MESTRADO EM GESTÃO EMPRESARIAL
Thomas Hartmann
UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE O REAL CUSTO DE PRODUÇÃO DE NAVALHAS
PARA CALÇADOS NO BRASIL E NA ARGENTINA
UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE O REAL CUSTO DE PRODUÇÃO DE NAVALHAS
PARA CALÇADOS NO BRASIL E NA ARGENTINA
Dissertação apresentada como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre
em Gestão Empresarial, pelo Mestrado em
Gestão Empresarial da Escola Brasileira de
Administração Pública e de Empresas da
Fundação Getulio Vargas.
Orientador: Prof. Dr. Roberto Pereira Guimarães
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique Simonsen/FGV
Hartmann, Thomas
Uma investigação sobre o real custo de produção de navalhas para calçados no Brasil e na Argentina / Thomas Hartmann. – 2010.
106 f.
Dissertação (mestrado) – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa.
Orientador: Roberto Pereira Guimarães.
Inclui bibliografia
.
1. Responsabilidade social da empresa – Estudo de casos. 2.
Desenvolvimento sustentável - Estudo de casos. 3. Auditoria ambiental- Estudo de casos. I. Guimarães, Roberto Pereira. II. Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas. Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa. III. Título.
UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE O REAL CUSTO DE PRODUÇÃO DE NAVALHAS
PARA CALÇADOS NO BRASIL E NA ARGENTINA
Dissertação apresentada como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre
em Gestão Empresarial pelo Mestrado em
Gestão Empresarial da Escola Brasileira de
Administração Pública e de Empresas da
Fundação Getúlio Vargas
Aprovada em ____/____/___
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________
Orientador: Prof. Dr Roberto Pereira Guimarães
____________________________________________________
Prof. Dr. Joaquim Rubens Fontes Filho
__________________________________________________
Para todos os meus mestres, dentro e fora da escola.
Para minha família, que sempre se mostrou compreensiva, e me ensinou que a
educação é algo para a vida toda.
Para minha noiva, Suelen, por ter me suportado em todos os sentidos durante
este período conturbado de dissertação. Espero que após a defesa, possamos
finalmente oficializar nossa união e vivermos juntamente com Nietzsche, nosso cachorro
que é quase um filho e que tem me animado em todas as horas.
Para meus colegas de mestrado, pelos meses de saborosa convivência e pela
promessa de anos de amizade.
A pesquisa compara as estruturas de custo e o impacto no patrimônio de uma mesma
empresa no Brasil e na Argentina considerando a geração de externalidades ambientais
positivas e negativas. Apresenta o balanço patrimonial e o demonstrativo de resultados
do exercício internalizando as externalidades ambientais sob sua responsabilidade
direta, desconsiderando para esta análise a responsabilidade solidária, geralmente
advinda da geração de resíduos em fretes contratados junto a prestadores de serviços
logísticos. Realizou-se avaliação do processo produtivo, e reconhecemos os
investimentos já realizados em gestão ambiental. Como resultado, encontraram-se
evidências empíricas de externalidades ambientais que não estão incluídas no sistema
de custeio das duas empresas, o que impacta na análise de patrimônio líquido por parte
dos acionistas.
The survey compares the cost structures and the impact on assets of one company in
Brazil and Argentina considering the generation of positive and negative environmental
externalities. Displays the balance sheet and income statement for the year internalizing
environmental externalities under his direct responsibility, disregarding for this analysis to
joint liability, usually coming from the generation of waste freight contracted with
providers of logistics services. We carried out life cycle assessment, and recognize the
investments already made in environmental management. As a result, we found
empirical evidence that environmental externalities are not included in the costing system
of the two companies, which impacts on the analysis of equity by the shareholders.
Quadro 1 - Do crescimento econômico ao desenvolvimento sustentável
14
Quadro 2 - Problemas de meio ambiente comuns na América Latina e Caribe 18
Quadro 3 - Mecanismos de gestão ambiental que incorporam incentivos
econômicos
23
Figura 1 - Métodos de valoração ambiental
48
Gráfico 1 - Dependência da Indústria de Transformação do Vale do Sinos em
relação
52
aos empregos gerados pelo setor coureiro-calçadista
52
Quadro 7 - Demonstrativo de resultados do exercício da AM Navalhas Ltda 60
Quadro 8 - Balanço Patrimonial da AM Navalhas Ltda.
61
Quadro 9 - Estado de Resultados de Fabbro SRL
63
Quadro 10 - Estado de Situación Patrimonial de Fabbro SRL
63
Figura 2 - Fluxograma de produção de navalhas
64
Figura 3 - Etapa 3: Resíduos
65
Figura 6 - Etapa 8: Máquina de dobra de aço e resíduo metálico.
68
Figura 7 - Etapa 9: Processo de soldagem.
70
Figura 8 - Etapa 10: Corte de reforço.
70
Figura 9 - Etapa 12: Afiar navalha.
71
Quadro 13 - Demonstrativo de resultados do exercício da AM Navalhas Ltda.
reconhecendo custos, despesas e receitas ambientais
77
Quadro 14 - Balanço Patrimonial da AM Navalhas Ltda. considerando as
externalidades ambientais
78
Quadro 15 - Notas explicativas referentes às externalidades ambientais:
79
Quadro 16 - Estado de resultados da Fabbro SRL reconhecendo custos,
despesas e receitas ambientais
80
Quadro 17 - Estado de Situación Patrimonial da Fabbro SRL reconhecendo
custos, despesas e receitas ambientais
81
...
1 INTRODUÇÃO
8
...
2 CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
10
2.1 CONTEXTO DO ECODESENVOLVIMENTO - TRANSIÇÃO ECOLÓGICA, CRISE
SISTÊMICA E ECODESENVOLVIMENTO ...
13
2.2 EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO E DA AGENDA SOCIOAMBIENTAL...
18
2.3 DESAFIOS GLOBAIS, REGIONAIS E NACIONAIS DA SUSTENTABILIDADE ...
23
3 ASPECTOS MORAIS E ECONÔMICOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
...
27
3.2 CONTABILIDADE E SUSTENTABILIDADE...
35
3.3 VALORAÇÃO AMBIENTAL ...
42
...
3.3.1 Métodos da Função de Produção
45
...
3.3.2 Métodos da Função de Demanda
48
...
4. METODOLOGIA
51
4.1 TIPO DE PESQUISA...
51
4.3 SELEÇÃO DOS SUJEITOS...
55
4.4 COLETA DE DADOS ...
56
4.5 TRATAMENTO DOS DADOS ...
56
...
5. ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS
58
5.1 CARACTERIZAÇÃO DAS EMPRESAS DA AMOSTRA ...
58
...
5.1.1 Histórico da AM Navalhas Ltda.
58
5.1.1.1 Histórico da gestão ambiental na AM Navalhas Ltda...
60
5.1.1.2 Demonstrativos contábeis na AM Navalhas Ltda...
61
...
5.1.2 Histórico Fabbro S.R.L.
63
5.1.2.1 Histórico da gestão ambiental na Fabbro S.R.L. ...
64
5.1.2.2 Demonstrativos contábeis na Fabbro S.R.L. ...
65
5.2 CICLO DE PRODUÇÃO DE NAVALHAS...
67
...
