TATIANA ROSADO ROSENSTOCK
ESTUDO DOS MECANISMOS CELULARES E
MOLECULARES ENVOLVIDOS NO PROCESSO
NEURODEGENERATIVO DA DOENÇA DE HUNTINGTON
Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina para obtenção do título de Doutor em Ciências pelo Programa de Pós-Graduação em Farmacologia.
TATIANA ROSADO ROSENSTOCK
ESTUDO DOS MECANISMOS CELULARES E
MOLECULARES ENVOLVIDOS NO PROCESSO
NEURODEGENERATIVO DA DOENÇA DE HUNTINGTON
Tese preparada durante o Curso de Pós-Graduação em Farmacologia - área de concentração Modo de Ação de Drogas - Departamento de Farmacologia, Disciplina de Farmacologia e apresentada à Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina, como requisito parcial, para obtenção do título de Doutor em Ciências pelo Programa de Pós-Graduação em Farmacologia.
Orientador: Profa. Dra. Soraya Soubhi Smaili
Co-orientador: Profa. Dra. Clélia Regiane Antônoi Bertoncini
Rosenstock, Tatiana Rosado
Estudo dos mecanismos celulares e moleculares envolvidos no processo neurodegenerativo da Doença de Huntington.
/ Tatiana Rosado Rosenstock --São Paulo, 2008. xviii, 204f.
Tese (Doutorado) Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Medicina. Programa de Pós-graduação em Farmacologia.
Título em inglês: Study of cellular and molecular mechanisms related to the neurodegenerative process of Huntington Disease.
1. Doença de Huntington. 2. Animais transgênicos R6/1. 3.Cálcio. 4. Mitocôndria. 5. huntingtina.
Dedico essa tese e todo o meu trabalho àqueles que me
ajudaram e me apoiaram, de alguma maneira, durante essa
fase da minha vida, em especial, a minha família e a Deus,
mesmo porque ‘A ciência sem a religião é manca,
v
“Detesto, de saída, quem é capaz de marchar em formação
com prazer ao som de uma banda. Nasceu com cérebro
por engano; bastava-lhe a medula espinhal”.
(Albert Einstein)
“O único homem que nunca comete erros é
aquele que nunca faz coisa alguma”.
"Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de
histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com
seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia
plantar as suas árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para
desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo
para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar
para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância
que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não
simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e
doutores do que não vimos, quando deveríamos ser
alunos, e simplesmente ir ver”.
AGRADECIMENTOS
vii
À Deus, por ter me dado o Dom da vida e estar permitindo vivê-la com saúde, dignidade, honestidade e amor em todas as horas.
À minha mãe, Vera Lúcia Guedes Rosado, pelos ensinamentos e exemplo de vida e, principalmente, pelo o apoio emocional durante os momentos difíceis pelos quais passei mesmo quando estava a milhas de distância... lá do outro lado do Oceano Atlântico... Brigada Mamis... Te Amo!
Aos meus querido avós, minha irmã, cunhado e, porque não, a futura sobrinha/ afilhada Manoela, por tudo o que são, fizeram e fazem por mim.
Ao meu boyfriend, Belal Al Kiswani, pela amizade, pelo carinho e pelo amor..bahebek..
À Patrícia Gonçalves, Mariana Calzavara e Rafael Miyazawa pela amizade e companheirismo durante todos esses anos (aliás, há dez anos!!!).
À Hanako, um agradecimento mais do que especial, pelo apoio, carinho, paciência, compreensão, amizade.... e por tudo de bom que você fez e ofereceu a mim durante todos esses anos que convivemos juntas no Departamento (aliás, oito longos anos)... muito obrigada Hanakinho....
Aos meus amigos Alessandra, Ana Paula, Fabrício, Guiomar, Juliana, Leandro, Mari, Priscila e Rodrigo pela convivência maravilhosa durante todas as horas de trabalho e, durante as outras horas também (hehehe). Ao Daniel, um super obrigada pelo apoio e ajuda durante essa reta final...
Aos meus amigos de Roma, quer sejam da Universidade Tor Vergata (Valentina, Manuela, Giusy), quer sejam da Residenzia de Dottorato Francesco Buonamici (Alma, Bernardo, Guillaume, Ivana, Laure, Lorena, Pedro, Rafael...) por todos, mas todos, os momentos que passamos juntos... foi maravilhoso!! Grazie, Mercy, Gracias, Brigada...!!
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora, Soraya Soubhi Smaili, pelos ensinamentos profissionais e pessoais, e pela confiança, credibilidade e oportunidade concedidos a mim durante o desenvolvimento de todo o trabalho... um caminho longo... Iniciação Científica, Mestrado, Doutorado....
Às Prof.as Beatriz Kiyomoto e Maria José da Silva Fernandes do Dept. de Neurologia Experimental/ UNIFESP, a Prof.a Clélia Regiane Antônio Bertoncini CEDEME/ UNIFESP e aos Prof.os Maria Grazia Farrace, Carlo Rodolfo e Mauro Piacentini, do Dept. de Biologia/ “Universidade de Roma/ Tor Vergata” por terem me ensinado tantas técnicas e terem possibilitado a realização desse trabalho.
À Beth, Carol, Lourdes, Teotila, Aylton e Darci e à todos os outros funcionários e técnicos que direta ou indiretamente contribuíram para que esta conquista.
Ao Cícero, um agradecimento todo especial pela sua ajuda e, principalmente, amizade durante esse tempo todo...
LISTA DE LEGENDAS
ix Figura 1 - Mecanismo de sinalização celular e homeostase de Ca2+.
Figura 2 - Excitação de receptores de glutamato, N-metil-D aspartato (NMDA) e AMPA com um conseqüente influxo de íons (Na+ e/ ou Ca2+) e ativação de diferentes vias celulares.
Figura 3 - Esquema representativo da síntese de espécies reativas de oxigênio (EROs) e da participação de agentes antioxidantes para a degradação de cada um deles.
Figura 4 - Esquema representativo da formação do autofagossomo e do autolisossomo durante o processo autofágico.
Figura 5 - Representação esquemática da participação de moléculas relacionadas com o processo autofágico como PI3K, LAMP e proteínas LC-3 e Atg, bem como a participação de estímulos indutores (em verde), Rapamicina e Starvation e inibidoras (em vermelho), 3-metiladenina (3-MA) e bafilomicina.
Figura 6 - (A) Representação da inserção da seqüência poliglutamínica expandida responsável pela síntese da mhtt; (B) Ressonância magnética de cérebro de indivíduo normal (esquerda) e de pacientes com DH (direita). C: caudado; P: putâmen; GP: globo pálido; V: ventrículo; Hip: hipocampo.
Figura 7 - Esquema representativo dos diferentes papéis da proteína transglutaminase 2 (TG2 ou tTG) após ativação pelo Ca2+.
Figura 8 - (A) Imagem de fatia cerebral de animal B6CBA/ F1 com 2 meses de idade incubada com Calceína-AM (500 nM); (B) Imagem de fatia cerebral de animal B6CBA/ F1 com 2 meses de idade delimitada com a ferramenta ROI; (C) Gráficos representativos da Intensidade de Fluorescência de diferentes regiões cerebrais. Objetiva 40x.
LISTA DE LEGENDAS
idade na presença de Glutamato (1 mM); (B) Valor obtido da taxa da respiração celular em nmol/ ml/ min.
Figura 10 - Figura representativa do vetor viral utilizado em nossos estudos, pLPCX, para a expressão da huntingtina mutante (mhtt). Estão demonstrados, ainda, seus sítios de restrição e a localização do gene de resistência a Puromicina (Puro).
Figura 11 - Eletroforese em gel de agarose das amostras obtidas de camundongos C57 e R6/1. As elipses brancas correspondem aos DNAs que carregam o gene da DH (banda de ≅ 80 Kb).
Figura 12 – (A) e (B) Fatias cerebrais de animais controle e transgênico R6/1 com 9 meses de idade, respectivamente, no momento 0 e após 5, 10 e 15 minutos da adição de Glu (1mM). Coloração obtida por meio do programa Spectralyzer, Overlay 340/ 380. A escala de pseudo-cores indica a intensidade da fluorescência (0-255). As cores foram atribuídas. Imagens obtidas por meio do microscópio de alta resolução com câmera CCD.Objetiva de 10x.
