• Nenhum resultado encontrado

Enxaqueca oftalmoplégica: estudo clínico e eletrencefalográfico de dois casos.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Enxaqueca oftalmoplégica: estudo clínico e eletrencefalográfico de dois casos."

Copied!
11
0
0

Texto

(1)

E N X A Q U E C A O F T A L M O P L Ê G I C A

E S T U D O C L Í N I C O E E L E T R E N C E F A L O G R A F I C O D E D O I S C A S O S

P A U L I N O W . L O N G O * P A U L O P I N T O P U P O ** O C T A V I O L E M M I ***

Enxaqueca é afecção caracterizada por crises periódicas de dor de cabeça, geralmente unilateral, paroxística, precedida ou não de aura visual (escotoma cintilante ou cegueira parcial), acompanhada de dis-túrbios stnsoriais, motores ou mistos, ao lado de fenômenos gerais vasomotores e psíquicos. Essas manifestações clínicas não são de presença obrigatória, podendo faltar ou ser acrescidas de outras mais. Assim sendo, é possível a separação de formas clínicas diversas no quadro da enxaqueca. Classificação bastante interessante e descritiva

c a de Moench 1

, que considera as seguintes formas: 1 — Enxaqueca comum ou hemicrânia simples; 2 — Enxaqueca of tálmica (dor de cabeça precedida, acompanhada ou seguida de distúrbios visuais, par-ticularmente escotomas) ; 3 — Enxaqueca oftalmoplégica (dor de cabeça acompanhada de paralisia de músculos oculares) ; 4 — Enxa-queca facioplégica (acompanhada de paralisia facial) ; 5 — EnxaEnxa-queca abdominal (síndrome de distúrbios gastrointestinais e cardiovasculares asscciados, não acompanhados de dor de cabeça) ; 6 — Enxaqueca psíquica (distúrbios psíquicos paroxísticos que substituem, se juntam ou se alternam com crises de cefaléia).

O aparecimento da enxaqueca está quase sempre ligado à presença de três fatores, hoje admitidos de maneira quase que categórica: 1 — a idade relativamente jovem em que se instala; 2 — a predominância no sexo feminino; 3 — a hereditariedade, homóloga e direta, bem eviden-ciável em 50 a 80% dos casos. Por outro lado, o seu íntimo parentesco com a epilepsia, já assinalado por Tissot H 8 6 3 ) , tem sido estatistica-mente comprovado pela maioria dos pesquisadores e, mais recenteestatistica-mente,

firmado de modo inequívoco com o advento da eletrencefalografia 2

. É a forma oftalmoplégica da enxaqueca que nos interessa no pre-sente trabalho. Caracteriza-se pelo fato de algumas crises de hemi-crânia serem acompanhadas de paralisia, parcial ou total, do nervo

T r a b a l h o a p r e s e n t a d o à Secção d e N e u r o p s i q u i a t r i a d a A s s o c i a ç ã o P a u l i s t a d e M e d i c i n a , em 6 o u t u b r o 1947.

* C a t e d r á t i c o d e N e u r o l o g i a na. E s c . P a u l i s t a M e d .

** L i v r e - d o c e n t e d e N e u r o l o g i a d a F a c . d e M e d . U n i v . S . P a u l o . C h e f e de C l í n i c a N e u r o l ó g i c a n a E s c . P a u l i s t a M e d . ( P r o f . P a u l i n o W . L o n g o ) .

*** A s s i s t e n t e d e C l í n i c a N e u r o l ó g i c a d a E s c . P a u l i s t a M e d . ( P r o f . P a u l i n o W . L o n g o ) .

