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LEITURA SEMIÓTICA DO TEXTO COMO A NOITE APPARECEU DE COUTO DE MAGALHÃES

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LEITURA SEMIÓTICA DO TEXTO “COMO A NOITE APPARECEU” DE COUTO DE MAGALHÃES

Claudinette Gabarron MEGGIATO (UEL – PG) Rosi Maria Basseto SENA (UEL – PG CAPES) Dra.Loredana LÍMOLI (docente UEL)

ABSTRACT: This paper presents a model of the interpretation of literary textes based on Greimas´s Semiotic theory. The aim is to present one more option for study and analysis of literary text.

KEYWORDS: literature, semiotic, teaching.

Muitas são as possibilidades de leitura e interpretação do texto literário. Neste universo de possibilidades o professor, às vezes, acaba misturando teorias ou até mesmo, não utilizando, metodicamente, nenhuma.

A teoria semiótica greimasiana tem oferecido subsídios adequados para uma leitura (de texto) em qualquer estágio escolar, uma vez que tem instrumentos apropriados para análise das estruturas do texto que leva, finalmente à interpretação segura da obra.

O presente estudo tem como objeto de análise o conto “Como a noite appareceu” de Couto de Magalhães. Ele narra a história, do ponto de vista indígena, de como surgiu a noite.

Segundo a narrativa, no início não havia noite, somente dia, ...um casal de índios haviam se casado e a esposa aqui denominada moça, que era filha de Cobra Grande, recusa-se se deitar com o esposo(moço) porque não era noite. Então o esposo, depois da afirmativa dela de que o sogro tinha a noite, envia três famulos, seus subordinados, para buscar a noite que estava adormecida no fundo das águas em posse de Cobra Grande. Os famulos vão, recebem um caroço de tucumã e a recomendação de que não devem abri-lo, porque as coisas se perderão se assim o fizerem. Porém, durante a viagem de retorno, não agüentam a curiosidade e acabam abrindo o caroço de tucumã e a noite é solta juntamente com todas as coisas que nela habitam. Por terem desrespeitado a proibição vem a punição e eles são transformados em macacos. A moça toma conhecimento da libertação da noite e sai transformando e dando nomes aos animais e separando os que pertencem ao dia dos que pertencem à noite. Quando os famulos retornam, o moço chama -lhes a atenção e confirma a punição pelo castigo de serem para sempre, macacos.

Para desenvolver a análise semiótica denominaremos aqui O moço como (S1), a moça como (S2), os famulos como (S3) e Cobra Grande como (S4), conforme a ordem em que aparecem na narrativa.

Do ponto de vista semiótico é possível estudar o texto observando os elementos ligados à estruturação sintática e semântica da narrativa e também os elementos fundamentais para análise das estruturas discursivas que são sintaxe e semântica do discurso, que servirão de parâmetro para análise do presente texto.

A sintaxe da narrativa, conforme Diana Luz Pessoa de Barros, “deve ser pensada como um espetáculo que simula o fazer do homem que transforma o mundo.” (2002:16) Para tanto se faz necessário “descrever o espetáculo, determinar seus participantes e o papel que representam na história construída” (ibid, p 16). Assim, do ponto de vista da sintaxe, a semiótica propõe duas concepções complementares de narrativa:

“narrativa como mudança de estados, operada pelo fazer transformador de um sujeito que age no e sobre e o mundo em busca de valores investidos nos objetos; narrativa como sucessão de estabelecimentos e de rupturas de contratos entre um destinador e um destinatário, de que decorre a comunicação e o conflito entre sujeitos e a circulação de objetos.”(ibid, p 16)

No texto em estudo, observa-se primeiro a segunda concepção, ou seja, há o primeiro conflito que é a não consumação do casamento quando a moça (S2) recusa-se a se deitar com o moço(S1) porque não é noite. Por causa deste conflito inicial, S1 vai à busca, através do S3, do objeto de valor desejado pelo S2 para transformar o conflito em harmonia.Temos então a primeira concepção descrita acima.

Ainda com relação ao enunciado, na sintaxe narrativa, temos o enunciado elementar que “caracteriza-se pela relação de transitividade entre dois actantes, o sujeito e o objeto”(ibid, p 17) a relação define os actantes que se relacionam com o objeto e este mantém laços com o sujeito. São duas formas de relações ou funções transitivas, a junção e a transformação, estas vão estabelecer a distinção entre estado e transformação.

