• Nenhum resultado encontrado

A democratização da política pública e o fortalecimento da cidadania. Conhecendo o projeto Casa Brasil : unidades Vitória e Vila Velha

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "A democratização da política pública e o fortalecimento da cidadania. Conhecendo o projeto Casa Brasil : unidades Vitória e Vila Velha"

Copied!
245
0
0

Texto

(1)

ADEMOCRATIZAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA E O FORTALECIMENTO DA CIDADANIA

Conhecendo o Projeto Casa Brasil – Unidades Vitória e Vila Velha

Dissertação apresentada à Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, como requisito para obtenção do título de Mestre em Administração Pública

Orientador: Prof. Dr. Fernando G. Tenório

THAIS SILVA GONÇALVES

(2)

AGRADECIMENTOS

A Deus, em primeiro lugar, por renovar a cada dia o dom de minha vida, ser luz no meu caminho, ser força quando sou fraca e ser a perene e mais presente companhia nos momentos de imprescindível solidão.

À minha família, que, com amor e generosidade, me ajudou e ajuda a construir minha história de vida.

Ao meu irmão Flávio, por sua ajuda concreta na realização deste trabalho. Aos meus amigos do mestrado, por se alegrarem com minhas vitórias e por não me deixarem desistir no meio do caminho.

À Carol e a Maiby, parceiras em todas as horas.

Ao meu orientador, Professor Fernando Guilherme Tenório, que, com sua acolhedora simplicidade, acreditou e confiou em mim, quando eu mesma já não me julgava capaz.

À Cordélia e ao Joarez, pela paciência, compreensão e ajuda constante.

Às minhas amigas do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, por terem aceitado, com nobreza de alma e coração, o encargo de serem minha família carioca, enxugando minhas lágrimas, rezando por mim e comigo e, principalmente, me ensinando a ser mais leve, descobrindo motivos para sorrir sempre.

(3)

(...) Mas ele desconhecia Esse fato extraordinário: Que o operário faz a coisa E a coisa faz o operário. De forma que, certo dia À mesa, ao cortar o pão O operário foi tomado De uma súbita emoção Ao constatar assombrado Que tudo naquela mesa Garrafa, prato, facão Era ele quem os fazia Ele, um humilde operário, Um operário em construção.

(...) Ah, homens de pensamento Não sabereis nunca o quanto Aquele humilde operário Soube naquele momento! (...) Foi dentro da compreensão Desse instante solitário Que, tal sua construção Cresceu também o operário. Cresceu em alto e profundo Em largo e no coração E como tudo que cresce Ele não cresceu em vão (...) E foi assim que o operário Do edifício em construção Que sempre dizia sim Começou a dizer não. E aprendeu a notar coisas A que não dava atenção: (...) Uma esperança sincera Cresceu no seu coração E dentro da tarde mansa Agigantou-se a razão De um homem pobre e esquecido Razão porém que fizera Em operário construído O operário em construção.

(4)

RESUMO

O objetivo desta dissertação é analisar o Projeto Casa Brasil e sua contribuição para a promoção de ações de cidadania, nos municípios de Vitória e Vila Velha. O presente estudo foi conduzido a partir de uma discussão teórica sobre os temas: cidadania, espaço público, participação social e política pública. Posteriormente, foram realizadas entrevistas temáticas, baseadas no método não probabilístico, com uma amostra composta por 17 pessoas, entre representantes dos poderes públicos, da sociedade civil organizada e da comunidade. No tratamento dos dados foi utilizada a análise de discurso. Foram identificados aspectos negativos e positivos no que diz respeito à cidadania e ao poder público. Com a pesquisa, pretendeu-se verificar se há estímulo à participação consciente e legítima da sociedade, na construção e no exercício permanente da cidadania. A experiência do Projeto Casa Brasil, nas unidades de Vitória e Vila Velha, demonstra que a eficácia e a sustentabilidade do projeto dependem da interação e do nível de comprometimento dos parceiros estratégicos, tendo em vista que as condições institucionais locais exercem influência nas formas de mobilização social e participação dos indivíduos. Evidencia, ainda, a necessidade de potencializar o envolvimento dos cidadãos, por meio da implantação dos conselhos gestores, assegurando a participação popular a fim de estimular a apropriação das unidades pela comunidade, conferir um caráter democrático à gestão pública e ampliar a cidadania.

(5)

ABSTRACT

The purpose of this dissertation is to analyze the Casa Brasil Project and its contribution for promoting actions related to citizenship in Vitoria and Vila Velha cities. The essay was led through a theoretical discussion about citizenship, public space, social participation and public politics. Thereafter thematic interviews based on a non-probabilistic method were done with seventeen people such as public power representatives, organized civilian society and community. The speech analysis was used for data treatment. Some negative and positive aspects referred to citizenship and public power were identified. The aim of the research was checking if there is any encouragement to a genuine and consciousness participation of the society for the structure and continuous citizenship practice. The Casa Brasil Project experience in Vitoria and Vila Velha demonstrates that its sustainability and effectiveness depend on how interacted and committed the strategic stakeholders are, since the condition of local institutions influences the model of social mobilization and individual participation. Besides, this essay shows it is necessary: to improve the citizen involvement – by implementing the board of directors, which assures public participation in order to stimulate the community to take the unity control – to grant democratic feature to the public power, and to increase citizenship.

(6)

Lista de Ilustrações

Quadros

Quadro 1: Benefícios esperados do Projeto Casa Brasil 56 Quadro 2: Variáveis para o desenvolvimento local sustentável

Referências para análise 71

Figuras

Figura 1: Construção Teórica da Pesquisa 65

Tabelas

(7)

Lista de Abreviaturas e Siglas

CGPCB – Comitê Gestor Projeto Casa Brasil

CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CMC – Centro Sócio-Educacional Marcelino Champagnat

Ebape – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas FGV – Fundação Getúlio Vargas

GBLTT - Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais IDH – Índice de Desenvolvimento Humano

ITI – Instituto Nacional de Tecnologia da Informação MCT – Ministério da Ciência e da Tecnologia

Pegs – Programa de Estudos em Gestão Social PMV – Prefeitura Municipal de Vitória

PMVV – Prefeitura Municipal de Vila Velha ONG – Organização Não-Governamental SECIS – Secretaria de Inclusão Social

SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial TIC – Técnico de Instrução Continuada

(8)

1 – INTRODUÇÃO 10

1.1 Objetivos 14

1.2 Suposição 14

1.3 Delimitação do Estudo 14

1.4 Relevância do Estudo 15

2 - REFERENCIAL TEÓRICO 17

2.1 Cidadania 17

2.1.1 Democracia e participação cidadã 20

2.1.2 Espaço Público: locus de democratização da participação cidadã 26 2.1.3 Sociedade Civil e Estado: instrumentos de interação e participação 28

2.2 Política Pública 39

3 – REFERENCIAL PRÁTICO 51

3.1 Projeto Casa Brasil 51

3.2 Casa Brasil 56

3.2.1 Casa Brasil Vitória 58

3.2.2 Casa Brasil Vila Velha 59

4 – METODOLOGIA 61

4.1 Tipo de Pesquisa 61

4.2 Universo e amostra 62

4.3 Seleção de sujeitos 63

4.4 Coleta de dados 64

4.5 Tratamento de dados 66

4.6 Limitações do método 73

5 – ANÁLISE 74

6 – CONCLUSÕES 108

(9)

Apêndice A - Roteiro de Entrevista – Representante do Governo Federal – âmbito de

atuação nacional – Entrevista exploratória 120

Apêndice B - Roteiro de Entrevista - Representantes dos Parceiros Estratégicos (Prefeituras, Governo Federal, Sociedade Civil) – âmbito de atuação local 122 Apêndice C - Roteiro de Entrevista - Representantes do Governo Federal – âmbito

de atuação regional 124

Apêndice D - Roteiro de Entrevista – Usuários 126

Apêndice E - Roteiro de Entrevista – Representante do Governo Federal – âmbito de

atuação nacional 127

ANEXOS 129

Anexo A – Cidadania 129

Anexo B – Desenvolvimento local com Cidadania 172

Anexo C – Edital CNPq 203

Anexo D – Projeto CNPq 220

Anexo E – Projeto Vitória Digital 245

(10)

1 - INTRODUÇÃO

Neste capítulo, serão apresentados o problema, os objetivos intermediários e o objetivo final que se esperou atingir a partir dos processos de busca e proposição de uma resposta à questão elegida. A delimitação do estudo, ou seja, a moldura de leitura da realidade a partir dos limites concernentes às variáveis, à abordagem, ao recorte geográfico e de tempo da investigação (VERGARA, 2005), também será apresentada neste capítulo. Por fim, serão ressaltadas as contribuições que esse estudo pode trazer para a sociedade.

