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Ensino de Língua Espanhola: o uso de brincadeiras tradicionais como recurso para a aprendizagem no ensino fundamental

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

ELAINE GOMES VIACEK OLIANI

ENSINO DE LÍNGUA ESPANHOLA: O USO DE BRINCADEIRAS

TRADICIONAIS COMO RECURSO PARA A APRENDIZAGEM NO

ENSINO FUNDAMENTAL

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ELAINE GOMES VIACEK OLIANI

ENSINO DE LÍNGUA ESPANHOLA: O USO DE BRINCADEIRAS

TRADICIONAIS COMO RECURSO PARA A APRENDIZAGEM NO

ENSINO FUNDAMENTAL

Dissertação de mestrado apresentada ao

Programa de Pós-graduação em Letras da

Universidade Presbiteriana Mackenzie como

exigência parcial para obtenção de título de

Mestre em Letras.

ORIENTADORA: Profa. Dra. Maria Lucia Marcondes C. Vasconcelos

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O671d Oliani, Elaine Gomes Viacek.

Ensino de Língua Espanhola: o uso de brincadeiras tradicionais como recurso para a aprendizagem no ensino fundamental / Elaine Gomes Viacek Oliani - 2016.

146 f. : il. ; 30 cm

Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2016.

Bibliografia: f. 142 – 146.

1. Língua espanhola. 2. Brincadeiras tradicionais. 3. Cultura. 4. Ensino. 5. Professor crítico. I. Título.

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A meus pais, marido e filho. Minha ascendência, minha escolha e meu futuro.

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AGRADECIMENTOS

Quero agradecer a todos aqueles que sempre me apoiaram, incentivaram, encorajaram e confiaram em mim. Como ouvi muitas vezes da minha mãe, Maktub, “tinha de acontecer”. O desafio de finalizar o mestrado “estava escrito”.

A Deus, cada vez mais presente na minha vida.

À minha mãe, minha maior incentivadora nessa grande conquista. Obrigada por suas sábias palavras de que sempre “é melhor se arrepender de ter feito do que não ter nem tentado”.

A meu pai, pelo carinho, alegria e exemplo de pessoa correta e de coração maior do que cabe no peito. Vida longa!

A toda minha família, em especial meu marido Ricardo e meu filho Pedro, pela paciência de longos finais de semana de muito trabalho e pouco lazer.

À Profª Drª Maria Lucia Marcondes de Carvalho Vasconcelos, pela orientação e apoio para a realização deste trabalho e por estimular a reflexão sobre minha missão de educadora.

A meus alunos, pela motivação, curiosidade e alegria na realização das atividades.

À Profª Drª Valeria Bússola Martins e à Profª Drª Nancy dos Santos Casagrande pelas preciosas contribuições durante a qualificação desta dissertação.

À minha parceira Patrícia Maria Carrer de Sá, pela alegria representada nas cores das suas aulas e no seu exemplo de mulher e profissional competente.

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Donde haya un árbol que plantar, plántalo tú. Donde haya un error que enmendar, enmiéndalo tú. Donde haya un esfuerzo que todos esquivan, hazlo tú. Sé tú el que aparta la piedra del camino.

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RESUMO

O Ensino de língua espanhola no Ensino Fundamental faz-se cada vez mais presente nas escolas públicas e particulares no Brasil, embora nos Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) não conste como uma disciplina obrigatória para essa faixa etária escolar. Encontra-se nesta pesquisa o relato de dois estudos de caso que têm como foco o ensino e a aprendizagem da língua espanhola a partir de uma sequência didática que resulta na prática de duas brincadeiras tradicionais de países de língua castelhana: o Pelele festejado na Espanha e a tradição da Piñata realizada no México. Foi possível, a partir das experiências vivenciadas por grupos de alunos do 3º e 4º anos do Ensino Fundamental em uma escola particular de São Paulo, analisar e refletir sobre a importância do elemento lúdico nessa fase escolar e a consciência da riqueza cultural de outros países como fonte inspiradora para a valorização da própria cultura lúdica. As brincadeiras relatadas nesta pesquisa, qualificadas como atividades que envolvem o trabalho coletivo, também proporcionaram um inestimável registro dos alunos com relação à postura reflexiva e crítica do educador que, neste trabalho, foi discutida à luz de conceitos encontrados na obra do educador brasileiro Paulo Freire (2014). Por fim, com base nos estudos relatados, foi possível concluir que, o ensino e a aprendizagem da língua estrangeira fundamentados na estratégia do uso de brincadeiras tradicionais com alunos do Ensino Fundamental, ultrapassam os conhecimentos linguísticos do idioma pois promovem ações que valorizam a cultura própria e de outros países e as relações humanas ancoradas no respeito mútuo.

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ABSTRACT

Spanish language teaching in primary education is becoming more present in public and private schools in Brazil, although it does not appear as a compulsory subject for this school age in the Brazilian National Curriculum Parameters (1998). This works reports two case studies that focus on Spanish language teaching and learning from a teaching sequence that results in the practice of two traditional games from Spanish-speaking countries: the Pelele, celebrated in Spain, and the Piñata tradition of Mexico. From the experiences lived by groups of students from the 3rd and 4th year of elementary school in a private school in São Paulo, it was possible to analyze and reflect on the importance of playfulness and games in this school age and the awareness of cultural wealth of other

countries as a source of inspiration for the development of the student’s own play culture.

The games reported in this research, qualified as activities involving collective work, also provided an invaluable record of the students with regard to the reflexive stance and criticism of the educator that, in this study, was discussed in the light of concepts found in the work proposed by Brazilian educator Paulo Freire (2014). Finally, based on the reported studies, it was possible to conclude that elementary school student education and foreign language learning based on the strategy of the use of traditional games go beyond the linguistic knowledge of the language, since they promote actions that value the

student’s own culture, that of other countries and human relations anchored in mutual

respect.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – “Manteo de Sancho Panza” – gravura de Vicente Urrabieta Ortiz ... 97

Figura 2 –Quadro “El Pelele” – Francisco de Goya ... 99

Figura 3 – Alunos do 3º ano da manhã executando a brincadeira do Pelele ... 108

Figura 4 – Alunos do 3º ano da manhã executando a brincadeira do Pelele ... 109

Figura 5 – Alunos do 3º ano da manhã executando a brincadeira do Pelele ... 110

Figura 6 – Alunos do 3º ano da tarde executando a brincadeira do Pelele ... 111

Figura 7 – Alunos do 3º ano da tarde executando a brincadeira do Pelele ... 112

Figura 8 –Mural “La Piñata” de Diego Rivera... 121

Figura 9 – Alunos do 4º ano manhã quebrando a piñata no pátio da escola... 131

Figura 10 – Alunos do 4º ano manhã quebrando a piñata no pátio da escola... 132

Figura 11 –Piñata construída pelos alunos do 4º ano tarde... 133

Figura 12 –Piñata construída pelos alunos do 4º ano tarde... 134

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 10

CAPÍTULO I O LÚDICO COMO ELEMENTO FACILITADOR NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM ... 20

CAPÍTULO II – A CONSCIÊNCIA CRÍTICA DOS PROFESSORES E ALUNOS NA EXECUÇÃO DAS BRINCADEIRAS... 48

CAPÍTULO III – O VIÉS CULTURAL QUE PERMEIA AS BRINCADEIRAS TRADICIONAIS... 77

CAPÍTULO IV – ESTUDO DE CASO – EL PELELE E LA PIÑATA...…... 89

CONCLUSÃO ... 136

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INTRODUÇÃO

Siembra en los niños ideas buenas, aunque no

las entiendan… Los años se encargarán de

descifrarlas en su entendimiento y de hacerlas florecer en su corazón.

Maria Montessori

O presente trabalho visa analisar o uso de brincadeiras tradicionais1 no ensino de língua estrangeira, em especial, no ensino de língua espanhola, como recurso auxiliar no processo de ensino e aprendizagem na escola de educação básica.

É bastante comum, em cursos de idiomas ou em aulas de língua estrangeira (LE) do ensino regular, que o aluno passe pelo processo de memorização e repetição de frases em situações hipotéticas do uso da língua e seja exposto a atividades padronizadas, preestabelecidas pelo professor. Essa prática irreal do idioma não facilita ao aluno alcançar um aprendizado verdadeiramente significativo.

