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System of Beliefs as Imaginary in Wunenburger

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Gilson Xavier de Azevedo**, Carolina Teles Lemos***

Resumo: o presente texto tem por objetivo analisar a questão do sistema de crenças a partir dos conceitos de imaginário e representação. Referencia-se imaginário e repre-sentação, dentro da abordagem de Wunenburger, um filósofo francês, especialista em estudos sobre o imaginário representativo, sendo que, sua obra busca uma aproximação com a antropologia estruturalista para analisar símbolos e mitos nas suas relações com o racionalismo no mundo contemporâneo. Parte-se do problema de que a crença seria um produto do imaginário humano. A premissa básica é pensar que o imaginário seria de fato fonte das construções simbólicas da crença. Trata-se de uma análise de uma das obras do autor enviesada por outras citações e pontos de vista. Espera-se com esse estudo, ampliar o debate entorno da questão das crenças humanas e como estas se constroem socialmente. Palavras-chave: Religião. Imaginário. Sistema de Crenças.

O

foco deste texto é considerar a questão do sistema de crenças sob o viés de uma cultura do imaginário e da representação social. Assim sendo, as práticas huma-nas seriam construções simbólicas que tem origem na ação do imaginário e da representação humana.

SISTEMA DE CRENÇAS

COMO IMAGINÁRIO

EM WUNENBURGER*

–––––––––––––––––

* Recebido em: 21.10.2017. Aprovado em: 21.11.2017.

** Docente da Universidade Estadual de Goiás. Professor Titular de Antropologia na FAJOP, Filosofia do Direito e Filosofia Empresarial na FAQUI. Coordenador do NAED (Núcleo de Apoio à Educação à distância pela FAQUI. Doutor em Ciências da Religião pela PUC Goiás. Pós-doutorando pela Universidade Lusófona/Lisboa. E-mail gilsoneduc@yahoo.com.br *** Possui graduação em Pedagogia pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras Umuarama

(1989), mestrado em Ciências Sociais e da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (1994) e doutorado em Ciências Sociais e da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (1998). Atualmente é professor titular da Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em Sociologia, atuando principalmente nos seguintes temas: religião, gênero, catolicismo, tradições culturais e práticas de religiosidade popular. E-mail: cetelemos@uol.com.br.

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O cotidiano de cada indivíduo é permeado por ações que nem sempre estão alinhadas com a noção geral de realidade que é construída socialmente. Por tal razão, buscou-se analisar a obra O Imaginário de Wunenburger (2007) de modo a verificar indícios de tal perspectiva.

SOBRE O CONCEITO DE IMAGINÁRIO

O termo imaginário é uma variação recentemente utilizada no mundo, de modo que é inclusive desconsiderada em alguns países. Para Wunenburger (2007, p. 7) o imaginário compreende lembrança, fantasia, sonho, devaneio, crença, roman-ce, mito e ficção. O fato de a palavra ter ganhado grande expressão mundial foi devido à insatisfação com a capacidade do termo “imaginação” conseguir representar algumas realidades dentro do campo teórico.

De acordo com este pensador (WUNENBURGER, 2007, p. 8) o termo possui quatro ver-tentes, a saber: mentalidade, mitologia, ideologia e realidade ficcional. A primei-ra vertente a que se fez menção seria a de mentalidade, servindo a designação histórica de algo, ou seja, é a consciência de algo que existe ou existiu. Nesse contexto, o imaginário é a ideia da existência de algo em um dado momento histórico.

Depois, a ideia de imaginário se desdobra na mitologia que tem relação com o conjunto de relatos culturais. Nesse caso, imaginário seria um relato de algo, de um fato, de uma situação, algo que pode ou não existir conforme o que pretende descrever. Imaginário tem ainda relação com ideologia1 enquanto concepção marxista que

iden-tifica na realidade uma intencionalidade não positiva a qual impera sobre os indivíduos. Por fim, imaginário é uma realidade ficcional e ao mesmo tempo temática que destaca matéria e forma das obras artísticas e literárias.

