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A interação e coordenação da política fiscal e monetária no Brasil: uma análise da dominância fiscal e dos impactos sobre a inflação.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA – UFSC CENTRO SÓCIO ECONÔMICO

DEPARTAMENTO DE ECONOMIA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS

REBECA PASTORELLI CARVALHO

A INTERAÇÃO E COORDENAÇÃO DA POLÍTICA FISCAL E MONETÁRIA NO BRASIL: UMA ANÁLISE DA DOMINÂNCIA FISCAL E DOS IMPACTOS SOBRE A

INFLAÇÃO.

Florianópolis 2019

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Rebeca Pastorelli Carvalho

A INTERAÇÃO E COORDENAÇÃO DA POLÍTICA FISCAL E MONETÁRIA NO BRASIL: UMA ANÁLISE DA DOMINÂNCIA FISCAL E DOS IMPACTOS SOBRE A

INFLAÇÃO.

Monografia submetida ao curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito para a obtenção do grau de Bacharel em Ciências Econômicas. Orientador: Prof. Dr. Roberto Meurer

Florianópolis 2019

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Carvalho, Rebeca Pastorelli

A INTERAÇÃO E COORDENAÇÃO DA POLÍTICA FISCAL E

MONETÁRIA NO BRASIL: : UMA ANÁLISE DA DOMINÂNCIA FISCAL E DOS IMPACTOS SOBRE A INFLAÇÃO / Rebeca Pastorelli Carvalho ; orientador, Roberto Meurer, 2019.

58 p.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) -Universidade Federal de Santa Catarina, Centro Sócio

Econômico, Graduação em Ciências Econômicas, Florianópolis, 2019.

Inclui referências.

1. Ciências Econômicas. 2. Dominância Fiscal. 3. Política Monetária. 4. Coordenação entre políticas. 5. Política Fiscal. I. Meurer, Roberto . II. Universidade Federal de Santa Catarina. Graduação em Ciências Econômicas. III. Título.

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Rebeca Pastorelli Carvalho

A INTERAÇÃO E COORDENAÇÃO DA POLÍTICA FISCAL E MONETÁRIA NO BRASIL: UMA ANÁLISE DA DOMINÂNCIA FISCAL E DOS IMPACTOS SOBRE A

INFLAÇÃO.

Este Trabalho Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do Título de “Bacharel em Ciências Econômicas” e aprovado em sua forma final pelo Programa de Graduação em

Ciências Econômicas, com a nota 9,5.

Florianópolis, 03 de dezembro de 2019.

________________________ Prof. Daniel de Santana Vasconcelos, Dr.

Coordenador do Curso

Banca Examinadora:

________________________ Prof. Roberto Meurer, Dr.

Orientador

Universidade Federal de Santa Catarina

________________________

Profa. Eva Yamila Amanda da Silva Catela, Dra. Universidade Federal de Santa Catarina

________________________ Prof. João Frois Caldeira, Dr. Universidade Federal de Santa Catarina

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus por todas os privilégios e oportunidades que tive durante a vida e por ter saúde e sabedoria para usufruí-los.

A minha mãe, Erika, mulher forte e guerreira pela educação libertadora que me proporcionou, ao me dar assas para voar sempre acreditando e confiando em mim. Agradeço muito a ela não só pelos meus estudos, mas também pelo apoio emocional e por todo o amor que sempre me deu. Obrigada por tudo e por tanto, sem você nada eu seria.

A minha avó Neyde por ser outro grande exemplo de mulher batalhadora que a todo momento esteve ao meu lado, me ensinando os verdadeiros valores da vida. A minha avó Helena por todo o carinho, atenção e acolhimento em todos os momentos que já tivemos.

Ao meu pai, pelo apoio e pela amizade que construímos, além do papel fundamental na minha carreira de economista, pois desde pequena esteve preocupado em me apresentar o funcionamento do mundo e da sociedade, sempre me atentando os acontecimentos e desigualdades que me instigaram a seguir esta profissão.

Agradeço ao meu namorado, Thales, meu parceiro de vida e maior companheiro. Obrigada por estar ao meu lado desde o primeiro dia de aula, buscando me entender a todo instante e me amar do jeito que eu sou. Sem você minha vida não seria tão especial.

A Universidade Federal de Santa Catarina pela oportunidade de me formar não só como profissional, mas como cidadã, um lugar que me proporcionou conhecer pessoas de todos os lugares do país e do mundo e em que fui muito feliz. Agradeço a UFSC por todos os colegas que fiz e que hoje posso chamar de verdadeiros amigos: a minha querida amiga hondurenha, Maria Esther, por tudo que já vivemos ocupando eternamente um espaço especial no meu coração, e os meus amigos que entraram comigo em 2015.1 e até hoje me acompanham, entre eles o Thales, a Maria, o Felipe, o Eduardo e o Tiago.

E por último, a todos os professores do Departamento pelos ensinamentos e exemplos concedidos, em especial ao Roberto, a Carmen, ao Daniel Vasconcelos, ao Guilherme de Oliveira, ao Nildo, ao Jaylson e ao Francis pelas aulas inspiradoras que me fizeram ter certeza que estou no caminho certo.

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RESUMO

O trabalho procura investigar se houve dominância fiscal no Brasil entre os anos de 2000 e 2015. Como alguns períodos da economia brasileira foram fortemente afetados por constrangimentos de ordem fiscal, analisa-se a coordenação entre as políticas fiscal e monetária através da revisão teórica e posteriormente pela estimação de longo prazo entre as variáveis macroeconômicas. Sargent e Walace iniciaram o debate sobre coordenação entre as políticas já em 1981, expondo que a dominância monetária implica em um superávit que mantenha constante a relação dívida/PIB enquanto na dominância fiscal, a autoridade fiscal define sua atuação independente do orçamento proposto, anunciando possíveis déficits ou superávits. Alguns períodos, como os anos de 2002 e 2015, sugerem que a política fiscal foi dominante no Brasil. A fim de averiguar se de fato tal dominância aconteceu, foi feito um teste de raiz unitária sobre as séries temporais de cinco variáveis macroeconômicas, como a taxa de inflação, a taxa de câmbio real, a taxa de juros, o índice EMBI e a NFSP/PIB, para depois estimar a relação de longo prazo através do teste de cointegração. Tal relação indicou que apesar da alta influência dos fatores fiscais sobre a inflação, a taxa de juros ainda tem predominância, permitindo concluir que o Brasil se encontra em um regime de dominância monetária.

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ABSTRACT

This study investigates if there was fiscal dominance in Brazil between 2000 and 2015. As some periods of the Brazilian economy were strongly affected by fiscal constraints, the coordination between fiscal and monetary policies is analyzed through a theoretical review and then by a long-term estimation between the macroeconomic variables. Sargent and Walace started the policy coordination discussion as early as 1981, pointing out that monetary dominance implies a surplus that keeps the debt/GDP relation constant while in fiscal dominance, the tax authority defines its performance independently of the proposed budget, announcing possible deficits or surpluses. Some periods such as 2002 and 2015 suggest that fiscal policy was dominant in Brazil. In order to ascertain whether such dominance actually occurred, a unit-root test was performed on the time series of five macroeconomic variables, such as inflation rate, real exchange rate, interest rate, EMBI index and NFSP/GDP relation and then estimate the long-term relationship using the cointegration test. This relationship indicated that despite the high influence of fiscal factors on inflation, the interest rate still predominates, leading to conclude that Brazil is in a monetary dominance regime.