1 INTRODUÇÃO
Esta dissertação tem como objetivo comparar as estruturas de custo e o impacto
no patrimônio de uma mesma empresa no Brasil e na Argentina, levando em
consideração fatores ligados à geração de externalidades ambientais positivas e
negativas. Para isso, apresenta o balanço patrimonial e o demonstrativo de resultados
do exercício da empresa em sua operação na cidade de Campo Bom, no Brasil, e em
Buenos Aires, na Argentina, internalizando as externalidades ambientais sob sua
responsabilidade direta, desconsiderando para esta análise a responsabilidade solidária,
geralmente advinda da geração de resíduos em fretes contratados junto a prestadores
de serviços logísticos.
Foi necessário identificar as externalidades ocorridas durante o processo de
produção desta empresa, por meio de avaliação do fluxo do processo produtivo, e
reconhecer os investimentos já realizados em gestão ambiental. Como resultado,
encontraram-se evidências empíricas de externalidades ambientais que não estão
incluídas no sistema de custeio das duas empresas, o que impacta na análise de
patrimônio líquido dos acionistas.
O primeiro capítulo apresenta o contexto do ecodesenvolvimento, considerando a
chamada transição ecológica, a crise no sistema de desenvolvimento atual e o
ecodesenvolvimento. Uma das questões que trata este capítulo é se há o chamado
desenvolvimento sustentável, ou se este não passa de um oxímoron. Para fins de
contextualização, o capítulo traz um histórico da evolução da agenda ambiental global,
seus principais atores, e os desafios que se avizinham nos horizontes global, nacional e
local. Entre as posições destacadas, há uma particularmente importante, que argumenta
que países com menor grau de proteção ambiental competem de maneira desigual com
aqueles que possuem uma preocupação mais desenvolvida com a natureza, por não
terem certos custos de controle.
A seguir, explica-se o delineamento metodológico da pesquisa: pesquisa
bibliográfica inicial seguida por pesquisa de campo amparada em estudo de caso, com
aplicação de questionário e análise documental. Neste mesmo capítulo, apresenta-se o
universo e também a amostra que compõem o estudo, selecionada utilizando-se do
critério de acessibilidade, posto que a confiança dos dirigentes da empresa no
pesquisador impunha-se como requisito para a análise documental do balanço
patrimonial e do demonstrativo de resultados do exercício, além da avaliação do fluxo do
processo produtivo e consequente identificação de gargalos ambientais.
A análise dos dados e resultados do estudo de caso são apresentados no
capítulo seguinte. Nele, se traz o histórico das duas empresas constituintes da amostra,
AM Navalhas Ltda. e Fabbro SRL. (constituída com 50% de sociedade da AM Navalhas
Ltda.). Como elementos importantes da análise, resgata-se o histórico da gestão
ambiental, e avalia-se o processo produtivo em questão, identificando suas principais
externalidades. Por fim, estas externalidades são lançadas nos demonstrativos de
resultado do exercício de 2009 e no balanço patrimonial das empresas, realizando uma
exploração das possibilidades circunscritas na literatura.
2 CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Desenvolver significa crescer, mudar de estado, evoluir de um ponto a outro.
Sustentar indica manter, estagnar, conservar. À primeira vista, parece uma temeridade
que os dois termos, juntos, identifiquem a ideia que define o principal desafio de
governos, instituições de ensino, sociedade civil e empresas durante o século XXI.
Afinal, como dois conceitos tão distintos e arraigados na cultura humana
puderam unir-se para formar o conceito de “desenvolvimento sustentável”, tão em voga
atualmente? E o que significa esta pequena subversão à lógica, qual sua genealogia,
por que justamente estas palavras?
Conforme será visto, a designação ocorreu balizada por um jogo de poder, por
um diálogo envolvendo quem quer desenvolver (notadamente economistas) e quem
quer sustentar (especialmente ecologistas). Assim, de um lado, desenvolve-se a
economia, com crescimento do PIB e consumo - lembrando que consumir identifica
esgotar. De outro, sustenta-se o planeta, garantindo que as gerações futuras tenham o
mesmo quinhão de oportunidades que a atual.
Segundo Montibeller (2007), há quatro tipos diferentes de ‘desenvolvimento’,
conforme apresentado no quadro 1 na sequência.
Montibeller (2007:46-47) pondera que enquanto o desenvolvimento econômico
vincula-se essencialmente à ideia de mudanças na estrutura da economia com vistas a
viabilizar o crescimento persistente e a taxas elevadas da produtividade, o
desenvolvimento sustentável enfocaria as questões ambientais ao mesmo tempo que
consideraria as dimensões social e econômica.
Para o desenvolvimento sustentável, quatro condições seriam necessárias:
- Aumento persistente na renda média (Condição A);
- Desconcentração na estrutura de rendas (Condição B);
- Melhoria significativa dos índices sociais (Condição C);
- Conservação ou melhoria das condições ambientais (Condição D).
Se somente A fosse atendida, teria-se o crescimento econômico. Com A e B
atendidas, haveria desenvolvimento econômico. Se A, B e C, desenvolvimento
econômico e social aconteceriam. Se A e C, então haveria crescimento econômico e
social. Se C (ou B e C), aconteceria desenvolvimento social. Se D, apenas
desenvolvimento ambiental. Se não ocorrer nenhuma das alternativas, haveria
estagnação ou regressão econômica, social e ambiental.
+ Produção e + Renda per capita de maneira significativa e persistente, por período de tempo não curto (médio prazo)
(Quantitativo: econômico) Médio prazo
Desenvolvimento econômico
+ Produção e + Produtividade
Transformações na estrutura produtiva
Desconcentração da estrutura de rendas (diminuição das desigualdades sociais) DE = F (modelo econômico e inovações)
(Quantitativo e qualitativo: econômico) Médio-longo prazo
Desenvolvimento socioeconômico
+ Produção e + Produtividade em função de inovações tecnológicas Transformação da estrutura produtiva
Desconcentração da estrutura de rendas Significativas melhorias sociais
DSE = F (modelo econômico; inovações e ação governamental) (Quantitativo e qualitativo: econômico e social) Médio-longo prazo
Desenvolvimento sustentável
+ Renda per capita "verde" e + Produtividade sustentável
Transformações: na estrutura produtiva; nas formas de produzir; no que é produzido e no padrão de consumo
Abrangência social
Conservação das condições ecoambientais DS = Novo paradigma sociopolítico e científico
(Qualitativo: econômico, social e ambiental) Longo prazo
Quadro 1 - Do crescimento econômico ao desenvolvimento sustentável
Fonte: adaptado de Montibeller (2007:03).
Portanto, desenvolvimento sustentável significaria, ao mesmo tempo,
desenvolvimento econômico, melhoria das condições sociais e manutenção do meio
ambiente. A noção parece interessante, mas não é possível excluir a hipótese de uma
contradição interna. Isto porque o sistema produtivo é baseado na transformação, a
condição pela qual ocorre a mudança de um estado a outro, ou, em outra palavra, o
desenvolvimento.
Um estudo interessante sobre o tema foi conduzido por Vitousek et. al, em 1986.
Nele, os pesquisadores analisaram o impacto da humanidade na biosfera calculando a
fração da rede de produção primária (RPP) que ela se apropria para sua conservação e
desenvolvimento.
