica e metacíclica) reside no intestino, sendo transmitida através do repasto sangüíneo a hospedeiros mamíferos, como o homem, cães, raposas e outros animais. No hospedeiro mamífero, os parasitas assumem a forma amastigota, arredondada e imóvel, que se multiplica obrigatoriamente dentro de células do sistema monocítico fagocitário. À medida que as formas amastigotas vão se multiplicando, os macrófagos se rompem liberando parasitas que são fagocitados por outros macrófagos (Figura 1).
1.2. Transformação de amastigotas de Leishmania spp. em
promastigotas in vitro
Quando os amastigotas são cultivados em meio de cultura
com pH (7,0-7,5) e temperatura apropriada (26˚C), o primeiro
Figura 1. Ciclo biológico da Leishmania spp. (Modificado do
site: www.who.int/en/).
I) Infecção do homem por formas promastigotas através da
picada do inseto vetor na pele, II) entrada de promastigotas
em macrófagos e diferenciação em amastigotas no vacúolo
parasitóforo, III) multiplicação intravacuolar dos
amastigotas, IV) rompimento dos macrófagos infectados e
liberação dos amastigotas, V) reinfecção de macrófagos por
amastigotas, VI) ingestão de macrófagos parasitados de
indivíduos ou animais infectados pelo inseto vetor, VII) diferenciação em promastigotas no intestino do inseto vetor.
I
II
III
IV
V
VI
VII
I
II
III
IV
V
VI
comprimento. Essa fase de crescimento é densidade-dependente e ocorre enquanto existem nutrientes no meio, e é conhecida
como fase logarítmica. Bates & Tetley (1993) mostraram que
durante o crescimento in vitro, os promastigotas acidificam o
meio, o que propicia a transformação de promastigotas procíclicos em metacíclicos, aproximadamente no 5º dia de cultura. Os promastigotas metacíclicos são pequenos (5-8 µm), estreitos e extremamente móveis. Após esse período a cultura entra em fase estacionária. Assim, durante a diferenciação de amastigotas até promastigotas metacíclicos, há mudanças tanto morfológicas, quanto na expressão qualitativa e quantitativa de moléculas presentes na superfície de Leishmania (Sacks et al, 1995; Turco & Descoteaux, 1992).
1.3. Cultura de amastigotas axênicos de Leishmania spp.
Nos últimos anos, vários trabalhos têm demonstrado o
cultivo de formas amastigotas in vitro. Estas formas são
Assim, Hodgkinson et al (1996), Eperon & McMahon-Pratt (1989) e Pan et al (1993), mostraram que amastigotas axênicos apresentam epítopos comuns aos amastigotas intracelulares, sem contudo expressar os antígenos promastigotas-específicos. Ainda, Turco & Sacks (1991) demonstraram que a síntese e expressão de lipofosfoglicano (LPG), uma das moléculas chave
de promastigotas de Leishmania spp., conhecida como fator de
virulência de promastigotas, está “down-regulada” em amastigotas axênicos, assim como em amastigotas intracelulares.
No entanto, estudos recentes de Holzer et al (2006),
sobre o controle da expressão gênica em L. mexicana,
mostraram que apesar dos amastigotas axênicos apresentarem várias semelhanças com os isolados de lesão, diferenças significantes na expressão gênica entre esses amastigotas foram observadas.
2. Principais componentes de membrana plasmática
da bicamada lipídica, os fosfolipídeos estão distribuídos em ambos os folhetos da membrana, porém de forma assimétrica. Fosfatidilserina, fosfatidiletanolamina e fosfatidilinositol estão localizadas predominantemente no folheto interno da bicamada, e fosfatidilcolina e esfingomielina são predominantes no folheto externo da bicamada lipídica.
Os fosfolipídeos possuem uma cabeça polar, unida ao glicerol por ligação fosfodiéster, podendo o glicerol apresentar um ou dois ácidos graxos, sendo também denominados de glicerofosfolipídeos. Por outro lado, os esfingolipídeos apresentam na porção lipídica a esfingosina unida por ligação amida a um ácido graxo, formando a ceramida. Esfingolipídeos podem apresentar como cabeça polar: i) resíduos de colina, conhecidos como esfingomielina, presentes na membrana plasmática de células animais e especialmente encontradas na bainha de mielina de axônios de alguns neurônios; ii) resíduos de carboidratos, como os glicoesfingolipídeos; e iii) inositol, como os inositol fosforilceramida e seus derivados. A Figura 2 mostra as estruturas gerais de glicerolipídeos e esfingolipídeos, modificada de Degroote et al (2004).
Formas promastigotas de Leishmania spp. apresentam
Figura 2. Estrutura de glicerolipídeos e esfingolipídeos
Modificado de Degroote et al (2004). Glicerofosfolipídeos contêm uma cadeia de glicerol fosforilada (vermelho), podendo estar ligada a duas cadeias de ácidos graxos e apresentar como grupamento polar (R) colina, etanolamina, inositol, serina ou carboidratos dando origem a PC (fosfatidilcolina), PE, PI, PS ou GIPLs, respectivamente. Esfingolipídeos (SLs) contêm uma base esfingóide, como a esfingosina (vermelha) ligada a um ácido graxo por ligação amida, e podem conter como grupamento polar açúcares (como os GSLs) ou inositolfosfato (como o IPC), colinafosfato (como a esfingomielina).
SLs
GSLs
IPC
Glicerofosfolipídeos
SLs
GSLs
IPC
glicoinositolfosfolipídeos (GIPLs). Cabe salientar que Straus
et al (1993) descreveram em formas amastigotas de L. (L.)
amazonensis a presença de antígenos glicoesfingolipídicos espécie e estágio-específicos. Tripanossomatídeos também podem apresentar uma classe distinta de esfingolipídeos compreendendo o inositol fosforilceramida (IPC) e os glicosilinositol fosforilceramidas (GIPCs), não descritos em mamíferos.