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LISTA DE FIGURAS

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – IPCA mensal – Janeiro de 2001 a dezembro de 2003 ... 30

Gráfico 2 – IPCA mensal – Janeiro de 2000 a dezembro de 2015 ... 31

Gráfico 3 – IPCA anual - 2000 a 2015 ... 31

Gráfico 4 – EMBI – Janeiro de 2000 a dezembro de 2015 ... 32

Gráfico 5 – Taxa de juros Selic – Janeiro de 2000 a dezembro de 2015... 34

Gráfico 6 – Dívida total líquida do setor público como % do PIB – Janeiro de 2001 a dezembro de 2016 ... 36

Gráfico 7 – Taxa de câmbio real – Janeiro de 2000 a dezembro de 2015 ... 40

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Dívida Pública Federal (interna e externa) em 2002 ... 35 Tabela 2 - Efeitos de um aumento de 1% na taxa Selic sobre a taxa de câmbio ... 39 Tabela 3 – Variáveis Utilizadas - Janeiro de 2000 a dezembro de 2015 ... 43 Tabela 4 – Estatística descritiva das variáveis Utilizadas - Janeiro de 2000 a dezembro de 2015 ... 43 Tabela 5 – Resultados do Teste de Raiz Unitária ADF ... 47 Tabela 6 – Resultado Teste KPSS ... 47 Tabela 7 – Resultados do Teste de Raiz Unitária ADF com as séries em primeira diferença 48 Tabela 8 – Resultado Teste KPSS com as séries em primeira diferença ... 48 Tabela 9 – Resultado do Teste de Cointegração de Johansen ... 50 Tabela 10 – Vetor de cointegração normalizado para a variável IPCA ... 51

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ADF - Dickey-Fuller Aumentado

CMN - Conselho Monetário Nacional

COPOM - Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil DLSP - Dívida Líquida do Setor Público

DPFe - Dívida Pública Federal Externa DPFi - Dívida Pública Federal Interna EMBI - Emerging Markets Bond Index EUA - Estados Unidos da América

FGTS - Fundo de Garantia do Tempo de Serviço FMI - Fundo Monetário Internacional

IPCA - Índice de Preços ao Consumidor Amplo IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada KPSS - Kwiatkowki, Phillips, Schimidt

LFT - Letras Financeiras do Tesouro

NFSP - Necessidade de Financiamento do Setor Publico NTN - Notas do Tesouro Nacional

PAC - Programa de Aceleração de Crescimento PEC - Proposta de Emenda Constitucional PIB - Produto Interno Bruto

PT - Partido dos Trabalhadores RMI - Regime de Metas de Inflação, TFNP - Teoria Fiscal do Nível de Preços VAR - Vetor Autoregressivo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 13

2 REFERENCIAL TEÓRICO ... 16

2.1 POLÍTICA MONETÁRIA ... 16

2.1.1 Regime de metas de inflação (RMI) ... 18

2.2 POLÍTICA FISCAL ... 19

2.2.1 Restrição orçamentária do governo ... 20

2.3 POLÍTICA CAMBIAL ... 23

2.4 COORDENÇÃO ENTRE POLÍTICA FISCAL E MONETÁRIA ... 24

3 POLÍTICA MONETÁRIA, POLÍTICA FISCAL E DÍVIDA PÚBLICA ... 28

3.1 CONTEXTO MACROECONÔMICO ... 28

3.2 DÍVIDA PÚBLICA BRASILEIRA ... 34

3.3 LESSONS FROM BRAZIL ... 36

4 ANÁLISE QUANTITATIVA ... 43

4.1 DADOS ... 43

4.2 TESTE DE RAIZ UNITÁRIA ... 44

4.2.1 Dickey-Fuller Aumentado (ADF) ... 45

4.2.2 Kwiatkowki, Phillips, Schmidt e Shin (KPSS) ... 46

4.2.3 Resultados ... 47

4.3 TESTE DE COINTEGRAÇÃO ... 49

5 CONCLUSÃO ... 54

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1 INTRODUÇÃO

Historicamente no Brasil o combate à inflação sempre foi um dos grandes desafios das autoridades econômicas. Em 1999, com o Plano Real já implementado foi adotado o Regime de Metas de Inflação, com o objetivo principal de exercer maior controle inflacionário tornando a taxa de juros (Selic) o seu principal instrumento. Além disso, o governo se compromete a atingir uma meta para o superávit primário, com expectativas de que os preços se consolidassem em patamares estáveis, bem como a Selic se reduzisse consideravelmente. Sendo assim, a política monetária torna-se crucial na atuação do Banco Central a partir dos anos 2000, seguindo a lógica macroeconômica padrão onde um aumento na taxa de juros atua via três canais principais: crédito, câmbio e ativos financeiros. (CARVALHO et al, 2012, p. 204). No canal do câmbio, um aumento da taxa de juros torna os investimentos domésticos mais atrativos, o que atrai capital estrangeiro, levando a apreciação do real. No entanto, houve um período da economia brasileira em que tal relação parece não ter se realizado, o que desperta o questionamento sobre a existência de dominância fiscal, que será investigada no presente trabalho.

Em 2002, com a crescente probabilidade da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva para o cargo de presidente do Brasil o cenário macroeconômico entra em crise. As baixas expectativas levaram ao aumento da taxa de juros sobre a dívida pública em dólar e o aumento da avalição do mercado sobre a probabilidade de default. O Real se deprecia levando ao aumento da inflação. Em 2003, o cenário se inverte. Já eleito, Lula se compromete com uma meta alta de superávit primário, com o controle inflacionário e com a reforma previdenciária e tributária. Ainda coloca no Ministério da Fazenda e no Banco Central uma equipe econômica que agrada o mercado, nomeando Antônio Palocci e Henrique Meirelles, respectivamente. As expectativas melhoram e levam a diminuição da probabilidade percebida de default, a valorização do Real e a queda da inflação (BLANCHARD, 2004, p. 3).

Apesar do compromisso com a inflação e o aumento dessa em 2002, segundo Blanchard (2004) o Governo Brasileiro não deveria aumentar a taxa de juros com a finalidade de controlar a inflação, já que tal aumento iria piorar a trajetória da dívida pública, ampliar a percepção de default e afastar ainda mais o fluxo de capitais. Argumenta que quanto maior for o nível inicial da dívida, a proporção desta em capital estrangeiro e o prêmio pelo risco, maior a chance de um aumento da taxa de juros levar ao aumento da percepção da probabilidade de

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default, diminuindo a atratividade da dívida e levando a depreciação da moeda local. Ou seja, a política monetária restritiva em resposta ao aumento da inflação levaria a depreciação da moeda, que futuramente refletiria em aumento no índice de preços devido aos repasses de custos de bens importados. Dentro dessa relação, a política monetária como instrumento de controle inflacionário pode ter efeitos perversos, pois um aumento na taxa de juros leva à depreciação real, que futuramente ocasiona o aumento do índice de preços. Nesse caso, a política fiscal é que seria o instrumento correto para diminuir a inflação.

Os autores Sargent e Wallace iniciaram os debates sobre as dominâncias e coordenação entre tais políticas já em 1981. Segundo os autores, na dominância monetária a autoridade monetária determina o resultado primário que deve ser entregue pela autoridade fiscal, cabendo a política fiscal se ajustar a fim de equilibrar o orçamento do governo, buscando um superávit que mantenha constante a relação dívida/PIB. Já na dominância fiscal, a autoridade fiscal define sua política sem considerar o orçamento proposto, equilibrando possíveis déficits e superávits via emissão de títulos públicos, onde a autoridade monetária se torna passiva, agindo de acordo com a necessidade de garantir a solvência do governo e de ajustar o balanço orçamentário

Ainda nessa lógica, houve outra situação na economia brasileira que poderia evidenciar a dominância fiscal. Em 2015, o país apresentou elevado déficit primário como resultado de sua política fiscal que levou a desconfiança dos agentes, induzindo depreciação cambial e refletindo em inflação elevada para o período. Como medida, tanto para conter a trajetória da dívida como para a inflação, além de aumentar a taxa de juros, o governo incluiu uma medida de emenda diretamente na constituição a fim controlar os gastos públicos. Segundo Relatórios da Inflação do Banco Central, a recuperação da confiança para a trajetória fiscal futura foi essencial para diminuir a inflação no ano seguinte. Dessa forma, foi feito o uso da política fiscal para o alcance de objetivos que seriam da política monetária caracterizando um possível regime de dominância fiscal. Além disso, o déficit primário do período pode caracterizar o regime de dominância fiscal, uma vez que demonstra que a autoridade fiscal não esteve comprometida com o orçamento proposto.