Figura 13 - Histograma representativo do aumento do Ca2+c em fatias cerebrais de camundongos B6CBA/ F1 e R6/1 com 3, 6 e 9 meses de idade estimuladas com KCl (200 mM) (A) e Glu (1 mM) (B).
Figura 14 - Histograma representativo do t1/2 em fatias de cérebro de camundongos B6CBA/ F1 e R6/1 com 3, 6 e 9 meses de idade estimuladas com KCl (200 mM) (A) e Glu (1 mM) (B).
Figura 15 - Histograma representativo do aumento do Ca2+
c em fatias cerebrais de
camundongos R6/1 com 9 meses de idade estimuladas com Glu (1 mM) em meio normal, Glu (1mM) em meio zero Ca2+, FCCP (50 µM) e Tapsigargina (TAP) (10 µM).
LISTA DE LEGENDAS
xi Figura 17 - Histograma representativo da porcentagem de aumento do Ca2+c induzido pelo Glu (1 mM) na presença de FCCP (50 µM) ou Tapsigargina (TAP) (10 µM) em fatias cerebrais de camundongos R6/1 com 9 meses de idade.
Figura 18 - Fatias cerebrais de camundongos R6/1 incubadas com anticorpo primário anti-NMDA 2B (1:250) por 1 hora. (A) Imagens visualizadas em vários planos (z) e excitadas com a laser Argônio (488) (objetiva 10x); (B) e (C) Fotos da sobreposição das imagens da Figura A com a objetiva de 10x e 40x, respectivamente; (D) Foto da sobreposição de imagens de hipocampo (objetiva de 10x)
Figura 19 - (A) Histograma representativo da intensidade de fluorescência em fatias cerebrais de camundongos R6/1 com 9 meses de idade incubados com anticorpo primário anti-NMDA 2B; (B) Histograma representativo da intensidade de fluorescência em diferentes regiões cerebrais.
Figura 20 - Fatias cerebrais de camundongos R6/1 controles (A) e transgênicos (B) de 9 meses de idade incubadas com Calceína-AM (500 nM) e excitadas com o laser Argônio (488); (C) Histograma representativo da Intensidade de Fluorescência normalizada.
Figura 21 - Fatias cerebrais de camundongos R6/1 controles (A) e transgênicos (B) de 9 meses de idade na presença de PI (5 µg/ ml) e excitadas com o laser HeNe 1 (543);
(C) Histograma representativo da Intensidade de Fluorescência normalizada.
Figura 22 - Fatias cerebrais de camundongos R6/1 controles (A) e transgênicos (B)
com 9 meses de idade incubadas com DCF (2,5 µM) e excitadas com o laser Argônio (488) em diferentes momentos após adição de Glu (1mM). Objetiva de 40x; (C) e (D)
LISTA DE LEGENDAS
Figura 23 - Fatias cerebrais de camundongos R6/1 controles (A) e transgênicos (B)
com 9 meses de idade excitadas com o laser Titânio-Safira para a análise do NAD(P)H em diferentes momentos após adição de Glu (1mM). Objetiva de 40x; (C) e (D)
Histogramas representativos da Intensidade de Auto-Fluorescência basal e da ∆ da Intensidade de Auto-Fluorescência em relação ao valor basal (%) após a adição de Glu (1 mM), respectivamente, de animais controles e transgênicos.
Figura 24 - (A) Fatias cerebrais de camundongos B6CBA/ F1 de 2 meses de idade incubados com DCF (2,5 µM, verde) e MTR (10 nM, vermelho) e excitadas com alasers de Argônio (488) e HeNe 1 (543). Objetiva de 40x; (B) Sobreposição das imagens da Figura A; (C) Gráfico representativo da co-localização da fluorescência do DCF e MTR.
Figura 25 - (A) Fatias cerebrais de camundongos B6CBA/ F1 de 2 meses de idade incubados com MTR (10 nM, vermelho) e MTG (100 nM, verde) e excitadas com alasers de Argônio (488) e HeNe 1 (543). Objetiva de 40x; (B) Sobreposição das imagens da Figura A; (C) Gráfico representativo da co-localização da fluorescência do MTR e MTG.
Figura 26 - Fatias cerebrais de camundongos R6/1 de 9 meses de idade controles (A)
e transgênicos (B) incubadas com TMRE (500 nM) e excitadas com o laser HeNe 1 (543) em diferentes momentos após adição de Glu (1mM). Objetiva de 40x; (C) e (D)
Histogramas representativos da Intensidade de Fluorescência basal e da ∆ da Intensidade de Fluorescência em relação ao valor basal (%) após Glu (1 mM), respectivamente, de animais controles e transgênicos.
Figura 27 - Gráfico representativo do traçado da respiração celular referente a uma fatia cerebral de camundongo R6/1, controle (linha vermelha) e transgênico (linha azul) com 9 meses de idade.
LISTA DE LEGENDAS
xiii Figure 29- (A) Fatias cerebrais de camundongos R6/1 com 3, 5, 7, 9 e 11 meses de idade marcadas para a enzima succinato desidrogenase (SDH) (E.: estriado; C.C.: corpo caloso; C.: córtex). As imagens foram obtidas no Microscópio Olympus BX 60 com objetiva de 4x; (B) Histograma representativo do nível de SDH em fatias cerebrais de camundongos R6/1 com 3, 5, 7, 9 e 11 meses de idade.
Figura 30 - Histogramas representativos do nível da SDH em fatias do cérebro de camundongos R6/1 controles e transgênicos com 9 e 11 meses de idade, (A) e (B)
respectivamente, nas diferentes regiões cerebrais.
Figura 31 - (A) Fatias do cérebro de camundongos B6CBA/ F1 com 2, 7, 9 e 11 meses marcadas para SDH. Objetiva de 4x; (B) Histograma representativo do nível de SDH.
Figura 32 - Histograma representativo da atividade da SDH em fatias do cérebro de camundongos R6/1 e B6CBA/ F1 com 7, 9 e 11 meses.
Figura 33 - Fatias cerebrais de camundongos R6/1 incubadas com anticorpo primário anti-GFAP (1:250) por 1 hora. (A) Imagens visualizadas em vários planos (z) (objetiva 10x); (B), (C) e (D) Fotos da sobreposição das imagens da Figura A com a objetiva de 10x, 40x e 40x juntamente com zoom digital, respectivamente.
Figura 34 - (A) Histograma representativo da intensidade de fluorescência em fatias cerebrais de camundongos R6/1 com 9 meses de idade incubados com anticorpo primário anti-GFAP; (B) Histograma representativo da intensidade de fluorescência em diferentes regiões cerebrais.
LISTA DE LEGENDAS
Figura 36 - Efeito induzido pelo FCCP (8 µM) e pela Tapsigargina (2 µM) nos diferentes linfoblastos: Células B (Controle), Células A (heterozigota para DH) e Células E (homozigota para DH).
Figura 37 - (A) Histograma representativo do aumento da fluorescência (%) após adição de FCCP (8 µM) na presença de Tapsigargina (2 µM) em linfoblastos B, A e E;
(B) Histograma representativo do aumento da fluorescência após adição de Tapsigargina (2 µM) na presença de FCCP (8 µM) em linfoblastos B, A e E; (C)
Histograma representativo do aumento de fluorescência total após Digitonina (5 mM) nos diferentes linfoblastos.
Figura 38 - (A) Imagens de células MEFs (+/+) após incubação com Fura-2-AM (objetiva 60x); (B) e (C) Aumento do Ca2+c em células MEFs (+/+), MEFs (-/-), MEFs γ2 (+/+) e MEFs γ2 (-/-) sob estímulo do FCCP (8 µM), seta cheia; Tapsigargina (2 µM), seta pontilhada; Digitonina (5 mM) e MnCl2 (0,2M).
Figura 39 - (A) e (B) Histogramas representativos do aumento da fluorescência em relação ao valor basal (%) após FCCP (8 µM) ou Tapsigargina (2 µM), respectivamente, nas células MEFs (+/+), MEFs (-/-), MEFs γ2 (+/+) e MEFs γ2 (-/-);
(C) Histograma representativo do aumento da fluorescência após a adição de FCCP (8
µM) na presença de Tapsigargina (2 µM); (D) Histograma representativo do aumento da fluorescência após Tapsigargina (2 µM) na presença de FCCP (8 µM); (E)
Histograma representativo do aumento de fluorescência total após Digitonina (5 mM).
