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O Brasil precisa de política industrial? De que tipo?

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Academic year: 2017

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Os artigos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões

neles emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Fundação

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o

Brasil Precisa de Política Industrial? De que Tipo?*

MAURICIO CANÊDO-PINHEIROa

EPGE/FGr" e IBRElFGV

SAMUEL DE ABREU PESSÔAc

EPGDFGr e IBRElFGr"

LUIZ GUILHERME SCHYMURAb

EPGDFGr" e IBRE'FGr'

Resumo

Este trabalho discute a conveniência do uso de políticas industrias no Brasil. Argumenta-se que o sucesso dos países do Leste Asiático, muitas vezes relacionado ao uso de política industrial (PI), é resultado principalmente de políticas horizontais. Além disso, aponta-se que a maioria dos argumentos utilizados para justificar a adoção de PI carece de fundamentação teórica e empírica e que PI deve ser motivada por algum tipo de falha de mercado. Nesse sentido. faz-se uma breve descrição das falhas de mercado que teoricamente justificariam algum tipo de PI. avalia-se a relevância empírica destas falhas e quais as ferramentas de intervenção seriam mais adequadas (se for o caso). A partir disso, avalia-se a atual política industrial brasileira, tal como descrita em Brasil (2003). Por fim, conclui-se que políticas horizontais, além de estarem menos sujeitas à pressão de grupos organizados, possuem maior potencial para impulsionar o crescimento econômico brasileiro.

Palavras-Chave: Política Industrial, Inovação, Falhas de Mercado, BrasiL Crescimento.

Classificação JEL: 014,038,040.

Abstract

This artic1e discllsses the convenience of adopting industrial palie}" in Brazil.

We

argue that the sueeess of East Asian eountries, uSllal(\" explained b,r industrial policy, is main(l' result of horizontal policies. We also shmv that there are not theoretical ar empirieal foundations in most of the argllments used to just(f}" industrial polic)i and that industrial polic)' must be motivated by markel fàilures. We briefly discuss 11'hat market failures theoretiealZv justify industrial poliey, 11'hal the empirical relevance of these failures and セカィ。ャ@ the mosl adeqllate inslrlllnents to be used in ease of publie inlervention. From this perspeetive, 11'e ana(vze lhe Brazilian industrial polic)', such as described in Brasil (2003). Final(\", we conclude that horizontal policies, besides to be less suNect to the in.fluence of se({-interested groups, have more potential tofoster Brazilian groll·th.

KeJ'words: Industrial Palie)". Inno\'Qtion. Market Failures. Brazil. Groll·th.

lEL Classijication: 014. 038. 040.

* Os autores agradecem aos participantes das reuniões semanais no IBRE/FG I' pelas diversas sugestões. em especial a Afonso Arinos de Melo Franco Neto. Pedro Cavalcanti Ferreira, Claudio Burian Wanderley e Guilherme Hamdan de Araújo Gontijo. Agradecimento também a Filipe Lage de Souza pela leitura atenta de uma versào preliminar e por seus comentários. Obviamente. os erros remanescentes sào de responsabilidade exclusiva dos autores. As opiniões expressas neste trabalho nào correspondem necessariamente à posiçào das instituições de afiliação dos mesmos.

J Praia de BOfa/ágo. 190. sala 914. CEP: :;:;:;50-9110. Rio de Ja/leiro - RJ. E-mail: calledOlÍifjp·.br. , Praia de BOfofogo. 190. sala 9:;9. CEP: :; :;:;5()-9f11!. Rio de Ja/leiro - RJ. E-mail: pe.\soa(ujgdJ/·.

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1. Introdução

A necessidade de adoção de algum tipo de política industrial (PI) é um tema recorrente na discussão de intervenções públicas voltadas para impulsionar o crescimento. Nesse sentido. cabe fazer a distinção entre políticas industriais setoriais (ou verticais), que atendem somente a alguns setores, e políticas horizontais. que atingem indistintamente todos os setores. Muitos autores defendem políticas setoriais [Kupfer (2003), Além. Barros e Giambiagi (2002)] sob diversos argumentos, em especiaL a partir da constatação de que outros países se utilizaram destas políticas e obtiveram sucesso ou levando em conta a necessidade de melhorar nossas contas externas. Pretende-se mostrar que estes dois argumentos não são válidos e que mais adequada seria a adoção de políticas horizontais.

A construção deste argumento se dará em duas partes. Na primeira parte (seções 2 e 3). mostra-se que não há evidências de que o sucesso dos países do Leste Asiático, apontados como modelos a serem seguidos pelo Brasil, se deve primordialmente ao uso de políticas industriais setoriais e que a adoção de políticas horizontais teve um papel preponderante no desempenho de Japão, Coréia do Sul e Taiwan.

Na segunda parte (seção 4). argumenta-se que políticas setoriais fazem sentido na presença de falhas de mercado. N esse sentido. discute-se que falhas de mercado poderiam teoricamente justificar tais políticas e se existem evidências de que estas falhas são significativas a ponto de merecer algum tipo de intervenção do governo. Mais urna vez, mesmo nos casos em que as falhas de mercado parecem justificar a intervenção pública, as políticas mais adequadas são de caráter horizontal, ou são mais eficazes se acompanhadas destas políticas.

Por fim, analisa-se a atual política industrial brasileira, consubstanciada em Brasil (2003). à luz da discussão das seções 2. 3 e 4. A despeito de ser um documento de governo, a escolha de Brasil (2003) não embute nenhuma conotação político-partidária, mesmo porque boa parte dos argumentos e propostas contidos nesse documento foram de alguma maneira utilizados ou implementados por outros governos. A opção por ilustrar os argumentos construídos ao longo deste trabalho com a análise de Brasil (2003) se deu basicamente por conta de dois critérios: (i) trata-se de documento recente; (ii) traz, de urna maneira resumida e sistematizada, grande parte dos argumentos utilizados pelos defensores do uso de política industrial vertical. Nesse sentido, mostra-se que Brasil (2003) acerta quando propõe algumas políticas horizontais, quando adota prazos definidos para sua vigência e exige contrapartida das empresas contempladas e quando reconhece o papel importante da inovação. No entanto, argumenta-se que não as propostas contidas em Brasil (2003) não são adequadas para atingir o objetivo de contornar a restrição externa que o país enfrenta nem para gerar empregos ou promover o desenvolvimento regional. Além disso, não existe racionalidade econômica em manter o foco desta política em setores estratégicos "avançados" ou "de ponta".

2. Política Industrial: Brasil versus Leste Asiático 2.1. Política Industrial no Brasil

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principalmente através da imposição de tarifas protecionistas [Prebisch (1950) & Singer (950)].1

Não se pretende fazer um relato detalhado da PI brasileira ao longo dos últimos anos [para tal ver Suzigan (1995), Guimarães (1996) e Bonelli, Veiga & Brito (1997), Suzigan &

Furtado (2006)], mas elencar brevemente as ferramentas utilizadas para promoção da indústria. Entre as décadas de 50 e 80 basicamente foram utilizados diversos tipos de proteção comercial (imposto de importação e barreiras não tarifárias, tais como exame de similaridade, índices de nacionalização, contingenciamento, licenciamento prévio das importações, preferência nas compras governamentais), estímulo à exportação (câmbio favorecido para exportação de manufaturados e isenções fiscais) e subsídios à produção em setores selecionados (isenção e redução de impostos e aceleração da depreciação do capital).2 Além disso, houve intenso direcionamento de crédito para os setores considerados prioritários e uma pesada presença direta do Estado em diversas atividades produtivas. Soma-se a isso entraves para adoção de novas tecnologias (Lei da Informática, por exemplo), grandes investimentos estatais em infra-estrutura (principalmente até o final da década de 70) e expansão do ensino superior (principalmente a partir da década de 70).

