CAROLINA BORSOI MORAES
ORGANIZAÇÃO ESPACIAL DA TRANSCRIÇÃO COMO UM
POTENCIAL MECANISMO DE EXPRESSÃO GÊNICA EM
Plasmodium falciparum
Tese apresentada à
Universidade Federal de
São Paulo – Escola
Paulista de Medicina
para obtenção do Título
de Doutor em Ciências
São Paulo
CAROLINA BORSOI MORAES
ORGANIZAÇÃO ESPACIAL DA TRANSCRIÇÃO COMO UM
POTENCIAL MECANISMO DE EXPRESSÃO GÊNICA EM
Plasmodium falciparum
Orientador: Prof. Dr. José Franco da Silveira
Co-orientador: Dr. Lucio H. Freitas-Junior
Tese apresentada à
Universidade Federal de
São Paulo – Escola
Paulista de Medicina
para obtenção do Título
de Doutor em Ciências
São Paulo
Moraes, Carolina Borsoi
Organização espacial da transcrição como um potencial mecanismo de expressão gênica em Plasmodium falciparum
/Carolina Borsoi Moraes -- São Paulo, 2009. xiv, 120f.
Tese (Doutorado) – Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Medicina. Programa de Pós Graduação em Microbiologia e Imunologia.
Título em inglês: Spatial organization of transcription as a potential
gene expression mechanism in Plasmodium falciparum
1. Plasmodium falciparum. 2. expressão gênica. 3. organização
Trabalho realizado na Disciplina de Parasitologia
do Departamento de Microbiologia, Imunologia e
Parasitologia da Universidade Federal de São
Paulo – Escola Paulista de Medicina, em
colaboração com o Institut Pasteur Korea da
Coreia do Sul, com auxílios financeiros
concedidos pelos Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq),
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo (FAPESP), Ministério da Educação,
Ciência e Tecnologia da Coreia do Sul (MEST),
Governo da província de Gyeonggi da Coreia do
Sul, e Instituto Coreano de Informação Científica e
AGRADECIMENTOS
Ao Professor José Franco da Silveira, pelo apoio imprescindível a esta tese. Obrigada pelos conselhos, por toda a ajuda e pela paciência.
Ao Lucio, pelos aprendizados, pelas oportunidades, pela motivação, pela alegria, e por sempre acreditar em mim. Você é, sem dúvidas, o meu maior colaborador.
À comissão de Pós-graduação do Departamento de Micro, Imuno e Parasitologia da UNIFESP, por terem apoiado a minha vinda ao Institut Pasteur Korea.
Ao Institut Pasteur Korea, pelo apoio financeiro e científico.
À minha primeira orientadora, Dra. Maria Lucia Cardoso de Almeida, com quem muito aprendi sobre Ciência.
Ao Professor Sergio Schenkman, pelos conselhos e conversas.
À Mércia V. Maia, pela ajuda com os trâmites relacionados à tese .
Aos docentes, funcionários e alunos da Disciplina de Parasitologia, pela convivência sempre agradável e produtiva durante meu primeiro ano de doutorado.
Às minhas colegas e grandes amigas Miriam A. Giardini, Mónica Contreras-Dominguez e Luciana G. Gentil. Nunca me esquecerei de todo apoio e carinho, dentro e fora do laboratório. Vocês têm estado sempre presentes.
Aos meus colegas e amigos de laboratório Jair, Fernando, Gyongseon,
Minje, Eunhye, Helena e Mariana, pelas discussões, amizade,
companheirismo e ajuda. Vocês sem dúvida fazem minha vida na Coréia muito mais interessante e divertida.
Ao colaborador Thierry Dorval, com quem muito aprendi, obrigada pela prestatividade e pelas discussões.
Às minhas antigas colegas de laboratório, Rose, Gisela e Silene, pela ajuda e pela amizade.
Aos meus colegas do Institut Pasteur Korea por todo o apoio e convivência, em especial à minha querida amiga Heejin Chung.
Aos meus amigos da Bio34, pelos anos inesquecíveis de UNIFESP.
ÍNDICE
AGRADECIMENTOS ... v
Lista de figuras ... viii
Lista de tabelas... x
Resumo ... xi
Abstract... xiii
1. Introdução ... 1
1.1 A doença e o parasita ... 1
1.2 Organização do genoma nuclear de P. falciparum... 4
1.3 Controle molecular do desenvolvimento ... 5
1.4 Regulação da expressão gênica em P. falciparum... 7
1.5 Formas alternativas de regulação da transcrição durante o ciclo eritrocítico ... 10
1.6 Controle epigenético da expressão gênica e genes var... 11
1.7 O papel da organização nuclear na expressão gênica ... 14
1.8 A organização espacial da transcrição e a posição nuclear de genes co-regulados ... 16
2. Objetivos ... 19
3. Material e Métodos ... 20
3.1 Composição de soluções e tampões ... 20
3.2 Meios de cultura e soluções de sincronização de P. falciparum... 20
3.3 Cultivo e sincronização de P. falciparum... 21
3.4 Marcação de RNA nascente in situ por incorporação de BrUTP ... 22
3.5 Ensaio de imunofluorescência para proteínas nucleares... 23
3.6 Preparação de sondas de DNA para Fluorescence in situ hybridization (FISH) ... 24
3.7 Fixação de parasitas para FISH... 25
3.8 Protocolo de FISH... 26
3.9 Aquisição de imagens... 27
3.10 Análise automatizada de imagens ... 27
3.11 Análise da distribuição radial dos clusters teloméricos ... 30
3.12 Análise da colocalização de sondas de telômero e Rep20 em P1- e P2-FISH ... 31
3.13 Análises estatísticas... 31
4.1 Estudos in situ da síntese de RNA nascente mostram que transcrição é
organizada em fábricas em P. falciparum... 34
4.2 A análise automatizada de imagem em 3D indica que fábricas de transcrição são estruturas dinâmicas... 37
4.3 O número de fábricas de transcrição está fracamente correlacionado com volume nuclear... 44
4.4 Parasitas em diferentes fases do ciclo eritrocítico apresentam distribuição espacial distinta das fábricas de transcrição... 46
4.5 A transcrição ocorre preferencialmente em áreas de baixa densidade de cromatina ... 50
4.6 Fábricas de transcrição definem um compartimento nuclear distinto de zonas de silenciamento em P. falciparum... 55
4.7 O marcador nucleolar PfNop1 colocaliza apenas parcialmente com fábricas de RANpolI ... 56
4.8 Modificações de histonas características da cromatina ativa não determinam não o compartimento de transcrição ... 59
4.9 Considerações sobre a arquitetura da transcrição e organização espacial da cromatina ... 62
4.10 Um novo protocolo para FISH resulta em núcleos mais conservados65 4.11 Análise automatizada de imagens em 3D mostra que P2-FISH resulta em volume nuclear mais conservado e menor variabilidade no número de clusters teloméricos ... 69
4.12 Núcleos preparados por P2-FISH apresentam melhor preservação da distribuição periférica dos clusters teloméricos... 73
4.13 Um maior índice de colocalização entre sondas telomérica e de Rep20 é observado em núcleos de P2-FISH ... 77
5. Conclusões e Perspectivas ... 81
6. Referências Bibliográficas... 83
Lista de figuras
Figura 1. Ciclo de vida do parasita Plasmodium falciparum ...2
Figura 2. Mecanismos de patogênese mediados por PfEMP1………...…...3
Figura 3. Características morfológicas dos quarto estágios de
desenvolvimento de P. falciparum ao longo do ciclo eritrocítico……….5
Figura 4. Transcriptoma do ciclo eritrocítico………..………...9
Figura 5. Organização da transcrição em fábricas………..…………..17
Figura 6. Detecção automatizada de estruturas nucleares…………..………32
Figura 7. A transcricao é organizada em estruturas pontuadas e dispersas
por todo o núcleo em P. falciparum…….………..36
Figura 8. Perifl de transcrição em diferentes fases do ciclo de vida…………38
Figura 9. O número de fábricas de transcrição está apenas parcialmente
correlacionado com o volume nuclear………...45
Figura 10. Redistribuição das fábricas de transcrição durante o ciclo
eritrocítico………...47
Figura 11. Intensidade das fábricas de transcrição não está relacionada com
a posição da fábrica no núcleo………...52
Figura 12. Fábricas de transcrição localizam-se preferencialmente em zonas
de baixa densidade de cromatina………..53
Figura 13. Fábricas de transcrição localizam em um compartimento nuclear
diferenciado de áreas de silenciamento e do nucléolo………...58
