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Mortalidade materna no Brasil, 1980.

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MORTALIDADE MATERNA NO BRASIL, 1980*

Arnaldo Augusto Franco de Siqueira** Ana Cristina d'Andretta Tanaka** Renato Martins Santana**

Pedro Augusto Marcondes de Almeida**

* Trabalho apresentado no I Seminário Nacional de Estudos de Mortalidade Materna, realizado em São Paulo, em outubro de 1984 e agraciado com o Prêmio Aché.

** Do Departamento de Saúde Materno-Infantil da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo - Av. Dr. Arnaldo, 715 - 01255 - São Paulo - SP - Brasil.

SIQUEIRA, A.AF. de et al. Mortalidade materna no Brasil, 1980. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 18:448-65, 1984.

RESUMO: Estudou-se, através de dados oficiais, a mortalidade materna no Brasil, em suas regiões geográficas e em São Paulo (Brasil). Escolheu-se o ano de 1980 por oferecer possibi-lidade de se trabalhar com informações sobre nascimentos verificados naquele ano, divulgados no Censo Demográfico realizado naquele ano. Verificou-se que as principais causas de óbito por causas maternas no Brasil, pela ordem, são os estados hipertensivos, as hemorragias, as infecções puerperais, seguidas do aborto. Para São Paulo, onde se dispôs do 4.o digito da

Clas-sificação Internacional de Doenças, a primeira causa de óbito materno foi a eclâmpsia, a se-gunda as hemorragias e a terceira as infecções, quer próprias ou associadas à gravidez. Quan-to à idade, pode-se observar que o menor coeficiente de mortalidade materna ocorreu na faixa etária de 20 a 29 anos, sendo um pouco maior nas idades de 15 a 19 anos e aumentando gra-dativamente nas idades de 30 a 39 anos e 40 a 49 anos. Cabe ressaltar que não foi possível analisar este coeficiente para as faixas de 10 a 14 anos e de 50 e mais, por falta de dados sobre nascidos vivos, porém ocorreram 18 e 4 óbitos respectivamente nestas faixas, o que mostrou que nos extremos do período reprodutivo existe contingente não desprezível de mor-tes maternas. Estas mulheres deveriam, pelas suas condições, merecer melhor assistência de saúde, evitando-se perdas desnecessárias de vida, principalmente as adolescentes que não são até o momento contempladas por ações de saúde nos programas ora vigentes. Ao se compa-rar estes dados com os de outros países pôde-se observar que a maioria dos óbitos por complica-ções de gravidez, parto e puerpério são evitáveis e que seria possível reduzi-los de maneira con-siderável por meio de melhor assistência à mulher, com a utilização de técnicas e recursos dis-poníveis em nosso meio.

UNITERMOS: Mortalidade Materna. Risco gravídico. Saúde Materno-Infantil.

INTRODUÇÃO A mortalidade materna é um indicador

específico da mais alta relevância em saúde materno-infantil. Interferem nessa mortali-dade desde aspectos considerados biológi-cos da reprodução humana, como as doen-ças próprias e associadas à gravidez, até ca-racterísticas da própria população e da uti-lização de serviços de saúde como o aces-so/freqüência ao pré-natal, proporção de partos hospitalares, qualidade da assistên-cia ao parto, freqüênassistên-cia de abortos provo-cados, e outras. Dá, assim, uma visão muito clara de como está ocorrendo o processo reprodutivo e dos problemas/distorções/a-gravos/anormalidades que estão se dando

nesse processo e que têm como resultado final o óbito materno. Permite também apreciar, através, por exemplo, do estudo das causas de morte materna, qual o setor da assistência de saúde que deva receber uma atenção em nível prioritário. Ciari Jr. e Almeida2, entre outros, chamaram a aten-ção para o fato, ao mostrar como a morta-lidade por toxemia situa o problema a ní-vel de assistência pré-natal, ou como uma excessiva mortalidade por hemorragia leva a problemática mais para o âmbito da assis-tência hospitalar ao parto.

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mortalidade por aborto e aquela decorrente da própria utilização inadequada dos ser-viços (ou de existência de serser-viços inade-quados), a mortalidade materna transcende sua especialidade e chega a ser, à semelhan-ça do que ocorre com a mortalidade in-fantil, um indicador de condições de vida mais do que de saúde.