Se aparentemente a PI obteve sucesso em modificar a estrutura produtiva brasileira, não há evidências de que conseguiu promover crescimento sustentado durante muitos anos. A comparação com países que estavam em estágio semelhante de desenvolvimento é bastante ilustrativa. Perceba que na década de 60 a renda per capita do Brasil era maior do que muitos dos países do Leste Asiático, mas que durante a década de 80 foi ultrapassado por todos eles. A título de ilustração, em 1980 a renda per capita brasileira era 131 % da sul-coreana, 40% da japonesa e 108% da taiwanesa. Em 2000 era 50% da sul-coreana, 28% da japonesa e 39% da taiwanesa (ver Figura 1 INセ@

100

90

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111

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Figura 1: Renda Per Capita Relativa (Estados Unidos

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fHIョエセZ@ hセセエッョN@ sオュュセイ@ ... &: a{セョ@ サセooNZ@ I

-Brasil Coréia do Sul

--Japão Taiwan

...• - Chile

I No entanto. cabe lembrar que não há consenso a respeito da deterioração dos termos de troca [ver Hadass &

Williamson (200 I) para referências a este respeito]. Por outro lado, Sarkar & Singer (1991) encontram indícios de que os termos de troca para exportações de manufaturados dos países em desenvolvimento também tendem a se deteriorar. o que justificaria as prescrições de Prebisch (1950) e Singer (1950) mesmo em um estágio mais adiantado de desenvolvimento.

: Estas ferramentas não foram utilizadas com a mesma intensidade em todos os períodos. Mais detalhes ver Suzigan (1995 l.

, Para Tai"an as informações se referem ao ano de 1998.

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A partir da década de 90, percebe-se um movimento de abertura da economia e diminuição do papel do Estado como empresário. O impacto da abertura comercial na produtividade da indústria é amplamente documentado [Ferreira & Rossi-Júnior (2003)], mas aparentemente não se traduziu em taxas de crescimento excepcionalmente altas, principalmente se comparadas com períodos anteriores (caracterizados pelo uso intenso de políticas verticais) ou com os países do Leste Asiático (ver Figura 1). Sendo assim, muitos autores apontam o desempenho da economia brasileira nos últimos quinze anos como uma evidência da necessidade do uso de políticas setoriais [ver Kupfer (2003), por exemplo].

Aliás, Coréia do SuL Japão e Taiwan muitas vezes são apontados como exemplos de países com políticas industriais bem sucedidas. Se, conforme será mostrado na próxima subseção, o Brasil usou instrumentos semelhantes a estes países, qual seria a causa do nosso fracasso? Uma primeira resposta poderia ser a existência de problemas na implementação da política industrial brasileira. Este tema será retomado na subseção 2.3.

2.2. Política Industrial no Leste Asiático

Assim como na subseção anterior, não se pretende fazer uma descrição detalhada da PI adotada pelos países do Leste Asiático [para referências a este respeito ver Noland & Pack (2002,2003)]. Será feito um breve resumo das ferramentas utilizadas por Japão, Coréia do Sul e Taiwan na promoção da indústria.

Como no BrasiL o Japão utilizou subsídios diretos, embora os setores beneficiados tenham sido justamente aqueles que viram sua participação diminuir (agricultura, pesca, floresta, mineração de carvão). Além disso, lançou-se mão de uma ampla gama de subsídios indiretos: o Programa de Investimentos e Empréstimos Fiscais, cujo destino primordial foram investimentos em infra-estrutura, educação, saúde e outras políticas de bem-estar, empréstimos a juros subsidiados e aceleração da depreciação. Também existiram programas voltados especificamente para pesquisa e desenvolvimento, seja via subsídio direto ou através de contratos com o governo (este último canal foi o mais importante). Por fim, também houve contingenciamento do câmbio e alocação das reservas para produtos estratégicos (principalmente até meados da década de 60) e tolerância com comportamentos anticompetitivos.

Na década de 60 a Coréia do Sul se valeu de instrumentos como isenção de tarifas para importação de bens intermediários, incentivos fiscais, acesso preferencial ao capital, depreciação acelerada de equipamentos importados, preços subsidiados de energia e transporte. O governo controlou o sistema financeiro e durante quase todo o período as taxas reais de juros se mostraram negativas. Na década de 70 o foco foi voltado para a indústria pesada e química. O governo aprofundou o controle sobre sistema bancário, direcionando linhas de crédito para determinados setores, projetos e firmas. Estes setores também receberam pesados incentivos fiscais e proteção comercial.

Por fim, Taiwan também utilizou incentivos fiscais (redução de impostos ou aceleração da depreciação, a escolha das firmas). O foco destas políticas passou de indústrias exportadoras (década de 60), para setores intensivos em capital (década de 70) e posteriormente para indústrias intensivas em tecnologia (década de 80). Este programa foi remodelado a partir do diagnóstico de que havia pouca relação entre a participação no programa e ganhos de produtividade. O foco passou a ser investimento em pesquisa e desenvolvimento e redução da poluição, mas alguns incentivos específicos foram mantidos nos setores de alta tecnologia. Também foram utilizadas diversas modalidades de crédito público subsidiado, principalmente para atividade exportadora. Com relação à proteção comercial, a década de 50 foi caracterizada por uma política de substituição de importações, que foi abrandada ao longo dos anos. Embora muitos setores fossem muito protegidos, tinham que justificar esta proteção com base em sua capacidade para competir com produtos importados. Ao contrário do Japão, o gowrno teve participação preponderante no

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financiamento e incentivo à atividade de pesquisa e desenvolvimento, seja ela criação de instituições para identificar, transferir, difundir e absorver tecnologias industriais estrangeiras (décadas de 70 e 80), seja por subsídios diretos à pesquisa realizada pelas firmas privadas.-l

2.3. Algumas Diferenças com Relação à Implementação da Política Industrial

Ficou claro que os países do Leste Asiático lançaram mão de muitas das políticas empreendidas no Brasil. No entanto, podem ser identificadas duas diferenças básicas com relação à implementação destas políticas. Em primeiro lugar, no Leste Asiático as firmas beneficiadas pelos programas do governo foram sempre confrontadas com metas de desempenho, que em caso de não cumprimento implicavam na descontinuidade do mesmo. Além disso, ao contrário do Brasil, os subsídios e incentivos foram desenhados para serem reduzidos ao longo do tempo.5

Também cabe salientar que a política industrial brasileira implicou uma sene de barreiras à adoção de novas tecnologias, ao contrário dos países do Leste Asiático, que criaram mecanismos para facilitar esta atividade. Aliás, vários autores sublinham a importância deste aspecto no desenvolvimento dos países do Leste Asiático [Pack (2001)].

Com relação aos aspectos levantados nos parágrafos anteriores, pode-se dizer que a política industrial brasileira sofreu de problemas sérios em sua implementação. Muitos autores defendem que, corrigidos estes problemas, os resultados alcançados nos países do Leste Asiático poderiam ser reproduzidos em outros países [Wade (1990), Chang (2003)].6 Este argumento parte da premissa de que a política industrial na Coréia do Sul, Japão e Taiwan foram os principais motores do crescimento destes países. Entretanto, nas próximas seções pretende-se demonstrar que não é esse o caso: a política industrial parece ter um papel muito menos importante do que muitos autores advogam.