Figura 14. Fábricas de transcrição localizam em um compartimento nuclear
diferenciado da cromatina ativa e da modificação H3K79me3……….61
Figura 15. Hipóteses sobre a organização da cromatina e da transcrição em
P. falciparum………..64
Figura 16. Núcleos de parasitas submetidos ao protocolo P1-FISH são mais
deformados (menos compactos) do que núcleos de parasitas submetidos ao
protocolo P2-FISH………67
Figura 17. Parasitas submetidos a P1- apresentam núcleos mais largos e
maior número de sinais teloméricos que parasitas submetidos a P2-FISH...72
Figura 19. P2-FISH resulta em indices de colocalização telômeroo-Rep20
Lista de tabelas
Tabela 1. Quantificação do número de fábricas de transcrição detectadas de forma automatizada em parasitas a 10 e a 22 hpi………..39
Tabela 2. Número teórico médio de genes compartilhando uma mesma fábrica a 10 e a 22 hpi………..41
Resumo
Crescentes evidências mostram que a organização espacial da
transcrição é um fator epigenético importante na regulação gênica em
eucariotos. Em células de mamíferos, os genes são transcritos em estruturas
nucleares discretas conhecidas como fábricas de transcrição, e genes com
funções relacionadas e co-regulados compartilham as mesmas fábricas de
transcrição. Plasmodium falciparum apresenta um padrão de expressão
gênica bastante complexo durante o ciclo eritrocítico, contrastando
paradoxalmente com o baixo número de putativos fatores de transcrição
codificados pelo seu genoma. Por outro lado, mecanismos epigenéticos são
importantes na regulação gênica neste parasita. Nesta tese, investigamos a
organização da transcrição em P. falciparum visando determinar se a
organização nuclear está relacionada com a expressão/regulação gênica ao
longo do desenvolvimento do parasita.
Com este objetivo, marcamos transcritos nascentes com BrUTP em
formas eritrocíticas de P. falciparum. Assim como em mamíferos, a
transcrição no parasita também está organizada em focos nucleoplásmicos
discretos, chamados fábricas de transcrição. Análises automatizadas de
imagens em 3D mostram que o número e a intensidade das fábricas de
transcrição variam durante o ciclo eritrocítico, estando correlacionados com o
número de genes expressos em cada estágio, mas não com o volume
nuclear. O baixo número de fábricas indica que os genes ativos compartilham
as fábricas enquanto estão sendo transcritos.
Surpreendentemente, as fábricas são espacilamente redistribuídas
durante o desenvolvimento de anéis para trofozoítas, com a periferia nuclear
sendo a zona de transcrição favorita nos anéis, enquanto nos trofozoítas as
fábricas estão igualmente distribuídas por todo o nucleoplasma. Também
observamos que a transcrição por RNA polimerase I ocorre principalmente
nas áreas centrais dos núcleos em trofozoítas, sugerindo que os
componentes nucleolares podem ser dispersos devido à entrada na fase S.
falciparum também se localizam em áreas nucleares com baixa densidade de cromatina.
Análises de imunofluorescência combinando incorporação de BrUTP
com marcadores nucleares mostram que as fábricas de transcrição formam
um compartimento exclusivo, diferente do compartimento de silenciamento
definido por PfSir2A ou do compartimento de cromatina ativa definido por
H4ac ou H3K79me3. Para estudar a organização espacial da cromatina e
entender como os genes co-regulados interagem com as fábricas de
transcrição, decidimos realizar ensaios de hibridização fluorescente in situ
(fluorescence in situ hybridization, FISH).
Durante a realização de ensaios de FISH seguindo protocolos
publicados, observamos uma grande variação na morfologia nuclear dos
parasitas, o que nos moveu a otimizar esta técnica. Utilizando análises
automatizadas de imagens, mostramos que os parasitas desidratados por
secagem ao ar e fixados por curtos períodos de tempo à temperatura
ambiente apresentam uma variação intra-populacional maior em relação à
forma e ao volume nucleares após o ensaio de FISH, assim como valores de
volume quase duas vezes maiores, do que núcleos de parasitas fixados em
suspensão por longos períodos de tempo e em baixas temperaturas.
Também observamos que a fixação em suspensão leva a uma melhor
conservação da estrutura nuclear, e índices de colocalização mais altos para
duas sondas de repetições adjacentes das extremidades cromossômicas,
Rep20 e telômeros. Em resumo, nossos resultados mostram que o tipo de
protocolo de fixação utilizado antes da realização do desenvolvimento de
FISH é um fator crucial para a conservação apropriada da arquitetura
Abstract
Growing evidence points that transcription spatial organization is an
important epigenetic factor for eukaryotes gene regulation. In mammalian
cells, genes are transcribed in discrete nuclear structures known as
transcription factories, and developmentally co-regulated, functionally related
genes have been shown to share factories. Plasmodium falciparum shows a
remarkably complex pattern of gene expression during the erythrocytic cycle,
paradoxically contrasting with the low number of putative transcription factors
encoded by its genome. However, epigenetic mechanisms are important for
gene regulation in this parasite. In this thesis, we investigated transcription
organization of P. falciparum in order to determine if nuclear architecture is related with developmentally regulated gene expression.
To this aim, we have labeled nascent transcrips with BrUTP in P.
falciparum erythrocytic forms. Transcription in organized in discrete nuceloplasmic foci, the transcription factories. Automated 3D analysis of
confocal images shows the number and intensity of transcription factories
change during the erythrocytic cycle, correlating with the number of genes
expressed at each stage but not with the nuclear volume. The low number of
factories indicates that active genes share factories while being transcribed.
Unexpectedly, factories spatially redistribute from ring to trophozoites,
being the nuclear periphery the preferential transcription zone in rings while in
trophozoites factories are equally distributed throughout the nucleoplasm. We
also observed that RNApolymerase I transcription occurs mostly at central
nuclear areas in trophozoites, suggesting that nucleolar components may be
dispersed upon S phase transition. Like in higher eukaryotes, in P. falciparum
transcription factories occur on nuclear areas with low chromatin density.
Immunofluorescence analysis of P. falciparum nuclear markers
combined with BrUTP incorporation show that transcription factories are a
novel and exclusive nuclear compartment, different from the silent
compartment defined by PfSir2A or the active chromatin compartment defined
by H4ac and H3K79me3. In order to study the spatial organization of
transcription factories, we decided to perform fluorescence in situ
hybridization (FISH).
While performing FISH with published protocols, we observed great
variation in the parasite nuclear morphology, prompting us to optimize this
technique. Using automated image analysis, we show that parasites
dehydrated by air-drying and fixed for short periods at room temperature
present after FISH higher intra-population variation of nuclear shape and
volume, as well as almost two-times higher relative volume values, than
parasite nuclei fixed in suspension for long periods at low temperatures. We
also observe that longer fixation in suspension leads to improved
conservation of the nuclear structure, with chromosome end clusters
preferentially locating at the nuclear periphery, and higher colocalization
indexes for two adjacent chromosome end probes, Rep20 and telomere.
