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O Relicário de Celeida Tostes

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Academic year: 2017

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FUN DAÇÃO GETÚLI O VARGAS

CEN TRO DE PESQUI SA E DOCUMEN TAÇÃO DE HI STÓRI A CON TEM PORÂN EA - CPDOC

PROGRAMA DE PÓS- GRADUAÇÃO EM HI STÓRI A, POLÍ TI CA E BEN S CULTURAI S - PPHPBC

MESTRADO EM BEN S CULTURAI S E PROJETOS SOCI AI S

O Relicário de Celeida Tost es

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Program a de Pós- Graduação em História, Política e Bens Culturais ( PPHPBC) do Centro de Pesquisa e Docum ent ação de Hist ória Contem porânea do Brasil – CPDOC – para obt enção do grau de Mest re em Bens Cult urais e Proj et os Sociais.

Raquel Mart ins Silva

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FUN DAÇÃO GETÚLI O VARGAS

CEN TRO DE PESQUI SA E DOCUMEN TAÇÃO DE HI STÓRI A CON TEM PORÂN EA - CPDOC

PROGRAMA DE PÓS- GRADUAÇÃO EM HI STÓRI A, POLÍ TI CA E BEN S CULTURAI S - PPHPBC

MESTRADO EM BEN S CULTURAI S E PROJETOS SOCI AI S

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

APRESENTADO POR

RAQUEL MARTI NS SI LVA

O Relicário de Celeida Tost es

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O Relicário de Celeida Tost es

Aut ora: Raquel Mart ins Silva

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO APRESENTADO POR RAQUEL MARTI NS SI LVA

E

APROVADA EM 30 DE AGOSTO DE 2006 PELA BANCA EXAMI NADORA

Prof.ª Dr.ª ______________________________________________ Dulce Chaves Pandolfi ( Orientadora)

Prof.ª Dr.ª ______________________________________________ Verena Albert i

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RESUM O

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ABSTRACT

The purpose of this thesis is to provide an out look on plast ic art ist Celeida Tost es ( 1929- 1995) and her act ions at t he com m unit y of Chapéu Mangueira, st art ed in t he early 1980’s. The research was developed from interviews recorded on videographic m eans and based on t he m ethodology of oral history. Besides t he writ t en paper, a video-docum ent ary was also produced. The int ention of this research was to put t oget her, from t he m em ories of people who were fam iliar wit h t he art ist , a pat chwork, sim ilar t o t hose she encouraged t he wom en from t he Chapéu Mangueira hillside shant yt own t o rem em ber and to m ake. A parallel int ent ion, t oo, was t o bring up m em ories of what t hese people did t oget her wit h t he art ist in t he proj ect “ Form at ion of Ut ilit arian Ceram ic Cent ers in t he Com m unit ies of Rio de Janeiro’s Urban Outskirts—so- called

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DEDI CATÓRI A

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AGRADECI M EN TOS

O t rabalho de pesquisa não pode, por princípio, ser um trabalho solitário, pois o pesquisador precisa, const antem ent e, est ar discut indo, revendo, descobrindo novas nuances, novos pont os de vista, sem pre se renovando. Port ant o, é preciso agradecer em prim eiro lugar a t odos aqueles que ouviram e, de algum a m aneira, contribuíram para a elaboração dest e t rabalho.

À m inha m est ra, Prof.ª Dulce Pandolfi, escolha acert ada, feit a com o coração.

Aos professores do m est rado do CPDOC, em especial à Prof.ª Verena Alberti, que m e apresent ou o “ fascínio do vivido” ; à Prof.ª Marly Mot t a, que m e “ puxou as orelhas” na hora cert a; à Prof.ª “ gent e boa” Mariet a Moraes Ferreira, que sinalizou o “ lugar da m em ória” ; e ao Prof. Lauro Cavalcant i, que nos cont agiou com seu ent usiasm o.

À antropóloga I zabel Ferreira que, sem pre present e, m e incent ivou de t odas as m aneiras, auxiliou nas ent revist as, leu, releu e brigou m uit o.

Ao Prof. Diógenes Pinheiro, responsável por isso t udo acontecer.

A t oda a m inha fam ília, em especial ao m eu dindo, Edson Meirelles (in m em oriam) , m inha dinda, Therezinha; m eu tio Célio (in m em oriam) , m inha prim a Luisa e a m inha irm ã Duda.

Aos m eus colegas de m est rado, especialm ent e Anna Karina, Elizet e, Georgy, I vone, Magda, Maria Alice, Osvaldo, Silvana e Sílvia.

Ao pessoal do Chapéu Mangueira pelo apoio, carinho, solidariedade e em oção.

À fam ília e aos am igos de Celeida Tostes, que se dispuseram a ser entrevistados e colaboraram para que esta pesquisa se concret izasse: Terezinha Eboli Benj am in, Carm em Regina Vargas, Luiz Pizarro, Maria August a Nascim ent o Silva ( D. August inha) , Maria Regina Rodrigues, Roselene Menezes, Coracy Ferreira da Silva, Luiz Áquila, Mônica Barki, João Guerra, Marcus de Lont ra Cost a, Nelly Gut m acher, Jorge Em anuel, Sabará, Maria Mart ins, Suely Lim a, Lélia Coelho Frot a, Suzane Worcm an e Anna Carolina.

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St ela Cost a e a t oda equipe “ sim pat ia” do Cent ro Nacional de Folclore e Cultura Popular.

E last , but not least , aos m eus am igos de fé, que ao longo da m inha t raj et ória foram m eus professores de vida: Rosana Rouvenat , Acácia Gom es, Hildegard Angel, I vone Kassú, Elda Priam i, Ruddy Pinho, Susana Vieira, Maria Luiza Carvalho (in m em oriam) , Sandra Mager, Marcus Lontra, Márcia Lontra, Claudia Aj uz, Rej ane Marques, Miriam Chaves, Eloá Chaves, Rosi Marques, Noêm ia Marques Machado, Claudia Ferreira, Ângela Borba (in m em oriam) , Madalena Guilhon, Am ália Fisher, Dida, Mariza Conde, Denise Mat t ar e Mest re Cam isa.

E ainda a Bet h Sim ões, “ Macarrão” , Anna I nnecco, Ricardo Silveira, Rit a Godoy, Magda Nunes, Reynaldo Roels, Viviane Mat esco, Nelson August o, Ulisses Pinheiro, Verônica de Sá Vianna, Nalva Souza, Jailson de Sousa, Elcio Guelero e I sabel da UFRJ.

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SUM ÁRI O

Pág. I N TRODUÇÃO

1. A descobert a do obj et o 1

2. Sobre o obj etivo do trabalho 9

3. A organização da dissert ação 12

4. O relicário: guardião de resíduos de fé, sent im ento e m em ória 14

5. Sobre a m etodologia e as fontes 15

Capít ulo I - GÊN ESE DE UMA ARTI STA

1. Mem órias da infância 25

2. Um a sólida form ação 27

3. Um a art ist a apaixonada 29

4. Parque Lage, celeiro das art es 33

5. Passagem , um a experiência lim it e 38

6. Depois de “ Passagem ” 41

7. Celeida de Barro 42

8. A experiência de Porto Rico 57

9. Tot ens 61

10. Pequena conclusão 70

Capít ulo I I - "BREVE N ESTE LOCAL, FÁBRI CA DE CHAPÉUS MAN GUEI RA"

1. O encont ro com o barro da favela 74

2. A favela do Morro do Chapéu Mangueira 78

3. Moldando a ident idade cultural com o barro da favela ou

“ Form ação de Cent ros de Cerâm ica Ut ilit ária nas Com unidades

de Periferia Urbana do Rio de Janeiro – Cham adas Favelas” 86

4. O Grupo da Arte 96

5. “ Chapéu Mangueira, sua gent e, sua vida, sua art e” 99

6. As artistas 100

7. O Galpão de Art e 103

CON SI DERAÇÕES FI N AI S 113

BI BLI OGRAFI A 120

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I N TRODUÇÃO

1 . A descobert a do obj et o

No início de 2003 fui cont rat ada por Marcus de Lont ra Cost a para fazer a assessoria de im prensa da exposição “ Celeida Tostes – Arte do Fogo, do Sal e da Paixão” , apresent ada no Cent ro Cult ural Banco do Brasil, do Rio de Janeiro.1 Marcus Lontra é um renom ado curador, que j á foi diretor da Revist a Módulo,2 da Escola de Art es Visuais do Parque Lage – ( EAV- Parque Lage) ,3 do Museu de Art e Moderna de Brasília, do Museu de Art e Moderna do Rio de Janeiro ( MAM- RJ) e do Museu de Art e Moderna Aluísio Magalhães ( MAMAM) , em Recife. Desde 1980 venho prest ando serviços de assessoria para seus proj etos e para as inst it uições que dirige. São 28 anos de parceria prat icam ent e inint errupt a.