O coeficiente de mortalidade materna, definido pela relação:

apresenta, para a sua elaboração, dificulda-des quer no numerador (muitas mortes ma-ternas não chegam a ser classificadas como tal), quer no denominador, devido princi-palmente ao sub-registro de nascimentos. Em países periféricos, como é o caso do Brasil, avultam esses problemas, que acabam afetando a qualidade da informa-ção e a precisão dos coeficientes11.

Talvez pelo fato de ser calculado com base no número de nascidos vivos, como também é o caso da mortalidade infantil, e pelo fato de ser incomparavelmente me-nor do que esta última (em São Paulo, em 1981, enquanto a mortalidade infantil era 51,1%o n.v., a materna era 0,53%o n.v.), não se costume dar tanta relevância, em nosso meio, ao problema da mortalidade materna.*

Quando se comparam, porém, os valo-res de nossa mortalidade materna e infantil, com os de países ditos centrais, verifica-se que, se a nossa mortalidade infantil é várias vezes maior que a desses países, a mortali-dade materna é igualmente mais elevada. A Tabela 1 mostra os valores da mortali-dade materna e infantil para alguns países ditos desenvolvidos, no ano de 19782.

Comparando com os dados da Tabela 1, a mortalidade infantil de São Paulo, em 1981, foi 3,5 vezes maior que a dos Esta-dos UniEsta-dos, em 1978, e 6,5 vezes maior que a da Suécia. A mortalidade materna de São Paulo, em 1981, foi 4,5 vezes maior que a da Inglaterra e Gales e 8 vezes maior que a da Escócia, Suécia e Austrália.

Apesar, pois, dos números pequenos, a situação de saúde materna (medida pela mortalidade) em São Paulo é pior do que a situação de saúde infantil quando compa-rada com a de países ditos desenvolvidos. Para o Brasil, a situação deve ser ainda pior, apesar de faltarem estudos recentes a esse respeito.

Puffer e Griffith11, ao analisar dados do Estudo Interamericano de Mortalidade, mostraram, para o município de São Paulo, um coeficiente de mortalidade materna 8,7%oo n.v., valor muito alto quando com-parado com Bristol (1,8%oo n.v.) ou San Francisco (1,1%oo n.v.). Além disso, para uma mortalidade materna real de 8,7%oo n.v., para São Paulo, as estatísticas oficiais apontavam apenas 5,7%oo n.v. Em núme-ros absolutos, enquanto em São Paulo ocorreram, de 1962 a 1964, cerca de 260 óbitos maternos, nesse mesmo período

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continuação

Fonte: * Ministério da Saúde10 , CIS/SEADE.

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houve apenas um óbito materno em San Francisco e 2 em Bristol. Apesar da dife-rença de populações entre estas cidades e São Paulo, aqui os óbitos maternos con-tam-se às centenas e nessas outras cidades às unidades.

Com a publicação, em 1983, de estatís-ticas de mortalidade para o Brasil10, refe-rentes ao ano de 1980 e com a divulgação das tabulações avançadas do Censo de 19805, tornou-se viável um estudo sobre a mortalidade materna no Brasil.

MATERIAL E MÉTODOS

Material

1 — Os dados referentes aos óbitos maternos foram obtidos da publicação "Estatística de Mortalidade - Brasil 1980"10, que traz uma lista de óbitos por causa, sexo e idade ao morrer, para o Brasil e para os Estados e Territórios e suas capitais.

As causas de morte, segundo essa publica-ção, foram apresentadas segundo a 9.a Revi-são da Classificação Internacional de Doen-ças (CID)9.

Neste estudo, algumas das causas de óbito do capítulo foram reagrupadas em 4 grandes grupos, a saber: Hipertensão, Hemorragia, Aborto e Infecção Puerperal.

Para o Estado de São Paulo foram utiliza-dos dautiliza-dos do Centro de Informação de Saú-de da Fundação Sistema Estadual Saú-de Análise de Dados (CIS/SEADE) com a finalidade de melhor distribuir as causas de óbitos, dado que este centro utiliza o 49 dígito na codifi-cação das causas de morte materna.