(2)

motor ocular comum ipsilateral, a princípio intermitente e fugaz, depois quase sempre permanente. Descrita inicialmente por Charcot ( 1 8 9 0 ) , que lhe deu a denominação de "enxaqueca oftalmoplégica", fora já assinalada por Gubler (1860) e por Saundby (1882). Moebius (1884),

descrevendo, segundo Behmack 3

, uma "paralisia oculomotora recidi-v a t e e periódica" como manifestação motora, acompanhada ou não de dor, e dependente de afecções orgânicas da base do crânio, não a admitiu corno possível forma particular de enxaqueca. Foram a descrição "princep?" de Charcot, o trabalho de Ballet (1896) e as teses de Alche

(Paris, 1895) e de Leclezio (Bordeaux, 1905), que lhe outorgaram o direito de um lugar próprio nos quadros da patologia, direito ainda hoje bastante discutido.

A multiplicidade dos quadros clínicos assinalados na literatura, a confusão freqüente entre a "enxaqueca oftalmoplégica" de Charcot e a "paralisia oculomotora recidivante e periódica" de Moebius e, mais

ainda, os achados anatômicos em casos semelhantes 4

, têm sido, a nosso ver, as razões pelas quais muitos estudiosos põem e m dúvida a

existên-cia da forma oftalmoplégica da enxaqueca. Entre

eles,

citemos

Chris-tiansen s

, Pasteur Vallery-Radot 6

, Crouzon e Chatelin 7

, Gerini 8

, Garcin 9

, Dereux. 1 0

e Riley — discutindo uma comunicação de

Foster-Kennedy 1 1

— bem como os tratadistas Claude 1 2

e Ford 1 3

.

A propósito destas discussões, encontramos no trabalho de Bürki 1 4

uma análise criteriosa, separando a verdadeira forma da

==3. B e h m a c k , C h . — Z u r K e n n t n i s d e r o p h t h a l m o p l e g i s c h c M i g r ä n e . Z t s c h r . f. d. g e s . N e u r o l , u . P s y c h i a t . , 114: 264-280, 1 9 2 8 .

==4. R i c h t e r ( f i b r o c o n d r o m a d a b a s e d o c é r e b r o , 1 8 8 7 ) , M a s s a l o n g o ( p r o c e s s o i n f l a m a t ó r i o c r ô n i c o o u n e o p l á s t i c o d a s m e n i n g e s d a b a s e . 1 8 9 1 ) , S h i o n o y a ( t u b e r c u l o s e d a s m e n i n g e s , 1 9 1 1 ) , K a r p l u s ( n e u r o f i b r o m a d o I I I p a r , 1 9 0 2 ) , D a s s e n ( a n e u r i s m a d a a r t é r i a c o m u n i c a n t e p o s t e r i o r . 1 9 3 1 ) , e t c .

==5. C h r i s t i a n s e n , V . — R a p p o r t s u r la m i g r a i n e (VT R é u n i o n N e u r o l o g i q u e I n t e r n a t i o n a l e A n n u e l l e . S o c i é t é d e N e u r o l o g i e d e P a r i s — 25 a 27 d e m a i o , 1 9 2 5 . R e v . N e u r o l . , 1: 8 5 4 - 8 8 1 , 1 9 2 5 .

==6. P a s t e u r V a l l e r y - R a d o t — R a p p o r t s u r la p a t h o g é n i e d e s m i g r a i n e s . R e v . N e u r o l . , 1: 881-922, 1 9 2 5 .

==7. C r o u z o n , M . e C h a t e l i n . C h . — U n c a s d e m i g r a i n e o p h t a l m o p l é g i q u e ( p a r a l y s i e o c u l a i r e p é r i o d i q u e ) . R e v . N e u r o l . , 1: 734-36, m a i o , 1914.

==8. G e r i n i , C. — S o p r a un caso di e m i c r a n i a o f t a l m o p l e g i c a . C e r v e l l o , 6: 197-208, 1927. ==9. G a r c i n , R . e H e l b r o n . P . — C o n t r i b u t i o n à 1'étude d e s m i g r a i n e s a c c o m p a g n é e s e t . e n p a r t i c u l i e r , d e la p h y s i o p a t h o l o g i e d e s m i g r a i n e s o p h t a l m i q u e s a c c o m p a g n é e s . A n n . M é d . , 34: 81-114, 1934.