Apesar de alguns trabalhos já terem revelado que a condução da política monetária tem tido predominância no Brasil, alguns períodos apresentam características que sugerem a dominância fiscal, como o de 2002 e de 2015. Assim, torna-se importante o estudo iniciado em 1981 por Sargent e Wallace da coordenação entre política monetária e política fiscal que até hoje se encontra no centro das decisões políticas e econômicas dos governos ao redor do mundo.

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O presente trabalho tem como objetivo geral investigar se houve dominância fiscal no Brasil já que alguns períodos como 2002 e 2016 apresentaram características para tal. Como objetivos específicos pretende-se revisar o funcionamento das políticas monetária, fiscal e cambial brasileiras, ressaltar quais seriam as características macroeconômicas de dominância fiscal apresentadas nos períodos selecionados e realizar uma análise econométrica através de séries temporais sobre os fatores de influência da inflação brasileira, a fim de concluir se a política fiscal foi predominante à monetária.

Para alcançar o objetivo proposto, o trabalho encontra-se dividido em quatro capítulos além desta introdução. O capítulo dois traz o referencial teórico sobre o funcionamento das políticas fiscal, cambial e monetária e a coordenação entre elas. O terceiro levanta o problema de pesquisa ao analisar o funcionamento da política monetária no período e sugerir a dominância fiscal. A quarta parte detalha os dados e métodos utilizados na pesquisa e os seus resultados. Por fim, o último capítulo faz as considerações finais da pesquisa.

Com base no cenário pré Governo Lula e inicio do mesmo, o trabalho busca analisar se o efeito perverso que poderia ser causado pela ação restritiva da política monetária devido a alta da inflação é consequência da existência de dominância fiscal. Também é analisado o ano de 2015 em que o déficit primário e inflação elevada, fez com que o governo brasileiro tomasse uma atitude drástica a fim de conter e trajetória da dívida para os próximos vinte anos.

A pesquisa se torna relevante pois investiga porque uma das principais ferramentas do governo brasileiro para o controle da inflação pode não causar o efeito esperado tradicionalmente. A inflação já foi um dos maiores desafios das autoridades brasileiras, sendo alvo de diversos planos nos anos 80 e 90. Por afetar diretamente o custo de vida da população, agravar a desigualdade que já é tão discrepante no país e ainda trazer incerteza para o cenário econômico, o Regime de Metas de inflação (RMI) muda a âncora cambial para a âncora dos juros em combate ao nível de preços. Sendo assim, é essencial que autoridade monetária seja capaz de acompanhar o seu objetivo segundo o regime, o da manutenção de uma taxa de inflação baixa e estável. (CARVALHO et al, 2012, p. 140).

A coordenação entre a política fiscal e monetária já é foco de estudos e trabalhos dada a importância de se entender possíveis problemas na economia brasileira. As duas políticas interagem diretamente e o desajuste entre as duas é capaz de gerar efeitos significativos no cenário macroeconômico, principalmente sobre a inflação e trajetória da dívida como no caso brasileiro.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 POLÍTICA MONETÁRIA

Os Bancos Centrais ao redor do mundo perseguem diversos objetivos de acordo com as teorias consideradas em sua conduta de política monetária. Dentre eles estão: o alto nível de emprego, maior crescimento econômico, estabilidade da taxa de câmbio, prevenção de falências bancárias, manutenção da saúde do sistema financeiro, manutenção da confiança dos investidores estrangeiros, e principalmente o alcance da estabilidade de preços. (CARVALHO

et al, 2012, p. 158).

Responsável pela política monetária, o Banco Central do Brasil tem à sua disposição instrumentos que afetam diretamente as variáveis operacionais, a fim de atingir as metas intermediárias desejadas e alcançar os objetivos finais, uma vez que a atuação da política monetária sobre a economia não é imediata.

Os instrumentos clássicos de política monetária são: recolhimento compulsório (depósito de parte das reservas bancárias feito pelos bancos obrigatoriamente ao Banco Central), redesconto de liquidez (empréstimos do Banco Central aos bancos para atender necessidades de reservas) e operações de mercado aberto (compra e venda de títulos públicos federais), que atuam sobre a oferta de moeda disponível em circulação via variáveis operacionais, como a determinação da taxa de juros básica de curto prazo e o controle das reservas bancárias agregadas. Por exemplo, o Banco Central, através da compra ou venda de títulos públicos, pode atuar tanto fixando a taxa de juros e com o mercado determinando a quantidade de reservas bancárias quanto controlando a quantidade de reservas e deixando a taxa de juros a ser determinada pelo mercado, sendo a primeira opção utilizada no Brasil. (CARVALHO et al, 2012, p. 158).

Já as metas intermediárias funcionam para sinalizar ao banco central se o impacto da política passada sobre a economia está a caminho de fazer efeito e se será expansionista ou contracionista, via taxa de juros de longo prazo e agregados monetários. Logo, são as mudanças nas variáveis operacionais, através dos instrumentos de política, que afetam as metas intermediárias, com a operação do multiplicador monetário, em que a base monetária é transformada em um dado volume de meios de pagamento. (CARVALHO et al, 2012, p. 159).

No Brasil, o responsável pela condução da política monetária é o Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil (COPOM), órgão do Banco Central instituído em 1996.

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Através de reuniões periódicas, os sete diretores da instituição e outros cinco chefes de departamento estabelecem diretrizes e fixam uma taxa de juros utilizada como meta para a taxa Selic, que é a taxa média dos financiamentos diários com lastro em títulos federais, amplamente utilizada pelo sistema financeiro como um todo. (CARVALHO et al, 2012, p. 161).

Como base para a determinação da taxa de juros de curto prazo, o Banco Central utiliza a “Regra de Taylor” que descreve a operacionalização da política monetária sobre o Regime de Metas de inflação através de uma função reação. A regra elaborada pelo economista John Taylor em 1993 relaciona inversamente a taxa de juros básica a desvios na inflação em relação à meta inflacionária, ao hiato do produto e à taxa de juros real de equilíbrio. Por exemplo, quando a inflação supera a meta de inflação ou quando o produto real supera o nível compatível com a taxa potencial do produto, o Banco Central deve elevar a taxa de juros, via vendas de títulos públicos (que contraem a base monetária, pressionando a taxa de juros para cima) (CARVALHO et al, 2012, p. 162). Resumidamente, descreve a reação do Banco Central em relação a inflação através dos desvios da mesma em relação a meta preestabelecida e dos ciclos dos negócios. (NÓBREGA; MAIA; BESARRIA, 2016, p. 4). No entanto, apesar de ser um bom referencial, nem sempre a política monetária segue a regra mecanicamente já que o Banco Central também leva em consideração outros fatores não quantificáveis em suas decisões.

Em condições normais, a elevação da taxa de juros atua sobre a economia através de três canais principais. O primeiro é através do valor dos ativos financeiros que cai mediante a elevação dos juros mas aumenta os rendimentos, o que leva a migração de investimentos em capital real para títulos financeiros, diminuindo o investimento e o consumo presente. O segundo acontece via crédito, uma vez que maiores taxas serão cobradas pelos bancos em seus empréstimos, diminuindo o acesso ao crédito (muitas vezes necessário para o consumo ou para investimentos reais) e reduzindo a quantidade de moeda em circulação. Os bancos aumentam as taxas de empréstimos para que esses sejam mais atrativos, já que a compra de títulos se torna mais rentável. E o terceiro canal é o câmbio, sob regime flutuante, que sofre uma valorização diante do aumento da taxa de juros. Acontece porque os investimentos do país se tornam mais atrativos, o que atrai capital estrangeiro e aumenta a demanda pela moeda doméstica, levando a sua valorização. A apreciação desestimula as exportações e favorece o consumo de bens importados. Por isso, segundo Carvalho et al (2012, p. 204), a utilização de elevações de taxas de juros como instrumento de administração de demanda agregada pode exibir um viés anti-investimento e anticrescimento.

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2.1.1 Regime de metas de inflação (RMI)

Após profundas crises cambiais e financeiras no século XX, diversos países emergentes passaram a adotar o Regime de Metas de Inflação (RMI) para a condução da política monetária. No Brasil o regime foi adotado em 1999 após a troca de regime cambial trocando a âncora cambial pela âncora do juros. O RMI foi estabelecido pelo Novo Consenso Macroeconômico como o melhor arranjo institucional para conduzir a política econômica onde a política monetária ganha destaque, devendo as demais estarem subordinadas aos seus objetivos de estabilização de preços e produto.