Marcus Lont ra foi am igo e grande adm irador da artista Celeida Tostes, t rabalharam j unt os no Parque Lage, onde ela era t it ular da Oficina das Artes do Fogo e Transform ação de Materiais,4 e escreveu alguns t ext os crít icos sobre sua obra. Naquela época t rabalhei em diversas exposições no Parque Lage, incluindo a badalada “ Com o vai você Geração 80?,”5

1 A exposição esteve em cartaz de 29 de abril a 29 de j unho de 2003.

2 Revista de arte e arquitetura, editada por Oscar Niem eyer, que t eve dois períodos de circulação: nos anos 1950 e na década de 1980 ( 1980- 1988) .

3 A Escola de Artes Visuais do Parque Lage é um a conceituada instituição de ensino da Secretaria de Cultura do Estado do Rio de Janeiro. Fundada em 1950, originalm ente cham ada I nstituto de Belas Artes do Rio de Janeiro ( I BA) , na Urca, m udou- se para o Parque Lage em 1966. Em 1975 passou a cham ar- se Escola de Artes Visuais. Desde a sua fundação a EAV é um dos principais pólos na form ação das artes visuais brasileiras. Estudaram lá os principais nom es da produção artística contem porânea.

4 “ As Art es do Fogo [ são] aquelas ( ...) result ant es de t ransform ações de m at érias inorgânicas subm etidas à ação do calor, com o a cerâm ica, o m etal e o vidro.” ( Tostes, 1974, p.7) . 5 “ Com o vai você, Geração 80?" foi um a exposição coletiva realizada na Escola de Artes

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em 1984, e não m e recordo de t er conhecido Celeida Tost es. Minhas lem branças se lim it am a um a edição da Revist a Módulo, que t inha um a im ensa roda, feit a por ela, publicada na capa.

Foi a part ir da necessidade de conhecer m elhor seu t rabalho e sua obra que em preendi um a pequena pesquisa. É preciso dizer que, ao com eçar um trabalho de assessoria de im prensa, t em - se por praxe realizar um a pesquisa prévia sobre o assunt o a prom over, suas curiosidades e seus diferenciais, visando m axim izar o alcance da divulgação. Foi assim que descobri que Celeida Tost es era bast ant e conhecida no Rio de Janeiro, t inha fam a de t ransgressora, era adorada por seus am igos e colegas de profissão, além de ter realizado um t rabalho inovador em t odos os lugares por onde passou. Cont udo, eu necessitava de m ais inform ações, pois, apesar de sua reconhecida im port ância no m eio das art es visuais, a art ist a não havia se t ornado um nom e consagrado da art e brasileira, e o fat o de j á t er m orrido dificult ava m uit o m eu t rabalho de divulgação. Por isso eu precisava de um diferencial que a t ornasse int eressant e e im port ante para o grande público.

Não lem bro m ais quem m e falou que Celeida havia realizado um t rabalho com a com unidade do Morro Chapéu Mangueira. Pergunt ei às pessoas da produção sobre o assunto e m e inform aram que tinham conhecim ent o de que ela, de fat o, desenvolveu um proj et o no Morro, m as não sabiam bem do que se t rat ava. Naquele m om ento não parecia haver qualquer conexão entre a exposição que ora realizávam os com o t rabalho que ela desenvolveu no Chapéu Mangueira. Minha form ação de j ornalist a, no ent ant o, m e dizia que deveria t er sido algo im port ante.

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proj eto. Por coincidência, em um a conversa com o professor Diógenes Pinheiro da Universidade do Rio de Janeiro ( UniRio) e à época pesquisador do Observatório de Favelas,6 com entei o assunto. Ele m e

part icipou que lecionava no “ Pré- Vest ibular Com unit ário” no Morro Chapéu Mangueira. Conhecia D. August inha, que t rabalhou com Celeida Tost es, e m e colocaria em cont at o com ela. Meu prim eiro cont at o t elefônico foi revelador: um a sim pát ica senhora m e cont ou que era o braço direit o da art ist a no Proj et o “ Form ação de Centros de Cerâm ica Ut ilit ária nas Com unidades de Periferia Urbana do Rio de Janeiro – Cham adas Favelas” , idealizado e execut ado pela art ista na com unidade.

Foi dessa m aneira que t om ei conhecim ent o do t rabalho que a art ist a realizou no Morro Chapéu Mangueira e coloquei D. August inha em cont at o com a j ornalist a Daniela Nam e, do j ornal O Globo. Meu t rabalho foi am plam ent e recom pensado com um a m at éria de capa do Segundo Caderno,7 que não som ent e apresent ava a exposição, com o t razia em um boxe o relat o do t rabalho feit o pela art ist a e pelas pessoas da com unidade. Minha m issão de assessora est ava cum prida.

Dias após a publicação da m at éria, acont eceria o vernissage da exposição “ Celeida Tost es – Art e do Fogo, do Sal e da Paixão” . Foi nesse m om ent o que m e dei cont a de que nem D. August inha nem ninguém do Morro Chapéu Mangueira seria convidado. Sent i- m e decididam ent e desconfort ável com a sit uação, um a vez que eles haviam m e aj udado a lograr êxit o no m eu t rabalho. Ent ão, pedi a um conhecido que t rabalhava no Clube de Regat as Flam engo, e que m ora no Chapéu

6 O Observatório de Favelas do Rio de Janeiro é um a rede sociopedagógica com posta por professores universitários, estudantes e organizações com unitárias. As favelas são o cam po de estudos e ações da entidade, e seu público são os j ovens universitários e pré-universitários nelas residentes. I n: http: / / observat orio.ultim osegundo.ig.com .br

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Mangueira, que ent regasse os convit es a t odas as pessoas da com unidade.

O que se seguiu foi um dos m om ent os m ais em ocionant es que eu, a j ornalist a Daniela Nam e e m ais algum as poucas pessoas t ivem os o privilégio de presenciar. Acom panhei o grupo do Chapéu Mangueira na visit a às três salas do 2º andar ocupadas pela exposição. Por m eio das palavras delas parecia que a artista estava presente. Cada obra tinha um a hist ória, cada cant o um a em oção. A hom enagem que o próprio evento rendia à escult ora ficou pequena pert o da em oção dem onst rada por eles, em est ar present e e ( re) ver aqueles trabalhos nas luxuosas salas do Centro Cultural Banco do Brasil. Algo parecido com a em oção e o orgulho de pais e m ães na form at ura ou no casam ent o dos filhos.

Ao contrário da m aioria dos convidados das inaugurações das exposições, que passam rapidam ente pelas obras e ficam horas entre quit ut es e espum ant es, os convidados do Chapéu Mangueira se dem oraram olhando obra por obra e, depois da

“ Celeida Tostes – arte do fogo, do sal e da paixão. CCBB- RJ, 2003

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visit a, ao serem convidados a perm anecer no coquet el, recusaram e foram em bora com expressões inacredit avelm ent e felizes. Ant es de ir, D. August inha m e disse: “ Você não vai abandonar a gent e, não né? Precisam os tocar as idéias deixadas pela Celeida...” Eu, que j á havia experim ent ado a culpa e est ava encantada com a reação que eles t iveram diant e da exposição, m e sent i, naquele m om ent o, irrem ediavelm ent e com prom et ida e prom et i a ela que não iria abandoná- los.

Foi nest e m esm o ano de 2003, 25 anos depois do m eu prim eiro trabalho na área de com unicação e cult ura, que alguns am igos m e falaram sobre o Mestrado Profissionalizante em Bens Culturais e Proj etos Sociais. O curso est ava abrindo a prim eira t urm a no CPDOC da Fundação Get ulio Vargas e parecia adequado ao m eu perfil. Tinha um

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caráter prático, m as guardava o rigor dos m estrados acadêm icos. Por se t rat ar de um a pós- graduação st rict o sensu, m e perm it iria avançar nos est udos acadêm icos. Fiquei bastant e interessada, principalm ente depois de conhecer a grade de disciplinas, que vinha ao encont ro de m eus interesses pessoais e profissionais. Devido a com prom issos profissionais – inclusive a exposição das obras da Celeida no CCBB –, não houve t em po hábil para escrever um proj et o e part icipar da prim eira seleção. Mas naquele dia, na inauguração da exposição, sem procurar, encontrei o t em a para o m eu proj et o.

Paralelo a t udo isso, no m esm o m ês de j unho, foram abert as as inscrições para novos proj et os voltados para m ulheres, prom ovido pelo Fundo Angela Borba,8 organização não- governam ent al ( ONG) da qual faço part e do quadro de fundadoras. É fundam ent al esclarecer que a escolha dos proj et os é feit a por um grupo de conselheiras e as propost as recebidas são analisadas anonim am ent e; port ant o, eu não t eria nenhum a int erferência na escolha ou não do proj et o. Pensei em D. August inha e t elefonei, no últ im o dia de inscrição. Propus que ela enviasse um proj et o para dar cont inuidade ao que Celeida havia im plem ent ado no Morro, há alguns anos. Ela adorou, é claro, e pediu que eu falasse com sua am iga e parceira em ações sociais no Chapéu, Roselene Menezes, que t am bém aprovou a idéia, m as infelizm ent e não t inha nem t em po hábil, nem inform ações suficient es, edit al et c. para escrever um proj et o.