Figura 40 - Intensidade da fluorescência em porcentagem do PI para análise da apoptose (A) e da Acridine Orange (AO) para análise da autofagia (B) em linfoblastos de paciente com a DH, células B (controles), A (heterozigotas) e E (homozigotas). Rapamicina (RAP, 1 µM, 96 horas), Starvation (STR, 24 horas) e 3-metiladenina (3-MA, 10 mM).
LISTA DE ABREVIATURAS
xv 3-MA - 3-metiladenina
ACh - Acetilcolina AC - Adenilciclase
AIF - Fator Indutor de Apoptose
ANT - Adenina nucleotídeo translocase AO - Acridine orange
aTCP- αααα-tocoferol
ATG - Autophagy-related genes ATP - Adenosina trifosfato
BDNF - Brain-derived neurotrophioc factor BSA - Albumina Bovina
C - Caudado C. - Córtex Ca2+ - Cálcio Ca2+
m - Cálcio mitocondrial
Ca2+
c - Cálcio citosólico
CAG - Trinucleotídeo citosina-adenina-guanina Cat - Catalase
CAT - Colina-acetil transferase C.C. - Corpo caloso
CMA - Chaperonas
CM-H2DCF-DA (DCF) - Diclorohidro fluoresceína carboxilada
CyP-D - Ciclofilina D DA - Dopamina
DAB - Diamino benzidina DH - Doença de Huntington
DMEM – Dulbecco’s Modified Eagle Medium DTT - Ditioltreitol
E. - Estriado
EBSS -Earle's Balanced Salt Solutions EDTA - Ácido diaminoetanotetraacético
LISTA DE ABREVIATURAS
GABA - Ácido gama-amino-butírico GAD - Glutamato descarboxilase
GAPDH - Gliceraldeído-3-fosfato desidrogenase GFAP - Glial fibrilarity acid protein
Glu - Glutamato GP - Globo pálido
GPe - Globo pálido externo GPi - Globo pálido interno GPX - Glutatina peroxidase GR - Glutationa redutase GSH - Glutationa reduzida H2O2 - Peróxido de hidrogênio
HAP - Huntintin association protein HCE - Tracador H+/ Ca2+
Hip - Hipocampo
HIP - Huntintin interaction protein htt - Huntintina
IP3 - Inositol 1,4,5-trifosfato
IP3R - Receptores de IP3
IR - Receptor ionotrópico KCl - Cloreto de Potássio LC-3 - Light chain 3
MEF - Mice embrionic fibroblasts
mGluR - Receptor glutamatérgico ionotrópico mhtt - huntintina mutante
MnCl2 - Cloreto de manganês
MR - Receptor metabotrópico MTG – Mito Tracker Green
mTOR - Target of Rapamycin from mammals MTR - Mito Tracker Red
NCE - Trocador Na+/ Ca2+
LISTA DE ABREVIATURAS
xvii NOS - Óxido nítrico sintase
O2-•••• - Radical aniônico superóxido
••••OH - Radical hidroxila
P - Putâmen
PBS - Tampão Fosfato
PCR - Polimerase Chain Reaction PI - Iodeto de propídeo
PMCA - Bomba Ca2+- ATPase
PMNCE - Trocador Na+/Ca2+da membrana plasmática polyQ - Sequência de poliglutaminas
PTP - Poro de Transição de Permeabilidade RAP - Rapamicina
RE - Retículo Endoplasmático ROI - Região de interesse
ROS - Espécies Reativas de Oxigênio SDH - Succinato desidrogenase SERCA - Bomba Ca2+-ATPase do RE
SFB - Soro fetal bovino
SNC - Sistema Nervoso Central STR - Starvation
t1/2 - Tempo necessário até o aumento de metade da intensidade máxima da fluorescência obtida
TAP - Tapsigargina
TCA - Ciclo do ácido tricarboxílico TG2 ou tTG - Tissue transglutaminase TMRE – Tetramethylrhodamine-ethyl-ester TPM - Transição de Permeabilidade Mitocondrial U - Uniporter
V - Ventrículo
RESUMO
Introdução: Alterações no tamponamento do cálcio citosólico (Ca+2c) podem levar à desordens neurodegenerativas como a Doença de Huntington (DH). Vários mecanismos estão relacionados esses processos tais como a excitotoxicidade, o estresse oxidativo e as interações da proteína huntintina mutante (mhtt) com outras proteínas como a transglutaminase 2 (TG2). Essas alterações podem estar relacionadas com a ativação de mecanismos de morte celular ou autofagia.
Objetivo: O objetivo deste projeto foi investigar os mecanismos celulares e moleculares envolvidos no processo de neurodegeneração da DH tais como alterações dos níveis de Ca+2c relacionados com o transporte de Ca+2 mitocondrial (Ca+2m) e reticular (Ca+2RE), disfunção mitocondrial e morte celular, em três modelos experimentais: a) animais transgênicos da linhagem R6/1; b) linfoblastos provenientes de pacientes com DH; c) células MEFs (fibroblastos) normais e knock-outs para a TG2, na presença ou ausência da mhtt.
Resultados e Conclusões: Nos camundongos transgênicos R6/1 houve um aumento significante do Ca+2c em relação aos controles aos 9 meses de idade. Essa alteração parece ser devido a um aumento da liberação do Ca+2
m, do estresse oxidativo, do
potencial de membrana mitocondrial (∆Ψm) e do consumo de oxigênio. Os transgênicos não apresentaram diferença quanto à SDH, muito embora haja um aumento desta com o envelhecimento. Além disso, os linfoblastos de pacientes com DH apresentaram alterações do Ca+2m e do Ca+2RE, bem como um aumento na taxa de células autofágicas. Por outro lado, nas células de fibroblastos de camundongos embrionários (MEFs), a presença de mhtt parece não afetar a homeostase celular de Ca2+. A ausência da TG2 nestas células, influenciou não somente os níveis de Ca2+
c como
SUMÁRIO
DEDICATÓRIA iv
EPÍGRAFE v
AGRADECIMENTOS vii
LISTA DE LEGENDAS ix
LISTA DE ABREVIATURAS xv
RESUMO xviii
1. Introdução 2
1.1. O íon Ca+2 e a regulação de sua homeostase 2
1.2. Participação da mitocôndria na sinalização celular e transporte de Ca+2 3
1.3. Mecanismos Mitocondriais e Excitotoxicidade 5
1.4. Espécies Reativas de oxigênio e defesa antioxidante 7
1.5. Morte Celular 9
1.5.1. Autofagia 11
1.6. Doença de Huntigton 14
1.6.1. Aspecto genético 14
1.6.2. Epidemiologia e sintomatologia 14
1.6.3. Neuropatologia 15
1.6.4. Aspectos Moleculares da DH 17
1.6.5. Modelos animais da DH 20
2. Objetivos gerais 24
2.1. Objetivos específicos 24
3. Métodos 26
3.1. Modelos para o Estudo da Doença de Huntington 26
3.2. Controle genético dos animais transgênicos por PCR 26
3.3. Alterações da Sinalização Celular em fatias cerebrais de camundongos 28
3.3.1. Microscopia em tempo e espaço reais de fatias cerebrais 29
3.3.2. Medidas da Sinalização de Ca+2 30
3.3.2.1. Análise do Receptor Ionotrópico Glutamatérgico NMDA (2B) 32
3.3.3. Avaliação da Sinalização Intracelular 33
3.3.3.1. Medida da viabilidade celular 33
3.3.3.2. Medida de Espécies Reativas de Oxigênio (EROs) 36
SUMÁRIO
3.3.3.4. Medida do potencial de membrana mitocondrial (∆Ψm) 38
3.3.3.5. Avaliação do consumo de oxigênio 39
3.3.3.6. Análise histoquímica 41
3.3.3.7. Análise de GFAP 41
3.4. Alterações da Sinalização Celular em Diferentes Modelos Celulares para DH 42
3.4.1. Cultura Celular de Linfoblastos de Pacientes com DH 42
3.4.2. Construção dos plasmídeos e inserção da mhtt em células MEFs 43
3.4.3. Cultura de Células MEFs 45
3.4.4. Medidas da Sinalização de Ca+2 46
3.4.5. Citometria de Fluxo (FACS) 46
3.5. Análise Estatística 48
3.6. Materiais 48
4. Resultados 50
4.1. Controle genético dos animais transgênicos por PCR 50
4.2. Alterações da Sinalização Celular em fatias cerebrais de camundongos 50
