Poucosdefensoresdeummodelodedemocraciadelibera- tivooucomunicativoafirmariamqueeleseaplicaprimor- dialmenteasituaçõesemqueaspessoasestãomutuamen-tepresentesnummesmoespaçoeporumadeterminada ocasiãoparasedefrontarefalardiretamente.Noentanto, tantonateoriaquantonapráticaháumatendênciaaasso-ciar processos democráticos comunicativos a interações face-a-face.Querassumamqueacircunstânciadadiscussão democráticatenhalugarnumasessãoparlamentarounum encontrodeumgrupodecidadãos,essesdefensoresgeral-menteacabamporrepresentaroprocessodecomunicação democráticacomocentradoemalgumespaçoondeospar-ticipantesestãomutuamentepresentes.
Uma democracia forte certamente requer diversas
ocasiõesemqueautoridadespúblicasecidadãosseencon-MINORIAS
IrisMarionYoung
140
tremparadiscutirdeterminadasexperiênciasequestões. Noentanto,teorizarademocraciacomoumprocessode comunicaçãoquevisachegaradecisõesnãocondizsufi- cientementecomanecessidadedeconceitualizarademo-cracia descentralizada das grandes sociedades de massa. Numasociedadecomplexaecommuitosmilhõesdepes-soasacomunicaçãodemocráticaconsisteemdiscussõese decisõesfluidas,sobrepostasedivergentes,dispersastanto noespaçocomonotempo.Oquesãorelaçõescomunica-tivasinclusivasemtaissociedadesfluidas,descentralizadas, demassa?
Nocontextodessassociedadessãomuitofreqüentesas queixasqueapontamocaráterexcludentedasnormasde representação.Aspessoasmuitasvezesreclamamqueos grupossociaisdosquaisfazemparteoucomosquaistêm afinidade não são devidamente representados nos orga-nismosinfluentesdediscussõesetomadasdedecisão,tais comolegislaturas,comissõeseconselhos,assimcomonas respectivas coberturas dos meios de comunicação. Essas demandasevidenciamquenumasociedadeamplaecom muitas questões complexas os representantes formais e informais canalizam a influência que as pessoas podem exercer.
141
mulheresnassuaslistasdecandidatos2.Nospaísesquenãocontamcomtaisdispositivosécrescenteamobilizaçãodas mulherespelaadoçãodemedidasnessesentido,aopasso quediversospartidostêmreconhecidoquesuaslistasnão sãodevidamenterepresentativassemumacertaproporção decandidaturasfemininas,aindaquealeinãooexija.
NosEstadosUnidosestãoemcursodiscussõessimilares acercadarepresentaçãoespecíficademinoriasraciaisou étnicas.Debatem-sepropostasdedistritoseleitoraisoupro-cessosdevotaçãoajustadosparaaumentaraprobabilidade deeleiçãodecandidatosafro-americanosoulatino-america- nos.Tantoaidéiaquantoapráticadepromoverarepresen-taçãoespecíficademinoriassãocontroversas,masaquestão jáestádefinitivamenteincorporadaàagendapúblicanor-te-americana.Muitosoutrospaísespossuemoudiscutem esquemasderepresentaçãodegrupossociaisespecíficos, naformadeconselhoscorporativos,cadeirasparlamentares reservadas,regrasparalistaspartidárias,comissõesetc.
Noentanto,aspolíticas,aspropostaseosargumentos acercadarepresentaçãoespecialdegrupossãoalvodemuitas objeções.Umadelas,particularmenterelevante,presumeum posicionamentoqueensejadiferençassociaisemvezderedu-zi-las.Segundoessaobjeção,aidéiaderepresentaçãoespecial assumequeumgrupodemulheres,oudeafro-americanos,de maoris,demuçulmanos,depessoassurdas,temumconjunto deatributoseinteressescomunsquepodeserrepresentado,o quenamaioriadasvezesnãoseriaverdadeiro.
Diferençasderaçaedeclasseperpassamogênero,dife-rençasdegêneroeetniaperpassamareligiãoeassimpor diante.Osmembrosdeumgrupodegênero,racialetc.têm históriasdevidaqueostornammuitodiferentesentresi,com
142
cos.Assim,oprocessounificadorrequeridopelarepresenta- çãodegruposbuscariacongelarrelaçõesfluidasnumaidenti-dadeunificada,oquepoderecriarexclusõesopressivas3.
Essaobjeçãoapolíticasepropostasderepresentação especialdegrupos,quedeoutraformatendemaserexclu-ídosdasdiscussõesedeliberações,convergeparaascríticas àlógicaidentitáriaanalisadaspormimalhures4 .Numaver-sãodessacrítica,nenhumrepresentanteúnicopoderiafalar porqualquergrupo,jáqueosindivíduosqueocompõem mantêm relacionamentos por demais entrecruzados. No entanto,asdemandasporrepresentaçãoespecialdegrupos marginalizadosnãoparecemserafetadasporessascríticas, poisnocontextodasdisputaspráticasmuitosacreditamque taismedidassãoamelhorformadedarvozamuitasques-tões,análiseseposiçõesinjustamenteexcluídas.
Busca-seaquiesclarecerosignificadodarepresentaçãode gruposeoferecerargumentosadicionaisàidéiadequetais práticasrepresentativasdiferenciadassãoumimportanteins-trumentodeinclusãopolítica.Asdúvidassobreessaspráticas empartesedevemamal-entendidossobreanaturezadarepre-sentaçãoemseusentidomaisgeral.Muitosdosdiscursossobre arepresentaçãoassumemimplicitamentequeapessoaque representasepõenumarelaçãodesubstituiçãoouidentidade comosmuitosrepresentados,queeleouelaestápresentepor elesemsuaausência.Contrariamenteaessaimagemdarepre-sentaçãocomosubstituiçãoouidentificação,conceitualizoa representaçãocomoumrelacionamentodiferenciadoentreatores políticosengajadosnumprocessoqueseestendenoespaço enotempo.Consideraratemporalidadeeaespacialidade mediadadoprocessoderepresentaçãodescentralizaoconcei-to,revelandotantooportunidadesquantoriscospolíticos.
3.Essetipodeobjeçãopodeserencontrado,porexemplo,emPhillips(1993); Mouffe,(1993);Cohen(1997).
143
Apósteorizararepresentaçãoemtermosgerais,voltoà questãodarepresentaçãodegrupos.Muitasobjeçõesàsprá-ticasdarepresentaçãoespecíficadegruposestruturalmente desfavorecidosderivamdasuposiçãodequeelesnãotêm umconjuntodeinteressesouopiniõescomuns.Apartirde certospressupostosacercadoposicionamentoestruturale dacompreensãosituada5,argumentoqueestarposicionado similarmentenocamposocialgeraumaperspectivasocialcuja inclusãonadiscussãopúblicapodeserpromovidaporpro- cessosderepresentaçãodegrupos.Conceitualizoumadistin-çãoentreinteresses,opiniõeseperspectivas eidentificoseusres-pectivospapéisnaparticipaçãopolítica.Depoisdeapresentar argumentosacercadarepresentaçãoespecialdeperspectivas sociais,quedeoutraformaseriamexcluídasoumarginaliza-das,avaliobrevementediversoscanaisinstitucionaisparaa efetivaçãodessarepresentaçãodegrupos.Antesdepassaràdiscussãogeraldosignificadodarepre-sentaçãoeaosargumentosacercadarepresentaçãodegrupos, retomoasrazõesaventadasporalgunsautoresparaafirmar quearepresentaçãoéincompatívelcomademocraciaautênti- ca.Aprimeiratarefadestetextoérebateressasrazõeseexpli-carporquearepresentaçãonãonecessariamenteenfraquece aparticipaçãoinclusiva.Aocontrário,nasgrandessociedades demassaarepresentaçãoeaparticipaçãoserequeremumaà outraparaquehajaumapolíticaplenamentedemocrática.