2.1. Moléculas de superfície de Leishmania spp.
Estudos relacionados a moléculas de superfície de Leishmania spp. vêm ganhando ênfase, principalmente porque esses parasitas penetram e se desenvolvem dentro da célula hospedeira de maneira ainda não totalmente compreendida. Sabe-se que o parasita se liga a moléculas da célula hospedeira, normalmente células do sistema fagocítico, invadindo-as e proliferando-se dentro de um vacúolo parasitóforo, sobrevivendo em pH acídico, e resistindo a ação de enzimas hidrolíticas, e ao “burst oxidativo”. A elucidação de como o parasita consegue sobreviver a esse ambiente hostil envolve o conhecimento e caracterização e moléculas presentes na superfície do mesmo.
A superfície externa de parasitas, como a Leishmania
(1963), contendo carboidratos, que estão associados à face externa da membrana plasmática, rica em glicolipídeos, glicoproteínas e outros glicoconjugados. Formas promastigotas e amastigotas apresentam glicocálice constituídos de diferentes componentes. Nas formas promastigotas, o glicocálice apresenta espessura de 20-40 nm (Pimenta et al, 1991) e é composto principalmente por lipofosfoglicano (LPG), glicoproteínas ancoradas à glicofosfatidilinositol (GPI) e glicoinositolfosfolipídeos (GIPLs) (McConville et al, 2002; Descoteaux & Turco, 1999). Em contraste, amastigotas apresentam um glicocálice menor, coberto com uma camada de GIPLs (McConville & Blackwell, 1991) e glicoesfingolipídeos
do próprio parasita (Straus et al, 1993, 1997) ou
incorporados da célula hospedeira (McConville & Blackwell, 1991; Winter et al, 1994). O esquema 1 mostra as principais
moléculas de superfície de Leishmania spp.
2.1.1. Lipofosfoglicanos (LPGs)
O LPG é o componente majoritário da superfície de
promastigotas (aproximadamente 6x106 cópias/célula), no
Esquema 1. Representação esquemática de moléculas de superfície de Leishmania spp. (Hiley et al, 2000).
fosfolipídica; unidades repetitivas de dissacarídeos fosforilados; e um pequeno “cap” oligossacarídico.
Um grande número de funções têm sido atribuídas ao LPG tanto no inseto vetor quanto no hospedeiro vertebrado, sendo considerado um fator de virulência de promastigotas (Beverley & Turco, 1998). As principais funções propostas para o LPG são: proteção contra enzimas hidrolíticas (McConville & Bacic, 1990), proteção contra o ataque do sistema complemento (Puentes et al, 1990), proteção contra radicais de oxigênio (Chang et al, 1990) e inibição da fusão fagossomo-endossomo, permitindo a diferenciação de promastigotas em amastigotas (Desjardins & Descouteaux, 1997).
2.1.2. Proteínas ancoradas via Glicofosfatidilinositol (GPIs)
Promastigotas de Leishmania spp. apresentam também,
várias proteínas ancoradas via GPI, como a glicoproteína de 63 kDa (gp63) (Handman et al, 1995) e os proteofosfoglicanos de membrana (mPPGs)(Ilg et al, 1999).
A gp63, também conhecida como PSP (protease de superfície de promastigota), é a proteína majoritária expressa em promastigotas, e foi encontrada em todas as
espécies de Leishmania estudadas (revisado por Chang et al,
1990; Etges et al, 1986). Frommel et al (1990) demonstraram
Leishmania, mas em menor quantidade. Essa protease possui atividade de metaloprotease e tem entre 58-65 kDa. Em promastigotas a gp63 representa aproximadamente 1% do total
de proteínas, e estima-se que cerca de 5x105 moléculas
estejam presentes na superfície do parasita (Bouvier et al, 1985). Estudos têm postulado que a PSP é um fator de virulência envolvido na interação direta entre promastigotas e receptores de macrófagos, e na interação com o sistema de complemento (Russel, 1987; Brittingham et al, 1995).
Os proteofosfoglicanos constituem uma distinta classe de moléculas, sendo algumas ancoradas à membrana via GPI (mPPG) (Ilg et al, 1999). Esses mPPGs são expressos tanto em amastigotas quanto em promastigotas, nestes últimos apesar de serem menos abundantes que a gp63 representam importantes componentes no parasita. Embora o papel do mPPG ainda não esteja definido, essa molécula constitui um ligante potencial para receptores do intestino do inseto vetor e receptores do macrófago, devido à grande quantidade de resíduos de leucina, aminoácido que tem sido relacionado com a interações proteína-proteína (Montgomery et al, 2000; Ilg, 2000).
2.1.3. Glicoinositolfosfolipídeos (GIPLs)
glicanas. Os GIPLs tipo 1 apresentam estruturas relacionadas às âncoras de GPI e os GIPLs tipo 2 apresentam a porção glicana semelhante ao "core" do LPG, já os GIPLs do tipo híbrido apresentam seqüências de carboidratos que fazem parte tanto de âncoras de GPI, quanto de LPG (McConville & Blackwell, 1991).
Os GIPLs podem cobrir uma grande porção da membrana
plasmática, tendo sido estimados em aproximadamente 107
moléculas/célula (McConville & Blackwell, 1991). O fato dos
GIPLs serem expressos em altos níveis também em amastigotas, tem levado muitos autores a proporem que os mesmos sejam moléculas chave na sobrevivência dos amastigotas dentro do
fagolisossomos (Ilgoutz et al, 1999). Através de estudos de
marcação de superfície de promastigotas de L. (L.) major foi
demonstrado que GIPLs estão expressos em altas quantidades na superfície celular, no entanto, também podem apresentar localização intracelular (McConville & Bacic, 1990). Os GIPLs intracelulares poderiam ser precursores biossintéticos do LPG (McConville & Bacic, 1989, 1990).
Suzuki et al (2002) demonstraram, utilizando o anticorpo monoclonal MEST-1, que reconhece GIPL-1 presente tanto em
promastigotas quanto em amastigotas de L. (L.) major, que
GIPL-1 está envolvido na interação da Leishmania-macrófago.
promastigotas, e de 30% na infecção de amastigotas de L. (L.) major, quando estes parasitas foram pré-incubados com fragmentos Fab desse anticorpo e posteriormente com macrófagos peritoneais de camundongos.