2.4. Crescimento nos Países do Leste Asiático: Resultado de Política Industrial?

Até aqui tem se tomado como verdadeira a hipótese de que existe causalidade positiva entre crescimento e política industrial nos países do Leste Asiático. No entanto, não é imediata a relação entre a presença de políticas setoriais e o surto de crescimento observado nas últimas décadas nestes países. Tome-se, por exemplo, a análise de Wade (1990) a respeito da expenencia de Taiwan.7 Embora reconheça que foram empreendidas políticas macroeconômicas saudáveis - déficit público controlado, inflação baixa e câmbio pouco pressionado - e investimentos significativos em infra-estrutura e em educação, o autor credita o bom desempenho deste país às políticas setoriais desenvolvidas pelo governo. Argumento semelhante é feito por Chang (2003) para um grupo maior de países.

セ@ Em 1978 o go\'emo respondia por 65% dos gastos em pesquisa e desenvolvimento e em 2000 por 40° n. Além

disso. os gastos (públicos e pri\ados) nesta atividade passaram de PNXセP@ do PIB em 1978 para 2°0 em 2000

{セッャ。ョ、@ & Pack (2002. 2003»),

, ema outra diferença apontada por alguns autores é a ênfase de países como o Brasil na substituição de importações enquanto os países do Leste Asiático privilegiaram a promoção de exportações [Westphal (1990)]. Para outras referências ver Rodrik ( 1995).

A Não se pode esquecer que também no Leste Asiático podem ser identificados diversos problemas na

implementação da política industrial. Em Noland & Pack (2002. 2003) é ressaltado que no Japão muitas vezes a coordenação entre as diversas agências responsáveis pela implementação das políticas falhou e paralisou todo o processo. Ademais. há indícios de que os setores tradicionais (baseados em recursos naturais) foram os mais beneficiados. o que sugere algum tipo de captura por grupos organizados. Na Coréia do Sul também existem

diversos casos de corrupção. captura e problemas sérios de moral ha::ard.

Embora se concentre na experiência de Tai\\'an. as conclusões de Wade (1990) são estendidas para outros países asiáticos. em particular Coréia do Sul c Japão,

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,

I

No entanto existe um viés de seleção neste argumento. Pelos mais diversos motivos, praticamente todos os países do mundo fizeram algum tipo de política setorial ou de incentivo à indústria. Alguns apresentaram bom desempenho e hoje são países desenvolvidos. mas a maioria deles não alcançou os resultados almejados. Desse modo, selecionar os casos de sucesso e verificar que todos foram objeto de algum tipo de política industrial não é suficiente para demonstrar causalidade entre políticas de promoção à indústria e crescimento. Há que se levar em conta a existência de fracassos.

Aliás. Wade (1990) até reconhece que outros países utilizaram as mesmas ferramentas dos países do Leste Asiático e chegaram a resultados pífios. Segundo o autor a diferença entre o desempenho de Taiwan, Coréia do Sul e Japão e dos demais países seria que no Leste Asiático houve "uma consistente e coordenada atenção aos problemas e oportunidades de indústrias específicas. no contexto de uma perspectiva de longo prazo da evolução da economia, e um estado forte o suficiente não só para produzir os efeitos desejados na economia, mas também a direção destes efeitos" [Wade (1990), p. 343]. Dito de outro modo, a diferença no desempenho dos países que empreenderem algum tipo de política industrial se deveria a falhas de implementação em alguns deles. o que remeteria ao argumento desenvolvido na subseção 2.3. Nesse caso, corrigidos os erros de implementação, as experiências dos países do Leste Asiático poderiam ser reproduzidas por outros países com sucesso.

Entretanto, existe um problema de identificação que não foi satisfatoriamente resolvido em Wade (1990) e Chang (2003). Países como Japão, Coréia do Sul e Taiwan lançaram mão de políticas industriais. mas também de outras políticas que teriam efeito positivo no crescimento. Cabe identificar qual o impacto de cada tipo de política no desempenho econômico destes países. Nesse sentido, existe uma farta literatura empírica que investiga o impacto da política industrial (proteção comercial e subsídios, principalmente) no crescimento dos países do Leste Asiático e aponta para um impacto negativo (ou pouco significativo) da mesma na produtividade do trabalho ou na produtividade total dos fatores [Yoo (1990), Noland (1993, 1997), Lee (1996), Beason & Weinstein (1996) e Lawrence &

Weinstein (1999)].8 Estas evidências são robustas à consideração da possibilidade de políticas setoriais gerarem externalidades para setores não contemplados [Pack (2000), Pack & Lin (2001 )].

3. Políticas Públicas e Crescimento: O Que Realmente Importa?

Se existem evidências de que o impacto da política industrial no desempenho dos países do Leste Asiático foi pequeno, o que justificaria a diferença com relação ao desempenho do Brasil? Esta seção mostra que, além de PI e ao contrário do Brasil. Japão, Coréia do Sul e Taiwan adotaram sistematicamente uma série de políticas públicas que, do ponto de vista teórico e empírico, tendem a favorecer o crescimento. Para a ilustrar esta diferença de comportamento. fez-se uma compilação de diversos indicadores para o Brasil. Japão. Coréia do Sul e Taiwan. Além disso. também foram contemplados indicadores dos Estados Unidos e Chile. referências de um país desenvolvido e de um país da América Latina com bom desempenho econômico. respectivamente.

3.1. Política Fiscal, Inflação e Qualidade dos Gastos Públicos

Uma das diferenças marcantes entre o Brasil e os países do Leste Asiático diz respeito à

condução da política fiscal. Japão, Coréia do Sul e Taiwan sempre mantiveram uma política fiscal austera [Noland & Pack (2002, 2003)], enquanto no Brasil a preocupação em reduzir o déficit público é muito recente.

x Compilações desta literatura podem ser encontradas em \l oland & Pack (2002. 2003) e Pack & Saggi (2006).

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I

Além disso, do ponto de vista teórico e empírico também há muitos motivos para crer que inflação alta diminui o crescimento dos países [ver Mansoorian & Michelis (2005)].9 A comparação entre o Brasil e alguns países do Leste Asiático é bastante ilustrativa a esse respeito (ver Tabela I).

Tabela 1: Taxa de Inflação Anual Média (Índice de Preços ao Consumidor)

1960-1969 1970-1979 1980-1989 1990-1999 2000-2005

Brasil 42,82 % 32,59 % 271,7 % 280,4 % 7,71%

Coréia do Sul 13,00 % 15.05 % 8.08 % 5,71 % 3,04%

Japão 5.35 % 8,97 % 2.51 セG￳@ 1,20 % -0,37%

Taiwan 4.77 % 8.90% 4.44 % 2,87 % 0,78%

Chile 24.16% 130.36% 20.29% 10,28% 2,82%

Estados Unidos 2.17% 6.46% 4,17% 2.46% 2,12%

Fonte,: Qセif@ 12005) e Bureau ofStau;;tics - Republic ofChina (2005).

Com relação a este tema, existem fartas evidências de que a condução da política fiscal tem impacto significativo no desenvolvimento dos países no longo prazo. Mais especificamente, ajustes fiscais tendem a favorecer o crescimento da renda per capita tanto em países ricos [Alesina & Perotti (1995), Alesina et alli (2002)] quanto em países pobres [Baldacci. Hillman & Kojo (2004). Gupta et a//i (2005)]. No entanto, os canais de transmissão são diferentes: nos países desenvolvidos o aumento da taxa de crescimento é resultado da elevação do investimento privado [Alesina et a//i (2002)] enquanto nos países pobres é fruto principalmente do incremento da produtividade [Baldacci, Hillman & Kojo (2004)].lIJ

Aliás, os resultados de Baldacci, Hillman & Kojo (2004) são indícios de que os gastos públicos nos países mais pobres são ineficientes. Nesse sentido: (i) a qualidade do ajuste fiscal também é importante, ou seja, o corte de despesas correntes tende a ser mais proveitoso do que reduções no investimento ou aumento de receitas [Von Hagen & Strauch (2001) e Gupta et a/li (2005)]: (ii) a qualidade da burocracia estatal e o nível de corrupção no governo possuem impacto significativo no resultado das políticas públicas [Rajkumar & Swaroop (2002)]; (iii) a eficiência do setor público tende a ser menor em países em que os gastos do governo são maiores como proporção do PIB [Herrera & Pang (2005)].