Participaçãoerepresentação
Osdemocratasradicaisfreqüentementedesconfiamdasins-tituiçõesderepresentaçãopolítica.Muitasvezeschegama retratararepresentaçãocomoalgoqueviolaospróprios valoresdademocracia.ParaBenjaminBarber,porexem-plo, a representação “aliena a vontade política em
144
mentodogenuínoautogoverno”,“prejudicaacapacidade dacomunidadedeatuarcomouminstrumentoregulador dajustiça”e“impedeaformaçãodeumpúblicoparticipati-vonoqualaidéiadejustiçapoderiaseenraizar”6.
Semdúvida,umademocraciafortedeveconteremseu repertórioprocedimentalinstitutosdedemocraciadireta, taiscomoodoplebiscito.Alémdisso,umasociedadeémais plenamentedemocráticaquantomaispossuifórunspatro-cinadospeloEstadoefomentadospelasociedadecivilpara discussõessobrepolíticas,epelosmenosalgunsdelesdevem influenciarprocedimentalmenteasdecisõesgovernamen-tais.Aposiçãoanti-representação,noentanto,recusa-sea encararasrealidadescomplexasdoprocessodemocráticoe erroneamenteopõearepresentaçãoàparticipação.
A representação é necessária porque a rede da vida socialmodernafreqüentementevinculaaaçãodepessoase instituiçõesnumdeterminadolocalaprocessosquesedão em muitos outros locais e instituições. Nenhuma pessoa podeestarpresenteemtodososorganismosdeliberativos cujasdecisõesafetamsuavida,poiselessãonumerosose muitodispersos.Aindaqueasexpectativasdeumcidadão sejamfreqüentementedesapontadas,eleesperaqueoutros pensememsituaçõescomoadeleeasrepresentemnosres-pectivosfórunsdediscussão7.
Pode-se objetar que esse argumento pressupõe uma organizaçãosociopolíticaemlargaescala,aqualérejeita-dapelavisãodademocraciadireta:umademocraciasem representaçãodeveconsistiremunidadespequenas,des-centralizadaseauto-suficientes.Noentanto,RobertDahl
6.Barber,Benjamin(1984:145-146).Cf.tambémHirst(1990:42-43).
145
oferece um irrefutável conjunto de argumentos sobre ofatodequemesmoessavisãodademocraciadiretadescen-tralizadanãopodeevitararepresentação.Aparticipação igualitáriadetodosnadeliberaçãopolítica,afirmaele,só pode ocorrer em pequenos comitês. Mesmo em assem-bléias de umas poucas centenas de pessoas haverá uma maioriadeparticipantespassivos,queescutamunspoucos falarememnomedeumaspoucasposiçõesedepoispon- deramevotam.Paraalémdopequenocomitê,merascon-diçõesdetempoeinteraçãoproduzemrepresentaçãode facto ,mastalrepresentaçãoéarbitrária.Comefeito,demo-craciasdiretasfreqüentementeconcedempoderpolíticoa falastrõesarrogantesqueninguémescolheucomorepre- sentantes.Assim,mesmoemunidadesdedeliberaçãopolí-ticarelativamentepequenas,comoasdevizinhançaoude localdetrabalho,aigualdadepolíticapodesermaisbem servidaporinstitutosderepresentaçãoformal,jáquenesse casoasregrasconcernentesaquemestáautorizadoafalar porquemsãopúblicaseháalgumasnormasderesponsa-bilização(accountability).Dahltambémargumenta–ameu verplausivelmente–quenocursonormaldavidasocialas unidadespolíticaspequenasedescentralizadastendema seexpandirpormeiodeconquistasoudecoalizões.Tão logoháumaquestãodeescala,arepresentaçãotambém entraemjogo8.
Oscríticosdademocraciarepresentativapodemobje-tar que essa participação ampliada, na medida em que ocorra,éalcançadaemdetrimentodaparticipaçãocidadã noprocessodeliberativo:depoisdeelegerseusrepresen-tantes,oscidadãosnãosãomaisnecessários.Asinstituições eaculturadealgumasdemocraciasrepresentativasdefato
146
sõespolíticas.Pode-seargumentar,porém,quenessecaso elasnãosãopropriamenterepresentativas,poisemtaiscir-cunstânciasosrepresentantestêmumarelaçãomuitofraca comseuseleitores.Sobosideaisnormativosdademocracia comunicativa,asinstituiçõesrepresentativasnãosecontra-põemàparticipaçãocidadã;antes,requerem-naparaser eficazes9 .Aseguir,desenvolvoumaconcepçãodarepresen-taçãocomoumprocessodeantecipaçãoeretomadaque fluientreosrepresentanteseosrepresentadosapartirda participaçãodestesematividadesdeautorizaçãoepresta-çãodecontas.
Representaçãocomorelacionamento
Avisãodequeademocraciaautênticanãoécompatívelcom representaçãoseapóiaimplicitamentenumalógicaidenti- tária,ounaquiloqueJacquesDerridachamade“metafísi-cadapresença”10 .Talvisãoimaginaasituaçãodedelibe-raçãodemocráticaidealcomoaquelaemqueoscidadãos estãoco-presentes.Nessaimagemdademocraciaautêntica, oscidadãosseencontramnummesmoespaçoparatomar suasdecisõesnumaocasião,àmaneiradeumareuniãode âmbitolocal.
Essavisãotambémassumeumaidentidade dosgovernan- tesedosgovernados.Oscríticosdarepresentaçãoarejei-tamporqueasinstituiçõesrepresentativasseparamopovo dopoder:aquelesquefazemasregrasnãosãoidênticosa todosaquelesquesãoobrigadosasegui-las.Umavezmais aspalavrasdeBenjaminBarbersãoparticularmentevee- mentes:“Homensemulheresquenãosãodiretamenteres-ponsáveis,pormeiodedeliberaçõesemcomum,decisões
147
minamsuasvidasemcomumnãosãorealmentelivresde modoalgum”11.Nessa imagem da democracia, os representantes só poderiamexpressardevidamentea“vontadedopovo”se estivessempresentesporseuseleitoreseagissemcomoestes agiriam. Nessa imagem, o representantesubstitui os elei-tores,pondo-secomelesnumarelaçãodeidentidade.Os críticosdarepresentaçãocorretamenteobservamquenão épossívelaumapessoaapresentar-senolugardemuitas outrasparafalareagircomoessasofariamseestivessem presentes.Éimpossívelcaptarosatributosessenciaisdos eleitores,osingularbemcomumquetranscendeadiversi-dadedeseusinteresses,experiênciaseopiniões.Aobjeção quealgunsfazemànoçãodarepresentaçãoespecíficade gruposmarginalizados,naverdade,podeserestendidaa todarepresentação.Osrepresentantespolíticosgeralmente têmumeleitoradoamploediversificadoemseusinteres-ses,formações,experiênciasecrenças.Talvezsejaatémais difícilconceberumavontadecompartilhadaparaosmora-doresdeumdistritoeleitoralmetropolitanodoqueparaos membrosdeumgrupoétnico,porexemplo.
