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Desenvolvimento rural, conhecimento e cooperação como força produtiva

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Academic year: 2017

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DESENVOLVIMENTO RURAL, CONHECIMENTO E

COOPERAÇÃO COMO FORÇA PRODUTIVA

Rica rd o Luiz Sa p ia d e CAMPOS1

RESUMO: No t ra b a lh o d is cu t im os con h e cim e n t o e coop e ra çã o n o m e io ru ra l ou s ocie d a d e s ru ra is , p e n s a n d o e s t e s d e n t ro d a s t ra n s form a çõe s p rod u t iva s , e , t e n d o os a g e n t e s d e s t a p rod u çã o com o a t ore s d e t a l t ra n s form a çã o. De s t a ca m os o con h e cim e n t o e a ca p a cid a d e e m p re e n d e d ora d e m ob iliza r e in t e ra g ir com e s t e con h e cim e n t o com o a p rin cip a l força p rod u t iva n a con s t ru çã o d e “n ovos m e rca d os ”. Pa ra t a n t o d is cu t im os com a u t ore s clá s s icos d a t e oria s ocia l, p a r t icu la rm e n t e com Ma r x e We b e r, q u a n d o t oca m n e s t e s p on t os . A id é ia ce n t ra l é e n t e n d e r com o s e p od e con ce b e r o d e s e n volvim e n t o ru ra l a p a r t ir d e u m s a b e r-fa ze r, ou força p rod u t iva , t íp ico d e s t e ch a m a d o “m u n d o ru ra l”, q u e in t e ra g e com a s con q u is t a s t é cn ico-cie n t ífica s id e n t ifica d a s com a p re cis ã o e a cod ifica çã o a t rib u íd a s à s ocie d a d e in d u s t ria l.

PALAVRAS-CHAVE: Con h e cim e n t o. Coop e ra çã o. Te oria s ociológ ica . De s e n volvim e n t o t e rrit oria l ru ra l.

Introdução

Nos últimos a nos tem ha vid o certo refluxo nos interes s es d e p es q uis a s volta d a s p a ra a a g ricultura e o meio rura l. Es ta cons ta ta çã o é ma is ma rca nte no ca mp o d a s cha ma d a s ciência s s ocia is e d a s ociolog ia em p a rticula r. Na ma ioria d a s vezes s ã o a s ciência s “ma is exa ta s ”, ou a q uela s q ue o s ociólog o a lemã o Ma x Web er a p onta va como exemp lo ou mod elo d e es tud os e p rofis s ões

1 Pós-doutorando em Sociologia. UNESP – Universidade Estadual Paulista. Faculdade de

Ciências e Letras – Pós-graduação em Sociologia. Araraquara – SP – Brasil. 14800-901 – sapiacampos@yahoo.com.br

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“ra ciona is ” a p lica d a s , como a a d minis tra çã o e p rincip a lmente a economia , q ue concentra ra m a ma ioria d os es tud os e p es q uis a s s ob re d es envolvimento rura l e a g ricultura2.

Um d os motivos , p rova velmente o p rincip a l d eles , q ue fizera m com q ue tema s lig a d os à a g ricultura e a o d es envolvimento rura l fos s em, d e certa ma neira , d eixa d os d e la d o, ou entã o p reterid os p or outra s temá tica s d e p es q uis a , foi jus ta mente o d es a p a recimento ou a p ouca ênfa s e d a d a a os a s s untos d a ntes tã o ca ros à cha ma d a “s ociolog ia rura l”.

Há q ue s e cons id era r a ind a q ue muitos d es tes a ntig os tema s ou s e es g ota ra m, ou entã o p a s s a ra m a ter p ouca relevâ ncia em fa ce d e outros cria d os p elo mund o mod erno. É imp orta nte lemb ra r a ind a q ue os vá rios tip os d e corp ora tivis mos – s eja m eles a ca d êmicos ou ins tituciona liza d os d e vá rios mod os na s ocied a d e – imp ed em a comunica çã o e a troca d e s a b eres , d ificulta nd o nã o s ó a s cha ma d a s p es q uis a s a p lica d a s , ma s ta mb ém a s p es q uis a s científica s b á s ica s e a s p olítica s p úb lica s d e d es envolvimento d e ma neira g era l.

Nes te tra b a lho, exp lora mos a s p ectos d es te p otencia l p rod utivo q ue p a s s a a s er va loriza d o no cha ma d o “meio rura l”, ou s ocied a d es rura is , e q ue s e cons titui como uma nova força p rod utiva . Ta is a s p ectos (ou p ontos centra is d o q ue cha ma mos d e nova força p rod utiva ) s ã o d is cutid os com b a s e em d ois textos clá s s icos d a s ociolog ia – um d e Ma rx, outro d e Web er.

Pens a mos q ue os referid os es critos , ca d a q ua l a s ua ma neira , toca m nos p ontos centra is s ob re os a s p ectos q ue a tua lmente p a s s a m a s er va loriza d os como força p rod utiva , e q ue cha ma remos como na tra d içã o fra nces a , d e savoir-faire3. Send o a s s im, recup era mos o p ens a mento d es tes a utores clá s s icos s em a p retens ã o d e q ua lq uer exeg es e, ma s com o firme p rop ós ito d e exp lora r a lg uns p ontos q ue, a cred ita mos , p erma necem a tua is p a ra p ens a r os tema s q ue nos p rop omos a d is cutir.

2 No estágio de quatro meses que realizamos junto ao Departamento de Política da Universidade de

Bologna no fi nal do nosso doutorado, dentre outras, constatamos que, apesar da Itália, em especial a região da Emilia – Romagna, ser referência mundial em se tratando de pequenos núcleos de produção agroindustrial, eram quase inexistentes estudos voltados para esta realidade na área de sociologia ou política. Em contrapartida existiam muitos estudos voltados para esta realidade na área de economia, administração, economia empresarial dentre outras disciplinas.

