REVISTA
BRASILEIRA
DE
ANESTESIOLOGIA
PublicaçãoOficialdaSociedadeBrasileiradeAnestesiologiawww.sba.com.br
ARTIGO
CIENTÍFICO
Eventos
respiratórios
adversos
após
anestesia
geral
em
pacientes
com
alto
risco
de
síndrome
da
apneia
obstrutiva
do
sono
Daniela
Xará
a,
Júlia
Mendonc
¸a
a,
Helder
Pereira
a,
Alice
Santos
ae
Fernando
José
Abelha
a,b,c,∗aDepartamentodeAnestesiologia,CentroHospitalardeSãoJoão,Porto,Portugal
bAnestesiologiaeUnidadedeTratamentoPerioperatório,FaculdadedeMedicina,UniversidadedoPorto,Porto,Portugal cDepartamentodeCirurgia,FaculdadedeMedicina,UniversidadedoPorto,Portugal
Recebidoem23dedezembrode2013;aceitoem5defevereirode2014 DisponívelnaInternetem28desetembrode2014
PALAVRAS-CHAVE Apneiaobstrutiva dosono;
Eventosrespiratórios; Desfechono
pós-operatório
Resumo
Introduc¸ão: OspacientescomescoreSTOP-BANG>3possuemaltoriscodedesenvolverapneia obstrutiva dosono.Oobjetivodesteestudofoiavaliarascomplicac¸õesrespiratóriasno pós--operatórioimediatoemadultoscomescoreSTOP-BANG>3apósanestesiageral.
Métodos: Estudoprospectivodedupla-coorte,comparando59paresdepacientesadultoscom escoreSTOP-BANG>3(altoriscodeapneiaobstrutivadosono)epacientescomescore STOP--BANG<3(baixoriscodeapneiaobstrutivadosono),similaresnoquedizrespeitoaogênero, idadeetipodecirurgia,admitidosapósacirurgiaeletivaemsaladerecuperac¸ãopós-anestésica (SRPA)emmaiode2011.Odesfechoprimáriofoiodesenvolvimentodeeventosrespiratórios adversos.Dadosdemográficos,variáveisnoperioperatórioetemposdepermanêncianaSRPAe nohospitalapósacirurgiaforamregistrados.OstestesdeMann-Whitney,qui-quadradoeexato deFisherforamusadosparacomparac¸ão.
Resultados: Osindivíduosdeambososgruposdepacientesdoestudotinhamumamédiade idade de 56 anos, 25% eram do sexo masculino e 59% foram submetidos à cirurgia intra--abdominal. Os pacientes com alto risco de apneia obstrutiva do sono apresentavam uma medianamaiordoíndicedemassacorporal(31versus24kg/m2,p<0,001)ecomorbidadesmais
frequentes,comohipertensão(58%vs.24%,p<0,001),dislipidemia(46%vs.17%,p<0,001)e diabetesmelitodependentedeinsulina(17%vs.2%,p=0,004).Essespacientesforam subme-tidoscommaisfrequênciaàcirurgiabariátrica(20%vs.2%,p=0,002).Ospacientescomalto riscodeapneiaobstrutivadosonoapresentarammaiseventosrespiratóriosadversos(39%vs.
10%,p<0,001),dessaturac¸ão deleveamoderada(15%vs. 0%,p=0,001)eincapacidadede respirarprofundamente(34%vs.9%,p=0,001).
∗Autorparacorrespondência.
E-mails:fernando.abelha@gmail.com,abelha@me.com(F.J.Abelha).
0034-7094/$–seefrontmatter©2014SociedadeBrasileiradeAnestesiologia.PublicadoporElsevierEditoraLtda.Todososdireitosreservados.
Conclusões:Após a anestesia geral, os pacientes com alto risco de apneia obstrutiva do sonoapresentaram umaumentodaincidênciadecomplicac¸õesrespiratóriasnoperíodo pós--operatório.
©2014SociedadeBrasileiradeAnestesiologia.PublicadoporElsevierEditoraLtda.Todosos direitosreservados.
KEYWORDS Obstructivesleep apnea;
Respiratoryevents; Postoperative outcome
Adverserespiratoryeventsaftergeneralanesthesiainpatientsathighrisk ofobstructivesleepapneasyndrome
Abstract
Introduction:PatientswithSTOP-BANGscore>3haveahighriskofObstructivesleepapnea. Theaimofthisstudywastoevaluateearlypostoperativerespiratorycomplicationsinadults withSTOP-BANGscore>3aftergeneralanesthesia.