No que tange ao item (i), embora nos últimos anos o Brasil tenha reduzido drasticamente o déficit público, está claro que esta redução foi feita às custas de cortes no investimento e aumento de receitas, o que indicaria a necessidade de se fazer um ajuste fiscal de melhor qualidade. Com relação ao item (ii), a comparação internacional é bastante desfavorável ao Brasil. Conforme ilustrado na Tabela 2, percebe-se que, em termos de corrupção e de qualidade da burocracia estatal, os indicadores brasileiros se encontram muito abaixo dos norte-americanos, dos países do leste asiático e mesmo do Chile. Por fim. o item (iii) sugere que um ajuste fiscal de qualidade por si só tende a melhorar a eficiência dos gastos públicos, o que reforçaria o efeito desta medida e facilitaria o aprofundamento do ajuste.

9 Em termos teóricos e empíricos há um certo consenso do impacto negativo da inflação na taxa de crescimento

dos países. no entanto ainda não há um consenso se este impacto é apenas de curto e médio prazo ou se é de longo prazo.

111 Basicamente. os canais pelos quais a inflação diminui o crescimento são os mesmos [ver Fischer ( 1993) e

Baldacci. Hillman & Kojo (2004) para mais detalhes e outros canais] .

(9)

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セ@

Tabela 2: Indicadores de Corrupção e Qualidade da Burocracia Estatal (2004) Controle da Corrupção3 Eficácia do Governob Indicadorc

Rallkilll

Indicadorc

Rallkillg

e

Brasil -0,15 95° 0,02 87°

Coréia do Sul 0,17 78° 0,95 42°

Japão 1.19 290 1,21 29°

Taiwan 0,64 54° 1,15 32°

Chile 1,44 24° 1.27 28°

Estados Unidos 1,83 16° 1,80 14°

" É uma medida da extensão da comlpção. ou seja. do exercicio do poder público para obtenção de ganhos pri\ados,

c Indicador que mede conjuntamente a qualidade da pro\isão do ser\iço público. a qualidade da burocracia estatal. a competência do, ser\idore;, públicos ci\is. a independência do seniço público de pressõe, politicas c a credibilidade do comprometimento do gO\ emo com as políticas públicas,

. Pode assumir \alores entre -.::!.5 e セNZB@

" De um total de 20.+ países, , De um total de 209 paises,

Fonte: Kauffmann. Kraay & セi。ウエイオココゥ@ (2005),

3.2. Infra-estrutura

Do ponto de vista teórico. o canal através do qual o investimento em infra-estrutura contribuiria para o desenvolvimento dos países seria pelo aumento da produtividade dos demais fatores de produção. A este respeito. existem muitas evidências empíricas do impacto positivo do estoque de infra-estrutura no nível e na taxa de crescimento do produto per capita

dos países [ver Calderón & Servén (2004a) para referências].

Nesse sentido, em comparação com os países desenvolvidos ou com os do Leste Asiático, o Brasil se encontra em posição evidente de desvantagem. Tome-se, por exemplo, a geração de energia elétrica. A Figura 2 mostra que o estoque de infra-estrutura per capita

brasileiro é bastante pequeno, mesmo quando comparado a outros países da América Latina. como o Chile.11 Mais ainda, esta diferença chegou a ser bem menor no início da década de 1980, mas foi aumentando ao longo dos anos. Note que estas constatações são mantidas mesmo quando se constrói uma medida do estoque de infra-estrutura que controla para fatores como taxa de urbanização, população e área territorial [Calderón & Servén (2004b)].

Figura 2: Estoque

Per Capita

de Infra-estrutura (Geração de Energia Elétrica)

3.5,---,

1.<

U.:'

ッセMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMセ@

1980 QYセT@ QYxセ@ 199c 19% eOflO 2004

Fonte: \\'orld Bank 12005 I e ElA (2006 J

11 Para comparações em outros setores \'er Schymura & Canêdo-Pinheiro (2006 l.

8

-Sra:-.Ii Coreia do Sul --Japà\J

(10)

Desse modo, faz sentido imaginar que parte da diferença de desempenho entre os países do Leste Asiático e o Brasil pode ser atribuída a este fator, em especial nos últimos trinta anos. Esta conjectura é confinnada pela evidência empírica: o déficit de infra-estrutura brasileiro explica cerca de SUセ￳@ da diferença da taxa de crescimento com relação à Coréia do

Sul [Calderón & Servén (2002)]. Além disso. encontram-se fortes evidências de que investimentos em infra-estrutura, em especial acesso à água tratada e rede de esgotos, têm um papel importante na redução da desigualdade de renda [Calderón & Servén (2004a), Calderón

& Chong (2004)]. A título de ilustração, os resultados de Calderón & Servén (2004a) sugerem

que se o Brasil tivesse o estoque de infra-estrutura da Coréia do Sul, a desigualdade interpessoal de renda seria reduzida em cerca de 15%.

O diagnóstico para o caso brasileiro (e de muitos países da América Latina) é que o governo reduziu seus investimentos em infra-estrutura. mas não conseguiu atrair investimentos privados em quantidade suficiente [Calderón & Servén (2004b)]. Deste modo, embora a solução passe também pelo aumento dos investimentos públicos em infra-estrutura (que depende de um ajuste fiscal de qualidade), está claro que há necessidade da participação do setor privado neste processo. Sendo assim. mostra-se imprescindível que se construam marcos legais e regulatórios que tornem atrativo o investimento privado em alguns setores. 3.3. Investimento em Capital Humano

Adicionalmente, uma das diferenças marcantes entre os países do Leste Asiático e o Brasil é a ênfase dada à acumulação de capital humano. Nesse sentido. a Figura 3 ilustra muito bem esta afinnação. Em 1960 a escolaridade média da população brasileira acima de 15 anos era de cerca de 3 anos de estudo. enquanto em Taiwan e na Coréia era de cerca de 4 anos. Em 2000 o Brasil havia avançado apenas para 4,88 anos de estudo enquanto Taiwan e Coréia atingiram patamares próximos a 9 e 11 anos de estudo, respectivamente.

Figura 3: Escolaridade Média da População Acima de 15 Anos

14,---,

12

10

---HjセMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMセ@

1%11 セijHIo@

-Brasil

Coréia do Sul --Japão

Taiwan

••••. Chile

eセi。、ッセ@ L ャャゥ、ッセ@

Em tennos teóricos. a acumulação de capital humano é desejável porque aumenta a produtividade de outros fatores de produção, além de contribuir para redução da desigualdade de renda. Muitos trabalhos empíricos encontram relação positiva entre nível de escolaridade médio e crescimento [Benhabib & Spiegel (1994) e Sala-i-Martin (1997)]. Evidência semelhante é encontrada com relação à qualidade da educação e crescimento [Hanushek &

Kimko (2000)]. Aliás. quando se leva em consideração não somente os anos de escolaridade. mas também a qualidade da educação. mostra-se que. ao contrário do sugerido em Bils &

Klenow (2000). a acumulação de capital humano gera crescimento.

(11)

l

entre gastos com educação e crescimento. Desse modo, políticas educacionais devem ser Ademais, a relação encontrada é entre educação e crescimento, e não necessariamente desenhadas para garantir que os gastos públicos nesta área se transformem efetivamente em capital humano. No mais, há evidências de que existem extemalidades associadas à educação [ver Moretti (2004) para referências], o que reforçaria a importância de algum tipo de política pública nessa área.