Overall, our results show that the type of fixation protocol applied prior to
1. Introdução
1.1 A doença e o parasita
Anualmente ocorrem de 300 a 500 milhões de casos de malária em
todo o mundo, resultando em mais de 1 milhão de mortes. Quase metade da
população mundial vive em áreas endêmicas da doença, que é transmitida ao
homem pela picada do mosquito Anopheles. A malária de humanos é
causada por quatro espécies de parasitas do gênero Plasmodium (filo
Apicomplexa): P. falciparum, P. vivax, P. malariae e P. ovale. Recentemente,
foi descrito que P. knowlesi, um plasmódio que normalmente infecta primatas,
pode também infectar humanos com certa freqüência, sobretudo no sudeste
asiático, e é potencialmente fatal (Cox-Singh et al., 2008; White, 2008), e
desde então P. knowlesi tem sido considerada a quinta espécie causadora de
malária em humanos.
De todas essas espécies, P. falciparum é a mais mortal e portanto a mais estudada. O parasita apresenta um ciclo de vida complexo,
compreendendo diversos estágios de desenvolvimento distintos tanto em
termos morfológicos quanto em termos moleculares (figura 1). Durante a
picada do mosquito Anopheles, a forma do parasita denominada esporozoíta
é inoculada na pele do hospedeiro (figura 1-1). Os esporozoítas migram, via
corrente sanguínea, até o fígado (figura 1-2), onde infectam os hepatócitos
(figura 1-3). Durante esse estágio, que em infecção por P. falciparum é curto
e assintomático, os esporozoítas multiplicam-se e diferenciam-se em
merozoítas, que deixam o fígado em estruturas chamadas merossomos
[figura 1-4; (Sturm et al., 2006)] para entrar na corrente sanguínea e invadir os eritrócitos em circulação, estabelecendo assim o ciclo eritrocítico ou
assexual (figura 1-5). O ciclo eritrocítico é o responsável pelos sintomas da
malária e pela perpetuação do parasita no hospedeiro. Nos eritrócitos, os
merozoítas diferenciam-se na forma chamada de anel, que cresce à medida
que se desenvolve em trofozoíta, um estágio morfologicamente distinto. Os
estabelecendo-se então a fase de esquizogonia. Durante essa fase, um único
trofozoíta se multiplica diversas vezes de forma assexuada, originando de 8 a
32 merozoítas. Os merozoítas rompem o eritrócitos e caem na circulação,
invadindo novas hemácias. Eventualmente, alguns trofozoítas não entram em
esquizogonia, mas se desenvolvem em gametócitos masculinos ou femininos
(figura 1-6), que serão transmitidos ao mosquito durante uma picada. No
mosquito, os gametócitos diferenciam-se em gametas, que se reproduzem
sexuadamente por fecundação (figura 1-7). O zigoto, denominado oocineto
(figura 1-8), invade a parede do epitélio do tubo digestivo e diferencia-se no
oocisto, a fase na qual ocorre multiplicação por esporogonia, originando os
esporozoítas, que rompem o oocisto e migram para a glândula salivar do
mosquito (figura 1-9), sendo inoculados em humanos durante uma próxima
picada (figura 1-10).
Figura 1. Ciclo de vida do parasita Plasmodium falciparum. (1-4) ciclo hepático; (5-6) ciclo eritrocítico; (7-10) ciclo sexual e esporogonia. (modificado de http://www.path.org/vaccineresources/details.php?i=747.)
Uma das características mais marcantes do ciclo eritrocítico é a
intensa remodelagem que o parasita induz na hemácia infectada. A fim de
escapar do sistema imune, P. falciparum modifica a superfície do eritrócito,
placenta (Maier et al., 2009). Esse fenômeno é chamado de citoadesão ou
seqüestro e é mediado pela P. falciparum erythrocyte membrane protein 1, ou
PfEMP1. A citoadesão é um dos principais mecanismos de escape da
resposta imune e pode ocorrer em órgãos vitais como o cérebro (malária
cerebral) e a placenta (malária associada à gravidez – ver figura 2).
Figura 2. Mecanismos de patogênese mediados por PfEMP1. Acima, receptores reconhecidos por diferentes variantes de PfEMP1 em diferentes órgãos, levando à citoadesão; ao lado, adesão célula-celula mediada por PfEMP1; abaixo, ondas de parasitemia observadas em pacientes correspondem a diferentes variantes de PfEMP1 majoritariamente expressas na população (Miller et al., 2002).
Além disso, PfEMP1 pode mediar outros mecanismos de patogênese
tal como rosetting de hemácias infectadas e não infectadas, clumping de
eritrócitos infectados e ligação a células dendríticas, causando atenuação da
resposta imune. A adesão a diferentes tipos de receptores é mediada por
diferentes tipos de PfEMP1, que são expressas clonalmente e estão sujeitas
à variação antigênica, ou seja, um único parasita expressa um único tipo de
PfEMP1 num dado momento (Miller et al., 2002; Pierce and Miller, 2009;
Scherf et al., 2008). Antes que o sistema imune do hospedeiro possa produzir
anticorpos contra a variante de PfEMP1 expressa na população e eliminar os
seqüência de PfEMP1, escapando assim da resposta imune e dando início a
uma nova onda de parasitemia (ver figura 2).
1.2 Organização do genoma nuclear de P. falciparum
O genoma nuclear de P. falciparum contém ~ 23 Mb distribuídos em
14 cromossomos haplóides que variam de ~ 0.6 a 3.3 kb. Extremamente rico
em AT (aproximadamente 80%), codifica cerca de 5300 proteínas, das quais
apenas 40% apresentam homologia com proteínas conhecidas (Gardner et
al., 2002).
Os cromossomos de Plasmodium ssp. possuem regiões centrais
sintênicas contendo sobretudo genes housekeeping, enquanto a maior parte
dos genes que codificam fatores de virulência e proteínas exportadas para a
membrana dos eritrócitos está localizada próxima às extremidades
cromossômicas (Gardner et al., 2002). Em P. falciparum, as extremidades
cromossômicas são compostas de telômeros seguidos por uma região
subtelomérica de estrutura conservada. Os telômeros são compostos por
repetições GGGTT(T/C)A de 1650 bp em média na cepa 3D7, seguidos por
uma região subtelomérica não codificante de 15-30 kb composta de por seis
regiões conservadas denominadas telomere-associated repetitive elements,
ou TAREs (Figueiredo et al., 2002; Figueiredo et al., 2000; Gardner et al., 2002). As TAREs são classificadas entre TARE 1 a 6, sendo TARE 6 –
também chamada de Rep20 (Oquendo et al., 1986) – a mais longa de todas
as TAREs, com tamanho total de 6 a 23 kb, dependendo do braço do
cromossomo analisado (Figueiredo et al., 2002).
Um aspecto bastante curioso – e único – é a organização do rDNA em
Plasmodium. Ao contrário de outros eucariotos, que possuem diversas cópias
de unidades rRNA em tandem arrays, P. falciparum possui apenas 7
unidades 18S-5.8S-28S rRNA distribuídas em diferentes cromossomos.
Essas unidades de rRNA possuem seqüências diferentes e são classificadas,
de acordo com a fase do ciclo de vida em que são expressas, em asexual
type, ou A-type (duas unidades funcionais, localizadas nos cromossomos 5 e
cromossomos 11 e 13 - Gardner et al., 2002; McCutchan et al., 1988; Waters
et al., 1995). As três unidades restantes de 18S-5.8S-28S rRNA não foram caracterizadas funcionalmente. Além disso, há também três genes de 5S
rRNA, localizados em tandem no cromossomo 14 (Gardner et al., 2002).
