José Carlos Valencia Alvites
Orientador: Prof. Dr. Paulo Afonso Faria da Veiga
Dissertação apresentada ao Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação - ICMC-USP, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ciências - Matemática . VERSÃO REVISADA
USP – São Carlos
Março de 2012
Data de Depósito: 26/03/2012
com os dados fornecidos pelo(a) autor(a)
V152h
Valencia Alvites, José Carlos
Hipótese de Riemann e física / José Carlos Valencia Alvites; orientador Paulo Afonso Faria da Veiga. --São Carlos, 2012.
94 p.
Dissertação (Mestrado - Programa de Pós-Graduação em Matemática) -- Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação, Universidade de São Paulo, 2012.
1. Função zeta de Riemann. 2. Hipótese de Riemann. 3. Zeros não triviais. 4. Teorema dos Números
Agradecimentos
Meus mais sinceros agradecimentos, sem d´uvida, aos meus pais, Lucy e Rosalio, os amo
por acima de tudo, que sempre acreditaram em mim apesar dos meus defeitos, pelo apoio,
muito obrigado mam´a e pap´a.
A Mary, meu amor, minha companheira, minha melhor amiga, que sempre leva o melhor de mim, que me ensinou a ser uma pessoa melhor, pelo apoio em tempos dif´ıceis, pelas
cr´ıti-cas, para ela com amor e admira¸c˜ao, obrigado bebe.
Ao Professor Paulo, meu orientador, que me apoiou na minha estadia em S˜ao Carlos, pela
orienta¸c˜ao, amizade e por sempre estar disposto a me ajudar no trabalho, este trabalho ´e em
grande parte o produto de suas id´eias e sugest˜oes, professor muito obrigado por seu apoio a
vocˆe e sua fam´ılia que foram muito gentis comigo.
Aos Professores Edgar Vera, que foi meu orientador na gradua¸c˜ao, e Luis Carrillo,
pro-fessores da Facultad de Ciencias Matem´aticas da UNMSM, no Per´u.
Ao ICMC, por me dar a oportunidade.
Aos professores do ICMC pela importante forma¸c˜ao academica.
`
A CAPES, pelo apoio financeiro, sem o qual n˜ao seria poss´ıvel a realiza¸c˜ao deste trabalho,
Resumo
Neste trabalho, introduzimos a fun¸c˜ao zeta de Riemann ζ(s), para
s ∈ C\{1} e apresentamos muito do que ´e conhecido como
justifica-tiva para a hip´otese de Riemann. A importˆancia de ζ(s) para a teoria
anal´ıtica dos n´umeros ´e enfatizada e fornecemos uma prova conhecida
do Teorema dos N´umeros Primos. No final, discutimos a importˆancia de
ζ(s) para alguns modelos f´ısicos de interesse e concluimos descrevendo
Abstract
In this work, we introduce the Riemann zeta function ζ(s), s ∈
C\{1} and present much of what is known to support the Riemann
hypothesis. The importance of ζ(s) to the Analytic number theory is
emphasized and a proof for the Prime Number Theorem is reviewed. In
the end, we report on the importance ofζ(s) to some relevant physical
Sum´
ario
1 Introdu¸c˜ao e Motiva¸c˜ao 1
2 Preliminares 5
2.1 Fun¸c˜ao Gama de Euler . . . 5
2.2 A Fun¸c˜ao Zeta de Riemann . . . 13
2.3 Fun¸c˜oes Inteiras de Ordem Um . . . 24
3 A Hip´otese de Riemann 33 3.1 Estabelecendo a Hip´otese de Riemann . . . 33
3.2 Os Zeros n˜ao-triviais de ζ(s) e a Teoria Anal´ıtica dos N´umeros. . . 41
3.3 A Conjetura de Hilbert-P´olya e a Hip´otese de Riemann . . . 55
3.4 Outras Formula¸c˜oes Equivalentes para a Hip´otese de Riemann . . . 55
4 Zeta de Riemann e a F´ısica 63 4.1 Regulariza¸c˜ao Zeta . . . 64
4.2 O Bilhar Circular Aberto . . . 69
4.3 Mecˆanica Estat´ıstica . . . 74
5 Considera¸c˜oes Finais 77
A Informa¸c˜oes Adicionais 79
B Mais Informa¸c˜oes 87
´Indice Remissivo 95
Nota¸
c˜
ao
C O conjunto dos n´umeros complexos.
Z O conjunto dos n´umeros inteiros.
N O conjunto dos n´umeros inteiros n˜ao negativos.
R O conjunto dos n´umeros reais.
Γ(s) A fun¸c˜ao Gama de Euler.
ζ(s) A fun¸c˜ao Zeta de Riemann.
ξ(s) A ξ-fun¸c˜ao de Riemann.
S A faixa cr´ıtica.
L A reta cr´ıtica.
Λ(x) A fun¸c˜ao de von Mangoldt.
Ψ(x) A fun¸c˜ao de Chebyshev.
π(x) A fun¸c˜ao de contagem de n´umeros primos.
γE A constante de Euler-Mascheroni.
LQ O conjunto dos n´umeros livres de quadrados.
H(Ω) O conjunto das fun¸c˜oes anal´ıticas em Ω⊆C.
[·] A fun¸c˜ao ch˜ao.
Li(x) A fun¸c˜ao integral logar´ıtmica Euleriana.
1
Introdu¸
c˜
ao e Motiva¸
c˜
ao
Em 1737, Euler provou que a s´erie (Pdenota o conjunto dos n´umeros primos)
X
p∈P
1
p,
diverge, o que implica na existˆencia de infinitos n´umeros primos. Um outro resultado
impor-tante obtido por Euler ´e apresentado na seguinte f´ormula
Y
p∈P
1− 1
ps
−1
=X
n≥1
1
ns, ∀s∈R, s >1. (1.1)
Euler tamb´em calculou a soma da s´erie infinitaPn≥1n1s, paras= 2, encontrando o valor
X
n≥1
1
n2 =
π2
6 .
Um m´etodo interessante para calcular o valor dePn≥1n1s, paraspar esinteiro negativo
´ımpar, ´e descrito no Apˆendice B. A rela¸c˜ao expressa na equa¸c˜ao (1.1) foi o est´ımulo inicial
para que Riemann iniciasse suas pesquisas envolvendo a s´erie infinitaPn≥1 n1s. Na sua c´elebre
publica¸c˜ao de 1859, entituladaSobre os N´umeros Primos Menores que uma Magnitude Dada
[20], Riemann considerou a fun¸c˜ao
ζ(s) =X n≥1
1
ns. (1.2)
Queζ(s) ´e facilmente estendida para valores descomplexos localizados no semi-plano
com-plexo{s∈C:R(s)>1}´e uma consequˆencia imediata do fato que|ns|=na, ondes=a+ib;
a, b∈ R, i2 = −1, implicando na convergˆencia absoluta da s´erie no lado direito da equa¸c˜ao
(1.2), neste dom´ınio. Contudo, neste trabalho, Riemann n˜ao apenas considerou o dom´ınio
acima, mas a extens˜ao de ζ(s) no conjunto C\{1}.
Para ver queζ(s) pode ser estendida como uma fun¸c˜ao meromorfa em C, com uma ´unica
singularidade descrita por um polo simples em s= 1, n˜ao podemos usar a equa¸c˜ao (1.2). Ao
contr´ario, n´os nos servimos de uma extens˜ao meromorfa da fun¸c˜ao Γ(s) de Euler, que ´e uma
generaliza¸c˜ao da fun¸c˜ao fatorial. Ao mesmo tempo, com a ajuda desta fun¸c˜ao Γ(s) obtemos
uma rela¸c˜ao funcional compat´ıvel, que concorda com (1.2) em R(s) >1, dada a seguir [10]
(Mais adiante no texto, estabeleceremos esta rela¸c˜ao!)
ζ(s) = 2sπs−1sinπs 2
Γ(1−s)ζ(1−s), ∀s∈C\{1}. (1.3)
A extens˜ao meromorfa da fun¸c˜ao zeta de Riemann,ζ(s) definida em (1.2), com s∈C\ {1},
´e o tema central desta disserta¸c˜ao. Esta fun¸c˜ao ´e o ingrediente principal de um dos mais
complexos e ricos problemas da matem´atica moderna, conhecido como a “A Hip´otese de
Riemann”, o qual se manifesta e afeta um grande n´umero de ´areas da Matem´atica. ´
E f´acil mostrar, considerando o anulamento da fun¸c˜ao sin πs2 em (1.3), que ζ(s) possui
ra´ızes triviais em s = −2,−4,−6, . . . A Hip´otese de Riemann conjetura que ζ(s) apresenta
tamb´em zeros n˜ao-triviais nareta cr´ıtica
{s∈C:R(s) = 1
2}.