3 O termo em francês indica um tipo de saber completamente distinto daquele valorizado pela sociedade

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Aq ui, d es ta ca mos como os a utores clá s s icos revela m elementos internos d a vid a comunitá ria ou ca mp ones a , como d á d iva , recip rocid a d e, comunica çã o, intera çã o, etc. Lemb ra nd o, p orém, q ue utiliza mos ta is textos d es ta ca nd o e d is cutind o os p ontos d e interes s e p a ra nos s a a rg umenta çã o, s em a ob rig a çã o ou p retens ã o d e a b a rca r a tota lid a d e d es s es es critos .

Coope ração e con h e cim e n to n as com un idade s rurais

tradicionais

O s ociólog o a lemã o Ma x Web er, em uma d e s ua s p rimeira s p es q uis a s d e juventud e, va i jus ta mente inves tig a r a cond içã o d os tra b a lha d ores a g rícola s d a p rovíncia p rus s ia na orienta l. Em q ue p es em a riq ueza e a d ivers id a d e d e tema s tra ta d os em ta is textos , Web er, a na lis a a forma çã o d o ca p ita lis mo na Alema nha , comp a ra tiva mente com os Es ta d os Unid os , a p a rtir d a forma çã o a g rá ria d es tes p a ís es . Qua nd o es ta b elece a s p a rticula rid a d es e d iferença s interna s d a Alema nha , o a utor tra b a lha o temp o tod o com os tema s comunid a d e e s ocied a d e.

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O Oes te era ma is d ens a mente p ovoa d o e, o q ue é d ecis ivo em nos s a op iniã o, a comunica çã o loca l, a troca d e b ens d entro e entre a s menores comunid a d es loca is , foi ind ub ita velmente ma is d es envolvid a d o q ue no les te. Is s o s e evid enciou p elo fa to d e q ue o Oes te conta va com número muito ma ior d e cid a d es . Ba s ea va -s e, em p a rte, no -s imp le-s fa to hi-s tórico d e q ue a cultura d o Oe-s te era , s ob tod os os a s p ectos , ma is velha e, em p a rte, numa d iferença g eog rá fica , menos evid ente, ma s imp orta nte: a ma ior va ried a d e d a d ivis ã o a g rícola d o Oes te em comp a ra çã o com a o Les te. De um p onto d e vis ta p ura mente técnico, a comunica çã o na s p la nícies a mp la s d o Les te a lemã o d eve ter encontra d o menores d ificuld a d es d o q ue no território muito ma is a cid enta d o d o Oes te. Nã o ob s ta nte, es s a s p os s ib ilid a d es técnica s d e comunica çã o nã o d etermina m o volume d o comércio. Pelo contrá rio, no Oes te e no Sul, os motivos econômicos d o comércio e d o d es envolvimento d e uma comunica çã o rela tiva mente intens iva fora m muito ma is fortes d o q ue na s p la nícies d o Les te. Is s o ocorreu d evid o a o fa to d e q ue no Oes te e no s ul a s terra s b a ixa s , os va les d e rios , os p la na ltos , s e interca la m – a s cond ições climá tica s e outra s cond ições na tura is d e p rod uçã o d e merca d oria s s ã o p ercep tivelmente d iferentes d entro d e d is tritos p eq uenos . No Les te, p orém, a s cid a d es vizinha s na d a têm p a ra troca r entre s i (mes mo hoje), p orq ue, es ta nd o na mes ma s itua çã o g eog rá fica , p rod uzem a s mes ma s cois a s . (WEBER, 1979, p .428–429).

Os textos d e Web er, em es p ecia l os q ue s ã o cla s s ifica d os como “textos d a juventud e”, s ã o ricos em informa ções e revela ções típ ica s d a p róp ria metod olog ia d o a utor q ue a p onta fa tores e ca ra cterís tica s d ivers a s e correla ciona d a s na exp lica çã o d e d etermina d o fenômeno s ocia l. Sob re o p onto q ue nos interes s a , d es ta ca mos a p ena s a lg uma s d a s ca ra cterís tica s comunitá ria s interna s , como a d á d iva , a recip rocid a d e, a comunica çã o, a intera çã o etc., q ue Web er a p onta e id entifica em d etermina d a s reg iões d a Alema nha . Outro ca minho s eria s eg uir a trilha d e Mezza d ra (2006), q ua nd o s ob re es tes mes mos textos , d es ta ca a s ub jetivid a d e d os tra b a lha d ores p olones es d a ma rg em d o Elb a q ue mig ra va m, s ervind o d e mã o-d e-ob ra p a ra a s emp res a s a g rícola s d os Junk ers, ou s eja , coloca nd o o a to d e mig ra r como ca teg oria p olítica (MEZZADRA, 2006).

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centra is d o mod erno ca p ita lis mo p od eria m s er encontra d a s nos Es ta d os Unid os d a América , lemb ra nd o q ue a lg uns fa tores corres p ond entes es ta va m p res entes na Alema nha d o Les te, como o tra b a lho a s s a la ria d o (livre), o us o “ma is ” ra ciona l d a terra , etc., ca ra cteriza nd o a forma çã o tra d iciona l d e um “ca p ita lis mo a g rá rio”. Os elementos d o “mod erno ca p ita lis mo” nã o es ta va m p res entes na s s ocied a d es rura is tra d iciona is d o Sud es te e oes te d a Alema nha . Porém, como a p onta Web er, foi exa ta mente nes ta reg iã o q ue a ind ús tria (o ca p ita lis mo ind us tria l) s e d es envolveu.

O p onto s ob re o q ua l p retend emos d is correr refere-s e à s ca ra cterís tica s q ue Web er id entifica nes ta s comunid a d es rura is tra d iciona is d a Alema nha , como a comunica çã o; a recip rocid a d e; a d ivers id a d e; os vínculos tra d iciona is , s emp re es tra nhos a os elementos externos ; a intens ifica çã o d o merca d o d e troca s ; a interd ep end ência , etc. Va le a nota r q ue Ma rx, a o ela b ora r a fa mos a “teoria d o va lor-tra b a lho”, a p onta d ua s ca ra cterís tica s – o p eq ueno merca d o d e troca s vincula d o à s comunid a d es rura is e a economia fa milia r – como comp ond o um circuito d e “va lor d e us o”, q ue a s s im s end o nã o integ ra va a va loriza çã o d o ca p ita l. Nã o integ ra va p or nã o s e cons tituir em “va lor d e troca ”, d e merca d o, ou s eja , p or nã o g era r lucro e a cumula çã o.

