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Concepções prévias e obstáculos epistemológicos no ensino de atomística: uma abordagem a partir do método educacional psicodramático

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53 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 doi.org/10.26843/rencima eISSN: 2179-426X

CONCEPÇÕES PRÉVIAS E OBSTÁCULOS EPISTEMOLÓGICOS NO

ENSINO DE ATOMÍSTICA: UMA ABORDAGEM A PARTIR DO MÉTODO

EDUCACIONAL PSICODRAMÁTICO

MISCONCEPTIONS AND EPISTEMOLOGICAL OBSTACLES IN ATOMISTICS TEACHING: A PSYCHODRAMATIC EDUCATIONAL METHOD APPROACH

Matheus Ziantoni Páscui

Universidade Federal do ABC, matheus.pascui@aluno.ufabc.edu.br http://orcid.org/0000-0002-8437-7176

Maisa Helena Altarugio

Universidade Federal do ABC, Centro de Ciências Naturais e Humanas, maisahaufabc@gmail.com

http://orcid.org/0000-0002-8437-7176

Resumo

Dada a importância das concepções prévias dos alunos e a presença de obstáculos epistemológicos que dificultam a compreensão dos modelos atômicos, este trabalho relata uma experiência com o objetivo de levantar e analisar as concepções de alunos do 8º ano do Ensino Fundamental sobre o conceito de átomo e suas propriedades. A metodologia utilizada na construção, aplicação do instrumento e análise das concepções foi o Método Educacional Psicodramático (MEP), que se preocupa em trazer o aluno para uma posição mais ativa, mais espontânea e criativa frente à aprendizagem. Recursos auxiliares tais como desenhos, discussões coletivas e experimentos simples ajudaram a compor os dados. Embora os resultados não revelem novidades quanto às concepções dos alunos e aos obstáculos epistemológicos neles presentes, existe muita coerência entre os modelos propostos e as explicações para os fenômenos observados, demonstrando a presença de um raciocínio lógico consistente, mesmo quando estão afastados dos conhecimentos cientificamente aceitos. As conclusões reforçam a atenção para os obstáculos epistemológicos, no sentido de auxiliar os alunos a transformar visões errôneas e distorcidas. O papel do professor é fundamental para reconhecer os obstáculos que os alunos trazem de suas vivências cotidianas e os que são construídos na própria sala de aula.

Palavras-chave: concepções prévias, atomística, obstáculos epistemológicos, método educacional psicodramático

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54 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 Abstract

Given the importance of students’ misconceptions and the presence of epistemological obstacles which hinder the understanding of atomic models, this study shows an experience with the objective to analyze the conceptions of students from the 8th grade in

Elementary School about atoms and their properties. The methodology used in the tool construction and application and in the conceptions analysis was the Psychodramatic Educational Method (PEM), which encourages a more active, more spontaneous and more creative role for the student regarding the learning process. Additional resources such as drawings, group discussions and simple experiments help to compose the data. Although the results do not reveal new issues about the students’ conceptions and about their epistemological obstacles, there is a lot of coherence between the proposed models and the explanations for the observed phenomena, demonstrating the presence of a consistent logical reasoning, even when they depart from the accepted scientific knowledge. The conclusions reinforce the importance of paying attention to the epistemological obstacles, in terms of helping the students to transform erratic and distorted visions. The teacher’s role is essential to recognize the obstacles that the students bring from their everyday experiences and the ones that are built in the classroom itself.

Keywords: misconceptions, atomistics, epistemological obstacles, psychodramatic educational method

Introdução

Devemos considerar que nenhum aluno adentra as portas da escola sem conhecimento, já que possui vivências anteriores ao período escolar e que não há em sua mente um vazio específico que somente a escola preencherá. Dado este fato, considera-se verdadeira a premissa de que o aluno possui conteúdos mentais que não são necessariamente alheios ao conteúdo escolar. A este conteúdo mental prévio ao ensino (formal) é dado o nome de concepção espontânea ou prévia.

De acordo com Arruda e Villani (1994, p.88), concepções prévias são “idéias intuitivas relativamente estáveis, parcialmente consistentes, úteis para a interpretação dos fenômenos cotidianos e que constituem o ‘conhecimento do senso comum’”. Ou seja, uma das principais características das concepções prévias, segundo Viennot, é a sua resistência a mudanças, sua tendência de ser fixa, e isso pode ser interpretado como uma das principais causas das dificuldades de aprendizado do conhecimento científico (1979,

apud ARRUDA; VILLANI, 1994).

Posner et al (1982) defenderam em suas pesquisas que o aprendizado na ciência consistia em substituir uma concepção prévia por um conceito e elaboraram uma teoria para explicar as condições que deveriam ser preenchidas para que isso ocorresse: haver

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55 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 uma insatisfação por parte do aluno com sua atual concepção/definição, exigindo assim uma nova; haver uma concepção/definição nova que seja inteligível ao aluno; e que ela pareça plausível e enfim, fértil no quesito de possibilitar novas abordagens ao conteúdo.