Essa conjetura emergiu do fato que Riemann calculou trˆes zeros, usando o que ´e hoje con-hecida como a f´ormula de Riemann-Seigel [10]. Outros zeros na reta cr´ıtica foram obtidos analiticamente por outros renomados matem´aticos (Gram, Backlund, Hutchinson, Titch-marsh, Turing, Lehmer, Meller, Lehman, Rosser, Yohe, Schoenfeld, Brent, van de Lune, te
Riele, Winter, Odlyzko, Wedeniwski, Gourdon e Patrick Demichel), e hoje j´a conhecemos
mais de 1,5 bilh˜oes de zeros aproximados na reta cr´ıtica, obtidos usando m´etodos num´ericos
[27]. Ademais, mostra-se em alguns casos, e h´a forte indica¸c˜ao nos tratamentos num´ericos,
que todos os zeros s˜ao simples, isto ´e, de multiplicidade um.
A Hip´otese de Riemann faz parte da lista dos 23 grandes problemas da Matem´atica
pro-postos por Hilbert no Congresso Internacional de Matem´aticos de Paris, em 1900, sendo
ainda um dos poucos por resolver, juntamente com a Conjetura de Goldbach (Todo n´umero
par maior ou igual a 4 ´e a soma de dois primos.) e o Teorema de Kronecker-Weber
es-tendido para corpos n˜ao-abelianos (No caso abeliano, este teorema estabelece queum corpo
num´erico alg´ebrico cujo grupo de Galois sobre Q seja abeliano, ´e um subcorpo de um corpo ciclotˆomico, ou seja, um corpo obtido ao adicionar-se uma raiz complexa da unidade aos n´umeros racionais.).
Como dissemos acima, na Matem´atica, a fun¸c˜ao zeta e a Hip´otese de Riemann tem
con-sequˆencias em diversas ´areas. Um exemplo marcante ´e a Teoria dos N´umeros, e todos os
dom´ınios que se relacionam com ela (Teoria dos C´odigos, Geometria Alg´ebrica, etc), onde
observamos que ζ(s) nos fornece uma medida da densidade dos n´umeros primos na reta real
uma “contagem” (estimativa) dos n´umeros primos, obtido original e independentemente por Jacques Hadamard e Charles Jean de la Vall´ee-Poussin. Posteriormente, este teorema foi
demonstrado, sem usar a Teoria Anal´ıtica dos N´umeros, por Atle Selberg e Paul Erd¨os.
Selberg tamb´em obteve uma famosa f´ormula de tra¸co com seu nome [22], que apresenta
uma rela¸c˜ao estreita com os zeros de ζ(s) (O Teorema dos N´umeros Primos ser´a tratado na
se¸c˜ao 3.2). Podemos continuar mencionando tamb´em a Teoria de Operadores (Conjetura de
Hilbert-P´olya), a Teoria das Matrizes Aleat´orias, etc.
A rela¸c˜ao deζ(s) e da Hip´otese de Riemann com temas da F´ısica ´e tamb´em muito vasta.
Por exemplo, na Mecˆanica Cl´assica, est˜ao associados com o bilhar circular aberto [7], na
Mecˆanica Estat´ıstica Cl´assica, temos o Teorema de Lee-Yang sobre os zeros de fun¸c˜oes de
parti¸c˜ao, as quais determinam as quatidades termodinˆamicas de sistemas tais como gases e
cadeias de spins [14], [16] e os fenˆomenos de transi¸c˜oes de fase (bifurca¸c˜oes) que podem
ocor-rer nos mesmos. Na Mecˆanica Estat´ıstica Quˆantica, os zeros deζ(s) aparecem, por exemplo,
na descri¸c˜ao do sistema de um g´as dito Riemannium [18]. As matrizes aleat´orias tamb´em
s˜ao frenquente vari´aveis na Mecˆanica Estat´ıstica e seu espectro importante para descrever as
propriedades destes sistemas. Relacionam-se, conforme exposto acima, naturalmente com a
Hip´otese de Riemann. A fun¸c˜aoζ(s) fornece uma ferramenta muita utilizada para a
regular-iza¸c˜ao de operadores, fornecendo um sentido matem´atico para integrais de caminho utilizadas
por Hawking [29]. ζ(s) tamb´em aparece em sistemas dinˆamicos recorrentes na teoria do Caos
Quˆantico (fase de Berry) [4] e a f´ormula de Selberg relaciona-se, por exemplo, com modelos
f´ısicos com espa¸co tempo do tipo Kaluza-Klein [29].
Curiosamente, embora confirmar ou n˜ao a Hip´otese de Riemann seja um dos
proble-mas mais importantes da Matem´atica, entendemos que ´e muito frequente que profissionais e
pesquisadores da Matem´atica n˜ao conhecem seus requisitos m´ınimos. Entendemos tamb´em
que essa atitude prov´em de muitos fatores, at´e aqueles que fogem do escopo da ciˆencia em si. Contudo, pensamos ser esta uma atitude pouco recomendada aqui.
Neste contexto, decidimos preparar e redigir um texto contendo alguns dos pontos
fun-damentais para que qualquer estudioso da matem´atica, a come¸car por um estudante em vias
de se graduar, possa compreender e estabelecer uma id´eia geral b´asica do problema.
De forma alguma deve o leitor concluir que nos tornamos um expert no assunto, sobretudo
porque, como frisamos acima, trata-se aqui de um assunto n˜ao trivial e extremamente amplo.
Nosso texto, esperamos, poder´a ser considerado uma porta de entrada no tema.
Com este prop´osito, procuramos apresentar um texto relativamente auto-contido, com
muitas das demonstra¸c˜oes b´asicas e todos os ingredientes necess´arios ao tema.
Infelizmente, s´o tomamos conhecimento do excelente livro [6] quando este trabalho j´a
estava finalizado. Outras excelentes referˆencias no tema de ζ(s) s˜ao [10], [15], [26] e [9].
Sobre o uso extensivo de resultados gen´ericos de An´alise Complexa temos as referˆencias [8] e
[1].
Para completar nosso trabalho, realizamos uma discuss˜ao breve e pouco aprofundada
Por fim, vale mencionar que al´em da solu¸c˜ao de um grande problema em si, a confirma¸c˜ao
da Hip´otese de Riemann trar´a um aprimoramento do n´umero de primos menores que um
n´umero dado x, refinando o resultado atual do Teorema dos N´umeros Primos (ver se¸c˜ao 3.2
do cap´ıtulo 3).
Concluindo, esperamos que o leitor interessado consiga aqui se motivar para aprimorar
seus conhecimentos no tema e, qui¸c´a, poder juntar algum gr˜ao de conhecimento a tudo o que
2
Preliminares
Neste cap´ıtulo, apresentamos resultados b´asicos cl´assicos e algumas defini¸c˜oes a serem
uti-lizados no decorrer do trabalho. Apresentamos algumas provas que, a nosso ver, n˜ao s˜ao
facil-mente encontrados na literatura na forma aqui apresentada ou cujas demonstra¸c˜oes trazem algum argumento t´ecnico que seja relevante em algum ponto subsequente do texto.
No que segue, usamos as seguintes nota¸c˜oes. Dadosa,b∈R, coma < b, denotamos
H(a, b) ={z∈C:a <R(z)< b},
e, convencionamos que
H(a,+∞) ={z∈C:a <R(z)} e H(−∞, b) ={z∈C:R(z)< b}.
Tamb´em, para Ω⊆ C denotamos por H(Ω) o conjunto das fun¸c˜oes anal´ıticas (holomorfas)
em Ω eB(0;R) ´e o disco em Ccom centro em 0 e raio R > 0. As nota¸c˜oesO,Oǫ,≪ e ≪ǫ
ser˜ao muito usadas no texto e foram definidas no Apˆendice A.
2.1
Fun¸
c˜
ao Gama de Euler
A fun¸c˜ao Gama ´e a aplica¸c˜ao Γ :H(0,+∞)→Cdefinida como
Γ(z) :=
Z ∞
0
e−ttz−1dt. (2.1)
Para ver que a defini¸c˜ao acima faz sentido, observamos que se H(0,+∞)∋z=σ+iτ,σ,
τ ∈R, ent˜ao
Z ∞
0
e−ttz−1dt=
Z 1 0
e−ttz−1dt+
Z ∞
1
e−ttz−1dt.
Analisamos as duas integrais do lado direito:
R1
0 e−ttz−1dt : Claramente
R01e−ttz−1dt
≤R01e−ttz−1
dt =R01e−ttσ−1dt. Logo comoet > 1, para qualquer t∈(0,1), ent˜ao e−t<1, assim
e−ttσ−1< tσ−1, ∀t∈(0,1)⇒
Z 1 0
e−ttσ−1dt < Z 1
0
tσ−1dt <∞
⇒ Z 1
0
e−ttz−1dt <∞.