Ma rx, em 18 Brum ário d e Luís Bonapart e, tece interes s a ntes cons id era ções s ob re a cond içã o d e vid a d o ca mp es ina to fra ncês . O a utor, a o a na lis a r o movimento revolucioná rio fra ncês , cons id era q ue é o p róp rio is ola mento d os ca mp ones es q ue nã o lhes p ermite s entir-s e e, p orta nto, rep res enta r-s e como cla s s e. Es te is ola mento é ta mb ém a p onta d o no ca p ítulo d o Cap it al, em q ue Ma rx tra ta d a coop era çã o (MARX, 1983). Os ca mp ones es s ã o comp a ra d os p elo a utor a b a ta ta s d entro d e um s a co; d e ta l mod o q ue uma b a ta ta retira d a is ola d a mente nã o a feta e nem mes mo mod ifica a es trutura d a s d ema is . Ca d a fa mília ca mp ones a é uma unid a d e – como uma b a ta ta em um s a co – q ue p od e s er elimina d a fa cilmente s em q ue is s o a fete a s d ema is . Cha ma mos a a tençã o p a ra o fa to d e q ue es ta s fa mília s a loca d a s em p eq uenos núcleos ca mp ones es e q ue tinha m intens ifica d o um merca d o d e troca loca l, em s ua cond içã o d e is ola mento, conforme p ontua Ma rx, fa zia m circula r uma rela çã o coop era d a q ue s e d es envolvia d e forma “p a ra lela ” a o g ra nd e merca d o ca p ita lis ta .

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vez q ue ela s s ã o id entifica d a s p elo a utor a p a rtir d a s rela ções p rod utiva s típ ica s d o g ra nd e merca d o ca p ita lis ta em forma çã o. As rela ções coop era d a s , q ue comp õem o fluxo d o conhecimento d es ta s comunid a d es , nã o integ ra m o circuito d e va loriza çã o d o ca p ita l. Ca d a uma d ela s é a uto-s uficiente e s end o a s s im, como o p róp rio a utor a p onta , a p ena s p od em s e id entifica r como inimig a s ou concorrentes . A org a niza çã o p rod utiva , p ois era s ob es te p ris ma q ue Ma rx es crevia , ou mes mo a org a niza çã o comunitá ria , nã o a s unia em interes s es comuns .

Os p eq uenos ca mp ones es cons tituem uma imens a ma s s a , cujos memb ros vivem em cond ições s emelha ntes , ma s s em es ta b elecerem rela ções multiformes entre s i. Seu mod o d e p rod uçã o os is ola uns d os outros , em vez d e cria r entre eles um intercâ mb io mútuo. Es s e is ola mento é a g ra va d o p elo ma u s is tema d e comunica çã o exis tente na Fra nça e p ela p ob reza d os ca mp ones es . Seu ca mp o d e p rod uçã o, a p eq uena p rop ried a d e, nã o p ermite q ua lq uer d ivis ã o d o tra b a lho p a ra o cultivo, nenhuma a p lica çã o d e métod os científicos e, p orta nto, nenhuma d ivers id a d e d e d es envolvimento, nenhuma va ried a d e d e ta lento, nenhuma riq ueza d e rela ções s ocia is . Ca d a fa mília ca mp ones a é q ua s e a uto-s uficiente; ela p rod uz inteira mente a ma ior p a rte d o q ue cons ome, a d q uirind o a s s im os meios d e s ub s is tência ma is a tra vés d e troca s com a na tureza d o q ue d o intercâ mb io com a s ocied a d e. (MARX, 1974, p .402-403).

Como s e s a b e, Ma rx enfa tiza va a org a niza çã o e a coop era çã o p rod utiva com b a s e na na s cente s ocied a d e ind us tria l. Web er, p or s ua vez, s ob re es te p onto, es ta va ma is p reocup a d o com o fluxo d e troca s interna s d a s comunid a d es ca mp ones a s , tema q ue p a ra Ma rx era ins ig nifica nte. É a s s im q ue Web er a p onta : “É cla ro q ue d ura nte muitos a nos o ca mp onês vend eu s eus p rod utos exced entes e, emb ora teces s e e fia s s e, nã o p od ia s a tis fa zer s ua s neces s id a d es com o s eu p róp rio tra b a lho” (WEBER, 1979, p .415). J á Ma rx, es crevend o no interior d o q ue cons id era va s er o “mod erno ca p ita lis mo ind us tria l”, b us ca va id entifica r os elementos d a coop era çã o op erá ria no interior d e s ocied a d es ca mp ones a s , q ue s e org a niza va m d e ma neira b a s ta nte d is tinta d a q uela vig ente na s s ocied a d es d e merca d o.

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rura is ou ca mp ones a s . Ta mb ém Web er es ta va p reocup a d o com o “mod erno ca p ita lis mo”, q ue nã o p od ia s e d es envolver com a ma nutençã o d os vínculos d es ta s comunid a d es com a tra d içã o. A d iferença ma rca nte a es te res p eito é q ue Web er, a o fa zer a a ná lis e comp a ra tiva entre o q ue cons id era va s erem “d ua s Alema nha ”, a ca b a enfa tiza nd o e es tud a nd o a s ca ra cterís tica s interna s d es ta s comunid a d es , p roced imento es s e q ue Ma rx nã o a d ota . Como s e s a b e, p a ra Web er o “es p írito d o ca p ita lis mo” (e es te fa tor p od e cla ra mente s er verifica d o já nes tes textos d e juventud e) d es envolve-s e com a s ub s tituiçã o d os vínculos tra d iciona is p ela org a niza çã o ra ciona l d o tra b a lho e d a p rod uçã o.