No entanto, o conhecimento sobre as concepções prévias dos alunos, embora tenha produzido muitas pesquisas na área das ciências, e comprovado sua importância para o ensino e a aprendizagem de conceitos científicos, ainda é bastante negligenciado na sala de aula pelos professores. Além das concepções prévias trazidas pelos alunos, ainda é fato que no próprio processo de aprendizagem os estudantes produzem concepções que não coincidem com os conceitos científicos, que ocorre, por exemplo, por conta de um ensino com ideias positivistas, aliadas a visões rígidas, dogmáticas e infalíveis de ciência (CACHAPUZ et al, 2009) transmitidas em sala de aula, ou ainda pelo uso de analogias, metáforas, imagens, modelos presentes nos materiais didáticos e amplamente utilizadas por docentes sem a devida reflexão (GOMES; OLIVEIRA, 2007).

As noções que os alunos adquirem em suas experiências cotidianas e/ou escolares podem, eventualmente, de acordo com Bachelard (1996), se constituírem em obstáculos epistemológicos, que seriam obstáculos do pensamento ao próprio pensamento. Em outras palavras, seriam “os entraves inerentes ao próprio conhecimento científico, que bloqueiam seu desenvolvimento e construção” (LOPES,1992).

No caso do ensino de atomística, que trata da construção e evolução dos modelos atômicos, os alunos são envoltos por várias dificuldades, entre elas a de compreender a ideia e a necessidade de se construir modelos e também de imaginá-los (CHASSOT, 1996). O uso de modelos atômicos tem importância fundamental, particularmente no estudo da química, quando por meio deles se explica, por exemplo, a ligação entre os átomos na formação de compostos, as propriedades das substâncias e o seu comportamento diante de outras substâncias ou mediante determinadas condições do meio a que são expostas.

Por esses motivos, o papel e as habilidades dos professores em identificar e transformar os significados cotidianos trazidos e/ou construídos pelos alunos, merece atenção especial dos cursos de formação de professores, desde a compreensão da importância da educação científica na sociedade social até o trabalho com a didática das ciências e das metodologias de ensino que podem contribuir com essa formação.

Nesse sentido, considerando a importância trazida pelo conhecimento das concepções prévias dos alunos, a presença de obstáculos epistemológicos que podem dificultar a compreensão e o uso dos modelos atômicos, este trabalho relata uma experiência que teve como objetivo levantar concepções de um grupo de alunos do 8º ano do Ensino Fundamental, de uma escola privada de São Paulo, sobre o conceito de átomo e suas propriedades. A metodologia utilizada desde a construção do instrumento, até o levantamento e a análise das concepções foi o Método Educacional Psicodramático (MEP), pensado justamente porque se preocupa em trazer o aluno para uma posição

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56 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 mais ativa, ao mesmo tempo, mais espontânea e criativa na sua aprendizagem, e que será explicado mais detalhadamente a seguir.

As concepções prévias, o ensino e a aprendizagem da atomística

Conforme pode ser observado nos documentos da BNCC - Base Nacional Comum Curricular das Ciências da Natureza no Ensino Fundamental – Séries Finais – 9º ano (BRASIL, 2017), a unidade temática Matéria e Energia traz como habilidades a serem trabalhadas, as transformações químicas no nível submicroscópico, envolvendo explicar os fenômenos com base em modelos atômicos. Até então, as séries anteriores davam ênfase ao mundo fenomenológico, ou seja, exploravam a dimensão macroscópica do mundo da matéria e da energia e os efeitos observáveis de suas aplicações.

No entanto, sabemos que os alunos, muito antes de chegarem ao 9º ano, trazem concepções prévias a respeito do mundo invisível das partículas atômicas. Essas ideias, se não detectadas ou ignoradas pelos professores podem gerar muita confusão e dificultar ainda mais o aprendizado dos conceitos científicos. Isso porque, em primeiro lugar, dada a impossibilidade de ser vista e de ser muito distante da realidade do aluno, a ideia de átomo exige elevada capacidade de abstração (FRANÇA; MARCONDES; CARMO, 2009). Outra questão está ligada à dificuldade dos professores em lidar com essa abstração, tanto em termos da linguagem, quanto do uso dos modelos e da relação entre os níveis macro e submicroscópico nas aulas de Química (SANTOS, 2011; SANTOS; LIMA; SARMENTO, 2017).

Mesmo considerando que a aprendizagem do tema seja importante para subsidiar a compreensão das propriedades e transformações das substâncias, além de um grande número de fenômenos biológicos e físicos que envolvem as mudanças no rearranjo de átomos e moléculas, a maioria dos alunos do ensino médio tem grandes dificuldades em representar a estrutura de um átomo (FRANÇA; MARCONDES; CARMO, 2009).