Novam ent e m e vi envolvida. Sent ei no com put ador e, a partir da pesquisa que havia elaborado para a exposição, escrevi um proj et o

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cham ado “ Art iculação, Ação e Art e” , que visava à reest rut uração do t rabalho de conscientização e articulação de um grupo de m ulheres, a part ir da recuperação do Proj et o “ Cerâm ica Popular nas Favelas” e o “ Proj eto Mem ória” . A iniciativa seria coordenada por Maria August a do Nascim ent o e Silva, a m esm a D. August inha, que aj udou a escult ora Celeida Tost es, na década de 1980, a tocar o trabalho. Foi aprovada um a verba de R$ 4.000,00 para o proj et o do Chapéu Mangueira, e o cont rat o foi assinado no dia 6 de j ulho de 2004.

A prim eira vez que estive no Morro Chapéu Mangueira foi em 3 de novem bro de 2004. Fui convocada por D. August inha para fot ografar o forno art esanal utilizado na queim a da cerâm ica, no estado de abandono em que se encont rava, pois um a reform a seria iniciada naquela sem ana. Ela m arcou nosso encont ro na port a de um bar próxim o à ent rada do m orro. Subi com ela e o m arido, Sr. Coracy, e cerca de 100 m etros depois estávam os num a praça em frente ao Galpão das Artes, um a casa ret angular de alvenaria, com cerca de 50m2 de área no nível da praça e um subsolo, onde fora erguido o forno, num pequeno quint al. Fot ografei e film ei o forno, que estava, de fat o, em péssim o est ado, abandonado há 10 anos, desde a m ort e de Celeida Tost es.

Após cum prido o regist ro, D. Augustinha m e convidou para conhecer a capela em que são celebradas as m issas, próxim a à praça do Galpão. No cam inho passam os por um rapaz que carregava um saco de leite e um em brulho que suponho seria pão e, na outra m ão, um a pistola e

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duas granadas. Sent i um frio na espinha e com ecei a descer, m uda e apavorada. Foi quando ouvi D. August inha m e cham ar dizendo que a igrej a era para cim a e não para baixo, para onde eu descia em desabalada carreira.

Depois dessa visit a dem orei m uit o a aparecer novam ent e no Chapéu Mangueira. D. August inha t elefonava, convidava, m as, conscient e ou inconscient em ent e, eu sem pre est ava com prom issada com assunt os de trabalho. Por vezes, fiquei culpada por não querer visit á- los. Sent i que ela cont ava com o m eu apoio para o proj eto, m as eu não tinha tem po nem vont ade de volt ar. Apenas pelo t elefone nos falávam os. No ent ant o, o proj et o acont eceu e cum priu seu obj et ivo de levar a cerâm ica de volt a à favela e unir novam ent e as m ulheres da com unidade em t orno de suas m em órias e da sua art e.

O im passe agora era seguir em frent e com o m eu proj et o, que era t odo focado no t rabalho desenvolvido pela art ist a na com unidade e previa, inclusive, o uso de observação participant e no processo de reconst rução das at ividades no Galpão das Art es; do reencont ro das m ulheres e da adesão de novas alunas; e de acom panham ent o do reacender da cham a do forno. Na verdade, est ava com m edo de voltar e, por isso, com ecei a abrir novas frent es para m inha pesquisa e buscar os out ros locais de at uação de Celeida: o Parque Lage e a Universidade Federal do Rio de Janeiro ( UFRJ) .

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colocou à disposição para fornecer inform ações, tendo inclusive indicado out ra am iga da m esm a época. Um ant igo funcionário, Sr. Nelson, t am bém declarou t er sido m uit o am igo da artista, e o artista Luiz Ernesto, professor da escola, tam bém conhecia bastante a t raj etória e o trabalho de Celeida. Já havia fontes suficientes para iniciar a pesquisa; assim , part i para obt er inform ações sobre a UFRJ.

A part e m ais conhecida da passagem de Celeida pela UFRJ foi a defesa de seu Mem orial para o concurso de professora t it ular de cerâm ica em 1992. Conta- se que, perante um a banca de not áveis, a art ist a defendeu m agistralm ent e sua traj etória acadêm ica e artística e apresentou a pesquisa, que j á est ava desenvolvendo com o professora bolsist a. Proferiu um a brilhant e palest ra e com andou apresent ações perform á-t icas com a aj uda de seus alunos. Telefonei para Káá-t ia Gorini, sua assist ent e na época, hoj e professora da UFRJ, que se dispôs im ediat am ent e a cooperar. Encont rei t am bém dois art ist as plást icos: Ronald Duart e e Alm ir Soares, que conviveram com Celeida na UFRJ.

I ncluí as novas inform ações obt idas no m eu proj et o e acredit ei t er resolvido, pelo m enos em part e, m inhas inquiet ações a respeit o da m inha atuação j unt o ao Chapéu Mangueira, que passaria a apenas coadj uvant e no t rabalho. Porém após a apresentação para a qualificação, a banca apont ou que o t rabalho est ava dem asiadam ent e ext enso e que eu deveria focar m inha pesquisa no t rabalho desenvolvido na com unidade, considerado m uito rico e pouco docum entado. Tudo apont ava para o Chapéu. Conform ei- m e.

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um a declaração pret ensiosa, m as não é isso, pelo contrário: m uit as vezes m e questionei se o tem a não era grande dem ais e se eu não estava tentando abarcar o m undo com os braços. Mas, a cada dia que passava, eu m e via m ais com prom et ida com D. Augustinha, Sr. Coracy, os am igos da art ist a e as “ celeidinhas” – artist as e ceram istas que a seu m odo cont inuam um “ fazer” com o o aprenderam com a art ist a – e m e vej o, m ais um a vez, irrem ediavelm ent e envolvida, cat ivada, encant ada por Celeida.

2 . Sobre o obj et ivo do t rabalho

Por t udo que discorri ant es, acredit o na im port ância em se fazer o regist ro da t raj et ória de Celeida Tost es. Creio haver um diferencial em seu t rabalho art íst ico que o t orna expressão do m om ent o em que a sociedade vive, m as, principalm ente, vanguarda das proposições art íst icas, est ét icas e ét icas dessa m esm a sociedade. Minha propost a, desde o ingresso no Mestrado Profissionalizante de Bens Culturais e Proj etos Sociais do CPDOC, foi realizar um a pesquisa que, além de cont em plar os obj et ivos do program a de m est rado, dialogasse com o m eio de t rabalho em que at uo.

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No universo do cham ado “ m eio das art es” Celeida usufrui de m uit o prest ígio, principalm ent e no Rio de Janeiro. Mas, ao t rabalhar na prom oção de sua m ais com plet a hom enagem póstum a,9 divisei

rapidam ent e que seu prest ígio est ava longe de t er- se t ornado consagração. Celeida era reconhecida, porém pouco conhecida.

Port ant o, m apear a vida, o processo de trabalho e as buscas da artista Celeida Tostes, m esm o que com um foco específico, vai além de um exercício acadêm ico: torna- se um a contribuição para a hist ória da art e brasileira.

Com o t rabalho de conclusão de curso, além da dissert ação, apresent arei um a prim eira versão do videodocum ent ário “ O Relicário de Celeida Tostes” , com o recorte no proj eto “ Form ação de Centros de Cerâm ica Ut ilit ária em Com unidades de Periferia Cham adas Favelas” , desenvolvido pela art ist a de 1980 at é a sua m ort e em 1995.

A idéia de elaborar um docum ent ário surgiu a posteriori da decisão de fazer as entrevistas com suporte videográfico. A realização da gravação das entrevistas em vídeo tinha por obj etivo testar o m étodo da história oral e assim poder cont ribuir na afirm ação do vídeo com o um cam inho possível e enriquecedor para a m et odologia. A int enção de realizar o docum entário se fortaleceu com o um desej o de aplicação do m ét odo, depois da leit ura do t ext o de int rodução do livro “ Mario Henrique Sim onsen – um hom em e seu t em po” , que foi inspiradora:

[ As entrevistas] seriam recortadas e m ontadas com o em um docum ent ário. Apenas, em vez de im agens, t eríam os falas. Ent revist ados cont ando hist órias, apresent ando pont os de vist a, analisando conj unt uras e fat os relat ivos aos diferent es períodos da vida de Mário Henrique Sim onsen. Aut ores e at ores de um relat o

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colet ivo feit o não apenas de concordâncias, m as t am bém de debat es e divergências.10

Nesse caso, por que não realizar um docum ent ário?

O docum ent ário apresent a as ent revist as alt ernadas com im agens da art ista Celeida Tost es, suas obras e o proj et o de cerâm ica utilitária desenvolvido no Morro do Chapéu Mangueira. A int enção é cont ar a hist ória exclusivam ent e com as vozes de seus at ores e t est em unhas. A inevitável interm ediação ficará por conta da edição das entrevistas e da m ont agem das im agens.

