Medidas perceptivo-auditivas e acústicas de voz e fala e
autoavaliação da comunicação das disartrias
São Paulo
2011
Tese apresentada à Universidade Federal de
São Paulo – Escola Paulista de Medicina, para
Medidas perceptivo-auditivas e acústicas de voz e fala e
autoavaliação da comunicação das disartrias
São Paulo
2011
Tese apresentada à Universidade Federal deSão Paulo- Escola Paulista de Medicina, para
Obtenção do Título de Doutor em Ciências
Orientadora: Profa. Dra. Mara Suzana Behlau
Padovani, Marina Martins Pereira Padovani
Medidas perceptivo-auditivas e acústicas de voz e fala e autoavaliação da comunicação das disartrias/ Marina Martins Pereira Padovani. - São Paulo, 2011. xvi - 92
Tese (Doutorado) - Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina. Programa de Pós-graduação em Distúrbios da Comunicação Humana.
Título em inglês: Vocal and speech acoustical measures, perceptual auditory analysis and communication self evaluated in dysarthrias
Descritores: disartria, acústica da fala, testes de articulação da fala, fala, voz
ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA
DEPARTAMENTO DE FONOAUDIOLOGIA
Chefe do Departamento: Profª. Drª. Maria Cecília Martinelli Iório
Diretora acadêmica do curso de Pós-graduação: Profª. Drª. Brasília Maria Chiari
Medidas perceptivo-auditivas e acústicas de voz e fala e
autoavaliação da comunicação das disartrias
Aprovado em: 25/02/2011
Presidente da banca:
Profa Dra Mara Behlau
BANCA EXAMINADORA
Profa Dra Aline Epiphanio Wolf
Prof Dr Henrique Ballalai Ferraz
Prof Dr João Carlos Papaterra Limongi
Profa Dra Letícia Lessa Mansur
Suplentes:
Profa Dra Elisabete Carrara -de-Angelis
Profa Dra Ingrid Gielow
Ao querido Arthur, meu filho,
que desde muito cedo aprende
o valor do trabalho.
AGRADECIMENTO ESPECIAL
Às amigas Glaucya Madazio e Renata Azevedo, que acreditaram na minha imersão no Doutorado quando eu não tinha quase nada a oferecer;
À Dra Mara Behlau e à Dra Brasília Chiari, que endossaram, acolheram e apoiaram o projeto, apostando em sua concretização.
sincera gratidão por permitir minha participação em um grupo tão especial e fraterno, sob sua liderança. Agradeço pelo aprendizado intenso e contínuo, por meio de sua indiscutível competência profissional e sábias atitudes. Obrigada pelo zelo, acolhimento e conselhos sempre pertinentes.
À Dra Brasilia Chiari, Diretora acadêmica do curso de Pós-graduação, pelo acompanhamento confiante à distância.
Aos meus pais, Mauro e Maria Teresa e meu irmão Marcos, pela retaguarda sólida e constante.
Ao querido João Bosco Lopes, pelo terno e incondicional companheirismo e pelas incríveis soluções gráficas.
À querida amiga Isabella Neto, prestativa incansável, pela disponibilidade nas revisões intermináveis a quatro mãos.
Ao estimado amigo Luciano Neves, pelo suporte e grande apoio na finalização da qualificação.
Às fonoaudiólogas muito queridas Natália Siqueira Spitaletti Araújo e Rafaela P. Della Giacoma Prado Rabelo, pelo “braço direito” e cobertura nos ambulatórios e pela disponibilidade para o trabalho em campo.
Ao grupo especial, composto por Gisele Oliveira, Glaucya Madazio, Rosiane Yamasaki e Miriam Moraes, pelos ótimos e divertidos momentos vividos, pela torcida e incentivo na finalização.
Ao grupo de colegas da pós Graduação Fabiana Zambon, Felipe Moretti, Vanessa Pedrosa e Marina Lang Fouquet, pela reciclagem do conhecimento e troca de experiências tão proveitosas.
Às parceiras Luana Curti, pelo pronto atendimento tão carinhoso, e Sabrina Paes, pelos socorros sempre bem humorados.
Aos assistentes do CEV, Guilherme Pecoraro e Flavia Pereira da Costa, pela pronta e eficiente resolução dos problemas.
Aos colegas queridos do Ambulatório de Neurolaringe, do Serviço de Laringe e Voz do Departamento de Otorrinolaringologia da UNIFESP, em especial à Dra Noemi de Biase, Dra Paula Lorenzon, Dr Gustavo Korn e Dr Bruno Moraes, e da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da UNIFESP, pela persistência no trabalho do grupo e pela paciência nas minhas longas ausências por este.
Aos amigos queridos do Spazio Bambini, pelo acolhimento, compreensão e torcida em toda a trajetória deste trabalho.
À rede de apoio e estrutura, composta pela família de fato e pela escolhida (turma SFX e 26ª turma FonoPauli), por acompanharem pacientemente e sofrerem diretamente, com poucas queixas, os sabores e dissabores da escolha do Doutorado.
À Claudia Santos, secretária do Departamento de Fonoaudiologia, por sua competente orientação e atenção às dúvidas, sempre tão paciente e gentil.
Ao estatístico Euro Couto pela paciente análise e plantão de dúvidas dos resultados deste trabalho e pelo grande empenho na tentativa da análise de Rasch.
Ao funcionário da UNIFESP Wagner Viana, do ponto de apoio à FAPESP, pela disposição gentil na resolução de problemas
À Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo – FAPESP, pelo financiamento deste projeto.
Dedicatória...v
Agradecimento especial...vi
Agradecimentos...vii
Lista de Figuras...x
Lista de Tabelas...xi
Lista de Gráficos...xiii
Lista de Quadros...xiv
Lista de abreviaturas...xv
Resumo...xvi
1 INTRODUÇÃO...1
1.1 Objetivos...5
2 REVISÃO DA LITERATURA...6
3 MÉTODO...15
4 RESULTADOS...25
5 DISCUSSÃO...57
6 CONCLUSÕES...68
7 ANEXOS...69
8 REFERÊNCIAS...86
Abstract... 91
Bibliografia consultada...92
Figura 1. Telas de análise do Módulo Multi-Dimensional Voice Program...21
Figura 2. Telas de análise do Protocolo Análise de voz e tremor, no Módulo
Motor Speech Profile...22
Figura 3. Tela da análise de transição do segundo formante, no Motor
Speech Profile, Sona Speech,CSL…...……...23
Figura 4. Relatório estatístico oferecido no módulo Análise de Voz, Voxmetria,
CTS Informática...23
Tabela 1. Distribuição da idade média e seu desvio padrão nos grupos estudados...15
Tabela 2. Resultados do Teste de Mann-Whitney, ajustado pela Correção de Bonferroni, na comparação grupo a grupo, na variável idade...16
Tabela 3. Distribuição do grau de disartria...18
Tabela 4. Resultados do Teste de Mann-Whitney, ajustado pela Correção de Bonferroni, na comparação grupo a grupo, na variável grau de disartria...19
Tabela 5. Análise perceptivo-auditiva vocal e da fala, com emprego da escala analógico-visual, em milímetros...26
Tabela 6. Medidas acústicas de frequência fundamental e índices de perturbação...28
Tabela 7. Medidas de tremor vocal...30
Tabela 8. Medidas de transição do segundo formante...31
Tabela 9. Variabilidade da frequência fundamental, em semitons...32
Tabela 10. Valores de corte, sensibilidade, especificidade e eficiência nas variáveis estabilidade da emissão, variabilidade da frequência fundamental, em % e semitons, shimmer APQ e magnitude da frequência (Mftr) e da amplitude (Matr) do tremor, na comparação entre todos os controles e todos os disártricos de grau 0 a 2 de disartria...34
Tabela 11. Área, erro padrão significância e intervalos de confiança da variável estabilidade...35
Tabela 12. Área, erro padrão significância e intervalos de confiança da variável variabilidade da frequência fundamental em % - vF0(%)...36
Tabela 13. Área, erro padrão significância e intervalos de confiança da variável shimmer APQ....37
Tabela 15. Área, erro padrão significância e intervalos de confiança da variável magnitude da
amplitude do tremor (Matr)...39
Tabela 16. Área, erro padrão significância e intervalos de confiança da variável variabilidade da
frequência fundamental, em semitons - vF0 (st)...40
Tabela 17. Valor total do protocolo Vivendo com Disartria (VcD)...41
Tabela 18. Média de cada seção do protocolo Vivendo com Disartria...42
Tabela 19. Média, desvio padrão, valores mínimos e máximos do total de cada seção do protocolo
Vivendo com disartria...44