De qualquer modo, o fato é que não existe nenhum país do mundo que seja desenvolvido e que tenha os índices educacionais brasileiros. A Tabela 3 apresenta a parcela da diferença entre o produto por trabalhador do Brasil e de diversos países que é explicada pelo diferencial de educação e ilustra o custo de se ter uma população pouco educada. 12 Note que estas são estimativas conservadoras, pois foram ignoradas as extemalidades associadas à

educação e a diferença de qualidade entre os sistemas de ensino.

Tabela 3: Diferença de Renda Per Capita com Relação ao Brasil Devida à Educação Diferença de Renda Per Capita Explicada pela Educação Coréia do Sul

Japão Taiwan Chile

Estados Unidos

76% 66% 77% 89% 35%

Fonte: Pes,ôa 120(6) e calculo do, autores com a mesma metodologia 1 \er nota de rodapé n. 12)

3.4. Poupança e Previdência

Outro fator importante para fazer com que países mudem de patamar de renda (se aproximando dos países desenvolvidos) é a criação de incentivos adequados para acumulação de capital. O fato é que os países do Leste Asiático e o Chile (mais recentemente) fizeram um considerável esforço de poupança, enquanto durante os últimos quarenta anos no Brasil a taxa de poupança doméstica se manteve pouco acima dos Estados Unidos, país que já se encontra na dinâmica de crescimento balanceado de longo prazo (ver Figura 4). Foge do escopo deste trabalho discutir com detalhes a estratégia brasileira em comparação com estes países, mas certamente a construção de incentivos adequados para poupança passa pelo esforço de poupança do setor público e pela reformulação do sistema de previdência. 13

12 Supondo uma especificação .Hinceriana para a educação pode-se escrever o produto por trabalhador como:

r = Ak" (elnl

tu

.

em que a é a participação do trabalho na renda e f3 é o coeficiente de Mincer associado aos

anos médios de escolaridade da PEA. Seja ,,: a relação capital produto. É possí\el escrewr a função agregada no

"

longo prazo como .,. = NNj・ャAィィMセ@ [Pessôa (2006)). Conseqüentemente. o diferencial de renda entre dois países

atribuído ao diferencial de educação é dado por elll: . "los exercícios supôs-se o conservador \·alor de 0.07 para a

taxa de retomo agregada de Mincer [wr Topcl (1999) e Krueger & Lindahl (2001)]. Todos os dados são para

2000. Os anos médios de escolaridade da PEA (11) foram obtidos de Barro & Lee (2000). Os dados de produto

jllh-hBR)

por trabalhador sào de Heston. Summers & Aten (2002). A Tabela 3 reporta a estatística 100 e

,./

,.

. em que

. _ BR

o subscrito BR indica valores relativos ao Brasil.

13 É sabido que o sistema preYidenciário de repartiçào nos países asiáticos é pouquíssimo dispendioso em termos

comparativos. Praticamente toda a previdência é fundada. como. aliás. ocorre hoje com o Chile. O Brasil gasta

12°" do PIB com previdência. enquanto Coréia do Sul gasta 1.9°0. Chile XNUセHI@ e Estados Lnidos UNTセB@ [World

Bank (2005)]. Cabe lembrar que a parecia de idosos na população brasileira é bem menor do que a maioria destes países (5.3"" contra 7.2°" na Coréia do Sul 7.3"" no Chile e l2AO" nos Estados Lnidos).

(12)

Figura 4: Poupança Doméstica

(%

do PIB)

セGNMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMセ@

111

Fonte \\l)rld Bank. サセiIヲャセャ@

3.5. Conclusão

- B r a ... il cイセゥ。@ do Sul --Japão ..••. Chile

Em resumo. percebe-se que durante muitos anos alguns países do Leste Asiático perseguiram (e ainda perseguem) uma série de políticas horizontais que comprovadamente contribuem para o desenvolvimento: política fiscal austera, ajuste fiscal de qualidade. controle da inflação. incentivo à poupança, investimento em capital humano e infra-estrutura. A diferença para o caso brasileiro é marcante. Em vista disso, cabe se perguntar quais seriam as causas primordiais da diferença entre o desempenho do Brasil (e muitos outros países da América Latina) e de países que conseguiram se aproximar dos países desenvolvidos. em especial os do Leste Asiático. Nesse sentido. mesmo os entusiastas do uso de políticas setoriais não podem ignorar o papel importante de políticas econômicas horizontais no crescimento de países como Coréia do Sul, Japão e Taiwan [De Gregorio & Lee (2003)]. Aliás, a experiência chilena ilustra bem este ponto. Ao contrário da maioria dos países da América Latina, vem perseguindo por muitos anos diversas das políticas econômicas descritas nesta seção. Seria coincidência a diferença entre o desempenho chileno e o da maioria dos países latino-americanos (incluindo o Brasil) nas últimas décadas?

Este argumento pode ser transposto mesmo para países desenvolvidos como Estados Unidos e Alemanha. Além de 'exemplos' de política industrial bem sucedida, o que parece ser longe de verdadeiro, eles eram muito bem sucedidos em outras dimensôes, que a teoria econômica moderna considera essencial para o crescimento de longo prazo. O desenvolvimento inicial da indústria norte-americana baseou-se principalmente em vantagens comparativas. ou seja. na transforn1ação de recursos naturais não-reprodutíveis [Wright (1990)]. Além disso. as evidências apontam que. embora tenham antecipado em alguns anos a implantação de algumas indústrias. o protecionismo norte-americano teve impacto negativo em termos de bem-estar (ver seção 4.1). Finalmente os níveis de alfabetização para homens livres nos Estados Unidos no final do período colonial (isto é, fim do século XVIII) eram de 90% na nova Inglaterra e 70% na Virgínia e Pensilvânia [Galenson (1996)]. Além disso. os Estados Unidos lideraram o processo de universalização do ensino secundário [Goldin (2001)]. No caso alemão, o período de florescimento da indústria coincidiu com baixas taxas de proteção comercial e com investimentos em infra-estrutura, educação e incentivo à aquisição de tecnologia [Chang (2003). p.65-68]. Diferentemente da Alemanha e de forma próxima aos Estados Unidos. a América Latina era das regiôes do globo que apresentava as maiores tarifas de importação [Bértola & WilJiamson (2006)].

(13)

I

セ@

4. Política Industrial e Falhas de Mercado

Nas seções anteriores ficou claro que a política industrial brasileira não alcançou resultados satisfatórios e que, mesmo nos países do Leste Asiático, há evidências de que estas políticas alcançaram resultados limitados. Além disso, existe ampla evidência (teórica e empírica) que sustenta o uso de políticas horizontais, em contraposição a políticas setoriais ou verticais. Estes resultados significam que os países em desenvolvimento, em especial o BrasiL devem abdicar de qualquer tipo de política industrial? A resposta a esta pergunta não é imediata. Na verdade, políticas industriais, quando entendidas como intervenções seletivas setoriais. somente possuem racionalidade econômica se visam corrigir algum tipo de falha de mercado [Grossman (1990)]. Desse modo. a definição do escopo das intervenções do govemo passa primeiramente pela identificação destas falhas. As próximas seções fazem um breve resumo da literatura a este respeito. identificando as principais falhas de mercado que teoricamente justificariam políticas públicas, avaliando empiricamente se há evidências de que essas distorções são grandes o suficiente para merecer a atenção do govemo e, se for o caso. qual tipo de instrumento é o mais adequado.