A velha ord em econômica ind a g a va : como p os s o p rop orciona r, nes s e p ed a ço d e terra , tra b a lho e ma nutençã o p a ra o ma ior número p os s ível d e homens ? O ca p ita lis mo p erg unta : d es s e p ed a ço d e terra , como p os s o p rod uzir o ma ior número p os s ível d e colheita s , com o menor número d e tra b a lha d ores ? Do p onto d e vis ta técnico-econômico, os velhos a ld ea mentos rura is d a reg iã o s ã o, p orta nto, cons id era d os como s up er p ovoa d os . O ca p ita lis mo a rra nca o p rod uto d a s ua terra , d a s mina s , fund ições e ind ús tria s d e má q uina s . Os milha res d e a nos d o p a s s a d o luta m contra a inva s ã o d o es p írito ca p ita lis ta . (WEBER, 1979, p . 417).

Porta nto, a o q ue p a rece, es te p onto es tá p res ente ta nto em Ma rx q ua nto em Web er, a ind a q ue coloca d o d e forma d iferente. Ma rx, entus ia s ma d o com o entã o p a ra d ig ma ind us tria l, a p onta va q ue a coop era çã o p rod utiva verifica d a na ind ús tria na s cente nã o exis tia , ou entã o era ins ig nifica nte, entre a “ma s s a d e ca mp ones es ”. J á Web er, enfa tiza nd o ma is a s rela ções d e merca d o loca l, ta mb ém a p onta va q ue p a ra o ca p ita lis mo s e d es envolver era neces s á rio elimina r os vínculos d e coop era çã o e comunica çã o b a s ea d os em va lores tra d iciona is .

Outro p onto p res ente nos d ois a utores merece d es ta q ue p a ra a nos s a d is cus s ã o. Ma rx fa la va na a liena çã o d o tra b a lho a p a rtir d a es p ecia liza çã o e d a rotina d os fluxos d e p rod uçã o ind us tria l. Fenômeno q ue como s e s a b e encontra s eu a p og eu na s p rimeira s d éca d a s d o s éculo XX. Web er nã o fa la d e outra cois a , p orém, d á d es ta q ue à q ua lifica çã o q ue p erma necia entre a s s ocied a d es com vínculos tra d iciona is .

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d evid o à intens id a d e e a lta q ua lid a d e d e s eu tra b a lho, q ue é a umenta d o p elo interes s e p riva d o nele e s ua a d a p ta b ilid a d e à s exig ência s d o merca d o loca l. Es s es fa tores lhe d ã o uma s up eriorid a d e econômica q ue continua , mes mo q ua nd o a a g ricultura em g ra nd e es ca la p od eria p red omina r tecnica mente. (WEBER, 1979, p .418).

O ca mp onês p erma nece d ono d e s eus p róp rios meios d e p rod uçã o, a ind a q ue em uma s itua çã o econômica tota lmente nova . Web er a firma q ue os núcleos d e p rod uçã o ca mp ones a q ue s oub es s em a p roveita r ta is circuns tâ ncia s , es ta nd o p róximo, ou na s “fra nja s ” d os centros urb a nos , s eria m fa vorecid os . Em s ua s p a la vra s : “Em certos p ontos d e p rod uçã o a g rícola , o p eq ueno ca mp onês , s e s oub er como s e lib erta r d a s ca d eia s d e tra d içã o, p od e a d a p ta r-s e à s nova s cond ições d a a d minis tra çã o.” (WEBER, 1979, p .417).

Os d ois a utores , a p es a r d e nã o s erem contemp orâ neos na a cep çã o d o termo, d es ta ca m a comunica çã o, a intera çã o e a coop era çã o como fa tores centra is . Interes s a nte nota r q ue Web er, s emp re ma is “es correg a d io” q ue Ma rx, nã o é ta xa tivo q ua nto a o ca rá ter neg a tivo d os vínculos s ocia is q ue ca ra cteriza m a s s ocied a d es rura is , a ind a q ue a p onte, como s e s a b e, a neces s id a d e d e s e lib erta r d os vínculos tra d iciona is , como cond içã o p a ra o d es envolvimento d a ra ciona lid a d e neces s á ria p a ra o “novo ca p ita lis mo”. Des envolvimento es te q ue Web er nunca d efend eu, limita nd os e, mes mo em s eus es tud os p os teriores , a exp licá -lo. Ma rx p or s ua vez id entifica va a lib erta çã o d os g rilhões d e exp lora çã o d os tra b a lha d ores a p a rtir d a org a niza çã o ra ciona l d o tra b a lho ind us tria l. Ou s eja , s e a s ocied a d e ca minha va p a ra uma org a niza çã o ra ciona l d o tra b a lho ind us tria l, b a s ea d a na p recis ã o, na coop era çã o p rod utiva e na “toma d a d e cons ciência ” a p a rtir d a s rela ções d e exp lora çã o (d o s entir-s e cla s s e), o mund o rura l, ca mp onês e tra d iciona l, nã o s e enq ua d ra va nela .

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A s im bios e : con h e cim e n to e coope ração e n tre m e io

urbano e sociedades rurais.

É d es neces s á rio fa zer g ra nd es cons id era ções p a ra d izer q ue a s ocied a d e ind us tria l foi e é uma s ocied a d e d e tip o urb a no-ind us tria l. Ano-ind a q ue em d iferentes momentos , os a utores clá s s icos q ue a q ui es ta mos d is cutind o p ens a ra m s ob o p ris ma d o d es envolvimento ca p ita lis ta d a q uele momento his tórico. Em q ue p es em a s cons id era ções q ue Ma rx e Web er, ca d a um a s eu mod o, fa zem s ob re o mund o ca mp onês , a lg uns p ontos p od em s er d es ta ca d os . Web er a p onta a s p rincip a is ca ra cterís tica s interna s d a s comunid a d es rura is , vincula nd o-a s a o q ue s e p od e cha ma r d e mund o ca mp onês . J á Ma rx, a o fa zê-lo, cla ra mente tem como referência a org a niza çã o d o tra b a lho fa b ril verifica d o p rincip a lmente na Ing la terra . A coop era çã o, a d ep end ência e a comunica çã o p rod utiva – es ta b elecend o vínculos d e reconhecimento d e cla s s e, ta l q ua l s e verifica va no ca p ita lis mo na s cente – era m elementos es tra nhos p a ra a “imens a ma s s a ” d e ca mp ones es .