Seaceitamosoargumentodequearepresentaçãoé necessáriae,aomesmotempo,admitimosavisãodeque umadeliberaçãodemocráticarequerco-presençadecida- dãosedequearepresentaçãosóélegítimaseorepresen-tanteédealgummodoidênticoaoseleitores,temosentão umparadoxo:arepresentaçãoénecessáriamasimpossí- vel.Háumamaneiradesairdesseparadoxo,queimpli-caconceitualizararepresentaçãosemsepautarporuma lógica identitária. Compreender seriamente a natureza descentralizadadasdemocraciasdemassaemlargaescala requerdescartarimagensdeco-presençadoscidadãosea
148
idéiadequeosrepresentantesdevemestarpresentespelos cidadãos.Emvezdisso,éprecisoconceberadiscussãoea deliberaçãodemocráticascomoprocessosmediadosedis-persosaolongodoespaçoedotempo.Arepresentação políticanãodeveserpensadacomoumarelaçãodeiden- tidadeousubstituição,mascomoumprocessoqueenvol-veumarelaçãomediadadoseleitoresentresiecomum representante.
Apóio-menoconceitodedifférance deDerridaparafor-mularumaoutranoçãoderepresentação12.Aopassoque ametafísicadapresençagerapolaridades,poisvisaredu-zir muitas identidades numa só, pensar as entidades em termosdedifférancemantém-nasemsuapluralidade,sem requerersuaunificaçãonumaidentidadecomum.Ascoi-sasassumemseusereossignosassumemseusignificadoa partirdeseulugarnumprocessoderelacionamentosdife-renciados.Ascoisassãosimilaressemseremidênticasesão diferentessemseremcontráriasentresi,dependendodo pontodereferênciaedomomentoemumprocesso.Ao enfatizaroprocessoeorelacionamentomaisdoqueasubs-tância,adifférancedestacaintervalosdeespaçoedetempo. Oposiçõescomosubstância–acidente,causa–efeito,presen-ça–ausênciaerealidade–signosituamoserautênticonuma origem,numtempoinvariavelmenteprimordialdoqualo processopresenteéumacópiaderivada.Derridapropõe repensartaisoposiçõesnostermosdaidéiadevestígio,um movimentodetemporalizaçãoquecarregaconsigoopassa-doeofuturo.Omomentoemumdiálogo,estemomento noserdamontanhae,comoveremos,estemomentona relaçãorepresentativa,cadaqualcarregavestígiosdahistó-riadosrelacionamentosqueosproduziram,aopassoque suastendênciasatuaisantecipamrelacionamentosfuturos.
149
Conceitualizararepresentaçãoemtermosdedifférancesignificareconhecereafirmarqueháumadiferença,uma separação entre o representante e os representados. Evi-dentemente,nenhumapessoapodepôr-sepor(standfor) efalarcomoumapluralidadedeoutraspessoas.Afunção dorepresentantedefalarpornãodeveserconfundidacom umrequisitoidentitáriodequeorepresentantefalecomoos eleitoresfalariam,tentandoestarpresentesporelesnasua ausência.Nãoconstituiumacríticaaorepresentanteafirmar queeleouelaéalguémseparadoedistintodoseleitores.Ao mesmotempo,porém,conceberarepresentaçãosobaidéia dedifférancesignificadescreverumrelacionamentoentreos eleitoreseorepresentante,bemcomodoseleitoresentresi, noqualatemporalidadedopassadoeofuturoantecipado deixamvestígiosnasaçõesdecadaumdeles.
Conceberarepresentaçãocomoumrelacionamento diferenciadoentreatorespluraisdissolveoparadoxoposto pelasituaçãonaqualumasópessoarepresentaasexperi-ênciaseopiniõesdemuitasoutras.Nãoháumaespecífica vontadedopovoquepossaserrepresentada.Umavezque oeleitoradoéinternamentediferenciado,orepresentan-te não se põe por ou se reporta a uma opinião ou inte-resse compartilhado por todos os eleitores que ele deva expressaredefender13.
Em vez de interpretar o significado normativo da representaçãocomooatodepropriamentepôr-sepelos eleitores,devemosavaliaroprocessoderepresentaçãode acordocomocaráterdorelacionamentoentreorepresen-tanteeoseleitores.Orepresentanteinevitavelmenteirá seafastardoseleitores,mastambémdeveestardealguma formaconectadoaeles,assimcomooseleitoresdevemestar conectados entre si. Os sistemas de representação, por
150
vezes, deixam de ser suficientemente democráticos não porqueosrepresentantesdeixamdesepôrpelavontade doseleitores,masporqueperderamaconexãocomeles. Nas democracias de massa modernas, as relações entre representanteseeleitoresdefatoserompemfacilmente:o difícilémantê-las.
Antecipação,autorizaçãoeprestaçãodecontas
Em seu clássico trabalho sobre a representação, Hanna Pitkinanalisaosdiversossignificadosqueseanexaramao termo14 .Paraalgunsautores,oqueconstituiumrepresen-tanteéofatodequeeleéautorizadoaagirporumconjunto deinstituiçõesoficiaisquetambémcircunscrevemogru-porepresentado.Outrosenfocamademandadequeum legítimorepresentantedeveserresponsável ouprestarcon-tasperanteaquelesquerepresenta,pois,casocontrário,o agentequealegaestarrepresentandoestarásimplesmente agindoporsimesmo.Pitkinretomaodebateentreaqueles quepostulamorepresentantecomoumdelegado quecon-duzomandatodeumeleitoradoqueeledefendeeaqueles quepensamqueeledeveatuarcomoumfiduciário(trustee) quefazavaliaçõesindependentessobreacoisacertaafazer sobascircunstânciaspolíticas.Aautoraargumentaqueesse debateestámalcolocado.Cadaumdosladosestariacorreto àsuamaneira:afunçãoespecíficadeumlegítimorepresen-tanteconsisteemfazeravaliaçõesindependentes,sabendo eantecipandooqueoseleitoresdesejam.
Aconceitualizaçãodarepresentaçãopolíticatambém passapelasseguintesquestões:seosorganismosrepresenta- tivosdevemespelharapopulaçãorepresentadaeseosinte- ressesrepresentadosemtaisorganismosdevemsertoma-doscomoobjetivosousimplesmentecomoumprodutodas
151
percepçõesepreferênciassubjetivasdoseleitores.Pitkinconcluiquetodosessesconceitosequestõessãoaspectos docomplexorelacionamentochamado“representação”,e quetantoateoriaquantoapráticarequeremacompreen-sãodequeaatuaçãodorepresentantedevepermanecer nosdiversoslimitescolocadosporessasdiversasquestões.
A noção de representação política que apresento a seguirdevemuitoàdePitkin.Sigoseuspassos,aoteori- zararepresentaçãocomoalgoqueenvolvetantoaautori-zaçãocomoaprestaçãodecontaseaoargumentarquea dicotomia“delegado–fiduciário”éumafalsapolarização. Pitkinafirmaquetodasessasconceitualizaçõesaparente-mentedivergentessãonaverdadeaspectosdiversosdeum complexoconjuntodeinstituiçõesepráticasrepresentati-vas.Noentanto,elanãoteorizaplenamentesobrecomo reuni-los.Sugiroqueconceberarepresentaçãocomoum processo diferenciado e mediado no espaço e no tem-po propicia uma forma de pensar conjuntamente esses diferentesaspectos.