A RPP é a quantidade de energia que resta após subtrair a respiração dos
produtores primários (plantas, na maioria) do total de energia fixa biologicamente (solar,
principalmente). O cálculo foi feito a partir de uma área em que o plantio e o
desmatamento aconteciam dentro de um ano, mas os autores sugerem que uma escala
global para o estudo seria possível se se calculasse o total de materiais orgânicos
destruídos ou desmatados divididos pelo total existente de materiais orgânicos.
1. O total da RPP que as pessoas usam diretamente, como comida e
combustível;
2. A produtividade de terras devotadas totalmente às atividades humanas. Aí
também está a energia que as atividades humanas consumem, como atear fogo para
limpar um terreno;
3. Capacidade perdida de produção como resultado de converter terra livre em
cidades e florestas em pastos, ou por conta de erosão ou desertificação resultantes de
processos danosos de cultivo.
No terceiro caso, que nos interessa por ser mais apropriado e igualmente mais
rigoroso, os números revelam que os seres humanos consomem quase 40% (38,8%) de
toda a produtividade potencial terrestre ou, considerando o potencial terrestre e
aquático, 24,8% do total para a transformação, ou, em outras palavras, para o
desenvolvimento.
Crescimento econômico tampouco anda lado a lado com desenvolvimento social.
Montibeller (2007:41) afirma que "no caso brasileiro, por exemplo, configurou-se
historicamente uma estrutura de rendas concentrada, representando grande
desigualdade social, que o processo de expansão da economia tem apenas conseguido
ampliar". Mantega e Moraes (1978:49) relacionam redução de salários de 1964-1973
com o milagre econômico, dizendo que uma coisa originou a outra.
Questões sociais também exercem pressão sobre os padrões ambientais. Esta
força ocorre em duas direções: na primeira, temos o ponto de vista da produção.
Wallerstein (2002) argumenta que o êxodo rural, motivado pelo processo de
industrialização, aumentou o preço da mão-de-obra e, para compensar a falta de
competititividade, governos permitiram que empresas não internalizassem muitos de
seus custos (incluindo ambientais) por omissão, falhando em requerer que fizessem isto.
Na segunda direção, temos o consumo. Ainda segundo Wallerstein (2002), a expansão
da democracia fez com que mais pessoas demandassem seus direitos, inclusive os
direitos de consumir. Com mais consumo, há mais necessidade de produzir e a pressão
sobre os recursos naturais aumenta.
Para Guimarães (2008):
... enquanto a homogeneização crescente dos padrões de consumo e de produção provocada pela globalização está melhorando lentamente a qualidade de vida para muitos, o incremento excessivo do consumo, e do consumo insustentável, provoca severas pressões sobre a base de recursos naturais e aumenta as desigualdades distributivas, as quais são, por sua vez, transmitidas também às gerações futuras. (GUIMARÃES, 2008:2)
Já Naredo (1998), em texto no qual cita Daly (1996), explica que
‘desenvolvimento sustentável’ deve ser compreendido em seu contexto, em sua
genealogia. Segundo o autor, ele substituiu o termo ‘ecodesenvolvimento’, cunhado pelo
consultor das Nações Unidas para Meio Ambiente e Desenvolvimento Ignacy Sachs em
1973, a pedido do chefe da diplomacia norte-americana, Henry Kissinger, após a
declaração de Cocoyock. Kissinger teria manifestado sua contrariedade ao termo
ecodesenvolvimento, que indicava o compromisso de conciliar o aumento de produção
com a manutenção dos ecossistemas necessários para manter as condições de vida na
Terra, em correspondência para o presidente do Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente. De certa forma, a construção do suposto oxímoron ‘desenvolvimento
sustentável’ foi uma estratégia retórica para estabelecer uma ponte entre os
desenvolvimentistas e os ecologistas, procurando agradar ambos os lados.
Se de um lado ganhou-se em colaboração e em abertura ao diálogo, de outro
perdeu-se a oportunidade de questionar radicalmente como almejar a conservação das
condições necessárias à vida humana na Terra e, como consequência, de questionar o
modelo de desenvolvimento praticado até aqui.
Durante a pesquisa desenvolvida, a designação desenvolvimento sustentável
deverá ser entendida como crescimento da economia que não cause um esgotamento
do mundo natural, ou seja, que permita a recuperação do estoque a ponto de possibilitar
a retroalimentação do sistema.
2.1 CONTEXTO DO ECODESENVOLVIMENTO - TRANSIÇÃO ECOLÓGICA, CRISE
SISTÊMICA E ECODESENVOLVIMENTO
O termo ‘desenvolvimento sustentável’ surge da comprovação de que o
crescimento econômico, cujo pensamento original é consequência de um modo de ver o
mundo natural contando com sua instrumentalização para o desenvolvimento, traz
mazelas à conservação da própria vida humana.
Bennett (1976) chamou esta coisificação de transição ecológica:
The dualistic theories that opposed Humans to Nature led, in Western thought, to two contrasting conceptions: first, that Humanity, or Culture, is determined by Nature; and second, that as Humans developed natural resorces, they became increasingly “independent” of Nature. (BENNETT, 1976:4).
oito categorias, acrescidas de quatro categorias típicas da atualidade (as últimas na
listagem abaixo):
•
Desmatamento e destruição do habitat;
•
Problemas de solo, como erosão, salinização;
•
Dificuldades de manejo de água;
•
Aquecimento excessivo;
•
Pesca excessiva;
•
Efeitos de espécies introduzidas em habitats alheios;
•
Crescimento da população humana;
•
Crescente impacto per capita no meio ambiente;
•
Alterações climáticas provocadas pelo homem;
•
Químicos no meio ambiente;
•
Queda de energia no sistema;
•
Completa utilização da capacidade de fotosíntese pelo homem.
Apenas entre o século XVIII e o XIX que a Europa passou a especular sobre o
esgotamento dos recursos naturais, com a capacidade de estoque limitada da natureza
por conta, principalmente, da degradação que integra as saídas.
O termo ecossistema, empregado pela primeira vez por A. G. Tansley na primeira
metade do século XX, e que significa agregação de espécies de plantas e animais com
as características físicas do entorno, é importante para compreender a análise proposta
nesta pesquisa. O globo constitui um ecossistema, mas é possível analisar
ecossistemas menores como uma região, uma cidade ou mesmo uma localidade
(DUNCAN, 1961).
A caracterização habitual de sistemas conta com os seguintes termos/definições:
•
Sistemas abertos - possuem entradas e saídas voltadas ao exterior;
•
Sistemas fechados - recebem apenas mensagens geradas internamente;
•
Componentes - unidades básicas do sistema;
•
Fronteiras - como separar um sistema de outro;
•
Entradas - mensagens, informação, impulsos de energia recebidos por fontes
externas;
•
Saídas - tudo o que o sistema produz;
•
Feedback - informações, mensagens geradas com o funcionamento do
sistema;
•
Estoque - maneira de lidar com atrasos de entradas ou de lidar com
excessos de saídas;
•
Caixa-preta - designa função não completamente entendida, mas que pode
ser mensurada ou observada;
Quando um ecossistema não consegue mais renovar-se, entra em crise. As
principais consequências desta deterioração podem ser vistas em espaços urbanos e
rurais (quadro 2):
Espaço rural Espaço urbano
Erosão do solo Crescimento de áreas marginais pobres
Desmatamento Contaminação hídrica
Perda de biodiversidade Contaminação atmosférica
Esgotamento dos solos Contaminação do lixo, que gera contaminação do
solo, da água e do ar
Salinização dos solos Contaminação de resíduos perigosos
Sedimentação de cursos e nichos de água Catástrofes associadas à expansão urbana espontânea
Quadro 2 - Problemas de meio ambiente comuns na América Latina e Caribe
Fonte: adaptado de Giglo (2001:201-222).