Methods:Thisisaprospectivedoublecohortstudy matching59pairs ofadult patientswith STOP-BANGscore>3(highriskofobstructivesleepapnea)andpatientswithSTOP-BANGscore <3(lowriskofobstructivesleepapnea),similarwithrespecttogender,ageandtypeofsurgery, admittedafterelectivesurgeryinthePost-AnaesthesiaCareUnitinMay2011.Primaryoutcome wasthedevelopmentofadverserespiratoryevents.Demographicsdata,perioperative varia-bles,andpostoperativelengthofstayinthePost-AnesthesiaCareUnitandinhospitalwere recorded.TheMann---Whitneytest,thechi-squaretestandtheFisherexacttestwereusedfor comparisons.
Results:Subjects in both pairs ofstudy subjects had a median age of56 years,including 25%males,and59%weresubmittedtointra-abdominalsurgery.Highriskofobstructivesleep apneapatientshadahighermedianbodymassindex(31versus24kg/m2,p<0.001)andhad
morefrequentlyco-morbidities,includinghypertension(58%versus24%,p<0.001), dyslipide-mia(46%versus17%,p<0.001)andinsulin-treateddiabetesmellitus(17%versus2%,p=0.004). Thesepatientsweresubmittedmorefrequentlytobariatricsurgery(20%versus2%,p=0.002). Patientswith high riskof obstructivesleep apnea hadmore frequently adverse respiratory events(39%versus10%,p<0.001),mildtomoderatedesaturation(15%versus0%,p=0.001) andinabilitytobreathedeeply(34%versus9%,p=0.001).
Conclusion:Aftergeneralanesthesiahighriskofobstructivesleepapneapatientshadan incre-asedincidenceofpostoperativerespiratorycomplications.
©2014SociedadeBrasileiradeAnestesiologia.PublishedbyElsevier EditoraLtda.Allrights reserved.
Introduc
¸ão
Aapnéia obstrutivadosono (AOS) podeocorrer em todas asfaixas etárias1 e é umaformacomumde distúrbio
res-piratório do sono que afeta 2-26% da populac¸ão geral.2
EstudosdemonstraramqueospacientescomAOS
apresen-tamumaumentoassociadodemorbidadeemortalidade.3,4
Esses pacientes também apresentam taxas maiores de
complicac¸ões no pós-operatório.5---9 Como muitos
pacien-tes com AOS não foram formalmente diagnosticados no
momento da cirurgia,10 o manejo no pré-operatório e a
adoc¸ãodemedidasparareduzir orisco nopós-operatório
são difíceis de aplicar. Estima-se que um grande número
dehomense mulheres,com apneiadosono demoderada
agrave, nãotenha sidodiagnosticado.11 Apolissonografia
(PSG) noturna ainda é o padrão-ouro para o diagnóstico
de AOS, mas sua realizac¸ão pode ser inviável durante a
avaliac¸ãopré-operatória.
O uso rotineiro de instrumentos de triagem no
pré--operatório é importante para identificar os pacientes
com AOS não diagnosticada.12---14 Muitas ferramentaspara
a triagem de pacientes com AOS foram propostas, tais
como o questionário de Berlim, o questionário STOP e a
classificac¸ão daSociedadeAmericanade Anestesiologistas
(ASA),eseuusoaumentaaprobabilidadedeidentificac¸ão
daAOSnopré-operatório.1,9,13,15OquestionárioSTOP-BANG
(tabela1),quefoivalidadoparaapopulac¸ãocirúrgicapor
F. Chung etal., é um instrumento de fácil administrac¸ão
que consisteem oito perguntas, designadopelo acrônimo
em inglêsSTOP-BANG (Snoring, Tirednessduringdaytime,
Observedapnea,highbloodPressure,Bodymassindex,Age,
Neckcircumference,Gender[ronco,cansac¸odiurno,apneia
aparente, hipertensãoarterial, índice demassacorpórea,
idade,circunferênciadopescoc¸o,sexo]).Essequestionário
é pontuado com base em respostas Sim/Não (pontuac¸ão:
1/0)eoescorevariadezeroaoito.Umescore≥3mostrou
altasensibilidadeparadetectaraAOS:93%e100%paraAOS
moderada e grave, respectivamente.12 Devido a sua alta
sensibilidadeeporserumaferramentadetriagemfácilde
usar, o questionário STOP-BANG é considerado muito útil
paraidentificarpacientescomAOSmoderadaegrave.12
Em pacientescirúrgicos, a prevalênciade AOS é ainda