Pa ra Web er, q ue como Ma rx ob s erva va o ca p ita lis mo na s cente, a comunica çã o interna e o fluxo d e troca s d e ma neira g era l no interior d a s comunid a d es rura is nã o era m neces s a ria mente um entra ve p a ra o d es envolvimento d o ca p ita lis mo. O q ue p od ia s er comp rova d o, emp irica mente, toma nd o o les te a lemã o e os Es ta d os Unid os como mod elos “típ ico id ea is ”. J á no texto d e Ma rx, fica cla ro q ue os p rob lema s centra is d o mund o ca mp onês s ã o o is ola mento e a fa lta d e comunica çã o, em comp a ra çã o com a s ocied a d e urb a no-ind us tria l. Exa ta mente s ob re ta is es critos Ha rd t e Neg ri (2005, p .167) a p onta m:

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O q ue a contece d e novo s ob re es te p onto é q ue houve uma comp lexa s imb ios e entre os va lores e s a b eres d a s d ita s “comunid a d es tra d iciona is ” (Web er) ou “s ocied a d es ca mp ones a s ” (Ma rx), com a ra ciona lid a d e técnica e científica id entifica d a como uma conq uis ta g enuina mente urb a na , fa zend o com q ue es ta comb ina çã o a p a reces s e como um elemento novo q ue ta nto entra no circuito merca ntil já exis tente q ua nto cria novos merca d os .

Os novos elementos e ca ra cterís tica s d es ta nova forma d e p rod uzir nã o cons erva m a rela çã o d e s ep a ra çã o ou s up erp os içã o ins tituciona liza d a entre meio rura l e meio urb a no. As tra ns forma ções s ã o op era ntes no curs o d e uma nova s ocied a d e, q ue p od e a té comp orta r s ep a ra çã o, a p es a r d e nã o s er o q ue p a rece, ma s nã o cons erva ta is s ep a ra ções como era m verifica d a s q ua nd o es tes a utores clá s s icos es crevia m. Ha rd t e Neg ri (2005, p .155) a p onta m nes te s entid o:

Começa a s urg ir, p or exemp lo, uma forma p ós ford is ta d e p rod uçã o a g rícola q ue s e ca ra cteriza p or es te tip o d e mud a nça tecnológ ica . A mod erniza çã o a g rícola es corou-s e fortemente em tecnolog ia s mecâ nica s , d o tra tor s oviético a os s is tema s ca lifornia nos d e irrig a çã o, ma s a p ós mod erniza çã o a g rícola d es envolve inova ções b iológ ica s e b ioq uímica s , p a ra lela mente a s is tema s es p ecia liza d os d e p rod uçã o, como a s es tufa s , a ilumina çã o a rtificia l e a a g ricultura s em s olo. Es s a s nova s técnica s e tecnolog ia s tend em a a fa s ta r a p rod uçã o a g rícola d a p rod uçã o em la rg a es ca la , fa culta nd o op era ções ma is es p ecia liza d a s em p eq uena es ca la .

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coop era çã o d ifus a , nã o fora m extintos ou s ub s tituíd os , ma s a ntes d is s o tra ns forma d os .

Nes te s entid o é q ue a res p os ta à cris e d e um tip o d e org a niza çã o e g es tã o d o tra b a lho s urg e recup era nd o elementos q ue fora m d es ca rta d os p ela s ocied a d e ind us tria l. Conforme a p onta m Souza , Sa nta na e Deluiz (1999, p .41):

A res p os ta à cris e, ou melhor, como q uerem os teóricos d a es p ecia liza çã o flexível, a a ntecip a çã o a o es tra ng ula mento, nã o s urg ia d e elementos tota lmente inus ita d os . Antes , viria d e uma certa recup era çã o d e elementos ou forma s p rod utiva s q ue s ucumb ira m d ia nte d o s is tema ford is ta s em s e exting uirem. Aq uilo q ue p od e-s e cha ma r d e e-s ie-s tema d e ma nufa tura concorrera com a e-s id éia e-s cha ves q ue s e a rticula ria m ma is ta rd e no ford is mo, s end o d errota d o enq ua nto linha mes tra d o s is tema p rod utivo, continua nd o a exis tir a o long o d o temp o em exp eriência s is ola d a s . A d errota teria s e d a d o, d evid o, s ob retud o, à intervençã o d e ord em p olítica , s us tenta d a p ela vis ã o d o evolucionis mo tecnológ ico.

A recup era çã o d e forma s p rod utiva s q ue p a recia m extinta s s urg e como res p os ta à cris e. Ta is forma s recup era m um s a b er d es p reza d o p elo evolucionis mo tecnológ ico e q ue p a s s a a integ ra r a nova d inâ mica d o conhecimento neces s á rio à p rod uçã o. Ba g na s co (1999) a p onta q ue a intera çã o entre a es trutura urb a na e rura l d entro d um d a d o contexto ita lia no foi ca p a z ta nto d e s up la nta r es s a s ep a ra çã o q ua nto, a p roveita nd o-s e d a s exp eriência s , d e cons truir um novo a mb iente p rod utivo.

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Vê-s e a s s im a forma como Ba g na s co (1999) conceb e es te p roces s o intera tivo, tend o como “loca l” d e p es q uis a o norte d a Itá lia , e ma is p a rticula rmente o nord es te ita lia no, q ue conta com a p rovíncia d o Veneto como o s eu p rincip a l exp oente exp res s ivo. Foi o p roces s o intera tivo e comunica tivo entre rea lid a d es , q ue o p a ra d ig ma urb a no-ind us tria l tinha como s ep a ra d a s e irreconciliá veis , q ue d eu a tônica d e uma nova org a niza çã o p rod utiva4.