Nesse contexto, pode-se apontar o pensamento de Silva (2011, p. 25):

O imaginário funciona, sobretudo como fecundador e organizador da vida dos homens, como instância de mediação na relação do homem consigo mesmo, com o outro, com o mundo. Atua igualmente como uma rede ou sistema de relações [crenças], ou seja, um sistema dinâmico e organizador de imagens, no qual há plena integração e livre circulação entre a via racional e a via imaginária. Dormindo ou acordados os homens utilizam seu pensamento e portanto, sua crença,

para pensar, ou seja, para refletir, para construir, para desconstruir, para des-truir às vezes e para reconsdes-truir. No seu pensar o homem pode ainda imaginar lógicas para o real, situar e orientar sua vida. Nesse sentido, pensar não tem sentido direto de imaginar, todavia, o imaginário reflexivo do homem pressu-põe certa lógica que pode ser considerada racional ou ficcional e, nesse caso,

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imaginativa. Isso porque a maneira como vemos a realidade é uma forma re-presentativa, ou seja, de atribuição de valor e expectativas sobre o real. De acordo com Wunenburger (2007, p. 10), imaginário pode ser:

Um conjunto de produções mentais ou materializadas nas obras, com bases em imagens visuais (quadro, desenho, fotografia) e de linguagem (metáfora, sím-bolo, narrativa) que formam conjuntos coerentes e dinâmicos, que provêm de uma função simbólica entendida como uma superposição de sentidos próprios e figurados.

Ainda para o autor, o termo pode ser analisado a partir de seus contrários que são o real e o simbólico2. A realidade não é conhecida ou dita, ela é imaginada, ou substituída por símbolos criados especificamente para que o homem se loca-lize no Cosmo. Trata-se de uma crença, construída da individualidade para a coletividade. De acordo com Silva (2011, p. 55):

Imaginação corresponde a imaginário, sendo ambos os termos sinônimos. A pri-meira é faculdade de formar imagens fornecidas pela percepção, faculdade essa que pode libertar-nos da sedução das imagens primeiras, transformando-as em nosso psiquismo, visto manter-se sempre aberta, evasiva, experiência mesma da abertura, da novidade, soma de nossas experiências.

Feita essa distinção, busca-se situar melhor o conceito de imaginário. Para Wunenburger (2007, p. 12) o imaginário pode ser dito como uma noção holística ou de totali-dade representada que necessariamente de fisicalitotali-dade conhecida. O imaginário compreende, portanto, temas, motivos, intrigas, cenários, tempo, espaço, per-sonagem e ação.

Ainda para o pensador (2007, p. 12):

O estudo do imaginário como mundo de representações complexas, deve, pois, fundar-se no sistema das imagens-textos, em sua dinâmica criativa e sua riqueza semântica, que tornam possível uma interpretação indefinida, e, por fim, em sua eficácia prática e sua participação na vida individual e coletiva.

Com relação aos tipos de imaginário, pode-se identificá-lo como reprodutivo no jogo das memórias e imagéticos populares e sociais, como imaginação fantástica. Citando Le Goff, Wunenburger (2007, p. 13) afirma que o imaginário se mos-tra diferente da realidade física, simbólica e ideológica.

A ideia de imaginário ainda pode ser dita como estática, ou maneira individual de ver a realidade, e pode ser dito como ampliado integrando a atividade da própria

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imaginação. Wunenburger (2007, p. 15) enfatiza o tratamento de dois sistemas semânticos3, sendo um aberto que designa o conjunto de percepções variadas e o outro fechado que designam as variações interpretativas de significado, cons-truídas sempre a partir de uma especificidade. Ambos tratam mais diretamente de um modelo aleatório e imagético que se referea uma atividade autopoiética ou de autossuperação da percepção. O fato é que, segundo Silva (2011, p. 56): Se déssemos mais importância à imaginação, veríamos muitos falsos proble-mas psicológicos esclarecidos’ O imaginário, além de dinamismo organizador, é fator de homogeneidade de qualquer representação. É a faculdade de formar imagens e de deformar a realidade, podendo coordenar reciprocamente o pen-samento de forma mais íntima.

Assim, o ser humano desde períodos mais remotos e forma primitiva, consegue estabe-lecer uma relação de diferenças entre si e o mundo, se vendo como diferente e simbólico. Ao trabalhar, criar, agir, planejar, está modificando o universo natural pelo seu universo psíquico:

As imagens encontram sua dinâmica criadora na experiência do corpo, por exemplo, a atividade de expressão linguística ou do trabalho muscular por meio de seus movimentos, seus ritmos, a resistência das matérias trabalhadas pelo gesto, e por fim a consciência temporal descontínua, feita de instantes sucessi-vos e inovadores, arrebatados por um ritmo (WUNENBURGER, 2007, p.18-9). Representar a realidade de modo imaginário é, portanto, dar-lhe um sentido humano,

divino ou animal, diferente do que possui. O homem precisa frequentemen-te recorrer a esta possibilidade para então conseguir se ver inserido em uma realidade que, sendo para ele natural, é somente produto de seu imaginário e objeto de suas representações.