maiorquenapopulac¸ãogeralepodevariarmuito,deacordo
Tabela1 QuestionárioSTOP-BANG.AltoriscodeAOS:Simpara≥3perguntas.BaixoriscodeAOS:Simpara<3perguntas
RONCO:Vocêroncaalto(altoosuficienteparaserouvidoatravésdeportasfechadas)? SIM NO CANSAC¸O:Vocêcomfrequênciasesentecansado,fadigadooucomsonoduranteodia? SIM NO OBSERVAC¸ÃO:Alguémjáobservouvocêpararderespirarduranteosono? SIM NO PRESSÃOARTERIAL:Vocêtempressãoaltaouestáemtratamentoparapressãoalta? SIM NO IMC:IMCsuperiora35kgm---2? SIM NO
IDADE:Idadeacimade50anos? SIM NO CircunferênciadoPESCOC¸O:circunferênciadopescoc¸o>40cm? SIM NO
GÊNERO:masculino? SIM NO
70%foiespecialmenteobservadaempacientessubmetidosà cirurgiabariátrica.17AOSfoireconhecidacomoumpotencial
fatorderiscoindependenteparaumresultado adversono
perioperatório.18 OspacientescomAOSsubmetidos a
pro-cedimentoscirúrgicossãovulneráveisàobstruc¸ãodasvias
aéreas nopós-operatório,18 isquemiadomiocárdio,
insufi-ciência cardíaca congestiva, acidente vascular cerebral e
dessaturac¸ãodeoxigênio.18---20OspacientescomAOSpodem
ser mais suscetíveis a complicac¸ões respiratórias durante
o período perioperatório porque os medicamentos usados
duranteaanestesiageralpodemaumentaroriscode
perío-dosprolongadosdeapneia.14
Oobjetivodesteestudofoiavaliarascomplicac¸ões
res-piratóriasnoperíodopós-operatórioimediatoempacientes
comescoreSTOP-BANG≥3apósaanestesiageral.
Métodos
O Comitê de Ética do Centro Hospitalar São João
apro-vou este estudo e obtivemos a assinatura do termo de
consentimentoinformadodetodososparticipantes.O
Cen-troHospitalar SãoJoão, noPorto,é umhospitalterciário
com1.124leitos,localizadoemáreametropolitanaeserve
3.000.000pessoas.Esteestudoprospectivodedupla-coorte
foirealizadoem saladerecuperac¸ãopós-anestesia(SRPA)
com13leitosduranteumperíododetrêssemanas(de9a
27demaiode2011).OspacientesadmitidosnaSRPAapós
anestesiageralequeforneceramotermodeconsentimento
informadoassinadoforamincluídosnoestudo.Oscritérios
de exclusão foram: recusa do paciente, incapacidade de
fornecer consentimento informado, escore < 25 no
Mini--ExamedoEstadoMental(MEEM),idadeinferiora18anos,
nacionalidadeestrangeira,doenc¸aneuromuscular
diagnosti-cada,cirurgiadeurgência/emergênciaecirurgiacardíaca,
neurocirurgia ououtrosprocedimentosque exigiram
hipo-termiaterapêutica.
Todos os pacientes foram entrevistados na véspera da
cirurgiaounodiadacirurgia,pelomenostrêshorasantes
dacirurgia,naenfermariacirúrgica.Duranteaentrevista,
oconsentimentofoiobtido,oMEEMeoquestionário
STOP--BANGforamconcluídoseaanamnesefoirealizada.
Os anestesiologistas desconheciam o envolvimento
do paciente no estudo. A anestesia foi administrada e
monitoradadeacordocomoscritériosdoanestesiologista
responsável, masa condutaseguiuospadrões mínimosdo
departamento. De acordo com os nossos procedimentos
habituais,aanestesiageralfoiinduzidacomumanestésico
intravenoso, em combinac¸ão com um opiáceo, seguida
quando necessário de bloqueio neuromuscular (BNM).
Aanestesiafoimantida comanestesia venosatotal(TIVA)
oucom anestésicos inalatórios. O anestesiologista estava
livre para optar pelo uso de óxido nitroso.O manejo de
líquidosficoutotalmenteacargodoanestesiologista.
Bloqueadoresneuromusculares(BNM)foramusadospara
aintubac¸ão traqueale bolus adicionaisforamfornecidos,
casonecessário.Nãohádiretrizespublicadassobreousode
monitoramentoneuromuscular;portanto,omonitoramento
ficouacritériodoanestesiologista.
Para garantir que o anestesiologista permanecia
des-conhecendo a participac¸ão dos pacientes no estudo, não
tentamosobservarousointraoperatórioouainterpretac¸ão
da sequência de quatro estímulos (Train-of-Four [TOF]).