Pensararepresentaçãoemtermosdedifféranceemvez deidentidadesignificalevaremcontaasuatemporalida-de.Arepresentaçãoéumprocessoqueocorreaolongodo tempoetemmomentosouaspectosdistintos,relacionados entre si, mas diferentes uns dos outros. A representação consistenumrelacionamentomediadoentreosmembros deumeleitorado,entreesteeorepresentanteeentreos representantesnumorganismodetomadadedecisões.Na qualidadedeumrelacionamentoprolongadoentreoselei-toreseseusagentes,arepresentaçãooscilaentremomentos deautorizaçãoedeprestaçãodecontas:éumciclodeante-cipaçãoeretomadaentreoseleitoreseorepresentante,no qualseusdiscursoseaçõesdevemcarregarvestígiosdeum momentoaoutro.
152
eficaz,quepromovalegitimidadedemocráticaeinclusão política.Deacordocomumconceitodedemocraciacomo umaquestãodegrau,umaboarepresentaçãoéelames-maumaquestãodegrau.Napróximaseção,sugirouma medidadeboarepresentaçãoqueconsideraonúmerode aspectosoumodospelosquaisaspessoassãorepresenta-das.Aqui,considerooalcancedaconexãoentreeleitores erepresentantescomoumamedidadograuderepresen-tação. Conceitualizada como diferença, a representação necessariamenteenvolvedistinçãoeseparaçãoentrerepre- sentanteseeleitores.Arepresentaçãoéumrelacionamen-todiferenciadoentreeleitoreserepresentantes,emque adesconexãoésempreumapossibilidadeeaconexãoé mantidaaolongodotempopormeiodeantecipaçõese retomadas em momentos de autorização e prestação de contas. Dessa forma, um processo representativo é pior, namedidaemqueaseparaçãotendeaorompimento,e melhor,namedidaemqueestabeleceerenovaaconexão entreoseleitoreseorepresentanteeentreosmembrosdo eleitorado.
153
qualodelegadopodeconduzirinalteradoaumorganismo representativo15.Naverdade,porém,namaioriadassituações,oeleitora-doespecíficoexistenomáximopotencialmente;aspróprias instituiçõesrepresentativaseopróprioprocessodeautori-zaçãoéqueconvocamseusmembrosàação16 .Antecipan-doomomentoemqueosrepresentantesseapresentarão paraagiraseumandoeemseunome,osindivíduosdeum determinadoeleitoradoprocuramunsaosoutros,seorga-nizam,discutemasquestõesqueconsideramimportantes parasieconvocamcandidatosaresponderporseusinte-resses.Namedidaemquegeralmenteháummomentoem queoseleitoresautorizamrepresentantes,aofazê-lo,eles raramentecomparecemparaafirmarumavontadecomum. Oeleitoradonormalmenteéamplodemais,asatividadesde seusmembrossãovariadasedispersasdemaisousuadefi-niçãoesuasfronteirassãovagasdemaisparaquesepossa ensejarummomentoemqueoeleitoradochegueaumsó tempoaumavontadecoletiva.
Emvezdisso,numprocessodeautorizaçãoeficaz,uma esferapúblicadediscussãodefineumaagendadequestões eosprincipaispontosdedisputaoudeluta.Paraqueos processosparlamentaressejamefetivamenterepresentati- vos,enãomeramenteumaetapaemqueaselitesdesempe- nhemseupapelconformeseusprópriosroteiros,oproces-sodemocráticodaautorizaçãoderepresentantesdeveser tantoparticipativoquantoinclusivoemsuadeliberação.
15.NancySchwartzcriticaavisãoqueeladenominateoriadarepresentaçãocomo “correiadetransmissão”,queteriaessaforma.Nessavisão,osindivíduosrepresen- tadosprecisariamtão-somenteexpressarsuasvontades,eorepresentantefuncio-nariacomoummediador.Nemoseleitoresnemorepresentantesãoativos,eseus juízospolíticostampoucosealteramnodecorrerdoprocessorepresentativo.Cf. Schwartz,1988
154
ComosustentaPitkin,conceitualizarorepresentante puramentecomoumdelegadocomummandatoinequívo- co,ouinteiramentecomoumfiduciárioqueagetão-somen-tedeacordocomsuasprópriasluzes,dissolveosignificado específicodaatividaderepresentativa.Arepresentaçãoefi- cazficaentreumacoisaeoutraeincorporaambas.Ares- ponsabilidadedorepresentantenãoésimplesmenteexpres-sarummandato,masparticipardasdiscussõesedebates comoutrosrepresentantes,ouvirsuasquestões,demandas, relatoseargumentosecomelestentarchegaradecisões ponderadasejustas.Osdiferentesgruposesegmentosda sociedadedialogammelhoremsuasdiferençaspormeiode representantesqueseencontrameouvemunsaosoutros, abertosàpossibilidadedemudarsuasposições.
Aolongodessesmomentosdeaçãoeavaliaçãoindepen- dentes,orepresentantedeve,noentanto,retomaroproces-sodediscussãoquelevouàsuaautorizaçãoeanteciparo momentodeprestaçãodecontasperanteaquelesqueale-garepresentar.Orepresentanteestáautorizadoaagir,mas suasavaliaçõesestãosempreemquestão.Saberseeleagiu ounãoconformeaquelaautorizaçãoéumaquestãopospos-taaummomentoulterior,quandoelevieraprestarcontas desuasaçõesaosrepresentados.Orepresentanteageporsi próprio,masantecipandoessemomento.Umavezquenão hámandatoautorizadoparaváriasdecisões,arepresentação émaisfortequandocarregaosvestígiosdadiscussãoque levouàautorizaçãoouquando,deoutraforma,sejustifica persuasivamentenumaprestaçãodecontaspública.
155
anteriormenteoseleitoresnãosabiamexatamentecomoasquestõesseriamformuladasnoorganismorepresentativo, quaisexpressões,solicitaçõeseargumentosseriamaliapre-sentados.Aresponsabilidadedorepresentantenãoconsiste apenasemrelataraoscidadãoscomocumpriuomandato porelesautorizadooucomoserviuaosseusinteresses,mas tambémempersuadi-losdaadequaçãodesuasavaliações17.
Namaioriadasdemocraciasexistentes,omomentoda prestaçãodecontasémaisfracoqueodaautorização.Em muitossistemasderepresentação,aúnicaformadeefetivara prestaçãodecontaséareautorizaçãopormeiodareeleição. Ocicloquevoltaàautorizaçãoédefatoimportantepara motivaraprestaçãodecontas,masumademocraciacomuni-cativaforterequertambémalgunsprocessoseprocedimentos medianteosquaisoseleitoresconvoquemosrepresentantes aprestarcontasparaalémdosmomentosdereautorização. Assimcomoaautorização,aprestaçãodecontasdeveocorrer tantopormeiodeinstituiçõesoficiaiscomonaarenapúbli-cadaassociaçãocivilindependente.Todasasdemocracias representativasexistentespodemseraperfeiçoadasporpro-cedimentosefórunscomplementarespormeiodosquaisos cidadãosdiscutamentresiecomosrepresentantessuasava-liaçõesacercadaspolíticasqueessesúltimosapoiaram.Meios oficiaisdeprestaçãodecontasdistintosdascampanhaselei-toraispodemincluirconselhosdesupervisão,comissõesde estudosdeimplementaçãoeaudiênciasparticipativasperiódi-casqueacompanhemosprocessosdeproduçãodepolíticas. Esferaspúblicasdasociedadecivilpodemaprofundarares-ponsabilizaçãomediantequestionamentos,elogios,críticase avaliaçõesindependentes.