Assim, em “Como a Noite Appareceu” é:

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S1 > Ov = (S2) > = quer S2 > Ov = noite

S3 > Ov = noite S4 possui Ov = noite.

Portanto, a noite é o objeto de valor dos três sujeitos e está em posse de S4.

Temos então: S1 quer S2, esta se recusa, há então o conflito que gera a dis junção S1 ∪ S2. Por sua vez, S2 quer Objeto de valor (noite) e entra em disjunção também, pois ainda não a tem, S2 ∪ Ov.

Para conseguir o que querem, S1 e S2 atribuem ao S3 (famulos) a missão de buscar a noite que está em posse de S4 (Cobra Grande). Desta forma, S3 passa a querer Ov (noite) de S4 que lhe concede. S3 < > Ov < > S4 < > S3.

O texto apresenta o conflito inicial de relacionamento: S1 quer S2 quer Ov

S1 eS2 querem Ov

S1 e S2 ∩ Casamento, porém há um impedimento para a sua consumação, então S1 e S2 ∪ Ov consumação do casamento.

Ambos estão casados, porém a esposa recusa a deitar porque ainda é dia.

O segundo conflito é do casal com a natureza. A noite passa a ser o objeto de valor que vai promover a disjunção pela ausência: S1 e S2 ∪ Ov (natureza= noite).

A sintaxe narrativa estabelece que, nos textos, há também o programa narrativo, definido como “um enunciado do fazer que rege um enunciado de estado”(ibid, p 20) que envolve estados e transformações. Assim, o programa narrativo do texto em estudo, se institui no enunciado do fazer com o casal em disjunção porque no enunciado de estado não é noite.

Para que a conjunção entre o casal se dê, é necessário o fazer transformador do dia para a noite, que será efetivado pela moça que, de posse do objeto mágico, caroço de tucumã, terá o poder de transformar os elementos da natureza, por isso separa a noite do dia e todos os seres que neles habitam. Opera -se, neste caso, a transformação de um estado dis juntivo para um estado conjuntivo.

Ausência da noite S1 ∪ S2 Presença da noite S1 ∩ S2

Dentro do programa narrativo que “define-se como um enunciado de fazer que rege um enunciado de estado”(ibid, p 20) é possível verificar que a narrativa estrutura-se em um programa de base ou programa principal que é a ausência da noite e programas de uso ou programas secundários que são, a busca da noite, a transgressão a uma imposição, a obtenção da noite e a transformação após a aquisição da noite.

Quanto aos valores investidos no objeto temos os valores modais.

Querer > S2 quer a noite

Dever > S1 deve obter a noite para conseguir S2 Poder > S1 pode procurar a noite

Saber > S1e S2 sabem como conseguir a noite

Assim, no programa de competência, que é o programa de doação de valores modais ao sujeito de estado, capacitando-o para a ação, temos:

PN > Programa de Competência (Função > consumar o casamento) Atores: S1 e S2

Aquisição> entrar em conjunção com a noite Valores Modais > quer e sabe obter a noit e

O moço quer consumar o casamento com a moça e atribui aos subordinados(famulos) a competência de adquirir a noite para realizar o seu intento.

No programa de perfórmance que é a apropriação de valores descritivos, ou seja, a ação do sujeito para a aquis ição do objeto valor desejado, temos:

PN >Programa de Perfórmance (Função> obter a noite) Atores: S1, S2 através do S3

Aquisição: entrar em conjunção com a noite Valores Descritos: conseguem a noite

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S1 conjunção S2 – casamento

S1 disjunção S2 – sem a noite, sem consumação do casamento. S1 conjunção S2 – com a noite.

PN> S1 e S2 através do S3 buscam e obtém o objeto valor = noite.

Querer, poder, saber e obter a noite promove a condição final de consumação do casamento e eles entram em conjunção com o objeto valor (noite) e com o casamento.

Já, S3, por desobedecer ou romper com o contrato estabelecido com Cobra Grande (não abrir o caroço de tucumã) sofre a penalidade.