1.3 Controle molecular do desenvolvimento
Durante as ~48 horas de um ciclo celular da fase eritrocítica, P.
falciparum passa por quatro estágios de desenvolvimento morfologicamente distintos: o anel, o trofozoíta, o esquizonte e o merozoíta (figura 3). Com
exceção de diferenças fisiológicas mais evidentes, tais como os merozoítas
serem especializados na invasão de eritrócitos e esquizontes na replicação
de DNA, pouco se sabia das particularidades moleculares de cada fase.
Figura 3. Características morfológicas dos quatros estágios de desenvolvimento de P. falciparum ao longo do ciclo eritrocítico. Note que o esquizonte é o único estágio representado dentro do eritrócito. Modificado de (Bannister et al., 2000)
~ 48 horas
Anel
Trofozoíta Esquizonte
Em 2003, com a publicação do transcriptoma de P. falciparum, começou a surgir uma idéia mais clara dos eventos moleculares que
governam o desenvolvimento do parasita ao longo do ciclo eritrocítico
(Bozdech et al., 2003; Le Roch et al., 2003). Embora se tivesse uma idéia
então de que alguns genes, incluindo genes housekeeping, eram regulados
de maneira estágio-específica (Cheesman et al., 1998; Delves et al., 1990;
Horrocks et al., 1998; Horrocks et al., 1996; Lanzer et al., 1992a; Lanzer et
al., 1992b; Waters et al., 1989; Wesseling et al., 1989), os estudos de
transcriptoma revelaram que este fenômeno é muito mais comum do que se
pensava. Ao contrário do que ocorre em eucariotos superiores e leveduras,
nos quais apenas cerca de 15% dos genes são periodicamente regulados,
em P. falciparum mais de 75% dos genes expressos ao longo do ciclo eritrocítico são regulados de maneira estágio-específica. Este padrão de
regulação da transcrição só é visto em organismos em fase de
desenvolvimento, e portanto reforça a idéia de que um ciclo celular de P.
falciparum equivale a um ciclo de desenvolvimento/diferenciação (Bozedch et al., 2003; Le Roch et al., 2003).
Ainda mais surpreendente foi a descoberta de que genes
funcionalmente relacionados, sejam grupos de genes housekeeping ou
grupos de genes envolvidos na evasão do sistema imune, são co-expressos,
com um único pico de ativação durante o ciclo (figura 4). A ativação da
transcrição dos grupos de genes relacionados ocorre just-in-time, isto é,
pouco antes da necessidade de utilização das proteínas por eles codificadas;
por exemplo, a transcrição dos genes que codificam proteínas envolvidas na
invasão se inicia apenas nos esquizontes (Bozdech et al., 2003; Le Roch et
al., 2003). Esse modo de ativação gênica foi chamado de.
Além disso, com exceção do cluster de genes do grupo SERA
localizado no cromossomo 2, não se observou padrão de ativação
estágio-específica em regiões cromossômicas contínuas, sugerindo que a ativação
dos genes ocorre de maneira individualizada (Bozedch et al., 2003).
Trabalhos subseqüentes demonstraram que a regulação periódica dos
genes não é exclusiva do estágio eritrocítico: diversos genes expressos
durante o estágio hepático e o desenvolvimento sexual (gametócitos)
Tarun et al., 2008; Young et al., 2005). Um outro caso bastante atípico é a
regulação das unidades A-type e S-type de rRNA: as duas unidades de
A-type, A1 e A2, são expressas exclusivamente durante o ciclo eritrocítico,
enquanto que as duas unidades S-type, S1 e S2, são transcritas
exclusivamente em fases sexuais (McCutchan et al., 1988; Waters et al.,
1989). Um estudo em P. berghei demonstrou que durante o ciclo eritrocítico
uma parcela da população expressa também S1 e S2, e as freqüências de
parasitas expressando essas unidades coincidem com as freqüências de
gametocitogênese (Waters et al., 1997). Portanto, a regulação
estágio-específica da expressão gênica é um fenômeno extremamente comum, seja
durante o ciclo celular ou durante o desenvolvimento do ciclo de vida.
1.4 Regulação da expressão gênica em P. falciparum
Apesar dos avanços obtidos com o sequenciamento do genoma do
parasita (Gardner et al., 2002) e com os estudos do transcriptoma (Bozdech
et al., 2003; Gunasekera et al., 2007; Le Roch et al., 2003; Silvestrini et al.,
2005; Tarun et al., 2008; Young et al., 2005), os mecanismos moleculares da
regulação estágio-específica dos genes de P. falciparum permanecem pouco
conhecidos.
Os genes de P. falciparum possuem estruturas canônicas, contendo
regiões 5’ e 3’ não-traduzidas, promotores bipartidos e íntrons e, ao contrário
de tripanossomas, possuem transcrição monocistrônica (Horrocks et al.,
1998; Lanzer et al., 1992b; Lanzer et al., 1994).
O alto conteúdo de AT do genoma do P. falciparum (90% em média
nas regiões não codificantes; Gardner et al., 2002) frustrou a descoberta de
seqüências reguladoras por métodos de bioinformática/filogenia clássicos
baseados em seqüências reguladoras de outros organismos, com exceção
da TATA box (Ruvalcaba-Salazar et al., 2005). Contudo, evidência
experimental acumulada por mais de uma década demonstrou que
seqüências curtas e simples nas regiões promotoras exercem papel
regulador na expressão gênica estágio-específica em Plasmodium. O
gene que codifica a glycophorin-binding protein [GBP130; (Lanzer et al., 1992b)]. Trabalhos subseqüentes demonstraram que diversos outros genes
também possuem em suas regiões promotoras seqüências suficientes para
garantir a expressão estágio-específica de repórteres epissomais (Crabb and
Cowman, 1996; de Koning-Ward et al., 1999; Dechering et al., 1999; Eksi et
al., 2008; Gunasekera et al., 2007; Horrocks et al., 1996; Lopez-Estrano et al., 2007; Militello et al., 2004; Olivieri et al., 2008; Porter, 2002; Young et al.,
2008). Contudo, um estudo comparando as atividades do promotor gbp130
epissomal e endógeno demonstrou que, ao contrário do gene endógeno, o
promotor epissomal perde sua atividade estágio-específica, tornando-se
constitutivamente ativo. Os autores atribuíram a perda de expressão
estágio-específica à aparente mudança na estrtura dos nucleossomos no promotor
epissomal e concluíram que fatores epigenéticos podem estar envolvidos na
expressão estágio-específica em Plasmodium (Horrocks and Lanzer, 1999).
Portanto, seqüências regulatórias podem comportar-se diferentemente
quando removidas do seu contexto cromossômico, e o uso de promotores
epissomais para estudo da expressão estágio-específica durante o ciclo
eritrocítico deve ser considerado com certa cautela.
Assim como em diversos outros eucariotos, o genoma de P. falciparum
codifica uma maquinaria basal de transcrição por RNA polimerase II
(RNApolIl) e de fatores associados à transcrição [TAFs – (Callebaut et al.,
2005)]; contudo, não foram encontrados ortólogos de outros fatores de
transcrição canônicos. Oposto à essa situação, os genes de P. falciparum
possuem mais seqüências reguladoras em cis do que qualquer outro genoma
analisado (van Noort and Huynen, 2006), levando os autores desse estudo a
propor um modelo de regulação combinatória da expressão gênica em P.
falciparum. Segundo este modelo, os poucos fatores de transcrição disponíveis interagem de maneira combinatória com os elementos
reguladores em cis de forma a regular a expressão estágio-específica dos
genes.