No intuito de refletir sobre quem seria o novo mediador entre o poder público e a sociedade, o Programa de Estudos em Gestão Social (Pegs) iniciou estudos a fim de verificar até que ponto seria possível sair da dicotomização Estado-mercado ou mercado-Estado (enfoque estadocêntrico e/ou mercadocêntrico) para outra percepção que teria na sociedade civil o determinante das relações sociais e de produção (enfoque sociocêntrico). Assim, impulsionada pelo fortalecimento da sociedade civil e suas novas demandas, a cidadania deveria ser vista não apenas como a base da soberania de um Estado-nação, mas também como expressão do pleno exercício de direitos exigíveis em benefício da pessoa humana e da coletividade (Sunkel apud Tenório, 2004:12).

A pesquisa aqui apresentada seguiu os moldes de iniciativas anteriores, originadas com o Programa de Estudos em Gestão Social (Pegs), desenvolvido na Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), coordenada pelo Professor Fernando Guilherme Tenório, visando o conhecimento e divulgação de experiências que promovam a criação de espaços públicos e o fortalecimento da cidadania.

(11)

identificar o conteúdo, as formas e o significado de participação cidadã nas decisões do poder público, a partir do estudo das práticas e representações de alguns dos principais sujeitos envolvidos no processo de gestão, formulação e implementação de políticas públicas, em nível municipal. (...) É dentro de uma perspectiva metodológica que privilegia as relações Sociedade-Estado que se pode investigar os mecanismos criados, no Brasil, a partir da Constituição Federal de 1988, para ampliar a autonomia dos municípios e os espaços de participação da sociedade na gestão

pública. Parte-se do pressuposto, adotado pelos próprios

constituintes, de que a descentralização permite desenvolver novas formas de gestão, mais eficazes no atendimento das necessidades

dos diferentes grupos sociais, especialmente daqueles

tradicionalmente excluídos dos processos decisórios. (Tenório e Costa, 1999:7)

Com o escopo de reproduzir a experiência didática do referido programa, foram aplicados o referencial teórico e metodológico de pesquisa, originados em tais estudos, para a análise de outra iniciativa do poder público, que é o Projeto Casa Brasil, cujo objetivo geral é promover o desenvolvimento social para a apropriação autônoma e cidadã das tecnologias de informação e comunicação, a partir da inclusão digital e social, promovendo a geração do trabalho e renda, a ampliação da cidadania, a popularização da ciência e da arte; devendo, ainda, criar e consolidar as redes sociais e as parcerias para sustentabillidade das Unidades Casa Brasil, instaladas em localidades de grande concentração de pobreza e exclusão social.

A análise dos elementos da pesquisa foi orientada pelo uso do referencial teórico habermasiano, partindo do conceito de cidadania deliberativa, tendo em vista que o projeto teórico-social desenvolvido por Jürgen Habermas focaliza a importância da esfera pública como o locus privilegiado de emancipação social e de democratização das relações sociais.

(12)

Com unidades funcionando em áreas de baixo índice de desenvolvimento humano, o Projeto Casa Brasil leva às comunidades computadores e conectividade, e privilegia, sobretudo, ações em tecnologias livres aliadas a cultura, arte, entretenimento, articulação comunitária e participação popular.

As atividades desenvolvidas visam estimular a apropriação autônoma e crítica das tecnologias, como, por exemplo, o software livre, a democratização das comunicações e o desenvolvimento local orientado pelos princípios da economia solidária.

Com o objetivo de garantir a participação popular e comunitária, para organizar e realizar as atividades desenvolvidas em cada unidade da Casa Brasil, foi previsto um Conselho Gestor, que deve ser formado, em sua maioria, por membros da comunidade. Sendo um espaço público e comunitário, de uso gratuito e de acesso irrestrito, o projeto anseia estimular a apropriação da unidade pela comunidade, transformando-a em espelho cultural do local em que foi implementada, fomentando a gestão participativa e ampliação da cidadania, e, fortalecendo a ação da sociedade civil.

Dessa forma, apresentar-se-ão as discussões teóricas sobre o tema que serviu de base para a pesquisa, qual seja, a cidadania, no enfoque deliberativo que fundamentou a teoria da ação comunicativa proposta por Habermas.

Serão apresentadas, ainda, as fontes de estudo sobre política pública, interação entre seus diversos atores, participação social e espaço público, onde possam existir processos de discussão, orientados pelos princípios da inclusão, do pluralismo, da igualdade participativa, da autonomia e do bem comum.

Desde já, queremos ressaltar que os conceitos são significados possíveis e que, por isso, apontam entendimentos que podem ser provisórios, já que construções históricas, culturais, humanas e sociais.

(13)

diálogo envolvendo o campo empírico, o campo teórico e os conhecimentos e práticas do pesquisador.

O cerne da análise é o fortalecimento do espaço público, a abertura da gestão pública à participação cidadã no debate e formulação de políticas sociais, por meio de práticas participativas que vão além das ações de cunho utilitarista e clientelista.

E, finalmente, apresentaremos algumas considerações finais sobre o tema, não como possibilidade única de entendimento, mas como uma das possibilidades de compreensão deste tema que envolve concepções e práticas que procuram a justiça social, por meio da inclusão realizada em diversos níveis, acreditando na proposta de políticas públicas que trabalhem com métodos participativos e que almejem a democratização do poder público, ainda que sejam necessárias mudanças que lhes garantam a efetividade e ampliem a eficiência e eficácia.

É importante observar que os Anexos A e B desta dissertação integram o referencial teórico do trabalho, constituindo-se de estudos sobre os temas: cidadania e desenvolvimento local com cidadania, originados de pesquisa realizada pelo Programa de Estudos em Gestão Social, desenvolvida da Escola Brasileira de Administração Pública, sob coordenação do Professor Fernando Guilherme Tenório1.

Diante do exposto, com a pesquisa, pretendeu-se verificar se há estímulo à participação consciente e legítima da sociedade, na construção e no exercício permanente da cidadania. Mais especificamente ainda, o trabalho buscou a resposta ao seguinte problema: O Projeto Casa Brasil, desenvolvido nas unidades Casa Brasil dos municípios de Vitória e Vila Velha, promove ações de cidadania?

1

Tais Anexos constituem os capítulos 1 e 3 do livro Cidadania e Desenvolvimento Local, organizado pelo Prof.

(14)

1.1 Objetivos

a) Objetivo Final:

Verificar se as unidades Casa Brasil dos municípios de Vitória e Vila Velha, do Projeto Casa Brasil, promovem ações de cidadania.

b) Objetivos Intermediários:

1) Analisar o Projeto Casa Brasil, explicitando seus objetivos e formas de execução;

2) Identificar o contexto social e as parcerias estabelecidas para implantação das Unidades Casa Brasil, nos municípios de Vitória e Vila Velha; e,

3) Analisar a relação entre os poderes públicos, instituições públicas, sociedade civil e cidadãos em cada município pesquisado.