4.2.1. Medidas da Sinalização de Ca+2 50
4.2.1.1. Medidas da Sinalização Ca2+ em B6CBA/F1 e R6/1 com diferentes idades 50
4.2.1.2. Medidas da Sinalização Ca2+ em R6/1 com 9 meses 54
4.2.2. Análise do Receptor Ionotrópico Glutamatérgico NMDA (2B) 56
4.2.3. Avaliação da Sinalização Intracelular 59
4.2.3.1. Medida da viabilidade celular 59
4.2.3.2. Medida de Espécies Reativas de Oxigênio (EROS) 61
4.2.3.3. Identificação mitocondrial por meio de microscopia de fluorescência 65
4.2.3.4. Medida do potencial de membrana mitocondrial (∆Ψm) 66
4.2.3.5. Avaliação do consumo de oxigênio 68
4.2.3.6. Análise histoquímica 71
4.2.3.7. Análise de GFAP 75
4.3. Alterações da Sinalização Celular em Diferentes Modelos Celulares para DH 78
4.3.1. Medidas da Sinalização de Ca+2 78
4.3.2. Citometria de Fluxo (FACS) 83
5. Discussão 86
5.1.Alterações da Sinalização Celular em fatias cerebrais de camundongos 86
SUMÁRIO
6. Conclusões 102
7. Anexo I 104
8. Anexo II 134
9. Anexo III 154
10. Anexo IV 160
11. Anexo V 162
12. Referência 176
INTRODUÇÃO
1. Introdução
Todas as células vivas utilizam diferentes processos e reações durante seu ciclo de vida. Essas reações, porém, são controladas constantemente. No entanto, para funcionar adequadamente, diversas moléculas presentes nas células, denominadas de segundos mensageiros, são acionadas. O íon cálcio (Ca2+) participa como um desses mensageiros sendo capaz de regular diversas funções como, metabolismo, liberação de neurotransmissores, contração muscular, fertilização, secreção hormonal, coagulação sanguínea e sobrevivência e proliferação celular por meio da via de ativação da proteína Erk (NISHI et al, 1997; YAN et al, 1999; TORAL & TOLEDO, 2002). A ativação destes eventos depende da variação da concentração de Ca2+ intracelular que, muitas vezes, pode ocasionar déficits energéticos, modificações na ativação de enzimas e proteínas e até mesmo a morte celular.
1.1. O íon Ca2+ e a regulação de sua homeostase
Nos eucariotos, as concentrações extracelulares de Ca2+ giram em torno de 1 a 2 mM (~10-3M) e as concentrações intracelulares ao redor de 50 a 100 nM (~10-7M). No entanto, durante a sinalização celular, podem ocorrer aumentos da concentração do cálcio citosólico (Ca2+
c) basicamente por duas vias: I) pela entrada de Ca2+ do meio
extracelular por meio da abertura de diferentes tipos de canais presentes na membrana plasmática (SMAILI et al, 2000); II) pela liberação de Ca2+ de estoques intracelulares como por exemplo, mitocôndria e retículo endoplasmático (RE). No RE, contudo, esse processo pode ocorrer pela ativação de receptores metabotrópicos com conseqüente aumento do inositoltrifosfato (IP3) e estimulação dos receptores de IP3 (IP3R) (BERRIDGE, 1997; CSORDAS et al, 1999; PACHER & HAJNOCZKY, 2001; PINTON et al, 2001; HAJNOCZKY et al, 2006).
INTRODUÇÃO
3
peroxissomos, também são capazes de armazenar o Ca2+ mas este, no entanto, se encontra complexado a proteínas celulares, polissacarídeos e/ ou lipídeos (Figura 1).
Figura 1 - Mecanismo de sinalização celular e homeostase de Ca2+. O aumento de Ca2+ c pode
ocorrer por meio de canais na membrana plasmática como VOCs (canais dependentes de voltagem), ativação de receptores ionotrópicos (IR) e metabotrópicos (MR) e, também, pela liberação dele de estoques intracelulares como, o tracador Na+/ Ca2+ (NCE) e o tracador H+/
Ca2+ (HCE) da mitocôndria e a ativação do Receptor de IP
3 e Rianodina do RE. Esse aumento
do Ca2+
c, em uma região celular, pode estimular a captação de Ca2+ pela mitocôndria por meio
do uniporter (U). O acúmulo de Ca2+ nas mitocôndrias (Ca2+m) pode levar a ativação do PTP e a
consequente liberação do íon. Outras vias de exclusão do Ca2+
c são: o trocador Na+/ Ca2+
(PMNCE) e a bomba Ca2+- ATPase presente na membrana plasmática (PMCA) e, ainda, a
bomba Ca2+- ATPase presente no RE(SERCA) (modificado de Addison Wesley Longman Inc.).
1.2. Participação da mitocôndria na sinalização celular e transporte de Ca2+
Aumentos do Ca2+c podem também sofrer um outro mecanismo de tamponamento: a captação mitocondrial. Esse é um processo eletrogênico dependente do potencial de membrana da mitocôndria (∆Ψm) (GUNTER et al, 1998) que ocorre por meio da ativação de um uniporter, uma proteína carreadora localizada na membrana interna mitocondrial (GUNTER & PFEIFFER, 1990). Esta captação é importante não só para a remoção do Ca2+c como também para a ativação de desidrogenases dependentes de Ca2+ e para a produção de ATP (RUTTER et al, 1996;
ROBB-IR U U VOCs SERCA SERCA canal canal receptor
receptor IPIP33
canal canal receptor receptor Rianodina Rianodina Mitocôndria Mitocôndria Retículo Retículo Endoplasmático Endoplasmático
Receptor Tirosina kinase
PMNCE
PMNCA
canal de Ca+2+2
MR
Proteína G
↑
↑
↑
↑
↑
↑
↑
↑
Ca
Ca
+2
+2
NCE
NCE
P
PTT
P
P HCE
Receptor Tirosina kinase
IR
VOCs PMNCE
PMNCA
canal de Ca2+ MR Proteína G IR U U VOCs SERCA SERCA canal canal receptor
receptor IPIP33
canal canal receptor receptor Rianodina Rianodina Mitocôndria Mitocôndria Retículo Retículo Endoplasmático Endoplasmático
Receptor Tirosina kinase
PMNCE
PMNCA
canal de Ca+2+2
MR
Proteína G
↑
↑
↑
↑
↑
↑
↑
↑
Ca
Ca
+2
+2
NCE
NCE
P
PTT
P
P HCE
Receptor Tirosina kinase Receptor Tirosina kinase
IR
VOCs PMNCE
PMNCA
canal de Ca2+ MR
INTRODUÇÃO
GASPERS et al, 1998). Experimentos com mitocôndrias isoladas evidenciaram que a atividade do uniporter é influenciada não só pelo ∆Ψm, mas também pelo pH, pela temperatura e pela concentração de Ca2+ livre no meio (NICHOLLS & BUDD, 2000). Estudos demonstraram, ainda, que a proximidade entre as mitocôndrias e o RE permite a formação de microdomínios contendo altas concentrações de Ca2+
c (RIZZUTO et al,
1998). Estas concentrações são detectadas pelas mitocôndrias que ativam seus mecanismos de captação, promovendo um eficiente sistema de tamponamento (PACHER & HAJNOCZKY, 2001; PINTON et al, 2001; WUSSULING et al, 2001; HAJNOCZKY et al, 2006).
As mitocôndrias mantêm um ∆Ψm negativo, resultado do controle realizado pelos diversos mecanismos mitocondriais como transporte iônico, redução do oxigênio e transporte de elétrons durante a fosforilação oxidativa. Esses processos são importantes para a célula, pois contribuem para a constante redução do oxigênio e a formação de espécies reativas de oxigênio (EROs). Portanto, a participação da mitocôndria na sinalização celular durante os processos fisiológicos vai além da síntese de ATP (NICHOLLS & FERGUSON, 1982), uma vez que ela atua no transporte e homeostase do Ca2+
c (SMAILI & RUSSELL, 1999; SMAILI et al, 2001), funcionando
como um estoque de baixa afinidade, porém de alta capacidade.