Entretanto, a paradoxal ausência de fatores de transcrição em
Plasmodium foi desafiada pela identificação da primeira família de fatores de
transcrição específica de apicomplexos, chamada de ApiAP2 (Balaji et al.,
motivo de ligação de DNA de integrase conservado, encontrado também na
segunda maior família de fatores de transcrição específicos de plantas,
Apetala2/fator de resposta ao etileno (AP2/ERF).
A caracterização funcional de fatores ApiAP2 demonstrou que estes
reconhecem motivos específicos localizados nas regiões 5’ upstream de
grupos funcionais de genes co-expressos, tanto no ciclo eritrocítico quanto
em fases do ciclo sexual (De Silva et al., 2008; Llinas et al., 2008; Yuda et al., 2009). Dado que tais motivos estão presentes apenas em genes
co-regulados/co-expressos, especula-se que a família de fatores ApiAp2 tenha
um papel importante na regulação da expressão estágio-específica em
Plasmodium.
1.5 Formas alternativas de regulação da transcrição durante o
ciclo eritrocítico
Evidências de estudos de bioinformática sugerem que P. falciparum
possui um variado repertório de RNAs estruturais não codificantes (ncRNAs)
que podem influenciar os padrões de expressão gênica. Em um dos estudos
(Mourier et al., 2008) foram identificados 33 ncRNAs expressos no ciclo
eritrocítico, sendo que alguns são regulados de maneira estágio-específica.
Outro trabalho encontrou diversos RNAs estruturais de P. falciparum que
constituem componentes da maquinaria de transcrição em outros eucariotos
(Chakrabarti et al., 2007). Um terceiro estudo descreveu ncRNAs transcritos
a partir das regiões centroméricas (Li et al., 2008). Os autores propuseram
um papel de regulação da estrutura da cromatina por esses ncRNAs, contudo
essa hipótese ainda necessita ser validada.
RNA polimerase II (RNApolII) de P. falciparum transcreve grandes
quantidades de RNA antisenso de diversos loci genômicos, que parecem ser
regulados de maneira estágio-específica (Militello et al., 2005). A função
desses RNAs é desconhecida, sobretudo porque o genoma de P. falciparum
não codifica uma maquinaria conservada de RNAi (Militello et al., 2008).
Análises em escala genômica demonstraram que as taxas de
decaimento de mRNA aumentam drasticamente ao longo do ciclo eritrocítico.
Na fase de anel, a meia-vida média dos mRNAs é de 9.5 min, enquanto que
em esquizontes esse número sobe para 65 min (Shock et al., 2007). Os
pós-transcricional podem ser importantes para genes expressos em esquizontes,
e permitem um acúmulo de mRNA nesse estágio.
1.6 Controle epigenético da expressão gênica e genes var
Durante os últimos anos, ficou evidente que fatores epigenéticos
exercem um papel no controle da expressão gênica em P. falciparum. Com a
publicação do genoma do parasita, descobriu-se que, em contraste à
aparente ausência de fatores de transcrição canônicos, P. falciparum possui
uma maquinaria completa de proteínas de modificações e remodelagem de
cromatina, sugerindo que modificações epigenéticas seriam um mecanismo
fundamental da regulação da transcrição nesse parasita (Gardner et al.,
2002). A cromatina de P. falciparum, assim como a maioria dos eucariotos,
está organizada em nucleossomos, compostos de um octâmero de duas
cópias de cada uma das histonas H2A, H2B, H3 e H4, envolvido por 147
pares de bases de DNA (Cary et al., 1994). Contudo, o parasita não contém a
histona H1, que sela o nucleossomo e ajuda a estabilizar a estrutura da
cromatina (Miao et al., 2006).
Grande parte do conhecimento funcional sobre a epigenética desse
parasita veio dos estudos da família multigênica var, que codifica PfEMP1
(Baruch et al., 1995; Smith et al., 1995; Su et al., 1995). Há grande interesse
no estudo da regulação dos genes porque a expressão de seus membros
ocorre de maneira mutuamente exclusiva, isto é, num dado momento um
único parasita expressa apenas um dentre os aproximadamente 60 membros
da família. Os mecanismos moleculares que garantem a expressão
mutuamente exclusiva dos genes var ainda não estão claros, mas uma
grande variedade de estudos aponta para fatores epigenéticos.
A primeira evidência de que genes var seriam regulados por
mecanismos epigenéticos foi demonstrada por Scherf e colaboradores. Neste
estudo, os autores mostraram que o switching de genes var ocorre in situ, e a
expressão mutuamente exclusiva é estabelecida independentemente de
recombinação ou modificações de DNA, tal como metilação (Scherf et al.,
exerce na regulação da expressão dos genes var. Foi demonstrado que o
promotor do gene var ativo encontra-se hiperacetilado nas histonas H3 e H4,
enquanto que os promotores dos genes silenciados estão associados à
proteína Silent information regulator 2, ou PfSir2A, uma histona deacetilase
(Freitas-Junior et al., 2005; Merrick & Duraisingh, 2007). Acredita-se que PfSir2A leve a um estado de hipoacetilação da cromatina, tornando-a menos
acessível à maquinaria de transcrição, causando o silenciamento dos genes
hipoacetilados (Freitas-Junior et al., 2005). O genoma do P. falciparum
codifica dois parálogos de PfSir2, A e B, e a deleção de um dos parálogos
resulta na abolição da expressão mutuamente exclusiva dos genes var
(Duraisingh et al., 2005; Tonkin et al., 2009). Curiosamente, PfSir2A e
PfSir2B controlam subgrupos independentes de genes var, de modo que
juntas são capazes de silenciar todos os membros da família, e com exceção
da família multigênica rif, que também está sujeita à expressão mutuamente
exclusiva, PfSir2A e B não parecem ser importantes na regulação da
expressão de outros genes (Tonkin et al., 2009).
Desde a primeira associação do estado de acetilação de histonas com
transcrição de genes var, novos estudos detalharam as modificações
associadas com o gene ativo e os silenciados. Verificou-se que genes var
inativos estão enriquecidos em histona H3 trimetilada na lisina 9 (H3K9me3),
um marcador de heterocromatina em outros eucariotos, durante todo o ciclo
eritrocítico. Já as modificações associadas com o gene var ativo são mais
dinâmicas. No período em que o gene var é transcrito, na fase de anel, a
região 5’ upstream está enriquecida em H3K4me2, H3K4me3 e H3K9ac,
sendo que esta última modificação é antagonista de H3K9me3 e está
associada com cromatina ativa em outros eucariotos. Em trofozoítas, o gene
var, que também é periodicamente regulado, deixa de ser transcrito,
perdendo H3K4me3 e H3K9ac, sendo enriquecido para H3K9me3. Contudo,
o gene continua enriquecido em H3K4me2, sugerindo que esta seja a
marcação que diferencia o var ativo dos silenciados, mesmo quando o gene
não é transcrito, e permite que esse mesmo gene volte a ser expresso num
próximo ciclo celular, num estado poised (Chookajorn et al., 2007;
Contudo, as modificações de histonas não são exclusivas de genes
var em P. falciparum. Um estudo caracterizou a histona acetilase PfGCN5 e
demonstrou que H3K9ac é um marcador não apenas de genes var mas
também de genes que possuem regulação estágio-específica ao longo do
ciclo eritrocítico (Cui et al., 2007). Estudos mais recentes sugeriram que
H3K4me3 e H3K9ac não refletem simplesmente o estado transcricional dos
genes expressos durante o ciclo eritrocítico, e que estes marcadores são
regulados ao longo do ciclo celular (Salcedo-Amaya et al., 2009). Além disso,
H3K9me3 não está restrita apenas a genes var inativos mas também
encontra-se enriquecida em outras famílias multigênicas implicadas em
interações parasita-hospedeiro, como rif e stevor, restritas a regiões
subteloméricas e em clusters internos nos cromossomos (Lopez-Rubio et al.,
2009; Salcedo-Amaya et al., 2009). Recentemente, foi descrita a interação da
heterochromatin protein 1 de P. falciparum (PfHP1) com genes enriquecidos em H3K9me3, reforçando os argumentos de que tais regiões cromossômicas
possam de fato estar organizadas em heterocromatina (Flueck et al., 2009;
Pérez-Toledo et al., 2009).