1.2 Suposição

Considerando que o Projeto Casa Brasil surgiu com a necessidade de promoção de ações de combate à exclusão social e de estimulação da cidadania ativa pela inclusão digital e social, voltado para a população de baixa renda e que não possui condições de adquirir acesso individual à Internet, a suposição considerada na presente pesquisa foi a de que as Unidades Casa Brasil dos municípios de Vitória e Vila Velha, no Estado do Espírito Santo, promovem ações de cidadania.

1.3 Delimitação do Estudo

(15)

inicialmente, para 90 localidades de grande concentração de pobreza e exclusão social, distribuídas por todo o território nacional.

Tendo em vista que as unidades possuem autonomia para lidar com as diversas abordagens do projeto, respeitando a própria dinâmica cultural regional e local, e, considerando, ainda, a inviabilidade de se conhecer todas as unidades, em razão da exigüidade do tempo disponível para a realização da pesquisa e da extensão da área de abrangência do projeto, este estudo restringiu-se à análise das unidades implantadas nos municípios de Vitória e Vila Velha, no Estado do Espírito Santo.

A escolha das unidades Casa Brasil Vitória e Vila Velha, além da questão geográfica, considerou o vínculo estabelecido pelo governo federal para a execução do Projeto Casa Brasil naquelas localidades, uma vez que os parceiros estratégicos das duas unidades foram as Prefeituras Municipais. Além disso, em ambas as parcerias, houve a interação do poder público com a sociedade civil organizada. Acrescente-se, também, o fator tempo, eis que tais unidades possuem o mesmo período de existência.

Considerando, ainda, a amplitude do objetivo geral do projeto, o qual pretende ser realizado por meio de uma multiplicidade de ações, esta pesquisa concentrou-se naquelas ações cujo alvo seja a promoção e ampliação da cidadania, por meio da criação de um espaço público e da democratização das relações sociais e da gestão públicas, com mecanismos que fomentem a participação popular.

1.4 Relevância do estudo

(16)

O desenvolvimento de estudos desta natureza pode fornecer subsídios ao aperfeiçoamento e ao desenvolvimento de métodos participativos em projetos ou programas públicos, contribuindo assim para o avanço da administração pública, aumentando a eficácia e a efetividade da gestão de políticas públicas, além de auxiliar no avanço da construção de uma democracia cidadã.

Do ponto de vista prático, a análise das atividades desenvolvidas nas Unidades Casa Brasil auxilia a tomada de decisões do poder público, contribuindo para o fortalecimento do projeto, podendo, ainda, inspirar a implementação de práticas semelhantes por outros entes federativos, deflagrando-se outras parcerias.

(17)

2 – REFERENCIAL TEÓRICO

Nossa intenção, neste capítulo, é explicitar os conhecimentos que contribuíram como base e fundamentação teórica para a pesquisa. Serão apresentadas as fontes de estudo sobre cidadania, participação social, espaço público e política pública. Para tanto, trazemos as reflexões, dentre outros autores citados, de: Tenório (1997, 1999, 2004, 2007), Vieira (2001, 2005), Jacobi (2002), Bucci (2002), Saravia (2006) e Benevides (1994).

2.1 Cidadania

O surgimento da cidadania na história da civilização ocidental está ligado ao fenômeno da democracia antiga. Isso, no entanto, não significa dizer que democracia e cidadania sejam sinônimos. Benevides explica que

Histórica e etimologicamente, cidadania é uma palavra que vem de cidade, sendo essa compreendida no sentido clássico de sociedade política (civitas, para os antigos romanos, ou polis, para os gregos antigos), na qual os cidadãos, ou seja, os membros livres daquela sociedade, se articulavam e participavam da vida pública, visando o interesse coletivo. Dessa forma, as palavras cidadania e cidadão, referem-se necessariamente, à participação na vida da cidade, entendida como o espaço público para decisões coletivas. Nessa democracia antiga havia clareza do termo cidadania, porque só se admitia como cidadão o membro ativo, que participava da vida pública. Aquele que não era ativo (o escravo, a mulher, o estrangeiro, por exemplo), simplesmente não era considerado cidadão. (Benevides, 1994:13)

(18)

prática comum, cujo exercício é o que permite aos cidadãos se converterem no que querem ser: atores políticos responsáveis de uma comunidade de pessoas livres e iguais (Habermas apud Tenório, 2004: 29). 2

De acordo com Silva e d’Arc, “no plano da construção da cidadania, surge mais explicitamente a questão da cidadania como valor, com dimensão coletiva, mas igualmente individual”. Para tais autores, “o indivíduo precisa ter consciência de que ser cidadão implica responsabilidade individual de valorização e exercício dos seus direitos e obrigações em relação à coletividade enquanto usuário, cliente, contribuinte, chefe de família, morador etc.” (Silva e d’Arc, 1996:63).

O significado de cidadania deliberativa procura superar a concepção liberal assim como a republicana por meio da soberania popular. No primeiro caso, os indivíduos cedem ao poder político parte de seus direitos e este tem a função de arbitrar os conflitos entre os interesses privados e sociais. No segundo, o poder político é o administrador e fiador da soberania do povo e instrumento de construção da sociedade (Tenório, 2004:107).

A concepção de cidadania, com base no modelo da deliberação, proposta por Habermas, deve ser entendida como uma ação política deliberativa, na qual o indivíduo participa de um procedimento democrático, decidindo, nas diferentes instâncias da sociedade e em diferentes papéis, o seu destino social como pessoa humana quer como eleitor, trabalhador ou consumidor, ou seja, a sua autodeterminação não se dá sob a lógica do mercado, mas da democracia social: igualdade política e decisória (Tenório, 2004:30).

Segundo Vieira (2005:27), “ser cidadão é ter acesso à decisão política, ser um possível governante, um homem político; ter direito não apenas a eleger

2

(19)

representantes, mas a participar diretamente na condução dos negócios da cidade”. Adotando os elementos conceituais estabelecidos por Tenório, “cidadão é aquele que entende que o bem-estar da sua comunidade política, do seu município, do seu local, enfim do seu território, depende da responsabilidade coletiva” (Tenório, 2007:44).

Sob o enfoque deliberativo de Habermas, fundamentado na teoria do diálogo3, a legitimidade das decisões políticas origina-se de processos de discussão, que sejam orientados pelos princípios da inclusão, do pluralismo, da igualdade participativa, da autonomia e do bem comum. Assim, a essência da cidadania deliberativa está nas redes de debates e negociações que, unindo os cidadãos em torno de um auto-entendimento ético, conduzam a solução racional de questões pragmáticas, éticas e morais (Tenório, 2007).

Na Teoria da Ação Comunicativa, proposta por Habermas, todos têm direito à fala que se caracteriza por seus argumentos e discurso voltados para a prática da razão. O “mundo da vida” é o espaço onde essa comunicação é possível e acontece por meio das manifestações entre as pessoas, ou seja, por meio da intersubjetividade.4 Crítico da Teoria Geral dos Sistemas e da Cibernética, Habermas entende a existência das organizações e, conseqüentemente, o uso da racionalidade instrumental como um modo de dominar o “mundo da vida”.

Habermas propõe que a práxis social seja pensada, além de ser capaz de promover um conhecimento reflexivo e, dessa forma, conduza a uma situação de interesse. Para ele, as instituições existentes devem ser questionadas à luz do contexto histórico, orientando a prática das ações. Argumenta, ainda, que somente a ação comunicativa permite que a razão (liberdade, justiça social, solidariedade) prevaleça, já que, segundo ele, todos os outros tipos de ação social são limitados, seja por uma estratégia, por normas ou padrões, eis que regidos pela lógica da dominação.