Gráfico 1. Curva ROC da sensibilidade e especifidade da variável estabilidade...35
Gráfico 2. Curva ROC da sensibilidade e especificidade da variável variabilidade da
frequência fundamental, em %...36
Gráfico 3. Curva ROC da sensibilidade e especificidade da variável shimmer APQ...37
Gráfico 4. Curva ROC da sensibilidade e especificidade da variabilidade da frequência
fundamental, em semitons - vF0 (st)...38
Gráfico 5. Curva ROC da sensibilidade e especificidade da magnitude da amplitude do
tremor (Matr)...39
Quadro 1. Sequência de procedimentos de coleta de dados e análise...24
Quadro 2. Correlações entre as variáveis perceptivo auditivas e acústicas...33
Quadro 3. Quadro resumo das variáveis com diferença estatística entre controles
e experimentais...55
Quadro 4. Quadro resumo das variáveis com diferença estatística entre os grupos
experimentais...56
DL distonia laríngea
dp desvio padrão da frequência fundamental
DP doença de Parkinson
ELA Esclerose Lateral Amiotrófica
ELAb Esclerose Lateral Amiotrófica com predomínio dos sintomas bulbares
Fmáx frequência fundamental máxima
Fmín frequência fundamental mínima
F2 magn magnitude da variação do segundo formante F2 rate velocidade da variação do segundo formante F2 reg regularidade das variações do segundo formante F2 aver valor médio do segundo formante
GC≤45 anos grupo controle com idade menor ou igual a 45 anos GC>45 anos grupo controle com idade maior que 45 anos
Jitter RAP perturbação média relativa da variabilidade da frequência no período MDVP Multi-Dimensional Voice Program
Matr magnitude da amplitude do tremor
Mftr magnitude da frequência do tremor MG Miastenia Gravis
shimmer APQ quociente de perturbação da amplitude
st semitons
TE tremor essencial vocal VcD Vivendo com Disartria
vF0 (%) coeficiente de variação da frequência fundamental ROC Receiver Operating Characteristic
oferece melhor informação quanto às habilidades neuromotoras da fala e a efetividade
comunicativa e pode ser complementada com dados sobre o impacto do transtorno da fala na
qualidade de vida do paciente para customizar a reabilitação. O objetivo deste trabalho foi
caracterizar diversas disartrias com medidas perceptivo-auditivas, acústicas da voz e fala e
protocolo de autoavaliação. Participaram 106 indivíduos, de ambos os sexos, divididos em distonia
laríngea (DL), esclerose lateral amiotrófica (ELA) e esclerose lateral amiotrófica com predomínio
de sintomas bulbares (ELAb), Miastenia Gravis (MG), doença de Parkinson (DP), tremor essencial vocal (TE) e dois grupos controle até e acima de 45 anos. Todos tiveram a gravação da vogal “a” e
do ditongo “iu” em condições recomendadas, além do preenchimento do protocolo Vivendo com
Disartria. Os dados foram analisados com uso da escala analógico visual e dos programas Multi-Dimensional Voice Program, Kay Elemetrics e Vox Metria, CTS Informática. Os resultados mostraram que o ritmo discriminou o maior número de disartrias dos controles e a disartria por
distonia laríngea diferenciou-se no maior número de variáveis, exceto na integridade articulatória.
A variabilidade da frequência fundamental em semitons diferenciou todos os disártricos dos
respectivos controles, seguida pelo coeficiente de variação da frequência fundamental, em % e o
desvio padrão da frequência fundamental. As variáveis estabilidade e Mftr apresentam acurácia
satisfatória e melhor sensibilidade. As medidas Matr e ShimmAPQ também têm acurácia satisfatória, mas melhor especificidade, enquanto a medida variabilidade da F0(st) mostrou boa
acurácia, com estabilidade e sensibilidade boas. O escore total do protocolo Vivendo com Disartria
diferenciou a distonia laríngea da esclerose lateral amiotrófica e da sua variante bulbar, não
apresentou correlação com o grau de desvio da disartria, nem com as variáveis auditivas e
acústicas. Os efeitos na emoção, a insatisfação com a comunicação e a percepção de ajustes que
modificariam a comunicação foram as seções com maior escore nas doenças estudadas. Portanto,
houve correlação entre medidas auditivas e acústicas nas disartrias, com acurácia variada e, o
impacto na comunicação deve ser investigado independentemente do grau de desvio da disartria.
1. INTRODUÇÃO
As disartrias são definidas como alterações na sucessão dos sons resultantes de um
distúrbio no controle neuromuscular dos mecanismos da fala, que podem comprometer as funções
respiração, fonação, ressonância, articulação e prosódia, de forma isolada ou associada (Darley,
Aronson, Brown, 1969 a,b). Estes transtornos complexos da fala (Kent, Weismer, Kent, Vorperian,
Duffy, 1999) interferem em várias funções simultaneamente e tem sido diferentemente classificados
sob diversas perspectivas, tais como de acordo com a etiologia (Ward, Hanson, Berci, 1981),
localização da lesão (Darley, Aronson, Brown, 1969 a), com as características auditivas e acústicas
da voz e da fala (Aronson,1990) ou ainda por aspectos vocais e laríngeos (Ramig, Scherer, 1992).
As classificações facilitam a identificação do tipo de disartria, descrevendo suas manifestações
típicas em cada subsistema da fala; no entanto, não é incomum que os mesmos aspectos
fonoarticulatórios qualitativamente definidos, como por exemplo, voz soprosa ou articulação
imprecisa, estejam presentes em diferentes disartrias (Carrillo, Ortiz, 2007). Os aspectos alterados
da fala e da voz, o prejuízo funcional, a limitação e a restrição da participação em diferentes atividades poderão variar em sua intensidade dependendo do tipo de disartria (Hartelius, Elmberg,
Holm, Lövberg, Nikolaidis, 2008).
O fonoaudiólogo clínico especialista em voz pode ser um dos primeiros profissionais a ser
contatado pelo paciente, que percebe a interferência dos desvios de voz e fala em sua
comunicação social e profissional. Isto justifica a necessidade de se desenvolver e utilizar tarefas
dirigidas para detecção e categorização destes transtornos, uma vez que algumas disartrias
apresentam comprometimento vocal predominante, com alterações laríngeas e de fala associadas.
O diagnóstico é condição primordial para que o planejamento terapêutico seja feito e haja mais
chances de êxito (Goulart, Chiari, 2007), sendo recomendado o uso de instrumentos validados. A
seleção de tarefas sensíveis e específicas, de fácil administração, deve, então, compor o protocolo
de avaliação das disartrias (Goulart, Chiari, 2007).
Os recursos clínicos fonoaudiológicos disponíveis para a compreensão das disartrias
baseiam-se no tripé: avaliação perceptivo-auditiva, avaliação acústica da voz e fala e autoavaliação
do paciente.
A avaliação clínica geralmente identifica as alterações de voz, ritmo e velocidade de fala,
típicas nas disartrias (Smith, Ramig, 1996). O método mais utilizado para a descrição destas
alterações é a análise perceptivo-auditiva (Murdoch, 2005), que avalia a impressão global da
qualidade vocal e é considerada padrão-ouro na análise das disfonias em geral (Oates, 2009).
Muitas escalas foram utilizadas para analisar as disartrias, com protocolos de até 38 itens da fala e
intervalos de até 13 pontos de desvios (Murdoch, 2005), tornando-se possível caracterizá-las,
estabelecer relações com a fisiologia e o processo neuromuscular subjacente (Darley, Aronson,
disartrias entre si (Ludlow, Bassich, 1983). A escala analógico-visual, uma recente opção para
avaliação perceptivo-auditiva vocal, foi apresentada como robusta e sem influências de aspectos
culturais (Nawka, Anders, 2005), oferecendo valores de corte para os diferentes graus de alteração
vocal, dieferenciando uma faixa de variabilidade normal da qualidade vocal. Sua utilização na
avaliação das disartrias ainda é ainda insipiente, mas se mostra promissora na distinção das
mesmas (Moraes, Padovani, Madazio, Gielow, Behlau, 2010).