A expressão de GIPLs varia nas diferentes espécies de Leishmania spp. GIPLs do tipo 1 estão presentes em
amastigotas de L. (L.) donovani (McConville & Blackwell,
1991). GIPL do tipo 2 podem ser encontrados em formas
promastigotas de L. (L.) mexicana e promastigotas e
amastigotas de L. (L.) major (McConville et al, 1993;
Schneider et al, 1993).
Recentemente em nosso laboratório, Silveira et al (2005), utilizando o anticorpo SST-1 demonstraram que formas
promastigotas de L. (V.) braziliensis apresentam uma classe
específica de GIPLs presentes em formas promastigotas do
subgênero Viannia, porém ausentes em espécies de Leishmania
do subgênero Leishmania.
2.2. Esfingolipídeos (SLs)
endoplasmático, a qual é convertida em esfingolipídeos complexos no sistema de Golgi, como a esfingomielina (SM), inositol foforilceramida (IPC) e glicoesfingolipídeos (GSLs) (revisado por Denny & Smith, 2004).
Esfingolipídeos são constituintes ubíquos da membrana lipídica de eucariotos (Hakomori, 1981). Eles são essenciais para o crescimento não somente de células de mamíferos, mas também de invertebrados e de células fúngicas (Dickson, 1998; Acharya & Acharya, 2005; Hanada et al, 1992; Levery et al, 2000). Na maioria das células eucarióticas, os
esfingolipídeos juntamente com proteínas ancoradas via GPI e colesterol formam microdomínios na membrana plasmática (Simons & Ikonen, 1997; Brown & London, 1998), que podem estar envolvidos em vários processos biológicos como interação célula-célula, célula-matriz, eventos celulares, como sinalização e tráfego de vesículas (Merrill Jr et al, 1993; Kolter et al, 2002; van Meer & Lisman, 2002; Hakomori,
2000). Esses domínios são regiões, de células eucarióticas,
resistentes a detergentes não iônicos a 4ºC e podem ser isolados por ultracentrifugação de gradiente de densidade
(Simons & Ikonen, 1997).
2.2.1. Glicoesfingolipídeos (GSLs)
Os GSLs são compostos por uma porção hidrofóbica (ceramida) inserida na membrana celular e por uma porção hidrofílica (carboidrato), exposta na superfície da celular. Eles estão presentes predominantemente na camada externa da membrana de todas as células animais e de algumas plantas (Hakomori, 1981), no entanto, usualmente constituem a classe minoritária dos lipídeos da membrana plasmática (van Meer & Holthuis, 2000).
Os glicoesfingolipídeos podem ser classificados em: glicoesfingolipídeos neutros e acídicos. Os glicoesfingolipídeos acídicos podem ser subdivididos em: gangliosídeos, que contem um ou mais resíduos de ácido siálico em sua estrutura (Kishimoto & Radin, 1966), sulfatídeos, que apresentam éster de sulfato no carbono 3 da galactose e os glicoinositol-fosforilceramida (GIPCs), presentes em fungos (Barr & Lester, 1984; Levery et al, 2001)
e parasitas como o Trypanosoma cruzi (de Lederkremer & Colli,
1995, Carreira et al, 1996, Suzuki et al, 2001).
A presença de glicoesfingolipídeos neutros tem sido
descrita em diversos parasitas e fungos. Sendo que, em L.
(L.) amazonensis os primeiros estudos identificando GSLs em formas amastigotas foram realizados por Takahashi et al
(1989) e Straus et al (1993). Em amastigotas de L. donovani,
McConville & Blackwell (1991), relataram a presença de antígenos glicoesfingolipídicos adquiridos da célula hospedeira.
Em nosso laboratório, antígenos GSLs de formas
amastigotas de L. (L.) amazonensis têm sido analisados e
caracterizados utilizando-se anticorpos monoclonais específicos contra estes antígenos, e que não apresentam nenhuma reatividade com macrófagos ou outro tecido do
hospedeiro (Straus et al, 1993, 1995, 1997). Os anticorpos
monoclonais (mAbs) ST-3, ST-4 e ST-5 reconhecem especificamente 17 componentes glicoesfingolipídicos
purificados de formas amastigotas de L. (L.) amazonensis, não
apresentando reatividade com a fração de glicolipídeos de formas promastigotas, indicando que os glicoesfingolipídeos de L. (L.) amazonensis são antígenos estágio-específicos. A estrutura completa do menor antígeno reconhecido pelos
anticorpos foi determinada como: Galpβ1-3Galpα1-4Galpβ
1-4Glcpβ1-1Cer, sendo denominado de β
glicoesfingolipídicos na interação Leishmania-macrófago foi demonstrado utilizando-se fragmentos Fab desses mAbs. Os mAbs inibem 80% da infectividade de amastigotas em culturas de macrófagos (Straus et al, 1993), além disto a incubação de
macrófagos com o dissacarídeo Galpβ1-3Gal, presente no
terminal não redutor do glicoesfingolipídeo β
-D-Gal-globotriaosilceramida, inibiu significantemente a interação L. (L.) amazonensis - macrófago, confirmando o papel destes antígenos na infectividade de formas amastigotas (Tanaka,
2002). Dados de nosso laboratório sugerem ainda que os
glicoesfingolipídeos de amastigotas poderiam modular a resposta imune do hospedeiro durante o processo infeccioso (Giorgio et al, 1992, 2003).
2.2.2. Inositol fosforilceramida
IPCs constituem um grupo de esfingolipídeos de membranas não encontrados em mamíferos, mas encontrados em várias plantas, fungos, e protozoários (Lester & Dicskson, 1993).
Kaneshiro et al (1986) foram os pioneiros no estudo
sobre inositol fosforilceramida em Leishmania, eles
verificaram que o IPC representa 5-10% do total de lipídeos
em formas promastigotas de L. donovani, correspondendo a
aproximadamente 2,1 x 108 moléculas/célula. IPC foi
mexicana (Singh et al, 1988) e de L. (L.) major (McConville & Bacic, 1989).
A biossíntese do IPC inicia-se com a condensação de L-serina com palmitoil-CoA, catalisada pela enzima L-serina palmitoiltransferase, a qual possui duas subunidades, LCB1 e
LCB2. Trabalhos com mutantes de L. (L.) major deficientes na
enzima LCB2, mostraram que esses parasitas apresentam acúmulo de pequenas vesículas indicando uma alteração no tráfego e
degradação de vesículas, sugerindo um importante papel dos
esfingolipídeos nestes processos, em Leshmania major (Zhang
et al, 2003).