R∞
1 e−ttz−1dt : An´alogo ao caso anterior,
R1∞e−ttz−1dt
≤ R1∞e−ttσ−1dt. Agora, como
et=Pk≥0 tkk! ent˜ao tnn! ≤et para qualquer t≥1 e n∈N. Assim, consideremos n′ ∈N
tal que σ < n′, ent˜ao σ−(n′+ 1)<0, logo
e−ttσ−1 ≤tσ−(n′+1)n′!, ∀t≥1⇒
Z ∞
1
e−ttσ−1dt≤n′! t σ−n′ σ−n′
! +∞
1 =
n′!
n′−σ <∞
⇒ Z ∞
1
e−ttz−1dt
<∞, ∀z∈H(0,+∞).
Portanto, Γ(z) ´e bem definida. Al´em disso, pelo m´etodo de integra¸c˜ao por partes, ´e claro
que, para z∈H(0,+∞), temos a recorrˆencia
Γ(z+ 1) =zΓ(z). (2.2)
Ademais, pelo c´alculo direito, Γ(1) = Γ(2) = 1.
Assim, para qualquer n∈N,
Γ(n) = (n−1)!,
o que tamb´em justifica escrever 0! = 1.
Agora vamos provar que Γ(z) pode ser estendida para uma fun¸c˜ao meromorfa emC. Para
este fim, usamos o seguinte lema.
Lema 2.1 . Seja (cn)∞n=0 uma sequˆencia em C tal que
P
n≥0|cn| converge e S ={−n:n∈
N∪ {0} ecn6= 0}. Ent˜ao,f(z) =Pn≥0 zc+nn converge absolutamente para qualquer z∈C\S e uniformemente em subconjuntos limitados de C\S. Al´em disso, f ´e uma fun¸c˜ao meromorfa em C com polos simples no conjunto S e Res(f,−n) =cn, para qualquer −n∈S.
Demonstra¸c˜ao: Seja A ⊂ C um conjunto limitado. Ent˜ao, existe R > 0 tal que A ⊆
B(0;R). Assim,|z|< Rpara qualquerz∈A. Logo, sen≥Rtemos|z+n| ≥n−|z| ≥n−R.
Isto implica que| 1
z+n| ≤ n−1R, para|z|< Re n > R. Portanto, se n0> R,
m
X
n=n0
cn
z+n ≤
m
X
n=n0
|cn|
|z+n| ≤
m
X
n=n0
|cn|
n−R ≤
1
n0−R
m
X
n=n0
|cn|
!
, ∀m≥n0.
Da ´ultima desigualdade, temos que a s´erie Pn>R cn
z+n converge absolutamente. Ademais,
como | cn
z+n| ≤ | cn|
no conjunto A. Isto implica que a s´erie Pn≥0 cn
z+n define uma fun¸c˜ao que tem um n´umero
finito de polos simples emS que est˜ao contidos emB(0;R). Portanto, temos que
f(z) =X n≥0
cn
z+n,
´e uma fun¸c˜ao meromorfa com polos simples em S. Ent˜ao, para qualquer −n ∈ S podemos
escrever
f(z) = cn
z+n+
X
−m∈S−{−n}
cm
z+m,
ondeP−m∈S−{−n} cm
z+m ´e uma fun¸c˜ao anal´ıtica emz=−n. Assim, Res(f,−n) =cn e como
n´e arbitr´ario, temos Res(f,−n) =cn, ∀ −n∈S.
Finalmente, podemos estabelecer o seguinte teorema.
Teorema 2.2 . Γ(z) pode ser estendida a uma fun¸c˜ao meromorfa no plano complexo, com polos simples em 0,−1,−2, .... Al´em disso, vale que
Res(Γ,−n) = (−1) n
n! .
Demonstra¸c˜ao: Para z∈H(0,+∞), temos
Γ(z) =
Z ∞
0
tz−1e−tdt=
Z 1 0
tz−1e−tdt+
Z ∞
1
tz−1e−tdt. (2.3)
A segunda integral do lado direito converge para todoz=x+iy∈C. De fato,
Z ∞
1
tz−1e−tdt ≤
Z ∞
1
tx−1e−tdt.
Repetindo o argumento acima, lembrando que, para t ≥ 1, ntn! ≥e−t para qualquer n∈ N,
sejanx∈Ntal que nx> x, ent˜ao x−(nx+ 1)<0 assim temos
Z ∞
1
tx−1e−tdt≤nx!
Z ∞
1
tx−(nx+1)dt=n
x!
lim t→+∞
tx−nx
x−nx − 1
x−nx
= nx!
nx−x
.
Assim temos que, para qualquerz∈C,R1∞tz−1e−tdtconverge, ent˜ao esta integral representa
uma fun¸c˜ao inteira. Por outro lado, como a fun¸c˜ao exponencial ´e inteira, a sua s´erie de Taylor
converge uniformemente em subconjuntos compactos deCe temos
Z 1 0
tz−1e−tdt =
Z 1 0
tz−1
X
n≥0
(−1)ntn n!
dt
= X
n≥0
(−1)n
n!
Z 1 0
tn+z−1dt
= X
n≥0
(−1)n
n!
1
n+z
Assim, substituindo em (2.3), obtemos
Γ(z) =X
n≥0
(−1)n
n!
1
n+z
+
Z ∞
1
tz−1e−tdt, (2.4)
para qualquerz∈H(0,+∞), logo comoPn≥0 (−n1)!n <∞, pelo Lema 2.1, o lado direito desta
´
ultima igualdade define uma fun¸c˜ao meromorfa em C com polos simples em 0,−1,−2, ... e
Res(Γ,−n) = (−n1)!n.
No restante deste trabalho, para evitar confus˜ao e para evitar a introdu¸c˜ao de novas
nota¸c˜oes, vamos continuar denotando por Γ(z) a extens˜ao meromorfa da fun¸c˜ao Γ(z) definida
em (2.1). Agora, ´e claro que, de (2.2) e do Teorema 2.2 , temos o seguinte corol´ario.
Corol´ario 2.3 . Para qualquer z∈C\{−1,−2,−3, . . .}
Γ(z+ 1) =zΓ(z).
Como exemplo, vamos verificar a consistˆencia de (2.4) com o corol´ario ´ultimo. Seja
z∈C\ {−1,−2, . . .}, ent˜ao de (2.4) temos
Γ(z+ 1) = X
n≥0
(−1)n
n!
1
n+ 1 +z
+
Z +∞
1
tze−tdt
= X
n≥0
(−1)n+1 (n+ 1)!
− n+ 1
n+ 1 +z
+ (−e−ttz)
+∞
1 +z
Z +∞
1
tz−1e−tdt
= X
n≥0
(−1)n+1 (n+ 1)!
z
n+ 1 +z −1
+1
e +z Z +∞
1
tz−1e−tdt
= z X
n+1=m≥1
(−1)m
m!
1
m+z
− X
n+1=m≥1
(−1)m
m! + 1
e +z Z +∞
1
tz−1e−tdt
= z
X
m≥1
(−1)m
m!
1
m+z + 1 z − X
m≥1
(−1)m
m! + 1
+1
e +z Z +∞
1
tz−1e−tdt
= zX
m≥0
(−1)m
m!
1
m+z
−X
m≥0
(−1)m
m! + 1
e+z Z +∞
1
tz−1e−tdt
= zX
m≥0
(−1)m
m!
1
m+z
−1e +1
e +z Z +∞
1
tz−1e−tdt
= z
X
m≥0
(−1)m
m!
1
m+z
+
Z +∞
1
tz−1e−tdt
= zΓ(z).
Agora, com ajuda da fun¸c˜ao Γ(z) vamos definir a fun¸c˜ao Beta que ser´a de utilidade na
parte de regulariza¸c˜ao Zeta (se¸c˜ao 4.1). Observamos que, para u, v∈H(0,+∞),
Γ(u) =
Z ∞
0
e−ttu−1dt e Γ(v) =
Z ∞
0
Logo, fazendo a mudan¸cat=x2, temos Γ(u) =
Z ∞
0
e−x2x2(u−1)2xdx= 2
Z ∞
0
e−x2x2u−1dx.
Analogamente,
Γ(v) = 2
Z ∞
0
e−x2x2v−1dx.
Multiplicando as duas igualdades anteriores
Γ(u)Γ(v) = 4
Z ∞
0
e−x2x2u−1dx
Z ∞
0
e−y2y2v−1dy
= 4
Z ∞
0
Z ∞
0
e−(x2+y2)x2u−1y2v−1dxdy.