Alterações na qualidade vocal, ritmo, velocidade da fala e articulação interferem na
inteligibilidade da fala que, uma vez reduzida, pode provocar impacto crítico nas habilidades
comunicativas e limitar a participação vocacional, educacional e social do indivíduo (Hustad 2008).
Portanto, caracterizar adequadamente estas alterações pode oferecer condições para uma
reabilitação mais específica e eficaz.
Para complementar a avaliação perceptivo-auditiva, os dados objetivos da avaliação
acústica vocal computadorizada tornaram-se opção ao oferecerem informações não percebidas
pelo ouvido humano (Kent, Vorperian, Kent, Duffy, 2003), desde que cuidados específicos com a
análise qualitativa do sinal sonoro, condições de registro, protocolo e sistemas de gravação sejam
considerados para garantir a confiabilidade dos dados (Behlau, Madazio, Feijó, Pontes, 2001). Nas
últimas décadas, o desenvolvimento de sistemas de análise e programas de baixo custo facilitou o
uso da análise acústica vocal, popularizando as medidas que eram antes possíveis somente nos
grandes centros de pesquisa. No entanto, as tarefas mais sensíveis e adequadas ainda não foram
definidas, entre outras causas, por exemplo, pela própria limitação dos cálculos selecionados
nessa análise, que é mais confiável quanto menos alterada é a voz (Duffy, 2008).
Na possibilidade da voz disártrica ser um sinal menos periódico, a seleção de medidas
relacionadas à frequência fundamental mostra-se uma boa opção de análise (Titze,1995). A
frequência fundamental é o parâmetro mais resistente aos diferentes sistemas de análise acústica
(Behlau, Madazio, Feijó, Pontes, 2001) e o menos sensível aos meios de gravação (Yamasaki,
Behlau, 1998). Kent, Weismer, Kent, Vorperian, Duffy (1999) recomendam, para a avaliação do
subsistema laríngeo, medidas relacionadas à frequência fundamental (média, moda, extensão,
desvio-padrão, etc), medidas de perturbação (jitter – sensação psicoacústica da frequência fundamental, e shimmer- sensação psicoacústica da intensidade), de ruído e de tremor. Outra medida utilizada na caracterização de transtornos neurológicos é a variabilidade da frequência
fundamental, em semitons (Behlau, Madazio, Feijó, Pontes, 2001), que além de corroborar a
análise perceptivo-auditiva, em estudo com distonia laríngea e tremor essencial vocal,
apresentou-se distinta nas diversas disartrias avaliadas (Padovani, Moraes, Madazio, Lorenzon, Korn, de
Biase, 2010).
Medidas específicas para as disartrias, como as relacionadas ao tremor (magnitude da
repetir duas vogais combinadas, com transição rápida e rítmica dos pontos articulatórios, avaliando
assim a mobilidade articulatória), foram propostas e o sistema para analisá-las foi considerado
confiável para as alterações vocais nas disartrias (Kent, Weismer, Kent, Vorperian, Duffy, 1999). As
medidas de tremor diferiram vozes de indivíduos normais de pacientes com distonia laríngea e com
doença de Parkinson (Moraes, Padovani, Madazio, Gielow, Behlau, 2010). Já a análise do segundo
formante tem mostrado alta correlação com a percepção da inteligibilidade das vocalizações, e,
portanto, ser um preditivo da inteligibilidade de fala (Deliyski, Gress, 1996). Tais medidas foram
consideradas indicadores sensíveis do comportamento motor da fala (Deliyski, Gress, 1996).
Quando os dados acústicos são combinados aos dados perceptivos e fisiológicos, pode-se
obter uma melhor informação quanto às habilidades neuromotoras da fala e a efetividade
comunicativa do paciente (Orlikoff,1992).
A caracterização típica das disartrias, tradicionalmente delineada pela combinação de
dados perceptuais e acústicos, tem sido complementada há algumas décadas pela busca da
compreensão do impacto do transtorno da fala na qualidade de vida do paciente. Este dado é
fundamental para elucidar o real comprometimento da comunicação em diversas situações, além
de possibilitar a customização de programas de reabilitação. Esta preocupação com a percepção
do paciente tem como base a classificação da Organização Mundial de Saúde em deficiências,
incapacidades e desvantagens, atualmente revisada como Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) que define os componentes da saúde e do bem-estar
em saúde, tais como educação e trabalho (Farias, Buchalla, 2005). A partir desta nova visão e
classificação de saúde, vários protocolos de qualidade de vida foram desenvolvidos relacionados a
doenças específicas. Para a área dos transtornos motores da fala, o protocolo “Vivendo com
Disartria” (Puhl, Diaferia, Padovani, Behlau, 2009) pontua o grau de interferência das alterações do
paciente em diversas situações, dos níveis cognitivos ao fonoarticulatório da comunicação,
passando por aspectos ambientais, sociais e emocionais.
Uma seleção cuidadosa dos testes proverá informações mais apuradas e a avaliação mais
apropriada dos resultados. Determinar o melhor teste diagnóstico requer habilidade para buscar
evidências que descrevam a acurácia e a interpretação dos resultados (Fritz, Weinner, 2001). A
seleção de instrumentos de avaliação e diagnóstico clínico deve ser criteriosa, pois estes diferem
dos instrumentos de rastreamento em relação a seus objetivos e critérios de elegibilidade. Para
ambos os casos, a sensibilidade e a especificidade são indicativas da precisão de um instrumento
de avaliação, seja para rastreamento ou diagnóstico. Contudo, é importante levar em consideração
a reprodutibilidade, tempo para realização do teste ou exame e preparação prévia do paciente
Desta maneira, a investigação das características das propriedades dos recursos clínicos
disponíveis ao fonoaudiólogo para identificação e descrição das disartrias poderá favorecer a
1.1. OBJETIVOS
OBJETIVO GERAL
Caracterizar as disartrias na distonia focal laríngea adutora (DL), doença de Parkinson (DP),
Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), Esclerose Lateral Amiotrófica de predomínio de sintomas
bulbares (ELAb), Miastenia Gravis (MG), e no tremor essencial vocal (TE), por meio de avaliação perceptivo-auditiva, medidas acústicas da voz e fala e protocolo de autoavaliação da disartria e
identificar quais variáveis discriminam disártricos e não disártricos.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
1. Caracterizar a avaliação perceptivo-auditiva nas variáveis qualidade vocal, estabilidade,
velocidade de fala, ritmo e integridade articulatória, nas doenças estudadas.
2. Caracterizar a avaliação acústica computadorizada, por meio de medidas da frequência
fundamental (freqüência fundamental máxima – Fmáx; e mínima - Fmín; desvio-padrão da
frequência fundamental – dp; coeficiente de variação da frequência fundamental - vF0); de
perturbação (perturbação média relativa da variabilidade do período - jitter RAP; quociente de perturbação da amplitude - shimmer APQ), medidas de tremor (magnitude da frequência – Mftr- e da amplitude do tremor – Matr) e de transição do segundo formante (magnitude da variação do
segundo formante - F2 magn; velocidade da variação do segundo formante - F2 rate; regularidade
das variações do segundo formante - F2 reg; valor médio do segundo formante - F2 aver).
3. Caracterizar a autoavaliação do impacto da disartria na qualidade de vida, por meio do protocolo
Vivendo com Disartria –VcD.
4. Determinar a especificidade e sensibilidade das variáveis com significância estatística que
2. REVISÃO DA LITERATURA
A avaliação da disartria é baseada em características qualitativas e a procura por atributos
capazes de identificar a presença desses transtornos da fala e distinguí-los, tem sido interesse de
pesquisadores, devido à importância diagnóstica do procedimento. A busca por medidas objetivas
complementares tornou-se objeto atual de investigações por agregar valor diferencial no
diagnóstico das disartrias. Conjuntamente, a valorização do conhecimento do impacto da disartria
sob a perspectiva do paciente consolida a avaliação, pois oferece protocolos específicos com
informações mais pertinentes à doença subjacente.
O presente capítulo oferece uma revisão da literatura sobre a avaliação da disartria e os
aspectos específicos para sua caracterização, a utilização da análise acústica computadorizada
complementar e o uso de protocolos de autoavaliação na área dos transtornos motores da fala.