3

A teoria do [diálogo], que atribui ao processo democrático maiores conotações normativas do que o modelo liberal, as quais, no entanto, são mais fracas do que as do modelo republicano, assume elementos de ambas as partes compondo-os de modo novo (Habermas apud Tenório, 2007)

4

(20)

Assim sendo, a ação comunicativa (razão comunicativa) é aquela onde os indivíduos buscam o entendimento a respeito de uma situação para, de comum acordo, coordenar seus planos e suas ações; referindo-se, primordialmente, à negociação de definições da situação susceptível de consenso, ou seja, aceitas de modo não-coercitivo por todos os envolvidos.

Com o conceito de cidadania deliberativa, fundamentada na noção habermaseana de ação comunicativa (perspectiva crítica e

autoreflexiva), esboça-se a imagem de uma sociedade

descentralizada e que se caracteriza por um espaço público que serve para apresentar, identificar e solucionar problemas sociais. Neste tipo de cidadania a solução de questões subnacionais, por exemplo, não deve ser planejada exclusivamente pelo poder político e/ou tecnocburocrático ou atender a interesses sociais corporativos, mas compartilhar com a sociedade civil por meio de um procedimento político argumentativo no qual a cidadania delibera, decidem com os outros poderes, os interesses da comunidade (Tenório, 2004:107-8).

Na relação Sociedade-Estado, a ação gerencial dialógica – gestão social, a cidadania deliberativa sugere que a pessoa humana ao tomar ciência de sua função

como sujeito social e não adjunto, deve atuar com uma presença ativa e solidária nos destinos de sua comunidade; surgindo daí a necessidade de um locus privilegiado que propicie a integração social, a intersubjetividade sustentada por uma gestão mais solidária (Tenório, 2004:31).

Tenório (2005:44) ressalta que “é pelo esforço comum de seus concidadãos, por meio de espaços públicos decisórios, que determinado espaço geográfico obterá o seu desenvolvimento social, econômico, político, cultural e ambiental”.

2.1.1 Democracia e participação cidadã

(21)

O final da década de 70, no Brasil, foi caracterizado pelo início da democratização política, com a discussão da questão do direito do cidadão de participar e influir nas decisões políticas. O Banco Mundial, por sua vez, durante os anos 80, passou a recomendar o estabelecimento da participação social nas instâncias públicas e a implementação da participação como instrumento-chave do exercício da democracia local e meio de legitimação das aspirações populares em matéria de vida cotidiana (Silva e D’Arc, 1996).

A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988, reforçou a preocupação em garantir à população um papel de maior relevo no processo decisório, papel não só exercido através dos mecanismos de representação, mas também da participação direta (Silva e D’Arc, 1996).

Com o advento da Carta Magna de 1988, também denominada “Constituição Cidadã”, foram criados mecanismos 5 para fortalecer os espaços de participação da sociedade na gestão pública, ampliando a autonomia dos municípios, por meio da descentralização, a fim de suscitar o aperfeiçoamento e a eficácia do atendimento das necessidades de todos os grupos sociais, mormente os excluídos dos processos decisórios.

5 Alguns dos instrumentos jurídicos de participação popular estabelecidos na Constituição Federal são os seguintes: 1) Ação popular (artigo 5º, LXXIII): destaca que qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise anular ato lesivo

ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência; 2)

Atendimento aos direitos da criança e adolescente (artigo 227, caput e § 7º, que remete ao artigo 204, II): estabelece como

(22)

Segundo Silva e D’Arc, “é possível afirmar que existe um consenso no sentido de que gestão democrática e participação popular requerem, combinadamente, o fortalecimento da sociedade civil e um processo real de redemocratização do Estado” (Silva e D’Arc, 1996:47).

Entretanto, esses mesmos autores ressaltam que a ordem democrática se instalou potencializando uma distribuição desigual de bens materiais e simbólicos, além de enormes desigualdades sociais, obstaculizando as tentativas de institucionalização da participação popular, que passa a ser utilizada pela administração pública de maneira a legitimar formas de dominação e cultura política tradicional (Silva e d’Arc, 1996).

Citando Jacobi e Sanchez, reconhecem que o processo de redemocratização legitimou vários direitos sociais, mas, reavivou antigas práticas clientelistas, ao atribuírem à participação uma conotação negativa enquanto legitimação eficientista do Estado do bem-estar (Silva e d’Arc, 1996).

Dessa forma, é indispensável a adoção de mecanismos e procedimentos de participação que assegurem a todos, principalmente aos grupos sociais minoritários, igualdade de acesso ao espaço público, mediante o discurso, independentemente dos conteúdos, não sendo admissível que a política seja considerada atributo das elites (Vieira, 2001). Neste sentido, Silva e d’Arc (1996) defendem a denúncia da institucionalização da participação e das estratégias de cooptação dos poderes públicos, bem como das conseqüências no plano de cultura política que se reproduz, por exemplo, por meio do personalismo e do fisiologismo6.

Para que a participação realmente ocorra, faz-se necessário que, além de um conjunto de cidadãos e de entidades ou movimentos sociais, existam canais de participação consistentes em espaços (institucionalizados ou não), criados pelo Estado, para que sirvam de ponte entre o Estado e a sociedade onde, por meio de

6 Darcísio Corrêa alerta que enquanto o cidadão brasileiro, visto como um sujeito político, não tomar consciência de sua força

(23)

uma gestão democrática, os cidadãos não sejam apenas consultados, mas exerçam o real direito de decisão. (Costa e Tenório, 1999)

Pinho e Santana consideram que uma gestão democrática é uma gestão participativa, comunitária, sem paternalismo, com combate ao clientelismo, e uma forma de deselitização de políticas públicas, onde o cidadão é um sujeito e não um mero objeto (Pinho e Santana apud Tenório, 2004:95).

A respeito da participação, destacam-se dois elementos chaves que são a intervenção no curso de uma atividade pública e a expressão de interesses sociais. A participação cidadã não deve ser vista como uma alternativa à democracia representativa, mas, sobretudo, como um complemento capaz de suscitar novos caminhos ou novas relações entre a sociedade civil e a esfera pública, possibilitando o contato mais direto e cotidiano entre os cidadãos e as instituições públicas, de forma a possibilitar que estes considerem os interesses e concepções político-sociais daqueles no processo decisório, conferindo à democracia um novo status, o de democracia participativa (Costa e Tenório, 1999).

Para Tenório e Rozenberg (1997:114), o incremento e a democratização da gestão pública “se caracterizam por estimular o envolvimento da participação e da organização sociais em processos dedicados a promover a democratização da administração, através da criação de espaços ampliados para a discussão do orçamento, a definição de prioridades, o planejamento de ações e a prestação de contas”.

Tenório explica que

na relação Sociedade-Estado a gestão social se efetiva quando os governos institucionalizam modos de elaboração de políticas públicas que não se refiram ao cidadão como “alvo”, “meta”, “cliente” de suas ações ou, quando muitos, avaliadores de resultados mas sim como participantes ativos no processo de elaboração dessas políticas. Processo que deve ocorrer desde a identificação do

problema, durante o planejamento de sua solução,

(24)

O envolvimento ativo do indivíduo na construção da realidade que almeja legitima sua participação, tendo em vista que a mesma acontece de forma consciente e contribui para a conquista da cidadania; o que não acontece em experiências que manipulam ou mascaram a cooptação do indivíduo pelo Estado, configurando-se, na verdade, pseudoparticipação.