156
O principal problema normativo da representação é aameaçadedesconexãoentreorepresentanteúnicoeos muitosqueeleouelarepresenta.Quandoosrepresentantes setornammuitoafastados,oseleitoresperdemapercepção dequeexerceminfluênciasobreaproduçãodepolíticas, desafeiçoam-seeseabstêmdaparticipação.Estabelecere manterprocessosderepresentaçãolegítimoseinclusivos impõeresponsabilidadestantoparaosrepresentantescomo paraoscidadãos.Estesprecisamestardispostoseaptosa mobilizarunsaosoutrosparaparticiparativamentetanto doprocessodeautorizaçãoquantododeprestaçãodecon- tas.Osrepresentantesdevemouviressasdiscussõespúbli-caseasdiversasdemandas,permanecerconectadoscomos eleitoreseexporasrazõesdesuasaçõeseavaliaçõesem termosqueretomemaquelasdiscussões.Essamobilizaçãoe essaconectividadepodemserpromovidasouobstadaspelo desenhodasinstituiçõesrepresentativas.
Assim,possoagoratrocaremmiúdosaproposiçãode quenumademocraciacomunicativainclusivaarepresen-taçãoeaparticipaçãonãosãoexcludentes,masrequerem umaàoutra.Asinstituiçõesrepresentativascontribuempara organizarasdiscussõeseastomadasdedecisãopolíticasao introduzirprocedimentoseumapertinentedivisãodotra-balho.Dessaforma,oscidadãostêmobjetivosemtornodos quaispodemseorganizarentresietomarparteemdiscus-sões,críticaseavaliaçõesantecipatóriaseretrospectivas.Sem essaparticipaçãocidadãaconexãoentrerepresentantese eleitoresficamaissujeitaaromper-se,fazendodorepresen-tanteumagentedaelite.Desuaparte,osrepresentantes devemresponderaessesprocessosparticipativos.Asesferas públicasdasociedadecivilsãoimportantesarenasparaapar-ticipaçãocidadãecontribuemparamantertaisconexões18.
157
Modosderepresentação
Seorepresentantenãodeveserpensadocomoumsubstituto daquelesquerepresenta,comojásugeri,tampoucosedeve assumirqueelepossaoudevaexpressarecumpriralgum tipodevontadeunívocadasuabaseeleitoral.Orepresen-tantenãopoderetratarnemaidentidadedequalqueroutra pessoanemaidentidadecoletivadeumeleitorado.Éinevi- távelquehajaumadiferençaeumaseparaçãoentrerepre-sentanteeeleitores,oquecontinuamentepõeemquestãoo modoeograuemqueoseleitoresparticipamdoprocesso quelevaàproduçãodepolíticas.Nãoobstante,nassocie-dadesmodernasarepresentaçãoétantonecessáriaquanto desejável.Emvezdedesvalorizararepresentaçãoenquanto tal,osdemocratasparticipativoseradicaisdeveriamavaliar emquemedidaosprocessosdeautorizaçãoeprestaçãode contasexistem,sãoindependentesesuscitamaparticipação ativaeinclusivadoeleitoradonodebatepúblico.
158
comoutras.Essesaspectosouafinidadessãopotencialmente numerosos.Proponhoaquidistinguirtrêsmodosgeraispelos quaisumapessoapodeserrepresentada:interesses,opiniões eperspectivas.Numcontextopolíticoespecífico,umapes-soapodeserrepresentadadediversasmaneirasemcadauma dessasmodalidades.Aexplanaçãosobrearepresentaçãoda perspectiva,emparticular,provêargumentosparaarepre- sentaçãoespecialdegrupossociaisoprimidosoudesfavoreci-dos,namedidaemqueevitaoproblemadeatribuiropiniões ouinteressescomunsatodososmembrosdessesgrupos.
Oquedouaentenderquandodigoquemesintorepre-sentado no processo político? Há muitas respostas possí- veisparaessapergunta,mastrêsdelasmeparecemsedes-tacarcomoasmaisimportantes.Primeiramente,sinto-me representadoquandoalguémestácuidandodeinteresses quereconheçocomomeusequecompartilhocomalgu-masoutraspessoas.Emsegundolugar,éimportantepara mim que os princípios, valores e prioridades que penso deveriamnortearasdecisõespolíticassejamverbalizados nasdiscussõesqueasdeliberam.Porfim,sinto-merepre-sentadoquandopelomenosalgumasdessasdiscussõese deliberaçõessobrepolíticascaptameexpressamotipode experiênciasocialquemedizrespeito,emrazãodaminha posiçãonumgruposocialedahistóriadasrelaçõesdesse grupo social. Discutirei interesses e opiniões apenas em linhasgerais,vistoquesãotemasjáamplamentediscutidos nateoriapolítica.Dedicareimaisatençãoàrepresentação dasperspectivas,umavezqueessaidéiaémenosfamiliar.
Interesses
alcançadososfinsqueelealmeja.Issoincluitantoosrecur-159
sosmateriaisquantoahabilitaçãoparaexercercapacidades, porexemplo,deexpressãocultural,deinfluênciapolítica, de interferência nas decisões econômicas. Concebo aqui osinteressescomoauto-referentesecomoalgodiversode idéias,princípiosevalores.Estespodemajudaradefiniros finsqueumapessoaestabeleceuparasimesma,enquantoos interessesdefinemosmeiosparaalcançaressesfins.Os interesses freqüentemente conflitam não apenas entreagentes,mastambémnasaçõesdeumúnicoagente. Aoprocurarobterosrecursosdequeprecisamparareali-zarumavariedadedefins,osagentestendemadescobrir quealgunsdessesrecursossãorelativamenteescassos.Às vezes,aobtençãodecertosrecursosporumagenteimpli-cadiretamentequeeleimpeçaumoutroagentedeobter osmeiosnecessáriosparaperseguirseusfins.Noentanto, éimportantenotarqueosinteressesnãonecessariamente conflitamentresi.Abuscadefinsemsociedadeeoarran-jodosinstrumentospolíticosqueviabilizamessabuscanão precisamnecessariamenteestarestruturadoscomoumrela-cionamentodesomazeroentreosagentes.
Arepresentaçãodointeresseécorrentenapráticapolíti-ca,etalvezhajamaisteoriadarepresentaçãodointeressedo quedequalqueroutrotipoderepresentação.Nãopretendo retomaraquiavastaliteraturasobreosgruposdeinteresse eosmeiospelosquaiselespodemobterinfluênciapolítica. Apenasassinaloquefazpartedoprocessodelivreassociação nademocraciacomunicativaqueaspessoastenhamliberdade depressionar,politicamente,porpolíticasqueatendamaseus interessesedeseorganizarcomoutraspessoasquetenham interessessimilaresafimdeobterinfluênciapolítica.