Considerando a integral dupla e usando coordenadas polares, obtemos
Γ(u)Γ(v) = 4
Z π
2
0
Z ∞
0
e−r2r2(u+v)−1cos2u−1θsin2v−1θdrdθ
=
2
Z ∞
0
e−r2r2(u+v)−1dr
2
Z π
2
0
cos2u−1θsin2v−1θdθ !
=
Z ∞
0
e−r2(r2)((u+v)−1)2rdr
2
Z π
2
0
cos2u−1θsin2v−1θdθ !
⇒Γ(u)Γ(v) = Γ(u+v) 2
Z π
2
0
cos2u−1θsin2v−1θdθ !
. (2.5)
A integral da ´ultima express˜ao pode ser calculada como segue:
2
Z π
2
0
cos2u−1θsin2v−1θdθ=
Z π
2
0
(cos2θ)u−1(sin2θ)v−1(2 cosθsinθ)dθ
=
Z π
2
0
(1−sin2θ)u−1(sin2θ)v−1(2 cosθsinθ)dθ,
e, fazendo a mudan¸cas= sin2θ, temos
2
Z π
2
0
cos2u−1θsin2v−1θdθ=
Z 1 0
(1−s)u−1sv−1ds.
Ent˜ao, a fun¸c˜ao beta B(v, u) ´e definida como
B(v, u) :=
Z 1 0
(1−s)u−1sv−1ds. (2.6)
Logo, de (2.5) temos
Γ(u)Γ(v) = Γ(u+v)B(v, u), (2.7)
Sejax∈(0,1). Da equa¸c˜ao acima temos
Γ(x)Γ(1−x) = Γ(1)B(x,1−x) =
Z 1 0
(1−s)1−x−1sx−1ds=
Z 1 0
(1−s)−xsx−1ds.
Fazendo a mudan¸ca de vari´aveiss= uu+1, obtemos
Γ(x)Γ(1−x) =
Z +∞
0
u u+ 1
x−1
1− u
u+ 1
−x 1
(u+ 1)2du=
Z +∞
0
ux−1 u+ 1du.
Agora, usando este resultado, vamos provar uma rela¸c˜ao que vai ser de muita utilidade, no
que segue, e que nos diz que Γ(z) n˜ao tem zeros. Para este fim, vamos usar o seguinte lema.
Lema 2.4 . Paray ∈(0,1), temos
Z +∞
0
u−y u+ 1du=
π
sinπy.
Demonstra¸c˜ao: Considere o conjunto G ={z ∈ C:z = 06 ,arg(z)∈ (0,2π)}, e o ramo do logaritmo seguinte
log(reiθ) = logr+iθ
onde θ ∈ (0,2π). Logo, para z ∈ G seja f(z) := e−ylogz. Assim f ´e um ramo da fun¸c˜ao
exponencialz−y. Agora, considere emC o caminho dado na Fig. 2.1,
Figura 2.1: Caminho γ usado na integral da Eq. (2.8).
onde 0< r <1< R. Assim, temos que seγ :=CR+L2+Cr+L1. Como γ ´e homot´opica a
zero e desde que limz→−1(z+ 1)fz(+1z) =e−πiy, temos que Res
f(z)
z+1,−1
=e−πiy. Assim, pelo
Teorema dos res´ıduos temos I
γ
f(z)
z+ 1dz = 2πie
Agora observemos o que acontece com as integraisRL1 fz+1(z)dz e RL2 fz+1(z)dz:
Z
L1
f(z)
z+ 1dz=
Z R
r
f(teiα)
teiα+ 1e
iαdt, (2.9)
consideremosg: [r, R]×[0,π2]→Rdefinida como
g(t, α) =f(te iα)
teiα+ 1e
iα− t−y
t+ 1
.
´
E claro que g(t,0) = 0, para qualquer t ∈ [r, R]. Como [r, R]×[0,π2] ´e compacto, ent˜ao
g ´e uniformemente cont´ınua. Assim, para qualquer ε > 0, existe δ0 > 0 de modo que se
(t−t′)2+ (α−α′)2 < δ20
⇒g(t, α)−g(t′, α′)< ε R.
Em particular, set′ =te α′ = 0, temos
g(t, α) =|g(t, α)|< ε
R, ∀α < δ0
⇒
Z R
r
g(t, α)dt≤ ε(R−r)
R < ε, ∀α < δ0
⇒ Z R
r
f(teiα)
teiα+ 1e
iαdt−Z R r
t−y
t+ 1dt
< ε, ∀α < δ0
⇒ lim α→0+
Z
L1
f(z)
z+ 1dz= limα→0+
Z R
r
f(teiα)
teiα+ 1e iαdt=
Z R
r
t−y
t+ 1dt. (2.10)
Similarmente, como log(z) = log(z) + 2πi, ent˜ao
Z
L2
f(z)
z+ 1dz=
Z r
R
f(te−iα)
te−iα+ 1e−
iαdt=Z r
R
f(teiα)
te−iα+ 1e−
iαdt=Z r
R
e−ylog(teiα) te−iα+ 1 e−
iαdt
=
Z r
R
e−y(log(teiα)+2πi) te−iα+ 1 e−
iαdt=
−e−2πyi Z R
r
e−y(log(teiα)) te−iα+ 1 e−
iαdt
⇒
Z
L2
f(z)
z+ 1dz=−e−
2πyi
Z R
r
e−y(log(teiα)) te−iα+ 1 e−
iαdt. (2.11)
Semelhante ao caso anterior, consideremosh: [r, R]×[0,π2]→R, dada por
h(t, α) =e−
y(log(teiα))
te−iα+ 1 e−
iα− t−y
t+ 1
.
Ainda, como no caso anterior, h ´e uniformemente cont´ınua e h(t,0) = 0 para qualquer
t∈[r, R]. Portanto,∀ε >0,∃δ1 >0 de modo que
h(t, α)< ε
R, ∀α < δ1 ⇒ Z R
r
e, pela defini¸c˜ao de limite
lim α→0+
Z
L2
f(z)
z+ 1dz =−e
−2πyi lim α→0+
Z R
r
e−y(log(teiα)) te−iα+ 1 e−
iαdt
!
=−e−2πyi Z R
r
t−y
t+ 1dt. (2.12)
N´os estimamos agora as integrais RC
R
f(z)
z+1dz e
R
Cr
f(z)
z+1dz:
zf+ 1(z)
≤ |z|−
y
|z+ 1| ≤
|z|−y
|1− |z||
⇒ Z
Cr
f(z)
z+ 1dz
≤ 2πr
1−y
1−r e
Z
CR
f(z)
z+ 1dz
≤ 2πR
1−y
R−1
⇒ lim r→0
Z
Cr
f(z)
z+ 1dz = limR→+∞
Z
CR
f(z)
z+ 1dz = 0. (2.13)
Agora, da equa¸c˜ao (2.8), temos
Z
CR
f(z)
z+ 1dz+
Z
L2
f(z)
z+ 1dz+
Z
Cr
f(z)
z+ 1dz+
Z
L1
f(z)
z+ 1dz=
I
γ
f(z)
z+ 1dz= 2πie− iπy
⇒
Z
CR
f(z)
z+ 1dz+
Z
Cr
f(z)
z+ 1dz = 2πie
−iπy−Z L2
f(z)
z+ 1dz+
Z
L1
f(z)
z+ 1dz
,
ent˜ao, de (2.9), (2.10), (2.11), (2.12) e (2.13) obtemos
lim α→0+
Z
CR
f(z)
z+ 1dz+
Z
Cr
f(z)
z+ 1dz
= 2πie−iπy−(1−e−2πyi)
Z R
r
t−y
t+ 1dt.
Logo, pela defini¸c˜ao de limite, para qualquerη >0 existeδ >0 de modo que, se 0< α < δ,
⇒2πie−iπy−(1−e−2πyi)
Z R
r
t−y
t+ 1dt−
Z
CR
f(z)
z+ 1dz+
Z
Cr
f(z)
z+ 1dz
< η
2.
Tomando os limitesR→+∞ e r→0, obtemos
2πie−iπy−(1−e−2πyi)
Z +∞
0
t−y
t+ 1dt
≤ η
2 < η.
Finalmente, como η >0 ´e arbitr´ario, segue que
Z +∞
0
t−y
t+ 1dt=
2πie−πiy 1−e−2πiy =
π
sin(πy).
Para concluir, conforme foi mencionado antes do Lema 2.4 , que Γ(z) n˜ao possui zeros,
estabelecemos a seguinte proposi¸c˜ao.
Proposi¸c˜ao 2.5 . Para qualquer s∈C\Z temos
Γ(s)Γ(1−s) = π
Demonstra¸c˜ao: Como Γ(x)Γ(1−x) = R0+∞uux+1−1du, para qualquer x ∈ (0,1), ent˜ao pelo lema anterior
Γ(x)Γ(1−x) = π
sinπ(1−x) =
π
sin(πx), x∈(0,1).