Exemplos destes problemas abundam. Em 1967, o acidente com o petroleiro
Torrey Canyon na costa britânica causou comoção entre os europeus. Em 1968, a
doença de Minamata, provocada pela ingestão de peixes contaminados por resíduos de
mercúrio, entrou no léxico médico. Mas é mais recentemente, e principalmente entre os
pobres, que os efeitos da crise são mais sentidos.
O Banco Mundial (2009) estima que o custo do aquecimento global representará
4% do PIB da África e 5% da Índia, enquanto corresponderá a apenas 1% do PIB
global. Entre 1981 e 1985, cerca de 500 milhões de pessoas requisitaram assistência
internacional para desastres; em 2001-05, foram 1,5 bilhões - 4% da população dos
países mais pobres e 7% dos países de classe média baixa. Os mais pobres possuem
níveis mais baixos de assistência médica. Ainda segundo o relatório, por volta de 2030
mais 90 milhões de africanos serão expostos à malária; em 2070, 60% da população
global estará expostas à dengue. A agricultura também estará comprometida, ainda
mais se considerarmos que os melhoramentos genéticos de sementes respondem bem
a climas estáveis, mas possuem limitações quando de mudanças climáticas.
No Rio Grande do Sul, uma das maiores tragédias ambientais já registradas
aconteceu de outubro a janeiro de 2006. Ao todo, foram mais de cem toneladas de
peixes mortos no Rio dos Sinos, que abastece de água potável grande parte dos
municípios da Grande Porto Alegre (RIO DOS SINOS, 2007).
consequências do crescimento econômico a qualquer custo. O rio, que deveria servir
como fonte de vida, revelou-se uma tétrica mortalha.
Para o diretor técnico da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) à
época, André Milanez, as causas do desastre foram:
...combinação de descartes clandestinos de efluentes químicos, descarga permanente de esgoto residencial, calor superior a 30 graus por mais de cinco dias consecutivos e baixa vazão do rio nesta época do ano, fatores que retiram o oxigênio da água. (TONELADAS, 2007).
Além do evidente impacto social com a diminuição da qualidade do
abastecimento de água, houve consequências dramáticas para setores menos
desenvolvidos da economia. Tome-se como exemplo os pescadores locais, que foram
impedidos de garantir seu sustento e acabaram se sujeitando à ajuda do governo
federal (PESCADORES, 2007).
Uma definição de sustentabilidade ecológica é a capacidade de um sistema (ou
ecossistema) de manter constante seu estado no tempo, seja por sua capacidade
natural de renovação, seja por ações artificiais. Nesta segunda possibilidade, o homem
teria papel importante ao introduzir informação, matéria e energia para manter
constantes os volumes, taxas de câmbio e ritmos de circulação.
Já para atingir a sustentabilidade ambiental, o esforço é maior por ter de
considerar tecnologia, tempo e recursos financeiros neste cenário. A sustentabilidade
proposta neste trabalho e considerada implícita no termo desenvolvimento sustentável é
ambiental:
... la sustentabilidad ambiental de los procesos de desarrollo de una sociedad se define como una condición en que, en correspondencia con los horizontes de estrategias de desarrollo de largo plazo, sobre la base del acervo tecnológico que la sociedad posee, y considerando la posibilidad real que se tiene para acceder a los recursos materiales y energéticos, se logra la coexistencia armónica del hombre con su medio ambiente, equilibrando los sistemas transformados y creados, minimizando la entropía de los procesos modificatorios y evitando, por tanto, sus deterioros. (GLIGO, 2001:34).
Como lidar com a crise sistêmica? Para Guimarães (1988), os desafios
ambientais contemporâneos decorrem da tecnologia e do crescimento demográfico, e
faz-se necessária a incorporação de uma perspectiva ecológica no processo de tomada
de decisões econômicas e políticas. É daí que vem a ecopolítica, que se preocupa com
a viabilidade de sistemas ecológicos e sociais.
No interior do arcabouço cultural da civilização moderna, no qual o ser humano não faz parte e sim está à parte da natureza, as ecopolíticas são necessariamente antipáticas, inoportunas e desagradáveis. Em suma, as políticas de meio ambiente se distinguem das demais políticas por seu caráter de ‘estraga festa’. (GUIMARÃES, 1988:268).
cada setor industrial impacta de maneira diferente por conta de três fatores: (1) a
natureza da estrutura industrial em distintas relações com o meio natural, (2) a
intensidade e concentração espacial dos gêneros e ramos industriais e (3) o padrão
tecnológico do processo produtivo, com suas tecnologias de filtragem, reprocessamento
de efluentes e reaproveitamento econômico de subprodutos.
Considerar estes conceitos na cadeia coureiro calçadista significa pensar desde
a criação do gado até o recolhimento do calçado após o uso pelo consumidor final,
passando também pela gestão dos detritos envolvidos na produção direta, como
químicos, pó de lixa, retalhos de couro, borracha, metais etc. Significa entender que a
saída de químicos de curtumes em excesso para rios afeta a capacidade de pesca de
determinada região. Subprodutos também estariam na alçada desta análise como uma
forma de sustentar financeiramente o esforço de filtragem e tratamento de resíduos.
A sustentabilidade do sistema, ou a manutenção da taxa de estoque capaz de
suprir as necessidades das gerações futuras, deve ser considerada um pressuposto das
atividades produtivas. Só assim que o desenvolvimento industrial e o crescimento
empresarial poderiam ser entendidos como sustentáveis, indo ao encontro de uma
agenda supranacional que ganhou força a partir da segunda metade do século XX.
2.2 EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO E DA AGENDA SOCIOAMBIENTAL
Wallerstein (2002) defende que o capitalismo busca a expansão eterna, em
termos geográficos e também produtivos. Não há limite e, com isto, não há
sustentabilidade. Para buscar a preservação dos recursos naturais seria necessário
discutir, lançar mão do embate de ideias, para se chegar a um denominador comum que
seja o melhor para o maior número de pessoas.
É o que tem feito a Organização das Nações Unidas nos últimos 38 anos. Os
primeiros passos significativos em direção ao desenvolvimento sustentável deram-se em
1972, com o Clube de Roma e a Conferência de Estocolmo. Foi com o o relatório The
limits to growth que se popularizou a ideia de que o crescimento contínuo da sociedade
industrial é inviável, e foi com a Conferência de Estocolmo que o assunto ‘meio
ambiente’ se popularizou entre os integrantes de governos mundo afora.
possuem elevado nível de consumo. Até aqui, buscou-se apenas reconhecer o
problema.
A Fundação Dag-Hammarskjöld aprofundou a declaração de Cocoyock e
publicou relatório com colaboração de 48 países, junto com o Programa de Meio
Ambiente das Nações Unidas e mais 13 organizações da ONU em 1975. Enfocou um
novo desenvolvimento, calcado na mobilização de forças capazes de mudar os sistemas
vigentes. Começavam a surgir as primeiras alternativas.