G a r c i n , R . e D o l f u s s , M . A . — P a r a l i s i e s r e c i d i v a n t e s et a l t e r n a n t e s d e la 3º et d e la 6º p a i r e s é v o l u a n t p a r p o u s s é e s d e p u i s onze a n s . R e v . N e u r o l . . 1: 461-469, 1 9 3 1 .

==10. D e r e u x , M . J . — P a r a l y s i e p é r i o d i q u e de la t r o i s i è m e p a i r e é v o l u a n t p a r p o u s s é e s d o u l o u r e u s e s d e p u i s q u i n z e a n s ( c o n t r i b u t i o n à 1'étude de la m i g r a i n e o p h t h a l m o p l é g i q u e ) . R e v . N e u r o l . . 75: 307-308, 1 9 4 3 .

==11. Fosterr-Kennedy — A case of o p h t h a l m o p l e g i c m i g r a i n e a n d a t h e o r y for i t s p r o ¬ duction. J . N e r v . a. M e n t . D i s . , 104 : 89-91 ( j u l h o ) 1 9 4 6 .

==12. C l a u d e . H . — P a t o l o g i a I n t e r n a — E n f e r m e d a d e s del S i s t e m a N e r v i o s o . B i b l i o t e c a C a r n o t y Fournier V o l . T r a d . e s p a n h o l a . S a l v a t E d i t . , B a r c e l o n a , 1 9 4 2 . p á g s . 784 e 787.

==13. F o r d , F r . — D i s e a s e s of t h e N e r v o u s S y s t e m i n I n f a n c y , Childhood a n d A d o l e s c e n t e . Ch. C. T h o m a s . B a l t i m o r e . 1937. p á g . 8 4 9 .

(3)

enxaqueca oftalmoplégica das "pseudo-enxaquecas oftalmoplégicas". Estas seriam melhor catalogadas como oftalmoplegias recidivantes acompanhadas de fenômenos dolorosos. Neste grupo, podem ser incluí-dos toincluí-dos aqueles casos da literatura, nos quais a necrópsia revelou afecções orgânicas comprometendo o nervo motor ocular comum, isola-damente ou ao lado de outros nervos cranianos (processos inflamatórios, tumores, aneurismas, etc.) Em geral, em tais casos, a sintomatologia surge já em idade avançada e se desenvolve por surtos de paralisia permanente ao invés de paralisias recorrentes dos nervos ocu! orno to res.

A verdadeira enxaqueca oftalmoplégica, ao contrário, é moléstia da juventude e a oftalmoplegia é recorrente, acompanhando as crises da enxaqueca; quando ela, após aparecimentos sucessivos, não se estabelece de modo permanente, tende a se espaçar e mesmo a desaparecer na velhice, tal como as próprias crises da enxaqueca.

Or. casos acima assinalados e os de Flatau (apud Costa Rodrigues e Collares 1 5

) , Brcuchard 1 6

, Lotti e Sedlakowa 1 7

, Behmack 3

, Gareiso

e Rascovsky 1 8

e de Foster Kennedy 1 1

, não deixam dúvidas quanto à sua existência e quanto à correlação estreita entre as crises de enxa-queca e os surtos de oftalmoplegia. Aliás, e a é admitida pela maioria

dos tratadistas: Wilson 1 9

, Strümpell 2 0

, Dejerine 2 1

, Adrogué 2 2

Barraciuer 2 3

, Curshmann 2 4

, Grinker 2 S

.

As discussões ainda hoje existentes em torno da patogenia da oftalmoplegia conseqüente à enxaqueca decorre, segundo pensamos, do fato de que numerosos autores se tenham deixado enlevar pelos pro-cessos anátomo-patológicos encontrados em casos descritos como "enxa-queca oftalmoplégica". Com isso estabeleceu-se confusão, uns admitindo dualidade de. patogenia, outros excluindo sumariamente do grupo da enxaqueca oftalmoplégica os casos em que foi encontrado substrato

==15. Costa R o d r i g u e s , T. e C o l l a r e s , J. V . — E n x a q u e c a d i t a ophtalmo-facioplegica. A r c h . B r a s i l . d e M e d i c i n a , 20: 51-71, 1930.