Denny et al (2004) também demonstraram que mutantes de L. (L.) major, deficientes em LCB2, não se diferenciam eficientemente da forma procíclica para metacíclica, no entanto, eles mantêm a capacidade de estabelecer a infecção em camundongos, porém de maneira mais lenta do que os parasitas selvagens, sugerindo que as primeiras etapas da
síntese de novo de esfingolipídeos não seria necessária para
OBJETIVOS
Esta tese teve como objetivos:
I - Analisar componentes de membrana (glicolipídeos e
fosfolipídeos) de formas promastigotas de L. (L.)
amazonensis;
II - Produzir anticorpos monoclonais dirigidos contra
antígenos lipídicos de formas promastigotas de L. (L.)
amazonensis;
III - Analisar a reatividade dos anticorpos monoclonais LST-1 e LST-2 com formas amastigotas isoladas de lesões de hamsters
infectados com L. (L.) amazonensis e com amastigotas axênicos
de L. (L.) amazonensis;
MATERIAIS
1. Parasitas
Os parasitas utilizados foram: Leishmania (Leishmania)
amazonensis (M2269 - MHOM/BR/1973/M2269), Leishmania (Leishmania) chagasi (MHOM/BR/1972/LD) fornecidas pela Dra. Clara Lúcia Barbieri, do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da Universidade Federal de São
Paulo/Escola Paulista de Medicina (UNIFESP/EPM), L. (L.)
amazonensis (M12766 - MHOM/BR/1989/166MJO) e Leishmania (Viannia) braziliensis (M11272 - MHOM/BR/1987/M11272) isoladas de pacientes portadores de leishmaniose tegumentar no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Análises Clínicas da
Universidade Estadual de Maringá (LEPAC/UEM). Os parasitas L.
(V.) braziliensis (M2903 - MHOM/BR/1975/M2903), L. (V.) guyanensis (M17157 - MHOM/BR/1998/M17156-1) e (M17343 -
MHOM/BR/1999/M17343), L. (V.) lainsoni (M14263 -
MHOM/BR/1993/M14263) e (M14269 - MHOM/BR/1993/M14269), L.
(V.) panamensis (M13144 - MHOM/EC/1989/natali) e (M13145 -
MHOM/EC/1990/burgos) e L. (V.) naiffi (M14229 -
Formas amastigotas axênicas de L. (L.) amazonensis LV79
(MPRO/BR/72/M1841) foram cedidas pela Dra. Silvia Alfiéri, do
Departamento de Parasitologia da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo.
2. Animais
Camundongos BALB/c foram fornecidos pelo biotério do Instituto Nacional de Farmacologia (INFAR) da UNIFESP/EPM e pelo biotério da Universidade de Campinas (UNICAMP), Campinas, SP. Golden Hamsters foram fornecidos pelo biotério do INFAR da UNIFESP/EPM.
3. Meios de cultura
Materiais adquiridos da Sigma Chemical Co. (St. Louis, MO, EUA): ácido fólico, estreptomicina, hemina bovina, HAT (aminopterina, hipoxantina e timidina), HT (hipoxantina e timidana), L-glutamina, HEPES, penicilina e piruvato. Infusão de fígado e triptose foram adquiridos da Difco Laboratories (Detroit, MI, EUA).
4. Anticorpos secundários
Anticorpos secundários adquiridos da Dako (Dinamarca): anticorpo de coelho anti-Ig de camundongo, anticorpo anti-IgG de camundongo conjugado a biotina, anticorpo de coelho anti-IgM de camundongo. Anticorpo anti-IgG de camundongo conjugado a fluoresceína foi adquirido da Cappel (Aurora, Ohio, EUA).
5. Padrões
5.1. Padrões de fosfolipídeos
Foram utilizados os seguintes padrões de fosfolipídeos:
fosfatidiletanolamina (1-palmitoil-2-oleil-sn
-glicero-3-fosfatidiletanolamina); fosfatidilcolina, Lecitina de ovo
(L-α-lecitina;1,2-diacil-sn-glicero-3-fosfatidilcolina);
fosfatidilinositol (1,2-diacil-sn-glicero-3-fosfo-[1-D-myo
-inositol]); fosfatidilserina (1,2-diacil-sn
-glicero-3-fosfo-L-serina). Todos esses padrões foram adquiridos da Sigma Chemical Co. (MO, USA).
5.2. Padrões de glicolipídeos
6. Reagentes
Reagente de Dittmer-Lester (trióxido de molibdênio e molibdênio metálico), orcinol, primulina foram adquiridos da Sigma Chemical Co.(MO, EUA).
7. Solventes
Clorofórmio, hexano, 1-butanol, etanol, isopropanol, metanol e metilamina foram adquiridos da Merck (SP, Brasil), acetona da Ecibra (SP, Brasil), éter da Synth (Diadema, SP, Brasil), piridina da Aldrich Chemical Co. (WI, EUA).
8. Sílicas e resinas
Coluna de Iatrobeads 6RS8010 (4,6 x 300 mm) (Iatron, Toquio, Japão), placa de cromatografia de alta resolução em camada delgada de sílica gel 60 (HPTLC) e sílica gel 60 (Merck, Alemanha), HPTLC J. T. Baker (Phillipsburg, NJ, EUA), DEAE-Sephadex A-25, Octyl Sepharose foram adquiridas da Amershan Pharmacia Biotech (Buckinghamshire, UK).
9. Outros Materiais
de sódio, m-periodato de sódio, foram adquiridos da Sigma
Chemical Co. (MO, EUA); 125I e filme de raio-X Hyperfilm-MP
foram adquiridos da Amershan Pharmacia Biotech (Buckinghamshire, Inglaterra); proteína A adquirida da Pharmacia (Uppsala, Suécia); peróxido de hidrogênio da Nuclear (SP, Brasil), poliisobutilmetacrilato da Poliscience
(PA, EUA) e Iodobeads da Pierce (EUA). Revelador-reforçador
GX e Fixador- Reforçador GX da Kodak Brasileira Com. E Ind. Ltda (São José dos Campos, SP, Brasil). Lâminas e lamínulas da Glass Técnica (SP, Brasil). Membrana de nylon Nitex para filtração da Tetko, Monteray Park (CA, EUA).