Em Jogos para a estimulação das múltiplas inteligências, Antunes (1998) discorre sobre a importância da aprendizagem significativa ou complexa que pode ser alcançada pelo aprendiz por meio da combinação de muitas variantes ou ainda pela transformação que fazem do repertório de conhecimentos que possuem, face às informações que recebem. Portanto, a aprendizagem significativa expressa um comportamento inteligente que a criança demonstra porque consegue, pelo direcionamento dessa aprendizagem, alcançar a resolução de problemas. No tocante ao ensino de LE, a aprendizagem significativa faz referência ao uso do idioma em situações de uso real, com resoluções de problemas concretos, nos quais o aluno se sinta efetivamente agente da ação.

Estratégias de ensino que exponham o aluno a situações reais do uso do idioma, nas quais ele possa verdadeiramente vivenciar e constatar a utilidade do que está estudando, possibilitam uma aprendizagem consciente e abrem caminho não apenas para uma automática repetição de vocabulário, mas, principalmente, para um novo saber que pode ser transformado e ressignificado com autonomia por parte do aprendiz.

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O uso de jogos2 tradicionais no ensino da língua espanhola proporciona ao aluno a vivência de situações reais da prática do idioma. Portanto, desde o início da sequência didática que propõe o jogo como estratégia a ser executada em sala de aula, o educando tem a oportunidade de utilizar a LE na compreensão de seu contexto histórico que pode ser realizado, por exemplo, a partir de leituras de textos e análises de imagens que ampliam seu repertório artístico. A LE também pode ser sistematicamente utilizada na elaboração das regras, na confecção de algum artefato (se houver) e na declamação das cantigas e canções, assim como na execução da brincadeira e no processo de cooperação por tratar-se de uma atividade que envolve o trabalho coletivo.

À vista disso, são vários os atributos que o trabalho com os jogos tradicionais para o ensino da LE promove dentro do ambiente escolar, não somente para o aluno como indivíduo, mas principalmente quando se pensa no grupo.

Uma especificidade do uso de jogo como estratégia de ensino se dá, justamente, na sua força assertiva de trabalhar com a coletividade. Os alunos, a partir do uso da LE, devem saber lidar com a situação do trabalho coletivo de modo a superar as dificuldades que aparecem no transcorrer da atividade e encontrar soluções que transpassam as unidades curriculares de LE e alcançam a transversalidade, tema muito discutido no apartado sobre a Pluralidade Cultural nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN).

Isso posto, uma das propostas deste trabalho investigativo é analisar aspectos que apontam a importância do lúdico no trabalho pedagógico com alunos do Ensino Fundamental I, tendo a abordagem cultural nas aulas de línguas estrangeiras como norteadora de todo o processo.

Cabe ressaltar que toda essa conduta se dá a partir do contato que os alunos têm com a cultura de outros países. Na análise realizada neste trabalho, os jogos do Pelele, de origem espanhola, e da tradição de romper a Piñata, de origem mexicana, foram utilizados como estratégias didático-pedagógicas, demonstrando a importância de aproximar o ensino da realidade cultural dos povos falantes da LE estudada.

O emprego de jogos tradicionais não se restringe apenas ao cumprimento de etapas de aprendizagem de uma língua estrangeira. De acordo com Giovanni Sartori, em seu livro La sociedad multiétnica. Pluralismo, multiculturalismo y extranjeros (2001), o objetivo do

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Pluralismo Cultural3 é assegurar a paz intercultural para evitar a hostilidade entre culturas. Portanto, a prática do Pelele e da Piñata, jogos realizados em sala de aula e, posteriormente, neste trabalho analisados, busca promover nos estudantes o respeito à diversidade cultural.

Como é natural, a relação entre cultura e jogo torna-se especialmente evidente nas formas mais elevadas dos jogos sociais, onde estes consistem na atividade ordenada de um grupo ou de dois grupos opostos. O jogo solitário só dentro de estreitos limites possui uma capacidade criadora de cultura. (HUIZINGA, 2004. p. 54)

O uso de jogos e brincadeiras é um facilitador no processo de aprendizagem de uma LE, pois o lúdico deve estar presente nas aulas de línguas, principalmente quando se trata de alunos do Ensino Fundamental I, com idades entre seis e doze anos.

A abordagem cultural nas aulas de idiomas enriquece os temas tratados em sala, uma vez que aproxima o aluno de povos e países muitas vezes distantes de sua realidade, ao mesmo tempo em que leva o estudante brasileiro a resgatar sua própria essência cultural e valorizar suas origens ao ser estimulado a ter vários pontos de vista.

A utilização de jogos como estratégia de ensino de LE e a abordagem cultural no uso de brincadeiras tradicionais dos países de língua espanhola (em especial, Espanha e México) facilitam a prática do idioma e proporcionam ao aluno a consciência de uma aprendizagem muito mais significativa.

De acordo com Simone Selbach, no livro Língua Estrangeira e Didáticas,

A aprendizagem linguística é construída por meio do envolvimento na negociação do significado do que se pretende construir com os pré-conhecimentos que o aluno traz para a sala de aula; a aprendizagem linguística tem que ser uma experiência motivadora e afetiva para o aluno. (SELBACH, 2010, p. 52-53)

O jogo é, portanto, para o aluno do Ensino Fundamental I, uma atividade lúdica e afetiva, já que o aprendiz usa de seus conhecimentos da língua materna, ou seja, toda sua visão de mundo, para estabelecer relações entre os idiomas.

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Dispor de jogos como estratégia de ensino nas aulas de LE pode ser considerada uma ferramenta bastante comum, de acordo com os métodos comunicativos atuais de ensino de idiomas. No entanto, a singularidade desta pesquisa será a análise das especificidades do uso dos jogos tradicionais de dois países de língua espanhola que têm a abordagem cultural como elemento diferencial.

Ao se falar em “cultura”, pode-se ter em mente a humanidade em toda a sua riqueza e multiplicidade de formas de existência. São complexas as realidades dos agrupamentos humanos e as características que os unem e diferenciam, assim como a cultura que as expressa, seja de um grupo bastante reduzido seja de todo um território nacional. A partir de uma visão antropológica, pode-se pensar na cultura como uma teia de significados que dão sentido ao mundo que cerca um indivíduo, ou seja, a sociedade. E essa teia pode englobar um conjunto de diversos aspectos, como crenças, costumes, leis, valores, moral e línguas.

Portanto, cultura diz respeito à humanidade como um todo e, ao mesmo tempo, a cada um dos povos, nações, sociedades e grupos humanos. Quando se consideram as culturas particulares que persistem ou deixaram de existir, logo se constata a grande variação delas e a riqueza do patrimônio cultural que o mundo possui e que deve ser conhecido, vivenciado e principalmente preservado, neste caso, pelos alunos do Ensino Fundamental I, para as futuras gerações.

As riquezas culturais e suas relações são essenciais dentro do ambiente escolar, já que trata de ver os indivíduos como seres sociais que pertencem a diversos grupos que constituem a sociedade. Desse modo, essa discussão traz à tona a indagação sobre as razões da realidade social, suas formas de partilha e manutenção, assim como, as transformações a que estão sujeitas a todo momento. Por isso se diz que a cultura é dinâmica, viva e resiste ao tempo e às adversidades pelas quais a sociedade tende a percorrer. “[...] o destino de cada agrupamento esteve marcado pelas maneiras de organizar e transformar a vida em sociedade e de superar os conflitos de interesse e as tensões geradas na vida social”. (SANTOS, 2006, p. 11)

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extensa, mas, no que concerne a esta pesquisa, a cultura é um elemento essencial e parte constituinte dos jogos tradicionais (o Pelele e a Piñata), ou seja, a partir do uso dessas atividades como ferramenta lúdica do processo de ensino e aprendizagem da língua espanhola, os jogos atuam como um meio que promove o contato do aluno brasileiro com outras culturas, a fim de ampliar seu repertório no que diz respeito não só ao seu conhecimento geral, mas, principalmente, a valorização de sua própria cultura, a partir do autoconhecimento e do respeito à diversidade.