Como já citado anteriormente, o aumento do Ca2+c pode ocorrer também devido ao efluxo de Ca2+ a partir da mitocôndria. Esse mecanismo pode ocorrer por três diferentes vias (Figura 1). A primeira é a via dependente de Na+, também conhecida como trocador Na+/ Ca2+ (NCE).Ela ocorre principalmente em mitocôndrias localizadas no coração e no cérebro e caracteriza-se por ser eletrogênica (BAYSAL et al, 1994). A segunda via, conhecida como trocador H+/ Ca2+ (HCE),é independente de Na+ e ocorre em mitocôndrias localizadas no rim e no fígado e, ao contrário da primeira, não é uma via eletrogênica (GUNTER et al, 1994). O terceiro é um mecanismo inespecífico de liberação de Ca2+ decorrente da transição de permeabilidade mitocondrial (TPM), caracterizada por uma permeabilidade não-específica da membrana mitocondrial interna provocada pela abertura do poro de transição de permeabilidade (PTP) (LEHNINGER et al 1978; HUNTER & HAWORTH, 1979; SCORRANO et al, 2001 HAJNOCZKY et al, 2006).
INTRODUÇÃO
5
geradas pela cadeia respiratória (KOWALTOWSKI & VERCESI, 1999; SCORRANO et al, 2001; STARKOV et al, 2004). Durante períodos de estresse, o PTP abre rapidamente permitindo o efluxo de íons como H+, K+, Mg2+ e Ca2+, e de solutos de até 1.5 KDa. Como resultado, o ∆Ψm e o acúmulo de Ca2+ na matriz mitocondrial (Ca2+m) diminuem e a célula fica exposta ao excesso de Ca2+ no citosol podendo levar ao desacoplamento da síntese de ATP, liberação de algumas moléculas devido a uma difusão não-seletiva, inchamento mitocondrial e diversos mecanismos de morte celular (KROEMER et al, 1998; LEMASTERS et al, 1998; SMAILI et al, 2001).
A composição completa do PTP ainda é desconhecida, porém, sabe-se que a Ciclofilina D (CyP-D) faz parte do complexo de proteínas do PTP, estando ela na membrana interna, voltada para a matriz mitocondrial (HALESTRAP et al, 1997). Além desse componente, outros constituem o PTP como, a porina mitocondrial ou canal VDAC; a hexoquinase; a adenina nucleotídeo translocase (ANT) e os grupamentos tiol (GINCEL et al, 2001; KIRICHOK et al, 2004; BATHORI et al, 2006). Vários agentes podem ativar a abertura do PTP, como agentes oxidantes e protonóforos (desacopladores). Por outro lado, os antioxidantes (KOWALTOWSKI & VERCESI, 1999), a Ciclosporina A (CSA), o ADP e o ácido boncreico atuam como inibidores (ZORATTI & SZABÒ, 1995). Sabe-se, ainda, que o PTP é controlado por proteínas pró- e antiapoptóticas da família das proteínas Bcl-2, como Bax/ Bak e Bcl-2/ Bcl-xl, respectivamente (SHIMIZU et al, 1999; VYSSOKIKH & BRDICZKA, 2003).
1.3. Mecanismos Mitocondriais e Excitotoxicidade
Em situações de estímulo glutamatérgico e, conseqüente, acúmulo de Ca2+c ocorrem alterações patológicas e morte celular por um mecanismo denominado
excitotoxicidade. Ele se refere aos efeitos deletérios produzidos por alta concentração relativa da interação do glutamato ou seus agonistas, com seus receptores específicos de membrana, como o N-metil-D aspartato (NMDA) (COYLE & PUTTFARCKEN, 1993; RAMI et al, 1997; PÉREZ-DE LA CRUZ & SANTAMARÍA, 2007). No entanto, os receptores glutamatérgicos estão subdivididos em dois diferentes tipos: os ionotrópicos e os metabotrópicos. Os ionotrópicos, dentre os quais estão os receptores do tipo
INTRODUÇÃO
iônico pelo qual há um influxo maciço de Ca2+ vindo do meio extracelular. Por outro lado, os metabotrópicos (mGluR) são receptores acoplados à proteína G que, quando ativados, induzem a um aumento no Ca2+
c decorrente da liberação de Ca2+ de
estoques intracelulares. O aumento do Ca2+
c decorrente da ativação de ambos os processos induz à captação de Ca2+
m. O Ca2+ ao se acumular em concentrações
elevadas na mitocôndria, leva à formação de EROs pela cadeia respiratória podendo levar, então, à TPM devido a permeabilização da membrana mitocondrial interna decorrente da abertura do PTP. Assim, o aumento do Ca2+
m e do estresse oxidativo
(KOWALTOWSKI et al, 1996; CASTILHO et al, 1998; CROMPTON, 2004), bem como a abertura do PTP (KOWALTOWSKI et al, 1998) pode levar a TPM. Como conseqüência, tem-se não somente o colapso do ∆Ψm e o aumento do Ca2+c, mas também o desacoplamento da síntese de ATP e a ruptura da membrana externa da mitocôndria (KOWALTOWSKI et al, 1999; MOOTHA et al, 2001) que, em alguns casos, está associada a liberação de fatores apoptóticos (SUSIN et al, 1999; CHAI et al, 2000; STAVROVSKAYA & KRISTAL, 2005) (Figura 2).
Proteases Endonucleases
Danos mitocondriais
DANOS
DANOS
NEURONAIS
NEURONAIS
despolarização despolarização
radical livre OH -receptor receptor
glutamato
Célula da Glia
Proteases Endonucleases
Danos mitocondriais
DANOS
DANOS
NEURONAIS
NEURONAIS
despolarização despolarização
radical livre OH -receptor receptor
glutamato
INTRODUÇÃO
7
Figura 2 - Excitação de receptores de glutamato, N-metil-D aspartato (NMDA) e AMPA com um
conseqüente influxo de íons sódio e/ ou cálcio (Na+ e/ ou Ca2+) em células pós-sinápticas.
Como conseqüência, há ativação de diferentes reações/ vias celulares que podem culminar com danos neuronais e, até mesmo, a morte celular (modificado de Sinauer Associates Inc. Feldman, Fundamental of Neurobiology).
No entanto, concentrações não-tóxicas de Glu e o comprometimento energético podem agir de maneira sinérgica. Sob condições fisiológicas, a produção de ATP pela oxidação fosforilativa é suficiente para manter normal o potencial da membrana plasmática (mV) por meio da atividade da Na+/ K+ ATPase. Elevações transientes da concentração de Ca2+c decorrentes da ativação de receptores NMDA pelo Glu podem ser regulados, tamponados, por diversos mecanismos intracelulares, como já mencionado anteriormente. Contudo, uma falha parcial do metabolismo energético, como a diminuição da produção de ATP devido à disfunção mitocondrial, pode afetar a capacidade das ATPases da membrana em manter o potencial em níveis normais, levando a uma despolarização parcial da célula. Como conseqüência, pode haver a liberação do bloqueador voltagem-dependente do receptor NMDA, o Mg2+, que atua inibindo a entrada de íons como o próprio Ca2+ (BROUILLET et al, 1999)
Além disso, a inibição da fosforilação oxidativa afeta a habilidade da mitocôndria e do RE em tamponar o Ca2+
c contribuindo para uma maior concentração do íon no
interior celular. Sob condições de prolongada disfunção mitocondrial, a ativação constante do receptor NMDA pelo Glu, mesmo em concentrações fisiológicas, resulta em grande aumento do Ca2+c. Esse, por sua vez, ativa a via tóxica dependente de Ca2+ iniciando a cascata excitotóxica. Desta maneira, há a amplificação de fenômenos como a produção de EROs e ativação enzimática e, por fim, a morte celular (BROUILLET et al, 1999; PÉREZ-DE LA CRUZ & SANTAMARÍA, 2007).