Por isso, reforçamos o papel e a responsabilidade do professor no levantamento das concepções prévias sobre os conteúdos que os alunos trazem para a sala de aula, no sentido de que desenvolver certas habilidades como saber fazer pequenas e precisas

questões, saber ouvir, saber considerar o erro no processo de aprendizagem, saber aceitar as ideias dos alunos (CARVALHO; CACHAPUZ; GIL-PÉREZ, 2012), podem fazer

grande diferença nos resultados da aprendizagem dos alunos.

Obstáculos epistemológicos

O conceito de Obstáculo Epistemológico foi criado pelo epistemólogo francês Gaston Bachelard. Segundo a visão de Bachelard (1996), durante seu aprendizado científico, o homem tem de desconstruir conceitos antigos e inúteis para construir conceitos novos e úteis (segundo a ciência de cada época). Nesse sentido, surgem os obstáculos epistemológicos, os quais devem ser suplantados durante o processo de ensino-aprendizagem. No entanto, os obstáculos nunca são suplantados por completo, já

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57 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 que o ser humano nunca para de aprender, ou seja, há sempre obstáculos a serem vencidos (LOPES, 1992).

Lopes (1992, p. 255) explica o conceito de obstáculos epistemológicos como “os entraves inerentes ao próprio conhecimento científico, que bloqueiam seu desenvolvimento e construção”. A autora também aborda a questão de Bachelard quanto ao obstáculo pedagógico, o obstáculo onde o professor não compreende porque o aluno não aprende (compreende determinado conteúdo). Essa noção de obstáculo pedagógico fortifica ainda mais a importância do conhecimento das concepções prévias (ou espontâneas) pois, de posse deste conhecimento, o professor poderia inferir se o motivo da falta de compreensão do conteúdo não é devido ao entrave de um obstáculo epistemológico no aluno.

De acordo com a categorização de Bachelard (1996), os obstáculos epistemológicos se revelam como sendo de natureza animista, realista, verbal e

substancialista. Resumidamente, começando pelos obstáculos animistas, estes

aparecem quando se tenta explicar os fenômenos observados atribuindo-se sentimentos/sensações ou outras características de seres vivos a objetos. No caso da atomística, um exemplo seria modelos de átomos, representados por alunos, assumindo características de células (VASCONCELLOS; RODRIGUES; GOMES, 2016), incluindo a presença de núcleo e membrana (GOMES; OLIVEIRA, 2007). Ou ainda, representações de átomos demonstrando sentimentos afetuosos em relação a outro tentando explicar o fenômeno da afinidade química, muito frequente em livros didáticos das décadas de 1930 a 1990 (LOPES, 1992; LEITE; SILVEIRA; DIAS, 2006; MELZER et al, 2009; STADLER et

al, 2012).

O obstáculo realista é demonstrado quando se percebem generalizações calcadas em impressões táteis, visuais e macroscópicas, sem nenhum aprofundamento que exija do aprendiz um certo nível de abstração. Exemplos comuns relativos ao tema da atomística seriam as analogias amplamente divulgadas entre modelos atômicos e o sistema solar, onde o sol ocuparia o lugar do núcleo do átomo e os planetas ao seu redor, girando como os elétrons na eletrosfera (LOPES, 1992), ou ainda homens observando átomos e moléculas entre os dedos como uma forma de desvendar seus mistérios (LEITE; SILVEIRA; DIAS, 2006). Outra característica forte do realista seria a tomada das propriedades do todo aplicada às partes, sem que se leve em conta que essas propriedades são resultantes da interação entre as partículas, onde, por exemplo, dois ou três átomos de alumínio, ou mesmo um átomo, tem as mesmas propriedades (cor, dureza) que uma barra de alumínio (LOPES, 1992).

Quanto ao obstáculo verbal, Bachelard (1996) alerta que o uso de termos e palavras do senso comum dentro do contexto científico, na intenção de facilitar a compreensão, pode afastar o aprendiz do conceito científico. Se referindo ao experimento de Rutherford, um dado autor de livro didático de química de 2005, utiliza o termo “metralhadora” como instrumento que lança partículas radioativas (MELZER et al, 2009). Termos como “nobreza” e “espontaneidade” quando usados como sinônimos de baixa

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58 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 reatividade dos átomos e ocorrência natural das reações químicas, se não devidamente explicados, podem levar a noções incorretas (LOPES, 1993).

Finalmente, o obstáculo substancialista emprega a ideia de que as propriedades de uma substância podem ser reveladas a partir da investigação do seu interior. Se o ouro é amarelo é porque os átomos de ouro também o são. Se uma determinada substância é ácida, é porque essa propriedade estaria atrelada à partícula encontrada no interior de suas moléculas, no caso, o íon hidrônio, o que não é verdade, como aponta Lopes (1993): outras substâncias podem apresentar características ácidas sem a presença desse íon, mas como fruto de interações. De forma semelhante, quando uma substância se funde, significa que uma molécula sólida se torna líquida (MORTIMER, 1995).