Discutir cultura implica também discutir o processo social concreto que extravasa outras questões e preocupações. Lendas ou crenças, festas ou jogos, costumes ou tradições são fenômenos que não dizem nada por si mesmos, mas fazem parte de uma cultura, a qual não pode ser compreendida se não se estabelecem os laços que unem todas essas características dentro de uma mesma sociedade. O fato de que as tradições de uma cultura possam ser identificáveis não quer dizer que não se transformem, que não tenham sua dinâmica. O jogo do Pelele, por exemplo, apresenta atualmente uma releitura bastante distinta da de sua origem retratada no quadro de Goya de 1791, sem perder, porém, alguns traços singulares que o caracterizam. Nota-se, portanto, como os jogos, assim como a cultura que se identifica dentro de um grupo, ou sociedade, ou nação, podem ser reescritos com a passagem do tempo e as transformações vivenciadas pelos membros de uma dada sociedade.

Nada do que é cultural pode ser estagnado, porque a cultura faz parte de uma realidade em que a mudança é um aspecto fundamental para o desenvolvimento da humanidade.

O ato de brincar, na sociedade atual, é um resgate de elementos culturais que, em geral, são transmitidos oralmente de geração em geração. As crianças hoje em dia estão acostumadas a brincar com jogos, em geral eletrônicos, que não promovem o trabalho coletivo e de cooperação, pois jogam sozinhas diante da televisão ou do computador. O resgate de elementos culturais faz referência às brincadeiras que utilizam, em sua maioria, materiais produzidos manualmente (como bonecos, marionetes e bolas de meias) e que são desenvolvidos a partir de canções e cantigas que fazem parte da cultura popular de cada país.

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A seleção para esta pesquisa de brincadeiras de países diferentes tem como base o que dizem os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998)4 sobre a Pluralidade Cultural:

[...] É essencial que se traga para a sala de aula o fato de que, pelos processos de colonização, muitas línguas estrangeiras, tradicionalmente equacionadas com as línguas faladas pelos nativos dos países colonizadores (Inglaterra, Espanha, França etc.), só hoje usadas em várias partes do mundo como línguas oficiais e até mesmo como línguas maternas. Não faz sentido, por exemplo, considerar o espanhol somente como a língua da Espanha [...].

Ainda na temática de aspectos sociopolíticos referentes à aprendizagem de uma língua estrangeira é notável a presença, cada vez maior, do espanhol no Brasil.

Sua crescente importância, devido ao Mercosul, tem determinado sua inclusão nos currículos escolares, principalmente nos estados limítrofes com países onde o espanhol é falado. A aprendizagem do espanhol no Brasil e do português nos países de língua espanhola na América é também um meio de fortalecimento da América Latina, pois seus habitantes passam a se (re)conhecerem não só como uma força cultural expressiva e múltipla, mas também política (um bloco de nações que podem influenciar a política internacional). (BRASIL, 1998, p. 49)

Uma proposta desta pesquisa é comprovar, por meio da observação e relato de experiência, que o elemento lúdico funciona como um facilitador na aprendizagem de uma língua estrangeira e que a abordagem cultural deve ser parte constituinte do curso e pode ser trabalhada a partir do uso de brincadeiras tradicionais de vários países.

Um panorama sobre o ensino da língua espanhola será brevemente apresentado logo no início do trabalho, já que para a população brasileira, o uso do espanhol é perfeitamente justificado pela sua situação geográfica, ainda que o ensino deste idioma seja opcional na grade curricular do Ensino Fundamental.

Esta pesquisa, de caráter qualitativo, constitui-se em um estudo de caso e retratará, passo a passo, os trabalhos realizados com grupos de alunos do 3º e 4º anos do Ensino Fundamental de uma escola particular de São Paulo, realizados entre os anos de 2014 e 2015.

O estudo de caso5, entendido como uma metodologia indutiva, a partir da qual a teoria é construída desde as observações empíricas, com ênfase na interação entre os dados e sua posterior análise, foi o caminho metodológico escolhido por facultar a

4 Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira fazem referência ao Ensino Fundamental II. Os grupos de trabalho desta investigação pertencem ao Ensino Fundamental I. No decorrer deste trabalho será discutido o assunto sobre a não existência de um currículo de LE para o Ensino Fundamental I.

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disponibilidade da experiência a ser relatada a outros docentes de língua espanhola que busquem refletir sobre seus percursos didáticos, para inová-los.

Isto posto, o presente trabalho de pesquisa foi dividido em 4 capítulos. O primeiro capítulo trata da aplicação do lúdico como um elemento facilitador no processo de ensino e aprendizagem da LE, em especial, no Ensino Fundamental I, com estudantes de idades entre 8 e 10 anos. Nessa fase, o interesse dos alunos passa a ser o motor propulsor que comanda o processo da aprendizagem, suas experiências e descobertas, com a parceria do educador que trabalha como um gerador de situações estimuladoras e eficazes. Nesse capítulo, portanto, o jogo será abordado como uma ferramenta de ensino e aprendizagem no ambiente escolar que estimula o interesse do aluno, para construir suas novas descobertas, desenvolve e enriquece sua personalidade e simboliza um instrumento pedagógico que leva o professor à condição de estimulador e avaliador da aprendizagem. Na aplicação de brincadeiras, busca-se o resgate do ato de brincar como uma atividade de interação e trocas, abarcando a contribuição da visão de mundo que a criança traz para o processo de aprendizagem, mesmo que de forma inconsciente.

Essas funções e essas novas habilidades, ao entrarem em ação, impelem a criança a buscar um tipo de atividade que lhe permita manifestar-se de

forma mais completa. A imprescindível “linguagem” dessa atividade é o

brincar, é o jogar. Portanto, a brincadeira infantil está muito mais relacionada a estímulos internos que a contingências exteriores. A criança não é atraída por algum jogo por forças externas inerentes ao jogo e sim por uma força interna, pela chama acesa de sua evolução. É por essa chama que busca no meio exterior, os jogos que lhe permitem satisfazer a necessidade imperiosa posta por seu crescimento. (ANTUNES, 1998, p. 37)

O segundo capítulo trata das especificidades que o uso de jogos como ferramenta de ensino de LE requer de professores e alunos. A partir dos conceitos do educador e filósofo Paulo Freire (2014), faz-se uma análise da necessidade de se contar, no ambiente escolar, com professores reflexivos e críticos que respeitam e valorizam a curiosidade epistemológica dos alunos. Para uma adequada utilização de jogos como estratégia didático-metodológica, a reflexão, o rigor, a metodologia, a pesquisa, a tolerância, o respeito, a alegria, a esperança, a competência, a disponibilidade para o diálogo e a criticidade são elementos imprescindíveis para o sucesso dessa metodologia proposta.

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ambiente escolar quanto fora dele. A partir dos jogos, os professores críticos e reflexivos podem auxiliar seus educandos a buscarem e trazerem informações sobre os assuntos discutidos em sala, estabelecerem metas para seus projetos e estimularem o raciocínio crítico. O aluno precisa ser capaz de propor ideias criativas e expressá-las a fim de cooperar na resolução de problemas que possam surgir. Afinal, a proposta desta pesquisa é trabalhar o ensino de LE por meio de jogos coletivos que exigem um movimento colaborativo e respeitoso de todos os seus participantes.

Em consonância com os conceitos de Freire (2014), estão os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira, que mencionam a preocupação do governo brasileiro em propor um ensino de idiomas que promova no aluno a possibilidade de compreender e ser compreendido pelos outros, tanto na fala quanto na escrita e a valorização do conhecimento de outras culturas como forma de compreensão do mundo em que vive. Os PCN afirmam que o conhecimento de línguas estrangeiras possibilita compreender melhor a si próprio e aumenta as possibilidades de compreensão dos valores e interesses de outras culturas.