Segundo Carvalho et al (2012, p. 140), de acordo com a abordagem seguida pelo RMI:

[...] a política monetária, ao mesmo tempo em que é vista como um dos principais instrumentos da política macroeconômica, não pode afetar a atividade econômica (emprego e produto) de forma duradoura. A política fiscal, por sua vez, deve estar submetida à política monetária. Não deve haver dominância fiscal, ou seja, a conduta da política monetária não pode ser ditada por constrangimentos de ordem fiscal. Assim, a existência de déficits fiscais poderia conduzir a uma situação de descontrole na emissão monetária e que, por sua vez, levaria ao recrudescimento da inflação, tanto por meio de mecanismos de transmissão diretos como por intermédio de expectativas de inflação ascendentes. A política monetária, portanto, é vista como um instrumento flexível e poderoso para alcançar o objetivo da estabilização de preços.

Segundo Mishkin (2000, p.3), o RMI é uma estratégia de política monetária que envolve 5 principais elementos:

1) O anúncio público das metas de inflação de médio prazo.

2) O compromisso da autoridade monetária com a estabilidade de preços, sendo o objetivo principal e subordinando quaisquer outros objetivos a esse.

3) Uma estratégia de informação em que muitas variáveis, e não só os agregados monetários e a taxa de câmbio, sejam utilizadas na tomada de decisão.

4) Aumentar a transparência da política monetária via comunicação com o público e com o mercado sobre os planos, objetivos e decisões da autoridade monetária.

5) Aumentar a responsabilidade do Banco Central em atingir as metas de inflação estabelecidas.

Dessa forma, o regime assume que o objetivo central da política monetária é a manutenção de uma taxa de inflação baixa e estável propondo uma meta de crescimento para o índice de preços que varia, no Brasil, sobre uma banda (de 2%, 2,5% ou 1,5%, dependendo do período, acima e baixo da meta central) garantindo certo grau de flexibilidade. O Banco Central então utiliza seus instrumentos, sendo o principal a taxa básica de juros, para que a inflação do

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período fique dentro da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). (CARVALHO et al, 2012, p. 140).

Para assegurar que a condução da meta esteja clara para o público, o Banco Central utiliza de alguns mecanismos como a publicação de relatórios periódicos de inflação, produto e outras variáveis econômicas que permitem a avaliação geral das condições econômicas do pais. Além disso, caso a meta não seja alcançada a autoridade monetária deve apresentar justificativas sobre o que ocasionou e sobre quais medidas serão tomadas para reverter a situação. Tais mecanismos proporcionam aos agentes da economia previsibilidade e transparência além de impor certa disciplina à condução da política monetária. Estes fatores contribuem positivamente para a credibilidade do Banco Central, que é essencial para garantir a sua independência, para evitar problemas de inconsistência temporal e conquistar a confiança dos agentes.

2.2 POLÍTICA FISCAL

Ao contrário da política monetária, a política fiscal atua sobre a economia de forma mais direta e simples, por escolhas em aumento ou diminuição de tributos e gastos públicos. O saldo governamental, composto pela diferença entre tributos arrecadados e gastos realizados, compõe o terceiro componente da demanda agregada. (BLANCHARD, 2011, p. 42).

Os tributos têm como objetivo arrecadar recursos para financiar o provisionamento de gastos públicos, onde a política fiscal tende a cumprir três funções: a estabilização macroeconômica com a promoção do crescimento sustentado, do baixo desemprego e da estabilidade de preços, a redistribuição equitativa de renda e a alocação eficiente de bens e serviços públicos para cobrir as falhas de mercado. (BRASIL, acesso em 2019).

Além disso, os impactos da política fiscal, no curto prazo, podem ser descritos da seguinte maneira: em um cenário de contração fiscal, por exemplo, com redução do déficit via aumento de impostos, há uma diminuição da renda disponível, que leva à diminuição do consumo. Essa diminuição da demanda direciona a diminuição do produto e da renda. A diminuição da renda reduz a demanda por moeda, que por sua vez, reduz a taxa de juros. (BLANCHARD, 2011, p. 86).

Os resultados da política fiscal, em termos numéricos, podem ser analisados através dos fluxos ou dos estoques. O indicador do fluxo consiste em seu resultado primário, com a apuração da diferença entre receitas primárias e despesas primárias, e em seu resultado nominal,

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que é o primário acrescido do pagamento líquido de juros. A análise através do fluxo é feita no chamado método acima da linha, enquanto a da variação do estoque é no método abaixo da linha. O estoque nada mais é do que o resultado do fluxo com diferente perspectiva, sendo focado no financiamento do déficit. A variação do estoque é chamada de necessidade de financiamento do setor público (NFSP) e pode ser apurada em termos de dívida bruta, sendo o resultado da apuração nominal, e em termos de dívida líquida, sendo a bruta decrescida dos créditos (BRASIL, 2007). Ambos são tratados em termos de déficit, caso negativos, ou superávit, caso positivos (BRASIL, acesso em 2019).

Atualmente, o governo brasileiro conta com duas formas de financiar seus déficits, a contratual, via contratos com organismos multilaterais e bancos, e a mobiliária, via emissão de títulos públicos. A dívida também pode ser classificada como interna ou externa, dependendo da moeda em que ocorrem seus fluxos de recebimento e pagamento.

Segundo Brasil (acesso em 2019):

[...] toda a Dívida Pública Federal em circulação no mercado nacional é paga em real e captada por meio da emissão de títulos públicos, sendo por essa razão definida como Dívida Pública Mobiliária Federal interna (DPMFi). [...] Já a Dívida Pública Federal existente no mercado internacional é paga em outras moedas que não o real e tem sido captada tanto por meio da emissão de títulos quanto por contratos, sendo por isso definida como Dívida Pública Federal externa (DPFe).

Uma das grandes preocupações em torno da política fiscal é o reflexo sobre a dívida pública federal total, ou seja, o resultado sobre a variável de estoque baseada nos fluxos passados somados ao fluxo presente. Uma dívida elevada faz com que o país não só arque com o pagamento dos juros da dívida, mas dispenda um grande esforço em gerir a sua dinâmica e sustentabilidade, já que é uma variável importante na avaliação das políticas adotadas e de risco do país. Um nível alto de dívida gera desconfiança dos agentes sobre a possibilidade de default, o que exige maiores retornos sobre o risco, elevando o serviço da dívida e gerando um círculo vicioso. É nesse sentido que a responsabilidade fiscal do governo se torna tão essencial para a formação de expectativas.

2.2.1

Restrição orçamentária do governo

Assim como os indivíduos, o governo também apresenta restrições em sua capacidade de endividamento, conhecida como restrição orçamentária governamental. Para chegar na

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restrição orçamentária, é preciso considerar a equação de déficit do governo, por exemplo do ano t:

𝐷é𝑓𝑖𝑐𝑖𝑡𝑡 = 𝑟 𝐵𝑡−1+ 𝐺𝑡− 𝑇𝑡 (1) Onde B é a dívida pública, r a taxa de juros real, G os gastos do governo e T os impostos menos as transferências, ou seja, considerando o déficit orçamentário do governo no ano t igual aos gastos do ano t, incluindo o pagamento de juros sobre a dívida do ano anterior, menos os impostos líquidos de transferências. (BLANCHARD, 2011, p. 501). O déficit nada mais é do que do que a variação da dívida durante dois períodos, também dado por:

𝐷é𝑓𝑖𝑐𝑖𝑡𝑡= 𝐵𝑡− 𝐵𝑡−1 (2) Igualando ambas equações, pode se chegar a restrição orçamentária do governo que relaciona a variação da dívida ao nível inicial da dívida (que afeta o pagamento de juros) e aos gastos e receitas do período:

𝐵𝑡− 𝐵𝑡−1= 𝑟 𝐵𝑡−1+ 𝐺𝑡− 𝑇𝑡 (3) Também é possível interpretar a equação como a variação da dívida igualada ao pagamento de juros reais mais o déficit primário.