Caracterização e avaliação das disartrias
O primeiro protocolo para avaliação clínica das disartrias foi baseado em análise
essencialmente perceptivo-auditiva (Darley, Aronson, Brown, 1969 a,b). Esta classificação
estabeleceu a correlação entre características desviadas da fala e presumida fisiopatologia e é
utilizada até os dias de hoje. Os autores listaram dez dimensões mais comprometidas em sete
subtipos de disartrias, entre eles, monoaltura e voz áspera foram descritas em todos os subtipos,
soprosidade foi característica das disartrias hipocinéticas e flácidas; sendo que esta última também
apresentou inspiração audível. A qualidade vocal tensa-estrangulada estava presente nas disartrias
espásticas e hipercinéticas por distonia, e o controle da frequência estava comprometido nas
espásticas e mistas.
A proposta tradicional de Darley, Aronson, Brown (1969 a,b) divide as disartrias em: flácida,
espástica, hipocinética, hipercinética, atáxica e mista. As disartrias flácidas são consequência das
lesões dos nervos cranianos motores e nos nervos espinhais, caracterizando-se por fraqueza
atrofia e fasciculação muscular e perda ou redução dos reflexos musculares (Murdoch,
Thompson-Ward, 2005). A paralisia do nervo vago é seu representante mais comum na clínica
fonoaudiológica, de fácil caracterização, não representando desafio diagnóstico tão complexo como
outros tipos de disartrias. A Miastenia Gravis, com comprometimento da junção mioneural, apresenta também características da disartria flácida, com a fadiga vocal como uma das principais queixas (Gamboa, Jiménez-Jiménez, Mate, Cobeta, 2001). Esta doença apresenta incidência de
5,3 casos por milhão de pessoas/ano e 77,7 casos/ milhão de pessoa de prevalência (Carr,
Cardwell, Mc Carron, Mc Conville, 2010).
Nas disartrias hipocinéticas, a doença de Parkinson é a mais comum e apresenta disfunção
manifestações motoras e é a segunda doença neurodegenerativa mais comum em idosos, com
prevalência estimada de 3,3% no Brasil, de acordo com o estudo de Barbosa, Caramelli, Maia,
Cunningham, Guerra, Lima-Costa, Cardoso (2006). Suas características vocais e de fala são
extensamente descritas e compreendem: voz fraca, monótona, de qualidade soprosa e/ou rouca e
articulação imprecisa (Darley, Aronson, Brown, 1969b).
Outras alterações no circuito dos gânglios da base podem provocar as disartrias
hipercinéticas, verificadas nas distonias laríngeas ou disfonia espasmódica. A distonia focal de
adução é a mais frequente das distonias laríngeas, sendo observada forte contração dos músculos
adutores durante a fonação (De Biase, Lorenzon, Lebl, Padovani, Gielow, Madazio, Moraes, 2006),
com prevalência estimada em 1.1/ 100,000 habitantes (Pekmezović, Ivanović, Svetel, Nalić,
Smiljković, Raičević, Kostić, 2003). A distonia adutora é observada preferencialmente em mulheres,
com idade média, é usualmente esporádica e sua manifestação típica é de tensão vocal,
interrupções bruscas e instabilidade vocal, comprometendo em graus variáveis a inteligibilidade de
fala (Brin, Fahn, Blitzer, Ramig, 1992). A análise acústica da voz traduz objetivamente os padrões
vocais audíveis e permite a identificação da tensão e das quebras nestes casos.
Os gânglios da base podem ainda estar relacionados às alterações no controle motor,
como nos tremores, observados no tremor essencial. Este é o distúrbio do movimento mais comum
que, além de acometer membros e cabeça, pode levar a contrações rítmicas da laringe em 10 a
20% dos indivíduos, com intensificação sob tensão ou cansaço, e em 30% dos casos, tais tremores
vocais podem estar associados às disfonias espasmódicas (Aronson, 1990; Schaefer, 1983). O
tremor essencial vocal tende a acometer mais mulheres que homens, com até 50% dos casos com
história familiar de tremor. Cerca de 50% dos casos apresentam tremor de extremidade superior de
intensidade similar ao visto em indivíduos de mesma idade, sem o componente vocal. O tremor
essencial vocal pode levar anos para ser diagnosticado desde sua instalação e não é incomum que
seja confundido e diagnosticado inadequadamente como disfonia espasmódica (Sulica, Louis,
2010).
Finalmente, as disartrias mistas podem envolver dois ou mais tipos de disartrias, causadas
por diversos transtornos que afetam os vários níveis do sistema nervoso, podendo ser de causa
degenerativa, inflamatória, traumática, vascular, tóxica (Theodoros, 2005). A ELA tem sido
apontada como uma das prinicipais causas da disartria mista mais comum, espástica-flácida, com
88% dos casos com esta condição (Duffy, 1995). Sua incidência está na faixa entre 1.5 a 2.5/
100.000 por ano, levemente maior em homens (Logroscino, Traynor, Hardiman, Chiò, Mitchell,
Swingler, Millul, Benn, Beghi, 2010) e seus sintomas, tais como, fraqueza nos membros, disartria,
disfagia e insuficiência respiratória cursam com progressão fatal (Soriani,Desnuelle, 2009).
Alterações fonatórias estão relacionadas não somente à presença de transtornos na
qualidade vocal, mas podem estar associadas aos déficits na comunicação geral (Kent, Vorperian,
de fala, reduzindo-a (Smith, Ramig, 1996), o que demonstra a interação entre os subsistemas da
fala.
Carrillo e Ortiz (2007) utilizaram a avaliação clínica e acústica para descrever as disartrias
flácidas, espástica, hipocinéticas, hipercinéticas, mistas e com comprometimento do neurônio motor
unilateral, avaliando tipo de voz, ressonância, loudness, pitch, ataque e estabilidade vocal. A instabilidade vocal esteve presente em todos os tipos de disartria estudadas e outras
características, como voz rouca, soprosa e tensa, loudness reduzida e ressonância laringo-faríngea, foram os mais encontrados nessa caracterização. O ataque vocal não se mostrou
alterado, sendo classificado como isocrônico.
Outros estudos caracterizaram os transtornos motores da fala, com protocolos clínicos,
entre eles, Ribeiro, Ortiz (2009) analisaram sessenta protocolos de disartria, encontrando o
predomínio das seguintes características: ciclos respiratórios curtos, voz rouca, hipernasal,
alteração moderada a grave de articulação, discreta alteração de prosódia e velocidade lenta de
fala nos tipos de disartria mais observados, a saber, disartria do neurônio motor unilateral e flácida.
Para a avaliação clínica recomenda-se o uso de tarefas específicas para a disartria. Em
artigo de revisão, Kent e Kent (2000) descreveram que as tarefas tipicamente utilizadas na
avaliação das disartrias são: fonação de vogal sustentada, repetição de sílaba, leitura de texto e
conversação. Tais tarefas permitem classificar o tipo da disartria, descrever subgrupos e variações
individuais e indicam a possível fisiopatologia nos subsistemas da produção da fala. A tarefa direta
e simples da emissão prolongada da vogal sustentada isola o sistema respiratório-fonatório da fala
e oferece vantagens para a análise perceptivo-auditiva e acústica. As tarefas de vogal sustentada e
diadococinesia tem mínima interferência da língua e podem ter um valor universal no estudo da
disartria (Kent e Kent, 2000).
A escala analógico-visual pode ser utilizada na mensuração do grau de diversos aspectos
tais como, qualidade vocal e seus tipos (rugosa, soprosa, tensa, etc), desvios de pitch, loudness, ressonância, estabilidade, entre outros. Moraes, Padovani, Madazio, Gielow, Behlau (2010)
avaliaram a estabilidade da emissão em jovens e idosos sadios, parkinsonianos e sujeitos com TE,
correlacionando a avaliação do desvio da estabilidade por meio da escala analógico-visual com a
análise acústica. As autoras encontraram, na escala analógico-visual, valores médios de 20,4mm
para os jovens, 39,6mm para os idosos, 58mm para os parkinsonianos e 90,4mm para os sujeitos
com tremor. Esta avaliação confirmou os dados da análise acústica, que utilizou medidas de
tremor.
Embora a avaliação perceptivo-auditiva seja a análise mais comumente empregada na
clínica e na pesquisa, a confiabilidade intra e inter-avaliadores é flutuante entre as pesquisas e os
fatores de discordância podem ser resultado dos métodos utilizados para coletar as avaliações e
não problemas nas habilidades perceptivas ou inconsistência dos juízes (Kreiman, Gerrat, Ito,
Levin, Elluru (2010) quantificaram a confiabilidade intra e inter-sujeitos, em avaliação auditiva por
fonoaudiólogos experientes em pacientes pediátricos. Observaram que o grau de concordância
variou de acordo com o parâmetro, com valor muito pobre para tensão. Já para o grau geral do
desvio da qualidade vocal, entre outros aspectos, a associação foi moderadamente forte.