Os óbitos maternos, além de serem dis-tribuídos por causas, também o foram se-gundo a idade e o Estado ou regiões geográfi-cas do Brasil.

2. Para a obtenção do número de nasci-dos vivos foram utilizanasci-dos danasci-dos de duas fon-tes:

2.1. Anuário Estatístico do Brasil que apresenta, para o ano de 19801, por Estados, capitais, regiões (e para o Brasil como um to-do) o número de nascidos vivos registrados no ano e o número de nascidos no ano de 1980 e registrados nesse mesmo ano.

2.2. As tabulações avançadas do Censo de 19805, que trazem informação sobre nasci-mentos vivos ocorridos no ano anterior ao Censo, por idade da mãe, Estado e para o país.

Métodos

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de São Paulo (Tabelas 2 a 5).

De posse dos dados referentes a óbitos maternos referidos na Estatística de Mortali-dade: Brasil10, 1980, e a nascidos vivos, fo-ram calculados coeficientes de mortalidade materna para os Estados, regiões e o país, segundo os diferentes números de nascidos vivos disponíveis e o cálculo aproximado de óbitos maternos (Tabela 6).

Essa estimativa foi realizada por Becker, um dos responsáveis pela confecção do tra-balho "Estatística de Mortalidade - Brasil 1980"10, que serviu de fonte para este estu-do, da seguinte forma:

Para cada região do Brasil foram somadas as populações dos municípios cujos óbitos foram incluídos no referido trabalho. A partir dessa população, estimou-se o núme-ro pnúme-rovável de óbitos caso todos os municí-pios tivessem enviado regularmente as esta-tísticas de mortalidade.

Desse total estimado de óbitos foram cal-culados os óbitos por causas maternas, a partir da proporção entre esses e o total de óbitos por causas definidas incluídos no re-ferido estudo10.

É evidente que tal procedimento pode estar introduzindo um viés nessa estimativa. É provável que os municípios que não en-viem regularmente informações sejam dife-rentes dos que o fazem. E também possí-vel que as proporções de óbitos maternos nesses dois tipos de municípios também se-jam diferentes. É inegável, porém, que esse número estimado está mais próximo do real do que os registrados no trabalho do Minis-tério da Saúde referentes no geral, a 75% dos óbitos do Brasil, mas com proporções muito diferentes segundo as regiões10.

Não foi por outra razão que na introdu-ção do trabalho, já referido , esteja reco-mendado: "Pelos problemas expostos não é recomendável o cálculo de coeficientes que usem população como denominador. . ."; na nossa opinião, desde que estes problemas sejam devidamente ressalvados, é perfeita-mente válido utilizar esses dados para con-feccionar coeficientes que de outra maneira nunca poderiam ter sido elaborados.

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mortalidade segundo a idade da mãe (Tabe-las 7 a 13).

RESULTADO E DISCUSSÃO São poucos os trabalhos em nosso meio que têm procurado estudar a mortalidade materna. Na maioria das vezes constituem descrições de mortalidade em hospitais e serviços de obstetrícia.

Ciari Jr. e Almeida1 descreveram, em 1972, importantes aspectos da mortalidade materna no município de Osasco. Guimarães e col6, em 1979, estudando a mortalidade de adultos residentes na Capital do Estado de São Paulo (e outros municípios), verifica-ram que a mortalidade por causas maternas em São Paulo, em 1974/1975, era de 15,6%oo n.v. As principais causas de morte foram: aborto (25%), toxemias (21,88%) e infec-ções do parto e puerpério (21,88%).

Souza 13, em 1982, estudou as mortes maternas ocorridas em hospitais de Floria-nópolis, verificando a importância do abor-to e da infecção como causas de óbiabor-to nesse grupo.

A Tabela 2 mostra as mortes maternas por tipo de causa para o Brasil e Estado de São Paulo, em 1980.

Verificou-se que os estados hipertensivos na gravidez foram o principal grupo de cau-sas de morte materna. Aí estão incluídas desde as toxemias (pré-eclâmpsia e as eclâmp-sias), as hipertensões pré-existentes, a toxe-mia sobreposta à hipertensão prévia e, tam-bém, as hipertensões transitórias da gravi-dez. Assim, 29,56% ou quase um terço dos óbitos maternos se devem a estados hiper-tensivos.