A restrição orçamentária do governo pode ser abordada de forma intertemporal, onde um déficit presente significa que governo deve futuramente aumentar suficientemente sua receita a fim de pagar a dívida existente mais os gastos futuros, ou seja, produzir futuramente um superávit primário capaz de estabilizar a dívida. Em um cenário de consecutivos déficits ao longo dos anos, a trajetória da dívida é considerada sustentável desde que exista a perspectiva que em algum momento do futuro o governo irá gerar um superávit suficientemente volumoso.

Numa visão extrema, existe o argumento de que dentro da restrição orçamentária do governo nem o déficit nem a dívida tem qualquer efeito sobre a atividade econômica. Tal proposição é conhecida como equivalência ricardiana, que considera por exemplo que a queda nos impostos em t será recompensada em igual valor via aumento tributário em t+1, levando os consumidores a terem essa percepção e não mudarem os padrões de consumo, já que não mudou o valor presente dos impostos, apenas o momento em que será cobrado. No entanto, raramente cortes nos impostos vêm seguidos de anúncios do aumento futuro no período posterior, logo os consumidores iriam ignorar o possível aumento, sendo mais provável que não poupem na razão

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de 1 para 1 com a redução dos impostos. A evidência empírica torna a equivalência ricardiana pouco convincente, sendo seguro concluir que os déficits orçamentários tenham efeito sobrea atividade. No curto prazo, elevam a demanda e o produto. No longo prazo, diminuem a acumulação de capital, fazendo o produto cair. (BLANCHARD, 2011, p. 509)

Ainda rearranjando a equação da restrição orçamentária do governo, dividindo ambos os lados pelo produto real, 𝑌𝑡, multiplicando o numerador e o denominador por 𝑌𝑡−1, e supondo que o crescimento do produto seja constante, 𝑔, de forma que 𝑌𝑡−1

𝑌𝑡 possa ser escrito como

1

1+𝑔 ,obtém-se a evolução do coeficiente de endividamento: 𝐵𝑡 𝑌𝑡 − 𝐵𝑡−1 𝑌𝑡−1 = (𝑟 − 𝑔) 𝐵𝑡−1 𝑌𝑡−1 + 𝐺𝑡− 𝑇𝑡 𝑌𝑡 (4) A interpretação consiste que a variação do coeficiente de endividamento (relação dívida PIB) é igual à soma entre a diferença da taxa de juros real e a taxa de crescimento vezes o coeficiente de endividamento inicial e a razão do déficit primário sobre o PIB. A equação revela que a alta relação da dívida/PIB pode levar o país a um círculo vicioso e tornar a condução da política fiscal custosa e difícil. Por exemplo, em um caso extremo de um país com o coeficiente de endividamento em 100%, taxa de juros real de 3% e taxa de crescimento de 2%, o primeiro termo do lado direto ficaria em (3% - 2%) x 100% = 1% do PIB. Supondo que que o superávit primário também seja de 1% de forma que a relação dívida/PIB fique constante, tornando o lado direto igual a 1% + (-1%) = 0%. Um aumento na taxa de juros, seja por decisões da política monetária para controlar a inflação ou para gerar retenção de títulos devido ao aumento do risco percebido pelos investidores, para o patamar de 6% levaria a equação para (6% - 2%) x 100% = 4%, ou seja, para manter contaste a relação dívida/PIB o superávit primário deveria quadruplicar. (BLANCHARD, 2011, p. 506)

Para que o governo consiga atingir tal superávit seria preciso uma política fiscal austera, envolvendo custos elevados para a sociedade e podendo gerar recessão. Além da política fiscal, também há a possibilidade de receita via senhoriagem, que seria o ganho financeiro do governo com a emissão de moeda. A senhoriagem seria uma forma de o governo suprir a falta de receita para arcar com seus gastos via impressão de dinheiro e aumento das reservas bancárias, ampliando a base monetária e possivelmente resultando em inflação. O uso da senhoriagem para financiar o déficit público caracteriza o regime de dominância fiscal, já

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que nesse caso a autoridade fiscal é que determina quantidade de moeda que será emitida, fazendo com que a autoridade monetária abra mão do controle da inflação.

Outra opção seria não realizar um esforço fiscal adicional mantendo o déficit, o que elevaria o crescimento da dívida, aumentaria a desconfiança dos agentes e possivelmente exigiria maiores retornos sobre os títulos. Taxas de juros maiores elevariam o coeficiente de endividamento, e assim gerando uma dinâmica perversa até o momento que não restaria outra alternativa senão o default. Conclui-se que quanto maior a razão dívida/PIB maior o potencial para cair nessa dinâmica, onde mesmo que a possibilidade de default fosse infundada, poderia se tornar autorrealizável. Os juros crescentes poderiam levar o governo a perder o controle do orçamento e provocar o aumento da dívida para um nível em que não seria capaz de pagá-la, realizando os temores do calote. (BLANCHARD, 2011, p. 512)

2.3 POLÍTICA CAMBIAL

A taxa de câmbio representa o valor de moeda estrangeira em unidades da nacional, ou seja, o valor do real em dólares americanos. Uma depreciação cambial é a elevação do preço da moeda estrangeira e uma apreciação o inverso. A taxa de câmbio no regime flutuante é determinada pela oferta e demanda de moeda pelos agentes, que incorporam fatores como juros, riscos e expectativas de apreciação/depreciação em suas decisões.

O regime de câmbio flutuante foi adotado no Brasil a partir de 1999 em substituição ao câmbio fixo. A mudança não foi algo planejado e sim resultado da perda de reservas que vinha ocorrendo há meses devido ao ataque especulativo. A crise cambial impossibilitou a manutenção das intervenções requeridas pelo regime fixo e o Banco Central decidiu deixar o real flutuar.

Desde a mudança, as autoridades afirmam que se trata de um regime de flutuação livre justificando as intervenções como medidas ad hoc sem pretensão de influenciar o nível da taxa de câmbio. Em períodos de depreciação, a venda de moeda estrangeira pelo Banco Central fora sugerida como temporárias apenas para limitar o excesso de volatilidade e desordem no mercado. Já em períodos de apreciação, a compra é explicada como ajuste das reservas da instituição. Sobre afirmação da flutuação pura, na prática pode-se dizer que existe em momentos de calmaria, mas que quando há volatilidade excessiva se caracteriza por uma flutuação suja a fim de estabilizar a taxa de câmbio diretamente ou indiretamente. (CARVALHO et al, 2012, p. 373). Tais intervenções estabelecem uma conexão entre o balanço

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de pagamentos e a oferta monetária doméstica. Há uma expansão da base monetária quando o Banco Central decide comprar dólares no mercado para incorporar as suas reservas, devido a movimentação de real dos cofres em direção ao público. Já quando há venda de dólares, a base monetária se contrai levando moeda doméstica do público para os cofres. (CARVALHO et al, 2012, p. 353).

Apesar da política cambial e monetária serem independentes e agirem através de mecanismos distintos, a taxa de câmbio por vezes funciona como variável de ajuste caso a taxa de juros doméstica definida pelo COPOM seja muito superior à taxa externa (mais a expectativa de desvalorização cambial e risco país). Além disso, segundo CARVALHO et al (2012, p. 353), “a crescente integração financeira internacional faz com que o comportamento dos mercados domésticos, tanto os de bens e serviços como o monetário, recebam a influência das condições internacionais através do mercado de câmbio”, assim o comportamento da economia internacional e as variações nas taxas de juros externas tem cada vez mais aumentado a influência na definição da taxa de juros básica.

2.4 COORDENÇÃO ENTRE POLÍTICA FISCAL E MONETÁRIA

A política fiscal e monetária utilizam de diferentes instrumentos para atingir objetivos distintos mas que acabam por influenciar as variáveis finais uma da outra. Ao mesmo tempo em que alterações nos gastos e nas receitas do governo influenciam o nível de preços e o crescimento da moeda, alterações na base monetária e na taxa de juros afetam o resultado fiscal. Por esse motivo, é essencial que ambas políticas estejam bem coordenadas para que os resultados sejam exitosos.