No segundo capítulo, a postura do professor consciente, reflexivo e comprometido com sua missão de educador, que promove no ambiente escolar uma pedagogia libertadora ancorada no diálogo, é percebido como um personagem imprescindível no processo de ensino de LE, a partir do uso de jogos tradicionais. Como citam os documentos sobre a Cultura de Paz, proposta pela ONU/UNESCO, “[...] a cultura de paz procura resolver os problemas por meio do diálogo, da negociação e da mediação, de forma a tornar a guerra e a violência inviáveis” (2010, p. 11). Embora os alunos tenham grande conhecimento das atividades lúdicas e muito possam contribuir com sua visão de mundo, o professor aparece como parte constituinte do processo que tende a dar autonomia ao aluno, a partir das experiências compartilhadas entre todos, inclusive com o educador.

O terceiro capítulo aborda o tema da importância dos estudos culturais no ensino de LE. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998), a Pluralidade Cultural é essencial no processo de reconhecimento e valorização de outras culturas, principalmente em se tratando da língua espanhola presente nos países que fazem fronteira com o Brasil. Mais do que a língua da Espanha, o idioma castelhano fortalece a América Latina a partir de múltiplas expressões culturais e posicionamentos políticos.

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direito dos povos e dos indivíduos. Portanto, repudiar as formas de discriminação por etnia, crença, credo e gênero estão entre os objetivos centrais da proposta que visa fomentar o respeito mútuo e uma “Cultura de Paz”.

“A Cultura de Paz, assim, ao mesmo tempo, induz consciências e as influencia em direção a um mundo mais tolerante e, nesse caso, a uma nação mais solidária”. (ONU/UNESCO, 2010, p. 9)

O que preconiza o estudo de LE a partir da estratégia de jogos tradicionais nos ambientes escolares é, justamente, ampliar o repertório cultural dos alunos, colocando-os em contato com culturas distantes, a fim de que possam conhecer e respeitar as diversidades e sobretudo, valorizar sua própria cultura de origem.

No quarto capítulo, é relatado o estudo de caso, realizado com os alunos do 3º e 4º anos em 2014 e 2015 respectivamente, com a aplicação das brincadeiras Pelele e a tradição de romper a Piñata. Apresenta-se o relato passo a passo até a execução das atividades. Inicia-se com as discussões iniciais e o resgate cultural das brincadeiras tradicionais em contraponto aos jogos eletrônicos da atualidade. A observação da cultura do país estrangeiro e de seu próprio país e o estímulo à “Cultura de Paz” citada nos PCN. Continua com a observação de imagens e leituras de textos para ampliação de conhecimentos sobre dados históricos, documentação de origem e registros artísticos. A sequência se dá pela elaboração das regras e sistematização do estudo do idioma, a análise e ampliação gramatical, o treino fonético, a compreensão da oralidade e as resoluções que saem do individual e começam a ser definidas pelo grupo. Há também a possibilidade de trazer assuntos para a sala de aula, junto com o estudo de LE, assuntos considerados polêmicos, posto que algumas brincadeiras tratam de temas que representam realidades de gerações passadas. Esses temas podem ser discutidos e muitos aprendizes podem ter a oportunidade de ver releituras atuais e, assim, levantar suas próprias conclusões de como o tempo e as vivências podem modificar o modo de agir e pensar das pessoas. Por fim, a conclusão do projeto implica o ato de brincar, propriamente dito, colocando em prática todos os conhecimentos adquiridos anteriormente. Também há registros das atividades avaliativas feitas a partir das observações do professor e dos alunos. Uma autoavaliação dos alunos e também do projeto como um todo são essenciais para perceber o que sempre pode ser revisto e melhorado para uma futura aplicação.

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importância dos estudos culturais como aliados no processo de aquisição de uma língua estrangeira. Serão, ainda, destacados os aspectos positivos da aplicação dos jogos como elementos legitimadores da hipótese deste trabalho. Também há observações sobre a figura do professor como membro constituinte do processo e o rigor metodológico muito mencionado ao longo de todo o relato. Faz-se ainda uma breve observação sobre a interdisciplinaridade presente no processo, principalmente em função das análises dos jogos a partir de obras artísticas e literárias.

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CAPÍTULO I

O LÚDICO COMO ELEMENTO FACILITADOR NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM

Enseñar siempre: en el patio y en la calle como en el salón de clase. Enseñar con la actitud, el gesto y la palabra... Maestro, sé fervoroso. Para encender lámparas basta llevar fuego en el corazón. El amor a los niños enseña más caminos al que enseña que la pedagogía.

Gabriela Mistral

Aprender de forma lúdica é um dos recursos mais recorrentes nos planejamentos das aulas de língua estrangeira (LE) para crianças. Aprender de forma prazerosa envolve e diverte todos os integrantes do processo de ensino e aprendizagem: alunos e professores. As atividades lúdicas potencializam a criatividade e contribuem para o desenvolvimento intelectual e afetivo e, desse modo, os alunos são persuadidos a encarar o percurso de aprendizagem como um momento prazenteiro e intelectualmente enriquecedor. A organização do ato educativo a partir do desafio lúdico ocupa um espaço significativo no ambiente escolar, uma vez que promove a automotivação, o prazer, a espontaneidade, o movimento e a ação. Ao brincar, a criança não está preocupada com os resultados, ela é impulsionada pelo prazer e pela motivação de participar de uma atividade coletiva.

Dantas (2002), em seu artigo Brincar e trabalhar, detalha o significado dos vocábulos “brincar” e “jogar”. Em sua opinião, são

dois termos distintos em português e fundidos nas línguas de cuja cultura somos devedores: o francês (jouer) e o inglês (play). Por causa disso, frequentemente desperdiçamos a diferenciação de ordem psicogenética que a nossa língua nos permite: brincar é anterior a jogar, conduta social que supõe regras. Brincar é forma mais livre e individual, que designa as formas mais primitivas do exercício funcional, como a lalação6.

(DANTAS, 2002, p. 111)

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É no ato de jogar que as interações estabelecidas com outras pessoas acontecem. No momento em que sucedem as trocas, a criança tem a oportunidade de assumir diversos papéis, experimentar, colocar-se no lugar do outro, realizar ações que podem ser mais ou menos prazerosas. O jogo é capaz de colocar em destaque a informalidade e a espontaneidade, a competência e o enfrentamento, o desafio, a imaginação, a criatividade, o movimento, e, de maneira muito expressiva, a diversão. Mas, sem dúvida, uma característica que se sobressai na atividade lúdica, como aqui será proposta, é a especificidade que tanto a brincadeira quanto o jogo têm: a oportunidade que oferece à criança de expressar-se.

O uso de jogos e brincadeiras como uma ferramenta do ensino de uma LE proporciona ao educando a possibilidade de atuar como protagonista no processo de ensino e aprendizagem, fazendo com que as propostas sejam significativas e eficazes a partir de um estudo lúdico e consciente.

Uma prova de que o aluno é o sujeito da ação, quando a proposta é o uso de atividades lúdicas nas aulas de LE, efetiva-se no momento em que essa prática se torna verdadeiramente relevante no processo de aprendizagem. Tal fato é perceptível à medida que o aprendiz demonstra que é capaz de brincar com autonomia, fazendo uso de um idioma que não é o seu. De acordo com Kishimoto (2002), em Brincar e suas teorias, “quem brinca, se serve de elementos culturais heterogêneos para construir sua própria cultura lúdica com significação individualizada”. (KISHIMOTO, 2002, p.32)

O jogo, de forma geral, pode ser considerado um produto de múltiplas interações sociais que resulta em benefícios intelectuais, morais e físicos. Quando utilizado de forma consciente, crítica e planejada no ambiente escolar, dá acesso a riquezas culturais complexas e diversificadas. Como uma ferramenta de aprendizagem lúdica, o jogo caracteriza-se por ser um componente importante no desenvolvimento integral da criança.

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Ao jogar, a criança aprende e desenvolve seu pensamento, sua imaginação, sua criatividade, visto que o jogo promove um contexto no qual é possível ensaiar formas de responder perguntas com as quais se depara, e também, construir conhecimentos novos. O jogo ajuda o educando a reelaborar suas experiências e age como um importante fator de equilíbrio e domínio de si mesmo. Da mesma forma, tal atividade propicia que as crianças se comuniquem e cooperem com os demais companheiros facilitando a tarefa de ampliar o conhecimento que têm do mundo social.