Em 1980, a World Conservation Union usou o termo desenvolvimento sustentável
no documento intitulado World's Conservation Strategy. Em 1987, elaborou-se o
Relatório Brundland a partir da World Comission on Environment and Development
(WCED). Este documento diz que o desenvolvimento sustentável é o que atende às
necessidades das gerações presentes sem comprometer a possibilidade das gerações
futuras atenderem suas próprias necessidades (BELLEN, 2006). Mas, outro fenômeno
tornou necessária a revisão das propostas para o desenvolvimento sustentável: a
globalização.
Nas décadas de 1980 e 1990, as reformas econômicas neoliberais permitiram
recuperar taxas de crescimento, estabilizar as moedas nacionais e diminuir a inflação.
Com o crescimento real, foi possível dedicar esforços à questão ambiental
(considerando a dicotomia hipotética entre crescimento e sustentabilidade). O cenário
legitimou a perda de soberania do Estado, e o aumento da importância das empresas
nas grandes decisões.
O mercado passou a ser o princípio dominante da ordem social. As relações
entre pessoas, que tomam massivamente a forma de compra e venda de mercadorias,
se tornam menos transparentes e adquirem a aparência de relações entre objetos,
notavelmente a moeda. Gerações futuras são excluídas por não terem recursos.
Problemas ecológicos também são desconsiderados.
Vemos que el libre juego del mercado lleva a una ‘selección natural’ de los comportamientos más dañinos para el medio ambiente. En la medida en que la escasez de un recurso natural no se hace sentir, o que el aire, el agua y el ozono siguen siendo ‘bienes públicos’, los mercados pueden no darse por enterados de caráter depredador de una modalidad de crescimiento: ‘el mecanismo de los precios no es apto para reorientar espontáneamente la actividad económica en el sentido de un uso más moderado de los productos de subsuelo o de bienes ambientales comunes. La estructura de los precios relativos brinda informaciones acerca de las escaseces relativas en un momento dado, pero no puede indicar las penurias a largo prazo’. (CALCAGNO, 1995:141).
Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, instituições globais que
criaram padrões como WSI, GRI e ISO, além da iniciativa privada apoiaram as
iniciativas. (BELLEN, 2006).
Mesmo assim, na alçada empresarial, nem todos os teóricos aderiram ao
desenvolvimento sustentável como proposto no Rio de Janeiro. Porter (2006), por
exemplo, escreve que esforços empresariais para a conservação do meio ambiente não
são produtivos por: (1) jogar o negócio contra a sociedade, quando ambos são
independentes; (2) induzir corporações a tratar a responsabilidade social de um modo
genérico ao invés de trata-la de uma maneira apropriada à estratégia de cada empresa.
Porter sugere que organizações que venham a analisar seus projetos de
responsabilidade social usando o mesmo modelo que guia suas escolhas no coração do
negócio, descobrirão que a RSC pode se tornar fonte de oportunidade, inovação e
vantagem competitiva.
Mecanismos de gestão ambiental, desenvolvidos com vistas ao desenvolvimento
sustentável, também constituem propostas interessantes (quadro 3):
ORIENTADOS PARA O CONTROLE
ORIENTADOS PARA O MERCADO
ORIENTADOS PARA O MERCADO
ORIENTADOS PARA O MERCADO
ORIENTADOS PARA O LITÍGIO
Regulamentos e sanções
Precificação: Taxas, impostos e
cobranças
Criação de mercado de direitos
Intervenção de demanda final
Legislação de responsabili-zação
Padrões de emissões;
Licenciamento para atividades
econômicas e relatório de impacto ambiental;
Restrições ao uso do solo;
Normas sobre o impacto da construção de estradas, oleodutos, portos ou redes de comunicações; Diretrizes ambientais para o traçado das vias urbanas; Multas sobre vazamento em instalações de armazenagem situadas no porto ou em terra;
Proibições aplicadas a substâncias consideradas inaceitáveis para os serviços de coleta de resíduos sólidos; Quotas de uso de água.
Cobrança pelo uso ou degradação de um recurso natural; Tributos
convencionais fixados sob ótica ambiental; Royalties e compensação financeira para a exploração de recursos naturais; Bônus de desempenho para padrões de construção; Impostos afetando as opções de transporte intermodal; Impostos para estimular a reutilização ou reciclagem de materiais; Cobrança por disposição de resíduos sólidos em aterro sanitário.
Licenças comercializáveis para os direitos de captação de água, e para emissões poluidoras no ar e na água; Desapropriação para construção incluindo "valores ambientais"; Direitos de propriedade ligados aos recursos potencialmente impactados pelo desenvolvimento urbano (florestas, solo, pesca artesanal); Sistema de reembolso para resíduos sólidos de risco.
Rotulação de produtos de
consumo referente a substâncias
problemáticas (p. ex., fosfatos em detergentes); Educação para a reciclagem e a reutilização; Legislação sobre divulgação, exigindo que os fabricantes publiquem a geração de resíduos sólidos, líquidos e tóxicos; Lista negra dos poluidores.
Compensação de danos;
Responsabili-zação legal por negligência dos gerentes da empresa e das autoridades legais; Bônus de
desempenho de longo prazo para riscos possíveis ou incertos na
construção de infra-estrutura;
Exigências de "Impacto Líquido Zero" para o traçado de rodovias,
oleodutos ou direitos de passagem de serviços públicos, e passagens sobre água.
Quadro 3 - Mecanismos de gestão ambiental que incorporam incentivos econômicos
Fonte: Adaptado de Motta (2007:77).
Com diversas propostas sendo colocadas em prática, uma discussão que tem se
acirrado nos últimos 15 anos diz respeito a como medir os resultados dos esforços
relacionados à gestão ambiental, os chamados indicadores. O lançamento do livro
Our
ecological footprint, de Wackernagel e Rees
, em 1996, marcou a utilização de uma
ferramenta para medir e comunicar o desenvolvimento sustentável. O método
contabiliza os fluxos de matéria e energia que entram e saem de um sistema econômico
e os converte em área correspondente de terra e água suficientes para sustentar o fluxo.
Ele é a área de ecossistema necessária para assegurar a sobrevivência de uma
determinada população ou sistema.
característica original de ser um sistema de trabalho baseado na internet. O primeiro
encontro se deu em 1998 na cidade de Middleburg, em Virgínia, após intensa
comunicação sobre diferentes sistemas de indicadores na internet. De janeiro a março
de 1999, o grupo tentou conectar seu trabalho com o desenvolvimento de indicadores
do
Bellagio Forum for Sustainable Development
. O artigo que descreve o método, "The
dashboard of sustainability", lançado por Hardi em 2000, foi preparado para o encontro
Measure and Communicate Sustainable Development: a Science and Policy Dialogue
,
de 2001 em Estocolmo, na Suécia.
O
dashboard
seria o conjunto de instrumentos de controle abaixo do pára-brisa
de um veículo. São três
displays
, que correspondem a três
clusters
: perfomance
econômica (emprego, investimentos, produtividade, distribuição de receitas,
competitividade, inflação e utilização eficiente de materiais e energia, por exemplo),
social (exemplificando, crime, saúde, pobreza, educação, governança, gastos militares e
cooperação internacional) e ambiental (como qualidade da água, ar e solo, níveis de lixo
tóxico) - tanto para um país quanto para um empreendimento. Uma seta, em cada um,
aponta para um valor que reflete o desempenho atual do sistema, enquanto um gráfico
reflete as mudanças do sistema avaliado e um medidor apresenta a quantidade
remanescente de alguns recursos críticos. Se um indicador individual ultrapassar um
valor considerado crítico - ou mude muito rapidamente -, luzes piscam. Outra função
calcula a média dos mostradores para se chegar a um índice de sustentabilidade global.