Método Educacional Psicodramático (MEP) como metodologia ativa

De maneira geral, nas salas de aulas de Ciências, ainda há o predomínio da transmissão direta dos conteúdos feita pelo professor, consistindo em sua grande maioria em aulas expositivas e considerando o aluno como tábula rasa e sem conhecimento ou concepções sobre os temas abordados. O uso do livro didático, recurso exclusivo em certos casos, mantém uma distância grande entre o conteúdo aprendido e a vivência extraclasse do aluno, dificultando assim a compreensão total, aplicação e a interiorização dos conhecimentos.

Em tais práticas, conhecidas como ensino tradicional, os papéis do professor e do aluno são bem definidos: o primeiro é o detentor das informações e do conhecimento, a pessoa ativa no processo; o segundo acompanha o raciocínio do professor, suas explicações e permanece passivo (CARVALHO, 2012). Dessa forma, segundo a mesma autora, fica difícil fazer com que os alunos participem da aula, exponham suas ideias, já que eles esperam as respostas dos professores.

Quando se trata de metodologias ativas no ensino, o professor atua como facilitador ou orientador para que o estudante se engaje no processo de aprender, de pesquisar, de refletir e fazer escolhas com autonomia na resolução de problemas (BERBEL, 2011). Freire (2011) foi um defensor das metodologias ativas, com sua afirmação de que na educação de adultos, o que impulsiona a aprendizagem é a superação de desafios, a resolução de problemas e a construção do conhecimento novo a partir de conhecimentos e experiências prévias dos indivíduos.

Jacob Levy Moreno, médico psiquiatra, criou o Psicodrama (MARINEAU, 1989) a partir de experiências envolvendo o teatro e as emoções humanas. Embora com finalidade psicoterapêutica, nesta metodologia, os participantes vivenciavam situações já vividas por eles anteriormente em um período de suas vidas, criando oportunidades para desenvolverem melhor as relações que foram quebradas em determinado momento.

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59 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 O conceito central do Psicodrama é a espontaneidade, que pode ser definida como a capacidade de responder adequadamente e criativamente às situações vividas, novas ou velhas. A noção de conserva cultural, outro conceito importante para Moreno (2013), pode ser um obstáculo para a manifestação da espontaneidade e da criatividade se cristalizar, no tempo, comportamentos, usos e costumes. O Psicodrama auxilia, então, a liberar o potencial criativo e espontâneo dos indivíduos, melhorando suas relações interpessoais e do próprio indivíduo consigo mesmo.

Inspirada em Moreno e em outros filósofos, sociólogos e educadores, como Freire e Vygotsky, Romaña (1985) criou o Método Educacional Psicodramático - MEP, que é um método ativo e versátil de aprendizado. O MEP, como método ativo, está assentado em alguns pressupostos, nos quais ressalta a importância das situações vividas pelos alunos, a construção coletiva do conhecimento, o engajamento dos alunos na sua aprendizagem com a preocupação central de desenvolver uma consciência crítica e reflexiva em seus atores para obter uma compreensão do mundo e suas contingências com autonomia e compromisso (ROMAÑA, 2004).

No campo da formação de professores, bem recentemente, o MEP tem obtido resultados interessantes no que diz respeito à coleta e discussão das concepções prévias de futuros professores sobre os saberes e os conflitos ligados à prática docente (ALTARUGIO; CAPECCHI, 2016; ALTARUGIO, 2017, 2018a; ALTARUGIO; LOCATELLI, 2018) e também como exercício de ensino e aprendizagem de conceitos científicos (ALTARUGIO, 2018b; MÁXIMO et al, 2019), sempre gerando reflexões e ampliação dos saberes por meio da interação dialógica com o conhecimento.

O MEP, de acordo com Romaña (1985) possui três passos ou etapas, sendo que em cada um deles ocorre uma aproximação do conteúdo a ser aprendido (Intuitiva ou

Afetiva, Racional ou Conceitual e Funcional); uma vivência no plano dramático (Real, Simbólico e Fantasia); e um trabalho em um nível de operação do pensamento (Análise, Síntese e Generalização), conforme explicado resumidamente a seguir:

O 1º passo: aproximação Intuitiva ou Afetiva, é onde ocorre a aproximação do aluno com o conhecimento (do conteúdo a ser aprendido, por exemplo) a partir da dramatização de uma situação Real. Nesse momento, os estudantes fazem uma Análise do assunto que está sendo abordado.

O 2º passo: aproximação Racional ou Conceitual, corresponde à fase onde o aluno sai da realidade e vai para a abstração do conhecimento. Realiza o esforço da Síntese, revelando nela toda a sua riqueza conceitual. O momento Simbólico é marcado pela apreensão do essencial sobre o assunto.

No 3º passo: aproximação Funcional, ocorre a prova do conhecimento aprendido, tornando-o funcional para os alunos. É nesta parte onde eles buscam Generalizações, mesmo que Fantasiosas, e onde constroem associações a partir do conhecimento que foi adquirido.

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60 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 Como uma metodologia ativa de aprendizado e muito versátil, cabe ao professor saber liderar as dramatizações adequando-se às necessidades do momento, mas mantendo seus princípios, para que seja uma ferramenta útil no processo de ensino-aprendizagem.