Opiniões
160
serseguidasequaisfinsdevemserbuscados.Trata-seda esferaprimáriadaquiloqueAnnePhillipschamade“políti-cadasidéias”19,queestánocentrodemuitasdasdiscussões contemporâneasacercadopluralismo.AdiscussãodeRawls sobreosprincípioseosproblemasdoliberalismopolítico, porexemplo,concentra-senaquestãodossistemasplurais deidéiasecrençasnassociedadesmodernas,interrogan-dooquantoelesinfluenciamlegitimamenteavidapolítica ecomopessoascomdiferentescrençaseopiniõespodem manterumorganismosociopolíticoarticulado20.
Entendopor“opinião”todojuízooucrençasobrecomo ascoisassãooudevemsereoscritériospolíticosquedaí seseguem.Opiniõespodemserreligiosas–ouderivarde motivaçõesreligiosas–oupodemserculturalmentebasea-dasnumavisãodemundoounahistóriadedeterminadas práticassociais.Podemsebasearemsistemasdeconheci- mentodisciplinares–consistindo,porexemplo,emopini- õespolíticasderivadasdecertaspremissasdaeconomianeo-clássica–,ounumconjuntodeprincípiosnormativos,tais comoosdolibertarianismooudaecologiaradical.Embo-raeuduvidequetodasasopiniõesdamaioriadaspessoas sobrequestõespúblicasderivemdeumaúnica“doutrina abrangente”(nostermosdeRawls),suponhoqueamaio-riadaspessoaspauteseusjuízossobredeterminadostemas sociaisepolíticosporcertosvalores,prioridadeseprincí-piosqueelasaplicamaoutrostantostemas,senãoatodos. Opiniões certamente são contestáveis, e freqüentemente algumaspodemsemostrarmaisbemfundamentadasque outras.Noentanto,umademocraciacomunicativarequera
19.Phillips,1995.
161
livreexpressãoeoquestionamentodeopiniões,bemcomo umaamplarepresentaçãodeopiniõesemdiscussõesque levemadecisõespolíticas.Ospartidospolíticossãooveículomaiscomumparaa representaçãodeopiniões.Ospartidosfreqüentementeela-boramprogramasque,menosqueexpressarosinteresses deumdeterminadoeleitorado,organizamostemaspolí-ticosdodiasegundoprincípios,valoreseprioridadesque elessepropõemarepresentardeformageral.Noentanto, associaçõesmenoresoumaisespecializadastambémpodem representaropiniõesnavidapúblicaeinfluenciaraspolíti- caspúblicas.Ateoriadosgruposdeinteressetradicional-mentetemtratadoessasassociaçõescomomaisumtipode grupodeinteresse,oqueéumtantoinócuoparamuitos efeitos.Creio,noentanto,queéimportantefazerumadis-tinçãogenéricaentreassociaçõespolíticasmotivadaspor uminteresseinstrumentaleassociaçõespolíticasmotivadas porumcomprometimentocomcrençasevalores.Enquan-toaprimeiraformademotivaçãoéautocentrada,mesmo queautocentradanumgrupo,asegunda,freqüentemente, seassumecomoimparcialoumesmoaltruísta.
Perspectivas
Tenhoargumentadoqueosgrupossociaisestruturaisnão devemserpensadosdeacordocomumalógicasubstan-cial,queosdefiniriasegundoumconjuntodeatributos queseriamcomunsatodososseusmembroseconstitui-riam suas identidades, mas a partir de uma lógica mais relacional, em que os indivíduos seriam compreendidos comoposicionadosnasestruturasdosgrupossociais,sem queestasdeterminemsuasidentidades21.Contrariamente àquelesqueconsideramquepolíticasdediferenciaçãode
162
gruposapenascriamdivisõeseconflitos,argumentoquea diferenciaçãodegrupospropiciarecursosparaumpúbli- codemocráticocomunicativoquevisaestabelecerajusti-ça,umavezquepessoasdiferentementeposicionadastêm diferentesexperiências,históriasecompreensõessociais, derivadasdaqueleposicionamento.Aissochamo perspecti-vasocial.
Conformesuasposiçõessociais,aspessoasestãosinto- nizadascomdeterminadostiposdesignificadoserelaciona- mentossociais,comosquaisoutraspessoasestãomenossin- tonizadas.Eventualmenteestasúltimasnãoestãoposiciona-dassequerdeformaaterconsciênciadeles.Apartirdassuas posiçõessociaisaspessoastêmcompreensõesdiferenciadas doseventossociaisedesuasconseqüências.Umavezque suasposiçõessociaisderivamparcialmentedasconstruções queoutraspessoasfazemdelas,assimcomodasconstruções queelasfazemdeoutraspessoasemdiferentesposições, pessoasdiferentementeposicionadaspodeminterpretarde modosdiferentesosignificadodeações,eventos,regrase estruturas.Assim,asposiçõessociaisestruturaisproduzem experiências particulares, relativas ao posicionamento, e compreensões específicas dos processos sociais e de suas conseqüências. Cada grupo diferentemente posicionado temumaexperiênciaouumpontodevistaparticularacer-cadosprocessossociaisprecisamenteporquecadaqualfaz partedessesprocessosecontribuiparaproduzirsuasconfi- gurações.Éespecialmentequandoestãosituadasemdife-rentesladosdasrelaçõesdedesigualdadeestruturalqueas pessoasentendemessasrelaçõesesuasconseqüênciasde modosdiferentes.
163
enquantoaquelesqueestãosocialmentedistantestendem averascoisasdemododiverso.Emboradiferentes,essas perspectivassociaisnãosãonecessariamenteincompatíveis. Cadaperspectivasocialéparticulareparcialcomrelação aocamposocialemseutodo,e,apartirdecadaperspec-tiva,algunsaspectosdarealidadedosprocessossociaissão maisvisíveisqueoutros.Assim,umaperspectivasocialnãocomportaumcon- teúdoespecíficodeterminado.Nessesentido,aperspec-tivadiferedointeresseedaopinião.Aperspectivasocial consistenumconjuntodequestões,experiênciasepres-supostosmedianteosquaismaispropriamenteseiniciam raciocíniosdoqueseextraemconclusões.Ascríticasao essencialismoapontamcorretamentequepessoas,aprincí-piopertencentesaomesmogruposocial,freqüentemente têminteresseseopiniõesdiferentesemesmoconflitantes. Pessoasquetêmumaperspectivasemelhantesobrepro- cessosetemassociais–sobreasnormasdainteraçãohete-rossexual,porexemplo–freqüentementetêminteresses ouopiniõesnãoobstantediferentes,jáqueraciocinamde modosdiferentesapartirdaquiloqueexperienciam,ou têmmetaseprojetosdiferentes.
164
deperspectivassociaisdiferentesdoqueaquelasquesão compartilhadas22.
Aperspectivasocialéopontodevistaqueosmembros deumgrupomantêmsobreosprocessossociaisemfunção dasposiçõesquenelesocupam.Asperspectivaspodemser vivenciadasdeummodomaisoumenosautoconsciente. Asexperiênciasculturaisdepovosoudegruposreligio-sosdiferenciados,bemcomodegruposquereagemauma históriadeinjustiçasoudeopressãoestrutural,freqüen-temente lhes conferem interpretações refinadas acerca desuasprópriassituaçõesedesuasrelaçõescomoutros grupos.Aperspectivapodeserevelaremhistóriaseem canções, em brincadeiras e em jogos de palavras, assim comoemformasdeexpressãomaisassertivaseanalíticas. Exploremosumexemplo.