O anestesiologista tinha liberdade para decidir quanto à
reversãodoBNMcom neostigminaaotérmino do
procedi-mentocirúrgico.Emgeral,opacientefoiextubadonasala
decirurgiae transferido para a SRPA.Todosos indivíduos
receberam100%deoxigênioviamáscaraapósaextubac¸ão
traqueal. A decisão de administrar oxigênio durante o
tempoentreatransferênciaparaamacae aadmissãona
SRPAficouacargodoanestesiologistaresponsável.
AodarementradanaSRPA,oxigêniofoifornecidoatodos
ospacientesviacânulanasaloumáscarafacial,coma
deci-sãosobreotipo e aconcentrac¸ão deoxigênio acargodo
anestesiologistaprogramadoparaaSRPA.
O bloqueio neuromuscular residual (BNMR) foi
defi-nido como TOF<0,9 e quantificado na admissão à SRPA
usandoaceleromiografiadomúsculoadutordopolegar
(TOF--Watch®). Três mensurac¸ões de TOF (com intervalos de
15s) foram obtidas e a média dos três valores foi
regis-trada.Casoumdosvaloresdiferissedosoutrosemmaisde
10%, uma mensurac¸ão adicional era feita e a média
cal-culada com os três valores mais próximos. O bloqueio
neuromuscularfoi reavaliado de hora em hora, enquanto
ospacientesmantinhama TOF<0,9.Quandoospacientes
apresentavam uma TOF abaixo de 0,9, o anestesiologista
responsáveleracontatadoeinformado.
Ospacientesforamclassificadoscomodealtoriscopara
AOS(AR-AOS)quandoseusescoresSTOP-BANGeram≥3e
comodebaixoriscoparaAOS(BR-AOS)quandoseusescores
eram<3.
Umestudodedupla-coorte,comcasosprospectivamente
definidos, foi realizado. Todos os casos de AR-AOS foram
identificados durante o período do estudo e equiparados
com os pacientes do grupo controle selecionados para a
comparac¸ão.Oscasose controles foramidentificadospor
meiodecoletadedadosemtodosospacientesconsecutivos
casoscompreendiamtodosospacientesdeAR-AOS admiti-dosnaSRPAapósanestesiageral,equiparadosemrelac¸ãoao gênero,idadeetipodecirurgiaeletivadefinidacomo
intra--abdominal,musculoesqueletaloudecabec¸aepescoc¸o.
OspacientesdeBR-AOSforamclassificadoscombaseem
umacorrespondência de1:1 com ospacientes deAR-AOS
eforamselecionadosentreospacientesconsecutivossem
STOP-BANG≥3,deacordocomascaracterísticas
correspon-dentes.
As variáveis registradas na admissão à SRPA foram:
idade,sexo,tipodecirurgia(intra-abdominal,
musculoes-queletal, bariátrica, cabec¸a e pescoc¸o), índice de massa
corporal,estadofísicoASAepresenc¸adecomorbidades pré--hospitalizac¸ão.Usandoaclassificac¸ãodesenvolvidaporLee
ecolaboradoresparaaprevisãoderiscocardíaco,oíndice
derisco cardíaco revisado (IRCR) foi calculado para cada
paciente,sinalizandoumpontoparacadaumdosseguintes
fatoresderisco: cirurgiadealtorisco, históriadedoenc¸a
cardíacaisquêmica,históriadeinsuficiência cardíaca
con-gestiva, história de doenc¸a cerebrovascular, tratamento
pré-operatório com insulina para diabetes melito e
cre-atinina sérica no pré-operatório >2,0mg.dl---1.21 Os riscos
cirúrgicosforamavaliadosdeacordocomaEstratificac¸ãode
RiscoCardíacoparaProcedimentosCirúrgicosNão-cardíacos
das diretrizes de 2007 para Avaliac¸ão e Tratamento
Car-diovascularnoPerioperatório deCirurgia Não-cardíaca do
Colégio Americano de Cardiologia/Diretrizes para a
Prá-tica Clínica da Forc¸a Tarefa da Associac¸ão Americana de
Cardiologia.22
Pré-medicac¸ãocombenzodiazepínicoseseuusocrônico
foramregistrados.Detalhesintraoperatóriostambémforam
registradoseincluíramtipoedurac¸ãodaanestesiaeusode
BNMeneostigmina.