Pensar numa atividade lúdica como um meio educacional significa pensar menos no jogo pelo jogo, mas no jogo como instrumento de trabalho, como meio para alcançar objetivos preestabelecidos. Por meio do jogo, a criança fornece informações, e tal atividade pode ser útil para estimular o seu desenvolvimento integral e trabalhar conteúdos curriculares que certamente fazem parte do programa das aulas de LE.

A partir do jogo, pode-se observar o comportamento da criança no que se refere ao respeito às atividades físicas e mentais envolvidas. O ato de jogar põe em evidência as características de sociabilidade, já que sua execução propicia ações como as trocas e a competição. Também se tornam evidentes as atitudes, as emoções e as reações que envolvem os jogadores, bem como a conexão que mantem com os brinquedos ou outros objetos que façam parte da atividade.

Em Enseñar en clave de juego, Patricia Sarlé7 afirma que o jogo apresenta características que resultam particularmente úteis para o processo de ensino e aprendizagem: a motivação intrínseca, a simbolização e a relação meio-fim. À vista disso, os professores podem ter a convicção de que basta dizer “Vamos jogar” que as crianças se entusiasmam com a proposta e se sentem motivadas a realizá-la. Da mesma maneira que, ao criar um marco ficcional em que a fantasia e a imaginação andam de mãos dadas, os educadores conferem aos educandos a possibilidade de pensar além da tarefa e gerar intervenções ricas e variadas. Ao buscar caminhos alternativos para chegar a um fim, as crianças são capazes de traçar estratégias úteis para a resolução de problemas. (SARLÉ, 2010)

Tais características dão certa vantagem às atividades que o professor de LE idealiza. Ao assumir um formato lúdico, as crianças não “cumprem com” uma atividade proposta pelo docente, mas “são parte” dela. Portanto, as tarefas têm um sentido real para a criança,

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elas se contextualizam e os educandos se encontram com muitas oportunidades de observar e interatuar com outros participantes e, consequentemente, constroem o conhecimento de forma conjunta.

Por meio das atividades lúdicas propostas em sala de aula, o professor se instrumentaliza de uma série de dados que podem ser interpretados e reinvestidos em vários momentos das aulas de LE. Desde as observações feitas pelo educador, surgem diferentes perspectivas de análise do comportamento no ato de brincar, como as reações afetivas, cognitivas, sociais, morais, culturais e linguísticas. Cabe ressaltar que o jogo, em uma aula de LE, não se apresenta apenas como um recurso linguístico, utilizado na aprendizagem de um idioma. Tal atividade lúdica representa, para o professor, um recurso precioso de observação da natureza humana e do desenvolvimento da criança como um ser pensante e inserido num grupo escolarizado.

As atividades lúdicas propostas nas aulas de LE, além de cumprirem com sua função pedagógica de facilitar o processo de ensino e aprendizagem de um idioma, exerce uma função preciosa para o docente que tem um olhar atento nas atitudes de seu corpo discente. Carlota Boto (2002), em seu texto Por uma ética em profissão: rumo a uma nova paideia, faz uma reflexão acerca do profissional da educação e da responsabilidade que suas atribuições acarretam. De acordo com a autora, a aula é, para o educador, o registro de sua identidade.

Ser profissional, na plena acepção da palavra, requer de nós a firmeza de princípios, o entusiasmo das estreias e a serenidade que apenas o tempo e o hábito estão aptos a conferir. Há de se buscar, na vida em magistério, habilidade para lidar com o outro e com o diferente. Ser professor sugere, ainda, que sejamos capazes de confrontar cada etapa de nossa vida profissional com o transcurso já efetuado e optar por caminhos que nem sempre serão os mais fáceis, mas se colocam, dentre todos os que, em cada situação, se apresentam, como os mais éticos, os mais corretos, os mais valorosos. (BOTO, 2002, p.68)

Nas relações de troca promovidas pelas atividades lúdicas propostas nas aulas de LE, estabelecidas entre o professor e o aluno e também entre os próprios alunos, é possível transformar o cotidiano da escola em um exercício de formação continuada, principalmente se tal relação estiver ancorada no diálogo e envolver todos os elementos do processo de ensino e aprendizagem.

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detalhadamente esquematizada no ambiente da sala de aula. Porém, sua execução se dará no pátio da escola, possibilitando, assim, a atribuição de mais características atrativas para o educando.

Os jogos que acontecem no pátio apresentam o diferencial do ambiente físico ao ar livre em contraponto com o ambiente fechado da sala de aula. Esse lugar, em geral, dá ao aluno a ideia de autonomia e liberdade, principalmente por sua dimensão ampliada.

O espaço físico nomeado pátio da escola, na maioria das vezes, conta com certas regras de utilização, já que, em muitos casos, dispõe de materiais específicos utilizados em outros momentos pelos alunos, tais como: brinquedos (escorregador, balanço, gangorra), material em geral (bolas, carrinhos, bambolês entre outros) e tanque de areia. Apresenta-se, nesse momento de utilização do espaço, o grande desafio de aliar as regras do jogo aprendidas nas aulas de LE às regras já existentes em função do espaço físico de um ambiente aberto.

Há nesse contexto uma situação bastante desafiadora e estimulante para o aluno e um campo de observação valioso para o professor. O aluno, para poder executar o jogo no pátio da escola, precisará superar a instigante tarefa de unir regras e transpor obstáculos para finalmente alcançar seu objetivo: jogar. O professor, atento às atitudes de seu aprendiz, poderá observar a forma como o seu aluno consegue lidar com obstáculos reais de regras de convivência e respeito ao espaço coletivo.

No fluxo da atividade proposta aos alunos, o professor de LE, em geral, quase não intervém em sua realização. Espera-se que os educandos, depois da sequência de atividades propostas em sala de aula e conhecedores de suas tarefas, executem as atividades com autonomia. Consequentemente, o jogo realizado no pátio estimula a autoconfiança do discente por tratar-se de uma proposta que se centra principalmente na relação entre os participantes que têm nesse momento, como propósito, a ideia de diversão. Já para o docente, consciente de seu papel e atento espectador das ações de seus alunos, conta com o privilégio de observar a atividade a fim de conhecer melhor suas crianças, descobrir a amplitude de seu repertório lúdico e compreender maneiras pessoais de resolver situações problemáticas, potencializadas pela interação apoiada na ludicidade do jogo.

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sentido, o jogo no pátio não deve ser desaproveitado com espaço no qual deixar que o jogo aconteça e seja possível.8 (SARLÉ, 2010, p.51)

É imprescindível não ponderar a respeito da reflexão crítica sobre a prática docente, com relação ao valor educativo do momento do jogo. Cabe ao professor imaginar as melhores intervenções para potencializar as atividades coletivas tanto na sala de aula como no pátio e suas estratégias para incrementar e aprimorar o trabalho.

Na vida cotidiana das crianças no ambiente escolar, de acordo com Patricia Sarlé, faz-se necessário que o docente pense o jogo no pátio como “[...] um momento potente desde o ponto de vista dos aprendizes, fértil para algumas instruções, extremamente rico desde a perspectiva da interação social e a inserção na vida cultural comunitária”.9

(SARLÉ, 2010, p. 51)

Tais circunstâncias, assim como expressa o educador brasileiro Paulo Freire (2014), incitam o docente a assumir a responsabilidade de suas funções como um educador consciente de seu comprometimento com a sociedade e convicto de que a mudança é possível a partir de uma relação ancorada no respeito mútuo entre todos os participantes das atividades propostas.

Isto posto, quanto mais possibilidades tenha o discente de aprender e assimilar conhecimentos novos, e quanto mais elementos reais tenha à disposição a criança em sua experiência no ambiente escolar, mais considerável, significativa e produtiva será a possibilidade de seu jogo e suas atividades em interação com os demais companheiros.