Tam bém se configura com o um bem cult ural o convênio firm ado ent re est a pesquisadora e o Cent ro Nacional de Folclore e Cult ura Popular ( CNFCP) , no sent ido da disponibilização pública do m at erial produzido. O com prom isso é ceder para a inst it uição um a cópia de t odas as font es produzidas para est a pesquisa: cópias em DVD das 14 horas de gravação das 19 entrevistas de vídeo11 – fam iliares, am igos, art ist as e m oradores do Chapéu Mangueira – e sua respectiva transcrição; m atérias de j ornais e de todo o m aterial produzido a partir deles. O CNFCP, localizado no Rio de Janeiro, conta com um a biblioteca que disponibiliza, inclusive elet rônica e rem ot am ent e, um dos m aiores acervos de folclore e cult ura popular do Brasil, com cerca de 200 m il docum entos – livros, periódicos, folhetos, teses, folhetos de cordel, recort es de j ornal, fot ografias, discos, CDs, fit as casset e, film es e vídeos. O acordo se deu com o cont rapart ida à digit alização e à cessão, em caráter extraordinário, dos arquivos sonoros com ent revist as do proj eto do Chapéu Mangueira e com a artista Celeida Tostes, pert encentes ao acervo da inst ituição.

10 Alberti, Verena; Sarm ento, Carlos Eduardo; e Rocha, Dora, 2002, p. 14.

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Out rossim , de posse de m uit o m ais m at erial do que o necessário para realizar est a dissert ação, pret endo dar cont inuidade ao proj et o de edit ar um livro de arte sobre a carreira da artista. Para tal, j á firm ei parceria com o escult or Jorge Em anuel, real det ent or do espólio de Celeida Tostes, e j á estam os com o proj eto em vias de ser enviado para a chancela da Lei Rouanet de incent ivo à cult ura. O m esm o será feit o com o docum entário ora produzido, a fim de captar recursos para a sua versão final e post erior distribuição.

3 . A orga nização da dissert ação

Para que se possa ent ender o t rabalho realizado por Celeida Tost es, desenvolvi um a ext ensa biografia cronológica sobre a art ist a, que apresento no capítulo I dessa m onografia. As entrevistas t em át icas esclareceram m uitos pont os obscuros, m as o Mem orial que a própria Celeida apresentou para o concurso de professor titular de Cerâm ica12

da UFRJ, cedido pelo art ist a Jorge Em anuel,13 foi fundam ent al. A art ist a

recolheu e encadernou t odos os docum entos referentes aos cursos que freqüent ou e aos que m inist rou, bem com o t odos os proj et os que desenvolveu ao longo de sua carreira.

No capítulo I I faço um relato detalhado da atuação de Celeida Tostes com os m oradores do Morro Chapéu Mangueira e a const rução do Galpão de Art e que se configurou com o o “ lugar da m em ória” ,14 o qual

12 Concurso de professor titular de Cerâm ica para o Departam ento de Desenho I ndustrial – Escola de Belas Artes – Centro de Letras e Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mem orial Celeida Tostes, 1992.

13 O artista est udou 3D com Celeida Tostes na EAV- Parque Lage e depois a substituiu no início da década de 1990. Após a m orte da artista, Jorge Em anuel iniciou um a pesquisa sobre Celeida que não teve continuidade; por isso recolheu e é detentor de part e do acervo de docum entos e fotografias deixados por ela.

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pereniza a presença da art e e da cultura na com unidade. Procuro, por m eio da m em ória das pessoas que conheceram a artista, m ontar um a colcha de ret alhos, com o as que ela incent ivou as m ulheres do Morro a relem brar e fazer, para contar as suas histórias/ estórias. Procuro trazer à tona as m em órias do que essas pessoas realizaram j unto com a artista e a im portância que isso teve para suas vidas. Trata- se de um t rabalho delicado, com as lem branças ora tão vivas, que são narradas no present e do indicat ivo, e ora t ão fugidias, que t eim am em se esgueirar pelos cantos da m em ória.

A lem brança e o esquecim ento estão int im am ent e ligados, a m em ória é um a const ant e reconst rução de fat os e acont ecim ent os que nos m arcaram , que t iveram um significado real e/ ou sim bólico, pois “ quando lem bram os, lem bram os no present e, de acordo com as condicionant es hist óricas que nos apontam as questões a serem buscadas no passado” .15 Desse m odo, a m em ória const ruída a posteriori, é, inevit avelm ent e, selet iva, opera a partir de parâm etros individuais, afet ivos, econôm icos, geográficos et c., m as t am bém , por out ro lado, é a única m aneira de recuperar acontecim entos de vida que não se encontram disponíveis em docum ent os, “ afinal, em vez de se im aginar um a sim ples oposição ent re m em ória e esquecim ent o, deve- se valorizar, sim , a relação que am bos m ant êm ent re si.”16

Por fim , faço algum as considerações sobre a pesquisa, ou m elhor, algum as reflexões e quest ionam ent os, pois creio que m uit o m ais há para se dizer de Celeida Tost es. As m em órias da fam ília são as lem branças que sua prim a- irm ã Terezinha17 t em dela, de um a j ovem ant iconvencional, que quebrava os paradigm as “ com horários

15 Motta e Dantas, 2003, p. 21. 16 Motta, 1994, p. 115.

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est apafúrdios, j ant ando à m eia- noit e, quando a fam ília j á est ava t oda dorm indo” . Para seus am igos, ela foi um a artista única, um a m ulher incom um para a época. O pint or Luiz Áquila, que possivelm ent e foi seu am igo m ais ínt im o, diz sobre ela: “ Aprendi m uit o sobre m ulher com a Celeida. I sso desconcert ava porque ninguém falava assim , nem tinha essa entrega. As m ulheres art istas de sua geração eram m uit o racionais. Eram art istas conceit uais ou que gost avam de conceit uar m uit o. Racionalist as. O t rabalho dela é extrem am ente orgânico e diret o.”18 Para D. August inha ela foi “ um grande despert am ent o” . Um a

das dificuldades encont radas, por m im , foi essa unanim idade, essa adm iração incondicional, que t alvez confirm e que ela, de fat o, foi um a m ulher ext raordinária.

4 . O relicário: guardião de resíduos de fé, sent im ent o e m em ória

Na língua portuguesa o sufixo “ ário” rem ete à idéia de coleções ou lugares onde se acondiciona, arm azena ou preserva algum a coisa. Podem os cit ar com o exem plos as palavras orquidário, vocabulário, apiário, serpentário e arm ário. Segundo o Dicionário Houaiss, a palavra relicário significa caixa, cofre, lugar próprio para guardar relíquias; bolsinha ou m edalha com relíquias que algum as pessoas t razem ao pescoço, por devoção; ou ainda, algo precioso, de grande valor. A palavra deriva- se do lat im reliquìaeárum, que significa restos, resíduo de algum a coisa; relíquias, destroços; restos m ortais et c.

A idéia do local onde se guardam relíquias foi o que m e levou à escolha do t ít ulo do present e t rabalho: “ O Relicário de Celeida Tost es” . O

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significado de relicário t ant o pode cont er a idéia de obj etos santificados, guardados respeit osam ent e, quant o a da conservação de coisas preciosas e raras, de valor sim bólico ou m aterial.

Quando da realização da pesquisa de cam po para est a dissert ação, descobri um a rede de at ores sociais que guardam com o verdadeiras relíquias suas m em órias sobre o tem po em que conviveram com a m est ra, colega, irm ã, t ia ou am iga Celeida Tost es. Todos fazem quest ão absolut a de preservá- las com am or e cuidado. Sem pre dispost os a relem brar passagens vividas, ensinam ent os deixados e m esm o de m ost rar algum a obra com a qual foram present eados. Quase t odos se referiram a Celeida no presente, com o se estivesse viva, o que, a princípio, causou um a certa estranheza, m as no decorrer das entrevistas ficou claro que ela deixou para t odos eles um legado de preciosidades, que os acom panhará por t oda a vida.

O t ít ulo do t rabalho t am bém se fort aleceu no decorrer da pesquisa da cronologia da artista. Os conhecim entos, as obras, os proj etos e as pesquisas realizados por Celeida Tostes cert am ente são passíveis de serem cham ados de relíquias. Da m esm a form a, acredit o que a coleção de inform ações produzidas por est a pesquisa – que procurou desvendar, recort ar, cat alogar e divulgar um pouco dest a hist ória – cham arei de relicário, porém apenas um a part e dele, pois ainda há m uit o a pesquisar a respeit o de Celeida Tost es.