Concluem, então, que algumas características perceptivas podem aumentar a variabilidade de
análise de ouvintes especialistas, principalmente quando avaliadas em conjunto e nos casos de
disfonia com fonte sonora vibratória instável.
Dentre os atributos qualitativos, novos critérios para a inteligibilidade de fala foram testados,
como a influência da redução da velocidade articulatória e o acréscimo da intensidade da fala nos
escores de inteligibilidade em tarefas com palavras, frases e pseudopalavras. Em relação à
intensidade e velocidade, não houve interferência de nenhum dos dois na inteligibilidade,
reforçando que as pistas contextuais exercem mais efeito sobre a inteligibilidade da fala que as
informações independentes do sinal acústico (Barreto e Ortiz, 2008). O efeito do controle na
velocidade de fala, velocidade articulatória e inteligibilidade, também foram verificados utilizando-se
sete mecanismos. Apesar de vários estudos considerarem a relação entre a velocidade de fala e a
inteligibilidade da mesma (Marshall, Karow, 2002; Yorkston, Dowden, Beukelman,1992) o controle
da velocidade não melhorou a inteligibilidade global dos disártricos flácidos, atáxicos, hipocinéticos
e de comprometimento do neurônio motor superior unilateral, contudo um aumento significativo da
inteligibilidade foi encontrado em cinco dos dezenove participantes, indicando que o efeito do
controle da velocidade na inteligibilidade é independente da velocidade habitual de fala e do tipo de
disartria. Os métodos para controlar a velocidade resultam na redução da velocidade de fala e no
controle da velocidade pode ter efeito inverso na inteligibilidade (Nuffelen, De Bodt, Wuyts, Van de
Heyning, 2009).
A limitação da inteligibilidade de fala pode ter impacto crítico nas habilidades comunicativas
e pode comprometer a participação vocacional, educacional e social. Para a avaliação deste
aspecto, além dos fatores diretamente relacionados à amostra de fala a serem analisados,
aspectos relacionados aos avaliadores também devem ser considerados. A compreensão dos
ouvintes foi correlacionada com os escores das transcrições de inteligibilidade nos vários graus de
disartria da paralisia cerebral. No entanto, não houve relação entre escores de inteligibilidade e os
de compreensão dos ouvintes (Hustad,2008).
Duffy (2008), em artigo de atualização sobre os transtornos motores da fala, ressalta a
importância das pesquisas clínicas para melhorar a capacidade diagnóstica e comenta que, apesar
da contribuição das medidas acústicas e fisiológicas, as conclusões extraídas da avaliação
perceptivo-auditiva da fala são o padrão-ouro. No entanto, a avaliação perceptivo-auditiva
caracteriza, mas não discrimina os diversos transtornos. A especificidade da avaliação clínica é
doenças, como por exemplo, a lentidão ou a alteração do ritmo na repetição de sílabas (Portnoy,
Aronson, 1982).
Chiari e Goulart (2007), em análise sobre instrumentos de avaliação na Fonoaudiologia,
citam dois objetivos distintos que cabe ressaltar na seleção de testes para triagem ou avaliação: a
acurácia e a precisão. A acurácia se refere à capacidade de uma medida ser correta na média.
Quando a medida não é acurada, é viciada. A precisão, também conhecida como reprodutibilidade
ou confiabilidade, é a capacidade de a medida dar o mesmo resultado (ou um resultado muito
semelhante) nas medições repetidas de um mesmo fato. As autoras distinguem testes de
rastreamento, que são testes com habilidade em categorizar adequadamente os indivíduos com
sintomas "pré-clínicos", nos quais a sensibilidade e especificidade devem ser altas, dos testes
diagnósticos. Estes são mais precisos e com maior detalhamento em relação ao agravo ou doença
relacionada, agregam informação que contribui para o planejamento terapêutico e complementam
o diagnóstico, portanto a especificidade deve ser alta. A atenção à confiabilidade, sensibilidade e
utilizada deve também ser considerada na seleção de instrumentos para a avaliação dos
resultados terapêuticos (Carding, Wilson, Mackenzie, Deary, 2009).
Avaliação acústica
A análise acústica, sempre complementar à auditiva, auxilia na quantificação dos dados e
nas descrições das correlações dos julgamentos perceptivos de inteligibilidade de fala, qualidade
vocal e tipo de disartria (Carrillo, Ortiz, 2007). Os principais objetivos da sua aplicação nas doenças
neurológicas são: contribuir para o diagnóstico de diferentes subsistemas neurológicos;
documentar a degeneração progressiva de uma doença neurológica, além de identificar
manifestações subclínicas da mesma (Amir, Dukas, Shnaps-Baum, 2005; Deliyski, Evans, Shaw,
2005; Urban, Rolke, Wicht, Keilmann, Stoeter, Hopf, Dieterich, 2006).
Duffy (2008) comenta que medidas fisiológicas e acústicas podem enriquecer a avaliação
da disartria, proporcionando apoio e pistas para o diagnóstico
.
Apesar de promissora, a análiseacústica requer cuidados (Titze, 1995), pois algumas vezes os programas, mesmo com medidas
específicas para as disartrias (Motor Speech Profile – MDVP), não conseguem avaliar todas as
emissões, chegando a perder até 30% da amostra, limitando a aplicação clínica (Wang, Kent,
Duffy, Thomas, 2009). Além da impossibilidade da análise em uma parte da amostra, deve-se
atentar, também, para a aplicabilidade das medidas, pois para algumas sugeridas para as
disartrias, como as medidas de tremor, do programa MDVP, da Kay Elemetrics, a consistência
apresentou-se baixa, na avaliação de indivíduos sadios. Porém, a consistência entre a análise de
várias emissões do mesmo sujeito mostrou-se alta para medidas da frequência fundamental e
aceitável para medidas de perturbação de frequência e amplitude, ruído, subharmônicos e
Apesar das dificuldades já discutidas, reconhece-se a utilidade do uso das medidas do
programa MDVP, da Kay Elemetrics, na avaliação da fala disártrica, com especial atenção para
alguns parâmetros que possuem valor especial na descrição destas alterações. Sugere-se que a
confiabilidade de tais medidas deva ser comparada com sujeitos controle (Kent, Vorperian, Duffy,
1999). Outros programas de baixo custo, como o Vox Metria, da CTS Informática, mostraram-se
viáveis na avaliação das disartrias em medidas específicas, como a variabilidade da fundamental
(Padovani, Moraes, Madazio, Lorenzon, Korn, de Biase, 2010).
A avaliação acústica apresenta dificuldades metodológicas inerentes às suas
características, principalmente para a avaliação de desvios vocais mais intensos, como rupturas
fonatórias, imprecisão articulatória, entre outras. Na associação da acústica com aspectos de
controle motor da fala, muitas das medidas acústicas não diferenciam os tipos de transtornos
neurológicos entre si, nem dos grupos normais. Nas disartrias, as vogais geralmente estão
centralizadas, com redução da área acústica, podendo haver instabilidade no padrão dos
formantes, com queda no segundo formante, nas zonas de transição. Portanto, medidas para
aspectos do controle motor da fala quanto à fonação, articulação, função velar e prosódia são
sugeridas, mas, apesar de se reconhecer algumas correlações, não se sabe se as propriedades
acústicas sempre serão correlacionadas às descrições perceptivas (Kent, Weismer, Kent,
Vorperian, Duffy, 1999).
Os estudos com análise acústica ora utilizam medidas relacionadas à frequência
fundamental, índices de perturbação e ruído (Baken, 1987) em programas tradicionais e
disponíveis para uso clínico, como o da Kay Elemetrics; ora apresentam medidas mais complexas,
por vezes desenvolvidas especialmente para aquele estudo, como o de Akermann, Ziegler (1991).
Neste estudo, os autores avaliaram, por meio da análise acústica da fala de doze pacientes com
DP idiopática, valores de tempo da fala e acurácia da articulação, baseados na duração dos
movimentos de abertura e fechamento durante a articulação e a intensidade da emissão, durante a
oclusão articulatória na emissão de sons plosivos. Os autores verificaram capacidade reduzida de
oclusão articulatória completa, que pode refletir uma redução na amplitude do movimento dos
articuladores.