O poder do S1 e do S2 é superior ao do S3 (os famulos), que, ao final transformam-se em macacos e somente S1 e S2 permanecem humanos.

Os programas narrativos, conforme Barros:

organizam-se em percursos narrativos relacionados por pressuposição. O encadeamento lógico de um programa de competência com um programa de performance constitui, por exemplo, um percurso narrativo, denominado percurso do sujeito.(ibid, p 26).

O programa de performance do S3 (demanda em busca da noite) pressupõe o programa de competência obtido do S1 e do S2 (saber como e onde conseguir o objeto valor). Estes dois programas determinarão o percurso narrativo do sujeito. Assim, conforme a autora, “o sujeito de estado, o sujeito do fazer e o objeto foram caracterizados como actantes sintáticos, no momento da apresentação do enunciado elementar e do programa narrativo.”(ibid,p 26) porém “o percurso do sujeito não é o único tipo de percurso encontrado na organização narrativa. Existem dois outros mais: o percurso do destinador-manipulador e o percurso do destinador – julgador”(ibid, p28)

Assim, o percurso narrativo do texto em estudo é S1 destinador-manipulador que quer S2 que é também destinador-manipulador (faz-ser) e manipula S1 fazendo-o crer ser possível conseguir o Ov, S1 e S2 manipulam (faz-fazer) S3 destinatário-sujeito para a execução da ação de obtenção do Ov, S3 parte em busca do Ov, consegue de S4. Recebe a manipulação de S4, rompe com a proibição, recebe a punição que culmina na transformação.

Neste sentido ocorrem as manipulações em busca do Ov: S2 manipula por tentação S1

S1 manipula por intimidação S3 S3 recebe de S4 o Ov

S4 manipula por intimidação S3 Ov manipula por tentação S3

S3 recebe punição (transformam-se em macacos).

Há uma proibição que se transforma em tentação (S4 > S3)

S3 não é reconhecido como cumpridor dos compromissos assumidos, é julgado negativamente e recebe a punição.

Desta forma, ocorre uma relação desejável e possível entre S1 e S2, ambos querem a noite, é possível obtê-la. Portanto, S1 e S2 devem e querem a noite, podem buscar e sabem onde encontrar.

S2 quer e sabe

S1 quer, pode, sabe e atribui ao S3 a ação de busca, comunica os valores modais ao destinatário sujeito para que ele faça.

A respeito da Semântica narrativa serão analisadas as questões da Modalização e das paixões que dela decorrem.

A modalização de enunciados de estado é também denominada modalização do ser e atribui existência modal ao sujeito de estado. A modalização de enunciados do fazer é, por sua vez, responsável pela competência modal do sujeito do fazer, por sua qualificação para a ação.(ibid, p 42)

As modalidades que instauram o sujeito, as virtualizantes dever-fazer e querer-fazer promovem a ação de: S1 quer S2. E as atualizantes em que o S3 pode e sabe fazer – que é buscar a noite – atribuição recebida do S1. Em se tratando da obtenção da noite S2 quer e sabe, pode e deve, mas não faz. Transfere ao S1 o saber, o querer e o poder que, por sua vez transfere ao S3 o saber e o dever para a realização do fazer transformador.

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Estão presentes, portanto, as duas espécies de modalidades, as virtualizantes e as atualizantes, para a concretização do fazer transformador.

Em relação ao caroço de tucumã, há incompatibilidade de modalidades na organização da competência do S3, pois S3 não deve e não pode, mas sabe, quer e faz (abrir o caroço e tucumã, movido pela manipulação tentação).

Quanto à modalização do ser, a narrativa em análise é determinada pelas modalidades dos querer, dever, poder e saber, que será confirmada pelos percursos a seguir:

S1 quer a esposa S2 – desejo. S2 quer a noite – desejo. S1 e S2 querem a noite – desejo.