A busca dos determinantes moleculares da variação antigênica não se
restringe ao estudo das modificações da cromatina. Foi demonstrado que um
promotor var dirigindo a expressão epissomal de genes de resistência a
drogas como blasticidina S ou pirimetamina é “contado” como um promotor
de var endógeno e portanto leva ao silenciamento dos outros membros da
família, mesmo na ausência de região codificante de PfEMP1 (Dzikowski et
al., 2007; Voss et al., 2006; Voss et al., 2007). O promotor epissomal portanto
é reconhecido como um promotor nativo e é transcrito da mesma maneira
que um gene var endógeno, inclusive localizando na periferia nuclear
(discutido adiante). Contudo, o promotor do gene var deve estar pareado com
um segundo promotor ativo, localizado a downstream do gene de seleção, a
fim de garantir a inclusão do promotor var epissomal no mecanismo de
contagem de genes var endógenos, e assim manter a expressão
mutuamente exclusiva (Dzikowski et al., 2007). O papel do promotor pareado
seria mimetizar o íntron endógeno dos genes var, que foi implicado na
regulação da expressão mutuamente exclusiva. Os genes var possuem uma
(Scherf et al., 2008). O íntron localizado entre os éxons 1 e 2 possui seqüência conservada e apresenta atividade promotora durante a fase
trofozoíta, quando dirige a síntese de “transcritos estéreis” a partir do éxon 2
dos genes var (Su et al., 1995). Acredita-se que a atividade promotora do
íntron esteja envolvida no silenciamento dos genes var, num mecanismo
dependente da fase S do ciclo celular (Deitsch et al., 2001; Frank et al., 2006), mas o mecanismo molecular permanece desconhecido.
1.7 O papel da organização nuclear na expressão gênica
Tornou-se evidente que a arquitetura nuclear está correlacionada não
só com a transcrição, uma das mais fundamentais funções do genoma, como
também com todos os outros processos nucleares, como replicação e reparo
de DNA ou processamento pós-transcricional de RNA (Misteli, 2007). Uma
característica marcante é que esses processos são espacialmente
compartimentalizados, ou seja, não ocorrem aleatoriamente por todo o
núcleo, mas sim confinados a sítios definidos e exclusivos (Lamond and
Spector, 2003).
A primeira evidência de que o núcleo do P. falciparum é espacialmente
organizado foi a descoberta de que os telômeros e regiões subteloméricas do
parasita encontram-se organizados em clusters ancorados à membrana
nuclear (Freitas-Junior et al., 2000). Mais adiante, foi demonstrado que os
genes var subteloméricos silenciados estão associados aos clusters
teloméricos (Duraisingh et al., 2005; Ralph et al., 2005; Voss et al., 2006),
mas a localização de genes var de regiões cromossômicas centrais
silenciados tem sido debatida. Embora esse subgrupo de var esteja sempre
associado à periferia nuclear, dois estudos apontam para a localização
aleatória de genes var centrais nesta região do núcleo (Lopez-Rubio et al.,
2009; Ralph et al., 2005), enquanto outro estudo sugere que var centrais
silenciados também estão associados aos clusters teloméricos (Voss et al.,
2006).
Já o gene var ativo está associado a uma área transcricionalmente
Howitt et al., 2009; Lopez-Rubio et al., 2009; Marty et al., 2006; Ralph et al.,
2005). Contudo, não está claro se a ativação do gene var pode ocorrer
associada ao cluster telomérico (Marty et al., 2006; Voss et al., 2006) ou
requer translocação do gene var para uma área transcricionalmente ativa na
periferia nuclear (Lopez-Rubio et al., 2009; Ralph et al., 2005). A periferia nuclear foi apontada como uma zona de silenciamento, contendo uma
estrutura eletrondensa que sugere a presença de heterocromatina (Ralph et
al., 2005). Além disso, as proteínas de silenciamento PfSir2A, PfHP1 e
PfOrc1 (origin-of-recognition-complex 1) encontram-se associadas à região
perinuclear e aos clusters teloméricos (Flueck et al., 2009; Freitas-Junior et
al., 2005; Mancio-Silva et al., 2008b; Pérez-Toledo et al., 2009). A localização
exclusiva dessas proteínas no perinúcleo ocorre juntamente com a
transcrição de genes var nesta região, sugerindo que esta possui ao menos
um domínio de ativação gênica em meio a domínios de repressão.
Utilizando uma técnica de titulação de promotores, um estudo recente
demonstrou que a maquinaria de transcrição de genes var, localizada nessa
putativa região especializada da periferia nuclear, pode ser compartilhada por
promotores das famílias multigências rif, stevor e Pfmc-2TM, e a expressão
de um alto número de cópias de promotores var epissomais leva não só ao
silenciamento dos genes var como também de genes rif, stevor e Pfmc-2TM
endógenos (Howitt et al., 2009). Portanto, existe uma zona periférica
transcricionalmente permissiva onde o gene var ativo é transcrito, mas esta
zona, aparentemente, não é exclusiva para a transcrição de genes var.
A proposta de uma região nuclear especializada na transcrição de
dados genes encontra paralelos em outros parasitas. Em Trypanosoma
brucei, a existência de um compartimento de transcrição especializado na
transcrição de vsg foi implicado na expressão mutuamente exclusiva dos
membros dessa família multigênica (Navarro & Gull, 2001), enquanto que em
T. cruzi existe um compartimento dedicado à transcrição de spliced leader
RNAs (Dossin & Schenkman, 2005).
Com exceção dos genes var e dos clusters teloméricos, pouco se sabe
sobre a organização nuclear de outros loci cromossômicos em P. falciparum.
Com relação a compartimentos nucleares definidos por proteínas, o nucléolo
nucléolo, periférico, que é definido pela proteína fibrilarina ou PfNop1
(Figueiredo et al., 2005). PfSir2A, PfTERT – que codifica o componente
protéico da telomerase – e PfOrc1 estão associadas ao nucléolo (Figueiredo
et al., 2005; Freitas-Junior et al., 2005; Mancio-Silva et al., 2008b). Contudo,
não se sabe qual a função destas proteínas no nucléolo de P. falciparum, e a
relação da organização nucleolar com a transcrição diferencial das diferentes
unidades de rDNA permanece totalmente desconhecida.
Outras proteínas nucleares, assim como modificações específicas de
histonas, todas associadas com ativação/repressão da transcrição, foram
associadas a compartimentos nucleares discretos (Issar et al., 2009;
Pérez-Toledo et al., 2009; Volz et al., 2009). O fato de muitos desses
compartimentos apresentarem topografias diferentes uns dos outros,
demonstra que o núcleo de P. falciparum é altamente estruturado
espacialmente. A caracterização funcional destes compartimentos, contudo, é
necessária para o melhor entendimento da relação entre a organização
nuclear e a transcrição.