O local com o “espaço” produtivo

Nos últimos a nos , têm s urg id o e s e intens ifica d o focos d e p rod uçã o q ue va loriza m o “loca l” como a mb iente p rivileg ia d o p a ra o d es envolvimento p rod utivo. Es s es focos p rod utivos , q ua lifica d os g era lmente como a g lomera d os p rod utivos , como

clust ers (MONIE; SILVA, 2003), ou entã o como d is tritos ind us tria is ,

(BECATTINI, 1998), a p res enta m ca ra cterís tica s comuns q ue fa cilita m, p os s ib ilita m e p rop orciona m nova s e d is tinta s forma s p rod utiva s e d e org a niza çã o d o tra b a lho. Cha ma mos d is tinta s p or fug irem comp leta mente d a p ers p ectiva d o merca d o ma s s ifica d o e d a a ntig a org a niza çã o d o tra b a lho (SAPIA, 2004).

Os “novos territórios p rod utivos ” (SILVA; COCCO, 2006), s eja p or mero fa tor d e reorg a niza çã o d a p rod uçã o s eja p or inves timento p olítico-ins tituciona l, ou p or a mb os , a p a recem como loca is p rivileg ia d os d e inova çã o, como uma es p écie d e “la b ora tório d e p es q uis a ” (COCCO; URANI; GALVÃO, 1999). As ca ra cterís tica s interna s d es tes “novos territórios ” (como o eq uilíb rio entre coop era çã o e d is p uta , a interd ep end ência , a comunica çã o, etc.) a s s im como a s externa s (a ma neira como ta is territórios p rod utivos s e rela ciona m com o “mund o” g lob a l e com os outros territórios cons tituíd os ) a p onta m ta nto p a ra a imp ortâ ncia q ua nto p a ra a es p ecificid a d e d eles (RULLANI, 2002).

Des ta ca mos a emerg ência e a cons tituiçã o d es tes territórios d entro d o q ue a q ui p od emos cha ma r d e “fluxo d e g lob a liza çã o”. Qua nd o a d inâ mica p rod utiva d e muitos Es ta d os Na ciona is p a s s a

4 Importante considerar, uma vez que nos referimos ao caso italiano, que o eixo de desenvolvimento

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a s er d efinid a no contexto d a economia g lob a l, os territórios p rod utivos , d efinid os em s ua s ca ra cterís tica s interna s como célula s p rod utiva s , entra m no fluxo d a g lob a liza çã o, cons id era nd o-s e como “la b ora tórioo-s p rod utivoo-s ” e como p óloo-s d e inova çã o. Des s e mod o, rela ciona -s e, a ind a q ue a p lica nd o uma es p écie d e filtro em s ua s influência s p os itiva s e neg a tiva s , com o fluxo d a economia a b erta (SAPIA, 2004). Fa tor es te muito p ertinente p a ra s e p ens a r os a s p ectos centra is q ue ca ra cteriza m a s comunid a d es tra d iciona is , no nos s o ca s o cha ma d a s comunid a d es rura is . Vínculos tra d iciona is , a ind a q ue reforma d os , q ue exa lta m elementos d e s ocia b ilid a d e, intera çã o e interd ep end ência entre os memb ros q ue comp õem es tes territórios . Ap es a r d e nã o s erem exa ta mente os mes mos elementos q ue ca ra cteriza m o conceito d e “ca p ita l s ocia l5”, p rop os to p or Putna m (2005), e a p lica d o p or Ab ra mova y (2000) a o meio rura l b ra s ileiro, em a mb os os ca s os , s e d á d es ta q ue à s ca ra cterís tica s interna s d es te conceito q ue recup era m va lores tra d iciona is tra ns forma d os d a s comunid a d es rura is .

Uma d a s p rincip a is ca ra cterís tica s d es tes territórios é va loriza r a s ua voca çã o p rod utiva , a tra vés d e s ua cria çã o e recria çã o p erma nentes . A d efiniçã o (q ua nto a o q ue e a o como s e p rod uzir) es tá s emp re fortemente rela ciona d a a va lores e s a b eres loca is , e como ta is lig a d os à tra d içã o. Tod a via es ta tra d içã o nã o é a lg o q ue s e revita liza , ou s imp les mente s e a tua liza , ma s q ue na rela çã o com a p recis ã o ra ciona l d a s conq uis ta s técnico-científica s cria a lg o novo a b rind o-s e p a ra a s ua p róp ria red efiniçã o (BAGNASCO, 1999).

Es tes es p a ços p rod utivos s ã o “loca is ” e forma m fortes la ços nã o d e d ep end ência , ma s d e rela çã o nã o s ó com o g ra nd e merca d o p rod utivo cons tituíd o, ma s ta mb ém com a s a ntig a s forma s p rod utiva s e d e org a niza çã o d o tra b a lho. Send o a s s im, nã o d ep end em d o s uces s o ou d o ins uces s o d es ta s , ma s d a rela çã o q ue p od em ma nter com ela s6. Rela ções d ís p a res , p os itiva s ou

5 Apontando algumas características gerais deste conceito, dentre as quais destaca-se a confi ança,

observa-se uma rede de relações institucionais bastante difusas e cristalizadas, que dependem fundamentalmente de certo equilíbrio de relações. São normas e sistemas de relações que facilitam e promovem o desempenho e a efi ciência social por meio de ações coordenadas. Uma cooperação espontânea que não tolhe, mas limita as iniciativas egoístas e pessoais.

6 O sucesso e o desempenho de micro e pequenos negócios não dependem do insucesso das grandes

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neg a tiva s , ma s q ue s emp re s ã o remetid a s p a ra o interior d o fluxo comunica tivo e interd ep end ente d o interior d es tes territórios .

Porta nto, a voca çã o p rod utiva d os territórios é ta nto a lg o “rep rod uzid o” d e um p a s s a d o d e “s a b eres ” p róximo ou long ínq uo, q ua nto a lg o q ue p od e s er cria d o e recria d o a q ua lq uer momento (BECATTINI; ZORINI, 2003).