A temperatura timpânicados pacientes e a média dos
valoresdaTOFforamregistradasnomomentodaadmissãoà
SRPA.Todosospacientesforamcontinuamentemonitorados
commensurac¸ãodapressãoarterialefrequênciacardíaca,
eletrocardiograma(ECG)esaturac¸ãoperiféricadeoxigênio,
eamédiados valoresdaTOFfoiregistradana admissãoà
SRPA.
Osdadospós-operatóriosregistrados incluíram
mortali-dadeetempodeinternac¸ãoepermanêncianaSRPA.
Eventosrespiratóriosadversosnopós-operatório imediato
Cadaevento respiratório adverso (ERA) nopós-operatório
foi definido na folha de coleta de dados, usando uma
classificac¸ãodescrita porMurphyetal.23 comosseguintes
critérios:
Obstruc¸ão das vias aéreas superiores exigindo
intervenc¸ão (trac¸ão da mandíbula, via aérea oral ou
nasal);
Hipoxemia leve-moderada (saturac¸ão de O2 (SpO2) de
93%-90%) em 3L de O2 via cânula nasal que não
melho-rou após intervenc¸ões ativas (aumentando o fluxo de O2
para>3L.min---1,aplicac¸ãodealtofluxodeO
2via máscara
facial, solicitac¸ões verbais para respirar profundamente,
estimulac¸ãotátil);
Hipoxemia grave (SpO2 <90%) em trêsL de O2 via
cânula nasal que não melhorou após intervenc¸ões ativas
(aumentando o fluxo de O2 para >3L.min---1, aplicac¸ão de
altofluxodeO2viamáscarafacial,solicitac¸õesverbaispara
respirarprofundamente,estimulac¸ãotátil);
Sinaisdedesconfortorespiratório ouinsuficiência
ven-tilatóriaiminente(frequênciarespiratória>20rpm,usode musculaturaacessória,sinaldeobstruc¸ãoalta);
Incapacidadederespirarprofundamentequando
solici-tadopeloenfermeirodaSRPA;
Pacientecomqueixadesintomasdefraquezamuscular
respiratóriaoudasviasaéreassuperiores(dificuldadepara
respirar,engoliroufalar);
Pacienteprecisandodereintubac¸ãonaSRPA;
Evidênciaclínicaoususpeitadeaspirac¸ãopulmonarapós
aextubac¸ãotraqueal(conteúdogástricoobservadona
oro-faringeehipoxemia).
Durante a permanência na SRPA, os pacientes foram
continuamente observados por enfermeiros do setor que
entravam em contato imediato com um investigador do
estudo,casoERAfosseobservado.Aavaliac¸ãoda
incapaci-dadederespirarprofundamenteedossintomasdefraqueza
muscularrespiratóriaoudasviasaéreassuperioresfoi
rea-lizada em intervalos de 10min. Um outro investigador do
estudo observava o paciente para certificar-se de que o
pacienteapresentavapelomenosumdoscritériosparaERA.
Análiseestatística
Usamos a análise descritiva das variáveis para resumiros
dadoseotesteUdeMann-Whitneyparacompararas
variá-veis contínuasentreosgrupos deindivíduos; ostestes do
qui-quadradoeexatodeFisherforamusadospara
compa-rar as proporc¸ões entre grupos. Todas as variáveis foram
consideradassignificantesquandop<0,05.
O programa estatístico SPSS para Windows versão
19.0(SPSS,Chicago,IL)foiusadoparaanalisarosdados.
Resultados
Nototal,59paresdeindivíduosparticipantesforam
admi-tidos na SRPA durante o período do estudo. A tabela 2
apresenta as características dos pacientes admitidos na
SRPA, dados cirúrgicos,manejo anestésico, dadosno
pós--operatórioe acomparac¸ãoentreospacientesdeAR-AOS
edeBR-AOS.Ambososgrupos deindivíduostinhammédia
de idade de 56 anos, incluíam 25% de pacientes do sexo
masculinoe 59%depacientessubmetidos àcirurgia
intra--abdominal. A anestesia combinada foi usada em 13 dos
118pacientesdoestudo.
Ospacientesde AR-AOSapresentavam índice demassa
corporal mais elevado (mediana de 31 vs. 24kg.m---2,
p<0,001) e comorbidades mais frequentes, como
hiper-tensão (58% vs. 24%, p<0,001), dislipidemia (46% vs.
17%, p<0,001) e diabetes melito dependente de insulina
(17% vs. 2%, p=0,004). Esses pacientes foram
submeti-dosàcirurgiabariátricacommaisfrequência(20%vs.2%,
p=0,002).