Al´em disso, como (0,1) tem pontos limite emC\Z, ent˜ao
Γ(s)Γ(1−s) = π
sin(πs), ∀s∈C\Z.
Assim, podemos estabelecer agora o teorema que segue.
Teorema 2.6 . A fun¸c˜ao Γ(z) n˜ao tem zeros.
Demonstra¸c˜ao: Pela proposi¸c˜ao anterior, para qualquers∈C\Z, temos que
Γ(s)Γ(1−s) = π
sin(πs).
Ent˜ao Γ(z) n˜ao tem zeros em C\Z, assim os ´unicos zeros poss´ıveis de Γ(z) s´o podem estar
em Z. Mas Γ(z) tem polos em 0,−1,−2, . . . e Γ(n) = (n−1)! para qualquer n ∈ N. Em
consequˆencia, Γ(z) n˜ao tem zeros.
2.2
A Fun¸
c˜
ao Zeta de Riemann
Nesta se¸c˜ao, vamos introduzir a fun¸c˜ao zeta de Riemann que ´e o tema central do nosso
trabalho. Vamos tamb´em fornecer algumas de suas propriedades. Uma delas, o Produto de
Euler dado no Teorema 2.7 , adverte-nos da sua rela¸c˜ao com a teoria dos n´umeros.
A fun¸c˜ao Zeta de Riemann ´e definida como a fun¸c˜aoζ :H(1,+∞)→Ctal que
ζ(s) :=X n≥1
1
ns. (2.14)
Para ver que esta defini¸c˜ao ´e boa, ´e suficiente provar que para qualquer s ∈ H(1,+∞),
P
n≥1 n1s <∞. Mais geralmente, vamos provar que a s´erie que define ζ(s) converge
absolu-tamente emH(1,+∞). Al´em disso, mostraremos queζ(s)∈H(H(1,+∞)).
De fato, primeiro vamos provar que a s´erie que define ζ(s) converge absolutamente em
H(1,+∞). Seja s=σ+it∈H(1,+∞), logo 1< σ. Comons =nσ+it =nσnit =nσeitlogn,
temos que para qualquerm∈N
m
X
n=1
n1s
=
m
X
n=1
1
nσ.
Agora consideremoss=σ+itfixo em H(1,+∞) e definimos f : [1,+∞) →R, do seguinte
modof(x) = x1σ. Claramente,f ´e decrescente e cont´ınua. Logo, usando o crit´erio da integral,
para a s´eriePn≥1n1σ, temos
Z +∞
1
1
uσdu= limb→+∞
Z b
1
1
uσdu= limb→+∞
b1−σ
1−σ −
1
1−σ =
1
Ent˜ao, para qualquers∈H(1,+∞), a somaPn≥1
n1s
´e convergente, logoPn≥1 n1s converge
absolutamente para todo s∈H(1,+∞).
Agora, provaremos que ζ(s) ´e uma fun¸c˜ao anal´ıtica em H(1,+∞). Para isto, basta provar
que a s´erie que defineζ(s) converge uniformemente em subconjuntos compactos deH(1,+∞).
Para tal, escrevemos ζ(s) = Pn≥1gn(s), onde {gn(s) = n1s}n∈N ⊆ H(H(1,+∞)). Seja
A ⊂ H(1,+∞), compacto. Como A ´e compacto, existe σ0 > 0 tal que, para qualquer
s=σ+it∈A, temos que 1< σ0≤σ, e ent˜ao
n1s
= 1
nσ ≤ 1
nσ0,
para qualquer s∈A. Como vimos na demonstra¸c˜ao de convergˆencia absoluta, Pn≥1n1σ0 <
∞. Ent˜ao, pelo teste de WeierstrassPn≥0 n1s converge uniformemente emAe,
consequente-mente,ζ(s) ´e anal´ıtica emH(1,+∞).
Vamos agora mostrar o primeiro resultado importante envolvendoζ(s).
Teorema 2.7 (Produto de Euler). Para s=σ+it∈H(1,+∞). Temos
ζ(s) =Y p∈P
1− 1
ps
−1
.
Demonstra¸c˜ao: SejaX∈N, comX≥2, e consideremos a fun¸c˜ao
ζX(s) :=
Y
p∈P
p≤X
1− 1
ps
−1
.
Observemos que, como p1s
= p1σ <1, vale
1− 1
ps
−1
=X
k≥0
1
pks.
Assim, a convergˆencia da s´erie no lado direito ´e absoluta. Logo, se p1, p2, . . . , pm ∈ P, s˜ao
tais que 2 =p1 < p2 < . . . < pm ≤X, ent˜ao
Y
p∈P
p≤X
1− 1
ps
−1
=
X
k1≥0
1
pk1s1
X
k2≥0
1
pk2s2 . . .
X
km≥0
1
pkms
m
= X k1,...,km≥0
1 (pk11 . . . pkm
m )s
.
Agora, notemos que a s´erie m´ultipla acima n˜ao tem termos repetidos, pois, se
1 (pk11 . . . pkm
m )s
= 1
(pr11 . . . prm
m )s ⇒p k1
1 . . . pkmm =pr11 . . . prmm.
Logo, pelo Teorema Fundamental da Aritm´etica, concluimos que k1 =r1, . . . , km =rm.
Al´em disso, para qualquer n∈N e n≤X, existemk1, . . . , km ∈N tais que n=pk11 . . . pkmm.
Como esta descomposi¸c˜ao ´e ´unica temos que
Y
p∈P
p≤X
1− 1
ps
−1
= X
n≤X 1
ns +
′
X
n>X 1
onde ′ denota a soma de todos os n´umeros naturais maiores que X, de tal forma que seus
divisores primos s˜ao≤X. Agora, concentremo-nos nesta ´ultima soma. Temos
′ X n>X 1 ns ≤ ′ X n>X 1
nσ <
X
n>X 1
nσ.
Novamente, consideremosf : [1,+∞)→ R, definida como f(x) = x1σ. Assim, dado M ∈ N
com M ≥X, consideremos a parti¸c˜ao Q={X < X + 1< . . . < M} de [X, M]. Com isso,
considerando a soma inferiors(f, Q) de f em rela¸c˜ao a Q, podemos escrever
s(f, Q)
| {z }
f(X+1)+f(X+2)+...+f(M)=PM n>Xnσ1
≤
Z M
X
f(u)du=
Z M
X 1
uσdu≤
Z M
X 1
uσdu+ 1 Xσ ⇒ M X n>X 1
nσ ≤
u1−σ
1−σ
M X + 1 Xσ ⇒ ∞ X n>X 1
nσ ≤
X1−σ σ−1 +
1
Xσ ≤ 1
Xσ−1 +
X1−σ σ−1 =
σX1−σ σ−1
⇒ ′ X n>X 1 ns < σX
1−σ
σ−1 .
Assim, X1−σ → 0, quando X → +∞, pois σ > 1. Isso implica que P′n>X n1s → 0, quando
X→+∞. Consequentemente,
Y
p∈P
p≤X
1− 1
ps
−1
= X
n≤X 1
ns +
′
X
n>X 1
ns
e, quandoX →+∞, obtemos o resultado desejado
Y
p∈P
1− 1
ps
−1
=X
n≥1
1
ns.
Corol´ario 2.8 . A fun¸c˜ao ζ(s) n˜ao tem zeros no conjunto H(1,+∞).
Demonstra¸c˜ao: Admitamos que existe s0 =σ0+iτ0 ∈H(1,+∞) tal que ζ(s0) = 0. Logo
para qualquerp∈P, temos
1− 1
ps0
−1
=1 +X j≥1
1
ps0j
≥1−X j≥1
ps0j1
= 1−X j≥1
1
pσ0j = 1− 1
pσ0 −1
⇒
1− 1
ps0
−1
≥1− 1
Agora, se e10/σ0 < p, ent˜ao pσ01−1 < e101−1 < 101, portanto, pσ01−1 ∈(0,1/10). Logo
considere-mos a desigualdade e−2x<1−x, parax∈(0,1/10), que pode ser comprovada graficamente
ou pelo fato seguinte:
Da Desigualdade (2.49), temos que, para qualquer w∈C, com|w| ≤1/2,
e−2|w|2 ≤ |(1−w)ew|.
Em particular, se x∈(0,1/2),
e−2x2 ≤(1−x)ex,
⇒e−2x2−x≤1−x.
Mas,e−2x< e−2x2−x, parax∈(0,1/2). Em particular parax∈(0,1/10) tamb´em a desigual-dade ´e cumprida.