Por mais de cinqüenta anos o semanárioPittsburgh Courier foiumveículomuitoimportanteparaosafro-ameri-canosdacidadedePittsburgh,mastambémdemuitasoutras partesdosEstadosUnidos23 .Creioqueesseperiódicoilus-tramuitobemadiferençaentreperspectiva,deumlado,e interesseeopinião,deoutro.Oseventoseaspolêmicasnele
noticiadosmostramapluralidadedeinteresses–nemsem-22.Muitosautorestêmrecorridoaumaidéiasemelhanteàdaperspectivasocial paradescrevermodosdeolharsocialmentesituados(verMinow,1990:60-70). MelissaWilliams(1998,esp.cap.4)invocaumaidéiadeperspectivasocialem seusargumentosacercadarepresentaçãodegrupos,esuanoçãodomodelode representação “vocal” ressoa a idéia da perspectiva social. Thomas Christiano (1996:189-90)tambémargumentaquegrupossociaisdiversosfreqüentemente têmpontosdevistadiferentessobrequestõespolíticasesociaisdosquaistodos sebeneficiamquandosãovocalizados.KristinR.MonroeeLinaH.Kreidi(1997: 19-43)desenvolvemumaidéiadeperspectivasocialumtantodiferente,masope- racionalmentesimilar,parateorizarsobreapsicologiasocialdocaracterísticogru-podosfundamentalistasislâmicosemsociedadesocidentaispredominantemente seculares.
165
precompatíveis–dosafro-americanosdePittsburghede todaparte.Naspáginasdeopiniãoencontra-seumagama ideológicaquevaidolibertarianismodeextrema-direitaao socialismodeextrema-esquerda,doseparatismoeconômi-coaointegracionismoliberal.Adespeitodessavariedade deinteresseseopiniões,nãoédifícilidentificarcomooPittsburghCourierexpressaumaperspectivaafro-americana. Nota-sequeamaioriadoseventosnoticiadoseanalisados envolveosafro-americanoscomoprotagonistasesepassa emlocaiseinstituiçõesmajoritariamenteafro-americanos ouespecificamenteassociadosaeles.Aorepercutireventos locaisounacionaisnãoespecificamenteidentificadoscom osafro-americanos,asmatériasnormalmentediscutemou enfatizamquestõesparticularmentepertinentesaostemase experiênciasmaisespecíficosaosafro-americanos24.
Pode-seobjetarqueaidéiadeumaperspectivaafro-americanaouumaperspectivadegêneroestátãosujeita acríticasquantoaidéiadeumúnicointeressedegrupo. Falar deuma perspectiva nativo-americana não seria um reducionismotãoimpróprioquantofalardeuminteresse nativo-americano?Porcerto,cadapessoatemsuaprópria históriairredutível,oquelheconfereumaperspectivaou umapercepçãosocialúnica.Noentanto,devemosevitar avisãoindividualistaqueconcluiriadessefatoquetodoe qualquerdiscursosobreposicionamentosocialestruturale situaçãosocialdefinidaporgruposéequivocado,incoeren-
166
dorasemespecializaçãoprofissionaltêmvulnerabilidades eoportunidadesprevisíveisemfunçãodesuasposiçõesna estruturaocupacional.Aidéiadeperspectivabuscacaptara sensibilidadedaexperiênciadoposicionamentonumgru-po,semespecificarumconteúdounificadoparaaquiloque apercepçãovê.Oposicionamentosocial,produzidopor relações com outras posições estruturais e por processos sociaisqueresultamemconseqüênciasnãoplanejadas,ape- nasproporcionaumaexperiênciaeumaperspectivanoster-mosdasquaisdeterminadoseventosequestõessociaissão interpretados:elasnãofazemainterpretação.Assim,pode-mosmuitobemencontrarpessoasquetêmumaperspectiva socialsemelhante,masquefazeminterpretaçõesdiferentes deumamesmaquestão.Aperspectivaéumaabordagem damaneiradeolhareventossociais,aqualcondiciona,mas nãodeterminaoquesevê.
confundi-lacomoutra,comonafigurajustapostadopato-167
coelho.Asperspectivasdisponíveisaumapessoapodemserincomensuráveis,demodoqueessamultiplicidadepode produzirambigüidadesouconfusõesnasuaexperiênciae compreensãodavidasocial,ouentãoajudá-laaformaruma imagemcompósitadosprocessossociais.Adisponibilidade demúltiplasperspectivaspropiciarecursosparaquecada pessoatomedistânciadequalquerumadelaseparaque secomuniquecompessoascomasquaisnãocompartilha perspectivas.
Referindo-se a uma distinção entre interesses, opini-ões e perspectivas que formulei anteriormente, Melissa Williamsobjetaqueperspectivaseinteressesnãopodemser distinguidosnitidamente:“Meuentendimentodasrelações entreperspectivaseinteresseséantesodequeumaperspec-tivadegrupocompartilhadacontribuiparadefiniroslimites dentrodosquaissãopossíveisdiferentesinterpretaçõesdos interesses”25.Éproveitosoconceberaperspectivasocialcomo algoquecontribuiparaestabelecerumquadrodereferên- ciasparaasinterpretações,poisissodefatoajudaosindivídu-osaponderarsobreaquiloqueachamserdoseuinteresse. Noentanto,aoteorizá-ladessaforma,éprecisoreconhecer que indivíduos similarmente posicionados nas estruturas sociaisporvezesdescobremquehámuitosinteressesque elesnãocompartilham.Representaruminteresseouuma opiniãogeralmenteenvolvepromovercertosdesdobramen-tosespecíficosnoprocessodetomadadedecisões,aopasso querepresentarumaperspectivageralmentesignificapro-movercertospontosdepartidaparaadiscussão.Apartirde umadeterminadaperspectivasocialumrepresentantecolo- cacertostiposdequestões,relatacertostiposdeexperiên-cia,retomaumadeterminadalinhadenarrativahistóricaou expressaumcertomododeolharasposiçõesdeoutrem.Isso
168
contribuidecisivamenteparaainclusãodediferentespessoas noprocessodetomadadedecisõesechamaaatençãopara possíveisefeitosdaspolíticaspropostassobreosdiferentes grupos.Noentanto,expressarumaperspectivaquasenunca significainferirumaconclusãosobreresultados.
Darei um outro exemplo pra ilustrar a expressão da perspectiva.Em1992,osenadornorte-americanoRobert Packwoodfoiacusadodeassédiosexualporváriasdesuas assessoras.Quandoasacusaçõesvieramàtona,muitossena-doressemostraramrelutantesemrealizaraudiênciascom aspartesenvolvidas.Packwoodtinhaumaeminentefolha de serviço no Senado, e muitos de seus colegas assumi-ramaatitudedequeaquelasacusaçõesescandalosasnão mereciamqueseformasseumacomissãoparlamentarpara apurarocaso.Diantedisso,senadorasetambémdeputa- dasconvocaramumaconferênciacomaimprensaparaexi-girqueoSenadoapurasseasacusaçõescontraPackwood eeventualmenteaplicasseassançõeséticascabíveis.Essas mulheres tinham muitos interesses divergentes, não cul-tivavamosmesmosvalorespolíticosenãoconfluíamem suas opiniões acerca da culpabilidade de Packwood. Seu propósitoerainfluenciaraagendadoSenadoe,aofazê-lo, expressaramumamesmaperspectivasobreaimportânciae agravidadedasacusaçõesdeassédiosexual,umaperspecti-vaquemuitosdeseuscolegasdosexoopostopareciamnão compreender,pelomenosdeinício.
taçãodegrupos.Ademais,nenhumdessesaspectoséredu-169
tívelaosoutros.Elessãologicamenteindependentes,no sentidodeque,apartirdeumaperspectivasocialgeral, nãosepodeimediatamenteinferirumconjuntodeinte-ressesoudeopiniões.Diferentementedosinteressesedasopiniões,aspers-pectivassociaisnãopodemserfacilmentepensadascomo conflitantes.Reunidas,elasgeralmentenãoseanulamentre si; antes, oferecem questões adicionais e compreensões sociaismaisplenas.Noentanto,asperspectivasfreqüente-mentepodemserincomensuráveis.UmrelatodosEstados Unidosdopós-guerraapartirdaperspectivadaspessoas queagoraestãoemseus80anosdeidadenãopodeserfei-tonamesmalinguagemecomosmesmospressupostosde umrelatofeitoapartirdaperspectivadepessoasqueagora estãoemseus20anos.