Ao declarar que a proposta deste estudo tem como foco o uso dos jogos como elemento facilitador no processo de ensino e aprendizagem de uma LE, torna-se impraticável desassociar a linguagem e o jogo. Ambos têm uma relação bidirecional, de influência mútua e, por consequência, potencializam-se entre si. A linguagem se entrelaça com as ações dos participantes e contribui para criar a estrutura e a trama do jogo, pois permite que a tarefa seja realizada e se mantenha por um certo tempo. No entanto, ao jogar, os educandos estabelecem representações que subjazem a esta prática e se promovem, assim, diferentes aspectos do desenvolvimento linguístico das crianças. Para o educando, o jogo se torna uma situação de ensino informal na qual se aprende a linguagem. Mesmo que

8Tradução nossa. “No cabe la menor duda de que el juego es un modo de socialización que prepara para la adopción de papeles en la sociedad adulta [...], y que, en este sentido, el juego en el patio no debe ser desaprovechado como espacio en el cual dejar que el juego suceda y sea posible”.

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o aprendiz esteja consciente do uso da língua que deve ser potencializado na atividade no pátio, há uma certa dose de desprendimento linguístico que o aluno autônomo é capaz de desenvolver e o educador, com sua experiência didática e conhecimento linguístico, deve interceder de forma pouco invasiva, a fim de dosar os momentos de desvios linguísticos e interferir apenas quando necessário. Em situações de jogo, a interação entre os aprendizes e o professor cria uma circunstância de desenvolvimento cognitivo que pode se tornar cada vez mais complexa, de acordo com o desenrolar das atividades. As crianças constroem representações mentais completas e multíplices que sucedem a partir da interação verbal, independente de roteiros.

Os diálogos que as crianças estabelecem durante o jogo colocam em destaque o conhecimento da existência de algo dado e conhecido por todos, mesmo na fase anterior à atividade, na qual ainda era possível contar com um roteiro comum, único e coerente. Posto que a fonte enriquecedora dos jogos são as ideias que os alunos têm da realidade que os rodeia, a atividade será mais proveitosa de acordo com a experiência que os aprendizes têm sobre o tema em questão. Se as crianças não conhecem satisfatoriamente o assunto sobre o qual se propõe a situação simulada, não podem jogar, pois não possuem o conteúdo específico sobre o qual devem “recriar” o papel que cada um deve assumir.

Assim sendo, pode-se dizer que o jogo é um meio para aprender realidades diferentes, no momento em que se dá a “existência” a situações imaginárias conforme certas regras que afetam e constituem essa situação.

Um indício da relevância do uso de jogos no contexto das aulas de LE como elemento digno de análise nesta pesquisa se dá no instante em que se observa que jogar na escola, necessariamente, não é o mesmo que jogar em casa. O formato escolar determina o número de jogadores possíveis, a presença de um adulto que define o que se deve ou não fazer, o espaço e o tempo, a forma como os educandos devem utilizar os materiais e a disponibilidade dos mesmos, as normas sociais que regem as relações entre o professor e o aprendiz e as crianças entre si.

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Em Aprender com jogos e situações-problema, Lino de Macedo (2011) diz que os jogos propiciam ao professor um valioso instrumento de análise quanto à aplicação dos conhecimentos adquiridos num contexto lúdico, já que as contribuições que se tem do ato de jogar podem ser exploradas sob diferentes perspectivas. A partir de certas atitudes do aprendiz, é possível tecer considerações sobre sua postura

[...] ser atento, organizado e coordenar diferentes pontos de vista são fundamentais para obter um bom desempenho ao jogar e também podem favorecer a aprendizagem na medida em que a criança passa a ser mais participativa, cooperativa e melhor observadora. Além disso, a ação de jogar exige, por exemplo, realizar interpretações, classificar e operar informações, aspecto que têm uma relação direta com as demandas relativas às situações escolares. (MACEDO, 2011, p. 14)

O confronto de diferentes pontos de vista, essencial para o desenvolvimento do pensamento lógico, está sempre presente no jogo, o que torna essa situação particularmente rica para estimular a vida social e a atividade cognitiva do aprendiz. O trabalho com jogos torna-se realmente produtivo quando se percebe que o aluno consegue ser consciente de suas conquistas e é capaz de reinvestir seus conhecimentos em outros contextos, tanto escolar como pessoal.

Como afirma Paulo Freire (2008), filósofo e patrono da Educação Brasileira, em seu livro Educação e mudança,

Em todo homem existe um ímpeto criador. O ímpeto de criar nasce da inconclusão do homem. A educação é mais autêntica quanto mais desenvolve este ímpeto ontológico de criar. A educação deve ser desinibidora e não restritiva. É necessário darmos oportunidade para que os educandos sejam eles mesmos. (FREIRE, 2008, p. 32)

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encontra-se o conteúdo trabalhado nas aulas de LE, que dará o suporte linguístico necessário para manter no grupo o espírito lúdico, essencial para que o jogador possa entregar-se ao desafio da jornada que o jogo propõe. Como afirma Lino de Macedo, “quem joga pode efetivamente desenvolver-se”. (MACEDO, 2010, p. 24)

No contexto da utilização dos jogos como estratégia de ensino e aprendizagem de LE, a participação ativa do aprendiz sobre o seu saber é valorizada por vários motivos. Por exemplo, o jogo oferece uma oportunidade ao educando de estabelecer uma relação positiva com a aquisição de conhecimento, pois conhecer passa a ser percebido como uma real possibilidade, ou seja, o aluno necessitará falar no idioma estrangeiro para comunicar-se com os demais companheiros do grupo e somente a partir da assimilação, memorização e pronúncia correta do idioma ele se fará entender. Alunos com dificuldades de aprendizagem também podem modificar gradativamente a imagem negativa do processo de aquisição do idioma a partir de uma experiência na qual aprender pode ser uma atividade interessante e desafiadora. Por meio de atividades como os jogos, os aprendizes podem ganhar autoconfiança, podem ser incentivados a questionar e a corrigir suas ações, analisar e comparar pontos de vista, organizar e cuidar dos materiais utilizados.

O aluno que participa ativamente do processo de ensino e aprendizagem de uma LE que utiliza a estratégia de jogos, independentemente do seu grau de assimilação de conteúdo, tem a possibilidade de desenvolver seu raciocínio e elaborar estratégias na resolução de problemas.

[...] é imprescindível que as crianças tenham recursos internos para enfrentar e resolver desafios, adquirindo gradativamente autonomia para ter iniciativa, responsabilidade e organização com as tarefas escolares. A ação preventiva das oficinas (de jogos) tem a função de estimular a curiosidade, o espírito de investigação e a busca de soluções: atitudes exigidas na escola, e ao mesmo tempo, valorizadas quando se joga. (MACEDO, 2010, p. 24-25)

O uso de jogos como ferramentas de ensino e aprendizagem de LE promove condições internas nos educandos para lidar com as diferentes situações que enfrentam em sua rotina na escola e em casa. Observar, questionar, discutir, interpretar, solucionar e analisar são algumas das peculiaridades das atividades lúdicas propostas nas aulas de LE com o objetivo de realizar os jogos de forma satisfatória.

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aplicação de jogos como ferramenta no processo de ensino e aprendizagem de uma LE, o educador auxilia seus educandos a pensarem antes de agir. A partir do estímulo, a criança se sente encorajada a aprimorar e melhorar seu desempenho, valorizando assim um desejo próprio de autosuperação. Para Lino de Macedo, o trabalho com os jogos na escola faz a criança considerar que pensar é uma atividade constante, que pode e deve ser prazerosa. “Na medida em que a criança toma consciência disso, seu autoconceito vai se modificando: pode perceber que não está reduzida somente ao que não sabe e mais, aprende que ela é produtora de seu próprio conhecimento”. (MACEDO, 2010, p. 27)

Se bem que, dentro do contexto do uso de jogos nas aulas de LE proposto neste estudo, há uma questão fundamental que o professor de idiomas deve tratar com extremo rigor: a autoconfiança do aluno no momento da realização do jogo se deve, em parte, a um certo grau de assimilação do conteúdo praticado em sala de aula, ou seja, o jogo no pátio da escola é um momento precioso de aprendizagem, porém, o professor de LE deve garantir que, em sala de aula, o aprendiz seja capaz de se instrumentalizar minimamente, para logo participar ativamente da atividade coletiva. Sem uma aquisição pelo menos parcial do conteúdo trabalhado em sala, o aprendiz poderá correr o risco de sentir-se intimidado pelo grupo e ser exposto a uma a situação constrangedora, o que vai de encontro a todas as características positivas do trabalho com o jogo descritas até o momento. Verifica-se, nessa etapa das atividades propostas nas aulas de LE, a imprescindível presença do professor como guia indispensável na estruturação e instrumentalização do jogo. A atuação do professor continua sendo fundamental em todo o processo e realização das atividades.