==16. B r o u c h a r d — A c c è s d e m i g r a i n e s i m p l e . P a r a l y s i e d u s p h i n c t e r d e 1'iris et d u m u s c l e c i l i a i r e . J. d e N e u r o l , et d e P s y c h i a t . , 41-47, 1 9 1 1 .

==17. Cit. p o r E h l e r s . H . — O n t h e p a t h o g e n e s i s of t h e o p h t h a l m o p l e g i c m i g r a i n e . A c t a P s y c h i a t . et N e u r o l , 218-225, 1928-1929.

==18. G a r e i s o A . e R a s c o v s k y A . — S o b r e tin caso d c j a q u e c a o f t a l m o p l é g i c a ( C h a r c o t ) . A r c h . A r g e n t , d e P e d i a t . , 11: 9-21, 1939.

==19. Wilson, S. A. K. — Neurology. Williams a. Wilkins Co., Baltimore, 1940, pág. 1580.

==20. S t r ü m p e l l , A . — T r a t t a t o di patologia speciale m e d i c a e t e r a p i a . T r a d , i t a l i a n a . E d . V a l l a r d i , M i l a n o , 1928. V o l . I I , p a r t e I I , p á g . 86.

= = 2 1 . D e j e r i n e , J . — Sémiologie des a f f e c t i o n s d u s y s t è m e n e r v e u x . M a s s o n et Cie, 1926, p á g . 1150.

= = 2 2 . A d r o g u é , E- — N e u r o l o g í a o c u l a r . E l A t e n e o , B u e n o s A i r e s , pág:. 128.

= = 2 3 . B a r r a q u e r . G i s p e r t e C a s t a ñ e r — T r a t a d o d e e n f e r m e d a d e s n e r v i o s a s . S a l v a t E d i t . , B a r c e l o n a , 1940, p á g s . 181-182.

==24. C u r s h m a n n , H . e K r a m e r , F . — T r a t a d o d e l a s e n f e r m e d a d e s del s i s t e m a n e r v i o s o . T r a d , e s p a n h o l a , L a b o r E d i t . , B a r c e l o n a , 1932, p á g . 762.

(4)

anatômico para a oftalmolegia e, outros ainda, generalizando a natureza sintomática da oftalmoplegia para todos os casos.

Somos inteiramente favoráveis às idéias de Btirki, separando as falsas das verdadeiras enxaquecas oftalmoplégicas. Aquelas são sín-dromes secundárias a processos locais da base do crânio e sua patogenia é facilmente explicada; estas devem ter sua origem ligada aos fatores patogênicos da própria enxaqueca.

Entre muitas, a teoria angiospástica da crise da enxaqueca, já en-trevista por Dubois-Reymond ( 1 8 6 0 ) , é a mais aceita. Esta crise dependeria de distúrbios da vasomotricidade cerebral, seja em conse-qüência de fenômenos alérgicos, seja como manifestações de desordens cerebrais intrínsecas, decorrentes de fatores transmitidos hereditària-mente e traduzidos eletrencefalogràficahereditària-mente por disritmias análogas às da epilepsia. O cortejo sintomático da crise de enxaqueca, incluindo escotomas, hemianopsias passageiras, hemiparesias ou hemianestesias fugazes, parafasias ou afasias transitórias, peculiares aos distúrbios vasomotores corticais do cérebro, constituem argumento básico para aqueles que os consideram fator causai.

O mesmo conceito, por extensão, tem sido aventado por vários au-tores, procurando explicar o mecanismo da oftalmoplegia subseqüente à crise de enxaqueca. Assim, desde Charcot, consideram-na como dependente de angiospasmo e anoxia, ao nível dos núcleos do III par craniano, no pedúnculo cerebral, ou, talvez, no próprio tronco nervoso.