Em 1981, Sargent e Wallace iniciaram o debate sobre a importância da interação entre política monetária e fiscal através do famoso artigo “Some Unpleasant Monetarist Arithmetic”. A hipótese dos autores vai contra a ideia monetarista de que a inflação é um fenômeno puramente monetário, sendo passível de controle permanente através da política monetária (NÓBREGA; MAIA; BESARRIA, 2016, p. 4). Segundo os autores, a inflação pode ser um fenômeno fiscal na ausência de coordenação entre políticas, tornando ineficaz o instrumento de política monetária para o controle inflacionário. Consideram que a restrição orçamentária do governo é intertemporal de acordo com a equivalência ricardiana, ou seja, que a possibilidade de default não existe sendo o estoque da dívida pública em mãos dos agentes igual aos superávits primários futuros mais a receita de senhoriagem. Ressaltam principalmente que a

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política monetária precisa de suporte fiscal, já que as autoridades fiscais e monetárias possuem objetivos e instrumentos diferentes que podem levar a um comportamento antagônico entre ambas.

A partir disso, os autores sugerem que a interação entre a política fiscal e a política monetária pode ocorrer de duas formas: ou prevalece a dominância da política monetária ou a da política fiscal. No regime de coordenação em que a política monetária é dominante, a autoridade monetária é independente e determina a taxa de crescimento da base monetária. Com seu conjunto de políticas, impõe a receita provinda da senhoriagem que irá financiar a política fiscal. Então, autoridade fiscal tem que lidar com a restrição, tanto de senhoriagem quanto de demanda por títulos públicos, para determinar os possíveis déficits do seu orçamento. Assim, a autoridade monetária consegue controlar permanentemente a inflação pois é livre para determinar a base monetária e impor disciplina à autoridade fiscal.

Segundo Nóbrega, Maia e Bessaria (2016, p. 3): “O regime de dominância monetária é caracterizado por uma autoridade fiscal passiva, comprometida com a geração de receitas e orçamento equilibrado, no sentido de promover a estabilização da relação dívida/PIB.” Dessa forma, a autoridade monetária tem liberdade e autonomia para perseguir o objetivo central da estabilidade de preços, já que se recusa a monetizar os déficits públicos via emissão extra de senhoriagem. (PASTORE; GAZZANO; PINOTTI, 2014)

Já no regime de dominância fiscal, Sargent e Wallace (1981) argumentam que a autoridade fiscal determina independentemente e unilateralmente o seu orçamento, anunciando para a autoridade monetária o déficit que deverá ser financiado via venda de títulos públicos e senhoriagem. A autoridade monetária se torna menos eficiente pois perde o controle sobre os níveis de preços ao necessitar monetizar a economia no intuito de garantir a solvência do governo. Existiria assim, uma relação negativa entre a relação dívida/PIB e a oferta monetária, onde a autoridade monetária é obrigada a criar moeda e tolerar mais inflação, devido ao uso de uma taxa de juros reais maior que a taxa de crescimento da economia na emissão de títulos públicos. (SARGENT; WALLACE, 1981, p. 2)

O estudo iniciado por Sargent e Wallace é essencial ao demonstrar que a falta de coordenação entre as políticas fiscais e monetárias pode gerar uma situação onde a autoridade perde o controle sobre a inflação. A partir dessa ideia, foram desenvolvidas outras teorias acerca da interação entre as políticas como a Teoria Fiscal do Nível de Preços (TFNP).

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A TFNP começou a ser desenvolvida por Leeper em 1991 no artigo “Equilibria under

‘Active’ and ‘Passive’ Monetary and Fiscal Policies” utilizando o modelo de equilíbrio geral.

O autor utiliza a definição de autoridade passiva ou ativa, em paralelo a dominância de Sargent e Wallace. Uma autoridade monetária ativa define suas variáveis de controle sem se atentar ao estado da dívida governamental cabendo a autoridade fiscal definir o nível de impostos diretos de acordo com a quantidade de dívida real mantida pelo público. Já uma autoridade monetária passiva age respondendo aos choques da dívida e é restringida pelas ações da autoridade ativa. (LEEPER, 1991, p.130). Leeper exemplifica com a situação onde o efeito sobre os preços da política monetária dependem de como a política fiscal vai ajustar os impostos diretos em resposta aos efeitos reais sobre a dívida. Nesse caso é preciso que ocorra um aumento futuro dos impostos para que uma contração monetária consiga diminuir a inflação presente. (LEEPER, 1991, p.132)

A TFNP se difere do estudo de Sargent e Wallace pois no longo prazo o Banco Central, mesmo que forte e independente, pode não garantir a estabilidade de preços já que precisaria gerar superávits suficientes para pagar toda a dívida que possuí no presente sem recorrer à senhoriagem pois esta representa uma pequena fração das receitas federais. Nesse caso, se os agentes não acreditarem que o governo será capaz de realizar o pagamento da dívida no longo prazo, será necessário que o governo realmente não pague parte da dívida ou que tolere o aumento da inflação. Ou seja, a principal diferença entre a abordagem de Sargent Wallace e a TFNP é a forma de interpretar a restrição orçamentária intertemporal do governo, que também pode ser representada pela equação 5, onde B é o estoque de dívida nominal, P o nível de preço e S o superávit.

𝐵

𝑃= 𝑆 = 𝑣𝑎𝑙𝑜𝑟 𝑝𝑟𝑒𝑠𝑒𝑛𝑡𝑒 𝑑𝑜𝑠 𝑠𝑢𝑝𝑒𝑟á𝑣𝑖𝑡𝑠 𝑓𝑢𝑡𝑢𝑟𝑜𝑠 (5)

Para Sargent e Wallace a equação 5 representa a restrição ao comportamento do governo, em que os dois lados da equação devem ser igualados a qualquer nível de preços por meio da política fiscal. Já para a TFNP a equação é uma condição de equilíbrio, onde o estoque da dívida nominal (B) é dado e o superávit (S) constante, ocorrendo o ajustamento através do nível de preços (P). No entanto, a restrição orçamentária intertemporal do governo não é satisfeita para qualquer valor de P, sendo o nível de preços de equilíbrio aquele que iguala o valor real das obrigações (nominais) do governo ao valor presente dos superávits futuros. (ROCHA; SILVA, 2004, p. 420).

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Apesar da importância da coordenação entre as políticas fiscal e monetária, a separação da tomada de decisões entre elas baseia-se nas teses que a política monetária tem pequeno efeito sobre o orçamento público e que a política fiscal pouca influência sobre a inflação (WOODFORD, 1998). Porém no Brasil, cerca de metade da dívida mobiliária federal é financiada via Letras Financeiras do Tesouro, título indexado à Selic. Ou seja, a política monetária via alteração da taxa de juros acaba por afetar diretamente o acúmulo de juros a ser pago pelo Tesouro Nacional, impactando o orçamento.

Tal característica da dívida coloca em questionamento a existência de uma dominância monetária em alguns períodos como em 2002, onde a política monetária restritiva amplia a possibilidade de default, afasta fluxo de capitais, gera depreciação e consequentemente eleva o nível de preços via aumento dos custos de diversos bens. Oliver Blanchard em 2004 escreveu um importante artigo intitulado “Fiscal Dominance and Inflation Targeting: Lessons from

Brazil” apresentando um breve modelo teórico seguido de um teste empírico voltado para o

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3 POLÍTICA MONETÁRIA, POLÍTICA FISCAL E DÍVIDA PÚBLICA

3.1 CONTEXTO MACROECONÔMICO

Em 2002, o Brasil enfrentou uma crise de confiança causada pela incerteza sobre as eleições presidenciais e acentuada pela aversão ao risco nos mercados internacionais que exigiu do Banco Central uma atuação firme e clara a fim de contornar a credibilidade e restabelecer a confiança da economia brasileira desestabilizada com explosão dos prêmios pelo risco dos títulos públicos e forte depreciação cambial.