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porém, que o controle de hipertensão na gra-videz deva ser feito preponderantemente a nível de assistência pré-natal.

A Tabela 3 mostrou, para São Paulo, que a quase totalidade desses óbitos deveu-se à eclâmpsia e pré-eclâmpsia, 89,6% das causas hipertensivas.

Mesmo reconhecendo as dificuldades para distinguir a toxemia das outras formas de hipertensão e considerando também que essa proporção verificada em São Paulo possa não ser representativa do Brasil, é inegável que a grande maioria das mortes por hipertensão deve-se à toxemia. Assim, sendo os estados hipertensivos a principal causa de morte ma-terna, pode-se dizer que, mesmo não consi-derando eventuais distorções em outros setores, o setor da assistência pré-natal tem baixa eficácia no controle desses casos. O segundo grupo de causas de morte ma-terna no Brasil é constituído pelas hemorra-gias (20,42% das mortes), seja do início da gravidez, seja ante-partum, descolamento prematuro da placenta, placenta prévia, ou hemorragias pós-parto.

Apesar da maior proporção de mortes ser por hipertensão, é grande o número de óbi-tos por hemorragia. Como os paróbi-tos são, na sua grande maioria, hospitalares, e como a quase totalidade dos óbitos por hemorragias ocorrem no período ante-partum, no parto ou no pós-parto (apenas 3 dentre os 521 óbi-tos nesse grupo foram por hemorragias do inicio da gravidez), deve-se buscar, como propuseram Ciari Jr. e Almeida1, na assistên-cia hospitalar ao parto o principal responsá-vel por essa mortalidade. É justo considerar que a demora da paciente em procurar o hos-pital possa ser, entre outros, um importante fator dessa mortalidade; poder-se-ia também atribuir às falhas do pré-natal em identificar casos de inserção baixa de placenta, parte dessa situação. No entanto, é o mau funcio-namento (ou mesmo a inexistência) dos ser-viços de hemoterapia das maternidades o fator preponderante. Aliás, Karchmer8 mos-trou, no México, que dos óbitos maternos previsíveis, em mais de 2/3 dos casos a res-ponsabilidade era profissional ou da institui-ção.

O número de mortes por hemorragia po-deria ser ainda maior, caso fossem aqui com-putados parte dos óbitos maternos classifica-dos nas categorias 633 a 638 (abortos), 639 (complicação conseqüentes ao aborto e à gravidez ectópica e molar) e 665 (rotura ute-rina, laceração de colo uterino, laceração va-ginal alta) em que a hemorragia é, muitas ve-zes, o fator decisivo para o óbito.

Em São Paulo, em 1980, as mortes por hemorragias (Tabela 4) puderam ser melhor estudadas.

Assim, aos 66 óbitos maternos classifica-dos nas categorias 640, 641 e 666, foi pos-sível acrescentar outros 7 casos, equivalentes a um acréscimo de 10%, classificados como gravidez ectópica (categoria 633.9, com 5 casos) e rotura uterina (665.1, com 2 casos). Não foi possível conhecer quantas mortes por abortos foram devidas a hemorragias. Em São Paulo, apenas 9 dos 53 casos de aborto se devem a causas pouco especifica-das (em que o quarto dígito é 9). Os demais são abortos complicados por infecção. No Brasil, a terceira causa mais importante de óbito materno foi a infecção puerperal, com 270 óbitos (10,58%). Nesta categoria (670) não são incluídas as infecções conse-qüentes a abortos, que fazem parte da cate-goria 639, juntamente com outras complica-ções de abortos e da prenhez ectópica e mo-lar. Também não estão aí incluídas as infec-ções do trato geniturinário na gravidez, que fazem parte da categoria 646 (juntamente com outras causas), bem como outras infec-ções específicas ou não especificadas, incluí-das nas categorias 647,658 e 659.

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5,79% para 18,64% do total.

Vê-se, pois, que cerca de 60% dos óbitos assim agrupados devem-se a infecções conse-qüentes a abortos.

O aborto (categorias 632 a 638) aparece como a 4.a principal causa de morte mater-na, com 220 casos (8,62%). Parte dos 65 ca-sos classificados na categoria 639 (complica-ções do aborto e prenhez ectópica e molar) são também complicações de abortos.