A s observações de Bogaert, Helsmooertel e Bauwens 2 6

, bem como de

Matzdorff 2 7

, assinalando, no mesmo paciente, crises de angiospasmos cerebrais, de enxaqueca oftálmica, de epilepsia, de distúrbios vertiginosos do tipo labiríntico, seriam argumentos a favor deste ponto de vista.

Fazendo um parêntese, lembremos que Ehlers 1 7

, pelo contrário, vê na vasodilatação paralitica, pós-espasmo inicial, por ação direta da artéria cerebral posterior sobre o tronco do nervo motor ocular comum, o fator compressivo determinante da paralisia. O nervo motor ocular externo, em virtude de sua menor proximidade da artéria, seria atingido com menor freqüência.

Foster-Kennedy 1 1

, que vem defendendo, desde 1931, a teoria de que a enxaqueca tem por causa um edema intracraniano localizado, explica a oftalmoplegia como dependente da ação compressiva reiterada do parênquima cerebral edemaciado, sobre o próprio tronco nervoso.

==26. V a n B o g a e r t . L . , H e l s m o o e r t e l , J . e B a u w e n s , L . — V e r t i g e s d e M é n i è r e , m i g r a i n e o p h t a l m i q u e , m i g r a i n e o p h t a l m o p l é g i q u e et a n g i o s p a s m e s c é r é b r a u x . J . B e l g e d e N e u r o l , e t d e P s y c h i a t . , 28: 207-212, 1928.

(5)

Nesta explicação, os distúrbios da vasomotricidade cerebral não figuram como fatores diretos, mas sim indiretos, pelo edema que determinam. O edema, localizado de preferência nas regiões em declive, em parti-cular no lobo temporoccipital, encontrando a firme resistência da tenda do cerebelo e do osso esfenóide, comprime o nervo motor ocular comum aí sediado, acarretando seu bloqueio funcional. A repetição de tal fenômeno, nas crises sucessivas da moléstia, explica muito bem as oftalmoplegias, a princípio fugazes, depois mais duradouras e, por fim, permanentes, por efeito lesivo final sobre o nervo.

É esta, julgamos, a teoria mais condizente com os fatos clínicos. A unilateralidade da oftalmoplegia, sua ipsüateralidade com a hemi-crânia e com os sintomas cerebrais corticais que a acompanham, assim como o caráter freqüentemente total da paralisia do nervo motor ocular comum — comprometimento troncular e não nuclear — são argumentos ponderáveis em favor de sua gênese compressiva e não anóxica.

C A S O 1 — D . G., m a t r i c u l a d a n o S e r v i ç o d e N e u r o l o g i a d a E s c o l a P a u l i s t a de M e d i c i n a , sob n . ° 3 0 3 1 . M o ç a d e 1 6 a n o s de i d a d e , v e m a p r e s e n t a n d o , h á 4 a n o s — 3 a 4 v e z e s p o r a n o — c r i s e s p e r i ó d i c a s d e c e f a l é i a , l o c a l i z a d a n o hemic r â n i o e s q u e r d o , p a r t i hemic u l a r m e n t e n a s r e g i õ e s p e r i o r b i t á r i a e t e m p o r a l , a hemic o m p a n h a -d a s -d e m a l - e s t a r g e r a l , fotofobia, n á u s e a s e v ô m i t o s , a u m e n t a n -d o -d e i n t e n s i -d a -d e p r o g r e s s i v a m e n t e e d e s a p a r e c e n d o , t a m b é m p r o g r e s s i v a m e n t e e d e m o d o c o m p l e t o , c e r c a de 4 a 5 d i a s d e p o i s de seu início. A p r o x i m a d a m e n t e u m a v e z p o r a n o , q u a n d o a s c r i s e s d e cefaléia s ã o p o r d e m a i s v i o l e n t a s , e s s e c o m p l e x o de s i n t o m a s é a c r e s c i d o d e d i s t ú r b i o s o c u l a r e s m a i s i n t e n s o s , d o m e s m o l a d o d a h e m i c r â n i a , c a r a c t e r i z a d o s p o r q u e d a d a p á l p e b r a m a i s o u m e n o s c o m p l e t a , d i p l o p i a e d e s v i o d o g l o b o o c u l a r p a r a f o r a , d i s t ú r b i o s estes q u e se i n i c i a m n a f a s e m a i s i n t e n s a da cefaléia — d o i s a t r ê s d i a s depois de seu a p a r e c i m e n t o — p a r a r e g r e d i r e m e d e s a -p a r e c e r e m , l e n t a m e n t e , e m 1 0 o u 1 5 d i a s . F o r a d a s c r i s e s , a -p a c i e n t e de n a d a se q u e i x a , a p r e s e n t a n d o b o a s a ú d e g e r a l .