Vinte e nove pacientes de toda a populac¸ão
apresen-taram ERA (24,6%; intervalo de confianc¸a (IC) de 95%:
16,7-32,5) (tabela 3); 25 não conseguiram respirar
pro-fundamente quando solicitados (21,2%, IC95: 13,7-28,7);
nove apresentaram sintomas de doenc¸as respiratórias ou
Tabela2 Característicasdospacientes
Medianadasvariáveis,(IQR)oun(%) STOP-BANG≥3
(AR-AOS)
n=59
STOP-BANG<3 (BR-AOS)
n=59
p
Idadeemanos 56(41---67) 56(44---67) 0,859a
Sexo 1b
Masc. 15(25) 15(25)
Fem. 44(75) 44(75)
Índicedemassacorpórea(Kg.m---2) 31(26---38) 24(22---28) <0,001a
ASA 0,167b
I/II 49(83) 54(91)
III/IV 10(17) 5(9)
Cirurgiadealtorisco 19(32) 23(39) 0,442b
Doenc¸acardíacaisquêmica 1(2) 0 0,500c
Doenc¸acardíacacongestiva 2(3) 1(2) 0,500c
Doenc¸acerebrovascular 2(3) 0 0,248c
Insulinoterapiaparadiabetes 10(17) 1(2) 0,004c
Insuficiênciarenal 2(3) 4(7) 0,340c
IRCR 0,752c
<2 58(98) 58(98)
>2 1(2) 1(2)
Hipertensão 34(58) 14(24) <0,001b
Hiperlipidemia 27(46) 10(17) <0,001b
DPOC 3(5) 0 0,122c
Sítiocirúrgico 1b
Intra-abdominal 35(59) 35(59)
Musculoesqueletal 18(31) 18(31) Cabec¸aepescoc¸o 6(10) 6(10)
Cirurgiabariátrica 12(20) 1(2) 0,002c
Pré-medicac¸ãocomBZD 18(31) 22(37) 0,437b
UsocrônicodeBZD 10(17) 4(7) 0,076c
Hipotermia 19(32) 23(39) 0,442b
Tipodeanestesia 0,378c
Geral 51(86) 54(92)
Combinada 8(14) 5(9)
Usodeneostigmina 46(78) 41(70) 0,480b
UsodeBNM 49(83) 47(80) 0,407b
BNMR 23(37) 13(22) 0,070b
Durac¸ãodaanestesia(min) 110(80---190) 120(85---180) 0,897a
EventosrespiratóriosnaSRPA 23(39) 6(10) <0,001b
TempodepermanêncianaSRPA (min)
120(80---155) 99(75---120) 0,035c
Tempodeinternac¸ãohospitalar (dias)
3(2---6) 3(2---6) 0,482a
AR-AOS,Altoriscodeapneiaobstrutivadosono;BR-AOS,Baixoriscodeapneiaobstrutivadosono;ASA,Estadofísicodeacordocom aSociedadeAmericanadeAnestesiologistas;IRCR,Índicederiscocardíacorevisado;DPOC,Doenc¸apulmonarobstrutivacrônica;BZD, benzodiazepínico;BNM,Bloqueioneuromuscular;BNMR,Bloqueioneuromuscularresidual;SRPA,unidadederecuperac¸ãopós-anestesia.
a TesteUdeMann-Whitney. b Tesdedoqui-quadradodePearson. c TesteexatodeFisher.
2,8-12,5); nove desenvolveram hipoxemia leve-moderada
(7,6%, IC95: 2,8-12,5); seis apresentaram obstruc¸ão das
vias aéreas superiores (5,1%, IC95: 1,1-9,1); cinco
desen-volveram hipoxemia grave (4,2%, IC95: 0,1-7,9); cinco
apresentaramsinaisdedesconfortorespiratório(4,2%,IC95:
0,1-7,9). Nenhum paciente precisou de reintubac¸ão ou
apresentoususpeitaouevidênciaclínicadeaspirac¸ão
Tabela3 Complicac¸õesnopós-operatório
Total(n=118) AR-AOS (BR-AOS)p
Complicac¸õesrespiratórias 29(25) 23(39) 6(10) <0,001
Obstruc¸ãodasviasaéreas 6(5) 4(7) 2(3) 0,340 Hipoxemialeve-moderada 9(8) 9(15) 0 0,001 Hipoxemiagrave 5(4) 3(5) 2(3) 0,500 Insuficiênciarespiratória 5(4) 3(5) 2(3) 0,500 Incapacidadederespirarprofundamente 25(21) 20(34) 5(9) 0,001 Fraquezamuscular 9(8) 7(12) 2(3) 0,081
AR-AOS,Altoriscodeapneiaobstrutivadosono;BR-AOS,Baixoriscodeapneiaobstrutivadosono.