Na DP, Kent e Kent (2000) descreveram que a frequência fundamental apresenta
variabilidade restrita, jitter ou shimmer podem estar aumentados e a proporção harmônico–ruído reduzida, além da possibilidade de tremor entre seis e oito Hertz. Aspectos relacionados às
características da prosódia de mulheres com DP (DP) também são descritos e apontam que nas
parkinsonianas há pequena variação da frequência fundamental da voz, implicando em menor
tessitura; velocidade mais lenta, o que corresponde ao caráter monótono na fala do parkinsoniano;
e maior intensidade vocal, provavelmente compensatória à tessitura vocal reduzida (Azevedo,
de variação da frequência (vf0) e o coeficiente de variação da amplitude (vam) (Gonzalez, Cervera,
Miralles, 2002).
Kent e Kent (2000) encontraram ainda altos valores no percentual de variação da frequência
fundamental e na variação da amplitude, além de aumento nos parâmetros de jitter e shimmer quando avaliaram trinta e seis parkinsonianos. Carrilo, Ortiz (2007) selecionaram os seguintes
parâmetros para a análise acústica quantitativa de diversas disartrias: F0 (frequência fundamental)
e seus índices de perturbação (jitter e shimmer) e medidas de ruído - Glottal to NoiseExcitation Ratio (GNE). Não houve diferença entre as médias do tempo máximo de fonação nos diferentes sexos, em relação aos tipos de disartria. Em relação às medidas quantitativas, não houve diferença
da frequência fundamental entre os sexos nas diferentes disartrias. Quanto às variáveis
ciclo-a-ciclo, tais como jitter e shimmer, observou-se que em todos os tipos de disartria elas se mostraram aumentadas. As autoras concluem que os dados da análise perceptual auditiva e acústica nas
disartrias contribuem para o diagnóstico clínico das disartrias.
Uma outra medida, a variabilidade da frequência fundamental, tornou-se objeto de estudo
por evidenciar a falta de controle neural na sustentação da sonorização. Padovani, Moraes,
Madazio, Lorenzon, Korn, de Biase (2010) utilizaram a referida medida para diferenciar DL, TE e
vozes adaptadas. Os valores da variabilidade da frequência fundamental obtidos foram
estatisticamente significantes, maiores para a distonia focal laríngea, com média de 14 semitons,
seguido pelo tremor vocal (8,82 semitons) e, pelas vozes do grupo controle (1,14 semitons), em
média.
Além das medidas tradicionais da análise acústica (frequência fundamental e suas
variações, medidas de perturbação e ruído), a análise da diadococinesia, medidas de tremor e da
transição do segundo formante são importantes para a caracterização do paciente disártrico
(Deliyski, Gress,1996). Moraes, Padovani, Madazio, Gielow, Behlau (2010) compararam a análise
perceptivo-auditiva e acústica de emissões vocais sustentadas, em pacientes com DP e TE,
mensurando-se especificamente os parâmetros que correspondem à percepção de instabilidade à
fonação e medidas de tremor. Os resultados obtidos da análise acústica mostraram que os valores
de variabilidade da frequência fundamental nas três medidas de tremor (vf0, MFtr, Matr), foram
maiores para o grupo de tremor essencial, reduzindo consecutivamente para os grupos Parkinson,
controles idosos e controles jovens.
Outra medida objetiva bastante estudada e valorizada nas disartrias corresponde aos
valores dos formantes das vogais ou seus correlatos. A produção dos diversos formantes é um
mecanismo essencialmente articulatório, sendo que, geralmente, o grau de abertura de uma vogal
tem relação direta com o primeiro formante e o grau de anteriorização da vogal, ou o quanto a
faringe está livre ou não, pelo deslocamento da língua, relação direta com o segundo formante,
com valores distintos entre os sexos (Fant, 1970; Russo, Behlau, 1983, Behlau, Madazio, Feijó,
de segundo formante e dados de inteligibilidade de fala coletados de uma técnica estimada de
magnitude direta, em disartrias por DP e acidente vascular encefálico. Como resultados, os grupos
disártricos apresentaram redução significativa das pistas de transição de segundo formante, mas
não se diferenciaram entre si. Os autores concluem que algumas variáveis acústicas, como as
pistas do segundo formante, podem ser usadas para desenvolver uma métrica quantitativa da
intensidade dos déficits nas disartrias. Ainda, pelo fato destas medidas de transição do segundo
formante apresentarem alta correlação com medidas de inteligibilidade de fala, os autores sugerem
que estas poderiam servir como um índice do déficit do controle motor da fala, principalmente por
ser uma simples medida de fala.
Uma medida acústica alternativa, o Formant Centralization Ratio (FRC), foi testada por Sapir, Ramig, Spielman, Fox(2010), extraída de frases curtas, com a hipótese de ser mais eficiente
para diferenciar disártricos de falantes saudáveis e para registro da eficácia do tratamento.
Concluíram que, apesar de preliminares, os achados indicam que o FCR é sensível, válido, com
medidas confiáveis, provavelmente por causa da reduzida variabilidade de sensibilidade
inter-falante e melhor sensibilidade na centralização da vogal. Carmichael (2007) também elaborou um
sistema computadorizado para avaliar a articulação e a inteligibilidade e encontrou diferenças entre
os disártricos e seus controles, sugerindo os escores da inteligibilidade como medida padrão.
Desta maneira, as medidas relacionadas aos formantes podem oferecer dados importantes para
diferenciar os disártricos.
Protocolos de autoavaliação
A determinação da intensidade de uma disartria pode ser presumida por critérios subjetivos
e objetivos. No entanto, o impacto deste transtorno na qualidade de vida de um disártrico só pode
ser mensurado pelo próprio paciente. A relevância desta informação poderá modificar a
reabilitação, tornando-a mais eficiente.
A Organização Mundial de Saúde tem como uma de suas missões produzir classificações
em vários campos da saúde, a fim de facilitar a formação de base de dados, levantamentos e
análises. Para as condições de saúde relacionadas às doenças, transtornos ou lesões, temos o
CID-10. Porém, a necessidade de conhecer o que acontece com os pacientes após o diagnóstico,
com o decorrer do tempo, em relação às doenças crônicas e aos acidentes, torna-se cada vez mais
importante para a área da saúde. O modelo da CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade,
Incapacidade e Saúde) substitui o enfoque negativo da deficiência e da incapacidade por uma
perspectiva positiva, considerando as atividades que um indivíduo que apresenta alterações de
função e/ou da estrutura do corpo pode desempenhar, assim como sua participação social. A CIF
representa uma mudança de paradigma para se pensar e trabalhar a deficiência e a incapacidade,
de políticas de inclusão social. A partir desta nova classificação, uma série de protocolos foram
desenvolvidos em relação à qualidade de vida e o transtorno de saúde (Farias, Buchalla, 2005).
Para as disartrias, foi proposto um questionário de autoavaliação, denominado “Living with Diysarthria” (Hartelius, Elmberg, Holm, Lövberg, 2008), com o objetivo de detectar as dificuldades de fala auto-referidas pelo paciente disártrico. Este protocolo pode ajudar o clínico a identificar
situações nas quais o paciente necessite de instrução ou suporte para melhorar a inteligibilidade de
fala. O protocolo compreende cinquenta questões, divididas em 10 seções, que abordam aspectos
desde a identificação de dificuldades específicas na produção da fala e voz até a interferência de
questões comportamentais, sociais e ambientais. Neste estudo, destacaram as afirmações que
foram respondidas com “parcialmente e totalmente verdadeiro” por mais de 50% dos sujeitos
estudados. De forma geral, as dificuldades estavam relacionadas à restrição de participação na
comunicação, possibilidade de participar ativamente em estudos e no trabalho e expressar a
personalidade, além da relação com a emoção e o número de familiares em situações
comunicativas. Os autores verificaram que o grau de dificuldade foi variado e não se correlacionou
com idade, sexo, diagnóstico, duração da doença ou emprego. A intensidade da disartria não pode
predizer a extensão da percepção das dificuldades de comunicação.