Ressalte-se, no entanto, que, ainda que se reconheça a participação direta dos cidadãos como condição indispensável à condição de construção de uma sociedade verdadeiramente democrática, vários e complexos são os problemas enfrentados pela participação dos cidadãos na administração pública, mormente aqueles ligados à percepção e às atitudes dos governantes e demais sujeitos do processo participativo, aos fatores políticos institucionais que interferem no processo decisório governamental, às formas de atrair e manter o interesse dos cidadãos, aos arranjos institucionais, que garantam a eficácia e a continuidade da participação (Silva e D’Arc, 1996).

A participação requer consciência sobre os atos, e, os obstáculos ao acesso à informação e à educação são formas de dominação, vez que impedem a compreensão dos participantes sobre o processo em que estão inseridos.

A participação social e a cidadania referem-se à apropriação pelos indivíduos do direito de construção democrática de seu próprio destino. Sua concretização passa pela organização coletiva dos participantes, possibilitando desde a abertura de espaços de discussão dentro e fora dos limites da comunidade até a definição de prioridades, a elaboração de estratégias de ação e o estabelecimento de canais de diálogo com o poder público. (Tenório e Rozenberg, 1997:103)

A participação, para constituir-se instrumento de acesso à cidadania plena, precisa ser ação coletiva e exercício consciente, voluntário (não imposto) e conquistado (não concedido), e, também, visar à superação das desigualdades econômicas.

(25)

sociais traduzidos por necessidades cotidianas da sociedade e dos cidadãos que dela participam.78

Maria Vitória Benevides, discorrendo a respeito da cidadania ativa, considera cidadão, aquele que, além de ser alguém que exerce direitos, cumpre deveres ou goza de liberdades em relação ao Estado, é também titular, ainda que parcialmente, de uma função ou poder público (Benevides,1994).

Contrariamente a essa cidadania ativa, definida por Benevides (1994:16) como sendo “aquela que institui o cidadão como portador de direitos e deveres, mas essencialmente, criador de direitos para abrir novos espaços de participação política”, a cidadania é tida como incompleta, passiva ou inerte, quando o cidadão é visto apenas como eleitor, contribuinte e cumpridor de leis (Tenório e Rozemberg, 1997).

A cidadania, definida pelos princípios da democracia, constitui-se na criação de espaços sociais de luta (movimentos sociais) e na definição de instituições permanentes para a expressão política (partidos, órgãos públicos), significando necessariamente conquista e consolidação social e política (Vieira, 2005).

Conforme Lizt Vieira (2005), as principais correntes do pensamento político contemporâneo conferem centralidade ao papel do direito e da cidadania na construção de um Estado democrático. E, exemplificando com Foucault e Habermas, ressalta que aquele atribuiu ao direito, como forma de saber-poder, junto

7

Para Marshall, três elementos compõem a cidadania: o civil (direitos necessários à liberdade individual), o político (direito de participar no exercício do poder político) e o social (direito a um mínimo de um bem-estar econômico e segurança e direito de participar da herança social. Estes direitos surgiram em épocas diferentes: os direitos civis no século XVIII, os políticos no século XIX e os sociais no século XX. Segundo Marshall, esta divisão foi mais ditada pela história do que pela lógica. Senão vejamos: se nos velhos tempos os três direitos estavam fundidos num só, com a Modernidade a evolução da cidadania envolveu um processo de fusão e separação, sendo que a fusão foi geográfica e a separação foi funcional. Logo, a fusão de localidades constituiu um território nacional delimitado que passou a se chamar Estado-nação, no qual a cidadania se materializou, enquanto que a separação funcional da cidadania dizia respeito à distribuição dos tipos de direitos que a constituem nas instituições estatais: tribunais especializados que seguem orientações nacionais e o parlamento com o expressão dos poderes políticos do governo nacional. Assim, no que diz respeito às instituições correspondentes, aos direitos civis correspondem os Tribunais de Justiça, aos direitos políticos o parlamento e os poderes executivos e aos sociais o sistema educacional e os serviços sociais (Marshall apud Tenório, 2007:35)

8

(26)

com o político e econômico, o caráter de elemento constitutivo da sociedade (Foucault apud Vieira, 2005:38) e, este, ancorando o direito na moral, e não mais na racionalidade instrumental-cognitiva da ciência, o elemento estruturador da democracia (Habermas apud Vieira, 2005:39).

A cidadania deliberativa habermasiana, portanto, constitui-se em uma nova forma de articulação que questiona a prerrogativa unilateral de ação política do poder administrativo – do Estado e/ou dinheiro – o capital. A perspectiva é que a cidadania deliberativa contribua, por intermédio da esfera pública (espaço público), para que escape das “barreiras de classe”, para que se liberte das “cadeias milenárias” da estratificação e exploração social e para que se desenvolva plenamente “o potencial de um pluralismo cultural” atuante “conforme a sua própria lógica”, potencial que, “sem dúvida alguma, é tão rico em conflitos e gerador de significado e sentido” (Habermas apud Tenório, 2007:62-3)

2.1.2 Espaço Público: locus de democratização da participação cidadã

Liszt Vieira afirma que “a prática da cidadania depende da reativação da esfera pública, em que indivíduos possam agir coletivamente e praticar deliberações comuns sobre os assuntos que afetam a comunidade política”, sendo “essencial para a constituição da identidade política baseada em valores de solidariedade, autonomia e do reconhecimento da diferença” e, ainda, importante para a obtenção da ação política efetiva, desde que cada indivíduo contribua nas decisões que afetam o bem-estar da comunidade (Vieira, 2001:72-3).

Jacobi (2002) assevera que a possibilidade de alterar a institucionalidade pública está associada às demandas que se estruturam na sociedade, e a esfera pública representa a construção da viabilidade do exercício da influência da sociedade nas decisões públicas, além de suscitar uma demanda de publicização do Estado (Jacobi, 2002:16).

(27)

e a representação de conflitos”, adquirindo o caráter democrático toda vez que asseguram que a influência democratizante da sociedade civil torne-se fonte de democratização do poder, requerendo, para tanto, uma cultura política traduzida numa vida associativa livre (Vieira, 2005: 65).

De acordo com o mesmo autor, “a reconstrução do espaço público acontece dentro de uma perspectiva emancipatória, contemplando procedimentos racionais, discursivos, participativos e pluralistas, que permitam aos atores da sociedade civil um consenso comunicativo e uma auto-regulação, fonte de legitimidade das leis” (Vieira, 2001:64).

Segundo o conceito habermasiano, esfera pública é “o espaço da crítica argumentativa e deliberativa e da democratização da autoridade e do poder político, distinguindo-se tanto do Estado quanto do mercado, capaz de preservar uma autonomia própria” (Habermas apud Carneiro, 2006:150-1).

A esfera pública pode ser descrita como uma rede adequada para a comunicação de conteúdos, tomada de posição e opiniões; nela os fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados a ponto de se condensarem em opiniões públicas enfeixadas em temas específicos. O conceito de esfera pública pressupõe igualdade de direitos individuais e discussão, sem violência, de problemas através da autoridade negociada. Portanto a esfera pública é o espaço intersubjetivo, comunicativo, no qual as pessoas tematizam suas inquietações por meio do entendimento mútuo (Habermas apud Tenório, 2004:49).

Os espaços públicos permitem a ocorrência de debates públicos em torno dos interesses coletivos, possibilitando uma ação comum a partir do princípio do discurso. Assim, tais espaços dissociam-se dos interesses concretos dos atores sociais e permitem “a institucionalização das pluralidades nas sociedades civis modernas e a possibilidade de consenso mediante procedimentos comunicativos exercidos na esfera pública, fornecendo os critérios éticos de regulação dos discursos práticos” (Vieira, 2001:64).

(28)

vida) e as instâncias que articulam, institucionalmente, as decisões políticas (parlamento, conselhos)” (Vieira, 2001:87).