Como s e s a b e, os va lores e s a b eres s emp re fora m ma is b em cons erva d os e d es envolvid os – cria d os e recria d os – p ela s cha ma d a s s ocied a d es rura is . Web er (1979) tem a p onta mentos clá s s icos s ob re is s o, a o a na lis a r a forma çã o d o ca p ita lis mo a g rá rio na Alema nha recém unifica d a . A nos s a hip ótes e a es s e res p eito s ug ere q ue a s ocied a d e d e tip o ind us tria l, na b us ca d a s imp lifica çã o e d a ma s s ifica çã o d o cons umo e d e p rod uçã o, elimina s a b eres , s end o q ue na s s ocied a d es d e tip os rura is , tid a s à ép oca como “a tra s a d a s ”, es tes s a b eres hoje va loriza d os , a ind a q ue d e forma tra ns forma d a , encontra ra m terreno p rivileg ia d o ta nto p a ra s ua cons erva çã o q ua nto p a ra a p os s ib ilid a d e d e s e inter-rela ciona rem. Es te tip o d e s a b er d e q ue fa la mos , p róximo d o conceito fra ncês d e savoir-faire, encontra b oa d efiniçã o na p ena d e And ré Gorz (2005):

O s a b er é, a ntes d e tud o, uma ca p a cid a d e p rá tica , uma comp etência q ue nã o imp lica neces s a ria mente conhecimentos forma lizá veis , cod ificá veis . A ma ior p a rte d os s a b eres corp ora is es ca p a a p os s ib ilid a d e d e uma forma liza çã o. Eles nã o s ã o ens ina d os ; a p rend em-s e na e p ela p rá tica , p elo cos tume, ou s eja , q ua nd o a lg uém s e exercita fa zend o a q uilo q ue s e tra ta d e a p rend er a fa zer. [...] Quem q uer a p rend er uma líng ua , p or exemp lo, a p rend end o s ua s reg ra s g ra ma tica is , nã o s a b erá fa la r es s a líng ua , a o p a s s o q ue a q uele q ue em p rincíp io treina fa lá -la p od erá a p rend er ma is fa cilmente a s reg ra s g ra ma tica is p erg unta nd o-s e s ob re o funciona mento d es s a líng ua q ue ele s a b e, s em contud o conhecê-la . (GORZ, 2005, p .32).

O “meio rura l” é o loca l p rivileg ia d o d es te s a b er-fa zer. Como na s p a la vra s d e Ha rd t e Neg ri (2005), tod o a g ricultor é um q uímico. O conhecimento d e ca d a tip o d e s olo p a ra ca d a tip o d e p la nta , a s eleçã o d a s emente, a p rep a ra çã o d o a d ub o na tura l, tod os es s es s ã o s a b eres incorp ora d os p ela s comunid a d es rura is tra d iciona is . Nes s e s entid o, o a g ricultor é ta mb ém um b iólog o q ue es colhe

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a s melhores s ementes e a p erfeiçoa a s va ried a d es veg eta is ; um a rtes ã o q ue tra ns forma a fruta em vinho e o leite em q ueijo; um metereolog is ta q ue es p reita o céu e a rris ca p revis ões d e chuva e d e es tia g em.

No toca nte a org a niza çã o d o tra b a lho, a s s ocied a d es d e tip o rura l nunca p a s s a ra m p elo p roces s o d e “exp rop ria çã o d e s a b eres7”, conforme o p a ra d ig ma típ ico d a s ocied a d e d e tip o ind us tria l. Aind a q ue d e ma neira muito p a rticula r, es te p roces s o d e org a niza çã o d o tra b a lho s emelha nte a o d a g ra nd e emp res a ford is ta ocorreu d e ma neira tra ns forma d a e menos intens a na org a niza çã o d o tra b a lho d a s g ra nd es emp res a s rura is e us ina s . Nes te s entid o, a s d is tinta s forma s d e org a niza çã o d o tra b a lho exis tentes no interior d es tes territórios p rod utivos a p onta m ta nto p a ra fortes la ços d e recip rocid a d e e a p roxima çã o entre s a b er e fa zer, q ua nto p a ra rela ções d e g ra nd e exp lora çã o q ue a fa s ta m es ta rela çã o entre conhecimento e execuçã o d o tra b a lho.

As ca ra cterís tica s a té a q ui a p onta d a s no interior d es tes territórios ta nto cria m q ua nto s ã o cria d a s p ela forma çã o d e um novo merca d o. Es te é novo p or a p res enta r a trib utos d is tintos d o a ntig o merca d o d e cons umo ma s s ifica d o (BAGNASCO, 1988). É flexível, ind efinid o, va loriza a p lura lid a d e e a d ivers id a d e romp end o com os câ nones d a es ta nd a rd iza çã o d o cons umo. Bus ca ca p ta r p otencia is loca is e g lob a is d e “d es ejos ”, a d a p ta nd o ta is d ema nd a s d e cons umo na forma d e um p rod uto fina l, a o invés d e imp or p a d rões d e cons umo. Va loriza o fa tor q ua lid a d e e a d ivers id a d e em d etrimento d a q ua ntid a d e e d a p a d roniza çã o (ABRAMOVAY, 2006). Nes te s entid o, conforme es tud os d e Dima g g io e Louch (1998), tra ta -s e d e cons truçã o d e a lg o novo, o q ue imp lica a d mitir q ue ta nto a s ocied a d e influencia na cons truçã o d es te “novo merca d o”, q ua nto es te a g ind o na s ocied a d e p rod uz um novo cons umid or.

Va loriza nd o ta is p otencia lid a d es , o “conhecimento” em s entid o a mp lo a p a rece como p rincip a l força p rod utiva (GORZ, 2005). Nã o há s ub s tituiçã o d e ca p ita l fixo ma teria l p or ca p ita l ima teria l, ma s o q ue ocorre é q ue o p rod uto fina l tem cris ta liza d o

7 Na organização do trabalho industrial o saber era produzido pelos trabalhadores, neste ponto nada

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ma is conhecimento, p orta nto ca p ita l ima teria l, (LAZZARATO; NEGRI, 2001), d o q ue em p rincíp io s e p od eria s up or e, s eg ura mente, muito ma is d o q ue no tinha no p eríod o d e p rod uçã o ma s s ifica d a .