1.4. Espécies Reativas de oxigênio e defesa antioxidante
INTRODUÇÃO
REDDY, 2006) sendo, seu processo de síntese, decorrente da redução parcial do O2 durante a transferência de elétrons, tanto em passos intermediários da cadeia respiratória (BOVERIS & CHANCE, 1973; TURRENS, 1997), como pela NADH desidrogenase e pela coenzima Q (CADENAS et al, 1977).
As mitocôndrias são os principais consumidores de oxigênio e contém numerosas enzimas redutoras capazes de transferir elétrons para o oxigênio, gerando, assim, o radical superóxido (O2-•). Quando há um aumento da produção de O2-• e/ ou uma falha do sistema antioxidante, o H2O2 produzido pode se acumular e levar a mitocôndria ao estresse oxidativo. Nessa situação, o H2O2 pode reagir com o Fe2+ da mitocôndria, resultando na formação do radical •OH que, além de ser altamente reativo,
pode promover a oxidação de membranas lipídicas (HALLIWELL & GUTTERIDGE, 1998). Pelo fato de 60 a 65% da membrana mitocondrial externa e de 75% da membrana mitocondrial interna serem constituídas por proteínas (NICHOLLS & FERGUSON, 1982; MATTSON et al, 2004), elas também são alvos das EROs. Deste modo, o aumento da produção de radicais livres (estresse oxidativo) pode levar a alterações físicas e químicas da estrutura fosfolipídica da membrana mitocondrial interna, causando alterações na sua fluidez comprometendo o funcionamento da cadeia transportadora de elétron (BOVERIS & CHANCE, 1973; TRUSHINA & MCMURRAY, 2007) (Figura 3).
Cadeia Respiratória
Espaço intermembrana
Matriz
INTRODUÇÃO
9
Figura 3 - O acúmulo de EROs nas mitocôndrias pode induzir a TPM. A cadeia respiratória localizada na membrana mitocondrial interna gera constantemente o radical O2-•. Este radical é
removido pela Mn-superóxido dismutase (MnSOD), que promove a geração de H2O2. Este,
então, pode ser reduzido pela GPx, TPx ou catalase. Na presença de Fe2+, o H
2O2 gera o
radical •OH, que pode oxidar o grupo tiol do PTP ou, ainda, promover a lipoperoxidação da membrana mitocondrial (KOWALTOWSKI et al, 2001).
1.5. Morte Celular
De uma maneira geral, podem ser caracterizados três processos de morte celular, necrose, apoptose e autofagia.
A necrose refere-se ao correlato macroscópico e histológico da morte celular que ocorre no contexto de uma lesão exógena irreversível (ROBBINS, 2000). Ela é, em geral, patológica, acidental e pouco regulada (SMAILI et al, 2003) atingindo, de uma só vez, um grupo de células. Ela é caracterizada por um inchamento celular, ruptura da membrana plasmática, inchamento mitocondrial e seu posterior rompimento, degradação difusa e randômica do DNA celular, processo inflamatório com invasão de macrófagos e ausência de síntese proteica e de transcrição de RNA (HONIG & ROSENBERG, 2000). A aparência morfológica da necrose resulta de dois processos: desnaturação proteica e digestão celular enzimática, a mais estudada. As enzimas catalíticas provêm dos lisossomos das próprias células mortas (autólise) ou dos lisossomos de leucócitos imigrantes (heterólise) (ROBBINS, 2000).
INTRODUÇÃO
executam a apoptose, levando a eliminação dessas células por fagócitos ou células adjacentes (AMARANTES-MENDES & GREEN, 1998; DONOVAN & COTTER, 2004). Por outro lado, a via extrínsica ocorre pela ativação de receptores de morte localizados na membrana plasmática. Ambas as vias, no entanto, envolvem a estimulação de uma cascata de eventos intracelulares que culminam na morte das células (KROEMER et al, 1998) e, por isso, a apoptose é denominada, ainda, de morte celular programada. Embora a TPM seja crucial para as vias de morte celular dependente e independente de caspase, ela também pode ser ativada por outros fatores como o Ca2+ proveniente do RE (Ca2+
RE) e as catepsinas lisossomais em resposta a ceramida e EROs (JACOTOT et al, 1999). As catepsinas lisossomais são enzimas envolvidas na degradação citoplasmática durante a homeostase celular (TURK et al, 2001). As Catepsinas B e D são ativadas por uma ligação entre DNA danificado e mitocôndria no eixo mitocôndria-lisossomo, que direta- ou indiretamente ativa a cascata de caspase dependente de Bax/ Bak levando a TPM (BIDERE et al, 2003) e a apoptose (BOYA et al, 2003). Além disso, a ativação de Catepsinas também está envolvida com a autofagia, um processo independente de caspase, responsável pela reciclagem de organelas intracelulares. Pelo fato de que a Bax, a Bcl-2 e a Bak estão, também, localizadas no RE, ele serve como um importante centro de controle apoptótico mediado pela conecção mitocôndria-RE (BRECKENRIDGE et al, 2003). Tanto a super-expressão da Bcl-2 quanto a perda da Bax/ Bak levam a uma diminuição da concentração do Ca2+ no RE e a uma queda secundária da captação de Ca2+ pela mitocôndria (KIM et al, 2006).
INTRODUÇÃO
11
intracelulares, a via autofágica também é iniciada. Desta forma, ela estaria funcionando como um mecanismo de homeostase em nível subcelular fundamental para a sobrevivência das células. Contudo, patologicamente, a autofagia parece ter um papel relevante na alteração do crescimento celular que ocorre no câncer, assim como no inicio da neurodegeneração.
1.5.1. Autofagia
O controle rígido da degradação de componentes celulares é essencial para a homeostase celular, assim como as reações de biossíntese. Para isso, as células possuem várias vias catabólicas que vão desde a eliminação de pequenas moléculas até a degradação de organelas inteiras. Dentre os sistemas de degradação estão dois de especial interesse para a neurodegeneração: I) sistema ubiquitina-proteossomo; II) sistema endossomo-lisossomo. O sistema ubiquitina-proteossomo possui um papel essencial no controle da degradação da maioria das proteínas de células eucarióticas de curta duração. Devido a ação de três enzimas específicas, E1, E2 e E3, essas proteínas são ligadas a seqüências de ubiquitina que são, posteriormente, reconhecidas pelo sistema de degradação (ARDLEY et al, 2005). O sistema endossomo-lisossomo possui três diferentes vias: a) vid, via de importação e degradação vacuolar; b) cvt, via biossintética citoplasma-vacúolo; c) autofagia. Essa, por sua vez, pode ser subdividida em três diferentes tipos de acordo com o mecanismo da formação vacuolar e com o transporte de material para esse compartimento. Assim, ela pode ser discriminada em: a) autofagia mediada por chaperones (CMA); b) microautofagia; c) macroautofagia.
INTRODUÇÃO
como autofagia), cuja manifestação morfológica é mais proeminente. Ela é caracterizada pela formação de vesículas, de membrana múltiplas ou dupla, que se inicia com a formação de uma estrutura em “C” cujas extremidades se alongam até o completo fechamento. Especulava-se que a membrana originada da vesícula era proveniente de membrana do RE ou do Complexo de Golgi. Entretanto, atualmente, acredita-se que é originária de uma estrutura denominada fagóforo (CODOGNO & MEIJER, 2004; FENGSRUD et al, 2004). Com o fechamento da membrana e o aprisionamento de citoplasma ou organelas no interior da vesícula, etapa inicial em células de mamíferos, origina-se o autofagossomo. O autofagosomo, então, funde sua membrana externa com a membrana de lisossomos originando o autolisossomo ou vacúolo autofágico. No entanto, é a membrana interna do antigo autofagossomo com o conteúdo citoplasmático (corpo autofágico) que é degradada pelas enzimas lisossomais em produtos recicláveis para a célula (KLIONSKY & OHSUMI, 1999) (Figura 4).
Figura 4 - Sequência da formação do autolissomo. Primeiramente há a formação de uma membrana dupla, em forma de “C”, que ao se fechar engloba conteúdo citoplasmática e/ ou organelas celulares. Tal estrutura é denomianada de Autofagossomo. Em seguida, a membrana externa se funde a membrana do lisossomo (Autolisossomo) onde, todo conteúdo interno (corpo autofágico) é degradado pelas enzimas lisossomais (modificado de www.biken. osaka-u.ac.jp/.../jp/img/auto02.jpg).