A sociedade civil compõe-se de movimentos, organizações e associações, os quais captam os ecos dos problemas sociais que ressoam nas esferas privadas, condensam-nos e os transmitem, a seguir, para a esfera pública política. O núcleo da sociedade civil forma uma espécie de associação que institucionaliza os discursos capazes de solucionar problemas, transformando-os em questões de interesse geral no quadro de esferas públicas. (Habermas apud Tenório, 2004:49)

2.1.3 Sociedade civil e Estado: instrumentos de interação e participação

Dentre as diversas acepções encontradas para interação, estão a que a consideram a uma “atividade ou trabalho compartilhado, em que existem trocas e influências recíprocas” e, ainda, que a define como uma “comunicação entre as pessoas que convivem” (Houaiss, 2002).

De acordo com Tenório, “as políticas públicas projetadas sob a interação sociedade-Estado, em territórios onde os atores estão mais próximos, têm maior possibilidade

de adequação às necessidades identificadas” (Tenório, 2007:106).

Tenório (2007) explica que várias são as possibilidades metodológicas para que o processo de interação sociedade civil, mercado e poder público possa vir ao encontro das necessidades de um lugar. Mas, esclarece queexiste um componente que deve ser sempre considerado como fundamental para que o desenvolvimento com cidadania seja bem-sucedido. E esse componente é a participação.

Segundo Ferreira (2004:1498), participação significa “fazer saber, informar, anunciar, comunicar, ter ou tomar parte, associar-se pelo pensamento ou pelo sentimento, ter traços em comum, ponto(s) de contato, analogia(s)”.

(29)

Bordenave (1994) afirma que, desde a Revolução Industrial e a massificação dos meios de comunicação, acentuou-se o individualismo das pessoas, concentrando-se as preocupações em questões particulares. Entretanto, o mesmo autor afirma que tal individualismo está deixando de ser característica da sociedade contemporânea. Para ele, os movimentos populares refletem o desejo de efetivação da democracia, não só pelas urnas, mas, principalmente, pelo relacionamento entre as pessoas, pelo diálogo, pela ação conjunta e verdadeira participação. E, exemplifica dizendo que todo ser humano participa de algum tipo de movimento, seja em sua família, em seu bairro, em seu clube, em suas práticas religiosas, em sua comunidade, em seu trabalho, entre outros.

Fundamentando-se em Bordenave, Tenório explica que

existem dois processos de participação: o micro e o macro. A instância de participação micro envolve grupos primários tais como a família, os amigos e os vizinhos, pois este tipo de participação se dá a partir de dois ou mais indivíduos que compartilham objetivos e/ou interesses comuns. É extremamente importante esse processo, pois seu aprendizado pode ser considerado um pré-requisito para a participação em nível macro, visto que a participação nesse nível ocorre a partir de grupos secundários: empresas, clubes, associações etc, e grupos terciários, em movimentos de classe, partidos políticos etc (Tenório, 2007:119).

Teixeira elucida que a participação “supõe uma relação em que atores, usando recursos disponíveis nos espaços públicos, fazem valer seus interesses, aspirações e valores, construindo suas identidades, afirmando-se como sujeitos de direitos e obrigações” (Teixeira, 2000:37).

Desse modo, participar é privilegiar ações concertadas entre

sociedade civil, mercado e Estado, com respeito àquilo que a

comunidade acredita como tendo importância no seu lugar. A participação tem a ver com o processo, com o “como”, os resultados são conseqüências da ação concertada entre os agentes sociais, econômicos e estatais (Tenório, 2007:108).

(30)

facilitar, tornar mais direto e mais cotidiano o contato entre os cidadãos e as diversas instituições do Estado, e possibilitar que estas levem mais em conta os interesses e opiniões daqueles antes de tomar decisões ou de executá-las (Borja apud Jacobi, 2002:27).

Como método de governo, a participação

pressupõe satisfazer previamente ou simultaneamente um conjunto de requisitos vinculados às regras do jogo democrático e à crescente consolidação de práticas descentralizadoras da organização político-adiministrativa, o que se concretiza mediante uma completa revisão da repartição de competências, funções e recursos. (Borja apud Jacobi, 2002:28)

No Brasil, a preocupação com mecanismos capazes de assegurar a participação da sociedade civil com o poder público, na formulação e efetivação de políticas públicas, foi desencadeada pelo processo de democratização do país.

Discorrendo a respeito da descentralização, Jacobi ensina que

Teoricamente, a descentralização tem como objetivos gerais obter mais democracia, mais eficácia e mais justiça social. Mais especificamente, a descentralização deve visar ao aprimoramento

das relações intergovernamentais, capacitar os governos

subnacionais para s funções que lhes são atribuídas e possibilitar o controle social do poder público pela população organizada. (Jacobi, 2002:36)

Assim, pode-se dizer que “a participação possui uma estreita vinculação com o processo de descentralização910, podendo contribuir não só para a democratização do poder público, mas também para o fortalecimento de uma cidadania ativa” (Tenório, 2007:119).

De acordo com Spink, a descentralização, nos países em desenvolvimento, representa um processo político-técnico de reconfiguração do espaço de ação

9

Segundo Castro, a descentralização tem três aspectos importantes: 1) necessidade de se democratizar as relações entre o

Estado e a sociedade civil; 2) reestruturação do Estado no sentido das relações internas nos vários níveis das estruturas de

poder; 3) fiscalização e acompanhamento das ações do poder público no sentido de garantir a participação societal na esfera

pública por intermédio de mecanismos diversos que precisam ser institucionalizados para assegurar a continuidade das ações

instituídas. (Castro apud Tenório, 2007:119)

10

(31)

popular e de redefinição do terreno intersubjetivo da relação Estado-cidadão dentro de uma conjuntura conflituosa de interesses e alianças das mais diversas. (Spink apud Jacobi, 2002:37). Jacobi, oportunamente, registra que a transferência de

funções que hoje são exercidas pelo poder público deve enquadrar-se numa dinâmica de cooperação com o setor privado, instituições da sociedade civil e instâncias públicas consorciadas nos níveis municipal e estadual.

Na década de 1980 a participação cidadã se torna instrumento para um potencial aprofundamento da democracia. Com supressão dos regimes autoritários que prevaleciam na região [América Latina], tem início um processo de descentralização que impulsiona mudanças na dinâmica de participação, notadamente em nível local, evidenciando a necessidade de arranjos institucionais que estimulem, desde a esfera estatal, a criação de canais de comunicação com a sociedade e permitindo que de alguma forma se amplie a esfera de engajamento dos cidadãos (Jacobi, 2002:11).

Na década de 1990, na América Latina, a participação vem sendo amparada e institucionalizada em suas diversas dimensões, transformando-se no referencial, não só para ampliar as possibilidades de acesso dos setores populares segundo uma perspectiva de desenvolvimento da sociedade civil e de fortalecimento dos mecanismos democráticos, mas também para garantir a execução eficiente de programas de compensação social no contexto das políticas de ajuste estrutural e de liberalização da economia e de privatização do patrimônio do Estado (Jacobi, 2002:11).

Os Estados integrantes da América Latina têm se caracterizado pela dispersão na tomada de decisão, sendo crescente a representação popular e política, a partir de uma nova estrutura de representação denominada redes associativas11(Vieira, 2001).

Tenório (2007), trazendo a baila os ensinamentos de Castells e Costa, conceitua as redes como sendo

11

(32)

um conjunto de nós interconectados, uma estrutura aberta capaz de se expandir de forma ilimitada, integrando novos nós desde que consigam comunicar-se dentro da rede, ou seja, desde que compartilhem os mesmos códigos de comunicação. Assim sendo, uma estrutura social com base em redes é um sistema aberto, altamente dinâmico, suscetível de inovação e sem ameaças ao seu equilíbrio (Castells apud Tenório, 2007:132). Trata-se de iniciativas espontâneas (não induzidas pelo poder público) nas quais, a partir de uma convivência, há o ordenamento de ações em prol de um mesmo objetivo. Seus membros atuam de forma ativa e dinâmica, pois apesar de serem uma estrutura especializada são, também, flexíveis, pois vão se modificando à medida que for necessário (Costa apud Tenório, 2007:132).