Assim, como pσ01−1 ∈(0,1/10) ent˜ao e
−pσ02−1 <1− 1
pσ0−1. Logo, substituindo em (2.15),
temos
1− 1
ps0
−1
> e−pσ02−1
⇒ Y
p∈P:p>e10/σ0
1− 1
ps0
−1
≥e−2
P
p∈P:p>e10/σ0 1
pσ0−1
>0
⇒ Y
p∈P:p>e10/σ0
1− 1
ps0
−1
6
= 0,
o que implica
ζ(s0) =
Y
p∈P:p≤e10/σ0
1− 1
ps0
−1
Y
p∈P:p>e10/σ0
1− 1
ps0
−1
6= 0,
que ´e uma contradi¸c˜ao.
Observa¸c˜ao 2.9 . Do Produto de Euler, as duas seguintes observa¸c˜oes surgem:
1. ζ(s) pode ser definida, em alternativa, usando o Produto de Euler.
2. O Produto de Euler mostra a liga¸c˜ao da fun¸c˜ao zeta de Riemann com os n´umeros primos.
Agora vamos ver que ζ(s) pode ser estendida para uma fun¸c˜ao meromorfa em C. Para
isso, vamos usar o lema seguinte.
Lema 2.10 . Para s∈H(1,+∞), temos
Γ(s)ζ(s) =
Z +∞
0
Demonstra¸c˜ao: Para qualquers∈H(1,+∞), temos
Γ(s) =
Z +∞
0
ts−1e−tdt.
Logo, fazendo a mudan¸ca de vari´avelt=nx, onden∈N, obtemos
Γ(s) =
Z +∞
0
(nx)s−1e−nxndx=ns Z +∞
0
xs−1e−nxdx.
Ent˜ao,
Γ(s) 1
ns =
Z +∞
0
xs−1e−nxdx⇒Γ(s)ζ(s) =X n≥1
Z +∞
0
xs−1e−nxdx
⇒Γ(s)ζ(s) =
Z +∞
0
xs−1
X
n≥1
e−nx
dx=
Z +∞
0
xs−1
e−x
1−e−x
dx=
Z +∞
0
xs−1 ex−1dx.
Ent˜ao, n´os estamos prontos para provar que ζ(s) admite uma extens˜ao meromorfa no
plano complexo.
Teorema 2.11 . A fun¸c˜aoζ(s) admite a uma fun¸c˜ao meromorfa emC com polo simples em
s= 1 e com Res(ζ,1) = 1.
Demonstra¸c˜ao: Pelo Lema 2.10 , temos que, paras∈H(1,+∞),
Γ(s)ζ(s) =
Z +∞
0
ts−1 et−1dt.
Ent˜ao,
Γ(s)ζ(s) =
Z 1 0
ts−1
et−1dt+
Z +∞
1
ts−1
et−1dt. (2.16)
Vemos que a segunda integral desta ´ultima igualdade converge para qualquers∈C. De fato,
seσ=R(s),
Z +∞
1
ts−1
et−1dt
≤
Z +∞
1
t
s−1
et−1
dt=
Z +∞
1
tσ−1
et−1dt.
Observamos que tnn! ≤Pk≥1tkk! =et−1 ∀n ∈N e t∈ [1,+∞). Assim, para n
s ∈N de tal
forma queσ−ns<0, como t
ns
ns! ≤e
t−1, temos
tσ−1
et−1 ≤(ns!)t
σ−1−ns ⇒
Z +∞
1
tσ−1
et−1dt≤ns!
Z +∞
1
tσ−1−nsdt= ns!
ns−σ
.
Com isso, temos que, para qualquers∈C, a integralR1+∞etst−−11dt converge e portanto
repre-senta uma fun¸c˜ao inteira a que denotaremos porϕ(s) =R1+∞etst−−11dt. Por outro lado, para a
primeira intregral do lado direito de (2.16), consideremos a fun¸c˜aoh(z) = ez1−1 que tem polo
simples emz= 0. Ademais, Res(h,0) = limz→0ezz−1 = 1, ent˜ao
h(z) = 1
ondeG´e uma fun¸c˜ao meromorfa emCcom polos de primeira ordem emz= 2kπi, k∈Z\{0}. Portanto,
h(z) = 1
z+ X
n≥0
cnzn, |z|<2π.
Mas, comoB(0; 2π) ´e limitada, ent˜ao existeM >0 que satisfaz |G(z)|< M, ∀z∈B(0; 2π).
Ent˜ao, por estimativas de Cauchy |G(n)(0)| ≤ M n!
(2π)n < M n2n!, logo |cn| = |G (n)(0)
n! | < M2n.
Finalmente, como Pn≥0 M2n <∞, segue que
P
n≥0|cn|<∞. Logo paras∈H(1,+∞), como
h(z) = 1z +Pn≥0cnzn converge uniformemente em [0,1], temos
Z 1 0
ts−1 et−1dt=
Z 1 0
ts−1h(t)dt=
Z 1 0
ts−1 1
t + X
n≥0
cntn
dt
⇒
Z 1 0
ts−1
et−1dt=
Z 1 0
ts−2+X n≥0
cn
Z 1 0
ts−1+ndt= 1
s−1 +
X
n≥0
cn
s+n. (2.17)
E, substituindo ϕ(s) e (2.17) em (2.16), obtemos
Γ(s)ζ(s) =
Z 1 0
ts−1 et−1dt+
Z +∞
1
ts−1 et−1dt=
1
s−1 +
X
n≥0
cn
s+n +ϕ(s), s∈H(1,+∞)
⇒Γ(s)ζ(s) = 1
s−1 +
X
n≥0
cn
s+n +ϕ(s), s∈H(1,+∞). (2.18)
Assim, pelo Lema 2.1 , esta fun¸c˜ao pode ser estendida a uma fun¸c˜ao meromorfa em C com
polo simples em s = 1 e/ou polos simples em s = 0,−1,−2, . . . dependendo se cn 6= 0 ou
cn= 0. Agora, como Γ(s) n˜ao tem zeros ent˜ao Γ(1s) ∈H(C), logo de (2.18) paras∈H(1,+∞) temos
ζ(s) = Γ(s)ζ(s)
Γ(s) =
1 Γ(s)
1 s−1+
X
n≥0
cn
s+n+ϕ(s)
.
Agora, considerando as extens˜oes meromorfas de Γ(s)ζ(s) e Γ(s), temos que, como Γ(1) =
0! = 1, ent˜ao ζ(s) tem um polo simple em s= 1 e Res(ζ,1) = 1. Al´em disso, visto que Γ(s)
tem polos simples em s= 0,−1,−2, . . . ent˜ao a fun¸c˜ao Γ(1s) tem zeros simples nestes pontos,
assim ζ(s) tem singularidades remov´ıveis em s= 0,−1,−2, . . .. Portanto, ζ(s) estende-se a
uma fun¸c˜ao meromorfa em Ccom polo simples ems= 1.
An´alogo ao que foi feito com Γ(s) na se¸c˜ao anterior, no que segue, denotamos porζ(s) a
extens˜ao meromorfa da fun¸c˜aoζ(s) definida em (2.14).
Agora vamos continuar com um resultado que no pr´oximo cap´ıtulo vai nos ajudar a
analisar os zeros reais deζ(s).
Teorema 2.12 . Para qualquer s∈C\ {1}, temos
ζ(s) =πs−12ssinπs 2
Demonstra¸c˜ao: Consideramos o caminho C dado na Fig. 2.2 abaixo, e, paras∈ C, fixo,
consideremos a seguinte integral Z
C
ws−1 ew−1dw.
Figura 2.2: Caminho C.
Pelo Teorema de Cauchy, ´e claro que a integral ´e independente de 0 < ε < 2π e da
distˆancia das linhas horizontais em rela¸c˜ao ao eixo real. Por essa raz˜ao, faremos o c´alculo
desta integral no limite quando ε → 0 e quando a distˆancia entre as linhas horizontais
em rela¸c˜ao ao eixo real tende a zero. Assim considerando novamente o ramo do logaritmo log(w) = log|w|+iarg(w), arg(w)∈(0,2π), temos
|ws−1|= |w|
R(s)−1
earg(w)I(s).
Como arg(w)∈(0,2π) , ent˜ao existeM >0 de modo que
|ws−1| ≤M|w|R(s)−1, (2.19)
para qualquer w ∈ {z ∈ C : z 6= 0,arg(z) ∈ (0,2π)}. Agora consideremos a aplica¸c˜ao
ψ(w) = ew1−1 que claramente tem um polo simples em w = 0, ent˜ao g(w) = eww−1 tem
uma singularidade remov´ıvel em w = 0. Assim, podemos estender g de modo que g(0) :=
limw→0 eww−1 = 1. Ent˜ao, g(1w) = e w−1
w , para w 6= 0. Logo, como g1 ´e continua em w = 0,
temos, parawsuficientemente pequeno e |w| 6= 0
1−g(1w)
≤g(0)1 − 1
g(w)
≤ 1
2 ⇒
1
2 ≤
e
w−1
⇒ 1 |ew−1| ≤
2
|w|.