Cada indicador deve ser avaliado em termos de importância e performance.
Já especialistas ligados ao
World Conservation Union
(IUCN) e ao
International
Development Research Centre
(IDRC) criaram o
barometer of sustainability
. Para
Prescott-Allen, autor do método, a monetarização é eficiente como denominador comum
de medidas referentes ao comércio e ao mercado, mas nem sempre para aspectos
não-negociáveis dentro do mercado. Em estudo intitulado
The welbeing of nations
, em 2001,
Prescott-Allen comparou 180 países na escala do barômetro. Para cada um, foram
calculados o índice de estar humano (HWI, na sigla em inglês) e o índice de
bem-estar do ecossistema (FWI). Para ele, o ideal é utilizar escalas de performance.
Em nível empresarial, trabalham-se Sistemas de Gestão Ambiental, que
permitem gerenciar os aspectos e impactos ambientais que as atividades empresariais
causam ao meio ambiente. Os principais SGAs existentes são:
- Responsible Care Program
: trata-se de um programa desenvolvido pela
- BS 7750: iniciada em 1991, teve sua primeira publicação em junho do mesmo
ano com a formação de um comitê técnico no
British Standards Institution (BSI)
. A BS
7750 introduziu um novo enfoque para a resolução de problemas ambientais – da
auditoria ambiental à gestão ambiental, da identificação e resolução de problemas “a
jusante” à previsão e gerenciamento “a montante”.
- EMAS: sistema Europeu de Eco-Gestão e Auditorias (
EMAS - Eco-Management
and Audit Scheme
) adotado pelo Conselho da UE em junho de 1993, e aberto à
participação voluntária das empresas desde abril de 1995. Objetiva promover a melhoria
contínua do desempenho ambiental de atividades industriais a partir do estabelecimento
e implementação de políticas ambientais, programas e sistemas de gestão pelas
organizações; da avaliação sistemática, objetiva e periódica do desempenho dos
elementos contidos nas regulamentações e das informações à comunidade sobre a
organização.
- NBR ISO 14001: especifica 17 requisitos normativos. Descreve categorias
gerais de indicadores a serem considerados na condução da Avaliação de Desempenho
Ambiental: (1) os Indicadores de Condição Ambiental (ICA) fornecem informações sobre
as condições locais, regionais, nacionais ou globais da qualidade do meio ambiente,
com medições efetuadas de acordo com os padrões e regras ambientais estabelecidos
pelas normas e dispositivos legais; (2) os Indicadores de Desempenho Ambiental (IDA)
fornecem informações sobre o desempenho ambiental de uma organização, são
classificados em dois tipos: indicadores de desempenho gerencial e indicadores de
desempenho operacional; (3) os Indicadores de Desempenho Gerencial (IDG) fornecem
informações sobre os esforços gerenciais para influenciar positivamente o desempenho
ambiental da organização; (4) já os Indicadores de Desempenho Operacional (IDO)
fornecem informações sobre o desempenho ambiental relacionado às operações do
processo produtivo.
Bellen (2006:90) relaciona ainda outros indicadores importantes: PSR - OECD;
DSR - CSD; GPI - Cobb; HDI - UNPD; Material
input per service
(Mips) -
Wuppertal
Institut
- Alemanha;
System basic orientors
(SBO) - Bossel -
Kassel University; Wealth of
nations
- Banco Mundial;
Seea - United Nations Statistical Division; National round table
on the environment and economy
(NRTEE) -
Human/Ecosystem Approach - Canadá;
Policy performance indicator (PPI) - Holland; Interagency working group on sustainable
development indicators (IWGSDI) - U.S. President Council on Sustainable Development
Indicator Set; Sustainable proccess index (SPI) - Institute of Chemical Engineering -
Graz University; European Indices Project (EIP) - Eurostat; Environmental sustainability
index (ESI) - World Economic Forum
.
2.3 DESAFIOS GLOBAIS, REGIONAIS E NACIONAIS DA SUSTENTABILIDADE
Homens primitivos, ou mesmo das primeiras civilizações, imaginavam-se vivendo
numa planície ilimitada. A noção de uma Terra esférica e limitada é relativamente
recente.
For the sake of picturesqueness, I am tempted to call the open economy the "cowboy economy," the cowboy being symbolic of the illimitable plains and also associated with reckless, exploitative, romantic, and violent behavior, which is characteristic of open societies. Tile closed economy of the future might similarly be called the "spaceman" economy, in which the earth has become a single spaceship, without unlimited reservoirs of anything, either for extraction or for pollution, and in which, therefore, man must find his place in a cyclical ecological system which is capable of continuous reproduction of material form even though it cannot escape having inputs of energy. The difference between the two types of economy becomes most apparent in the attitude towards consumption.
(BOULDING, 1966).
Enquanto o caubói pensa na satisfação de suas necessidades imediatas, ao
homem do espaço é inerente a preocupação com seu futuro e também com o outro.
Para Hardin Garret (1968), o que é comum, que pertence a todos, não encontra seu
equilíbrio - todos procuram aproveitar ao máximo, exaurindo o recurso coletivo. Para
resolver a questão, o autor sugere controle. Restringir a liberdade, fazer o que é
necessário. Um exemplo é a poluição. Numa ótica individual, parece mais barato lançar
poluição no ar que é de todos do que purificar. Sem controle, o sistema entraria
inevitavelmente em entropia.
Daly (1991) escreve que economistas costumam incentivar que as nações
tenham comércio livre com países que não internalizem custos sociais e ambientais,
causando conflito e a injustiça de incentivar competição entre regimes diferentes de
internalização de custos.
There are no analogous international bodies of law and administration; there are only national laws, which differ widely. Consequently, free international trade encourages industries to shift their production activities to the countries that have the lowest standards of cost internalization - hardly a move toward global efficiency. (...) The most practical solution is to permit nations that internalize costs to levy compensating tariffs on trade with nations that do not. (DALY, 1991:52).
As tarifas, segundo o autor, devem ser adequadas ao mercado comprador. Quem
vende a um mercado externo deve se adequar às regras daquele mercado ou pagar
uma tarifa equivalente a remover a vantagem competitiva advinda de seus padrões
ambientais mais baixos. Ou seja, quem polui, paga.
subdesenvolvidos. A lógica segue a Lei de Miles, que defende que o ponto de vista
depende da posição na qual se está sentado (MILES, 1987:399), e tem como porta-voz
o Brasil. A responsabilidade pela conservação ambiental seria compartilhada mas, ao
mesmo tempo, diferente para cada país. Colocar isto em prática é um desafio que o
Brasil defende desde então.