O maior temor do mercado estava nos rumos que o país iria tomar quanto à política fiscal e ao cumprimento das obrigações financeiras com a possível eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (Lula), candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) e favorito nas pesquisas eleitorais. O nervosismo se justificava pela dúvida sobre a manutenção das mudanças realizadas nos anos anteriores na condução das políticas econômicas como um novo regime cambial e a adoção do RMI, além do histórico de declarações do candidato ao longo das últimas três eleições que havia concorrido sobre a implementação da revolução socialista e não pagamento da dívida pública, apesar da mudança de postura nas eleições de 2002.

Além da incerteza percebida pelos agentes, houve também um aumento dos spreads em todo o mundo, principalmente nos títulos coorporativos dos EUA, ocasionando uma parada repentina nos fluxos de capital na ordem de 6% do PIB e o levando a uma depreciação cambial de quase 50%. Aproximadamente 30% da dívida pública interna naquele momento estava indexada à taxa de câmbio nominal, logo em poucos meses tais movimentos aumentaram a relação dívida/PIB e as expectativas de inflação, agravando a desconfiança sobre os rumos da futura política econômica e da sustentabilidade da dívida. (GIAVAZZI; GOLDFAJN; HERRERA, 2005, p. 10). Os investidores passam então a reduzir a exposição à dívida pública, reprimindo a demanda por títulos ou buscando prazos mais curtos. Tais acontecimentos geraram um reflexo considerável no mercado financeiro doméstico, dificultando a administração da dívida e reduzindo o financiamento externo do país.

Essa depreciação cambial representou uma mudança importante de preços relativos, com a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) alcançando 12,5% no acumulado ao final de 2002, sendo descumprida a meta para inflação de 3,5% (com mais ou menos 2% de banda) determinada para o ano. Como o gráfico 1 demonstra, tal aumento ocorreu principalmente no último trimestre do ano, havendo certa estabilidade no primeiro semestre.

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Segundo o Presidente do Banco Central na época, esse aumento da inflação constitui o maior custo herdado da crise de 2002.

Na Carta Aberta ao Ministro da Fazenda elaborada pelo Presidente do Banco Central devido ao não cumprimento da meta de inflação, é estimado que a contribuição da depreciação cambial de 2002 foi de 5,8 pontos percentuais sobre a inflação, respondendo a 46,4% do índice IPCA do período. Já nos relatórios de inflação de 2003, o Banco Central justifica a elevada inflação de 2003 pelo efeito inercial da inflação do ano anterior.

Gráfico 1 – IPCA mensal – Janeiro de 2001 a dezembro de 2003

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Gráfico 2 – IPCA mensal – Janeiro de 2000 a dezembro de 2015

Fonte: Elaboração própria com base em dados do IPEADATA

Gráfico 3 – IPCA anual - 2000 a 2015

Fonte: Elaboração própria com base em dados do IPEADATA

A percepção de risco do Brasil também se elevou, levando o índice que busca mensurá-lo como o Emerging Markets Bond Index + Brasil (EMB+ Brasil) de um patamar de 800 p.b. em janeiro de 2002 para mais de 2.000 p.b. no terceiro trimestre de 2002, sendo o maior nível em toda a série histórica até hoje. O EMBI é o benchmark utilizado para medir o desempenho

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diário dos títulos da dívida de países emergentes mostrando a diferença entre esses papéis em comparação ao retorno de títulos semelhantes do Tesouro dos Estados Unidos, sendo o EMBI+ Brasil composto apenas pelos títulos brasileiros comumente chamado de Risco-Brasil. A significativa elevação demonstra a aguda percepção de risco dos investidores e a desconfiança do mercado financeiro nos rumos da economia nacional frente a mudança presidencial para um partido que embora garantisse o cumprimento dos contratos, historicamente confrontou o capital financeiro e contrariou o pagamento da dívida pública.

Gráfico 4 – EMBI – Janeiro de 2000 a dezembro de 2015

Fonte: Elaboração própria com base em dados do IPEADATA

O governo começa então a encarar vários desafios. O de recuperar a confiança sobre as políticas futuras para tentar evitar a saída de capitais e seus desdobramentos sobre a dívida, o de saber avaliar se o impacto no nível de preços se limitaria a inflação do período ou se perduraria mesmo com a estabilização da taxa de câmbio, se era necessário aumentar a taxa de juros e em qual proporção e o do gerenciamento da queda da demanda por títulos para evitar uma crise de rolagem da dívida.

Nesse sentido, Blanchard (2004) e Favero e Giavazzi (2005) argumentam que um aumento na taxa de juros para diminuir os impactos inflacionários da taxa de câmbio adicionaria ainda mais dúvidas sobre a sustentabilidade futura da dívida, podendo levar ao agravo da saída de capitais e da depreciação. Para Giavazzi, Goldfajn e Herrera (2005), ainda havia o ponto

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crítico do alto nível da taxa de juros brasileira. O país entrou na crise com um nível elevado e incomum, e segundo os autores, baixá-la seria suficiente para levar a economia a um bom equilíbrio, apesar da impossibilidade de se realizar repentinamente. Tal nível poderia ser explicado, segundo Arida, Bacha e Resende (2005), pelos fundamentos fiscais ainda fracos do país e pela falta de interesse dos investidores em títulos de longo prazo do mercado doméstico. Para que a situação se invertesse, além da mudança de cenário internacional, era preciso conquistar a confiança do mercado para melhorar as expectativas futuras. A primeira medida que auxiliou nesse processo foi o anúncio em agosto de 2002 do acordo do Brasil com o FMI. O fundo concedeu o seu maior empréstimo até aquele momento, totalizando U$30 bilhões na modalidade de stand-by, ou seja, com o dinheiro disponível para saque quando necessário no período de 15 meses. Garantiu não só a segurança de reservas para o Banco Central como também o apoio aos candidatos para a manutenção de políticas responsáveis futuras.

Ainda visando controlar os efeitos das incertezas, a atuação do Banco Central não foi ao encontro do sugerido por Blanchard (2004) e Favero e Giavazzi (2005) pois em reação a crise fez uso dos instrumentos de política monetária tradicional via elevações da taxa de juros em 3 p.p. outubro, 1 p.p. em novembro e 3 p.p. em dezembro como mostra o gráfico 5 e via aumento de 45% para 60% da alíquota de recolhimento compulsório sobre depósitos à vista, bem como de instrumentos novos para o caso brasileiro, como a introdução do mecanismo dos swaps cambiais. (BRASIL, 2003, p. 7). Tais medidas vão de encontro com os princípios de reação de Taylor, já que a taxa nominal de juros foi ampliada além da expectativa de inflação, afetando a taxa real de juros com a finalidade de diminuir a demanda agrega, e consequentemente o produto e a inflação.

Segundo o Banco central, tais aumentos buscaram inibir os reajustes de preços e evitar a propagação dos choques de oferta, sem produzir efeitos excessivamente prejudiciais sobre o produto e a renda da economia, uma vez que contribuíram para a coordenação das expectativas. (BRASIL, 2003, p. 11).

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Gráfico 5 – Taxa de juros Selic – Janeiro de 2000 a dezembro de 2015

Fonte: Elaboração própria com base em dados do IPEADATA

Segundo o Relatório da Administração do Banco Central (2003, p. 7), as suas atuações e a do Tesouro permitiram estabilizar os deságios dos títulos públicos e reverter o processo de migração de recursos dos fundos de investimento. Foram beneficiadas pela atuação preventiva adotada na política monetária em 2000 e em 2001, onde se buscou alongar a dívida pública mobiliária evitando vencimentos entre o último trimestre de 2002 e o primeiro de 2003 e formar colchão de liquidez para o Tesouro.

Após efetiva confirmação da eleição de Lula em outubro de 2002, houve um esforço gigantesco do futuro presidente nos meses seguintes em construir uma imagem diferente das expectativas sobre ele. Ainda em 2002, anunciou que teria nomes do mercado em seu governo, como Henrique Meirelles para presidente do Banco Central, Marcos Lisboa para secretário de Polícia Econômica e Joaquim Levy para secretário do Tesouro Nacional. Logo após, Lula se comprometeu a manter as políticas adotadas pelo anterior presidente Fernando Henrique Cardoso como, por exemplo, manter a ampliação do superávit fiscal. No acordo firmado com o FMI já havia a exigência de 3,88% do PIB e o nomeado Ministro da Fazenda, Antônio Palocci, prometeu um alcance ainda maior, de 4,25% do PIB. O futuro presidente ainda se pronunciou sobre reformas no sistema da previdência, que junto as demais promessas acabou acalmando o mercado sobre a situação fiscal brasileira. A retomada da confiança foi capaz de reverter os

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fluxos de capitais já em janeiro de 2003, ficando positivo (U$1,1 bilhão) pela primeira vez desde março de 2002, sendo que em 2002 havia finalizado com U$30 bilhões negativos.