Metodologia

O presente trabalho utilizou-se do MEP para construir um instrumento que revelasse ao professor concepções prévias e possíveis obstáculos epistemológicos presentes no pensamento dos alunos sobre o tema atomística. Os sujeitos da pesquisa foram 24 estudantes do 8º Ano do Ensino Fundamental II de uma escola da rede privada de São Paulo. É importante destacar que a escolha dos alunos do 8º ano justifica-se por ainda não terem sido formalmente apresentados ao conteúdo abordado na aula em questão, pois nos interessava que as concepções trazidas por eles pudessem ser consideradas espontâneas.

A seguir serão descritos os três passos do método psicodramático, cada um devidamente adaptado para tratar do tema em questão.

1º Passo (Aproximação Intuitiva ou Afetiva ao conteúdo)

Nesta primeira etapa, segundo o método psicodramático, os estudantes foram convidados a se aproximarem do conteúdo tratado, no caso, a noção de átomo. Para realizar este passo, foi solicitado aos alunos, individualmente, que pensassem em uma ideia de átomo. Vale destacar que no levantamento de concepções prévias não há ênfase em conceitos certos ou errados, mas sim em conceitos espontâneos. A seguir, os alunos expressaram suas ideias na forma de desenho (que também pode ser entendida como uma forma de dramatização) em uma folha de papel, com o máximo de detalhes que conseguiram, fornecendo também uma explicação por escrito, uma espécie de legenda, contendo as características visuais dos átomos. A seguir, os alunos formaram seis grupos (quartetos) e socializaram seus desenhos. Reunidos, os alunos discutiram e escolheram apenas uma das figuras por grupo, aquela que, para eles, melhor representava a ideia de átomo.

2º Passo (Aproximação Racional ou Conceitual)

Neste momento, os alunos foram orientados a atribuírem “poderes” aos seus átomos, estimulando a abstração e imaginação. A explicação para a utilização do termo “poderes”, ao invés de propriedades atomísticas, teve o objetivo de não dificultar conceitualmente a tarefa. A intenção, de fato, era que eles fossem capazes de listar as propriedades físicas e/ou químicas do átomo. Algumas perguntas facilitadoras: “Quais são os ‘poderes’ do seu átomo?” “O que ele consegue e o que ele não consegue fazer?” “Como é o átomo de vocês?”

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61 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 Para auxiliar neste passo, lançou-se mão de alguns experimentos simples. Porém, antes de começar a 3ª etapa, deixou-se bem claro para os alunos que eles deveriam assumir que os materiais utilizados nos experimentos (elástico e ar) eram todos formados pelos átomos que cada grupo imaginou. A proposta dada para os alunos foi que explicassem os fenômenos observados utilizando seus respectivos átomos e “poderes”, tentando inferir o que acontece em nível atômico/molecular em cada caso. Os dois experimentos consistiram em: 1) compressão de ar em uma seringa e 2) estiramento de um elástico.

As explicações possíveis dadas pelos alunos foram registradas nas folhas de papel contendo os desenhos. Foram consideradas para análise as seis folhas produzidas pelos alunos, considerando os desenhos, os conceitos/definições e os “poderes” atribuídos ao átomo e as explicações para os experimentos. Para sustentar as análises, baseou-se nos referenciais teóricos do MEP, nos obstáculos epistemológicos (LOPES, 1992, 1993) e outras referências que citamos anteriormente pertinentes ao ensino de ciências.

Resultados e discussão

As análises serão apresentadas seguindo os três passos do instrumento, sendo os desenhos e os conceitos/definições, no primeiro passo; os “poderes” ou propriedades, na segunda etapa; as explicações dos fenômenos dos experimentos, na terceira etapa.

1º Passo (Aproximação Intuitiva ou Afetiva ao conteúdo)

Neste primeiro passo, os alunos trazem suas concepções com base em realidades distintas, ou seja, vivências e experiências individuais que podem ser muito variadas. No caso de modelos atômicos, é muito provável que os alunos tenham tido contato com imagens provenientes de livros, desenhos animados, filmes enfim, das mídias em geral. Esse conhecimento prévio, advindo do seu contato com o mundo real, segundo o MEP, revela o saber dos alunos sobre a sua situação atual, independentemente se ele está de acordo com os conceitos cientificamente aceitos.