4.1. Externalidades no Aprendizado

Muitos autores têm enfatizado a necessidade de PI em ambientes em que alguns setores exibem aprendizado dinâmico, ou seja. quando o custo marginal de produção de cada firma diminui com o volume produzido por todas as firmas ao longo do tempo (learning by

dOing).I-l Sendo assim, como as firmas pioneiras não intemalizam a redução de custos que sua produção irá proporcionar para as demais firmas no futuro, existe a possibilidade de que. se o custo inicial de produção for suficientemente alto e sem intervenção do govemo, a economia não produza este bem. Nesse caso. a provisão de subsídios para o setor que apresenta aprendizado dinâmico será ótima se o aprendizado for rápido o suficiente e se o grau de substituição entre o bem doméstico e o importado for suficientemente pequeno [Melitz

(2005)]. Cabe lembrar que, mesmo quando o subsídio é a escolha ótima, este deve ser

escolhido de modo a ser reduzido ao longo do tempo [Melitz (2005) e Miravete (2003 )].

Em um contexto de equilíbrio geral com economias abertas Redding (1999) também encontra que pode ser ótimo algum tipo de subsídio a setores caracterizados por extemalidades no aprendizado, embora admita que na prática a seleção dos setores que devem recebê-lo é bastante difíciL principalmente pela quantidade de informação necessária. Este argumento de ordem prática se toma ainda mais relevante quando se leva em conta que o govemo não conhece a curva de aprendizado das firmas. Em Dinopoulos, Lewis &

Sappington (1995) é mostrado que, sob assimetria de informação com relação à curva de aprendizado, a intervenção pública não se mostra ótima em muitos casos em que seria justificada a intervenção se a informação fosse simétrica. Dito de outro modo, a assimetria de informação diminui o escopo de atuação do govemo para aumentar o bem-estar na presença de /eaming by doing.

Ainda com relação à implementação prática da interwnção do govemo, cabe reforçar que esta se justifica somente se o aprendizado implicar extemalidades entre as firmas. De outro modo. não há justificativa para políticas públicas. Nesse sentido. em Head (1994) é calculado o impacto da proteção comercial na indústria norte-americana de trilhos ferroviários. O impacto nos consumidores se mostrou negativo no curto e longo prazos e o efeito no bem-estar, embora positivo, se mostrou pequeno. Foram encontrados enormes efeitos de aprendizado, mas o resultado de Head (1994) é baseado nas hipóteses de que o

r

iセ@ Mais precisamente. c,

=

c( Q, ) . onde Q, =

fq,

cf,. (I, e c, sào a produçào doméstica e o custo no instante r .

"

(14)

spillover de conhecimento dentro da indústria doméstica é perfeito e de que não existe tal externai idade entre as firmas norte-americanas e as britânicas. A última hipótese, além de viesar o resultado na direção de validar a hipótese da presença de externalidades entre as finnas domésticas, é bastante discutível, na medida em que, conforme salientado em Irwin (1998), parte considerável dos trabalhadores da indústria norte-americana de aço adquiriam conhecimento e experiência nas indústrias britânicas.

Em Irwin (1998) é desenvolvido um modelo probabilístico no qual a decisão de entrada e saída das firmas é endógena. A aplicação deste modelo para a indústria norte-americana de folhas-de-flandres do início do século XIX mostra que as tarifas de importação instituídas em 1890 adiantaram em cerca de dez anos a implantação deste setor nos Estados Unidos. Apesar disso. a proteção comercial apresentou efeitos negativos em termos de bem-estar. Ohashi (2004) mostra que o aprendizado na indústria japonesa de aço foi bastante rápido, mas que não foram observados spillovers dentro do setor e que os subsídios à

exportação tiveram impacto pouco significativo no crescimento da indústria.

Com relação à indústria de semicondutores, Irwin & Klenow (1994) mantêm o foco em chips do tipo ORAM (Dynamic Random Access Memory) e encontram evidências de que o aprendizado é muito maior intrafimla. Além disso, as extemalidades do aprendizado se dão tanto entre as firmas de um mesmo país com entre firmas de diferentes países, o que não justificaria uma política de promoção da indústria doméstica. Resultados semelhantes são encontrados em Gruber (1998) para chips do tipo EPROM (Erasable Progral11l11able Read

011('· MeI11Ol:r). Por fim, há evidências de que pequena parte do aprendizado é transferida de uma geração de produtos para outra, pelo menos no que diz respeito aos chips do tipo DRAMI5. Dada a curta duração do ciclo dos produtos, os ganhos de políticas de promoção

dessa indústria tendem a ser auferidos durante um curto período de tempo.

Por fim, em Thomton & Thompson (200 I) são encontradas evidências de que as externalidades decorrentes do aprendizado se mostraram pequenas na indústria de construção naval para fins militares dos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial. Sendo assim, a evidência empírica parece indicar que não há extemalidades significativas associadas ao aprendizado das firmas, o que desautorizaria o uso de política industrial por parte do governo.

4.2. Externalidades Informacionais

Um outro tipo de falha de mercado associado ao aprendizado foi levantado por Hoff (1997) e Hausmann & Rodrik (2003). A utilização local de tecnologias ou atividades que já são empreendidas em outros países não é imediata e necessita de adaptações. Dito de outro modo. a função de produção de um determinado bem não é a mesma em todos os países, pois boa parte da tecnologia é tácita ou depende de ambiente econômico e institucional em que está inserida. Desse modo. existe incerteza se determinada atividade é passível de ser produzida localmente. ou seja. se as finnas envoh·idas na nova atividade serão suficientemente produtivas. Então. se este aprendizado só ocorre após o investimento e o retorno deste investimento não é inteiramente apropriado, tem-se espaço para intervenção do governo. Trata-se de um problema semelhante ao enfrentado pelas firmas que investem em inovação. mas neste caso o retorno do investimento pode ser protegido por leis de patente e de propriedade intelectual. Hausmann & Rodrik (2003) denominam o processo de descoberta de

I.' Grubcr (19n) acha c\ idência contrária para os chips do tipo EPROM.

(15)

l

que atividades são lucrativas domesticamente de se((-discovery e Rodrik (2004) chama a distorção associada a este processo de externalidade informacional. 16

Em Hausmann & Rodrik (2003) é desenvolvido um modelo em que os empreendedores locais não conhecem o custo associado à implementação local de novos produtos e atividades. Uma vez implementada uma atividade e tendo se revelada produtiva, o empreendedor aufere lucro extraordinário durante algum tempo. até que outros empreendedores também passem a se dedicar a esta atividade e este lucro seja erodido. Nesse sentido, o equilíbrio de mercado leva a dois tipos de ineficiências: (i) sub-investimento nas atividades não-tradicionais. pois os empreendedores pioneiros não internalizam os ganhos que geram para os demais empreendedores; (ii) excesso de diversificação nas atividades não tradicionais. na medida em que o lucro extraordinário permite que atividades pouco produti\"as sobrevivam.

Nesse caso, Hausmann & Rodrik (2003) e Rodrik (2004) sugerem uma política industrial que. em linhas gerais. deve incentivar o investimento em novas atividades ex ante e eliminar atividades pouco produtivas ex posto Obviamente, o incentivo deve ser dado somente à firma pioneira e nào às imitadoras. Proteção comercial e subsídios à exportação seriam pouco adequados. pois não é possível a discriminação entre pioneiros e imitadores. Empréstimos e garantias por parte do governo. embora consigam atingir as firmas de forma discriminada. sofrem de sérios problemas associados à influência política no direcionamento dos recursos. corrupção e moral ィ。セ。イ、N@ Aliás, a experiência brasileira com este tipo de política corrobora esta afirmação. 17

Além disso. cabe salientar que este tipo de modelo se ajusta melhor a economias em estágios iniciais de desenvolvimento. Hausmann & Rodrik (2003) reconhecem este fato e apontam que em estágios mais adiantados de desenvolvimento as atividades de inovação são mais importantes para garantir o crescimento. Aliás, esta parece ser a evidência internacional: 1mbs & Wacziarg (2003) apontam que o padrão de crescimento dos países tende a ser caracterizado por uma fase inicial de diversificação de atividades, precedida por uma fase de especialização, quando é atingido certo patamar de desenvolvimento (medido pela renda per capita).