N a ú l t i m a c r i s e , q u a n d o a p a c i e n t e foi p o r n ó s e x a m i n a d a ( 3 0 - 8 - 4 7 ) , e s t a n d o j á n o seu o i t a v o dia, a c e f a l é i a d e s a p a r e c e r a , m a s p e r s i s t i a m o s s i n a i s de p a r a l i s i a c o m p l e t a d o m o t o r o c u l a r c o m u m e s q u e r d o ( p t o s e p a l p e b r a l c o m p l e t a , d i p l o p i a , m i d r í a s e c o m r e f l e x o s p u p i l a r e s p r e g u i ç o s o s , e s t r a b i s m o d i v e r g e n t e , p a r a l i s i a d o s r e t o s s u p e r i o r , i n t e r n o e i n f e r i o r ) , n a d a h a v e n d o e m r e l a ç ã o a o s o u t r o s p a r e s c r a n i a n o s . O s s i n t o m a s p a r a l í t i c o s l e n t a m e n t e r e g r e d i r a m e, n o 2 1 . ° dia, a i n d a e s t a v a m p r e s e n t e s , se b e m q u e b a s t a n t e a t e n u a d o s ( f i g . 1 ) , s o m e n t e se e x t i n g u i n d o p o r c o m p l e t o , a o c a b o d e 3 0 d i a s . A p a c i e n t e n u n c a fêz r e f e r ê n c i a a o a p a r e c i -m e n t o de e s c e t o -m a s n a s s u a s c r i s e s . A o e x a -m e d o s d i v e r s o s a p a r e l h o s e d o sistem a n e r v o s o , n a d a sistem a i s se a p u r o u d e a n o r sistem a l . O i n t e r r g a t ó r i o sobre os a n t e c e d e n t e s p e s s o a i s e f a m i l i a r e s n a d a r e v e l o u de i m p o r t â n c i a p a r a o c a s o , n ã o h a v e n d o -r e f e -r ê n c i a s a m a n i f e s t a ç õ e s s e m e l h a n t e s n e m a n e u -r o p s i c o p a t i a s .

F o r a m r e a l i z a d o s e x a m e s s u b s i d i á r i o s — r e a ç õ e s s e r o l ó g i c a s p a r a sífilis, e x a m e d e l i q u o r , c r a n i o g r a m a — q u e a p r e s e n t a r a m r e s u l t a d o s n o r m a i s . E n t r e t a n t o , o

exame cletrencefalográjico ( n . ° 6 5 6 ) d e m o n s t r o u : T r a ç a d o e m c o n d i ç õ e s t é c n i c a s

(6)

d i s r i t m i a s p a r o x í s t i c a s b i l a t e r a i s d i f u s a s , c o m d u r a ç ã o d e 2 a 3 s e g u n d o s , c o m o n d a s d e p o t e n c i a l t r í p l i c e d o de b a s e e f r e q ü ê n c i a de 6 c / s , b e m s í n c r o n a s ( f i g .