Neste caso, as imagens são realidades que se configuram no espaço e no tempo, mental e exterior. Na imagem animada, o tempo cinematográfico não é o tempo da vida, mas esse tempo de um filme procura restituir um tempo da história, um tem-po do mundo. [...] Em suma, o primeiro aspecto é a manifestação espaço-temtem-poral da imagem de caráter fenomenológico. O segundo aspecto é o afetivo, que alimenta toda uma psicopatologia do imaginário. E o terceiro aspecto é que as imagens são inseparáveis da significação (WUNENBURGER, 2007, p. 20).

Desse modo, a compreensão do imaginário humano nos remete à necessidade de com-preensão de um todo elevado do ponto de vista semântico, linguístico e

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huma-no. Para entender o ser humano é preciso entender todo o seu sistema simbó-lico, a maneira como pensa, e pensando, entender a maneira como representa seu imaginário dentro de um simbolismo que lhe permite entender a seu modo o mundo natural e simbólico onde vive.

O QUE SÃO REPRESENTAÇÕES?

A ideia de representação está intimamente ligada à questão do imaginário, enquanto formulação mental de realidades concretas. Nesse sentido, representar algo é fazer uma substituição simbólica do real/concreto pelo imaginário/abstrato. Para Wagner (1998, p. 3) uma representação é um “conteúdo mental estru-turado (cognitivo, avaliativo, afetivo e simbólico) sobre um fenômeno social relevante, que toma a forma de imagens ou metáforas, e que é conscientemente compartilhado com outros membros do grupo social”.

A representação nesse caso pode ou não ser social, de modo que suas variantes seriam as representações afetivas, líricas, educativas dentre outras. Pode-se, portan-to entender representação como “uma forma de conhecimenportan-to socialmente elaborada e partilhada, tendo um objetivo prático e concorrendo à construção de uma realidade comum a um conjunto social” (JODELET, 1994, p. 36). Tal perspectiva pode aliar-se a de que representação seria o “conteúdo concreto apreendido pelos sentidos, pela imaginação, pela memória ou pelo pensamen-to”; é, em síntese, a “reprodução daquilo que se pensa” (FERREIRA, 1975). Fica claro, portanto, que uma representação é não apenas uma maneira particular de ver

uma situação, cultura, pessoa ou objeto, mas é uma criação imaginativa, uma nova realidade para a mente que observa o elemento em questão. Para Abric (1994, p. 188) é “produto e processo de uma atividade mental pela qual um indivíduo ou um grupo reconstitui o real ao qual ele é confrontado e lhe atribui uma significação específica”. Já para Franco (2004, s.p.):

...as representações sociais são elementos simbólicos que os homens expres-sam mediante o uso de palavras e de gestos. No caso do uso de palavras, utilizando-se da linguagem oral ou escrita, os homens explicitam o que pen-sam, como percebem esta ou aquela situação, que opinião formulam acerca de determinado fato ou objeto, que expectativas desenvolvem a respeito disto ou daquilo [..] e assim por diante. Essas mensagens, mediadas pela linguagem, são construídas socialmente e estão, necessariamente, ancoradas no âmbito da situação real e concreta dos indivíduos que as emitem.

Dentro de uma primeira síntese, pode-se dizer que praticamente tudo o que se pensa e se expressa é uma representação, sendo esta social ou não. Na perspectiva

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de Franco (2004), as representações servem ao contexto da criação de sentido existencial humano, ou seja, busca-se no cotidiano atribuir à realidade cono-tações e denocono-tações que tem certo estreitamento com a forma como o ser que representa o mundo o faz. Segundo Mazzotti (2002, p. 17):

Sujeito e objeto não são funcionalmente distintos, eles formam um conjunto indissoci-ável. Isso quer dizer que um objeto não existe por si mesmo, mas apenas em relação a um sujeito (indivíduo ou grupo); é a relação sujeito-objeto que de-termina o próprio objeto. Ao formar sua representação de um objeto, o sujeito, de certa forma, o constitui, o reconstrói em seu sistema cognitivo, de modo a adequá-lo ao seu sistema de valores, o qual, por sua vez, depende de sua his-tória e do contexto social e ideológico no qual está inserido.