Representaçãodegruposmarginalizados
Poucosnegariamqueosmembrosdegrupossociaisestru-turais menos privilegiados estão sub-representados na maioria das democracias contemporâneas. A desigual-dadesocioeconômicaestruturalcomfreqüênciaproduz desigualdade política e exclusão relativa das discussões políticasinfluentes26 .Assim,aspessoaspobresedaclas-setrabalhadorafreqüentementenãotêmseusinteressese perspectivastãobemrepresentadosquantoosdaspessoas dasclassesmédiaealta.Namaiorpartedossistemaspolíti- cos,asmulheresocupamumapequenaproporçãodoscar- gospúblicoseleitos,bemcomoestãorelativamentepou-copresentesnasposiçõesdepodereinfluêncianavida públicaeprivadademodogeral.Gruposculturaisminori-tárioseaquelessituadosemposiçõesraciaisdesvalorizadas tambémcostumamcarecerdevozpolíticaefetiva.Muitos
170
consideramincorretaessaexclusãooumarginalizaçãopolí-ticadegruposeindivíduossubordinados,poisissofrustra aspromessasdeigualdadepolíticaedeoportunidadesque estãonabasedosprincípiosdemocráticos.Taisjuízossobre ainjustiçadadesigualdadepolíticapodemsermobilizados pararomperocírculomedianteoqualademocraciapolí- ticaformaltendeareproduziradesigualdadesocial.Pro- piciarmaiorinclusãoeinfluênciaaosgrupossociaissub-representados pode contribuir para que uma sociedade enfrenteereduzaadesigualdadesocialestrutural27.
Uma forma importante de promover maior inclusão demembrosdosgrupossociaissub-representadossedápor meiodedispositivospolíticosdestinadosespecificamentea aumentararepresentaçãodemulheres,pessoasdaclassetra-balhadora,minoriasraciaisouétnicas,castasdesfavorecidas etc.Assim,esquemascomocotasemlistaspartidárias,repre-sentaçãoproporcional,cadeirasparlamentaresreservadas edelimitaçãodedistritoseleitoraisespeciais,entreoutros, têmsidopropostoseimplementadosparapromoverarepre-sentaçãodegrupos.Osmovimentossociaiscadavezmais demandamformasderepresentaçãodegruposnãoapenas naslegislaturas,mastambémemdiversostiposdecomissões econselhos,eminstânciasdiretivasdasempresasprivadase emórgãosestatais.Emboraaspropostasderepresentação degruposquasesempresejamcontroversas,asexclusões estruturaisquemotivamtaispropostasparecempermane-ceremmuitassociedades.Noentanto,comoapontaAnne Phillips,arepresentaçãoespecíficadegruposquedeoutra formapermaneceriammarginalizadosnãoéumaconseqü-ênciaimediatadocompromissocomaigualdadepolítica28: sãonecessáriosargumentosnormativosadicionais.
27.MelissaWilliams(1998:194)apresentaumanoçãoparecidadaconexãopoten-cialentrenormasderepresentaçãoedesigualdadeestrutural.
171
29.Cf.Schwartz,1988. 30.Pitkin,1971:90.
31.Cf.Pitkin,1971:73;Kymlicka,1996:139.Issosoacomoumargumentoreductio adabsurdum,dirigidocontraousodetécnicasdeamostragemcomopropósitode formardiversosgrupos;mastaismétodosnãosãoobviamentedisparatados.James Fishkin(1995),porexemplo,utilizaamostragemaleatóriaemsuaspesquisasde opiniãosobredeliberação.Eleargumentaqueessaéumaformaeficienteerazo-avelmenteconfiáveldereproduziramultiplicidadedeperspectivassociaisque eupostulocomonecessáriaparaumadeliberaçãoinformada,epodeterrazão nisso.Noentanto,osgruposqueelecompõenãosãopropriamentepolítico-re-presentativos,precisamenteporquenãotêmconexãoinstitucionalouativacom umabaseeleitoral.
Muitosduvidamquearepresentaçãoespecíficadegru-possociaispromovajustiçaoutenhapertinência.Alguns afirmamqueosindivíduosdevemcontardiretamentecom asinstituiçõespolíticas,semamediaçãodegrupos,equea agregaçãodevotosindividuaisemdistritoseleitoraispara elegerrepresentanteséaúnicaformadeimplementartal individualismopolítico29 .Outros,comojáapontei,conside- ramarepresentaçãodegrupossuspeitadeumaessenciali-zaçãoenviesadaeequivocada.
172
Noentanto,muitosdosqueadvogamarepresentação específicademulheres,oudeafro-americanos,oudeclas-sesoudeaborígines,achariamabsurdaasugestãodeque atributos físicos ou de pertencimentoem si mesmos pode- riamfundamentararepresentaçãodedeterminadaspes-soasporoutrascomatributossemelhantes.Emvezdisso, argumentameles,mulheres,aboríginesetc.têmexperiên-ciassemelhantesqueapenasosmembrosdeseuspróprios grupospodemcompreendercomomesmoimediatismo. Paraoutros,contudo,justificararepresentaçãodegrupos emtermosdeexperiências,interessesouopiniõessuposta- mentecompartilhadasportodososmembrosdogrupoobs-cureceasdiferençasinternasdesteeerroneamentereduz todososmembrosaumaessênciacomum,demodoqueos grupossetornariamdetalformadistintosunsdosoutros quelhesseriamimpossíveisoentendimentoeacooperação emsuasdiferenças32.
Ateoriadarepresentaçãoqueapresenteiaquipoderes-ponderaalgumasdessasquestõessobrearepresentaçãode grupos.Emqualquerformaqueassuma,arepresentação degruposnãodeveserconcebidasomenteporreferência a atributos compartilhados por pessoas, assim como não consistenamanifestaçãodealgumconjuntodeopiniões, interessesouexperiênciasquetodososmembrosdogru-pocompartilhem.Comojáressaltei,umatalinterpretação segue uma lógica identitária, em vez de conceitualizar a representaçãocomoumprocessodiferenciadoderelações entreorepresentanteeosrepresentados.
Poroutrolado,essateoriarejeitaumpressupostoque estáimplícitoemmuitasdasobjeçõesàrepresentaçãode grupos:odequeaparticipaçãodeumapessoanumorganis-mosociopolíticoemlargaescalapodeserdealgummodo