No quadro 1, encontram-se os seis desenhos do átomo e a transcrição de suas respectivas definições/conceitos:

Quadro 1 – Modelos atômicos e definições

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62 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 Eu acho que um átomo é

assim por causa de uma série chamada Big Bang

Theory, pois na transição

aparece um átomo

Átomo é uma partícula que quando se une com outros átomos formam a massa

Eu acho que o átomo tem esse formato só que menor

Grupo 4 Grupo 5 Grupo 6

O átomo pode ser algo gosmento com várias partículas de células separadas entre si

Eu imaginei um círculo com a forma pontuda. E também acho que átomo é um conjunto de partículas

Átomos são pequenas moléculas de ar. Há variadas espécies de esferas ovais a bactérias minúsculas

Fonte: Dados da pesquisa

Analisando as representações dos modelos atômicos, percebe-se que os Grupos 1 e 2 se aproximam bastante do modelo proposto por Rutherford. Embora em suas definições não constem a distinção entre as partículas subatômicas (prótons, nêutrons e elétrons), temos algumas partículas girando em órbitas em torno de um núcleo (no caso do Grupo 1, mas ausente no Grupo 2). Na definição do Grupo 1, fica clara a influência da mídia televisiva sobre as concepções do alunos. Em relação a esse aspecto, concordamos com Trivelato e Silva (2011), que indicam a utilização das mídias (jornais, televisão, cinema) como materiais potentes que os professores podem lançar mão para introduzir e discutir assuntos científicos. Inclusive vários autores (OLIVEIRA, 2006; KOSMINSKY; GIORDAN, 2002; GÁLVEZ DÍAZ; WALDEGG, 2004; SILVA; ALTARUGIO, 2009), já chamaram a atenção para a necessidade de se explorar nas escolas as visões de ciência que são veiculadas nas mídias pois, muitas vezes, transmitem noções estereotipadas, irreais (e surreais) dos profissionais e do trabalho científico.

Para os dois primeiros casos, julgamos aceitáveis, do ponto de vista científico, as representações trazidas pelos alunos, considerando o nível de aprendizagem de 8º ano. Apesar da alusão representativa ao modelo de Rutherford, o Grupo 2 define átomo como sendo “uma partícula”, ou seja, desconsiderando as partículas subatômicas que o compõem. Nesse sentido, a definição fica mais condizente com o modelo de Dalton (esfera maciça e indivisível). Mas a representação explícita do modelo de Dalton foi apresentada pelo Grupo 3, só que compondo um arranjo molecular.

O modelo representado pelo Grupo 5 traz alguma semelhança com o modelo de Dalton, a não ser pela “forma pontuda” em sua superfície. Embora sua definição traga uma informação importante e aceitável de “que átomo é um conjunto de partículas”

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63 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 (entendendo que partículas seriam as partículas subatômicas), ela não condiz com o modelo representado. O fato interessante - e não raro, pois já foi relatado em outros estudos - é a aparência do modelo atômico se assemelhar a algum tipo de célula (VASCONCELLOS; RODRIGUES; GOMES, 2016; SANTANA; SARMENTO; WARTHA, 2011; SANTOS, 2011, GOMES; OLIVEIRA, 2007), o que é mais evidente ainda não apenas nos desenhos dos modelos, mas nas definições dos Grupos 4 e 6. Mais uma vez, estamos diante da evidência da confusão entre as unidades básicas de seres inanimados e de seres vivos, o que para Santana, Sarmento e Wartha (2011), pode-se configurar como obstáculo epistemológico para a compreensão de temas relacionados à estrutura da matéria e à estrutura dos seres vivos.

Chama-nos a atenção de que a noção de partícula, utilizada pelos Grupos 2 e 5, não é aplicada com muita clareza quando atrelada à definição de átomo, pois ora “átomo é uma partícula”, ora “átomo é um conjunto de partículas”, sendo ambas corretas. Porém, os respectivos desenhos atestam essa confusão. Analisando essa situação, concluímos que a noção de partícula não é simples para os alunos, visto que ela pode, de fato, assumir diferentes significados dependendo do contexto onde ela se aplica, o que pode gerar um obstáculo epistemológico - no caso, verbal - a sua aprendizagem. Nesse sentido, amplia-se a importância de se estar atento ao uso da linguagem científica de forma precisa e adequada que, mesmo sendo difícil para o aluno, por ter características diferentes da linguagem comum, é determinante na aquisição do conhecimento (SANTOS; LIMA; SARMENTO, 2017).

2º Passo (Aproximação Racional ou Conceitual)

Nesse passo do MEP os alunos se esforçaram, em grupos, para sintetizar todo o conhecimento que estava ao seu alcance, de forma espontânea. Ao serem solicitados a listarem os “poderes” de seus átomos, os alunos foram induzidos e exigidos, dentro de um universo de possibilidades, a buscarem aquelas propriedades que consideraram as mais fundamentais, ou seja, foram em busca da essência.

Esses “poderes” ou propriedades simbolizam conceitos, lógicas de pensamento, que merecem posteriormente uma investigação e um aprofundamento maiores por parte do professor, para compreensão dos seus significados, algo que não foi feito nesta experiência porque fugia ao nosso objetivo. Temos abaixo o Quadro 2, que traz a transcrição da síntese dos pensamentos dos alunos a respeito dos “poderes” dos átomos.

Quadro 2 – “Poderes” dos átomos

Grupo “Poderes” (propriedades)

1 aumentar pessoas que são baixas; ficar transparente; aumentar QI para 300; possuir supervisão.