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Em Pedagogia da autonomia: saberes necessários a prática educativa, o educador Paulo Freire afirma que “a questão da identidade cultural, de que fazem parte a dimensão individual e a de classe dos educandos cujo respeito é absolutamente fundamental na prática educativa progressista, é problema que não pode ser desprezado” (FREIRE, 2014, p.42). Freire procurou, em seus 76 anos de muita dedicação em defesa da igualdade de direitos entre os cidadãos, a busca por uma educação problematizadora, questionadora e conscientizadora, cujo cerne estava na natureza política do ato de aprender. Em sua obra, discute amplamente a prática educativa como mudança social, sem, no entanto, desconsiderar o sujeito que tem autonomia no processo de construção de seu conhecimento.

Ao desprezar tais premissas, muitos professores de LE se empenham em propor atividades focadas apenas em funções comunicativas que priorizam a memorização de vocabulário e estruturas gramaticais. Assim, fazem do estudo de LE uma repetição mecânica de frases feitas que, em alguns momentos, cumprem com o papel de fazer com que o aluno consiga se comunicar, porém, tal estratégia desconsidera uma das principais funções da escola e do educador, que é ter a consciência de que ensinar exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo.

A nossa capacidade de aprender, de que decorre a de ensinar, sugere ou, mais do que isso, implica a nossa habilidade de apreender a substantividade do objeto prendido. A memorização mecânica do perfil do objeto não é aprendizado verdadeiro do objeto ou do conteúdo. Nesse caso, o aprendiz funciona muito mais como paciente da transferência epistemologicamente curioso, que constrói o conhecimento do objeto ou participa de sua construção. É precisamente por causa desta habilidade de apreender a substantividade do objeto que nos é possível reconstruir um mal aprendizado, o em que o aprendiz foi puro paciente da transferência do conhecimento feita pelo educador. (FREIRE, 2014, p. 67)

Para Paulo Freire – base epistemológica deste estudo –, o homem é o sujeito da educação, vista como um processo permanente, libertador. A educação deve considerar a vocação de ser do sujeito e as condições em que ele vive, e o conhecimento – como um processo de conscientização – é visto como uma ação inacabada, contínua e progressiva. Quando Freire se refere à contribuição da visão de mundo a partir do ponto de vista de um adulto10, ele fala do que o indivíduo traz de suas experiências pessoais, do meio cultural e social onde vive. No que concerne a este trabalho sobre o uso de jogos nas aulas de LE e a

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partir do trabalho realizado com crianças do 3º e 4º anos do Ensino Fundamental, a contribuição de visão de mundo faz referência à cultura lúdica que a criança traz para a sala de aula.

A cultura lúdica é, então, composta de um certo número de esquemas que permitem iniciar a brincadeira, já que se trata de produzir uma realidade diferente daquela da vida quotidiana: os verbos no imperfeito, as quadrinhas, os gestos estereotipados do início das brincadeiras compõem assim aquele vocabulário cuja aquisição é indispensável ao jogo. (BROUGÈRE in KISHIMOTO, 2002, p. 24)

Brougère (2002) também reforça a ideia de que brincar não é uma dinâmica interna do indivíduo, mas uma atividade dotada de uma significação social precisa, que, como outras, necessita de aprendizagem. Já a cultura, nasceria de uma instância e de um lugar marcados pela independência em face de qualquer outra instância, sob a sustentação de uma criatividade que poderia desabrochar sem obstáculos. “Para cada cultura, em função de analogias que estabelece, vai construir uma esfera delimitada (de maneira mais vaga que precisa) daquilo que numa determinada cultura é designável como jogo”. (BROUGÈRE, 2002, p. 24)

Assim, cabe ressaltar a relevância da pesquisa apresentada neste trabalho que apresenta a prática de jogos como uma ferramenta de ensino e aprendizagem de LE. De forma lúdica, propõe-se aos alunos o estudo de um idioma – o Espanhol –, que tem como diferencial o viés cultural por tratar-se de brincadeiras tradicionais da Espanha e do México.

Espelhado na sociedade em que o jogo é praticado, a atividade lúdica exerce a função de retratar o ambiente e o tempo de determinado grupo social, sua forma de pensar e agir. Para Kishimoto (2000), em seu livro Jogo, Brinquedo, Brincadeira e a Educação, “considerar que o jogo tem um sentido dentro de um contexto significa a emissão de uma hipótese, a aplicação de uma experiência ou de uma categoria fornecida pela sociedade, veiculada pela língua enquanto instrumento de cultura dessa sociedade”. (KISHIMOTO, 2000, p. 16)

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O conjunto de regras de jogo disponíveis para os participantes numa determinada sociedade compõe a cultura lúdica dessa sociedade e as regras que um indivíduo conhece compõem sua própria cultura lúdica. A façanha de tratar de jogos tradicionais ou de jogos contemporâneos não interfere na questão, mas é preciso saber que essa cultura das regras se individualiza, particulariza-se. É importante mencionar que a dimensão sociocultural do desenvolvimento humano não se refere apenas a um amplo cenário, um pano de fundo em que se desenrola a vida individual.

O ato de brincar e/ou jogar coloca a teoria em prática, pois faz com que o aprendiz precise utilizar a língua e toda sua leitura de mundo para pôr em ação atividades que, de forma geral, trabalham com o coletivo e funcionam a partir de regras preestabelecidas e parâmetros estritos.

O aprendiz de LE não pode ser aquele apenas que ouve e repete, ele precisa fazer parte de um processo no qual ele ouve, lê, escreve, compreende e principalmente executa. A criança que participa ativamente do processo de aprendizagem atinge níveis de sucesso no uso do idioma e, por consequência, alcança o contentamento pessoal.

A singularidade deste trabalho é discorrer sobre o uso de dois jogos tradicionais de países de língua castelhana, tendo como diferencial a vertente cultural que, no contexto da LE, deve ser considerada um elemento curricular imprescindível.

Muitas brincadeiras preservam sua estrutura inicial, outras modificam-se recebendo novos conteúdos. A força de tais brincadeiras explica-se pelo poder da expressão oral. Enquanto manifestação livre e espontânea da cultura popular, a brincadeira tradicional tem a função de perpetuar a cultura infantil, desenvolver formas de convivência social e permitir o prazer de brincar. Por pertencer à categoria de experiências transmitidas espontaneamente conforme motivações internas da criança, a brincadeira tradicional garante a presença do lúdico, da situação imaginária. (KISHIMOTO, 2000, p. 38-39)

Colocar a criança em contato com outras culturas faz com que ela consiga enxergar seu próprio espaço com outros olhos. Expor o aprendiz a culturas de países diferentes abre caminhos para o respeito à diversidade e amplia a visão de mundo ao se ter a consciência da grandeza cultural da humanidade.

No livro Ação cultural para a liberdade, Paulo Freire diz:

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num contexto concreto, histórico, social, cultural, econômico, político, não necessariamente idêntico a outro contexto. (FREIRE, 1989, p. 17)

O ato de brincar promove desafios aos alunos/crianças que terão de lidar não somente com a língua, a linguagem, mas também, com a situação problematizadora de respeitar regras e lidar com o coletivo.

Quando se analisa mais criticamente a sociedade atual, percebe-se que a criança de agora precisa lidar com situações muito diferentes das situações vividas por seus pais e avós. Não é mais tão comum, principalmente em grandes cidades, ver crianças em grupos, brincando nas ruas, lidando com situações que exigem trocas e principalmente respeito mútuo.