Estreptoavidina conjugada a peroxidase foi adquirida da Dako (Dinamarca).
Materiais adquiridos da Falcon (Becton Dickson, AC, EUA): placas de 96 (Falcon Microtest Flexible assay Plates), placas de cultura de 24 poços, placas de cultura de 96 poços,
garrafas de cultura de 25 cm2, 75 cm2 e 150 cm2, tubos
estéreis de 15 e 50 ml.
10. Aparelhos
contador gama Packard C5002 (EUA); coletor de frações FRAC-100 Pharmacia (Suécia); equipamento para cromatografia líquida de alta resolução modelo 9010 (HPLC) Varian (CA, EUA); cuba de cromatografia para HPTLC Sigma Chemical Co. (MO, EUA); densitômetro Shimadzu CS9000 (Japão); estufa
B.O.D. Eletrolab (SP, Brasil), estufa de CO2 Forma Scientific
(Ohio, EUA), evaporador com fluxo de nitrogênio e banho a
37˚C (N-EVAP) (MA, EUA), freezer -70°C Forma Scientific
MÉTODOS
1.Cultura e isolamento de parasitas
1.2. Cultura de formas promastigotas de Leishmania (L.)
amazonensis
Formas promastigotas de L. (L.) amazonensis (M2269 -
MHOM/BR/1973/M2269) foram cultivadas em meio LIT (liver infusion tryptose) contendo 10% de soro fetal bovino em câmara B.O.D. a 23ºC (Camargo, 1964).
1.3. Obtenção de formas amastigotas de L. (L.) amazonensis
Formas amastigotas de L. (L.) amazonensis foram obtidas
através de remoção cirúrgica de lesões de patas de Golden
hamsters infectados subcutâneamente com 2x107 promastigotas
ou amastigotas por pata. As lesões obtidas após 4-6 semanas foram removidas e homogeneizadas em tampão fosfato 0,01 M, pH 7,2 contendo NaCl 0,15 M (PBS). O homogenato obtido foi filtrado em membrana de nylon e centrifugado a 1900 xg por 10 minutos. Para a retirada dos debris celulares, o sobrenadante foi descartado e o precipitado ressuspenso em PBS e centrifugado novamente, esse processo foi repetido por 3 vezes. Para a lise das hemácias, o precipitado foi tratado
KHCO3 e 37,2 mg/L de EDTA. Centrifugou-se novamente a
suspensão e o precipitado obtido foi homogeneizado em “potter”, rompendo-se assim os macrófagos infectados com amastigotas. O homogenato foi lavado 3 vezes com PBS (1900 xg por 10 minutos), e então utilizado em ensaios de diferenciação de amastigotas para promastigotas, ou armazenado a -20ºC para a extração de glicolipídeos/fosfolipídeos.
1.3. Obtenção de amastigotas axênicos
Amastigotas axênicos foram cultivadas como revisado por Pral et al (2003) e cedidos pela Dra. Silvia Alfieri do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo.
2. Cultura e produção de hibridomas
2.1. Produção dos anticorpos monoclonais (mAbs)
Camundongos BALB/c machos com 6 semanas de vida foram imunizados com uma mistura contendo a fração parcialmente
purificada de fosfolipídeos/glicolipídeos (5 mg) de L. (L.)
durante 1 hora a 56ºC. Em seguida, a mistura foi liofilizada e ressuspensa em 2,0 mL de água destilada. Os animais
receberam doses semanais de 100 μL da mistura na veia caudal
(durante 4 semanas). Após um período de 3 semanas de descanso a resposta imune do animal foi “boosted” com o dobro de antígeno. Três dias após o “boost” o camundongo foi sacrificado, e seu baço retirado.
O baço foi homogeneizado em meio RPMI 1640 contendo 1 mM de piruvato e 2 mM de L-glutamina, filtrado em membrana de “nylon”, e lavado três vezes em meio RPMI 1640 (480 xg, por 10 minutos). Os esplenócittos foram então misturados com
aproximadamente 1,5x108 células NS-1 (células de mieloma de
camundongo). As células foram lavadas em RPMI 1640, e ao sedimento adicionaram-se 2,0 mL de polietilenoglicol 50% em meio RPMI 1640, para ocorrer a fusão das células. Após aproximadamente 3 minutos, adicionaram-se lentamente 16,0 mL de RPMI 1640. As células foram novamente centrifugadas e ressuspensas em 60,0 ml de meio RPMI 1640 contendo 15% de
soro bovino fetal (RPMI completo) e HAT (hipoxantina 1x10-4 M,
aminopterina 4x10-7 M e timidina 1,6x10-5 M). As células foram
então distribuídas em 5 placas de cultura de 96 poços (200
uL/poço) e mantidas em estufa contendo 5% de CO2 a 37º C. A
por HT (hipoxantina 1x10-4 M e timidina 1,6x10-5 M), o qual foi mantido por mais 15 dias.
Cerca de 10 dias após a fusão, o sobrenadante de cultura de cada poço foi retirado e testado quanto à presença de anticorpos reativos com os antígenos de formas promastigotas de L. (L.) amazonensis, por radioimunoensaio em fase-sólida. Os poços que continham hibridomas secretores de imunoglobulinas foram expandidos para placas de cultura de 24
poços e garrafas de 25 cm2, repetindo-se o processo de
“screening” regularmente. Os hibridomas que apresentaram reatividade com os antígenos foram clonados em placas de 96 poços, diluindo-se as células em meio, de modo a adicionar 1 célula a cada 3 poços, isto é, 0,3 célula por poço. O processo de “screening” foi repetido, os poços reativos foram ampliados e suas células congeladas em soro fetal bovino contendo 10% de dimetilsulfóxido. As células foram mantidas por 2 horas a -20ºC, “overnight” a -70ºC e finalmente armazenadas em tanques de nitrogênio líquido.