Este questionário foi traduzido e adaptado culturalmente por Puhl, Diaferia, Padovani,
Behlau (2009), denominado “Vivendo com Disartria”, e aplicado em 32 sujeitos com DP, com grau
moderado da disartria. Encontraram o valor médio de 170 pontos, sem relação com a intensidade
da disartria. Os pacientes apontaram consequências dessa disartria em vários aspectos da
3. MÉTODO
A presente pesquisa, aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UNIFESP sob protocolo
1885/08, foi desenvolvida no Departamento de Fonoaudiologia da UNIFESP, no Setor de Laringe e
Voz do Departamento de Otorrinolaringologia da UNIFESP, no Setor de Doenças Neuromusculares
do Departamento de Neurologia da UNIFESP, no Serviço de Fonoaudiologia da Associação Brasil
Parkinson – ABP para a coleta de dados, e do Centro de Estudos da Voz - CEV, para a análise
acústica computadorizada.
Participaram do estudo 106 indivíduos, de ambos os sexos, divididos em 8 grupos, seis
experimentais e dois controles. Os seis grupos experimentais compreenderam 13 indivíduos com
DL, 4 homens e 9 mulheres, entre 31 e 80 anos, média 58,69; 12 com ELA, 6 homens e 6
mulheres, entre 41 e 77 anos, média 58,25; 8 com ELAb, 4 homens e 4 mulheres, entre 42 e 67
anos, média 57,88; 8 com MG, 1 homem e 7 mulheres, entre 17 e 54 anos, média 37,25; 17 com DP, 14 homens e 3 mulheres, entre 54 e 84 anos, média 72,53; e 10 com TE, 2 homens e 8
mulheres, entre 36 e 88 anos, média 66,40. Os dois grupos controle foram divididos em idade até
45 anos (grupo controle ≤ 45/ GC≤45), com 23 sujeitos, 12 homens e 11 mulheres, média 29,52; e
o outro a partir de 46 anos (grupo controle > 45/ GC>45), com 15 sujeitos, sendo 10 mulheres e 5
homens, média 61,00 (Tabelas 1). A análise estatística por meio do Teste de Kruskal‐Wallis e do Teste
de Mann‐Whitney, ajustado pela Correção de Bonferroni, mostrou que o grupo controle ≤ 45 anos não
apresentou diferença estatística quanto à idade quando comparado com o grupo MG, ocorrendo o
mesmo com o grupo controle > 45 anos e os grupos DL, ELA, ELAb, DP e TE (Tabela 2).
Tabela 1 – Distribuição da idade média e seu desvio-padrão nos grupos estudados.
Grupo n Média desvio-
padrão
Controle ≤ 45 anos 23 29,52 5,76
Controle > 45 anos 15 61,00 9,76
DL 13 58,69 14,64
ELA 12 58,25 11,23
ELAb 8 57,88 9,05
MG 8 37,25 12,65
DP 17 72,53 7,69
TE 10 66,40 13,52
Total 106 53,91 18,27
Tabela 2 – Resultados do Teste de Mann-Whitney, ajustado pela Correção de Bonferroni, na comparação grupo a grupo, na variável idade.
Variável
Controle ≤ 45
X MG
Controle > 45
X DL
Controle > 45
X ELA
Controle > 45
X ELAb
Controle > 45
X DP
Controle > 45
X TE
Idade 0,074 0,661 0,643 0,605 0,002 0,149
Os grupos experimentais foram coletados em ambulatórios de atendimento multidisciplinar
específico para transtornos neurológicos. Os pacientes com DL e TE pertenciam ao Setor de
Laringe e Voz do Departamento de Otorrinolaringologia da UNIFESP e foram convidados a
participar durante sua primeira consulta ou no retorno médico/fonoaudiológico. Os pacientes
diagnosticados com ELA, ELAb e MG frequentavam o Setor de Doenças Neuromusculares do
Departamento de Neurologia da UNIFESP e os com DP, o Serviço de Fonoaudiologia da
Associação Brasil Parkinson – ABP. Nestes dois locais, a coleta foi realizada nos dias das
avaliações fonoaudiológicas agendadas para admissão nos referidos serviços. Os dois grupos
controles foram convocados a partir da rede de contato social da pesquisadora ou por convite aos
acompanhantes dos pacientes ou funcionários dos Serviços visitados.
Critérios de inclusão e exclusão
Para os grupos com transtornos neurológicos, era necessário ter diagnóstico realizado por
um neurologista clínico, estar estável em suas medicações específicas, nos casos de DP, ELA dos
dois tipos e MG, e sem efeito de toxina botulínica, nos casos das distonias laríngeas.
Houve a preocupação de garantirmos as condições cognitivas de compreensão para
resposta ao questionário de autoavaliação verificando se os sujeitos não eram institucionalizados,
eram responsáveis por seu autocuidado e se foram aptos a responder questões de identificação,
tempo, sinais e sintomas das doenças compatíveis com os dados de prontuário e/ou confirmados
por seus acompanhantes.
Na DP, optou-se por checar o risco para demência com o uso do Informant Questionnaire
on Cognitive Decline in the Elderly (IQCODE), que é um instrumento sugerido pelo DSM IV para a
triagem de demências, eficaz, ou seja, com boa especificidade e sensibilidade, de fácil aplicação e
padrão em estudos internacionais. Na DP, o comprometimento cognitivo é comum mesmo nos
indivíduos não dementes (Melo, Barbosa, Caramelli, 2007), com déficits cognitivos principalmente
de memória e das funções executivas (Muslimovic, Post, Speelman, Schmand, 2005), com
prevalência estimada entre 18,7% e 40% (Barbosa, Lefèvre, Comerlatti, Scaff, Canelas, 1987;
O IQCODE é um questionário para detecção do declínio cognitivo com base no relato do
informante, desenvolvido na Austrália, no idioma Inglês, composto, em sua versão original, por 26
itens. As respostas estão organizadas em uma escala Likert, com cinco opções, de “muito melhor”
até “muito pior”. O resultado final é obtido pela soma ponderada dos itens, dividindo-os pelo total de
itens da escala. O escore varia de um a cinco; os escores menores ou iguais a três indicam que
não está havendo alteração, igual a quatro indica uma considerável alteração, e igual a cinco indica
muita alteração. O IQCODE foi adaptado transculturalmente para o português brasileiro (Sanchez,
Lourenço, 2009) e apresenta uma versão resumida de 16 itens (Jorm, 1994). O ponto de corte
obtido no estudo original foi de 3,27/3,30 (Jorm, Korten, 1988). Estudos brasileiros mostraram
como valores de corte para indicar possíveis suspeitos de demência/déficit cognitivo o valor igual
ou maior que 3,40 (Hototian, 2004). Nesta pesquisa, os sujeitos com DP apresentaram valores
entre 2,81 e 3,44.
Como critério de exclusão, não foram incluídos os tabagistas, sujeitos que fizessem uso
profissional da voz ou tivessem realizado fonoterapia prévia, com antecedentes psiquiátricos,
portadores de deficiência visual ou auditiva grave.
O critério de inclusão, para os grupos controle, considerou ausência de qualquer
diagnóstico neurológico ou psiquiátrico anterior.
Procedimentos
Os procedimentos obedeceram a seguinte ordem (Quadro 1): seleção e convite dos
sujeitos, leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 1),
preenchimento da Ficha de Identificação (Anexo 2), gravação da voz e fala, preenchimento do
protocolo de autoavaliação Vivendo com Disartria –VcD (Anexo 3) e do IQCODE (Anexo 4), o
último nos sujeitos com DP.
Todos os indivíduos que aceitaram participar do estudo assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 1) e foram submetidos, individualmente, a uma
entrevista inicial para o preenchimento de dados de identificação, de tempo de diagnóstico e
medicação utilizada (Anexo 2).
Procedeu-se a gravação de voz diretamente no computador netbook LG X110, no programa
Sound Forge 4.5 da Sony, na faixa de gravação de 44100Hz e 16 bits, com emprego da placa de som Pure Audio Andrea, USB Audio Software, versão 6.0.0, e microfone auricular (Karsect HT2) posicionado no mento, a 5 cm da boca, em ambiente silente. Foram gravadas as emissões da
vogal prolongada “a” e o ditongo “iu” repetidamente, com modelo oferecido pela pesquisadora, em
frequência e intensidade habituais, auto-selecionadas pelo indivíduo.
Cada participante disártrico respondeu ao questionário de autoavaliação “Vivendo com
Behlau (2009), do original “Living with Dysarthria”, de Hartelius, Elmberg, Holm, Lövberg, Nikolaidis
(2008), com 50 questões divididas em 10 seções, que abordam o impacto da disartria em
diferentes situações relacionadas à comunicação, graduadas em até 6 pontos na escala de Likert
(Anexo 3).