De outro modo, a mediação feita por meio da linguagem, pode ser escrita, visual, mu-sical, artística, ritual, social ou simbólica. De acordo com Anadon e Machado (2001), são as representações sociais que criam as formulações do senso co-tidiano ou comum, pois referem-se ao conjunto de conhecimentos originados das tradições e experiências compartilhadas, além de remeter às imagens men-tais e aos excertos de teorias científicas modificadas para servir à vida cotidia-na. Conforme Bôas (2004):

O senso comum, por mais redundante que isso possa parecer, é realmente “comum” porque orienta não apenas o comportamento de um indivíduo, mas de toda a coletividade, determinando suas práticas e atitudes. Acredita-se que essa orientação de comportamento também é constituída por uma tessitura de sabe-res historicamente construídos e que colaboram para a constituição de repre-sentações sociais mais enraizadas e, consequentemente, mais estáveis.

Dessa forma, mesmo que uma representação não seja social em sua expressão, ela o é em sua construção, dado que parte de uma vivência essencialmente social, pois trata-se de uma crença que fora mentalmente construída e disseminada. Segundo Spink (1993, s.p.):

As representações sociais, sendo definidas como formas de conhecimento prático, inserem--se mais especificamente entre as correntes que estudam o conhecimento do senso comum. Tal privilégio já pressupõe uma ruptura com as vertentes clássicas das teorias do conhecimento, uma vez que estas abordam o conhecimento como saber formalizado, isto é, focalizam o saber que já transpôs o limiar epistemológico, sen-do constituídas por conjuntos de enunciasen-dos que definem normas de verificação e coerência. Em nítido contraste, as correntes que se debruçam sobre os saberes enquanto saberes, quer formalizados ou não, procuram superar a clivagem entre ci-ência e senso comum, tratando ambas as manifestações como construções sociais sujeitas às determinações sócio-históricas de épocas específicas.

Portanto, pode-se entender que uma representação é necessariamente um saber, uma certeza, uma verdade sobre algo que se percebe. Assim, uma representação

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encontra-se arraigada na vida comum do indivíduo, do coletivo, do saber prá-tico da forma como os indivíduos sentem, assimilam, apreendem e interpretam o mundo dentro de seu cotidiano.

As representações, segundo Moñivas Lazaro (1993, p. 246), teriam origem em nos-so interesse, ou seja, na “intenção de criar imagens capazes de expressar ou de conciliar os propósitos dos indivíduos e da coletividade, podendo ocorrer, em tais imagens e declarações, distorções subjetivas da realidade objetiva”. Todavia, podem também serem construídas a partir do desejo de se resolver “as tensões psíquicas e afetivas que provêm do fracasso de sua integração na sociedade, sendo, portanto, uma compensação imaginária cujo propósito é restituir algum equilíbrio interno”. Por fim, Moñivas Lazaro entende que as representações seriam uma forma de controle, nomos ou filtro sobre a infor-mação proveniente do coletivo que manipula pensamento e estrutura social. As representações foram teorizadas por Abric (1994) como forma de ancoragem ou

sistema periférico. Tal conceito refere-se a concretização, mediante apropria-ção individual e personalizada por parte de diferentes pessoas constituintes de grupos sociais diferenciados.

Ainda segundo Abric (1994, p. 22), podem se destacar cinco funções da ancoragem, ou do sistema periférico, no funcionamento e na dinâmica das representações: • A concretização do núcleo central em termos ancorados na realidade,

ime-diatamente compreensíveis e transmissíveis.

• A regulação, que consiste na adaptação da representação às transformações do contexto, integrando novos elementos ou modificando outros em função de situações concretas com as quais o grupo é confrontado.

• A prescrição de comportamentos: os elementos do sistema periférico cionam como esquemas organizados pelo núcleo central, garantindo o fun-cionamento instantâneo da representação com grade de leitura de uma dada situação e, consequentemente, orientando tomada de posições.

• A proteção do núcleo central: o sistema periférico é um elemento essencial nos mecanismos de defesa que visam a proteger a significação central da re-presentação, absorvendo as informações novas suscetíveis de pôr em questão o núcleo central.