Guimarães e Bezerra (2008) dizem que a política ambiental brasileira está
baseada em um tripé composto por: (1) priorização do crescimento econômico e da
industrialização sobre conservação e uso racional de recursos naturais; (2)
consideração de problemas ambientais de acordo com soberania e segurança nacional
e (3) compartimentalização apertada e sobreposta da gestão ambiental no aparato
burocrático brasileiro. Para o Brasil, apontam os pesquisadores, não há dúvidas de que
a responsabilidade primária de limpar o meio ambiente é dos países industrializados.
De acordo com esta perspectiva, problemas ambientais na periferia tinham como causa central o “grande número de seres humanos vivendo na pobreza” e, os países em desenvolvimento eram na realidade vítimas da poluição mundial gerada por uma falta de planejamento nas grandes economias industriais. Países em desenvolvimento, portanto, aprovariam medidas que fossem comprovadamente necessárias para corrigir esta situação, mas não caberia a eles sacrificar o único seu próprio crescimento econômico. Também não era esperado que países em desenvolvimento perdoassem qualquer medida que, direta ou indiretamente, pudessem transferir para os países desenvolvidos um fardo que, a priori, não seria deles. (GUIMARÃES E BEZERRA, 2008:11).
Para Guimarães e Bezerra (2008:15-16), o Brasil entende que a crise ambiental
será superada por tecnologias mais avançadas e limpas; e que os desequilíbrios
ambientais deveriam ser tratados de acordo com os princípios de pagador-poluidor e de
responsabilidades diferenciadas. Ainda, não faz sentido dizer que o meio ambiente é de
todas as pessoas do planeta, como supunha Boulding (1966), porque os recursos estão
localizados dentro de jurisdições nacionais.
Um desafio que se apresenta é governança. Segundo Sonnenfeld (2002), um
problema é que a maioria das instituições supranacionais surgiu a partir de agências
reguladoras nacionais, como uma inferência do modelo, o que ocasiona (1) falta de
dinamismo para lidar com questões essencialmente globais; (2) instituições
supranacionais possuem eficiência relacionada à internacionalização de países - se um
país não é muito inserido no contexto global, uma instituição supranacional terá pouca
validade - e (3) há atores diferentes envolvidos em escala global.
da Organização Mundial do Comércio, que permite que um país membro possa
questionar e até reverter a legislação de um país que exija que os bens importados
devam se adaptar a aspectos de segurança, saúde, trabalho ou ambiente que excedam
os padrões internacionais da OMC. Mesmo que um país adote padrões rigorosos de
gestão ambiental, se eles forem mais criteriosos que os da OMC, poderão ser
questionados.
3 ASPECTOS MORAIS E ECONÔMICOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Qualquer mudança de rumo frente ao paradigma do desenvolvimento provoca
inevitavelmente reações diversas. Documentados pela revista
The Economist
, na edição
de 22 de outubro de 2009, dois casos exemplificam a afirmativa. O primeiro (
Farmers
and climate change: seeds of discontent
) diz respeito à votação de nova lei nos Estados
Unidos contra a mudança climática, que propõe aumentar algumas taxas cobradas pelo
governo federal. Agricultores, representados em peso pelos senadores, enxergam
aumento de custos em combustível e fertilizantes de um lado e possíveis novos
negócios como a venda de créditos de carbono de outro. Logicamente, também
compreendem que o aumento da temperatura poderá comprometer seu negócio no
futuro. Mas, numa estratégia conservadora, a intenção destes agricultores é extinguir o
projeto (FARMERS, 2009). Tudo para evitar aumento de custos, ainda mais em época
de crise econômica - afinal, como dito no capítulo anterior, como crescer e sustentar ao
mesmo tempo?
O segundo artigo (
California’s water wars: of farms, folks and fish
) remete à
Califórnia, onde em 2007 o juiz Oliver Wanger ordenou que as estações do Sacramento
Delta reduzissem em 33% a água destinada a dois aquedutos cujos destinos são as
fazendas do Vale de San Joaquin e as casas do sul da Califórnia. O motivo: evitar a
extinção do delta smelt, um pequeno peixe de menos de oito centímetros, habitante da
região. Novamente, viu-se protestos de agricultores, motivados pela perspectiva de
redução da produção e dos empregos. Em algumas áreas, segundo o artigo, o temor
realizou-se e o desemprego atingiu 40%. Neste caso, entretanto, forma-se na localidade
uma oportunidade de conjugar forças políticas diversas no afã de encontrar a melhor
solução possível para a situação (CALIFORNIA’S, 2009).
O raciocínio que envolve a economia ecológica é bastante simples: atividades
para despoluir custam dinheiro, mesmo aquelas promovidas por voluntários. Seja na
atividade em si, como a conta no caso da mudança climática, seja nas consequências
para grupos de interesse, como no caso do peixe californiano. Barbieri (2007)
exemplifica com a chuva ácida:
No caso da indústria calçadista, foco desta dissertação, alega-se que há o
benefício dos curtumes, pois eles aproveitam uma parte do gado que seria descartada
durante o processo da geração de proteína animal. Com isto, em tese, o custo destes
depósitos de couro reduziriam. Mas, em outra ponta, a jusante, este couro é depositado
beneficiado em sapatos, bolsas, acessórios e peças de vestuário, no lixo comum, sem
qualquer proteção extra frente a resíduos como, por exemplo, o cromo.
Esta natureza dúbia das atividades empresariais encontra eco em Backer (2002),
que aponta dois tipos diferentes de impacto das atividades humanas sobre os
ecossistemas. No primeiro, são caracterizados os nocivos em quatro grupos principais:
- Indústria: Resíduos sólidos, efluentes líquidos, gás de emanação, acidentes
com potencial de deteriorar de maneira permanente os locais;
- Serviços: Resídulos sólidos (meios de transporte, computadores, meios de
comunicação), efluentes líquidos (turismo de verão) e gás de emanação (auto-estradas);
- Distribuição: Resíduos sólidos (embalagens e objetos usados), acidentes
(incêndios de armazém com emanação tóxica), efluentes líquidos (limpeza) e fumaça
(incineração);
- Famílias: Resíduos sólidos, efluentes líquidos, fumaças e lixo a partir de
produtos consumidos.
Na outra ponta está a indústria do meio ambiente, a que recupera o meio
ambiente, dividida em três setores:
- Produtos de consumo: Substituição de metais pesados, uso de plásticos
biodegradáveis, substituição de detergentes, de CFC, de CO2 e de NOx;
- Investimentos industriais: Indústrias de reciclagem e de limpeza, engenharia
das tecnologias limpas, indústrias de medida e controle;
- Serviços: medida, diagnóstico e controle em tempo real, avaliação de incidentes
e sistemas especializados, elaboração de softwares de serviços, supervisão humana,
financiamentos e seguros, formação e sensibilização.
Todas as cadeias produtivas atuam nas duas pontas. Enquanto uma traz custos
ambientais, a outra gera renda. O importante, aqui, é que exista uma gestão que vise à
compensação integral da ponta que gera a poluição. E, ao que tudo indica, quanto mais
regionalizado for este debate, melhor. Guimarães (1998:11) estima que o
desenvolvimento responde mais a variáveis endógenas que exógenas, dependendo
basicamente de seis fatores:
1. Os atores presentes no território, sejam individuais ou coletivos;
2. As instituições, sua flexibilidade e capacidade de aprender com a própria
experiência;
4. Os procedimentos usados pelas instituições que operam no território, em
especial as que sustentam a gestão do desenvolvimento, administração do governo, o
manejo da informação;
5. Os recursos existentes em um território, tanto materiais quanto humanos, de
conhecimento e psicossociais;
6. O entorno, como o território lida com outras instâncias.
Um dos principais atores é o Estado. Ele se interpõe à ponta que gera custos e à
que gera renda, cumprindo um papel único, necessário e indispensável na gestão
ambiental.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OECD, 2010) documenta
centenas de taxas e multas em uso em seus países membros para controle de
contaminação do ar, água, solo, resíduos sólidos e ruído. Também surgiram esquemas
de depósito-reembolso, permissões para uso de recursos ou para emitir certa
quantidade de contaminação, bônus de desempenho depositados durante execução de
projetos ambientalmente de risco, esquemas de etiquetas e informação pública, etc.