Os pacientes de AR-AOS desenvolveram mais complicac¸õesrespiratóriasnaSRPA(39%vs.10%,p<0,001). Apenasospacientes deAR-AOS desenvolveram hipoxemia leve-moderada, além de apresentarem alta incapacidade derespirarprofundamente(34%vs.9%,p=0,001).
AmedianadotempodepermanêncianaSRPAfoimaior nos pacientes de AR-AOS (120min vs. 99min, p=0,035). Otempodepermanêncianohospitalfoisemelhantenosdois gruposdepacientes.
Discussão
Amaioriados pacientescomAOSprogramados para cirur-giapermanece semum diagnóstico formal.Essa entidade pode ser considerada uma condic¸ão prevalente entre os pacientes cirúrgicos que pode provocar efeitos adver-sos significativos no período perioperatório.10 Durante a
avaliac¸ãopré-operatória,atriagemdeAOSéessencialpara
apreparac¸ãodeestratégiasqueminimizemorisco
periope-ratóriodeeventosadversos.Comoahistóriaclínicanãoéum indicadorconfiáveldapresenc¸adeAOSeaPSGnãoestá
dis-ponívelparatodosospacientescirúrgicos,umamodalidade
eficazdetriageménecessária.24
O questionárioSTOP foivalidado em pacientes
cirúrgi-cos em clínicas pré-operatórias como umaferramenta de
triagemquedemonstrouumaaltasensibilidadeevalor
pre-ditivonegativo,especialmenteparapacientescomAOSde
moderadaagrave.12,15
Aincidência relatadade eventosrespiratóriosadversos
emSRPAémuitovariável,comestudosobservacionais
des-crevendoumaincidênciade1,3%-34%,25---27 dependendodo
ERAestudadoedascomorbidadesdopaciente.
Diferentesestudosjádocumentaramaassociac¸ãodeAOS
comcomorbidades8,28,29 e, em nossoestudo, ospacientes
deAR-AOSapresentaramhipertensãoarterial,dislipidemia
einsuficiência renal commaisfrequência,mas não
pude-mos mostrar a associac¸ão entre AOS e doenc¸a cardíaca
isquêmica ou congestiva que foi estabelecida por outros
pesquisadores.28,29 Uma razãopara issopodeestar
relaci-onada à mediana relativamente baixa da idade de nossa
populac¸ão.
AOS foi descrita como umfator derisco independente
paracomplicac¸ões pulmonaresnoperioperatório,30,31 mas
hápoucaevidênciadescrevendocomplicac¸õesrespiratórias
empacientescomAOSemSRPA.Liaoetal.8relataramquea
maioriadascomplicac¸õesnopós-operatórioocorreudepois
datransferênciados pacientesparaa enfermariaeque o
principalcontribuinteparaataxaelevadadecomplicac¸ões
nopós-operatórioempacientescomAOSfoioaumentoda
incidênciadecomplicac¸õesrespiratórias.
Nossoestudomostra que,após acirurgia,ospacientes
de AR-AOS podem ter um alto risco de ERA, pois esses
pacientes apresentaram um aumento quase quatro vezes
maiorque ospacientes deBR-AOSde desenvolverem ERA
naSRPA.EsseachadoestádeacordocomoestudodeLiao
etal.querelataramumamaiorincidênciadecomplicac¸ões
pulmonaresempacientescomAOS(33%vs.22%).
Complicac¸ões respiratórias no pós-operatório imediato
podem levar ao aumento de morbidade e mortalidade.32
A fisiologia pulmonar e da faringe pode ser afetada por
fatoresperioperatóriosquepodemterefeitosnegativosem
pacientes comAOS.33,34 O comprometimento daatividade
dosmúsculosdafaringe,promovido porfatores
relaciona-dos farmacológicos e mecânicos, podeser visto como um
fatoragravantequeaumentaoriscodeERAnoperíodo
pós--operatórioempacientescomAOS.23Oestudodoimpactodo
manejoanestésiconãofoioobjetivodopresenteestudo,de
modoquedecidimosrealizarumtrabalhoobservacional
per-mitindo diferentes protocolos anestésicos. Efetivamente,
apenas 11% dos pacientes foram submetidos à anestesia
combinada;portanto,seuimpactosobreaocorrênciadeERA
nãopoderiaseravaliado.
Os pacientes com AR-AOS apresentaram mais BNMR e
foram mais frequentemente submetidos à cirurgia
bariá-trica;essesdoisfatorespodemserresponsáveispelastaxas
maiselevadasdeERA.