2 girar tão rápido a ponto de voar; super-resistente; é invisível; pode se multiplicar

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64 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 dentro das pessoas; pode flutuar; pode desaparecer; ficar invisível

4 variar de tamanho; não podem passar um pelo outro; possuem cor; pode ficar invisível; compor o universo; sofre mutações.

5 mudar de cor; juntar com outros para formar as coisas; voar; produzir energia.

6 Hábil, pois sobrevive em ambientes aquáticos podendo se adaptar a diversas temperaturas; compõe o ar; salva os humanos; minúsculos de forma invisível; há milhares; possuem diversas formas.

Fonte: Dados da pesquisa

Mesmo considerando a capacidade criativa e imaginativa dos alunos, poderíamos categorizar os poderes elencados pelos alunos a partir de vários critérios. Por exemplo, temos aqueles “poderes” que, em nossa interpretação, não guardam nenhuma relação com a realidade, tais como: aumentar as pessoas que são baixas; aumentar o QI para 300; possuir supervisão; voar; entrar na mente das pessoas; desaparecer.

Por outro lado, temos os “poderes” que, por mais que pareçam fantasiosos para os alunos, poderiam ser consideradas, com auxílio de uma análise teórica mais profunda, versões cientificamente corretas, tais como: passar por dentro das pessoas; produzir energia; é invisível; sofre mutações (!); salva os humanos; variar de tamanho; compor o universo. Nesses casos, alguns conceitos como radiação, fusão e fissão nuclear, transmutação, propriedades periódicas, e algumas explicações plausíveis acerca do Experimento de Rutherford, da aplicação da química nuclear na medicina, do funcionamento das usinas nucleares, por exemplo, servirão para dar respaldo científico às concepções dos alunos.

No entanto, o que nos preocupa são as propriedades que podem criar dificuldades à compreensão e aprendizagem dos conceitos por conta dos obstáculos epistemológicos (BACHELARD, 1996) que tais “poderes” encerram em si. É o caso, por exemplo, dos átomos possuírem ou mudarem de cor e de forma; serem super-resistentes, que corresponderiam ao obstáculo substancialista, ou seja, propriedades atribuídas ao átomo (microscópico) quando na verdade são das substâncias ou da matéria (macroscópicas). Outras propriedades, tais como: poder se multiplicar; sofrer mutações; sobreviver e se adaptar; voar; poderiam ser consideradas como obstáculos animistas, pois são características de seres vivos.

Uma entrevista ou uma roda de conversa com esses alunos poderia ser mais esclarecedora e enriquecedora a respeito da compreensão que eles teriam a respeito de cada um desses “poderes”, sem dúvida, um trabalho de aprofundamento que sugerimos por parte do professor. Nesse sentido, Gomes e Oliveira (2007) reforça a responsabilidade dos professores em questionar as concepções dos alunos, bem como em retificar as analogias e metáforas presentes nos materiais didáticos, a fim de auxiliá-los a avançar na construção dos conhecimentos científicos.

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65 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 Na etapa da aproximação funcional, os alunos tiveram a oportunidade de colocar à prova os conhecimentos levantados no passo anterior, ou seja, os conhecimentos agora são postos em ação. A tarefa de generalizar os conhecimentos consistiu em aplicá-los, neste caso, para explicar os fenômenos (experimentos) que lhes foram apresentados.

Segundo Romaña (1985), a metodologia psicodramática permite ao aprendiz utilizar o conhecimento como sua propriedade, não como se pertencesse ao livro ou ao professor, graças ao uso da espontaneidade e da criatividade. Este é um momento de altíssimo valor educativo, pois é quando se buscam as soluções próprias, livres de conservas.

Foram realizados os experimentos de compressão do ar em uma seringa e teste de estiramento de um elástico e pediu-se para os alunos explicarem os fenômenos com base nos “poderes” (propriedades) dos átomos. A seguir, no Quadro 3, transcrevemos as explicações dos alunos contidas nas folhas.

Quadro 3 – Explicações para os experimentos

Grupo Explicações

1 Sem esticar [o elástico] os átomos estão mais juntos quando estão parados, quando se esticam, vão se separando.

2 O elástico pode esticar, pois nosso átomo é super-resistente.

3 Concluí que os átomos se esticam quando estão no elástico, e diminuem quando estão na seringa.

4 Ele pode se esticar, se torcer; ele possui cor [elástico], amarelo. Alguns se esticam mais que outros. Apesar de ser flexível não é tão flexível quanto o ar, pois ele tem uma limitação maior que o ar. Quando tampamos a seringa há dificuldade de puxar o ar, pois aí encontramos a limitação do ar apesar de ele estar em todo o nosso planeta.

5 Quando você estica o elástico os átomos se separam deixando a cor mais clara e o elástico fica cada vez maior. Quando você prende a ponta da seringa e empurra o ar, os átomos se reprimem, deixando pesado. 6 O átomo pode ter diferentes formas e, cada forma tem uma habilidade e

uma cor diferente. Por exemplo: Há um átomo com o poder da elasticidade que conhecemos como “elástico”. As cores deles são de acordo com a forma. Têm a capacidade de se juntar, ficando cada vez maior.