1.8 A organização espacial da transcrição e a posição nuclear de
genes co-regulados
A grande maioria dos estudos sobre a organização espacial da
transcrição foi feita em células de mamíferos. Em HeLa, a incorporação em
células permeabilizadas de 5’-bromouridina 5-trifosfato (BrUTP) em
transcritos em enlongação demonstrou, pela primeira vez, que a transcrição
encontra-se organizada em foci discretos espalhados por todo o núcleo
(Iborra et al., 1998; Jackson et al., 1993; Wansink et al., 1993). Estudos
subseqüentes demonstraram que esses foci continham diversas unidades de
transcrição (uma unidade de transcrição corresponde, basicamente, a uma
RNA polimerase engajada a um gene; Faro-Trindade & Cook, 2006a;
Jackson et al., 1998). Esses foci foram, então, denominados fábricas de
transcrição, dado que são agregações espaciais de diversos genes e fatores
associados a esse processo., de forma a aumentar a eficiência da transcrição
estruturas conservadas ao longo da evolução, encontrando um paralelo entre
bactérias, nas quais o cromossomo circular formaria loops que favorecem a
agregação espacial da moléculas de RNApol. Em eucariotos, as fábricas de
transcrição serviriam, ainda, como estrturas estabilizadoras dos loops
formados por diversos cromossomos a fim de acessar às fábricas
(Faro-Trindade & Cook, 2006b).
As fábricas de transcrição apresentam especialização, ao menos em
relação ao tipo de RNA polimerase (RNApol). Fábricas de RNApolII, que
transcrevem mRNA, estão dispersas por todo o nucleoplasma, enquanto que
RNApolI, que transcreve rRNA, está restrita ao nucléolo (ver figura 5). Existe
evidência também que as fábricas de RNApolIII, que transcreve rRNA 5S e
tRNAs, dentre outros RNAs estruturais pequenos, também é espacialmente
restrita e diferenciada de fábricas de RNApolII (Carter et al., 2008).
Figura 5. Organização da transcrição em fábricas. (I) Modelo de uma fábrica de transcrição. Em verde, fábricas de transcrição contendo RNA polimerases (em forma de ferraduras) associadas a loops cromossômicos (DNA em azul) e produzindo transcritos nascentes (fitas em amarelo). Barra, 50 nm (modificado de Sutherland & Bickmore, 2009). (II) Fábricas de transcrição (em verde) visualizadas in situ em HeLa por incorporação de BrUTP e visualização por imunofluorescência (A) e por espalhamento de fábricas de transcrição e visualização por microscopia eletrônica de transmissão (B e C). Note que fábricas de RNApolI (nucleolares) contêm muitas mais unidades de polimerase engajadas no template
(B) do que fábricas de RNApolII (nucleoplásmica, C). Barras, 1 µm. (D) Detalhe de uma fábrica de RNApolII mostrando o que essas estruturas são ricas em nitrogênio (N), ou seja, em proteínas, e contêm BrRNA visualizado indiretamente com partículas de ouro (Au), mas são pobres em fósforo (P), ou seja, DNA. Barra, 100 nm (modificado de Carter et al., 2008).
Evidências experimentais apontam para uma ainda maior
especialização das fábricas de RNApolII. Um estudo recente (Xu & Cook,
2008) demonstrou que plasmídeos contendo promotores distintos são
dirigidos a fábricas diferentes, dependendo do tipo de promotor. A presença
de íntrons também foi importante na definição da fábrica ocupada por um
dado plasmídeo.
A maioria dos estudos, contudo, focaram na dinâmica espacial de loci
endógenos que são regulados ao longo do desenvolvimento. Os exemplos
mais claros vêm do estudo dos genes de globina, expressos em células
eritróides em fases embrionárias. Utilizando RNA fluorescence in situ
hybridization (RNA-FISH) e chromosome conformation capture (3C), foi
demonstrado por Osborne e colaboradores que o genes ativos de β-globina
colocalizavam em alta freqüência com outros genes específicos de linhagem
eritróides, ainda que esses genes estejam distantes do gene da β-globina (~
25 Mb), embora no mesmo cromossomo. A colocalização espacial dos genes
estava associada a fábricas de RNApolII. Contudo, esses dois loci não se
encontram espacialmente associados quando silenciados (em células
linfóides). Os autores concluíram que genes expressos em linhagens
eritróides compartilham a mesma fábrica de transcrição (Osborne et al.,
2004). Diversos outros estudos correlacionaram a associação espacial em
maior freqüência de diversos genes co-regulados ao longo do
desenvolvimento e diferenciação (Brown et al., 2006; Ling et al., 2006;
Simonis et al., 2006; Spilianakis et al., 2005; Würtele & Chartrand, 2006;
Zhao et al., 2006). Contudo, esses estudos não investigaram qual a
associação dos loci co-regulados com fábricas de transcrição no momento
em que estes estão ativos. Já em outro trabalho demonstrou-se que genes
eritróides de humanos quando ativos não se apresentam em associação com
fábricas de transcrição, mas sim com speckles, estruturas associadas com o
processamento de RNA (Brown et al., 2008).
Portanto, embora seja claro que, em mamíferos, diversos genes
co-regulados ao longo do desenvolvimento estão em maior proximidade espacial
quando ativos, a relação espacial dessas associações com fábricas de
2. Objetivos
Dada a importância da organização espacial da cromatina e da
compartimentalização de proteínas nucleares para expressão gênica em P.
falciparum, tivemos como objetivo principal, nesta tese, caracterizar de forma quantitativa e qualitativa a organização espacial global da transcrição nesse
parasita. Buscamos, ainda, caracterizar a dinâmica espacial de genes ciclo
eritrocítico funcionalmente relacionados e co-regulados de maneira
estágio-específica, a fim de verificar como tais genes estariam posicionados no
núcleo em relação a fábricas de transcrição.
Os objetivos específicos deste trabalho foram:
A. estabelecer e otimizar em P. falciparum a técnica de marcação de
RNA nascente in situ por incorporação de BrUTP;
B. desenvolver, em colaboração com grupo de Image Mining do
Institut Pasteur Korea, um software para o estudo automatizado e
quantitativo dos compartimentos de transcrição definidos por
BrUTP em P. falciparum;
C. analisar a arquitetura da transcrição em P. falciparum e investigar
a presença de organização conservada desta ao longo do ciclo
eritrocítico;
D. avaliar a relação espacial dos compartimentos de transcrição com
outros compartimentos descritos no núcleo de P. falciparum;
E. utilizando fluorescence in situ hybridization, investigar, ao longo do
ciclo eritrocítico, a posição de genes co-ativados, e se estes
encontram-se em maior proximidade/possuem maiores índices de
3. Material e Métodos
3.1 Composição de soluções e tampões
- PBS: 140 mM NaCl, 2.7 mM KCl, 10 mM tampão de fosfato pH 7,4
(Medicago #09-8912-100)
- 1x TBE: 100 mM Tris-base, 90 mM ácido bórico, 1 mM EDTA
(Invitrogen #15581-028)
- 20x SSPE: 3 M NaCl, 200 mM NaH2PO4, 20 mM EDTA, pH 7,4
(Invitrogen #15591-027)
- 20x SSC: 3 M NaCl, 0,3 M citrato de sódio, pH 7,0 (Invitrogen
#15557-044)
- Tampão de lavagem para incorporação de BrUTP: 150 mM sacarose,
20 mM glutamato de potássio, 3 mM MgCl2, 2 mM DTT, 10 µg/ml leupeptina
- Tampão de marcação para incorporação de BrUTP: tampão de
lavagem adicionado de 50 mM creatina fosfato, 200 µg/ml creatina cinase,
120 U/ml RNasin (Promega #N2511) e, quando indicado, 200 µg/ml α
-amanitina
- Solução de hibridização para fluorescence in situ hybridization (FISH):
50% formamida, 2x SSPE, 10% dextran sulfato, 250 µg/ml DNA de esperma
de salmão
- Solução TNT: 0,5% Tween 20, 150 mM NaCl, 100 mM Tris-HCl
3.2 Meios de cultura e soluções de sincronização de P. falciparum
- - Meio de cultura completo para P. falciparum: 100 µM hipoxantina de
sódio, 16 µM timidina, 10% albumax I (Invitrogen #11020-039), 20
µg/ml gentamicina em RPMI 1640 (Invitrogen #22400)
- - Soluções para sincronização: 5% sorbitol em água ultrafiltrada; 0.7%
gelatina (Sigma #G9391) em RPMI 1640 (Invitrogen #22400)
Todas as soluções foram esterilizadas por filtragem em membrana de
3.3 Cultivo e sincronização de P. falciparum
Parasitas da cepa 3D7 foram utilizados neste trabalho. Os parasitas
foram mantidos em meio de cultura completo contendo 3% de hematócrito
(eritrócitos humanos tipo O+) e atmosfera de 1% O2, 5% CO2 e 94% N2. Para
manutenção rotineira das culturas, a parasitemia foi mantida entre 1 e 5%.