Como ressalta Tenório (2004:65), “atualmente, os vocábulos aliança e parceria, assim, como rede, têm sido utilizados para significar processos de interação no quais interesses devem ser compartilhados em prol de objetivos comuns”.

As parcerias “geralmente ocorrem a partir da cooperação entre movimentos ou ONGs, capital e o poder público. As parcerias têm como meta repartir o poder de intervir e de decidir entre as instituições parceiras. Sua realização depende, assim, da disposição que os governos e parceiros têm para dialogar” (Tenório, 2007:131).

Segundo esse mesmo autor, os processos de interação Estado-sociedade civil deve acontecer na esfera pública, onde democracia e solidariedade, portanto, cidadania são as substâncias necessárias para implementar relações sociais compartilhadas (Tenório, 2004:82).

Os estudos demonstram como as alianças, que podem nascer das iniciativas estatais ou civis, vêm-se constituindo em um importante vetor de mudança e de desenvolvimento social. Eles demonstram que a afirmação de uma capacidade coletiva de ação é um complemento essencial a uma política econômica justa e distributiva. Também demonstram que alianças nem sempre percorrem caminhos tranqüilos e que às vezes é necessário enfrentar e negociar bloqueios e conflitos. (Camarotti e Spink apud Tenório, 2004:82)

(33)

compartilhados, não forem objeto de estratégia nem do poder público nem da sociedade, mas um exercício pleno de cidadania deliberativa”. (Tenório, 2004:83)

O desafio maior é romper com a lógica clientelista que prevalece na relação Estado/sociedade. Para tanto cabe os Estado criar espaços democráticos e plurais de articulação e participação – onde as diferenças e os conflitos se tornem visíveis enquanto base constitutiva da legitimidade dos diversos interesses em questão – dando acesso ao processo decisório e garantindo uma interação entre esses grupos e o poder público, embora isso possa colidir com a dinâmica que frequentemente preside a gestão dos serviços e sua pretensa racionalidade. (Jacobi, 2002:33)

Quando se trata da articulação entre a sociedade civil e o Estado, o espírito deve estar subordinado à busca da solidariedade e da justiça social. Alianças e parcerias, nesta relação devem ocorrer sob um espaço público e não devem ser projetadas como estratégias de ganho de mercado, como espaços privados, mas como processos dialógicos nos quais a cidadania seja o elemento de regulação dessa relação. Para que esta regulação ocorra é necessário que a pessoa humana tenha conhecimento do que está ocorrendo sob o mundo globalizado12 (Tenório, 2004:88). Novos movimentos sociais, por sua vez, têm se caracterizado pela criação de redes de comunicação alternativas, com a finalidade de instigar a conscientização e o desenvolvimento do próprio Estado (Vieira, 2001); sendo certo que “o conceito de cidadania deliberativa faz jus à multiplicidade das formas de comunicação, dos argumentos e das institucionalizações do direito mediante processos”. (Tenório, 2007:58)

Discorrendo a respeito do futuro da política informacional, Castells (2006) aponta três tendências13 – a recriação do Estado local, o aprimoramento das formas de participação política e da comunicação horizontal entre os cidadãos por meio da

12

(34)

comunicação eletrônica e o desenvolvimento e a mobilização política, via eletrônica ou por outros meios – integrantes do processo de reconstrução da democracia na sociedade em rede14.

Em várias sociedades em todo o mundo, a democracia local [...] parece estar florescendo, ao menos em termos relativos à democracia política nacional. Isso ocorre principalmente quando governos regionais e locais passam a atuar em conjunto, e estendem seu raio de ação buscando a descentralização nas comunidades e a participação dos cidadãos. No momento em que os meios eletrônicos (comunicação mediada por computador ou estações locais de rádio e televisão) também são empregados no intuito de aumentar a participação e o número de consultas feitas pelos cidadãos [...] novas tecnologias contribuem para maior participação no governo local.

[...]

a oportunidade oferecida pela comunicação eletrônica de aprimorar formas de participação política e comunicação horizontal entre os cidadãos. Com efeito, o acesso on-line a informações e a comunicação mediada por computador facilitam a difusão e a recuperação de informações, proporcionando interação e realização de debates em um fórum eletrônico independente, capaz de escapar do controle da mídia.

[...]

O desenvolvimento da política simbólica bem como da mobilização política em torno de causas “não-políticas”, via eletrônica ou por outros meios, é a terceira tendência que poderia integrar o processo de reconstrução da democracia na sociedade em rede. [...] Via de regra, essas mobilizações estão no meio-termo entre movimentos sociais e ações políticas, pois fazem seu apelo diretamente aos cidadãos, pedindo às pessoas que exerçam pressão sobre instituições do governo ou empresas privadas que possam ter um papel importante no tratamento da questão defendida pela mobilização. Em outros momentos, apelam diretamente para solidariedade das pessoas. Em última análise, o objetivo das mobilizações é atuar no processo político, isto é influenciar a gestão da sociedade pelos representantes dessa sociedade. [...] Tais formas de mobilização política, que podem ser defendidas como sendo

14 Sérias críticas, no entanto, podem ser e efetivamente têm sido endereçadas às perspectivas de uma democracia eletrônica.

(35)

causas voltadas a temas específicos e política não partidária, parecem estar ganhando legitimidade em todas as sociedades, e condicionando as regras e os resultados da concorrência política formal. Recuperam a legitimidade do interesse pelas questões públicas nas mentes e nas vidas das pessoas. Atingem esse objetivo ao introduzir novos processos e novas questões políticas, agravando a crise da democracia liberal clássica e ao mesmo tempo estimulando o surgimento do que ainda está para ser revelado: a democracia informacional. (Castells, 2006: 409-10)

No Brasil, o movimento em curso na esfera local pode ser entendido como parte de um processo de reconstrução da esfera pública, orientado para a democratização da gestão e das políticas públicas no país, o qual tem na descentralização um de seus componentes centrais (Farah, 2006:188); constituindo-se como um instrumento adequado para o uso e a redistribuição mais eficientes dos escassos orçamentos públicos e como possibilidade de reversão das tendências globalizantes dos projetos de planejamento (Silva e D’Arc, 1996:51).

Com a ampliação da institucionalidade política, por meio da reformulação da organização do Estado e da elaboração de novos arranjos institucionais15 que estimulem a prática democrática, teríamos, de acordo com Paula, uma “administração pública co-gestionária, que funcionaria pelas alternativas criadas pela engenharia institucional para a participação popular na definição de programas, projetos e gestão de serviços públicos” (Paula apud Tenório, 2007:109).

Segundo Jacobi, um dos principais benefícios da participação das comunidades locais no planejamento, monitoramento e avaliação das políticas sociais é a possibilidade de modificar gradualmente as estruturas de poder local por meio do denominado controle social do espaço público (Jacobi, 2002).

O fortalecimento da cidadania também pode ser observado na relação governo municipal-governo federal ou governo municipal-governo estadual, pois

15

(36)

quando a comunidade participa junto ao governo, o município adquire uma identidade mais forte, é em si mesmo um ator coletivo que está em melhores condições de negociar frente a outras instâncias do governo federal ou estadual, para obter recursos que lhe permitam atender às demandas de sua comunidade (Ziccardi

apud Tenório, 2007:120).