5 . Sobre a m et odologia e as font es

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foi, incont est avelm ent e, um a boa form a de aproxim ação do t em a a ser pesquisado, porque m ais do que m ost rar o processo de at uação da art ist a, se pret endeu aqui docum entar as im pressões deixadas por ela no m eio em que viveu. A hist ória que se procurou pesquisar não cost um ava, at é ent ão, ser encont rada em livros e/ ou docum ent os, pois trat a- se da reconstrução da t raj etória de um a artista e o encontro afet ivo e art íst ico com um grupo de pessoas. Buscam os invest igar a transform ação que isso causou na vida dessas pessoas e na vida da própria Celeida, o que, acredit o, só foi possível por m eio dos depoim entos dos atores ou testem unhas destas possíveis m udanças. O que nos im port a aqui é a reconst rução do m om ent o por int erm édio da m em ória, “ a recuperação do vivido conform e concebido por quem viveu” .19 Essa concepção se ent relaça com a própria propost a em pírica da arte que Celeida Tostes, nos anos 1980, levou para a com unidade do Chapéu Mangueira. Se a t ransform ação buscada pela artista era sem pre t rabalhada por via da ordem subj et iva, que out ro m ét odo poderia com provar transform ações subj etivas? Alberti nos responde, quando afirm a que a hist ória oral t em o grande m érit o de perm it ir que os fenôm enos subj etivos se t ornem int eligíveis.

Rem onta ao final do século XI X o início da utilização de font es orais nas Ciências Sociais. Os prim eiros regist ros foram colet ados por Franz Boas em sua fam osa expedição ao Árt ico para colher inform ações sobre os esquim ós, em 1883,20 quando t am bém inaugurou o m ét odo da

observação participant e. Desde ent ão as Ciências Sociais incorporaram est e procedim ent o às suas pesquisas. Nunca houve, no ent anto, por parte de sociólogos e antropólogos a preocupação em tornar estes relat os font es ou docum ent os disponíveis para posteriores pesquisas. Dat a dest a m esm a época a profissionalização do hist oriador e a

19 Alberti, 2004, p. 16.

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consolidação das font es escrit as com o det entoras exclusivas da fidelidade necessária ao registro histórico: “ expulsando a m em ória em favor do fato” .21 É im port ant e ressalt ar que, nest a época, a hist ória

dedicava- se quase que exclusivam ent e a est udos polít icos dos períodos ant igo e m edieval. Havia que se t om ar dist ância dos fat os: “ um a hist ória só nasce para um a época quando est á t ot alm ent e m ort a” .22 Naquele tem po, para os historiadores, as fontes orais não eram consideradas fontes, tam pouco a hist ória cont em porânea era considerada hist ória.

Em m eados do século XX um a nova geração de historiadores franceses da Écolle des Annales com eçou a operar um a transform ação m undial no cam po da hist ória. Defendiam um a hist ória que privilegiasse t am bém os fatores sociais e econôm icos da sociedade. A nova hist ória, cham ada história total, tinha o foco centrado nas realidades do t rabalho e da produção, e não apenas nos regim es polít icos. Entretant o, est a m udança não incidiu sobre as épocas hist óricas de est udo ou as font es: continuou voltada para os períodos m edieval, ant igo, renascent ist a e m oderno e, além disso, reafirm ando a suprem acia das font es escrit as.

A gênese da hist ória oral dat a de 1948, quando o j ornalist a am ericano Allan Nevins, da Universidade de Colúm bia com eçou a gravar ent revist as com polít icos, ut ilizando o recém - invent ado gravador de fit a. Durant e quase duas décadas a hist ória oral nos Estados Unidos seguiu o cam inho do est udo das elit es am ericanas, se est endendo para 50 inst it uições. Em 1965 j á eram m ais de 300 cent ros de est udo am ericanos dedicados à hist ória oral, a est a altura j á privilegiando os est udos de algum as m inorias, com o os índios. Em 1977, j á se

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cont abilizavam nos Est ados Unidos m ais de m il inst it uições dedicadas a produzir hist ória oral, em baladas pelos est udos da guerra do Viet nã e da lut a dos direitos civis dos negros, das m ulheres e dos im igrant es.

No Brasil a hist ória oral com eçou em 1975 com os program as da Universidade Federal de Sant a Catarina e do Cent ro de Pesquisa e Docum entação de História Contem porânea do Brasil, CPDOC, no Rio de Janeiro. Desde ent ão, vem experim ent ando expansões significativas. O início dos anos 1990 m arcam o pleno reconhecim ento e a inst it ucionalização da hist ória oral no país. A part ir do Encont ro Nacional de Hist ória Oral, realizado em 1993, firm aram - se int ercâm bios entre inst it uições. Em 1994, no I I Encont ro Nacional de Hist ória Oral, foi fundada a Associação Brasileira de Hist ória Oral.23

Depois de um breve e necessário histórico de apresentação do m étodo escolhido para esta pesquisa, parece obrigat ório se volt ar à pergunt a de Alberti: “ Mas o que vem a ser, afinal, esse m ét odo- font e- t écnica tão específico?” A Hist ória Oral é um m ét odo de pesquisa que prevê a realização de ent revist as com at ores e/ ou t est em unhas de det erm inado acont ecim ento social. Os relat os são regist rados elet ronicam ente e têm carát er hist órico e docum ental. A ut ilização da m et odologia perm it e a aproxim ação e análise do obj eto de est udo, à luz da m em ória das pessoas que dele efet ivam ent e participaram , m esm o que apenas com o observadores.

Part indo do pressupost o de que é coisa dada o fat o de a m em ória ser veículo privilegiado da hist ória oral e de que o m ét odo é adequado para a reconstituição de traj etórias de com unidades específicas, biografias e

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hist órias de m em órias,24 est a pesquisa se propôs o desafio de em barcar na avent ura de realizar a m aior parte de sua investigação com a m et odologia da história oral e se arriscar ao perigo de deixar- se seduzir pelo “ fascínio do vivido” .

Na verdade, a propost a de recuperação das m em órias, feit a por Celeida aos m oradores do Chapéu Mangueira, a m aioria m igrant es de áreas rurais, era um a reprodução de seu próprio processo, quando, depois de m uit os anos de est udos form ais, reencontrou- se com barro,25 o que se

tornou o leit m ot iv de sua arte, seus proj etos e suas pesquisas. Por m eio de rodas de conversa, os integrant es do grupo t am bém buscavam seus saberes ancest rais, abandonados em suas cam pesinas cidades. O exercício de rem em oração desses saberes t inha o obj et ivo de resgat ar a ident idade cult ural esquecida e t ransform á- la em art e, que, post eriorm ent e, se convert eria em font e de renda para o grupo.

Est e t rabalho não t em a pret ensão de fazer um a análise da art e ou do fazer artístico de Celeida Tostes. A escolha da art ist a com o suj eito da pesquisa se deu a part ir do reconhecim ent o de sua im port ância no m eio das art es e da necessidade que se im punha de fazer um a cronologia m ais aprofundada de sua t raj et ória. Ent ret ant o, a hist ória oral, com suas especificidades, perm it iu, t am bém , que em ergisse um pouco da art e de Celeida. Ent revist ados com o os crít icos de art e Lélia Coelho Frota e Marcus Lontra, assim com o o pintor Luiz Áquila, ofereceram indícios bast ant e inst igant es sobre o assunto e, ao m esm o tem po, falaram das dificuldades que a art ist a t inha com o m eio form al no qual est ava inscrit o o seu t rabalho.

24 Sobre os cam pos de pesquisa em que a história oral pode ser útil, ver: Alberti, 2004 p. 23-28.

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Ao m esm o t em po que se procura recuperar a traj etória da artist a, se busca aqui o registro da gênese e do percurso do proj eto “ Form ação de Cent ros de Cerâm ica Ut ilit ária nas Com unidades de Periferia Cham adas Favelas” , que a art ist a desenvolveu no Morro do Chapéu Mangueira. A im plant ação do proj et o na com unidade t inha por obj et ivo a recuperação da ident idade cultural dos m oradores da com unidade e a abert ura de um a nova possibilidade de geração de renda, m as, ao longo dos anos, teve diversos desdobram entos e constant es transform ações e, com o um ser aut ônom o, t om ou seus próprios rum os. O m esm o ocorreu com o local construído especificam ent e para o desenvolvim ento do trabalho, o Galpão de Art e que, por vezes, t eve esvaziada sua função prát ica de local de fazer art íst ico, m as com o passar do tem po se transform ou num a espécie de guardião da cultura local, nas palavras de Pierre Nora, um “ lugar da m em ória” .

Para reconst ruir a t raj et ória da art ista, foram recolhidos um a série de reportagens e textos críticos sobre sua obra; três dissertações de m est rado e um a t ese de doutorado, além de seis volum es encadernados, que com punham um ext enso m em orial com inform ações curriculares, preparados pela artista para o concurso de professora t it ular de Cerâm ica da UFRJ.

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Quando idealizei a prim eira seleção de ent revist ados, apenas t inha acesso aos recortes de j ornal e textos crít icos pesquisados no Museu de Art e Moderna do Rio de Janeiro. Guiada pelos obj et ivos da pesquisa, decidi prim eiro entrevist ar a irm ã da art ist a ( que descobri na ent revist a t rat ar- se de prim a- irm ã) . Poderia t er opt ado em fazer um a ent revist a de cunho explorat ório, m as devido a sua agenda at ribulada, decidi realizar um abrangent e rot eiro geral, a partir das inform ações que possuía e, com base nest a prim eira entrevista, elaborar os rot eiros específicos. De fato, a entrevista descort inou um a série de novos fatos e inform ações bast ante úteis para o desenrolar da pesquisa.