Os hibridomas foram mantidos em meio RPMI completo em
estufa com 5% de CO2 a 37ºC. Os sobrenandantes de cultura
2.2. Obtenção do fluido ascítico
Camundongos BALB/c foram inoculados com 0,5 mL de pristaine (2,6,10,14-tetrametilpentadecano), na cavidade
peritoneal. Após aproximadamente 10 dias, 1x106 hibridomas
foram ressuspensos em 0,5 ml de PBS e inoculados intraperitonealmente, 10 dias depois os animais começaram a desenvolver ascite. Os fluidos foram drenados, centrifugados a 530 xg por 10 minutos, filtrados em papel de filtro, alíquotados e mantidos a -70ºC.
3. Cultura de macrófagos peritoneais de camundongo
Macrófagos da cavidade peritoneal de camundongos BALB/c foram obtidos pela lavagem da mesma com 2,0 mL de PBS frio. O líquido peritoneal foi coletado e a quantidade de macrófagos foi determinada por contagens total e diferencial com cristal violeta 1,0 mg/mL em ácido acético 30% (diluído 1:5 v/v).
Ajustou-se então a concentração de macrófagos para 3x106
células/mL. Aproximadamente 5x105 macrófagos foram
L-glutamina 2 mM, penicilina 100 U/mL estreptomicina 100 mg/mL,
(P/S) e soro fetal bovino 10%, em estufa contendo 5% de CO2
a 37ºC.
4. Infecção de macrófagos peritoneais por formas promastigotas de L. (L.) amazonensis
Formas promastigotas de L. (L.) amazonensis (na proporção
de 10 parasitas/macrófago) foram incubados com macrófagos em cultura a 23ºC por 1 hora. Após esse período, as lamínulas foram lavadas 3 vezes com RPMI 1640 e incubadas ou não em
meio RPMI 1640 completo, a 37ºC em estufa de CO2 por 4 horas.
Em seguida, as lamínulas de vidro foram lavadas com PBS, fixadas com formaldeído 2% em PBS e mantidas a -20ºC até o momento do uso.
5. Diferenciação de formas amastigotas para promastigotas
Formas amastigotas recém-isoladas de lesões de Golden
hamsters infectados com L. (L.) amazonensis foram adicionadas
PBS. As lamínulas foram analisadas por imunofluorescência indireta utilizando-se os mAbs LST1 ou LST2.
6. Cromatografia em camada delgada de alta resolução (HPTLC)
A identificação dos glicolipídeos foi realizada por HPTLC em placas de silica gel 60, utilizando-se o solvente clorofórmio:metanol:água (C:M:W) (25:21:7; v/v/v). Os glicolipídeos foram visibilizados como manchas púrpuras pelo borifamento das placas de cromatografia com orcinol 0,05% em ácido sulfúrico 3 M e aquecimento a 120ºC por cerca de 5 minutos.
A identificação dos fosfolipídeos foi realizada também por HPTLC em placas de sílica gel 60, mas utilizando-se o solvente clorofórmio:metanol:metilamina 40% (C:M:metiamina 40%) (63:35:10; v/v/v). Os fosfolipídeos foram visibilizados pelo borifamento das placas com reagente de Dittmer-Lester (Dittmer & Lester, 1964).
O corante reagente de Dittmer-Lester é preparado da seguinte forma:
1. Ferve-se 100 mL de H2SO4 25 N
2. Adicionam-se 4,01 g de trióxido de molibdênio metálico lentamente, sob agitação até dissolução completa;
4. Adicionam-se a uma das frações 0,178 g de molibdênio metálico;
5. Juntam-se as duas frações e adiciona-se água na proporção (1:1:2).
7.Extração e purificação de glicolipídeos e fosfolipídeos
7.1. Extração de lipídeos de parasitas
Os glicolipídeos/fosfolipídeos foram extraídos de
aproximadamente 1x1010 parasitas por homogeneização dos
parasitas com uma mistura de Isopropanol:Hexano:água (IPA:Hex:água) (50:20:25; v/v/v), por 3 vezes e com clorofórmio:metanol (C:M) (2:1; v/v). Os cinco extratos foram combinados, secos em rotaevaporador, ressuspensos em C:M (2:1; v/v) e analisados por cromatografia em camada delgada de alta resolução (HPTLC).
7.2. Purificação de glicolipideos/fosfolipídeos de formas promastigotas de L. (L.) amazonensis
em rotaevaporador, ressuspensas em C:M (2:1; v/v) e analisadas por HPTLC, conforme descrito em 6.
Os glicolipídeos foram eluídos predominantemente nas frações C:M (1:9; v/v) e IPA:Hex:água (55:20:25; v/v/v). Em seguida, essas frações foram agrupadas, secas e ressuspensas no solvente C:M:W (30:60:8; v/v/v) e aplicadas em uma coluna de troca iônica, DEAE-Sephadex, previamente equilibrada neste solvente. A coluna foi lavada com 5 volumes deste solvente, e eluída com 5 volumes de metanol, os lipídeos acídicos foram eluídos com 5 volumes de acetato de sódio 0,2 M em metanol. Todas as frações foram secas em rotaevaporador, sendo que as acídicas foram ressuspensas em água e dialisadas contra água. Esses materiais foram secos novamente, e como as duas primeiras frações, foram ressuspensos em C:M (2:1; v/v) e analisados por cromatografia em camada delgada de alta resolução.
7.3. Purificação de inositol fosforilceramida (IPC) de L.
(L.) amazonensis
preparativa. Os componentes resistentes foram visibilizados em HPTLC, após coloração com reagente de Dittmer-Lester.
7.3.1. Hidrólise alcalina
A fração acídica eluída da coluna de DEAE-Sephadex foi seca e dissolvida em 1,0 mL de uma mistura de etanol/água/éter etílico/piridina (15:15:5:1, v/v/v/v), adicionou-se 1,0 mL de KOH 0,2 M em metanol, preparado no momento do uso. Após 1 hora em temperatura ambiente, com agitações ocasionais, foram adicionados 200 µL de ácido acético 1 M e 116 µL de água. A amostra foi seca, adicionou-se 1 volume de butanol saturado com água e um volume de água. O material foi agitado e a fase butanólica retirada. Repetiu-se esRepetiu-se procedimento 3 vezes.