Puffer e Griffith11, mostraram que para São Paulo, muitos casos em que a causa bá-sica era o aborto, nas estatísticas oficiais eram classificados ou como outras causas maternas ou como causas não-maternas. Além das falhas no preenchimento correto dos atestados de óbito, é evidente que, sen-do o aborto provocasen-do um procedimento criminoso na maioria dos países latino-ame-ricanos, na época, a sua não inclusão como causa de óbito foi intencional em grande par-te dos casos. O aborto provocado continua sendo crime perante a legislação brasileira, em que pesem as propostas de mudança que estão discutidas em diferentes segmentos da sociedade.

Acredita-se, assim, que o número de mor-tes maternas, por aborto, apresentado no trabalho que serviu de base para este estudo esteja abaixo do real. Em sua tese, Souza13 mostrou que nos hospitais de Florianópolis o número real de mortes maternas por abor-to é maior do que o das estatísticas oficiais. Quando os óbitos por infecção e por abor-to preponderam na mortalidade materna, deve-se procurar a responsabilidade, de acor-do com Ciari Jr. e Almeida1, nas caracterís-ticas sócio-econômico-culturais da popula-ção, o que é bastante plausível. A letalidade por aborto provocado depende tanto das condições técnicas em que o aborto é reali-zado quanto das condições de saúde da mu-lher.

O aparecimento de mortes por aborto numa comunidade deve levar, segundo Ciari Jr. e Almeida1, à procura e identificação da atividade criminosa de curiosas.

Quanto às mortes por infecção, especial-mente quando consideradas em um âmbito maior que o da categoria 670, estão também

relacionadas à prática do aborto criminoso. Outros fatores, especialmente os institucio-nais, relacionados à qualidade da assistência hospitalar à gestante, também são muito im-portantes. Dentre eles merece menção a contaminação das salas de admissão, salas de parto e enfermarias de puérperas, espe-cialmente quando não são tomadas medidas administrativas sobre a assistência à gestante com aborto infectado. Assim, a infecção in-tra-hospitalar, que ganha cada vez maior im-portância para toda a clientela do hospital tem, no caso da assistência materna, fatores agravantes que não podem ser ignorados. Rochat12, em 1981, fez um estudo sobre a mortalidade materna nos Estados Unidos. Assim, no período 1968/75, as principais causas de morte foram:

a) as relacionadas a gestação com termi-nação abortiva (aborto induzido e prenhez ectópica): 22,7%

b) complicações da gravidez: 27,4% c) complicações do parto: 25,2% d) complicações do puerpério: 24,8% Dos óbitos por complicação da gravidez, dois terços deveram-se a condições ligadas à toxemia.

A principal complicação do parto foi a hemorragia por descolamento prematuro de placenta, placenta retida, rotura uterina ou hemorragia pós-parto. No puerpério as prin-cipais causas são os embolismos, a infecção, flebites, trombose e hemorragia cerebral. No Brasil, as demais categorias de causas listadas na Tabela 2 aparecem com um nú-mero apreciável de óbitos: a 665 (que inclui os casos de roturas uterinas), a 661 (as dis-tócias funcionais), a 671 (onde estão situa-dos os transtornos cérebro-vasculares), a em-bolia pulmonar obstétrica (673). Aparecem ainda o sofrimento fetal (incluído na cate-goria 656) e a gravidez ectópica (633). Do exame da Tabela 2 depreende-se que, como nos Estados Unidos, a hipertensão, o aborto, as hemorragias e a infecção são as principais causas de morte materna no Brasil e em São Paulo.

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Para a construção do coeficiente de mor-talidade materna (CMM) uma dificuldade muito grande, em muitos países, inclusive o Brasil, refere-se à precisão do número de nascidos vivos, bem como do número de óbitos por causas maternas.

A Tabela 6 mostra, para o Brasil, Estados e regiões, os respectivos coeficientes de mor-talidade materna, conforme sejam calculados tomando como base o número de nascimen-tos registrados no ano, os nascimennascimen-tos do ano registrados no ano ou o número "real" de nascimentos.