O obj et ivo inicial era a realização de 10 ent revist as t em át icas. Cont udo, no decorrer do t rabalho, devido ao desdobram ento das inform ações e a abert ura de novas lacunas, foi- se t ornando necessário acrescent ar novos depoim ent os. No t ot al foram feit as 19 ent revist as.

É im port ant e assinalar que em 2004, quando ingressei no Mest rado do CPDOC/ FGV, dois at ores, que pressupus seriam os que m ais inform ações t eriam para a pesquisa, ainda est avam vivos; todavia, Henry Sthal, fotógrafo e grande adm irador do t rabalho de Celeida Tost es, que docum ent ou a perform ance “ Passagem ” , faleceu em 2004; e Maurício Bent es, im port ant e art ista da Geração 80, aluno, colaborador e seguidor das idéias da art ista, desapareceu precocem ente em 2003. Tam bém no Chapéu Mangueira, m uitas pessoas que part iciparam do proj eto ao longo dos anos 1980- 1990, faleceram ou m udaram - se.

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época, com portam ento de pessoas ou grupos, funcionam ent o de inst it uições ( ...) ” .26

O suporte videográfico se m ostrou- se bast ant e eficient e na realização das ent revist as. Os relat os foram enriquecidos com o registro de gestos e em oções dos ent revist ados. A preocupação em respeit ar os rigores do m ét odo da hist ória oral levou a ancorar a escrita im agética no inst rum ent al t eórico propost o pela Ant ropologia Visual. Não houve, no ent ant o, nenhum a int enção de realizar um vídeo et nográfico, m as sim de se utilizar o referencial antropológico com o suport e às ent revist as e a post erior m ont agem do vídeo- docum ent ário. Com o bem definiu Peixoto, o uso da im agem videográfica se j ust ifica na m edida em que

a linguagem im agét ica t em m ais expressividade e força m et afórica; ela condensa, t ornando a percepção dos fenôm enos sociais m ais sensível, j á que é m ais alusiva, m ais elípt ica e m ais sim bólica. Já disseram por aí que alguns m inut os de um film e de Jean Rouch nos dizem m ais sobre a África do que m uitos livros dispostos nas estantes das bibliotecas. Assim , ent re o t ext o escrit o e a im agem / som não exist e nem ident idade nem oposição, m as com plem entaridade.27

O audiovisual oferece inúm eras vantagens sobre out ras t écnicas de colet a de dados, pois a im agem visual é m ais rica em detalhes do que o áudio isoladam ent e. Mas, por out ro lado, t am bém oferece inconvenientes, com o foi observado no decorrer das entrevist as. Entretanto, é necessário ressaltar que onde residia a m aior preocupação – na inibição ou m esm o na m udança do com port am ent o dos ent revist ados diante da câm era – não houve problem a algum . Algum as vezes, nos prim eiros m inutos, notou- se um a preocupação em falar diret am ent e para a câm era ou m esm o em vigiá- la, m as à m edida que iam se envolvendo com a ent revist a, a presença do olhar elet rônico

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sobre si era t ot alm ent e esquecida. Houve, porém , um com plicador inesperado, com o qual não se cont ava e que, de início, dificult ou, m as post eriorm ent e facilit ou a boa realização das ent revist as: os ent revist ados ficavam pouco à vont ade com a presença de um cinegrafista profissional.

Esse com plicador não foi detectado de im ediato, apesar de estar latente desde a prim eira ent revist a. Provavelm ent e por se t rat ar de um assunt o de foro íntim o, que tocava na em oção, a presença de um t écnico const rangia os ent revist ados. A solução encont rada, a part ir da nona entrevista, foi a rápida capacitação dessa pesquisadora para o m anej o do equipam ent o, o que no início result ou em algum as falhas t écnicas. Cont udo, a qualidade docum ent al do m at erial colet ado m elhorou de form a sensível. I nvolunt ariam ent e foi aceito o convite feito por Thom pson:

Toda font e hist órica derivada da percepção hum ana é subj et iva, m as apenas a font e oral perm it e- nos desafiar essa subj et ividade: descolar as cam adas de m em ória, cavar fundo em suas som bras, na expect at iva de at ingir a verdade ocult a. Se assim é, por que não aproveit ar essa oport unidade que só nós t em os ent re os historiadores, e fazer nossos inform antes se acom odarem relaxados sobre o divã, e, com o psicanalist as, sorver em seus inconscient es, ext rair o m ais profundo de seus segredos?28

Após est a explanação, que apresent a um pouco das m uit as facet as de Celeida Tost es, sigam os o conselho do art ist a plást ico Luiz Áquila: “ Vam os Celeidar! ! ! ”

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CAPÍ TULO I

GÊN ESE DE UMA ARTI STA

“ Com o m ulher, Celeida int egra, no eros da sua criação, a am bigüidade e a fecundidade dos seres da nat ureza.”

Lélia Coelho Frota29

1 . Mem órias da infância

Celeida de Moraes Tost es era artista plást ica. Nasceu na Gávea, no Rio de Janeiro, em 26 de m aio de 1929 e m orreu nessa m esm a cidade em 3 de j aneiro de 1995.

Sua infância parece t er sido m arcada por dois acont ecim entos: a m ort e prem at ura da m ãe e as brincadeiras infant is, no barro e no rio que cort ava a propriedade da fam ília.

Quando a m ãe faleceu, Celeida t inha um ano e um m ês de idade. O pai, viúvo recente, enviou a m enina aos cuidados dos avós e tias m aternas, na Fazenda de Cam po Alegre, m unicípio de Macuco, interior do Est ado do Rio de Janeiro. As t ias Eliza e I rene ficaram encarregadas da pequena Celeida.

O pai ia visit á- la com freqüência na fazenda, m as não t inha condições de cuidar da m enina, pois, segundo a art ist a, ele t rabalhava com com ércio ext erior. Alguns anos depois, quando se casou novam ent e, fez um a nova t ent at iva de levá- la para m orar consigo, m as a m enina escolheu perm anecer na Fazenda, aos cuidados da tia I rene, irm ã de sua m ãe, e de seu m arido, o t io João.

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Ela falava m uit o na vida livre da fazenda... Falava m uit o nos encontros com os prim os, um a coisa m eio erotizada, assim . Falava em banhos de rio, ficar suj a de lam a ( ...) Principalm ent e, a liberdade da fazenda; e ela falava, em cont rapart ida, um a vez que ela veio para o Rio t ent ar m orar com o pai. E que o pai... eu não sei se eu fant asiei esse final; esse final eu não sei se é fant asia m inha, m as eu acho que não é não. Que ela foi m orar com o pai e que ela achou t ão rest rit a, t ão lim it adora aquela vida na cidade, que ela foi em bora, foi em bora e deixou o pai, ela criança ainda, sum iu e volt ou pra fazenda. Na m inha fant asia, não sei se é verdade, que ela deixou a roupa t oda e saiu nua. I sso ela t inha 12 anos ou 10 anos. Quer dizer, ela não queria m ais nada com aquilo, e volt ou pra essa vida m ais ligada à t erra. ( Luiz Áquila, 2006)

Quando a m ãe de Celeida m orreu, suas irm ãs Elisa e I rene t om aram cont a da m enina, que ficou na Fazenda. I rene m orava no Rio de Janeiro e j á era casada, m as não tinha filhos. Foi ela quem se encarregou da criação da sobrinha. Celeida foi criada com o um a filha e, anos m ais t arde, com o nascim ent o dos prim os Terezinha e João Henrique, nascidos em 1943 e 1939, respect ivam ent e, ganhou dois irm ãos.

Celeidinha, na fazenda é que ela teve contato com o chão, com a vida, com a t erra, com as pessoas da t erra m esm o, que viviam da produção da t erra, e Celeida se ident ificava m uit o. Ela ia pra casa dos colonos ouvir as histórias deles. E passava o dia inteiro na casa de colono, ouvindo as hist órias. Desde m ula- sem - cabeça, aquelas hist órias de fazenda ( ...) e a Celeidinha viveu m uit o t em po em fazenda. ( Terezinha Benj am in, 2005)

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de um a folha datilografada, gravado no estêncil Gestetner e m im eografado; foi assim que surgiu o “ o conhecim ent o de ferram entas e o prazer de t rabalhar em oficina” .30

No período que com preende os anos de 1946 a 1961, a artista t rabalhou no I APC ( I nst it uto de Aposent adoria e Pensões dos Com er-ciários) , com o auxiliar de adm inist ração, desenhist a da Revist a do I APC

e, t am bém ligada ao I nst it ut o, com o recreadora hospit alar no set or de doenças m entais da Casa de Saúde Dr. Eiras e ainda no set or de ort opedia do Hospit al dos Com erciários. Nest a época t am bém fez desenhos e ilustrações para j ornais e revistas.