7.3.2. HPTLC – Preparativa
segundos em ultrasom. O sobrenadante foi coletado e este procedimento foi repetido 3 vezes.
8. Análise por cromatografia gasosa acoplada a espectrometria de massa (GC/MS)
Cerca de 10 µg de IPC purificado foi submetido a metanólise. O material foi incubado com 1,0 mL de HCl 1 M em metanol secado a 80ºC durante um perídodo de 16 a 24 horas. Após a amostra ter esfriado, adicionou-se 1 mL de hexano e a fração superior, a qual contêm os ácidos graxos metil éster (FAMEs) foi guardada, repetiu-se o procedimento 3 vezes. As fases superiores agrupadas foram secas e analisadas por GC/MS.
Em seguida, a fração metanol/HCl foi re-N-Acetilada pela adição de 40 µL de piridina, 40 µL de anidrido acético e 200 µL de metanol secado. O material foi mantido por 30 minutos em temperatura ambiente, seco e trimetilsililado pela adição de 200 µL do Reagente Tri-Sil, (30 minutos a 80ºC). A seguir, as amostras foram secas, ressuspensas em 50 uL de hexano e aplicadas no GC/MS.
O programa utilizado foi de temperatura inicial de 40ºC (1 minuto) e temperatura final de 300ºC, sendo aumentado de 5ºC/min (5 minutos cada intervalo), no total de 58 minutos. A coluna utilizada foi a CP-Sil 8 (Varian) de 50 metros e 0,25 mm de diâmetro. O processo de aquisição do espectro de massa realizou-se por varredura linear m/z 40-700. Os derivativos foram comparados com padrões sililados de acordo com o tempo de retenção e perfil de fragmentação.
Esquema 2. Protocolo de derivatização para a análise do IPC
por GC/MS
1 volume de hexano
Fosfolipídeos
Metanólise
(MeOH/HCl 1M;
80ºC, 16 horas
)
Fase
metanol/HCl
Hidrólise alcalina
HPTLC preparativa
IPC purificado
Fase inferior
Fase superior
Fase hexano
(FAMEs)
GC/MS*
Re-N-Acetilação
(MeOH, anidrido acético
e piridina; 25ºC, 30 min)
GC/MS*
*GC/MS: Cromatografia Gasosa acoplada a Espectrometria de Massa
1 volume de hexano
Fosfolipídeos
Metanólise
(MeOH/HCl 1M;
80ºC, 16 horas
)
Fase
metanol/HCl
Hidrólise alcalina
HPTLC preparativa
IPC purificado
Fase inferior
Fase superior
Fase hexano
(FAMEs)
GC/MS*
Re-N-Acetilação
(MeOH, anidrido acético
e piridina; 25ºC, 30 min)
GC/MS*
9. Imunocoloração de placas de HPTLC
Após cromatografia dos fosfolipídeos/glicolipídeos em placas de HPTLC, as mesmas foram secas e imersas em solução de polimetacrilato 0,01% em hexano durante 1 minuto, e bloqueadas com gelatina 0,1% em PBS, durante 8 horas e leite 10% em PBS “overnight” para o mAb LST1, ou com BSA 1% em PBS por 2 horas para o mAb LST2. Em seguida, as placas foram incubadas “overnight” com os anticorpos monoclonais. Após este período, as placas foram incubadas com anticorpo secundário de coelho anti-IgM de camundongo diluído 500 vezes em BSA 1% em PBS por 2 horas e finalmente incubadas com
proteína A marcada com 125I (2x107 cpm/50 mL de BSA 1% em
PBS), por 1 hora, entre cada etapa as placas foram lavadas 5 vezes com PBS. O autoradiograma da placa de HPTLC foi realizado sobrepondo-se um filme de Raio X à placa de HPTLC “overnight” a -70ºC. As bandas visibilizadas no filme de Raio-X foram comparadas quanto às suas migrações cromatográficas em relação a uma placa de HPTLC contendo os mesmos glicolipídeos/fosfolipídeos, porém reveladas com reagente de Dittmer-Lester para fosfolipídeos ou
10. Radioimunoensaio em fase sólida (RIA)
10.1. RIA utilizando antígenos
glicolipídicos/fosfolipídicos adsorvidos em placa de 96 poços
Glicolipídeos/fosfolipídeos de diferentes parasitas foram diluídos em etanol absoluto e adsorvidos em placas de 96 poços (25 µL/poço), através da evaporação de etanol a 37ºC. A seguir as placas foram bloqueadas conforme descrito no item 9 (Imunocoloração de placas de HPTLC) e incubadas com anticorpos monoclonais (100 µL/poço), por 2 horas em temperatura ambiente. Em seguida, adicionaram-se 50 µL/poço da solução de anticorpos de coelho anti-IgM de camundongo diluído 500 vezes em BSA 1% em PBS. Logo após, as placas
foram incubadas com 50 µL proteína A marcada com 125I diluída
em BSA 1% em PBS (1x105 cpm/poço) durante 1 hora. Entre cada
etapa as placas foram lavadas 5 vezes com PBS. A radioatividade de cada poço foi quantificada em contador gama.
10.2. RIA utilizando parasitas fixados com glutaraldeído
previamente lavadas com PBS e ajustadas para uma concentração
de 5x106 parasitas/50 µL. Em seguida, centrifugaram-se as
placas a 1700 xg por 10 minutos e acrescentaram-se 50 µL/poço de uma solução de glutaraldeído 0,5% em PBS frio. Após 15 minutos as placas foram lavadas 2 vezes com PBS. A seguir, as placas foram incubadas por 30 minutos em temperatura ambiente com glicina 0,1 M, pH 8,0 (100 µL/poço), para bloqueio dos grupos aldeídos livres. As placas foram novamente lavadas com PBS, bloqueadas com BSA 1% em PBS (200 µL/poço) e mantidas a -20º C.
A reatividade dos anticorpos monoclonais com diferentes parasitas foi analisada como descrito no item anterior.