No segundo percurso, o S3 quer abrir o caroço de tucumã, portanto S3 – relaciona-se com Ov noite, através da curiosidade – querer-saber;

Conforme a estudiosa,

os efeitos de sentido ‘afetivos’ ou ‘passionais’ são produzidos pela modalização do ser, que acabam modificando o sujeito de estado através das paixões. Afinal, um sujeito ocupa diversas posições na narrativa, passando por ‘estados de tensão’ e de ‘disforia’ para ‘estados de relaxamento’ e de ‘euforia’ (ibid, p 47)

É possível perceber que na narrativa “como a noite appareceu”, desenvolvem-se as paixões complexas que “são efeitos de uma configuração de modalidade, que se desenvolve em vários percursos passionais”( ibid, p 47)

E como afirma Barros, “o estado inicial do percurso das paixões complexas é denominada por Greimas em estado de espera”(ibid, p 49) A espera é definida pela combinação de modalidades, afinal o sujeito anseia por um objeto (querer-ser) porém não luta por consegui-lo e acredita (crer-ser) possível contar com outro sujeito na realização do intento.(ibid, p 49) Sendo assim, S2 – estado de espera – acredita (crer-ser) contar com S1 – estado de espera, que por sua vez, acredita (crer-ser) contar com S3 para a realização da tarefa, a obtenção da noite e, conseqüentemente obter (dormir com) S2. A confiança no outro gera satisfação imaginada na obtenção do valor desejado. O contrário também pode acontecer: o sujeito ao verificar a impossibilidade de realização de seu querer, passa para o estado de insatisfação e de decepção. O que pode ser observado em S1 e S2.

S1 (em relação ao S2)

Relaxamento da espera intenção Satisfação (imaginada) insatisfação Confiança decepção

S1 e S2 (em relação ao S3)

Relaxamento da espera intenção Satisfação (imaginada) insatisfação Confiança decepção

Em função da ruptura do contrato (abertura antecipada do caroço de tucumã), há uma punição que não provém do S1, mas é uma conseqüência do ato d e S3 > (metamorfoseia-se em macacos).

Com relação à sintaxe discursiva, as estruturas narrativas são assumidas pelo sujeito de enunciação que seleciona a pessoa, o tempo, o espaço, construindo o discurso e deixando suas marcas. No texto “Como a noite appareceu”, o tempo e o espaço são indeterminados como pode ser constatado em algumas marcas deixadas pelo sujeito da enunciação:

No principio não havia noite ___ dia sómente havia em todo o tempo.” (...) “A filha da Cobra Grande ___ contam casara -se com um moço”. (...) “Um dia, elle chamou os três famulos e disse-lhes: ides passear, “(...) “Os famulos foram-se...”, “Quando estavam muito longe...” (...) “Então todas as cousas que estavam espalhadas pelo bosque... (MAGALHÃES, 1940:216)

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Portanto, as marcas existentes no discurso fazem parte da enunciação que são reveladas nas estruturas discursivas e de onde se originam os valores intrínsecos do texto construído. O discurso é definido “como objeto produzido pelo sujeito da enunciação e como objeto de comunicação entre um destinador e um destinatário” (ibid, p 47). Na verdade, o enunciador utiliza-se dos elementos de produção do discurso para comunicar a noção de “veracidade” do texto ao enunciatário. Assim, “o efeito de realidade ou referente” tratado por Barros (ibid, p 59) vem demonstrar que os acontecimentos contados e os seres presentes no universo textual, motivados pela ilusão discursiva, copiam a realidade e acabam criando “os efeitos de sentido”.

É particularmente importante ressaltar que, quanto maior for a noção de realidade empregada pelo discurso ao seu receptor, mais forte será o efeito de realidade ou a ilusão de verdade. Esse recurso construído pela semântica discursiva e não pela sintaxe, é denominado de “ancoragem” (ibid, p 60). Porém, esse recurso semântico pode atribuir à narrativa o efeito de irrealidade ou de ficcionalidade, ou seja, de que tudo não passa de pura ilusão ou imaginação, uma mera criação do discurso. Daí o amálgama “maravilhoso” do “Era uma vez” e que se observ a no início da narrativa “Como a noite appareceu”: “No principio não havia noite ___”, essa indeterminação temporal e espacial que é reiterada ao longo do texto em análise, propicia ao leitor uma busca de realidade que contraria o universo real. Dessa forma, ao tratar da questão da enunciação, deve-se analisar “os efeitos de sentido” presentes no discurso e os mecanismos que foram utilizados ao produzi-lo.