Assim, o número total de nascimentos registrados em 1980, no Brasil, foi de 5.336.564, e o de nascimentos do ano regis-trados no ano foi de 2.769.486; vê-se que seu valor é quase o dobro do outro. A morta-lidade materna assume valores, respectiva-mente, de 4,8 e 9,2 óbitos por dez mil nas-cidos vivos.

Neste trabalho considerou-se como o nú-mero real de nascimentos o obtido pelo Cen-so de 19805, uma vez que é certamente o número mais próximo possível do real.

Trabalhando com esses números, tem-se que aceitar uma imprecisão dada pelo fato de o Censo informar os nascimentos ocorri-dos de setembro de 1979 a agosto de 1980, e tomar esses valores como equivalentes aos nascimentos de janeiro a dezembro de 1980. Essa imprecisão é certamente muito menor que escolher qualquer das duas alternativas anteriores.

A mortalidade materna para o Brasil, em 1980, assim calculada, atingiu a 7,0 óbitos por 10.000 nascidos vivos. Essa mortalidade é cerca de 10 vezes maior que a verificada em países como Austrália, Escócia, Suécia e 5 vezes maior que a dos Estados Unidos. Se se levar em conta o sub-registro de óbitos maternos, já comentado por Puffer e Griffith11, bem como o fato de o Ministé-rio da Saúde ter apresentado apenas 75% dos óbitos gerais ocorridos no Brasil em 198010, depreende-se que a mortalidade materna em nosso país está ao redor de 15 óbitos por 10.000 n.v., como pode ser vis-to na Tabela 6, o que vis-torna a diferença com países centrais ainda mais evidente. Assim, se

são as mesmas as causas de óbito aqui ou nos Estados Unidos, como foi visto no trabalho de Rochat12, é inegável que a busca dos de-terminantes dessa mortalidade poderá enri-quecer sobremaneira a compreensão sobre tão grave problema.

Apesar disto, pode-se observar naquela Tabela que o coeficiente de mortalidade ma-terna é muito elevado na região Norte e mais ou menos semelhante nas regiões Sudeste, Sul e Centro Oeste. O menor coeficiente ve-rificado quando não corrigido na região Nor-deste deve-se, seguramente, ao sub-registro de óbitos e também à má qualidade de infor-mações no atestado de óbito, no qual o esta-do gravídico sequer é mencionaesta-do. Após cor-reção, a região Nordeste passa a ter o segun-do coeficiente mais elevasegun-do segun-do país, e ainda assim, deve estar subestimado.

Quanto à idade, o menor coeficiente de mortalidade materna foi o correspondente, no Brasil como um todo (todas as regiões geográficas), à faixa etária 20 a 29 anos (Ta-bela 7). Para mulheres de 15 a 19 anos o coe-ficiente, se bem que maior que o anterior, foi menor que para mulheres de 30 a 39 anos e o destas menor que o de mulheres de 40 a 49 anos. Assim, as idades mais favoráveis, isto é, de menor risco dentro do período re-produtivo feminino, são as compreendidas entre 15 e 29 anos.

Não foi possível calcular a mortalidade materna para mulheres de 10 a 14 anos por faltarem informações sobre nascimentos nessas idades. Quanto às mulheres de 50 anos e mais, o pequeno número de mortes registradas não permite uma análise adequa-da.

Ao comparar estes dados com os dos Es-tados Unidos, no período de 1968 a 1975, observa-se qua a tendência de óbito por ida-de é semelhante à do Brasil, sendo mais ele-vada nas idades maiores, decrescendo até a idade de 20 a 24 anos e sendo novamente maior que esta nas idades de 15 a 19 anos. Porém, os coeficientes são várias vezes me-nores, em cada faixa de idade, que os aqui apresentados12.

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8 a 13 que as 4 primeiras causas de óbitos são as mesmas porém variando de posição conforme a faixa etária.

As mulheres de 10 a 14 anos (Tabela 8), têm como primeira causa de óbito as hiper-tensões seguidas de infecção puerperal e de-pois por aborto.

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hiper-tensão, a segunda as hemorragias, a terceira a infecção puerperal e a quarta abortos, com um CMM de 4,79%oo n.v. (Tabela 10). Para as mulheres de 30 a 39 anos as prin-cipais causas são as hemorrágicas, seguidas de hipertensão, aborto e infecção puerperal, com um CMM de 10,13%oo n.v. (Tabela 11).