• As modulações individualizadas: é o sistema periférico que permite a elabo-ração de representações relacionadas à história e às experiências pessoais do sujeito.

Buscou-se nesse tópico destacar algumas das principais vertentes do conceito de re-presentação, de modo que o mesmo associado ao conceito ora trabalhado de imagem serão mesclados ao que se deseja expor a seguir sobre o sistema de crenças dentro dos quadros do imaginário e da representação.

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SISTEMA DE CRENÇAS, REPRESENTAÇÕES E O IMAGINÁRIO

As representações do imaginário social conforme se buscou discutir, são inúmeras e variáveis. A noção de saúde, doença, sucesso, bem-estar, são apenas algumas das representações que ocupam o imaginário dos indivíduos. “O imaginário, aqui, é entendido como parte da representação, como tradução mental de uma realidade exterior percebida, que ultrapassa o processo mental e vai além da representação intelectual ou cognitiva” (LAPLANTINE; TRINDADE, 1997, p. 25).

Nesse sentido, aquele que se submete a um tratamento ou submete a outrem, o faz por crer que o problema será resolvido no menor tempo possível, evitando transtornos e sofrimento. Assim, ritos, mitos e símbolos podem ser a media-ção entre a alteridade de um mundo frequentemente misterioso e o mundo da intersubjetividade humana.

Esse conjunto de representações é dito como mediações sociais, ou seja, representa-ções associadas que provavelmente não existiriam caso as pessoas vivessem isoladas. Mesmo pertencendo ou sendo uma característica de todos, supera e transcende cada um.

Assim, pela crença, os indivíduos, estão inseridos no contexto das representações e do imaginário como uma maneira de modificar a realidade de modo a transformá-la rapidamente em algo melhor.

A crença, como qualquer outra representação que altera a realidade, também tem o po-der de criar uma nova realidade, um novo imaginário diante de uma situação. Nesse contexto, conforme Bourdieu (1975), o fenômeno religioso da crença é sem

dúvida um contexto de bens simbólicos, em que os “procurantes” são indi-víduos que entendem a religião como uma segunda via, uma possibilidade. A religião passa a ser percebida como utilitária servindo como instrumento que ameniza os problemas da vida cotidiana (MONTEIRO, 1985). Desse mes-mo mes-modo, Weber (1966) entende que um mundo racionalizado é facilmente superado por certo controle de incertezas frente a uma realidade igualmente dinâmica e mutável.

Tanto a doença quanto a perspectiva de cura estão inseridas no contexto do imaginário social como formas de representação do ser humano no mundo. Ao crer que uma doença será curada, um emprego será conquistado, ou seja, em qual si-tuação for, a crença será sempre o escape, a saída do mundo real, a forma de representar uma possibilidade ainda não possível, ainda não racional de cura e libertação do mal, seja ele qual for.

Portanto, a imagem daquele que crê em algo, não é uma imagem que represente o massificado, o racionalizado, o tecnicizado, ao contrário, está inserido no rol das representações cotidianas, da gripe, na dor de estômago, no enjoo, na

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cólica, na anemia e em inúmeras outras formas de padecimento simples ou complexo.

Tal prática pode muito bem estar contextualizada no fato de que o indivíduo mesmo representando o real, por meio de seu poder de racionalizar o real, também associa a esta medida, a representação simbólica, emocional, animal e natural. Para Quintana (1999), a crença promove um acesso direto do plano profano ao plano

sagrado, ou seja, da condição humana à condição divina, regido por um agente que representa tal capacidade de recorrer à divindade para expor os problemas dos enfermos e conseguir êxito, sendo reconhecido por todos que participam de uma crença em comum.

Assim como são inúmeros os problemas e suas representações no cotidiano dos sujeitos, também o são, as representações do imaginário de tais problemas. Não se quer aqui entender que doença física não seja doença, mas que também possa ser entendida como representação, ao contrário, as doenças e os problemas humanos existem e estão presentes em nosso cotidiano, de modo que a questão é como são vistos por nós e como são vistos pelas pessoas que procuramos para nos ajudar a resolvê-los. Nesse contexto, Oliveira (1983, p. 04) busca situar os seguintes elementos do

imaginá-rio cotidiano:

a) saúde, b) manipulação do sistema (subemprego, não pagamento de dívidas de salá-rios e dívidas, questões com a polícia, encontro com autoridades burocráticas, etc. e c) aflições decorrentes de relações interpessoais: problemas afetivos, so-frimentos pessoais, perda de um ente querido ou de um ente desgarrado da fa-mília, conflitos familiares, relacionamento com parentes, vizinhos ou amigos’. Não é, contudo o indivíduo que cria tais representações, o que ele cria são outras, as de

possibilidade de fuga de tais imaginários. Nesse contexto, vale a pena ainda mencionar que existe uma estrutura simbólica muito bem estabelecida entre os indivíduos socialmente inseridos, sendo esta composta de doença ou mal, seguida de uma queixa, uma dor, um desconforto, um medo. Depois, o “pro-curante” busca saber quem seria a pessoa indicada para ajudá-lo em relação aquele mal. A procura por alguém que resolva-lhe o problema, também é um elemento simbólico, pois significa desalojar-se do conforto. Conforme expres-sa Malinowski (1986, p. 166):

Afirmo que existe um tipo especial de histórias, tidas como sagradas, incorporadas ao ritual, à moral e à organização social e que formam uma parte integrante e ati-va da cultura primitiati-va. Essas histórias não existem apenas em função do ócio, nem como simples narrativas, fictícias ou verdadeiras; para os nativos elas constituem a afirmação de uma realidade primeira, maior e mais relevante, que determina a vida presente, os destinos e as atividades da humanidade, e cujo conhecimento fornece ao homem, motivos para ações morais e rituais, tanto quanto indicações para desempenhá-las.

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O fenômeno da crença ocupa, portanto, um espaço simbólico ainda expressivo no co-tidiano e embora não se pretenda aqui analisar tal plausibilidade, entende-se que tal fato representa uma forma de entender tal fenômeno, ou seja, entender esta possível busca de retorno às raízes naturais do homem, de seu contato com a natureza, com o natural, de experimentar o cotidiano e gozar de saúde, e estar em harmonia consigo e com todo seu imaginário.

Segundo Levi-Strauss (1967), se a crença é uma representação que dá significado à existência do indivíduo, também o são as feridas ou problemas do que procura tal prática achando-se em estado de perturbação na ordem natural de compre-ensão da vivência do indivíduo.

Por fim, pode-se inferir do exposto que as realidades simbólicas existem, elas estão em constante processo de representação e atuam na construção de nosso imagi-nário. Sua eficácia depende de todo esse conjunto que funciona não em uma lógica racional hermética, pronta e completamente situada e entendida como tal, mas como fenômeno inserido simbolicamente em nosso cotidiano que ca-rece de investigação, de compreensão, de entendimento.

SYSTEM OF BELIEFS AS IMAGINARY IN WUNENBURGER

Abstract: the present text aims analyze the question of belief system from concepts of ima-gery and representation. Your reference with the imaginary and representation is within the approach of Wunenburger, a French philosopher, specialist in studies on the representative imaginary. His work seeks an approximation with structura-list anthropology to analyze symbols and myths in their relations with rationalism in the world contemporary. Part of problem is that belief is a product of human imagination. The basic premise is think that the imaginary would indeed be the source of symbolic constructs of belief. It’s an analysis of one work of that author skewed by other quotes and points of view. It is hoped by this study to broaden the debate around the question of human beliefs and how they are built socially. Keywords: Religion. Imaginary. System of Belief.

Notas

1 A ideologia, contudo, guarda sempre um viés bastante racional. Não há quase lugar para o não-racional no olhar ideológico. No fundo do ideológico há sempre uma interpretação, uma explicação, uma elucidação, uma tentativa de argumentação capaz de explicitar. Há algo, racional, que derivará da aplicação da noção de ideologia (MAFFESOLI, 2011, s.p). 2 Simbolismo é um movimento literário da poesia e das outras artes que surgiu na França,

no final do século XIX, como oposição ao Realismo, ao Naturalismo e ao Positivismo da época. Movido pelos ideais românticos, estendendo suas raízes à literatura, aos palcos teatrais, às artes plásticas.

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3 Semântica seria o estudo do significado. Incide sobre a relação entre significantes, tais como palavras, frases, sinais e símbolos, e o que eles representam, a sua denotação. A semântica linguística estuda o significado usado por seres humanos para se expressar através da lin-guagem. Outras formas de semântica incluem a semântica nas linguagens de programação, lógica formal, e semiótica

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