É precisamente no nível local, no âmbito cotidiano, onde se exercem os direitos de cidadania, onde a gestão de bens e serviços urbanos [e rurais] implica uma relação direta entre [o governo] local e os usuários, onde se põe e prova a democracia territorial, onde a participação social pode incidir no planejamento e implementação das políticas públicas (Zicardi apud Tenório, 2007:109).

Assim, a participação na gestão municipal deve ser entendida como uma referência de diálogo e cooperação que auxilia o desenvolvimento de iniciativas inovadoras e de fortalecimento da cidadania, podendo-se transformar num meio e num objeto democrático, conferindo direitos de intervenção a todos os cidadãos e perseguindo fins igualitários para a população da cidade (Jacobi, 2002:27).

A participação caracteriza-se como práticas exercidas por movimentos organizados, entidades civis ou simplesmente cidadãos mobilizados em fóruns e espaços públicos múltiplos e diferenciados, onde direitos e demandas coletivas são discutidos a fim de serem incluídos na agenda pública (Jacobi, 2002:33).

Vieira (2001) ensina que

os movimentos sociais constituem os atores que reagem à reificação e burocratização, propondo a defesa das formas de solidariedade ameaçadas pela racionalização sistêmica. Eles disputam com o Estado e com o mercado a preservação de um espaço autônomo e democrático de organização, reprodução da cultura e formação de identidade e solidariedade (Vieira 2001:63).

(37)

inviabilidades e limites se tornaram explícitos nas tentativas governamentais de desenvolver experiências participativas, como por exemplo as dificuldades de identificação do movimento popular, a existência de um setor público administrativamente improdutivo, burocratizado e com forte cultura centralizadora e setorializada, a falta de acesso dos cidadãos à informação e a não-explicitação dos canais de participação (Silva e D’Arc, 1996:49).

No entanto, Jacobi, com base em Avritzer e Azevedo, afirma que “os movimentos sociais, apesar de sua fragmentação, dispersão e fragilidade, incluíram na agenda da democratização a necessidade de compatibilização entre modernização econômico-adminstrativa e cidadania” (Jacobi, 2002:33).

Ademais, ainda que “oscilem entre a cooptação e a desconfiança em relação às instituições, esses movimentos evoluíram e definiram uma cultura política que merece ser reconhecida” (Silva e d’Arc, 1996:66-7).

Para Jacobi, “os movimentos tornam manifesta uma identidade que se concretiza a partir da construção coletiva de uma noção de direitos que, relacionada diretamente com a ampliação do espaço de cidadania, possibilita o reconhecimento público das carências” (Jacobi, 2002:18).

De acordo com Castells (2006), as mais poderosas tendências de legitimação da democracia durante os anos 90 estão acontecendo, no mundo todo, em nível local. Assim, as autoridades locais assumem cada vez mais o dever de regular a distribuição de bens e serviços de consumo coletivo, tendo que suportar as conseqüências da insuficiência de suas ações e dos recursos a ela destinados.

Entretanto,

(38)

Os canais necessários à institucionalização da participação da cidadania nas decisões governamentais já existem em diversos países e tem permitido que essa participação aconteça na elaboração de políticas públicas (Vieira, 2001). “Com a descentralização proporcionada pela Constituição de 1988, abriram-se espaços para uma participação popular16 efetiva” (Tenório, 2007:120), sendo imperioso frisar a multiplicidade de dinâmicas participativas nas estruturas dos conselhos e colegiados criados, que promovem uma crescente interação entre órgãos públicos e sociedade civil (Jacobi, 2002).

A concepção conciliar ganha terreno no Brasil com a legitimação do papel inovador dos diversos tipos de conselhos enquanto facilitadores da presença da sociedade civil na gestão pública. A institucionalização da participação ampliada ou neocorporativa se dá mediante a inclusão de organizações comunitárias e movimentos populares nos conselhos populares e fóruns, entre outros (Jacobi, 2002:30).

Com isso, o indivíduo passa a ser considerado legítimo representante da sociedade, deixando de ser visto apenas como trabalhador, ou seja, como peça integrante da engrenagem empresarial, para ser respeitado enquanto detentor de conhecimentos capazes de contribuir para a melhoria da sociedade em que vive. E sua participação vem ocorrendo por meio de conselhos e comissões municipais, em que a comunidade, via representante, tem assento, voz e voto.

De acordo com Carvalho,

no Brasil, em seus mais de 5 mil municípios, já em 1998, dez anos, portanto, da promulgação da Constituição Federal, havia mais conselheiros que vereadores, o que dá a dimensão desta forma de participação popular, que é muito mais acessível aos participantes dos movimentos sociais do que a tradicional representação parlamentar. Os conselhos são instâncias de formação de políticas que gozam de um alto conceito de respeitabilidade enquanto espaços transparentes e comprometidos com o interesse público, espaços que tornam a política mais pública, pelo menos aqueles em que há participação de grupos socais organizados e democráticos (Carvalho apud Tenório, 2007:129).

16

(39)

Conforme ensina Celso Daniel, os conselhos ou comissões populares podem ser concebidos enquanto órgãos da sociedade, portanto independentes do Estado, organizados com a perspectiva de buscar a ocupação de espaços de participação de uma gestão local (Daniel apud Tenório, 2007:120).

Os conselhos, dessa forma, são espaços públicos, de caráter híbrido (Estado e sociedade), que permitem a representação de interesses coletivos na cena política e na definição da agenda pública, diferenciando-se de movimentos e de manifestações escritas da sociedade civil, eis que possuem estrutura legalmente definida e institucionalizada e escopo de atuação conjunta com o aparato estatal na elaboração e gestão de políticas sociais (Carneiro, 2006:151).

Os conselhos são canais de participação política, de controle público

sobre a ação governamental, de deliberação legalmente

institucionalizada e de publicização das ações do governo. Dessa forma, constituem espaços de argumentação sobre (e de redefinição de) valores, normas e procedimentos, de formação de consensos, de transformação de preferências e de construção de identidades sociais. Têm poder de agenda e podem interferir, de forma significativa, nas ações e metas dos governos e em seus sistemas administrativos. Os conselhos, como espaços de formação de vontades e de opinião, são também mecanismos de ação, que inserem na agenda governamental as demandas e os temas de interesse públicos, para que sejam absorvidos, articulados politicamente e implementados sob a forma de políticas públicas. Portanto, mais do que um canal comunicacional para ressonância das demandas sociais, os conselhos possuem dimensão jurídica e têm poder de tornar efetivos as questões, os valores e os dilemas vivenciados no espaço da sociedade civil. (Carneiro, 2006:151)

2.2 Política Pública

Imagem

Tabela 1 - Quantidade e Origem dos entrevistados

Referências

Documentos relacionados

No entanto, ao avaliar as percentagens de germinação desse tratamento, verifica-se que houve um bom índice (52%) aos 90 dias após a semeadura. Portanto, pode ser dispensada a

b) Execução dos serviços em período a ser combinado com equipe técnica. c) Orientação para alocação do equipamento no local de instalação. d) Serviço de ligação das

Buscando contribuir para a composição do estado da arte da pesquisa contábil no Brasil, a investigação lançou mão de técnicas de análise bibliométrica para traçar o perfil

Tautologia – Quando uma proposição sempre é verdadeira, o que acarreta que toda sua coluna na tabela- verdade possui somente valores Verdadeiros. Contradição – Oposto à

O candidato deverá apresentar impreterivelmente até o dia 31 de maio um currículo vitae atualizado e devidamente documentado, além de uma carta- justificativa (ver anexo

Nesta pesquisa, são analisados diferentes objetos de aprendizagem utilizados em cursos a distância e aulas virtuais complementares às aulas presenciais, a fim de

Avaliou-se o comportamento do trigo em sistema de plantio direto em sucessão com soja ou milho e trigo, sobre a eficiência de aproveitamento de quatro fontes