Assim, temos que Z
Cε
1
|ew−1|dw ≤4π,
onde Cε ´e a por¸c˜ao de circunferˆencia, de raio ε > 0, que faz parte de C. Assim, de (2.19),
obtemos Z Cε
ws−1 ew−1dw
≤M εR(s)−1 Z
Cε
1
|ew−1|dw≤4πM ε
R(s)−1
⇒ lim ε→0
Z
Cε
ws−1
ew−1dw = 0. (2.20)
Agora, olhemos para as integrais sobre os caminhos horizontais:
Z
L1
ws−1 ew−1dw=
Z R
εcosθ
(t+ (εsinθ)i)s−1
et+(εsinθ)i−1 dt.
An´alogo `a demonstra¸c˜ao do Lema 2.4 consideremosg: [ε, R]×[0,π2]→R, definido como
g(t, θ) =(t+ (εsinθ)i) s−1
et+(εsinθ)i−1 −
ts−1 et−1
claramente g(t,0) = 0, ∀t ∈ [ε, R]. Como g ´e uniformemente cont´ınua, ent˜ao dado η > 0,
existe δ >0 de modo que
g(t, θ)< η
R, ∀θ < δ ⇒ Z R
εcosθ
g(t, θ)dt≤ η
R(R−εcosθ)< η
⇒ lim θ→0
Z R
εcosθ
g(t, θ)dt= 0
⇒ lim θ→0
Z
L1
ws−1 ew−1dw=
Z R
0
ts−1
et−1dt. (2.21)
Agora como log(w) = log(w) + 2πi, ent˜ao temos que
Z
L2
ws−1 ew−1dw=
Z εcosθ R
(t−(εsinθ)i)s−1
et−(εsinθ)i−1 dt=
Z εcosθ R
elog(t+(εsinθ)i)(s−1) et−(εsinθ)i−1 dt =
Z εcosθ R
e(log(t+(εsinθ)i)+2πi)(s−1)
et−(εsinθ)i−1 dt=−e
2πi(s−1)
Z R
εcosθ
e(log(t+(εsinθ)i))(s−1) et−(εsinθ)i−1 dt.
Assim, pelos mesmos crit´erios usados no caminho L1, temos que
lim θ→0
Z
L2
ws−1
ew−1dw=−e
2πi(s−1)Z R 0
ts−1
et−1dt. (2.22)
Logo tomando os limitesR →+∞,ε→0,θ→0 e de (2.20), (2.21), (2.22) temos
Z
C
ws−1 ew−1dw =
Z +∞
0
ts−1
et−1dt−e
2πi(s−1)
Z +∞
0
ts−1
et−1dt= (1−e
2πi(s−1))
Z +∞
0
⇒
Z
C
ws−1
ew−1dw =−2ie
πi(s−1)sinπ(s−1)Z +∞ 0
ts−1
et−1dt.
Agora, ses∈H(1,+∞) pelo Lema 2.10 temos que Γ(s)ζ(s) =R0+∞etst−−11dt, ent˜ao
Z
C
ws−1
ew−1dw= 2ie
πi(s−1)sin(πs)Γ(s)ζ(s), ∀s∈H(1,+∞). (2.23)
Logo, como RC ewws−−11dw tem sentido para qualquer s ∈ C, ent˜ao, da igualdade (2.23)
con-siderando continua¸c˜ao anal´ıtica, temos que
Z
C
ws−1
ew−1dw= 2ie
πi(s−1)sin(πs)Γ(s)ζ(s), ∀s∈C. (2.24)
Agora, vamos calcular a mesma integral usando o Teorema de Res´ıduos no caminhoβdescrito
descrito na Fig. 2.3. Seja s ∈ H(−∞,0) fixo e consideremos a fun¸c˜ao F(w) = ewws−−11. Pelo
Figura 2.3: Caminho β.
Teorema dos Res´ıduos,
I
β
ws−1
ew−1dw= 2πi m
X
n=1
Res(F,2nπi) + m
X
n=1
Res(F,−2nπi)
!
, (2.25)
notemos que 2kπi´e um polo simples deF,∀k∈Z, pois limw→2kπ(w−2kπi)[(w−2kπi)F(w)] = 0. Assim, temos que:
• Se k >0,
Res(F,2kπi) =2kπeπ2i
s−1
• Se −k <0,
Res(F,−2kπi) =2kπe32πi
s−1
= (2kπ)s−1e32π(s−1)i.
Ent˜ao, calculando o lado direito de (2.25), obtemos
I
β
ws−1
ew−1dw = 2πi m
X
n=1
(2nπ)s−1(eπ2(s−1)i+e32π(s−1)i)
= 2πi
m
X
n=1
2s−1ns−1πs−1eπ(s−1)i(e−π2(s−1)i+e
π
2(s−1)i) =−2s+1iπseπis e−
π
2(s−1)i+e
π
2(s−1)i 2
! m X
n=1
1
n1−s =−2s+1iπseπiscosπ
2(s−1)
Xm
n=1
1
n1−s =−2
s+1iπseπissinπ 2s
Xm
n=1
1
n1−s
⇒
I
β
ws−1
ew−1dw=−2
s+1iπseπissinπ 2s
Xm
n=1
1
n1−s. (2.26)
Agora, observemos que, se w pertence ao lado vertical direito do quadradoβ, ent˜ao
w
s−1
ew−1
= |w
s−1|
ew−1 =
elog|w|(R(s)−1)−arg(w)I(s)
|ew−1| =
1
earg(w)I(s)
|w|R(s)−1
|ew−1|
! .
Logo, como arg(w)∈(0,π4]∪[74π,2π) (limitado), ent˜ao existe M >0 tal que
w
s−1
ew−1
≤M|w|
R(s)−1 |ew−1|.
Al´em disso,
|eR(w)−1|=||ew| −1| ≤ |ew−1| ⇒ 1
|ew−1| ≤ 1
|eR(w)−1|.
Assim, temos
w
s−1
ew−1
≤M |w|
R(s)−1 |eR(w)
−1| ≤M
|R(w)|R(s)−1
|eR(w) −1| .
Logo, se denotamos por LV D o lado direito vertical do quadrado, como a parte real de w ´e
fixo deste lado, temos o seguinte
Z
LV D
ws−1 ew−1dw
≤M|R(w)|
R(s)−1
|eR(w)−1| ℓ(LV D) =M
|R(w)|R(s)−1
|eR(w)−1| (2|R(w)|) =
2M|R(w)|R(s)
|eR(w)−1|
⇒ lim
R(w)→+∞
Z
LV D
ws−1
ew−1dw = 0, (2.27)
ondeℓdenota o comprimento. Analogamente, no lado esquerdo verticalLV E temos a mesma
estimativa, ou seja existeM′ de modo tal que
w
s−1
ew−1
≤M′|w|
R(s)−1
⇒ Z
LV E
ws−1 ew−1dw
≤ 2M′|R(w)| R(s)
|eR(w)−1|
⇒ lim
R(w)→−∞
Z
LV E
ws−1
ew−1dw = 0. (2.28)
Agora, vejamos o que acontece nos lados superior e inferior do quadrado, novamente temos que existeM′′>0 tal que
w
s−1
ew−1
≤M′′|w|
R(s)−1
ew−1 ≤M′′
|I(w)|R(s)−1
ew−1 .
Por outro lado, como em linhas horizontais limR(w)→+∞|ew1−1| = 0 e limR(w)→−∞|ew1−1| = 1,
ent˜ao existe A >0 de modo que
1
|ew−1| ≤A
nos lados superior e inferior de qualquer quadrado. Ent˜ao,
w
s−1
ew−1
≤M′′A|I(w)|R(s)−1
nos lados superior e inferior de β. Logo, comoR(s)<0 e o comprimento para ambos lados
´e descrito por 2|I(w)|, se denotamos como LS e LI os lados superior e inferior, temos
Z
LS
ws−1 ew−1dw
≤2M′′A|I(w)|R(s) e
Z
LI
ws−1 ew−1dw
≤2M′′A|I(w)|R(s)
⇒ lim
I(w)→+∞
Z
LS
ws−1
ew−1dw=I(wlim)→−∞
Z
LI
ws−1
ew−1dw = 0. (2.29)
Assim, de (2.29), (2.28) e (2.27), considerando os lados deβ tendendo ao infinito, e de (2.26)
com (2.24), temos
2ieπi(s−1)sin(πs)Γ(s)ζ(s) =
Z
C
ws−1
ew−1dw=−2
s+1iπseπissinπ 2s
X
n≥1
1
n1−s
⇒2ieπi(s−1)sin(πs)Γ(s)ζ(s) =−2s+1iπseπissinπ 2s
ζ(1−s)
⇒sin(πs)Γ(s)ζ(s) = 2sπssinπ 2s
ζ(1−s)
⇒2 sinπ
2s
cosπ
2s
Γ(s)ζ(s) = 2sπssinπ 2s
ζ(1−s)
⇒cosπ 2s
Γ(s)ζ(s) = 2s−1πsζ(1−s), ∀ R(s)<0 e s6= 0,−2,−4,−6, . . .
e como esta ´e uma igualdade entre fun¸c˜oes meromorfas em C
⇒cosπ 2s
Γ(s)ζ(s) = 2s−1πsζ(1−s), ∀s6= 0.