Diversas etapas do processo autofágico requerem, ainda, a participação de proteínas do citoesqueleto como filamentos intermediários, responsáveis pelo sequestro de componentes citoplasmáticos e/ ou organelas e microtúbulos, responsáveis pela fusão dos lisossomos com o autofagossomo (FENGSRUD et al,
MEMBRANA DE ISOLAMENTO
CITOSOL E ORGANELAS
LISOSSOMO
AUTOFAGOSSOMO
AUTOLISOSSOMO HIDROLASES
INTRODUÇÃO
13
2004). Entre essas está a proteína 1 associada a microtúbulos de cadeia leve (LC-3, do inglês light chain 3) envolvida na formação do autofagossomo e que permanece associada a sua membrana até o final do processo (Figura 5).
Apesar do seu papel essencial para a homeostasia celular, os mecanismos moleculares que regulam a autofagia em mamíferos ainda são muito pouco entendidos (HOYER-HANSER et al, 2007). Entretanto, diversos estímulos extracelulares como a privação de fatores nutricionais (Starvation) e hormonais, bem como de estímulos intracelulares como, o acúmulo de proteínas misfold e a invasão de microorganismo são capazes de modular a resposta autofágica. Existem várias vias envolvidas na inicialização e maturação da autofagia. A figura central dessa sinalização é a proteína TOR (target of Rapamycin) que, em mamíferos, é designada como mTOR (YANG et al, 2005; YORIMITSU & KLIONSKY, 2005). A TOR é uma serina/ treonina kinase que exerce um efeito inibitório sobre a autofagia e que está envolvida na maioria das vias de regulação que controlam o processo autofágico (LIANG et al, 1999; MEIJER & CODOGNO, 2004) (Figura 5).
Figura 5 - Sequência da formação do autofagossomo e do autolissomo. Estão representados na figura, em verde, alguns dos indutores do processo autofágico como Rapamicina e
Starvation. Além disso, em vermelho, estão representados alguns inibidores do processo como
3-metiladenina (3-MA) e bafilomicina. No esquema ainda estão descritas as principais proteíans envolvidas em cada uma das etapas da formação do autofagossomo e do autolisossomo, como PI3-K, proteína LC-3, LAMP e proteínas Atg (modificado de http://www.nature.com/nrmicro /journal/v2/n4/ images/nrmicro865-f6.gif).
autofagossomo autolisossomo fusão
lisossomal fusão
endossomal conteúdo
citosólico
autofagossomo autolisossomo fusão
lisossomal fusão
endossomal conteúdo
INTRODUÇÃO
1.6. Doença de Huntigton 1.6.1. Aspecto genético
A Doença de Huntington (DH), também conhecida como Coréia de Huntington, devido ao termo coréia (do latim choreus) significar movimentos semelhantes a uma dança, é uma desordem neurodegenerativa genética autossômica dominante, no qual o fenótipo é expresso da mesma forma em homozigotos e heterozigotos. Ela é causada por uma expansão instável do trinucleotídeo CAG em um gene localizado no braço curto do cromossomo 4, mais especificamente, na região 4p16.3 em um fragmento polimórfico denominado D4S10 (GUSELLA et al, 1983). O processo de expansão de CAGs é dinâmico, podendo ocorrer em células germinativas e/ ou somáticas com a idade (TRUSHINA & McMURRAY, 2007). O tamanho da repetição CAG na população normal é de 6–39, enquanto que as expansões associadas à DH são de 36 – 180 (REGO & OLIVEIRA, 2003). Embora o número de repetições CAG esteja relacionado com a idade do início da DH (GUSELLA & MACDONALD, 2000), outros fatores podem possuir um papel importante no aparecimento da doença.
A repetição CAG está localizada dentro de uma seqüência codificadora de 17 códons, no primeiro éxon dos 67 existentes (AMBROSE et al, 1994). Esse gene, denominado de gene do transcrito interessante 15 (IT15),codifica a proteína huntintina (htt) (HUNTINGTON DISEASE COLLABORATIVE RESEARCH GROUP, 1993). Pelo fato de cada trinucleotídeo CAG codificar um aminoácido glutamina, no momento da transcrição do gene IT15 e da tradução da htt, é originada uma cadeia expandida de glutaminas (poliglutaminas/ polyQ) em sua porção N-terminal, originando a proteína huntintina mutante (mhtt).
1.6.2. Epidemiologia e sintomatologia
A DH é considerada uma doença de adultos jovens uma vez que os sintomas iniciam-se por volta dos 30-40 anos de idade. Esses pacientes apresentam um número de repetições CAG variando entre 40-50. No entanto, há alguns poucos casos onde os sintomas começam pouco depois do nascimento. Nessa situação, os pacientes possuem longas repetições CAG, por vezes acima de 100, sendo essa forma da doença denominada de juvenil (PETERSÉN et al, 1999).
INTRODUÇÃO
15
paciente apresenta retração de memória, diminuição acentuada na habilidade de elaborar estratégias de mudança de ação, como também perda da memória de procedimento, que seria importante no estabelecimento do “hábito” (equivalente ao que se chama de memória implícita) (LAWRENCE et al, 1996). As alterações emocionais geralmente acompanham a perda das funções cognitivas. Nesse sentido, os pacientes apresentam alterações de personalidade, agressividade, depressão, distúrbio bipolar e demência. Os sintomas motores caracterizam-se por movimentos involuntários como, tremor e distonia, que se inicia com uma hipercinesia e evolui a uma hipocinesia, bem como por movimentos voluntários como, falta de coordenação motora e demora em iniciar os movimentos (THE HUNTINGTON’S DISEASE SOCIETY OF AMERICA, 2006). Contudo, ela caracteriza-se por movimentos excessivos, espontâneos, randômicos e abruptos (BARBEAU et al, 1981; PÉREZ-DE LA CRUZ & SANTAMARIA, 2007; PETROZZI et al, 2007). Tipicamente, os primeiros sinais motores são anormalidades nos movimentos dos olhos, seguido pelo surgimento progressivo de discinesia orofacial que pode ser caracterizada por movimentos orofaciais (BROUILLET et al, 1999; BROWNE & BEAL, 2004; RAMASWAMY et al, 2007).
1.6.3. Neuropatologia
INTRODUÇÃO
Figura 6 - Expressão da proteína huntintina mutante (mhtt) causa perda seletiva de neurônios do estriado. (A) O gene da DH possui uma região com uma seqüência poliglutamínica no éxon 1. Em indivíduos normais a repetição fica abaixo de 39. O aumento dessas repetições leva a síntese da mhtt relacionada, diretamente, com a severidade dos sintomas da DH. (B)
Ressonância magnética de cérebro de indivíduo normal (esquerda) e de pacientes com DH (direita). C: caudado; P: putâmen; GP: globo pálido; V: ventrículo; Hip: hipocampo (modificado de TRUSHINA & MCMURRAY, 2007).
A DH atinge inicialmente uma população neuronal seletiva, neurônios estriatais como os da região ventral e neurônios secretores de ácido-γ-amino butírico (GABA) (CICCHETTI et al, 1996). Essa perda neuronal acarreta alterações como diminuição dos níveis de GABA e de suas enzimas de síntese, a glutamato descarboxilase (GAD), acetilcolina (ACh) e colina-acetil transferase (CAT), e alguns peptídeos específicos localizados nos neurônios finos médios (SHOULSON, 1984), bem como alterações importantes no número de receptores NMDA, sugerindo que alguns componentes da transmissão glutamatérgica podem estar envolvidos como fatores da causa da DH (ELLERBY, 2002). Também é observada uma neurodegeneração das 3ª, 4ª e 6ª camadas corticais cerebrais (VONSATTEL & DIFIGLIA, 1998), camadas predominantemente efetuadoras, cuja degeneração pode causar apraxia, ou seja, incapacidade de executar atos voluntários (HEDREEN et al, 1991; SOTREL et al, 1991). Alguns poucos estudos também descrevem uma morte neuronal clara no hipotálamo, mais especificamente no núcleo lateral tuberal (KREMER et al, 1990, 1991). Além disso, foi verificado que o metabolismo da glicose no estriado e no córtex cerebral está diminuído e parece preceder a perda de volume do tecido (JENKINS et al,
INTRODUÇÃO
17
1993; KOROSHETZ et al, 1994; TRUSHINA & McMURRAY, 2007). Alguns estudos em modelos animais de camundongos transgênicos da linhagem R6 sugerem que a perda de volume (atrofia) cerebral não é devido à morte neuronal, mas sim, ao encolhimento do corpo neuronal e de axônios e dendritos (HANSSON et al, 1999; KLAPSTEIN et al, 2001; PETERSÈN et al, 2002).