Lançar mão de uma tarifa ambiental é difícil. Segundo Acquatella (2001), que
estudou dezenas de casos de gestão ambiental na América Latina e no Caribe, alguns
fatores que dificultam a implementação são:
- Descontinuidade administrativa;
- Falta de prestígio político do setor ambiental;
- Escassez de recursos para as agências ambientais;
- Fragilidade do quadro institucional (equipes desmotivadas);
- Falta de compreensão e experiência das equipes técnicas.
A democratização do Estado, segundo Guimarães (1998), traria benefícios
distintos e fundamentais à sociedade em relação à democratização do mercado. No
entanto, mesmo com vistas a isto, ele identifica algumas vantagens em utilizar
instrumentos de mercado, de compra e venda, para desenhar o desenvolvimento
sustentável:
De este modo, una parte significativa de la preservación de la calidad ambiental pasaría al mercado, en la medida que la comercialización de tales derechos estimulan la modernización tecnológica y dejan de penalizar las industrias que, en el nivel tecnológico actual, no poseen las condiciones de reducir sus niveles de emisiones. En el sistema vigente, en que se privilegia la fiscalización por unidad productiva y a través de la aplicación de multas, además de dificultar la internalización de los costos de degradación del medio ambiente, son penalizadas las industrias que, aunque utilizando la tecnología más avanzada disponible en el mercado, siguen excediendo los límites establecidos, mientras se premian aquellas que, aun operando dentro de éstos, se abstienen de perfeccionar sus procesos productivos. (GUIMARÃES, 1998:28-29).
sociedade, implantando regulações diretas ou instrumentos de mercado para fazer com
que as empresas cumpram com os termos da regulação ou enfrentem custos mínimos
de transação. O que se busca, aqui, é considerar outros agentes, como empresas,
comunidade e mercado, tanto na análise do problema quanto no levantamento de suas
possíveis soluções (ACQUATELLA, 2001:65).
Um exemplo interessante para a cadeia calçadista está no artigo de Locke, Qin e
Brause (2006), que trata da experiência da Nike - talvez a marca mais conhecida de
tênis - com seus fornecedores. No texto, um
working paper
do
Massachussets Institute
of Technology
(MIT), os autores relatam a busca da empresa para produzir tênis mais
baratos, em países onde o custo de mão-de-obra eram menores. O resultado é que já
nos anos 1980 a empresa sofria críticas por buscar oportunidades em países com
baixas condições de trabalho e problemas com respeito aos direitos humanos, situação
que se agravou na década de 1990 com denúncias de trabalhadores mal remunerados
na Indonésia e trabalho infantil no Camboja e no Paquistão.
A primeira reação da empresa foi negar sua responsabilidade. Afinal,
empregados destas fábricas não eram funcionários da Nike. Por volta de 1992, no
entanto, a empresa formulou seu Código de Conduta para fornecedores - que incluía
padrões de segurança, saúde, condições de trabalho e de respeito ao meio ambiente.
Em 1998, a Nike aumentou a idade mínima para trabalhar em seus fornecedores de
calçado para 18 anos e de roupas para 16. Também insistiu para que os fornecedores
de calçado adotassem o padrão americano para qualidade de ar em ambientes
fechados.
Foram criadas três auditorias: a
Basic Environmental, Safety and Health
(SHAPE), que começou em 1997; a
More In-depth Management and Working Conditions
Audit
(M-Audit), iniciada em 2002 - que cobre mais de 80 itens da contratação até
cuidados com trabalho e compensação, e inspeções periódicas da
Fair Labor
Association
(FLA) para cerca de 5% dos fornecedores anualmente.
Nos mais de 800 fornecedores da empresa em 51 países, apenas o
monitoramento não parece ser suficiente. Prova disto está nos relatórios da Auditoria M,
que mostram que o número de visitas de funcionários da Nike nos fornecedores e a
consideração como parceiro estratégico têm impacto positivo sobre a auditoria. No nível
de país, as regulações e instituições têm uma influência positiva sobre o
score
da
Auditoria M. E em nível de fábrica, existe uma relação negativa entre o tamanho da
fábrica e a Auditoria M. Isto sugere que as condições de trabalho em fábricas pequenas
são melhores (LOCKE, QIN E BRAUSE, 2006).
3.1 ÉTICA EMPRESARIAL
Caso se queira acreditar que o termo desenvolvimento sustentável é possível,
partindo desta perspectiva, é preciso considerar que o mundo empresarial possui um
papel importante e fundamental - tanto quanto o Estado e a sociedade civil. Mais do que
uma forma de defender a marca, o trabalho com vistas à sustentabilidade é uma
obrigação moral.
Os sofistas foram os primeiros a tratar sobre a moral e os costumes pelos idos de
480 a.C. Como a medida de todas as coisas seria o homem, o conhecimento estaria
limitado pelos sentidos. Um acordo de convivência entre os homens não se daria por
uma verdade absoluta, mas por uma convenção. Este pensamento perdurou e se
transfigurou pelas obras de céticos como
Enesidemo de Cnossos
e de metafísicos como
Nicolau de Cusa e Giordano Bruno. Além disso, ecoou nas vozes de Montaigne, Hume,
Comte, Spencer, Spengler, Peirce, Nietzsche e Wittgenstein (THIRY-CHERQUES,
2008). Como argumento comum, temos que culturas diferentes possuem atos morais
diferentes, mas que o agir moral se dá em direção àquilo que torne possível a
perpetuação da espécie. Uma única cultura global, portanto, teria de possuir um acordo
igualmente global.
Um dos primeiros pensadores a se preocupar com um agir moral igual para todos
foi o grego Sócrates (470 a.C. - 399 a.C.). Sócrates é considerado o pai da ética e de
todos os grandes temas filosóficos vindos posteriormente, porque teria dito que as
questões morais exigiriam mais que a convenção ou os costumes - necessitariam de
uma elucubração. Contemporânea à Sócrates foi a Lei das Doze Tábuas (450 a.C.) do
direito romano, segundo a qual as leis tornaram-se técnicas e as querelas passaram a
ser resolvidas de forma teoricamente impessoal. Penas severas seriam caminhos para
um ato moral, uma garantia de cumprimento das normas de convivência. Nesta mesma
linha, mas em outra época, escreveu Cesare Beccaria (séc. XVIII):
Há delitos que tendem diretamente à destruição da sociedade ou daqueles que a representam. Outros afetam o cidadão em sua existência, em seus bens ou em sua honra. Outros, por fim, são atos contrários ao que a lei determina ou proíbe, tendo em mira o bem público. (BECCARIA, 2001:72).