OERAmaiscomumqueocorreu nogrupoAR-AOSfoi a
incapacidadederespirarprofundamente,registradaem34%
dospacientes.Hipoxemialeve-moderadafoiosegundoERA
mais comum nogrupo AR-AOS e ocorreu em 15%. Outros
estudos relataram resultados semelhantes em relac¸ão ao
risco maior dehipóxia,13,35,36 masumestudo recente que
avaliou pacientes com obesidade mórbida não encontrou
diferenc¸a entrepacientes com e sem AOS no número de
episódioshipoxêmicospós-cirurgiabariátrica.37
AsconsequênciasdeERAreferentesàpermanência
pro-longada em SRPA sãodifíceis de calculare divergem com
base em fatores institucionais singulares que incluem os
modelosdepessoal,tamanhodaSRPAedisponibilidadede
leitosemenfermaria.Nesteestudo,ospacientesdeAR-AOS
permanecerampormaistemponaSRPA,oqueécompatível
comamaioriadosestudos.8
Nosso estudo tem umasérie de limitac¸ões que devem
serreconhecidas.Primeiro,aamostraépequenaefoi
osresultadosparaalémdenossolocaldeestudo.Segundo,
contamos apenas com o escore STOP-BANG para fazer o
diagnósticodeAOSporquenãohaviadados
polissonográfi-cosdisponíveisparatodosospacientes;logo,nãopudemos
quantificar a gravidade dos pacientes considerados de
AR-AOS.Terceiro,asdefinic¸ões deERAtiveramalguns
cri-tériossubjetivosquepodemterinfluenciadoodiagnóstico.
Quarto, oseventosrespiratórios foramregistrados apenas
naSRPAeascomplicac¸õesquepoderiamterocorridoapós
aaltadaSRPAnãoforamconsideradas.
Porfim,emboratenhamostentadoterumasemelhanc¸a
emrelac¸ãoaotipodecirurgiarealizadanosdoisgruposdo
estudo,ospacientesdeAR-AOSforammaisfrequentemente
submetidosà cirurgiabariátricae issopodeter afetado a
incidênciadeERAentreessespacientes.
Os principaisachados deste estudo foramque os
paci-entescomescoreSTOP-BANG≥3apresentavam umíndice
demassa corporal maiselevadoe foramsubmetidos mais
frequentemente à cirurgia bariátrica; os pacientes de
AR-AOS apresentaram mais comorbidades, como
hiper-tensão, dislipidemia e diabetes melito dependente de
insulina; os pacientes com escore STOP-BANG≥ 3
tive-ram uma incidência maior de complicac¸ões respiratórias
nopós-operatório.Incapacidadederespirarprofundamente
e hipóxia leve-moderada foram os eventos respiratórios
adversos mais frequentes no período pós-operatório
ime-diato e ocorreram com maisfrequência nos pacientes de
AR-AOS.Conclusão
Em conclusão, a ocorrência de ERA na SRPA foi mais
comumemaisfrequentementeobservadaempacientesde
AR-AOS.
Autoria
Todas aspessoas listadas como autorescontribuíram para
a preparac¸ão do manuscrito e ninguém alémdos autores
mencionados contribuiu de modo significativo para a sua
preparac¸ão.Cadaautorlistado participou dotrabalho,de
modoquetodospodemdefenderpublicamenteoseu
con-teúdo. Todosleram o manuscrito antesde sua submissão
à publicac¸ão e estão dispostos a assinar uma declarac¸ão
afirmandoqueleramomanuscritoeconcordamcomasua
publicac¸ão.
Fernando Abelhafeztodaacoordenac¸ãodoestudo,as
análisesestatísticaseescreveuorascunhoeomanuscrito.
DanielaXaráparticipoudaconcepc¸ãodoestudoefeza
revi-sãocríticadomanuscritofinal. JuliaMendonc¸aparticipou
daconcepc¸ãodoestudoecoordenouaaquisic¸ãodedados
eajudouaconstruirobancodedados.HelderPereira
par-ticipou da concepc¸ãodo estudo, coordenou a construc¸ão
do banco de dados e contribuiu de forma substancial na
aquisic¸ão dos dados. Alice Santos fez contribuic¸ões
subs-tanciais nasanálises e interpretac¸ão dos dados,escreveu
orascunhoeomanuscritoecoordenouarevisãodo
manus-critofinal.
Conflito
de
interesses
Osautoresdeclaramnãohaverconflitosdeinteresse.
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