As brincadeiras, independente do país, língua ou cultura, proporcionam, em muitos momentos, o exercício do respeito à coletividade, o contato pessoal, o respeito ao limite próprio e alheio, a negociação. O que mais uma vez justifica o uso do jogo na escola, um ambiente coletivo, muito diferente do que se vê dentro de casa onde, em geral, o jogo ou as brincadeiras acontecem de forma solitária, individual. Esse resgate de valores é essencial no momento atual, no qual a maioria das crianças brinca apenas dentro de casa ou do condomínio, somente com irmãos ou poucos colegas, diante de computadores e telas de jogos eletrônicos.

O posicionamento da criança dentro do grupo, as relações interpessoais no jogo coletivo, a cooperação e a comunicação entre eles (ainda que não dominem o idioma castelhano) fazem do jogo usado nas aulas de LE um dispositivo facilitador da aprendizagem da língua e também uma ferramenta que estimula as relações entre elas.

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quanto mais estimule o desenvolvimento dessa necessidade radical dos seres humanos, a de sua expressividade”. (FREIRE, 1989, p. 24)

A confirmação de que o aluno é o sujeito da ação quando a proposta é o uso de atividades lúdicas nas aulas de LE, faz-se visível quando essa prática se torna verdadeiramente significativa no processo de ensino e aprendizagem da língua. Para a criança, o jogo realmente se efetiva quando dispõe de significação, de esquemas em estruturas que ela constrói no contexto de interações sociais aos quais tem acesso.

No contexto do uso de jogos como estratégia pedagógica, tal atividade busca criar condições para que os educandos possam descobrir ou redescobrir que é possível “aprender e conhecer, e, para a surpresa de muitas (crianças), mesmo as atividades mais formais podem dar prazer, despertar interesse e prender a atenção”. (MACEDO, 2010, p. 27)

É indiscutível como a cultura lúdica participa do processo de socialização da criança, pois conserva aspectos complexos do início ao fim das atividades. Através dos jogos, os alunos, junto com o professor, constroem uma representação mental do que será feito em sala. Toda a prática do jogo envolve uma aprendizagem progressiva, aliada a elementos heterogêneos provenientes de fontes diversas. Fazem parte das especificidades dessa ferramenta de ensino, a interação, a interpretação e a diversificação da cultura conforme diferentes critérios. Com o jogo, a criança se torna sujeito de uma experiência cultural composta por uma interação simbólica em toda sua complexidade.

Kishimoto (2002), em seu artigo Froebel e a concepção de jogo infantil, alega que Froebel11 foi o primeiro a colocar o jogo como parte essencial do trabalho pedagógico, embora não tenha sido o primeiro a analisar seu valor educativo. Anterior a Froebel, três concepções sobre os jogos no contexto escolar da educação infantil haviam sido elucidadas. Via-se o jogo, em primeiro lugar, como uma recreação. Em segundo lugar, seu uso era visto como um facilitador do ensino de conteúdos escolares, e em terceiro lugar, o jogo era considerado um recurso precioso para ajustar o ensino às necessidades infantis, a partir de um diagnóstico da personalidade da criança. “Froebel entende que, nas brincadeiras, a criança tenta compreender seu mundo ao reproduzir situações da vida. Quando imita, a criança está tentando compreender”. (KISHIMOTO, 2002, p. 74)

É o que se propõe nas aulas de LE quando o professor lança mão de jogos como estratégia de ensino. A partir desse tipo de atividade, o aluno pode visualizar situações de

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uso da língua e interagir com os demais companheiros. E a competência do ato de brincar lhe confere certa segurança no momento da atuação já que o aprendiz/criança tem a prática de brincar como um pré-requisito intrínseco.

O autor Johan Huizinga (2004) reforça os dizeres sobre a contribuição da visão de mundo de acordo com Freire e em seu livro Homo Ludens, pois reafirma a importância dessa contribuição no processo de ensino e aprendizagem no momento em que a criança ingressa na escola. Mesmo com um repertório ainda muito restrito em função de sua pouca experiência de vida, a criança se apoia na natureza intrínseca12 do ato de brincar para o ser humano

[...] o jogo é uma função da vida, mas não é passível de definição exata em termos lógicos, biológicos ou estéticos. O conceito de jogo deve permanecer distinto de todas as outras formas de pensamento através das quais exprimimos a estrutura da vida espiritual e social. (HUIZINGA, 2004, p. 9)

Pensando em uma atividade com jogos ou brincadeiras, independentemente das aulas de LE, a situação se dá da seguinte forma: quando a criança brinca, ela cria uma situação imaginária, sendo esta uma característica definidora do brinquedo em geral. Nesta situação imaginária, ao assumir um papel, a criança inicialmente imita o comportamento do adulto tal como ela observa em seu contexto. Assim, a imitação assume um papel fundamental no desenvolvimento da criança em geral, e na brincadeira em especial, na medida em que indica que primeiro a criança faz aquilo que ela viu o outro fazendo, mesmo sem ter clareza do significado dessa ação, para então, conforme deixa de repetir por imitação, passa a realizar a atividade conscientemente, criando novas possibilidades e combinações.

Ao se pensar em uma aula de LE que utiliza o jogo como estratégia de ensino e aprendizagem, o processo é o mesmo. O aluno passa por uma etapa de observação, amplia seu repertório linguístico a partir das atividades propostas pelo professor, passa pela fase da imitação até chegar à execução do jogo com autonomia.

Os alunos, de forma geral, não parecem notar o poder dos jogos e brincadeiras nas aulas de LE como instrumentos mediadores na configuração de suas práticas. Principalmente para os alunos do Ensino Fundamental do 3° e 4° anos, os jogos fazem

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parte de sua rotina e, certamente, a proposta dessa atividade lúdica na aula de LE é um estímulo para o curso de idiomas. Por serem consideradas atividades naturais dentro do repertório que possuem, os alunos, de algum modo, categorizam e sistematizam a atividade proposta pelo professor, alheios a sua natureza como uma ferramenta cultural, produto de forças socioculturais concretas.

Baquero (1998) afirma que o desenvolvimento da criança se dá a partir de duas linhas: a linha natural, que se assemelha aos processos de maturação e crescimento; e a linha cultural, que trata dos processos de apropriação e domínio dos recursos e instrumento que a cultura dispõe.

O desenvolvimento cultural da criança se caracteriza, em primeiro lugar, pelo fato de que transcorre sob condições de mudanças dinâmicas no organismo O desenvolvimento cultural se acha sobreposto aos processos de crescimento, maturação e desenvolvimento orgânico da criança. [...]. O crescimento da criança normal no seio da civilização implica, por regra geral, uma fusão com os processos de maturação orgânica. Ambos os planos de desenvolvimento – o natural e o cultural – coincidem e se confundem entre si. (BAQUERO, 1998, p. 30)

De acordo com Baquero (1998), o processo histórico-social e o papel da linguagem no desenvolvimento do indivíduo, efetiva-se na interação do sujeito com o meio, que é a questão central da aquisição de conhecimento que acontece a partir das relações intra e interpessoais, da troca e da mediação. O desenvolvimento da fala interior, que aqui se refere à interiorização do conhecimento, condensa uma série de complexos problemas teóricos. O mais imediato é o da natureza e características dos processos de interiorização que estão ligados inerentemente ao desenvolvimento cultural.

As atividades propostas com os jogos e brincadeiras relacionam aspectos de desenvolvimento cognitivo como da “personalidade” do sujeito, ou da atividade psicológica geral. Dessa forma, põe-se em ação tanto o desenvolvimento do pensamento, a capacidade de argumentação, quanto o desenvolvimento dos sentimentos e da vontade. O aprendiz tem a possibilidade de passar por um processo de reorganização interior de uma operação psicológica posta em jogo no meio social e, portanto, ligada à linha cultural de desenvolvimento.

Imagem

Figura 1  –  Gravura do espanhol Vicente Urrabieta Ortiz (1823-1879), utilizada na edição  de 1865 de Gaspar e Roig e que retrata o “Manteo de Sancho”
Figura 2  – Quadro “El Pelele” pintado por  Francisco de Goya y Lucientes entre 1791-1792
Figura 3  –  Alunos do 3º ano da manhã executando a brincadeira do Pelele no pátio da  escola
Figura 4 – Alunos do 3º ano da manhã executando a brincadeira do Pelele no pátio da  escola
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