Ela sem pre pensou o seguint e: que aquilo ela est ava fazendo para um a sobrevivência dela. Ela sem pre teve vontade, Celeida sem pre t eve um veio, a gent e diz veio art íst ico, m as Celeida sem pre est ava criando algum a coisa, const ruindo algum a coisa que não fosse um cot idiano repet it ivo. Celeida t inha sem pre um a fom e de um processo de m udança m uit o int enso. Muit o int enso. E aí, depois ela fez, eu m e lem bro que ela fez um pré- vest ibular, j á bem m ais adult a do que t odos da época que est avam fazendo vest ibular. ( Terezinha Benj am in, 2005)

É int eressant e ressalt ar t am bém a visão que Alfredo Benj am in, que era am igo de Celeida ant es de casar com Terezinha, t eve da art ist a quando a conheceu.

... eu a conheci em 1954, no ant igo I APC, I nst it uto dos Com erciários ( ...) E eu ouvi falar da Celeida o seguint e: é um a colega, m as ela é diferent e. Ela não é igual a t odo m undo, ela é diferent e. E ela era m uit o sim pát ica, essa coisa t oda. ( Alfredo Benj am in, 2005)

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2 . Um a sólida form ação

Pra transgredir é preciso conhecer. Celeida Tost es, 1990

Em 1950, com 21 anos, passou em prim eiro lugar no vest ibular para a Universidade do Brasil, na Escola Nacional de Belas Art es ( ENBA) , onde se form ou em 1955, no curso seriado de Gravura.

O curso da ENBA era bastante abrangente.31 Nessa época foi aluna de

Oswaldo Goeldi,32 um dos m ais im portantes gravuristas brasileiros. Em 1956, fez um curso de educação artística para professores na Escolinha de Arte do Brasil, dirigida por Augusto Rodrigues33 – considerada pioneira e inovadora na form ação de arte-educadores no Brasil. Na Escola Nacional de Belas Artes da Universidade do Brasil, com plem entou seus estudos com o curso de Professorado de Desenho, com form ação em Pintura, Arte da Publicidade e do Livro e Desenho Técnico. Cursou, tam bém na ENBA, em 1957, a Escola de Filosofia, licenciando-se em Desenho.34

31 Durante a graduação a artista estudou: 1º ano (1951) – Modelagem , Desenho Artístico, Geom etria Descritiva, Arquitetura Analítica; 2º ano (1952) – Desenho Artístico, Modelagem , Anatom ia, Perspectiva e Som bras; 3º ano (1953) – Gravura, Modelo Vivo, Croquis, Arte Decorativa; 4º Ano (1954) – Gravura, Modelo Vivo, Arte Decorativa, História da Arte; 5º Ano (1955) – Gravura, Modelo Vivo, História da Arte, Gravura de Talho Doce, Água Forte e Xilografia. 32 Oswaldo Goeldi (Rio de Janeiro, RJ, 1895-1961. Gravador. Estudou na Suíça, em Genebra, de

1901 a 1919. Dedicou-se à xilogravura. Trabalhou com o ilustrador, fez desenho, gravuras e xilogravuras coloridas para periódicos e livros. Em 1941, trabalhou na ilustração das Obras Com pletas de Dostoievski, publicadas pela Editora José Olympio. Foi professor da Escola Nacional de Belas Artes, RJ, onde abriu a oficina de xilogravura (1955). I n: O Olhar Modernista de JK, curadoria de Denise Mattar. São Paulo, FAAP, 2006, p. 105.

33 Augusto Rodrigues (Recife, PE, 1913 – Resende, RJ, 1993). Desenhista, ilustrador, caricaturista e poeta. A partir de 1935 fixou-se no Rio de Janeiro. Em 1948 fundou a Escolinha de Arte do Brasil. Recebeu o Prêm io de Viagem ao Estrangeiro em 1953. Em 1960, funda a Associação dos Artistas Plásticos Contem porâneos (ARCO). Participou das Bienais I nternacionais de São Paulo de 1953 e 1985. Recebeu prem iações de vários salões nacionais. In: O Olhar Modernista de JK, curadoria de Denise Mattar. São Paulo, FAAP, 2006, p. 96.

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No início do segundo sem estre de 1958 em barcou para os Estados Unidos com um a bolsa de um ano do “Program a do Governo dos Estados Unidos da Am érica para Cooperação Técnica com outros Governos”, especializando-se em Educação Secundária na Univer-sidade Southern, na Califórnia, e na Universidade New Mexico Highlands, no Novo México. Sua form ação curricular incluía cursos de especialização em 13 m atérias.35 Foi nos Estados Unidos sua prim eira exposição individual, na University of Southern Califórnia, no ano de 1959. Celeida expôs gravuras.

Com o se pode ver, a artista teve um a sólida form ação em Arte e Educação, m as, eclética, procurou t am bém um a apreensão do saber não- form al e não- convencional. Quando est eve nos Est ados Unidos fez cont at o com os índios Navaj os, no Novo México, em especial com a ceram ista Maria Martinez, a quem sem pre dest acou com o m uit o im portante para sua form ação e para o seu reencontro com o barro da infância, passando a partir de então a dedicar- se à cerâm ica.

Celeida nunca parou de est udar. Em seu retorno ao Brasil, entre as décadas de 1960 e 1970, fez diversos cursos de aperfeiçoam ent o t écnico, de educação e art e- educação, com o ela list ou em seu currículo, apresent ado à UFRJ, em 1992. Tam bém cursou a pós- graduação em Ant ropologia Cult ural na Faculdade de Educação da UFRJ ( 1973) .

35 History of Art – Renaissence to Present; Class use of Audio Visual Material; Secondary Education; I ntroducion of Graphic Arts; Collor; Basic Crafts; Methods and Directs Teatch: Art Education; Education Sociology; Evaluation of Pupil Progress; e Curriculum Lab in Secondary Education; Art for Classroom Teacher; Metal and Enam el e Ceram ics.

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Em 1975 recebeu bolsa de est udos do Conselho Brit ânico para um curso de um m ês na Cardiff College of Art , na Universidade de Wales, no País de Gales, UK. Nesse curso, aprofundou seus conhecim ent os em cerâm ica.36 No cert ificado da inst it uição do País de Gales, o diret or de

est udos, Tom Hudson, ressalt a que Celeida Tost es t rabalhou duro no período em que esteve lá e que todos os professores foram unânim es em dizer que não poderiam esperar m elhor aluna, que obteve 100% de aproveit am ent o prát ico e t eórico.

Em 1978, no Brasil, participou dos cursos de cerâm ica com Antonio Poteiro,37 no SESC, e, em 1987, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, com o professor australiano Vincent McGrath. Tam bém em 1987 recebeu o título de Livre Docência do Departam ento de Desenho I ndustrial (Cerâm ica) da Escola de Belas Artes da UFRJ, com a tese Esm altação em Metal, do livro de m esm o nom e que havia publicado em 1976.

3 . Um a art ist a apaixonada

Celeida é um a artista de um a só fase: cada vez m ais longe, cada vez m ais fundo. Dist anciando- se da superfície convencional, a sua m atéria- prim a, o barro ancestral, despoj a- se lentam ente da rim a visual para procurar febrilm ente a sensualidade da m ão se espoj ando na m aciez untuosa.

Henri V. Stahl38

36 Na Cardiff College estudou as seguintes disciplinas: Exploration of m aterials; ceram ic colour; industrial processes - m odeling ( sledging, profile, trim ing, whirler turnisng, lathe turning) , m ouldm aking ( dropout m ould for pressing, four piece m ould for slip casting) and enam elling ( screen printing, carried out in Fine Art print area) ; Print Making Departm ent ( Fine Art) : photo stencil for screen printing; e Pos Graduate School of Art Education.

37 Antônio Poteiro ( Antônio Batista de Sousa) é um dos m estres da pintura prim itiva no Brasil. Português de nascim ento, natural de Santa Cristina de Souza, nasceu em 1925 e iniciou-se na vida artística com o artesão, produzindo cerâm icas para o uso dom éstico, de onde adveio o "Poteiro" de seu nom e artístico. I nform ações colhidas no site: ht tp: / / pt.wikipedia.org acessado em 22/ m arço/ 2006.

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Os prim eiros trabalhos foram desenhos e gravuras. Na Escola Nacional de Belas Art es foi prem iada nas exposições acadêm icas de 1953 e 1954, com um a m ost ra de gravuras. Em 1955 recebeu a Medalha de Bronze na seção de Desenho e a Menção Honrosa na seção de Gravura do I I Salão dos Est udant es de Art e de Belo Horizont e. No m esm o ano suas gravuras t am bém receberam a Menção Honrosa do Salão Bahiano de Belas Artes.

O curso de gravura em m et al com Goeldi na Escola de Belas Artes result ou em sua part icipação, em 1955, na m ostra coletiva “ Gravura Brasileira nos Países do Leste Europeu” , exposição que percorreu a Polônia, Hungria, Rússia, Dinam arca, Suécia e Holanda. Da m ostra, participaram obras do próprio Goeldi, Adir Bot elho, Regina Yolanda Werneck, Newt on Cavalcant e, ent re out ros.