O sujeito da enunciação garante a coerência semântica do discurso, criando efeitos de realidade e de sentido a partir de elementos figurativos do conteúdo. A tematização e a figurativização são condutas semânticas do discurso (ibid, p 68). Verifica-se, dessa forma, que o texto “Como a noite appareceu” apresenta a figura da noite como elemento básico na formação das imagens que perpassa toda a narrativa: “No principio ... (...) a noite estava adormecida”. A noite é o objeto de busca que promove toda a ação do texto, ocorrendo o encadeamento de figuras relacionadas à noite durante todo o percurso narrativo.

Quanto à tematização é possível perceber a semelhança com a gênesis, o poder feminino direcionando o percurso narrativo desde o início até o final, no momento em que ela reordena o universo colocando cada ser em seu devido espaço e tempo, conforme trechos a seguir:

“ Os famulos foram-se, e então elle chamou sua mulher para dormir com elle. A filha da Cobra Grande respondeu-lhe:

___ Ainda não é noite. O moço disse-lhe:

___ Não ha noite; sómente ha dia. A moça falou:

___ Meu pae tem noite. S i queres dormir commigo, manda busca-la lá, pelo grande rio.” (Magalhães, 1940:216)

(...)

“A filha da Cobra Grande, quando viu a estrella d’alva, disse a seu marido:

___A madrugada vem rompendo. Vou dividir o dia da noite. Então ella enrolou um fio, e disse-lhe:

___ Tu serás cujubin. Assim ella fez o cujubin; (ibid, p 216)

(...)”

“Ella enrolou o fio, sacudiu cinza em riba delle, e disse: tu serás inambú, para cantar nos diversos tempos da noite e de madrugada. De então para cá todos os passaros cantaram em seus tempos, e de madrugada, para alegrar o principio do dia.”(ibid, p 216)

Um dos conflitos da narrativa se dá com a quebra do contrato “não abra o caroço de tucumã” e como conseqüência do ato infrator vem a punição com a transformação (metamo rfose) dos famulos em macacos. A coerência semântica é mantida durante todo o percurso narrativo. O elemento do maravilhoso, o caroço de tucumã que continha a noite em seu interior, é o objeto transformador que atribui sentido à narrativa. Portanto, noite é o sema desencadeador de isotopias.

Em se tratando da estrutura fundamental do texto, é preciso ater-se à significação em que a rede de relações se reduz a uma única relação (BARROS, 2002:77). As relações opositoras entre dois termos são analisadas dentro de um mesmo “eixo semântico”. Assim, no texto “Como a noite appareceu”, tem-se os elementos “noite” e “dia” ou “fechado” e “aberto” ou, ainda, “proibir” e “permitir”:

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Noite Dia

Não Noite Não Dia

Fechado Aberto

LEGENDA

Relação entre contrários Não Fechado Não Aberto

Relação entre contraditórios Relação entre complementares Proibir Permitir

(BARROS, 2000: 78)

Obedecer Transgredir

No texto, a proibição leva à transgressão que gera a punição. E a ação de punição ocorre com os atores secundários (famulos - S3). Desse modo, S1 e S2 não se transformam, permanecendo humanos.

Percebe-se que no nível das estruturas fundamentais constrói-se o mínimo de sentido que faz o texto, casando-se os planos de conteúdo e de expressão, demonstrando que o texto dialoga com outros tanto textos (ibid, p 79), como se observa na narrativa “Como a noite appareceu”, de Couto de Magalhães, que pode ser analisada como uma possível releitura da gênesis bíblica, com o mito da caixa de Pandora e, por sua vez, ter sido motivo de composição temática dos poemas “Coema Piranga”, “Uiara”, “Amor Selvagem”, “Sem noite, não”, “Onde está a noite?”, “A Cobra Grande”, “A Onça-Preta” e “Fon-Fin, Culó” da obra Martin Cererê de Cassiano Ricardo.

RESUMO: Este artigo apresenta uma leitura do texto literário tendo com base a teoria semiótica greimasiana. O objetivo é apresentar mais uma opção para estudo e análise do texto literário.

Palavras-chave: literatura, semiótica, ensino.

ANEXO I

COMO A NOITE APPARECEU

No principio não havia noite __ dia sómente havia em todo tempo. A noite estava adormecida no fundo das aguas. Não havia animaes; todas as cousas falavam.