Fazendo a mudan¸caspor 1−s, temos
cosπ
2(1−s)
Γ(1−s)ζ(1−s) = 2−sπ1−sζ(s)
⇒ζ(s) = 2sπs−1sinπs 2
Γ(1−s)ζ(1−s), ∀s∈C\ {1}.
2.3
Fun¸
c˜
oes Inteiras de Ordem Um
Como vimos na se¸c˜ao anterior, ζ(s) n˜ao ´e uma fun¸c˜ao inteira. Mas, como veremos no
pr´oximo cap´ıtulo, est´a associada, algebricamente, a uma fun¸c˜ao inteira. Al´em disso, esta
´e uma fun¸c˜ao inteira de ordem um. Portanto, precisamos introduzir esta defini¸c˜ao e
desen-volver algumas propriedades em rela¸c˜ao a seus zeros. Estas propriedades ajudam a relacionar
alguns dos zeros deζ(s) com a teoria anal´ıtica dos n´umeros e encontrar propriedades destes,
por exemplo ζ(s) tem um n´umero infinito enumer´avel de zeros n˜ao reais.
Para uma melhor compreens˜ao desta se¸c˜ao, recomendamos que o leitor fa¸ca uma leitura
pr´evia do Apˆendice A, na se¸c˜ao de Nota¸c˜ao Assint´otica.
Defini¸c˜ao 2.13 . Uma fun¸c˜ao inteira f :C→C´e de ordem um se
|f(z)|=Oǫ(exp(|z|1+ǫ)), para qualquer ǫ >0.
Lema 2.14 . Seja g∈H(C) tal queg(z)6= 0, para qualquer z∈C, que verifica
|g(z)|= exp(O(|z|3/2))
para qualquer z∈Sj≥1∂B(0;Rj), onde limj→+∞Rj = +∞. Ent˜ao,
g(z) = exp(Az+B),
para algumas constantes A, B.
Demonstra¸c˜ao: Comog(z)= 0 para qualquer6 z, ent˜ao existe h∈H(C), tal que
g(z) = exp(h(z)). (2.30)
Tamb´em, como |g(z)| = exp(O(|z|3/2)), ent˜ao |h(z)|=O(|z|3/2). Agora, seja z ∈C. Logo,
como limj→+∞Rj = +∞, temos que existej∈N tal quez∈B(0;Rj). Ent˜ao, pela f´ormula
integral de Cauchy, temos
h′′(z) = 1
πi Z
∂B(0;Rj)
h(w) (w−z)3dw
⇒ |h′′(z)| ≤ 1
π Z
∂B(0;Rj)
|h(w)||(w−z)|−3dw. (2.31)
Podemos escolher j suficientemente grande tal quez∈B(0;Rj/2). Assim,
|z−w| ≥ |w| − |z| ≥Rj−
Rj
2 =
Rj
2 . (2.32)
Usando |h(w)|=O(|w|3/2), existe uma constanteM >0 tal que
Assim, de (2.32) e (2.33) em (2.31), temos
|h′′(z)| ≤16R−j1/2.
Logo, se j → +∞, temos h′′(z) = 0 e como z ´e qualquer temos que h(z) = Az +B,
para algumas constantes A, B. Finalmente, usando esse fato em (2.30), obtemos g(z) =
exp(Az+B).
Teorema 2.15 (F´ormula de Jensen). Sejam R, ǫ > 0. Admitamos que f ´e anal´ıtica em
B(0;R+ǫ), que f(z) 6= 0, para R ≤ |z| < R+ǫ e z = 0, e que f tem zeros z1, . . . , zm em
B(0;R) (contando com as multiplicidades respectivas). Ent˜ao,
1 2π
Z 2π
0
log|f(Reiθ)|dθ= log|f(0)|+ log
Rm
|z1|. . .|zm|
.
Demonstra¸c˜ao: A demonstra¸c˜ao pode ser encontrada em [8].
Corol´ario 2.16 . Seja f uma fun¸c˜ao inteira com f(0)6= 0. Ent˜ao,
1 2π
Z 2π
0
log|f(Reiθ)|dθ−log|f(0)|=
Z R
0
n(r)
r dr,
onde n(r) :=|{z∈B(0;r) :f(z) = 0}|.
Demonstra¸c˜ao: Pela F´ormula de Jensen, s´o temos que provar queR0Rn(rr)dr= log|z1|R...m|z
m|
.
Para isso, ordenemos os zeros em rela¸c˜ao a sua magnitude, isto ´e, rj = |zj|, j = 1, . . . , me
r1 ≤r2 ≤. . .≤rm. Por conveniˆencia, seja r0 = 0 erm+1 =R. Assim, temos que
Z R
0
n(r)
r dr= Z r1
r0
n(r)
r dr+ Z r2
r1
n(r)
r dr+· · ·+ Z rm+1
rm
n(r)
r dr
=
Z r1
r0 0
rdr+ Z r2
r1 1
rdr+· · ·+ Z rm+1
rm
m r dr=
m
X
j=1
jlog
rj+1
rj
= m
X
j=1
log
rj+1
rj
j
= log m
Y
j=1
rj+1
rj
j = log
Rm
r1. . . rm
.
Agora passamos a provar uma propriedade importante das fun¸c˜oes inteiras de ordem um,
que ser´a muito ´util no pr´oximo cap´ıtulo.
Teorema 2.17 . Seja f uma fun¸c˜ao inteira de ordem um. Ent˜ao, para X >1, temos
(i)
X
f(ρ)=0 |ρ|≥X
(ii)
X
f(ρ)=0
ρ6=0
|ρ|−1−ǫ <∞,
para qualquer ǫ >0.
(iii) f tem a seguinte representa¸c˜ao:
f(z) =zreAz+B Y
f(ρ)=0
ρ6=0
1− z
ρ
ez/ρ.
Demonstra¸c˜ao:
(i) Se z= 0 ´e um zero de multiplicidader def, ent˜ao consideremos g(z) = fz(zr), que ´e uma
fun¸c˜ao inteira e verifica g(0) 6= 0. Al´em disso, como f ´e inteira de ordem um, temos
que, para qualquer ǫ >0,
|f(z)| ≪ǫexp|z|ǫ+1. (2.34)
Logo, como limz→∞|z1|r = 0, ent˜ao existe R >0 tal que
|z|> R⇒ 1
|z|r < ǫ. (2.35)
Assim, de (2.34) e (2.35), temos que
|g(z)|= |f(z)|
|z|r ≪ǫexp|z|
1+ǫ,
o que equivale a dizer que |g(z)| =Oǫ(exp(|z|1+ǫ)). Portanto, g ´e uma fun¸c˜ao inteira
de ordem um. Aplicando agora o Corol´ario 2.16 , temos que
Z R
0
n(r)
r dr=
1 2π
Z 2π
0
log|g(Reiθ)|dθ−log|g(0)|
= 1
2π Z 2π
0
log|g(Reiθ)|dθ− 1
2π Z 2π
0
log|g(0)|dθ= 1 2π
Z 2π
0
log
g(Re
iθ)
g(0)
dθ
⇒
Z R
0
n(r)
r dr=
1 2π
Z 2π
0
logg(Re iθ)
g(0)
dθ. (2.36)
Mas, como|g(Reiθ)| ≪
ǫ exp|Reiθ|1+ǫ = exp|R|1+ǫ ent˜ao log|g(Reiθ)| ≪ǫ|R|1+ǫ e como
log|g(0)|´e uma constante, ent˜ao em (2.36) temos
Z R
0
n(r)
r dr≪ǫ R
1+ǫ (2.37)
para qualquerǫ >0. Denotemos porSR o n´umero de zeros de f no anelR ≤ |z|<2R.
Assim, temos
SR≤n(2R) = 1
R Z 3R
2R
n(2R)dr≤ 1 R
Z 3R
2R
n(r)dr≤3
Z 3R
2R
n(r)