Nos final da década de 1950 part icipou do 8º Salão Nacional de Art e Moderna, no Museu de Art e Moderna do Rio de Janeiro – MAM- RJ. Em 1959, apresent ou a individual na Universit y of Sout hern California. Em 1960, volt ou a part icipar do Salão Nacional de Art e Moderna.

É im port ant e frisar que a carreira de educadora e a produção art íst ica de Celeida Tost es cam inharam j unt as e foram indissociáveis, do início de suas atividades profissionais até o final de sua vida. Era professora da Rede Est adual de Ensino do Rio de Janeiro desde 1964, inicialm ente cont rat ada e post eriorm ent e efet ivada por dois concursos de provas e t ít ulos. Tinha duas m at rículas.

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com preenda o processo artístico de Celeida Tost es: “ a ret om ada de m em órias da infância na roça, na fazenda de Cam po Alegre, no Est ado do Rio, pouco a pouco foi se apropriando das m atérias- prim as da esm alt ação, e que fazem part e do universo da cerâm ica” ( Mem orial da art ist a) .

Em 1960, Celeida t rabalhou no proj et o do educador Anísio Teixeira,39 que na época era diret or do I NEP ( I nst it ut o Nacional de Est udos Pedagógicos) . O proj et o, cuj o obj et ivo era alcançar as crianças que abandonavam a escola depois do curso prim ário ( 1ª à 4ª série do prim eiro grau) , previa equipar as escolas e, principalm ente, capacit ar professores de todo o Brasil, os quais vinham para o Rio de Janeiro com o bolsist as. A art ist a m inistrava o curso de Artes

I ndustriais ( esm altação em m et al) , que na época foi colocado em prát ica em classes de aplicação em diversas escolas da cidade.

A esm altação em m et al é um a das artes do fogo; trat a-se da fusão result ant e das t ransform ações de m at érias inorgânicas subm et idas à ação do calor, com o a cerâm ica, o m etal e o vidro. O esm alte industrial é encont rado em vasos, colheres, quadros, j óias, t ubos de m áquina de lavar, t am pas de fogão, clips et c. Na

39 Anísio Spínola Teixeira (1900, Caetité-BA – 1971, Rio de Janeiro-RJ). Diplom ou-se em 1922 em Direito, pela Universidade do Brasil; em 1924 foi nom eado inspetor geral do Ensino na Bahia. Viajou pela Europa em 1925, observando os sistem as de ensino da Espanha, Bélgica, I tália e França e com o m esm o objetivo fez duas viagens aos Estados Unidos entre 1927 e 1929. De volta ao Brasil, foi nom eado diretor de I nstrução Pública do Rio de Janeiro, onde criou entre 1931 e 1935 um a rede m unicipal de ensino que ia da escola prim ária à universidade. Perseguido pela ditadura Vargas, dem itiu-se do cargo em 1936 e regressou à Bahia — onde assum iu a pasta da Educação em 1947. Sua atuação à frente do I NEP, I nstituto Nacional de Estudos Pedagógicos, a partir de 1952, valorizando a pesquisa educacional no país, chegou a ser considerada tão significativa quanto a Sem ana de Arte Moderna ou a fundação da Universidade de São Paulo. Com a instauração do governo m ilitar em 1964, deixou o I nstituto — que hoje leva seu nom e — e foi lecionar em universidades am ericanas, de onde voltou em 1965 para continuar atuando com o m em bro do Conselho Federal de Educação. I nform ações colhidas em julho/ 2006 no site: http: / / www.prossiga.br/ anisioteixeira

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nat ureza, ele é encont rado no esm alt e dos dent es. Por m eio do ensino dest a t écnica, aliada à ut ilização de recursos alt ernat ivos, a iniciat iva procurava habilit ar os j ovens para um t rabalho que lhes possibilit asse ganhar a vida. Foi a part icipação neste proj et o que result ou no livro e na t ese “ Esm alt ação em Met al” . O proj et o se est endeu at é 1970.

De 1972 a 1975 Celeida Tostes se dedicou ao proj eto “ Com o Som os” , desenvolvido no Cent ro Educacional de Nit erói, da Fundação Brasileira de Educação. Est e proj et o, realizado com alunos da 7ª série do prim eiro grau, procurava recuperar a im portância do t at o, a consciência do próprio corpo, o t oque e a sensibilização. Foram realizadas experiências art ísticas partindo da pele dos alunos. Post eriorm ent e foi apresent ada no Museu Nacional de Belas Art es um a exposição com o m esm o nom e. Segundo a art ist a, est e t rabalho serviu de referencial para a “ Oficina das Art es do Fogo e Transform ação de Mat eriais” , im plantada por ela no Parque Lage a partir de 1975 e para o “ Proj eto de Oficina I ntegrada de Cerâm ica EBA/ FAU” da UFRJ, em 1989.

Desde as prim eiras at ividades com crianças dent ro de escolas, vi com o eram desconhecidas para elas coisas m uit o próxim as e sim ples. Sent ir a água, observar o chão, as árvores ou seu corpo. Foram m eninos e m eninas de m eios socioeconôm icos bastante diversificados: da Penha, Mangueira, Bot afogo e Vila I zabel, adolescent es uns, com sete e dez anos outros. Era com o se houvesse pouco uso dos sent idos. Poucos seriam capazes de dizer alguns det alhes de sua pele, de sua m ão, ou da própria sala de aula. Mais um a vez, a “ dist ância” do que est á próxim o. Era a falt a de exercício das possibilidades de usar.40

Em 1975, antes de retornar do curso na Cardiff College of Art, Celeida Tostes visitou os centros de esm altação de diversas Casas de Moeda na Europa: The Mint House, no País de Gales; The Royal Mint House na I nglaterra; e o Établissem ent Monétaire de Paris, França. Na carta que

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solicitava a visita, o superintendente do Departam ento de Moedas e Medalhas da Casa da Moeda do Brasil dizia que Celeida era professora de esm altação no Brasil e estava interessada em conhecer o processo de trabalho daquelas instituições. Neste m esm o ano, quando retornou ao Brasil, ofereceu um curso, para os funcionários da seção de m edalharia, que introduziu a esm altação em m etal na Casa da Moeda brasileira.

Ainda em 1975, foi convidada por Rubens Gerchm an, então diretor da Escola de Art es Visuais do Parque Lage, para lecionar na inst it uição.

Celeida era m uit o preparada, acabava de volt ar da I nglat erra e eu sabia disso. O convit e perm it iu que ela saísse do ost racism o em que vivia com o professora secundária do Est ado. Na EAV ela pôde desenvolver a plenit ude de sua capacidade e sensibilidade. Era um a época m uit o difícil. Sob a dit adura m ilit ar.41

Nesse m esm o ano a artista foi transferida da Secretaria de Educação e Cultura para o Departam ento de Cultura do Estado do Rio de Janeiro, ao qual a Escola de Artes Visuais, que funciona no Parque Lage, é vinculada, dando início à Oficina das Artes do Fogo e Transform ações de Materiais.

4 . Parque Lage, celeiro da s art es

O Parque Lage foi a grande usina criativa de Celeida Tost es, t ant o art íst ica quant o em suas at ividades de ensino. É a partir desse m om ent o que a confluência de sua atuação com o artista plást ica e educadora a t ornam um a pessoa

41 Conversa telefônica m inha com o artista Rubens Gerchm an, em j unho/ 2004.

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pública. No ano seguint e à sua ent rada na Escola, im plant ou a Oficina das Artes do Fogo e Transform ações de Mat eriais, na qual desenvolvia com os alunos um t rabalho sensorial, experim ent al e um a m et iculosa pesquisa e m anipulação de m ateriais do universo cerâm ico, pigm entos e, t am bém , m at eriais que hoj e seriam classificados com o reciclados: sobras da nat ureza e lixos produzidos pelo hom em .

Logo nos prim eiros anos, seu curso passou a ser recom endado por professores e disput ado pelos alunos. É curiosa a form a com o alguns de seus colegas, professores da EAV, transform aram o assistir às suas aulas no verbo “ celeidar” . Celeidar tornou- se um verbo para aqueles que precisavam t ranscender, com o conta o artista plástico Luiz Áquila, professor da EAV na m esm a época:

Quando aparecia gent e na m inha aula ou de out ros professores, que est avam m uit o rígidas, com m uit a dificuldade de criação, m uit a dificuldade ( ...) com pouca abert ura, preconceituosas, duras. “ Tá na hora de você Celeidar” , eu dizia. E iam pra aula da Celeida. Met iam a m ão na argila, faziam aquelas m assas absurdas que Celeida fazia, de pegar o lixo da lixeira e pôr esse lixo pra ferm ent ar e, a part ir desse lixo ferm ent ado, criar um a m assa plást ica. ( ...) Ou urinar sobre det erm inada coisa pra precipit ar a oxidação. Quer dizer, nenhum suco, nenhum líquido, nenhum a m at éria, pra Celeida, era hierarquizada. Ela não t inha hierarquia. Tudo t inha qualidade. O que é t ão difícil, porque o m undo é m uit o hierarquizado. ( Luiz Áquila, ent revist a, 2006)

Referências

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