2 b). T a i s d i s r i t m i a s se r e p e t i r a m e m v á r i o s o u t r o s s u r t o s , a p ó s a h i p e r p n é i a ,

m e s m o depois de 5 m i n u t o s de r e p o u s o . U m a v e z d e s a p a r e c i d a s , n o v a m e n t e s u r -g i r a m c o m a r e p e t i ç ã o da h i p e r p n é i a . C o n c l u s ã o : E l e l r e n c e f a l o -g r a m a d e b a s e , i r r e g u l a r , c e m t e n d ê n c i a a f r e q ü ê n c i a s l e n t a s e o s c i l a ç õ e s d e p o t e n c i a l d e f r a c a a m p l i t u d e . A p ó s h i p e r p n é i a , a p a r e c i m e n t o de d i s r i t m i a s p a r o x í s t i c a s b i l a t e r a i s difusas, de c u r t a d u r a ç ã o , p o r o n d a s de 6 c / s e p o t e n c i a l de 80 a 100 m i c r o v o l t s .

Fig. 1 — Caso 1 — D. F. —• Paresia dos músculos reto inferior (a), reto superior ( b ) , reto interno (c), com integridade do reto externo (d). Paresia do elevador da palpebra.

(7)
(8)

dessas-c r i s e s foi m u i t o i n t e n s a e se a dessas-c o m p a n h o u d e q u e d a d a p á l p e b r a e s q u e r d a , d e s v i o d o g l o b o o c u l a r p a r a f o r a e d i p l o p i a , s i n t o m a s e s t e s q u e t i v e r a m a d u r a ç ã o d e u m dia. D o i s a n o s depois, n o v a c r i s e s e m e l h a n t e a e s t a ú l t i m a , m a s os s i n t o m a s n e u r o c u l a r e s p e r s i s t i r a m c e r c a d e u m m ê s . D e p o i s d e s t a , o p a c i e n t e v e m a p r e s e n -t a n d o u m a d e s s a s c r i s e s p o r a n o .

Q u a n d o o e x a m i n a m o s ( 1 9 3 4 6 ) , a p r e s e n t a v a d o r d e c a b e ç a — r e g i ã o s u p r a -o r b i t á r i a e s q u e r d a — h á c e r c a d e t r ê s d i a s , a c -o m p a n h a d a d e p a r a l i s i a c -o m p l e t a d -o m o t o r o c u l a r c o m u m e s q u e r d o ( p t o s e p a l p e b r a l , p a r a l i s i a d o s r e t o s s u p e r i o r , i n t e r n o e i n f e r i o r , e s t r a b i s m o d i v e r g e n t e , m i d r í a s e c o m d i m i n u i ç ã o d o s r e f l e x o s p u p i l a r es e d i p l o p i a ) . E s s e s sinais p a r a l í t i c o s só d e s a p a r e c e r a m i n t e g r a l m e n t e d e p o i s d e c e r c a 45 d i a s . N a d a d e a n o r m a l se e v i d e n c i o u e m r e l a ç ã o a o s o u t r o s p a r e s c r a n i a -n o s , b e m c o m o e m r e l a ç ã o a o r e s t a -n t e d o s i s t e m a -n e r v o s o . O e x a m e d o s d i v e r s o s a p a r e l h o s n a d a m o s t r o u d e i m p o r t â n c i a p a r a o c a s o . N o i n t e r r o g a t ó r i o s o b r e os a n t e c e d e n t e s p e s s o a i s e f a m i l i a r e s n ã o h o u v e r e f e r ê n c i a a m a n i f e s t a ç õ e s s e m e l h a n t e s n e m a d i s t ú r b i o s n e u r o - p s i c o p á t i c o s , n e m se a p u r o u q u a l q u e r i n f o r m a ç ã o q u e p u d e s s e s e r r e l a c i o n a d a à p r e s e n t e a f e c ç ã o . F o r a d a s c r i s e s , o p a c i e n t e v o l t a a r e c u p e r a r e s t a d o d e s a ú d e p e r f e i t a m e n t e n o r m a l .