Fonte: dados da pesquisa

Percebe-se que, de modo geral, cada grupo soube manter uma coerência – surpreendente - entre a explicação dos fenômenos e os “poderes” atribuídos aos átomos: “O elástico pode esticar, pois nosso átomo é super-resistente” (Grupo 2); “Ele pode se

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66 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 esticar, se torcer” (variar de tamanho – Grupo 4); “Quando você estica o elástico os átomos se separam deixando a cor mais clara” (mudar de cor – Grupo 5); “cada forma tem uma habilidade... Por exemplo: Há um átomo com o poder da elasticidade” (hábil; possuem diversas formas – Grupo 6).

Existe um raciocínio coerente também em relação aos obstáculos substancialistas que tanto se revelaram, primeiramente, como propriedade do átomo, e em seguida, puderam ser aplicados para explicar o comportamento da matéria pelos quais são formados. Afirmar que os átomos do elástico “se esticaram” parece, aos alunos, muito lógico, uma vez que eles podem “mudar de forma”, “variar de tamanho”, da mesma forma que o elástico fica com “a cor mais clara”, porque, afinal, eles podem mudar de cor (nesse caso, os alunos explicam que a cor amarela do elástico é resultado da cor do átomo que o forma). Na mesma linha de raciocínio, no caso do ar na seringa, os átomos “diminuem” ou “se reprimem” quando comprimidos.

Além da ideia do átomo poder “se esticar”, ou de “ser flexível”, de acordo com os Grupos 3 e 4, o mesmo fenômeno pode ser explicado com outra teoria, que leva em conta a distância entre as partículas: no caso do elástico, os átomos podem ficar “mais juntos” (sem esticar) ou “vão se separando” (quando esticado), segundo o Grupo 1.

Até aqui, as explicações dos alunos estão assentadas em ideias bastante sólidas e com coerência interna, isto é, para eles, suas teorias parecem satisfatórias, inteligíveis e plausíveis (POSNER et al, 1982), mesmo quando eles permanecem afastados dos conceitos científicos. Contudo, para que possam reconstruir suas concepções prévias na direção de conceitos científicos, será necessário que o professor aceite o desafio de confrontá-las com novas situações, de instaurar conflitos diante dos quais os alunos precisem testar novas teorias.

Na perspectiva do psicodrama, sendo o MEP uma metodologia ativa de aprendizagem, onde o sujeito é potencialmente capaz de protagonizar a construção do seu conhecimento, o professor dispõe de uma ferramenta muito vasta para auxiliar o aprendiz a encontrar respostas criativas para as situações novas. O esforço do educador, segundo Romaña (1985), deve buscar provocar o momento “fecundo” - expressão de Karl Stocker – qualificado como o momento em que

“percebemos (no aluno) a ruptura do equilíbrio em sua visão e compreensão do mundo que o rodeia, e o surgimento do interesse por recuperar esse equilíbrio, (...) depois de surpreender-se ou desconcertar-se, o aluno começa a perguntar.” (ROMAÑA, 1985, p.43).

Conclusões

As concepções dos alunos em relação à representação dos modelos atômicos e ao conceito de átomo, de um modo geral, não apresentaram propriamente novidades quando comparamos aos resultados já divulgados em outros estudos, principalmente quando se tratam das confusões entre os conceitos de átomo e molécula, as semelhanças entre o

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67 REnCiMa, v. 11, n.5, p. 53-70, 2020 átomo e a célula e os obstáculos epistemológicos presentes nas concepções. Entretanto, é a recorrência mesma dessas concepções que reforça ainda mais a necessidade de um olhar mais atento do professor para os obstáculos epistemológicos que, uma vez identificados e trabalhados, levem os alunos a transformar visões errôneas e distorcidas em noções mais próximas das cientificamente aceitas. Além disso, podem evitar que elas se prolonguem e dificultem a aprendizagem de novos conceitos.

Nesse sentido, o papel do professor é fundamental, não só em reconhecer os obstáculos que os alunos trazem de suas vivências cotidianas, mas em dar-se conta de que, muitas vezes, os obstáculos podem ser construídos na própria sala de aula e a partir do próprio professor, se este não se atentar à linguagem verbal que utiliza. O MEP dá vazão ao que o aluno conhece e permite ao professor verificar, no ato da dramatização, tudo o que foi incorporado pelo aluno, não importando o meio pelo qual esse conhecimento foi adquirido. Se foi adquirido em sala de aula, cabe ao professor colocar-se em situação de avaliação e assumir o compromisso do qual ele participa e é responsável.

Em nossa avaliação, o MEP foi capaz de levantar as concepções dos alunos de maneira espontânea, enquanto estimulava a criatividade e a imaginação dos estudantes, tanto na forma de expressar seus conhecimentos, quanto na maneira de dar respostas aos desafios intelectuais. É uma ferramenta que torna o aluno protagonista na sala de aula, inova o ensino das ciências, afastando o professor do modo livresco e conservado de abordar os conteúdos.

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