Para a análise das amostras, estas foram editadas no programa Sound Forge 4.5 da Sony com o mínimo de um segundo de duração e o máximo de três, eliminados o ataque vocal e o final
da emissão, quando apresentavam crepitação. Tais amostras passaram por uma classificação
quanto ao grau da disartria e por duas análises, perceptivo-auditiva e acústica computadorizada.
Para a classificação do grau da disartria, uma fonoaudióloga especialista em voz, com mais
de 5 anos de experiência em transtornos neurológicos, avaliou toda a amostra editada e
randomizada, sem a identificação da presença ou tipo de doença, por meio de análise
perceptivo-auditiva das emissões da vogal “a” e do ditongo “iu”. Os critérios utilizados foram os mesmos do
protocolo da Mayo Clinic (Duffy,1995), a saber, pitch, loudness, qualidade vocal, ressonância e pressão intra oral, inteligibilidade, respiração, prosódia e articulação. Sendo assim, a juíza
classificou o grau de disartria atribuindo uma nota de zero a 4, significando ausência de disartria
para a nota zero, disartria leve para a nota 1, disartria moderada para a nota 2, disartria intensa
para a nota 3 e disartria extrema para a nota 4 (Tabela 3).
Tabela 3 – Distribuição do grau de disartria
Grupo n Média Dp
Controle ≤ 45 anos 23 0,22 0,00
Controle > 45 anos 15 0,40 1,00
DL 13 3,15 0,85
ELA 12 1,83 1,40
ELAb 8 3,25 0,46
MG 8 1,38 1,75
DP 17 1,29 2,00
TE 10 3,0 4,00
Total 106 1,81 3,00
Tabela 4 – Resultados do Teste de Mann-Whitney, ajustado pela Correção de Bonferroni, na comparação grupo a grupo, na variável grau de disartria
Controle ≤ 45 X Controle > 45
Controle ≤ 45
X MG
Controle > 45
X DL
Controle > 45
X ELA
Controle > 45
X ELAb
Controle > 45
X DP
Controle > 45
X TE
grau
disartria
0,587 <0,001 <0,001 0,003 <0,001 0,002 <0,001
Para a análise perceptivo-auditiva, as 106 amostras de fala foram randomizadas
aleatoriamente, com o acréscimo de 13 emissões repetidas para análise de confiabilidade intra e
inter sujeitos. Três fonoaudiólogas especialistas em voz e com experiência na área foram
convidadas para a avaliação auditiva, que aconteceu em uma única sessão, iniciada com uma
breve demonstração e treinamento de vozes âncoras de desvios mínimos, moderados ou intensos.
O protocolo da avaliação perceptivo-auditiva consistiu da análise de 5 parâmetros: grau
geral do desvio da qualidade vocal e da estabilidade da emissão na escuta da vogal “a” ; qualificação do ritmo, da integridade articulatória e da velocidade de fala, na tarefa de fala de
repetição do ditongo “iu”.
Cada amostra de fala foi escutada três vezes e as avaliadoras classificavam o desvio das
características da emissão, marcando em barras de rolagem de 100 unidades, em planilha no
Excel, o montante do desvio, se percebido (Anexo 5).
A qualidade vocal designa o conjunto de características que identifica uma voz e é
considerado o índice mais completo dos atributos da emissão de um indivíduo (Behlau, Madazio,
Feijó, Pontes, 2001). Na escala analógica visual, o intervalo entre 0 e 35,5 mm indica variabilidade
normal da qualidade vocal, o que inclui os desvios leves; 35,6 a 50,5, desvios de leve a moderado;
50, 6 a 90,5, desvios moderados, e 90,6 em diante, desvios intensos (Yamasaki, Leão, Madazio,
Padovani, Azevedo, 2007).
O desvio na estabilidade vocal pode ser verificado na avaliação auditiva pela observação de
flutuações na frequência e intensidade durante a sustentação do som (Behlau, Madazio, Feijó,
Pontes, 2001). Na escala analógica visual, os valores de estabilidade dentro da normalidade foram
20,4mm para os jovens e 39,6mm para os idosos (Padovani, Moraes, Madazio, Lorenzon, Korn, de
Biase, 2010)
Ritmo é a sucessão, em intervalos regulares, de sensações da mesma natureza, em
especial auditivas ou visuais (Infopedia, 2011) e pode ser classificado em regular e irregular
A integridade articulatória relaciona-se aos ajustes motores adequados para a produção dos
sons da fala. Normal, preciso, indiferenciado, travado ou exagerado podem ser os tipos
articulatórios observados em uma avaliação clínica (Behlau, Madazio, Feijó, Pontes, 2001).
A velocidade de fala é o número de palavras por minuto. Pode apresentar-se normal,
aumentada, reduzida, excessivamente variada (Behlau, Madazio, Feijó, Pontes, 2001).
Não há referência na literatura dos valores normativos para ritmo, integridade articulatória e
velocidade de fala, avaliados pela escala analógica visual.
Para a análise acústica dos dados foram utilizados dois programas, a saber: programa Sona Speech, CSL – Computadorized Speech Laboratory, modelo 4300 B, da Kay Elemetrics, nos módulos Multi-Dimensional Voice Program - MDVP e Motor Speech Profile e programa Voxmetria, CTS Informática, módulo Análise de Voz.
O Multi-Dimensional Voice Program – MDVP (Figura1), extraiu os valores das medidas acústicas seguintes, a partir da análise da vogal “a” sustentada: F0 (média da frequência
fundamental em todo o período, em Hz); Fmáx (maior frequência fundamental em todo o período,
em Hz); Fmín (menor frequência fundamental em todo o período, em Hz); dp (desvio-padrão da
frequência fundamental dentro da amostra analisada, em Hz); vF0 (coeficiente de variação da
frequência fundamental, em %); jitter RAP (medida de perturbação de longo termo que representa
a perturbação média relativa extraída da avaliação da variabilidade do período nivelado em 3
períodos, em %); shimmer APQ (quociente de perturbação da amplitude, em %). O programa não
oferece dados normativos para F0, Fmín, Fmáx e dp. Os dados normativos oferecidos pelo
programa são 1,10% para vf0; 0,68% para RAP, e 3,07% para APQ.
No módulo Motor Speech Profile foram avaliadas as medidas de tremor (Figura 2), também por meio da vogal “a”. Se a amplitude do tremor ou o tremor da frequência fundamental está
presente na emissão, o traçado mostra modulações e características que incluem a magnitude
destas variações, a média e a periodicidade das modulações. A extração destes parâmetros tem
se mostrado indicador sensível do comportamento motor da fala (Deliyski, Gress, 1996). Os
parâmetros selecionados para análise referentes às medidas de tremor foram: Mftr(%)- magnitude
da frequência do tremor; Matr(%)- magnitude da amplitude do tremor. Seus valores normativos são
0,386% para mulheres e 0,367% para homens em Mftr e 2,251% para mulheres e 1,669% para
homens em Matr.
Foram avaliadas também as medidas de transição do segundo formante, por meio das
amostras do seguimento “iu”. Para esta avaliação, foi necessária uma nova edição das amostras
de “iu”, para adequação da faixa de gravação para 11250Hz, 16bits. Esta edição foi realizada no
gravador de som do Windows no mesmo computador utilizado para a gravação das vozes. A
análise da transição do segundo formante mede a habilidade do paciente em repetir duas vogais
diferentes de língua e lábios, justamente o que gera a diferença na produção dos valores dos
formantes. Esta análise consiste na habilidade do paciente em realizar a transição dos pontos
articulatórios sem a presença de uma vogal neutra, avaliando assim a mobilidade articulatória
(Deliyski, Gress,1996).
Figura 2 – Telas de análise do Protocolo Análise de voz e tremor, no Módulo Motor Speech Profile
Na análise de transição do segundo formante, com o emprego do módulo Motor Speech Profile, do Sona Speech (Figura 3), os parâmetros utilizados foram: F2 magn (Hz) – magnitude da
variação de F2 durante a emissão; F2 rate /s/- velocidade da variação do F2 durante a emissão; F2 reg (%) – regularidade das variações de F2; F2 aver (Hz) – valor médio de F2 na vocalização. Os
valores normativos do programa são 609,580Hz para mulheres e 548,260Hz para homens em F2 magn; 2,193 s para mulheres e 2,445s para homens em F2 rate, 91,280% para mulheres e
93,233% para homens na F2 reg e 1769,400Hz para mulheres e 1635,800Hz para homens na