(9)
(10)

C O M E N T Á R I O S

E m ambos os casos apresentados encontramos: 1 — moléstia da juventude; 2 — cefaléia instalando-se sob a forma de crise, acompanha-da de fotofobia, mal-estar geral, náuseas e vômitos; 3 — as crises de cefaléia precederam de 1 e de 4 anos às crises de oftalmoplegia; 4 — o eletrencefalograma revelou disritmias paroxísticas bilaterais e difusas, tais como são assinaladas na epilepsia e na enxaqueca; 5 — a oftalmo-plegia ipsilateral foi, inicialmente, fugaz e, depois, mais duradoura, atingindo mais de 30 dias de duração; 6 — as crises de enxaqueca menos intensas, não se acompanharam de sintomas paralíticos; 7 — a paralisia do motor ocular comum foi total, atingindo as musculaturas extrínseca e intrínseca do globo ocular, sendo sua regressão integral; 8 —• fora das crises, era bom o estado de saúde geral; 9 — durante o período da oftalmoplegia e fora dê!e, nada de anormal revelaram os exames do restante do sistema nervoso e dos demais aparelhos; os exames subsidiários de sangue — reações para sífilis — liquor e craniograma foram inteiramente normais.

Com tais elementos, cremos não haver dúvidas quanto à afirmativa que se tratava de casos de verdadeira enxaqueca, cujas crises reiteradas determinaram a paralisia troncular do motor ocular comum ipsilateral, por compressão; nos períodos de intervalo, fora das crises de enxaqueca, a paralisia entra em regressão, mas, pela repetição daquelas, recidiva e se intensifica.

R E S U M O E C O N C L U S Õ E S

(11)

Baseados nestas duas observações em que crises de enxaquecas (edema cerebral localizado) se seguiram de repetidas paralisias tron-culares do terceiro nervo craniano, ipsilateral, os autores pensam poder concluir favoravelmente à teoria de Foster-Kennedy — compressão do tronco nervoso pelo cérebro edemaciado — e à existência de uma ver-dadeira forma oftalmoplégica da enxaqueca, no sentido de Charcot.

S U M M A R Y A N D C O N C L U S I O N S

T h e authors, going through the literature on ophtalmoplegie mi-graine, point out the difference of opinions concerning its existence or not and its physiopathology. T h e y present t w o cases. Both had a rich symptomatology characterizing the attacks of migraine ( m o r e or less rapid onset of the headache localized to one hemicranium and folowed by neurovegetative signs, vomiting a n d fotofobia). Both cases showed, in the electroencephalogram, bilateral symetrical p a r o -xysmal dysrhythmia indicating a t r u e migraine in patients without epileptic seizures and without an epileptic familial background. T h e ophtalmoplegia usually followed the most severe attacks of headache w i t h total involvement of the third pair, lasting one to thirty or m o r e days.

Based in these t w o cases w h e r e attacks of migraine (localized cerebral oedema) were followed by repetitive troncular palsy of the ipsilateral third pair, the authors think to be able to adopt F o s t e r K e n -nedy's theory (compression of the nervous t r u n k by the oedematous b r a i n ) and to accept the existence of a true ophtalmoplegic form of migraine in the sensus of Charcot.

Referências

Documentos relacionados

Utilizando-se os valores da evapotranspiração de referência (ETo), obtidas pelo tanque Classe A e os valores da evapotranspiração da cultura obtidos através do balanço

Banco Bradesco, Agência 0053-1, C/C 166202-3 em nome da Associação Brasileira de Educação Musical (Em caso de dúvida sobre quitação de anuidades anteriores, consultar a

Este estudo apresentou algumas limitações, como: confirmação do diagnóstico das crianças, pois, nem todas tinham confirmação laboratorial do ZIKV e também não se

Relativamente ao valor padrão da “Galega vulgar” que se situa nos 0,4 (% em ácido oleico), verifica-se que todos os genótipos resultantes de cruzamento

O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, com sete tratamentos, que corresponderam à solução completa e à omissão individual de N, P, K, Ca, Mg e S,

Ainda para esses autores, a pesquisa por questionário é considerada de corte transversal (cross-section) quando só é submetida uma vez para analisar o estado das

Em que pesem as limitações quanto à disponibilidade de informações acerca do mercado de trabalho fora das grandes regiões metropolitanas, a análise da variável censitária sobre