Nesse sentido, Rodriguez-Clare (2004a) analisa a experiência da Costa Rica e avalia que, no atual estágio de desenvolvimento daquele país, políticas voltadas ao ganho de produtividade em setores em que já foram reveladas vantagens comparativas são mais adequadas do que políticas cujo foco é a expansão do escopo de atividades, tal como preconizado em Hausmann & Rodrik (2003). Comparando os dois países, chega-se à conclusão que provavelmente a mesma prescrição vale para o Brasil. Por motivos diferentes, Hausmann. Rodrik e Velasco (2004) também não recomendam políticas de incentivo ao se({-disco\'ery no caso brasileiro. Nesse caso. o argumento se baseia no diagnóstico de que o Brasil é um país cujo retorno do investimento é alto. mas cujo crescimento é constrangido pelo mercado de crédito doméstico e internacional. Nesse sentido. seriam mais adequadas políticas para aumentar a intern1ediação financeira doméstica e o crédito internacional para o país (atra\"és de política fiscal austera. principalmente).

16 Este tipo de falha de mercado mostra-se ainda mais relevante quando se leva em consideração que para os

países menos desenvolvidos há evidências de que a imitação de tecnologias já existentes possui um papel mais importante do que o desenvolvimento de tecnologia doméstica para o crescimento da renda per capifa [Connolly

(2003)].

1- Lembre-se de que no Brasil durante muitos anos empréstimos de agências do governo foram concedidos a

diycrsas empresas. desde que comprO\ada a não existência de outra firma doméstica atuando na produção do bem. exatamente no espírito do modelo de Hausmann & Rodrik (2003).

(16)

4.3. Falhas na Coordenação de Investimentos e Clusters

Decisões de produção e investimento em uma indústria são interdependentes e quando tomadas de fonna descentralizada podem fazer com que indústrias intensivas em conhecimento não se desenvolvam, mesmo quando existe estoque de capital humano disponível. Rodrik (1996) desenvolve um modelo em que a economia é composta por dois setores: tradicional e intensivo em conhecimento. Os insumos para este último setor são produzidos com retornos crescentes de escala e não são passíveis de serem importados. Desse modo, para o setor intensivo em conhecimento se desenvolva, é necessário que uma variedade suficientemente grande de insumos seja produzida domesticamente. Se nenhum desses insumos for produzido localmente, há pouco incentivo para que alguma firma se disponha a produzi-lo, pois não haverá demanda suficiente por ele. O mesmo pode ser dito com relação ao bem final. intensivo em conhecimento. Nesses casos, existe espaço para que o governo coordene os investimentos produtivos.

No entanto, cabe lembrar que este tipo de modelo pressupõe uma certa dotação de capital humano. Rodrik (1996) reconhece que o seu modelo se ajusta melhor a economias com grande dotação relati"a de capital humano. em especial países do Leste Europeu e Leste

aウゥ£エゥ」ッNャセ@ No caso brasileiro. este modelo poderia ser aplicado para setores em que exista um estoque razoável de capital humano, sempre lembrando que a intervenção do governo só faz sentido se as economias de escala na produção doméstica do insumo forem significativas e se não for possível a utilização de insumos importados.

De qualquer modo. ao contrário do exposto em Rodrik (1996), a intervenção do governo não necessariamente passa pela concessão de subsídios e pela oneração do orçamento público. A lógica das falhas de coordenação significa que, uma vez que todos os investimentos sejam feitos de forma simultânea, todos se tomam lucrativos. Desse modo, nenhum dos investidores necessitaria ser subsidiado ex post, bastaria algum tipo de garantia

ex ante [Rodrik (2004)]. Mais uma vez, este tipo de política abre espaço para abusos e problemas de moral ha:::ard.

Note que a idéia exposta em Rodrik (1996) guarda relação com a presença de extemalidades de natureza local e específica de uma detenninada indústria. Conforme salientado em Rodriguez-Clare (2004a, b), este tipo de extemalidade costuma gerar aglomeração industrial, ou seja, costuma gerar o que se convencionou chamar de cluster.

Aliás, existe ampla evidência da existência de tais externalidades e que elas estão principalmente associadas a spillovers de conhecimento: tudo mais constante, indústrias intensivas em conhecimento (com grandes gastos em pesquisa e desenvolvimento ou com emprego significativo de mão de obra qualificada) tendem a ser mais concentradas geograficamente [Rosenthal & Strange (2004)]. Dito de outro modo, os spillovers que induzem à formação de c/lIsters estão geralmente relacionados ao conhecimento e à inovação. Esta evidência é confinnada por Raut (1995). com relação à presença de externalidades e Branstetter (200 I). com relação ao seu caráter eminentemente local. 19

I' Para uma análise do papel do go\emo no sucesso dos paises do Leste Asiático a panir da perspecti\a da

coordenação dos in\'Cstimentos \'Cr Rodrik ( 1995).

Iq Nessa linha. Grossman & Helpman (1990) desenvolvem um modelo de economia abena no qual o

investimento em pesquisa e desenvolvimento leva não somente ao desenvolvimento de novos produtos (cujo retomo é apropriado pela firma). mas também contribui para o estoque de conhecimento. ao qual todas as firmas têm acesso. Neste arcabouço. se as extemalidades do investimento em pesquisa e desenvolvimento fluem eom a mesma rapidez para as firmas domésticas e para as firmas estrangeiras. o comércio é puramente determinado pela dotação de fatores. No entanto. se estas extemalidades são apenas companilhadas com as firmas domésticas (ou se são apropriadas mais rapidamente dentro das fronteiras nacionais). então o padrão de comércio pode ser construido a pal1ir de \antagens comparati \ as que nào dependem exc1usi\ amente da dotaçào de fatores. Cabe

(17)

No entanto, cabe notar que: (i) todos os setores possuem algum potencial para formação de c!lIsters: (ii) todos os setores podem existir com ou sem c/lIsters. Desse modo. o modelo de Rodrik (1996) parte de uma premissa que não é valida. a de que o setor avançado (intensivo em conhecimento) necessariamente vai se desenvolver com a formação de c!uslers.

Se for levado em conta que o setor avançado pode se desenvolver usando tecnologias ou modos de produção defasados, fica claro que políticas que distorcem os preços para incentivar este setor não necessariamente levam a externai idades e formação de c!lIsters.20

Desse modo, ao invés de incentivar novos setores, a intervenção do governo deveria manter o foco em setores que já estão desenvolvidos e possuem potencial de serem beneficiados pela formação de c!lIsters [Rodriguez-Clare (2004a)]. Além disso. mesmo na presença de externalidades. políticas que distorcem os preços relativos como promoção de exportações ou proteção comercial levam a redução do bem-estar [Puga & Venables (1999) e Rodriguez-Clare (2004b )]? Sendo assim, deve-se dar preferência a políticas que consistem em subsídios fixos, investimentos em infra-estrutura e reformas legais que facilitem a exploração das externalidades associadas à inovação.