A filha da Cobra Grande __ contam __ casara-se com um moço.

Esse moço tinha tres famulos fieis. Um dia, elle chamou os tres famulos e disse-lhes: __ ide passear, porque minha mulher não quer dormir commigo.

Os famulos foram-se, e então elle chamou sua mulher para dormir com elle. A filha da Cobra Grande respondeu-lhe:

___ Ainda não é noite. O moço disse-lhe:

___ Não ha noite; sómente ha dia. A moça falou:

___ Meu pae tem noite. Si queres dormir commigo, manda busca-la lá, pelo grande rio.

O moço chamou os tres famulos; a moça mandou-os á casa de seu pae, para trazerem um caroço de tucumã.

Os famulos foram, chegaram á casa da Cobra Grande, esta lhes entregou um caroço de tucumã muito bem fechado e disse-lhes:

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___ Aqui está; levae- o . Eia! Não o abraes, sinão todas as cousas se perderão.

Os famulos foram-se, e estava ouvindo barulho dentro do côco de tucumã, assim: tem ten, ten... xi... (20) Era o barulho dos grillos e dos sapinho que cantam de noite.

Quando já estavam longe, u m dos famulos disse a seus companheiros: ___ Vamos ver que barulho será este?

O piloto disse: ___ Não; do contrário nos perderemos. Vamos embora, eia, remae!

Elles foram-se e continuaram a ouvir aquelle barulho dentro do côco de tucumã, e não sabiam que barulho era.

Quando já estavam muito longe, ajuntaram-se no meio da canôa, accenderam fogo, derreteram o breu que fechava o côco e abriram-no. De repente tudo escureceu.

O piloto então disse: ___ Nós estamos perdidos; e a moça, em sua casa, já sabe que nós abrimos o côco de tucumã!

Elles seguiram viagem.

A moça, em sua casa, disse então a seu marido: __ Elles soltaram a noite; vamos esperar a manhã.

Então todas as cousas que estavam espalhadas pelo bosque se transformaram em animaes e passaros.

As cousas que estavam espalhadas pelo rio se transformaram em patos e em peixes. Do paneiro gerou-se a onça; o pescador e sua canôa se transformaram em pato; de sua cabeça nasceram a cabeça e o bico de pato; da canôa, o corpo do pato; dos remos, as pernas do pato.

A filha da Cobra Grande, quando viu a estrella d’alva, disse a seu marido: ___ A madrugada vem rompendo. Vou dividir o dia da noite.

Então ella enrolou um fio, e disse-lhe: ___ Tu serás cujubin. Assim ella fez o cujubin; pintou a cabeça do cujubin de branco, com tabatinga; pintou-lhe as pernas de vermelho com urucú, e então, disse-lhe: ___ Cantarás para todo o sempre quando a manhã vier raiando.

Ella enrolou o fio, sacudiu cinza em riba delle, e disse: tu serás inambú, para cantar nos diversos tempos da noite e de madrugada.

De então para cá todos os passaros cantaram em seus tempos, e de madrugada, para alegrar o principio do dia.

Quando os três famulos chegaram, o moço disse-lhes: ___ Não fostes fieis ___ Abristes o caroço de tucumã, soltastes a noite e todas as cousas se perderam, e vós tambem, que vos metamorphoseastes em macacos, andareis para todo o sempre pelos galhos dos paós.

( A bocca preta e a risca amarella que elles têm no braço dizem que são ainda o sinal do breu que fechava o caroço de tucumã e que escorreu sobre elles quando derreteram).

...

( 20) Quando os selvagens narram esta parte imitam o zumbido dos insectos que cantam á noite. (MAGALHÃES, 1940:216)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROS, Diana Luz Pessoa de. Teoria Semiótica do Texto. 4ª ed. São Paulo: Ática, 2002.

MAGALHÃES, José Vieira Couto de. “Como a noite appareceu”. In: O Selvagem. 4ª.. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1940.

MÉNARD, René. Mitologia Greco-Romana.(trad. Aldo Della Nina). Vol. II. Sãu Paulo: Opus editora, 1991. RICARDO, Cassiano. Martin-Cererê. 15ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1981.

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