Uma outra característica da DH é a presença de inclusões intranucleares neuronais (NII), do inglês neuronal intranuclear inclusions, formada pela porção N-terminal da proteína huntintina mutante (mhtt). Essas inclusões, no entanto, são formadas também por proteínas da via proteassomo-ubiquitina, chaperonas, proteínas sinápticas e fatores de transcrição (LANDLES & BATES, 2004; QIN et al, 2004). Evidências demonstraram, ainda, uma deficiência severa na atividade dos complexos II e III (56%) e no complexo IV (33%) em pacientes com DH (GU et al, 1996) e anormalidades ultraestruturais nas mitocôndrias do córtex desses pacientes (GOEBEL et al, 1978; GARDIAN & VECSEI, 2004).
1.6.4. Aspectos Moleculares da DH
Vários mecanismos, que já foram mencionados anteriormente, têm sido propostos para explicar a DH (PÉREZ-DE LA CRUZ & SANTAMARIA, 2007; TRUSHINA & McMURRAY, 2007) tais como a excitotoxicidade (COYLE & PUTTFARCKEN, 1993; PETERSÉN et al, 1999), o aumento do estresse oxidativo (BROUILLET et al, 1999; PETERSÉN et al, 1999), as alterações da sinalização intracelular de Ca2+ (TANG et al, 2003; ZAINELLI et al, 2003; ROSENSTOCK et al, 2004) e o déficit do metabolismo energético (NOVELLI et al, 1988; BEAL, 1992; ROSENSTOCK et al, 2004). Uma outra hipótese para a DH é a de interações proteína-proteína (WELLINGTON et al, 1997). Em relação a essa última, é possível que o aumento de repetições CAG afetem a estrutura quartenária da htt devido a um aumento da seqüência polyQ, modificando a sua interação com outras proteínas e facilitando a formação de agregados (HARJES & WANKER, 2003; MICHALIK & VAN BROECKHOVEN, 2003; LEE & KIM, 2006).
INTRODUÇÃO
da glia (LI et al, 1993). Além disso, foi demonstrado que a htt está associada a grânulos citoplasmáticos, se assemelhando a corpos vesiculares, e a proteínas de degradação em neurônios corticais e estriatais (SAPP et al, 1997). Apesar da sua função não estar bem determinada, ela parece ser crítica para o desenvolvimento embrionário normal (ZEITLIN et al, 1995) e no transporte vesicular (TUKAMOTO et al, 1997).
Contudo, a expansão anormal da seqüência CAG pode atuar de maneira negativa ou positiva, eliminando ou aumentando, respectivamente, a função normal da htt. A expansão de polyQ, por exemplo, pode resultar em um “ganho” de função da htt aumentando a sua ligação com inúmeras proteínas. Uma dessas proteínas é a caspase 3 (GOLDBERG et al, 1996; KUIDA et al, 1996; SCHWARTZ & MILLIGAN, 1996). Além disso, a htt pode sofrer proteólise pela ação da calpaína, quando esta é ativada pelo Ca2+, contribuindo com os mecanismos de morte celular (KULKARNI et al, 1999; GAFNI & ELLERBY, 2002). Dados sugerem que um efeito particularmente importante da expressão da mhtt é a destruição e/ ou desequilíbrio de microtúbulos (TRUSHINA et al, 2003) e a inibição do tráfego vesicular. Isso porque a htt normalmente interage com proteínas motoras e com proteínas que se associam a clatrina como: a HAP1, proteína associada à htt (LI et al,1996), responsável pelo tráfego do fator de crescimento neuronal, BDNF, brain-derived neurotrophioc factor (GAUTHIER et al, 2004) e, também, pela adaptação entre a htt e o receptor de IP3 em neurônios estriatais (TANG et al, 2003) o que torna os neurônios estriatais mais suscetíveis a toxicidade (TANG et al, 2004); HIP2, enzima conjugada a ubiquitina (DIFIGLIA et al, 1997; ENGELENDER et al, 1997; TUKAMOTO et al, 1997; WAELTER et al, 2001; HARJES & WANKER, 2003); e HIP1, proteína que possui um papel importante na regulação do citoesqueleto e na concentração da próton ATPase da membrana plasmática (KALCHMAN et al, 1997). No entanto, a afinidade da HIP1 com a mhtt é menor do que com a htt normal, o que favorece a interação desta com uma outra proteína denominada de Hippi, cujo complexo é o responsável pela ativação da caspase-8 e incialização da cascata de morte celular (MAJUMDER et al, 2006).
INTRODUÇÃO
19
al, 2002; SUOPANKI et al, 2006). Um outro mecanismo pelo qual a mhtt pode afetar a função mitocondrial é pela alteração da transcrição gênica (LUTHI-CARTER et al, 2003), já que a mhtt transloca para o núcleo modulando a ativação de fatores transcripcionais como a proteína ligadora de CREB e o p53 (SUGAR & RUBINSZTEIN, 2003). Um outro dado relacionando alterações mitocondriais com a mhtt é que a presença da mhtt promove uma diminuição da motilidade dessa organela em células neuronais. As mitocôndrias de neurônios de pacientes com DH percorrem distâncias, em média, 70% menores do que em células normais (TRUSHINA et al, 2003). Essa perda da capacidade de locomoção favorece a excitotoxicidade pelo Glutamato e o desequilíbrio da homeostase do Ca2+ (CHANG et al, 2006), além de resultar numa deficiência de produção local de ATP.
INTRODUÇÃO
Figura 7 - Esquema representativo dos diferentes papéis da proteína transglutaminase 2 (TG2 ou tTG) após ativação pelo Ca2+. Dentre as funções esquematizadas estão a incorporação de
aminas, o cross-link entre proteínas, a deaminação sítio específica, a atividade de
isopeptidase, interação célula-matriz e sinalização transmembrânica (modificado de FESUS & PIACENTINE, 2002).
1.6.5. Modelos animais da DH
Atualmente existem diversos modelos que possibilitam o estudo dos mecanismos envolvidos na DH. Alguns desses modelos consistem de células provenientes de pacientes heterozigotos ou homozigotos com DH, como linfoblastos (Sawa et al, 1999; PANOV et al, 2002; NAGATA et al, 2004; MAGLIONE et al, 2006; MORMONE et al, 2006) ou de células transfectadas com a mhtt full-lenght ou apenas a porção N-terminal (PANOV et al, 2002; TANG et al, 2004; MILAKOVIC et al, 2005, 2006; OLIVEIRA et al, 2006).
interação célula-matriz sinalização transmembrânica estimulação de receptores aparição na superfície
celular fibronectina
receptor de oxitocina, receptor de tromboxano A2,
adrenoreceptor αααα1B αααα1D
interação célula-matriz sinalização transmembrânica estimulação de receptores aparição na superfície
celular fibronectina
receptor de oxitocina, receptor de tromboxano A2,
adrenoreceptor αααα1B αααα1D
atividade de isopeptidase deam inação sítio-específico crosslink de proteínas incorporação de aminas em proteínas
amina s prim
árias
ligação proteic
a por Ly s atividade de isopeptidase deam inação sítio-específico crosslink de proteínas incorporação de aminas em proteínas
amina s prim
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ligação proteic
a por Ly s interação célula-matriz sinalização transmembrânica estimulação de receptores aparição na superfície
celular fibronectina
receptor de oxitocina, receptor de tromboxano A2,
adrenoreceptor αααα1B αααα1D
interação célula-matriz sinalização transmembrânica estimulação de receptores aparição na superfície
celular fibronectina
receptor de oxitocina, receptor de tromboxano A2,
adrenoreceptor αααα1B αααα1D
atividade de isopeptidase deam inação sítio-específico crosslink de proteínas incorporação de aminas em proteínas
amina s prim
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ligação proteic
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