A Tabela 12 mostra que as causas de óbi-tos maternos nas idades de 40 a 49 anos, por ordem, são hemorragias, hipertensão, infec-ção puerperal e abortos, tendo um CMM de 16,32%oo n.v. Finalmente, nas idades de 50 anos e mais (Tabela 13) aparecem ape-nas 4 óbitos, cada qual em um grupo de causas, o que torna difícil uma melhor análi-se, apenas indicando que há um contingente de mulheres que ainda engravidam no fi-nal da idade reprodutiva, merecendo este fato uma melhor assistência por parte dos serviços de saúde.

Do estudo das mortes maternas por idade, chama a atenção a ocorrência de mortes ma-ternas em meninas de 10 a 14 anos. Apesar de não ter sido possível calcular coeficientes, o fato revela a necessidade de melhor assistir esse grupo populacional, quase sempre ex-cluído das preocupações dos programas de saúde existentes.

Vale a pena ainda salientar que o risco de morrer em mulheres acima de 40 anos é cer-ca de 4 vezes maior do que o que se verificer-ca em mulheres de 20 a 29 anos.

Do exposto, ficou patente a relevância do problema da mortalidade materna no Brasil. Além de ser muito elevada se comparada a de países desenvolvidos, o estudo das princi-pais causas de morte permite supor que são óbitos em sua maioria preveníveis, como já mostraram, por exemplo, Karchmer e col.8 , no México.

É possível prever que, através da melhoria da assistência à mulher, nas diferentes fases do ciclo reprodutivo, esse quadro possa ser modificado, com a melhor utilização de re-cursos e conhecimento de há muito disponí-veis.

CONCLUSÕES

1. O Brasil apresenta um alto coeficiente de mortalidade materna se comparado ao de países desenvolvidos.

2. As principais causas de óbitos por cau-sas maternas em nosso meio, por ordem são: causas hipertensivas, hemorrágicas, infec-ções puerperais e aborto.

3. A mortalidade materna pode ser anali-sada com muito maior propriedade se os óbi-tos forem classificados até o 4.o dígito da CID.

4. Para São Paulo a primeira causa de óbito foi a eclâmpsia, seguida das hemorra-gias e das infecções, quer próprias ou associa-das à gravidez.

5. Utilizando dados oficiais, pode-se obter coeficientes de mortalidade materna tão diferentes como 4,8%oo n.v., 9,2%oo n.v. ou 7,0%oo n.v. e, se corrigidos, 15%oo n.v., conforme os valores utilizados

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SIQUEIRA, A.A.F. de et al. [Maternal mortality in Brazil, 1980]. Rev. Saúde públ., S. Paulo,

18:448-65,1984.

ABSTRACT: Brazilian maternal mortality is studied on the basis of official statistics from the country's various geographical regions, including especially the State of S. Paulo (Brazil). 1980 was chosen because of the possibility of working with data from the Population Census of that year. The principal causes of death in Brazil were found to be, in the following order: hypertensive states, haemorrhage, puerperal infections and abortion. In S. Paulo, where the fourth digit of the IDC is used, the first cause of death was eclampsia. The second was hae-morrhage and the third the infections, whether due to or associated with pregnancy. As for age, one observed that the lowest maternal mortality rate occurred in the 20 to 29-year-old age group, the rate for 15-19 being slightly higher and increasing gradually in the age groups 30-39 and 40-49 years of age. It must be stated that it was not possible to analyse the rates for the 10 to 14 and over 50 age groups because of the lack of data on livebirths. However, there were 18 and 4 deaths respectively in those two groups which shows that at the extreme li-mits of the reproductive age there exists a not inconsiderable loss of life, mainly in the case of girls (adolescents) who are not taken into consideration at the present time in the pre-vailing health programs. On comparing these data with those of other countries it was found that the majority of deaths are avoidable and that it should be possible to reduce the num-ber considerably by means of better assistance to women, and by the use of the techniques and resources which are already available.

UNITERMS: Maternal mortality. Maternal health services. Pregnancy risk.

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Referências

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