Durante os experimentos de incorporação de BrUTP e FISH (descritos
abaixo), os parasitas foram submetidos a pelo menos um ciclo de
sincronização em gelatina e sorbitol. Mais detalhadamente, parasitas
maduros de culturas não sincronizadas foram centrifugados a 1000 x g por 2
min a temperatura ambiente. Cada volume de pellet foi ressuspenso em 9
volumes de 0,7% gelatina em RPMI e incubados a 37ºC por 1 h. Em seguida,
o sobrenadante contendo apenas parasitas maduros (idealmente,
esquizontes a ~ 38 – 42 horas pós-invasão, ou hpi) foi coletado em um novo
tubo, lavado uma vez em RPMI, e colocado em cultura com adição de
eritrócitos frescos, conforme descrito acima. Vale ressaltar que, em nosso
laboratório, o ciclo eritrocítico da cepa 3D7 dura aproximadamente 40 a 44
horas. Os parasitas nessas condições foram mantidos em cultura por 4 horas
a fim de permitir a invasão de novos eritrócitos. Após esse período, a cultura
foi centrifugada e tratada com 5% sorbitol (4 volumes de 5% sorbitol para 1
volume de pellet) por 5 min a 37ºC. O pellet contendo apenas parasitas
anéis, além de eritrócitos não infectados, foi recolocado em cultivo a 37ºC até
o momento do experimento. Este tratamento tem como objetivo lisar as
formas maduras que não completaram a invasão, enquanto que as formas
jovens (anéis de 0 a 4 hpi) foram preservadas pelo tratamento. A amplitude
da idade dos parasitas nessas populações é de 4 horas e para simplificar,
nos referimos daqui por diante à idade média da população: por exemplo,
uma população contendo parasitas de 8 a 12 hpi é classificada como 10 hpi,
e uma população contendo parasitas de 20 a 24 hpi é classificada como 22
hpi. Algumas vezes, tratamentos consecutivos de gelatina-sorbitol foram
necessários por dois a três ciclos a fim de alcançar um alto grau de
na mesma fase do ciclo).
3.4 Marcação de RNA nascente in situ por incorporação de BrUTP
A incorporação de 5-bromouridina 5’-trifosfato (BrUTP) em P.
falciparum foi adaptada do protocolo de (Dossin & Schenkman, 2005). A cultura sincronizada conforme descrito acima, foi coletada a 10 ou a 22 hpi,
centrifugada a 1000 x g por 2 min a temperatura ambiente, e ressuspensa a 1
x 109 eritrócitos infectados/ml em tampão de lavagem gelado.
Lisofosfatidilcolina (lisolecitina, Sigma #L4129) foi adicionada para uma
concentração final de 0,01% e, após homogenização por inversão, os
parasitas foram incubados por 5 min em banho de água e gelo. As células
permeabilizadas foram centrifugadas a 2500 x g por 10 min a 4ºC e lavadas 3
vezes em tampão de lavagem gelado. Em seguida, o pellet foi ressuspenso
em tampão de marcação a 1 x 109 eritrócitos infectados/ml na presença ou
ausência de 200 µg/ml de α-amanitina (daqui em diante referida apenas
como α-amanitina, ficando portanto subentendida que a concentração
utilizada foi a de 200 µg/ml) e incubados por 5 min a 37ºC. Foram
adicionados então a ambas preparações 2 mM ATP, 1 mM GTP, 1 mM CTP
e 1 mM BrUTP (concentrações finais) e a marcação procedeu por 10 min a
37ºC. Os parasitas foram então imediatamente fixados em 4%
paraformaldeído em PBS pH 7,4 (4% PFA) a 1,25 x 108 parasitas/ml por 20
min a temperatura ambiente. Após a fixação, os parasitas foram
centrifugados a 2500 x g por 10 min a 4ºC, lavados uma vez em PBS e
ressuspensos em PBS. A suspensão de parasitas foi colocada sobre uma
lâmina de microscopia pré-coberta com 0,1% polilisina por aproximadamente
30 min em câmara úmida à temperatura ambiente para permitir a adesão dos
parasitas ao vidro. Em seguida, os parasitas foram submetidos a ensaio de
imunofluorescência (ver abaixo). Ocasionalmente, quando os parasitas foram
preparados para aquisição de imagens em microscópio confocal (ver
adiante), microesferas fluorescentes (Tetraspeck microspheres, Invitrogen
#T7283) foram aderidas à lâmina, anteriormente aos parasitas, seguindo as
3.5 Ensaio de imunofluorescência para proteínas nucleares
Todas as etapas subseqüentes foram realizadas em câmara úmida
protegida de luz e mantida à temperatura ambiente. É de extrema
importância evitar a secagem da preparação a fim de se preservar ao
máximo a arquitetura nuclear. O excesso de parasitas depositados sobre as
lâminas de vidro foi removido e então os parasitas aderidos foram
permeabilizados com 0,1% Triton X-100 em PBS por 2 min, lavados 3 vezes
em PBS e bloqueados por 30 min em 4% BSA em PBS pH 7,4 (4% BSA). Em
seguida, o excesso de 4% BSA foi removido e os parasitas foram incubados
com o anticorpo primário apropriado por 45 min.
Para detecção de BrRNA (RNA nascente marcado com BrU), foi
utilizado o anticorpo monoclonal de camundongo anti-deoxiuridina (anti-BrdU)
clone PRB1 (Invitrogen #A21300); para detecção de PfSir2A, foi utilizado um
soro policlonal de coelho (Freitas-Junior et al., 2005), gentilmente cedido pelo
Prof. A. Scherf, Institut Pasteur, France; para detecção de PfNop1, foi
utilizado um soro de cabra anti-fibrillarina humana, (Santa Cruz #SC-11335);
para detecção de histona H4 acetilada (H4ac) e de trimetilação da lisina 79
da histona H3 (H3K79me3), foram utilizados soros policlonais de coelho
(respectivamente, Millipore # 06-598 e Abcam # AB2621). Todos os
anticorpos primários foram diluídos 1:50 (v/v) em 4% BSA, com exceção de
anti-Hac, que foi diluído 1:100 (v/v).
Após incubação com anticorpos primários, os parasitas foram lavados
em PBS 3 vezes e incubados com o anticorpo secundário apropriado e 5
µg/ml DAPI diluídos em 4% BSA por 30 min. Para detecção de anti-BrdU em
séries confocais ou em combinação com a detecção de PfSir2A,
anti-H4ac e anti-H3K79me3, utilizamos soro anti-IgG de camundongo-Alexa 488
(Invitrogen #A11001), diluído 1:200 (v/v) para anti-BrdU e soro anti-IgG de
coelho-Alexa 555 (Invitrogen #A21429) diluído 1:800 (v/v) para anti-PfSir2A,
anti-H4ac e anti-H3K79me3. Para a detecção de anti-BrdU juntamente com
anti-fibrilarina humana (anti-PfNop1), utilizamos soro anti-IgG de
camundongo-Alexa 555 (Invitrogen #31570) e soro anti-IgG de cabra-Alexa