Conclusões

Aq ui cha ma mos a tençã o p a ra o fa to d e q ue o merca d o nã o é a lg o a utônomo à s ocied a d e. A cons truçã o d o merca d o, conforme a p onta m Dima g g io e Louch (1998), ou entã o a “cons truçã o s ocia l d o merca d o”, conforme a p onta Ba g na s co (1988), d ep end e d a p otência d a p rod uçã o s ocia l. Es ta , p or s ua vez, a ind a q ue nã o s eja d etermina d a exclus iva mente p elo merca d o, s e rela ciona com ele d e mod o muito p rofund o.

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E a ind a q ue nã o es teja mos nos referind o a o p ens a mento d e Ma rx como um tod o, ma s a p ena s a o p onto d is cutid o, s eg uimos com Gid d ens (1998, p .182) q ua nd o ele a p onta :

A fra g ilid a d e d e Ma rx rep ous a exa ta mente nos elementos q ue ele a cred ita s erem o fund a mento d e s ua orig ina lid a d e e d e s ua força : s ua s reflexões s ob re a s up era çã o d o ca p ita lis mo p elo s ocia lis mo. As contrib uições ma is p erma nentes d e Ma rx, q ue lhe a s s eg ura m a p os içã o d e “clá s s ico” e com a s q ua is s e es ta b elece um d iá log o contínuo, res id em na s ua a ná lis e d a ord em d o ca p ita lis mo ind us tria l, q ue ele incorreta mente ima g inou ter vid a curta .

No nos s o ca s o, a concord â ncia com o d ia g nós tico d e Gid d ens nã o es tá na id entifica çã o d e uma “fra g ilid a d e” em Ma rx, ma s s im no q ue a p onta d e a tua lid a d e “ép ica ” d e s eu p ens a mento, ou s eja , a rela çã o q ue s ua teoria tem com os fenômenos s ocia is contemp orâ neos .

Web er s e ins ere nes ta mes ma ca teg oria , ou s eja , a d e a utor “clá s s ico”, q ue a s s im p od e s er cons id era d o d a d o q ue s ua s contrib uições res is tem a o temp o, oferecend o res p os ta s a tua is p a ra p rob lema s s ocia is a tua is . A imp ortâ ncia no p ens a mento d e Web er d a rela çã o entre s ocied a d e e vínculos d e recip rocid a d e comunitá rios é d e uma a tua lid a d e q ue p or vezes ca us a es p a nto. O p eq ueno merca d o loca l d e troca s , a d ivers id a d e interna a lia d a a os vínculos d e d ep end ência ta mb ém interna , o fluxo d e p es s oa s d is trib uíd a s no interior d es ta s comunid a d es , id entifica d os p or Web er no oes te e s ud es te a lemã o d o s éculo XIX, s ã o fa tores a tua is p a ra p ens a r o d es envolvimento e a s força s p rod utiva s q ue emerg em com a cris e d a p rod uçã o em ma s s a . Com Web er a comunica çã o a p a rece como centra l no fluxo d a p rod uçã o e intera çã o no interior d a s comunid a d es rura is . Ta mb ém no ca s o d e Web er, a o q ue p a rece, o res ulta d o d a p es q uis a , ta lvez a té a q uilo q ue o a utor julg a s s e ter menos imp ortâ ncia , s e s ob res s a i com rela çã o a q uilo q ue o a utor a cred ita va s er a s ua orig ina lid a d e. Seria m a s s im, ca d a q ua l a s eu mod o, contrib uições p erma nentes , ta nto a d e Ma rx q ua nto a d e Web er.

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p od e ocorrer p orq ue na s d ita s s ocied a d es rura is ou tra d iciona is nã o houve um p roces s o d e exp rop ria çã o d o s a b er conforme com o q ue ocorreu no meio urb a no-ind us tria l. O q ue nã o s ig nifica d es conhecer q ue es te p roces s o d e exp rop ria çã o p od e ocorrer a tra vés d e “meca nis mos ” d iferentes .

A “cons truçã o” d e um “loca l” como a mb iente p rod utivo ca rece menos d o elemento fís ico e g eog rá fico d o q ue s e p ens a . Os vínculos e la ços d e recip rocid a d e, p rovoca nd o um

m ix d e coop era çã o e d is p uta no interior d es tes territórios , s ã o

ma is d ep end entes d a red e d e rela ções q ue eles es ta b elecem interna mente, s ug erind o a s s im a tra ns forma çã o d e elementos d e d á d iva e recip rocid a d e, p os s íveis a p ena s na s comunid a d es rura is q ue cons erva ra m vínculos e conhecimentos tra d iciona is , e q ue nã o p ermitira m q ue eles fos s em comp leta mente s ub s tituíd os p ela “ra ciona lid a d e” ca p ita lis ta .

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A BST RA CT: I d iscu ss k n ow led g e an d coop erat ion in t h e ru ral m ilieu or ru ral societ ies p lacin g t h em w it h in t h e fram ew ork of p rod u ct ion t ran sform at ion s. A lso, I p lace t h e p rod u ct ion ag en t s as p lay ers in t h is t ran sform at ion . I ou t lin e t h e in t eract ion of k n ow led g e an d en t rep ren eu rsh ip ab ilit y as t h e m ain p rod u ct iv e force in t h e con st ru ct ion of “n ew m ark et s”. For su ch , I an aly z e classic sociolog y au t h ors (p art icu larly W eb er an d Marx ). T h e m ain focu s is t o u n d erst an d h ow ru ral d ev elop m en t can b e con ceiv ed from k n ow -h ow t y p ical from t -h e “ru ral w orld ” in in t eract ion w it -h t -h e t ec-h n ical an d scien t ific d ev elop m en t s w h ich are t y p ical t o p recision an d cod ificat ion at t rib u t ed t o t h e in d u st rial societ y.

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