11. ELISA
durante 1 hora. As placas foram reveladas com solução de OPD
(o-fenilenodiamino) (1 mg/mL) em tampão citrato fosfato 0,1 M
pH 4,0 e 0,012% de peróxido de hidrogênio (50 μL/poço). Após
15 minutos, 50 μL de H2SO4 2,0 M foram adicionados a cada poço
para a parada da reação. As absorbâncias foram medidas em espectrofotômetro a 492 nm.
12. Oxidação com meta-periodato de sódio
13. Marcação de proteína A com 125I
Para a marcação de proteína A com 125I, incubou-se 2
iodobeads (Pierce) com 1,0 mCi de Na125I diluído em 45 µL de
tampão Tris-HCl 0,4 M contendo EDTA 4,0 mM, pH 7,6, durante 5 minutos. A seguir, adicionaram-se aproximadamente 100 µg de proteína A e incubou-se essa mistura durante 15 minutos, agitando o tubo a cada 5 minutos. A solução foi aplicada em uma coluna de Sephadex G25 (PD-10) previamente lavada com BSA 1% em PBS. A proteína marcada foi eluída da coluna com BSA 1% em PBS, coletando-se 12 tubos, com 12 gotas/tubo. Alíquotas de 2 µL de cada tubo foram mensuradas em contador gama e as frações correspondentes ao pico de radioatividade (usualmente tubos 4 e 5) foram agrupadas, alíquotadas e mantidas a -70ºC.
14. Imunofluorescência indireta
Aproximadamente 1x108 parasitas foram lavados 3 vezes
conjugado à fluoresceína e 4,6-diamino-2-fenilenileneindol 0,01 mM (DAPI). Os parasitas foram novamente lavados 5 vezes com PBS e observados ao microscópio de fluorescência.
15. Dosagem de carboidratos
Glicolipídeos foram quantificados através da dosagem de açúcar pelo método de fenol-sulfúrico (Dubois et al, 1956),
utilizando-se glucose como padrão (0-20 μg). Alíquotas de 20
µL de fenol 5% em água foram adicionadas a 20 µL de amostra.
A seguir, adicionaram-se rapidamente 100 µL de H2SO4
concentrado. Após 10 minutos, a absorbância foi medida a 492 nm.
RESULTADOS
Com o intuito de obter informações a respeito da
composição da membrana de formas promastigotas de L. (L.)
amazonensis, parasitas foram analisados durante o crescimento logarítmico e estacionário quanto a composição de glicolipídeos e fosfolipídeos. Em paralelo, foram produzidos dois anticorpos monoclonais específicos para a fração de glicolipídeos e fosfolipídeos de formas promastigotas e suas especificidades determinadas.
1. Curva de crescimento e perfis de fosfolipídeos e glicolipídeos de formas promastigotas de L. (L.) amazonensis
Promastigotas de L. (L.) amazonensis foram cultivados em
meio LIT, e quantificados diariamente. Conforme a Figura 3, observa-se que nas condições realizadas, o crescimento é logarítmico nos 2 primeiros dias, atingindo a fase estacionária só no 4º dia de cultura.
Figura 3. Curva de crescimento de formas promastigotas de L. (L.) amazonensis
Formas promastigotas de L. (L.) amazonensis foram
cultivadas conforme item 1.1 de Métodos e alíquotas das culturas foram retiradas em horários pré-estabelecidos. Os valores representam a média de três quantificações em câmara de Newbauer.
1 10 100 1000
0 1 2 3 4 5 6
Tempo de cultura (dias)
P
ar
asi
tas (
x1
0
glicolipídeos foram quantificados por dosagem de carboidratos, conforme descrito em Métodos.
Além dos fosfolipídeos normalmente encontrados na bicamada lipídica: fosfatidiletanolamina (PE), fosfatidilcolina (PC), fosfatidilserina (PS) e fosfatidilinositol (PI), observou-se também a presença de 2
fosfolipídeos com migração cromatográfica abaixo do PI, Liso
-PI e inositol fosforilceramida (IPC). Esses fosfolipídeos estão presentes em todos os dias de cultura (Figura 4). Para identificação do IPC foi utilizado como padrão inositol
fosforilceramida de Saccharomyces cerevisiae e para o Liso-PI
foi utilizado como padrão Liso-PI isolado de L. (V.)
braziliensis caracterizado por GC/MS.
Comparando-se a concentração de fosfolipídeos presentes nos parasitas durante a fase logarítmica e estacionária, verifica-se que há um decréscimo da quantidade total de fosfolipídeos, provavelmente devido à diminuição do tamanho dos parasitas da fase logarítmica para a fase estacionária, isto é, geralmente a forma procíclica mede de 6-20 µm, enquanto que a forma metacíclica apresenta de 5-8 µm.
Comparando-se o percentual de cada fosfolipídeo durante a curva de crescimento verifica-se que, enquanto o percentual
de IPC, PS, PE, Liso-PI aumenta, o percentual de PI e PC
Figura 4. Perfil de fosfolipídeos de promastigotas de L. (L.) amazonensis mantidos em cultura durante 6 dias
Fosfolipídeos correspondentes a 2x107 promastigotas foram
aplicados em placa de HPTLC, cromatografados no solvente C:M:metilamina 40% (63:35:10; v/v/v) e corados com reagente de Dittmer-Lester.
Linha PL, padrão de fosfolipídeos contendo 1 mg/ml de PE, PC, PS e PI;
Linhas D1 a D6, fosfolipídeos extraídos de promastigotas de L. (L.) amazonensis mantidos em cultura por 1 a 6 dias (D1 a D6).
PL D1 D2 D3 D4 D5 D6
PC-
PE-
PS- PI-
IPC-
OR-Liso
-PI-PL D1 D2 D3 D4 D5 D6
PC-
PE-
PS- PI-
IPC-
-PI-Figura 5. Distribuição de fosfolipídeos e IPC em promastigotas durante o crescimento
Fosfolipídeos totais de 2x107 promastigotas de L. (L.)
amazonensis foram aplicados em placa de HPTLC,
cromatografados no solvente C:M:metilamina 40% (63:35:10; v/v/v), corados com reagente de Dittmer-Lester e densitometrados. As percentagens foram determinadas em relação a uma mistura padrão contendo cada fosfolipídeo na concentração de 1 mg/ml.
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
1º 2º 3º 4º 5º 6º
Dias de cultura