Então. ao invés de uma política de incentivo indiscriminado à inovação, mostra-se mais produtivo dar suporte à pesquisa e desenvolvimento em setores nos quais o país já tenha revelado alguma vantagem comparativa. Candidatos naturais são aqueles que apresentam bom desempenho exportador. Além disso, cabe notar que existe evidência de que as atividades de pesquisa e desenvolvimento realizadas em universidades e laboratórios públicos têm maior potencial de geração de externalidades [Audretsch & Feldman (2004)]. Desse modo, faz mais sentido dar suporte

à

pesquisa e desenvolvimento nesses órgãos. ao invés de subsidiar esta atividade no setor privado [Rodriguez-Clare (2004a)].

Note que as prescrições desta subseção vão de encontro ao senso comum de que a política industrial deve promover setores caracterizados por um grau de sofisticação tecnológica cada vez maior. Na verdade não existe nenhuma evidência de que o processo de desenvolvimento está associado ao deslocamento em direção a indústrias progressivamente mais intensivas em conhecimento [Hunt & Tybout (1998)]. Existem muitos países que sào desenvolvidos e não dominam tecnologias avançadas (Nova Zelândia e Itália, por exemplo) e outros que dominam tecnologias de ponta e nào são desenvolvidos (Rússia, por exemplo ).22

Um argumento comum é que um país grande como o Brasil não é capaz de gerar desenvolvimento se nào tiver uma indústria diversificada e presença nos setores mais "avançados". Não está claro qual é a lógica econômica deste tipo de argumento, mas obviamente. não se defende que o Brasil volte a ser uma economia monocultora de

lembrar que estes resultados. bem como as prescnçoes de políticas públicas deri\'adas deles. dependem criticamente de duas hipóteses: (i) line entrada de firmas: (ii) ausência de interação estratégica entre as firmas.

セ・ウウ・@ sentido. Leahy & \leary ( 1999) desenvolvem um modelo de economia aberta no qual as firmas competem

em oligopólio. セ・ウウ・@ caso. as prescrições de políticas não são tão óbvias: externalidades locais em pesquisa e

desemohimento podem justiticar a imposição de impostos (ao im'és de subsídios). cooperação entre firmas locais resulta em sobre-investimento em inovação (o que justificaria a imposição de imposto) e a presença de

spil/(m!rs com relação a firmas de outros países justificariam subsídios. mesmo se o gO\"Cmo se preocupa apenas com o lucro das firmas domésticas.

2() O Brasil é rico em exemplos de setores que receberam incentivos do governo para se desenvolver e que não

geraram nenhum tipo de aglomeração ou externai idade positiva.

21 Aliás. cabe lembrar que a maioria destas políticas foi proibida pela Organização Mundial do Comércio

(OMC). Uma das exceções são justamente os subsídios à atividade de pesquisa e desenvolvimento.

22 A pauta exportadora da ;-..JO\a Zelândia é bastante ilustrativa a este respeito. Segundo dados oficiais de 2004.

pelo menos 75% do valor exportado consistia em cOl71l71odities. produtos agricolas ou pequenas transformações

destes. Oeri\'ados do leite. carnes. couros e peles. frutas. peixes. madeiras. lã e \'Cgetais responderam por cerca

de 53° o do \alor das exportações. セッ@ entanto. a renda per ('apita neozelandesa é quase o triplo da brasileira [IMF

(2006) l. Para referências c uma bre\e análise da experiência italiana com política industrial \er Ferreira (2005).

(18)

I

"

r

exportação: os países citados possuem uma pauta de exportação muito diversificada. O único ponto que se enfatiza é que possuir pauta de exportação diversificada não é o mesmo que dominar os setores tecnologicamente mais avançados.

4.4. Barreiras à Entrada e Externalidades na Atividade Exportadora

Pode-se argumentar que existem barreiras à entrada de firmas domésticas em mercados estrangeiros. Além de barreiras tarifárias, quotas de importação e especificações sanitárias, existem barreiras à entrada associadas ao estabelecimento de contatos comerciais, ao conhecimento do mercado estrangeiro e à existência de assimetria de informação na qualidade do produto exportado. Por exemplo, Raff & Kim (1999) apresentam um modelo no qual os consumidores incorrem em custo para experimentar novos produtos. Como já conhecem a qualidade do produto local, mas desconhecem a qualidade do produto importado, este custo se transfom1a em barreira à entrada para as exportações de outros países. Nesse caso, como prescrição de política. é recomendado algum tipo de subsídio à exportação quando a diferença entre o produto de alta qualidade e o de baixa qualidade é significativa, quando a diferença no custo de produção entre estes produtos é baixa, quando o grau de diferenciação entre o produto exportado e o produzido pelo incumbente estrangeiro e a tarifa de importação são altas. De qualquer modo. o subsídio deve ser diminuído ao longo do tempo, conforme o problema de assimetria for sendo reduzido.

Além disso. alguns autores argumentam que existem extemalidades associadas à atividade exportadora. Uma vez que uma empresa consegue exportar para determinado país. as demais firmas do mesmo país se beneficiam desta transação, ou seja, as barreiras á entrada são reduzidas para todas as firmas. Nesse caso. seria reforçada a necessidade da presença de algum tipo de política pública. Em Aitken, Hanson & Harrison (1997) são utilizados micro-dados de firmas mexicanas e são encontradas evidências de que a probabilidade de uma firma exportar é maior se esta se localiza nas proximidades de uma empresa multinacional, mas não é alterada com a proximidade de uma firma exportadora doméstica. Este resultado parece indicar que as extemalidades não estão relacionadas à atividade exportadora em si. mas a algum outro aspecto da atividade das empresas multinacionais.23 Esta conjectura é corroborada por Greenaway, Sousa & Wakelin (2004), que examinam firmas britânicas e encontram indícios de que o principal canal pelo qual o investimento direto estrangeiro aumenta às exportações é via aumento da competição.24 Na mesma linha, Bemard & Jensen (200 I) e Barrios. Gõrg & Strobl (2003) não encontram evidências significativas de extemalidades na atividade exportadora de firmas espanholas e norte-americanas, respectivamente.

De qualquer modo, a presença de barreiras à entrada, mesmo na ausência de extemalidades, justificaria algum tipo de política pública. No entanto, em vez de subsídios. seriam mais adequadas medidas que reduzissem diretamente a assimetria informacionaL por exemplo, promoção do país como produtor de bens de qualidade e investimentos na certificação de nossos produtos.

c' Com relação aos resultados de Aitken. Hanson & Harrison (1997). os próprios autores e diversos outros

[Barrios. Gorg & Strobl (2003) e Rodriguez-Clare (2004a). por exemplo

1

interpretam-no como sendo eYidência

da existência de spillo\'ers na atividade exportadora das multinacionais. No entanto. esta interpretação não é

necessariamente a única. O fato de que a proximidade com multinacionais aumenta a probabilidade de exportar

não significa necessariamente que existem externalidades associadas à atividade exportadora em si, mas que a

presença das multinacionais gera algum tipo de externalidade que facilita a exportação das firmas domésticas. Esta externalidade pode ser gerada. por exemplo. pelo aumento de produtividade das firmas domésticas através da transferência de tecnologias e modelos organização mais modernos.

co As cxternalidades associadas ao imcstimento direto cstrangeiro serào abordadas na próxima subseção.

Imagem

Figura 1:  Renda Per Capita Relativa (Estados Unidos  =  100%)
Tabela 1:  Taxa de Inflação Anual Média (Índice de Preços ao Consumidor)  1960-1969  1970-1979  1980-1989  1990-1999  2000-2005  Brasil  42,82 %  32,59 %  271,7 %  280,4 %  7,71%  Coréia do  Sul  13,00 %  15.05 %  8.08 %  5,71  %  3,04%  Japão  5.35 %  8,9
Figura 2:  Estoque  Per Capita  de Infra-estrutura (Geração de Energia Elétrica)
Figura 3: Escolaridade Média da População Acima de 15 Anos
+3

Referências

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