Logo, após toda a incerteza e a crise enfrentada, pode-se dizer que o país conseguiu se recuperar já no fim de 2003. Os spreads americanos anteriormente elevados voltam a normalidade, a avaliação de risco de crédito do país segundo a agência Fitch sobre de B para B+, o EMBI e as expectativas de inflação que estavam elevados voltam ao patamar antes da crise, a taxa de câmbio se estabiliza e a Selic passa a finalmente ser cortada. Segundo Blanchard (2004), 2003 foi totalmente o contrário de 2002,

3.2 DÍVIDA PÚBLICA BRASILEIRA

A dívida pública brasileira, em 2002, era composta por uma estrutura que a tornava sensível a flutuações de variáveis importantes como a taxa de juros e a taxa de câmbio. Era em sua maioria composta por letras financeiras do tesouro (LFT) títulos da dívida interna em moeda nacional pós-fixados, com rentabilidade atrelada à taxa Selic, notas do tesouro nacional (NTN) corrigidas pelo dólar e títulos da dívida externa (Global Bonds), que variavam diretamente com a taxa de câmbio.

Tabela 1 – Dívida Pública Federal (interna e externa) em 2002

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Tesouro Nacional

Uma das razões pelas quais grande parcela da dívida era indexada ao dólar era demanda por hedge do setor privado brasileiro, que se protegia da exposição ao câmbio via contratos de swap com o Banco Central. (GIAVAZZI; GOLDFAJN; HERRERA, 2005,p. 19). Apesar de trazerem o risco da desvalorização cambial para o governo, os títulos indexados pelo câmbio diminuíam a procura do setor privado por dólares. Já os títulos indexados pela Selic são

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vantajosos por terem prazos maiores e custos menores, apesar do risco de aumentar a contaminação da política fiscal pela política monetária.

Além disso, de acordo com a restrição orçamentária do governo quanto maior a relação dívida/PIB maior o potencial para uma dinâmica da dívida catastrófica. Como é possível identificar pelo gráfico 6 em 2002 tal razão estava em crescente tendência e a possibilidade de um presidente de esquerda não sinalizava que tal tendência iria amenizar através de uma política fiscal austera futuramente.

Gráfico 6 – Dívida total líquida do setor público como % do PIB – Janeiro de 2001 a dezembro de 2016

Fonte: IPEADATA

Sendo assim, a sensibilidade da dívida pública ao câmbio e aos juros somadas a relação dívida/PIB elevada poderiam levar a economia a um círculo vicioso de depreciação. Como o comportamento da taxa de câmbio brasileira dependia dos fluxos de capitais, o aumento da taxa de juros a fim de reter o capital estrangeiro poderia, ao invés de aumentar a demanda por real e gerar apreciação, ampliar a percepção de default dos agentes ao elevar o serviço da dívida e na verdade afastar o capital estrangeiro. Nesse cenário, a política monetária não poderia atuar sozinha pois seria preciso que a política fiscal se ajustasse a fim de gerar superávits capazes de modificar a taxa de câmbio real. (GIAVAZZI; GOLDFAJN; HERRERA, 2005, p. 19). Foi dentro dessa lógica em que a política monetária via alteração da taxa de juros acaba por impactar

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diretamente o orçamento que Blanchard desenvolveu o seu artigo a fim de investigar se a dominância fiscal prevaleceu no período.

3.3 LESSONS FROM BRAZIL

Em 2004, Oliver Blanchard publicou um artigo chamado “Fiscal Dominance and

Inflation Targeting: Lessons from Brazil” a fim de argumentar sobre a situação que o Brasil se

encontrava no período entre 2002 e 2003. Inicia destacando que nos modelos padrões de economias abertas, um aumento na taxa de juros para diminuir a inflação atua sobre dois canais: o da demanda agregada e o do câmbio, focando no segundo para o desenvolvimento de sua argumentação. Segundo o autor, no cenário já apresentado onde o aumento da taxa de juros significa o aumento a percepção de default, a utilização da taxa de juros como instrumento para controlar a inflação poderia ter feitos perversos, pois afastaria o capital estrangeiro.

Questiona quais seriam as condições necessárias para que tal aumento ocasionasse a depreciação da moeda local, ao invés de uma apreciação como sugerido pela lógica macroeconômica padrão. A fim de responder, desenvolve um modelo para apenas um período baseado em duas equações, a de fluxo de capitais (C) e a do risco de default (p). Ambas estão em função da probabilidade de default (p) e da taxa de câmbio (ϵ), para dados valores da política fiscal, da política monetária e de outros parâmetros, e são representadas por:

𝐶( (1 + 𝑟) − 𝜖𝑛−1 (1 + 𝑟∗) − (1 − 𝜆) 𝜃∗𝑝) + 𝑁(𝜖) = 0 (6) 𝑝 = 𝜓 (( 1+𝑟 1−𝑝+ 𝜆𝜃∗𝑝 1−𝑝) [𝜇𝜖 + (1 − 𝜇)]𝐷 − 𝑋) (7) Onde:

r e r* = taxa de juros real interna e externa ϵ = taxa de câmbio real

η = onde 0 ≤ η ≤ 1, quanto mais perto de 1 mais a taxa de câmbio futura se altera com a taxa de câmbio presente

θ = aversão ao risco do mercado

θ*= aversão ao riso dos investidores estrangeiros λ = como θ* > θ , θ = λ θ*, onde λ ≤ 1 p = probabilidade de default da dívida pública

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N (ϵ) = exportações líquidas como função do câmbio, onde N (ϵ) = NX , N' > 0 Ψ = relação da probabilidade de default com a dívida do próximo período, onde p = Ψ(D’) sendo Ψ > 0

D = dívida pública brasileira

μ = proporção da dívida em dólar sobre a dívida total, onde μ = D$

D

X = superávit primário

Segundo o autor, as equações retornam que quanto maior o nível inicial da dívida (D), ou a maior proporção desta em moeda estrangeira (μ) ou maior a aversão ao risco dos investidores estrangeiros (θ*), mais provável será que um aumento na taxa de juros ocasione uma depreciação cambial, e que todos esses fatores estavam profundamente presentes no cenário de 2002.

Logo após, faz uma observação à evidência empírica utilizando as equações modeladas como um guia para as estimações econométricas desses três parâmetros, determinando quando e se um aumento da taxa de juros iria gerar apreciação, através do canal tradicional, ou depreciação, devido a possibilidade de default.

Blanchard utiliza a equação de fluxo de capitais que retorna o mais forte e correto sinal para a taxa de juros e estima para o câmbio e para o risco de default, consecutivamente:

𝑙𝑜𝑔 𝜖 = 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡𝑎𝑛𝑡𝑒 − 0,21(𝑟 − 𝑟∗) + 12,43(𝜃𝑝) (8)

𝑝 = 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡𝑎𝑛𝑡𝑒 + 0,23𝐸𝐷′ 𝑜𝑛𝑑𝑒 𝐷′ = [(1+𝑟

1−𝑝+ 𝜆𝜃∗𝑝

1−𝑝) [𝜇𝜖 + (1 − 𝜇)]𝐷 − 𝑋] (9)

Tais relações podem ser explicadas da seguinte maneira: há um efeito direto de um aumento na taxa de juros sobre a taxa de câmbio, dada pela diferença dos juros (r - r*), que leva um aumento de 1% da Selic a uma apreciação de 0,21%. No entanto, o mesmo aumento leva a um aumento na dívida esperada, elevando a probabilidade de default e levando a depreciação. A magnitude desse efeito irá depender dos fatores já citados como a aversão ao risco dos investidores estrangeiros, do nível inicial da relação dívida/PIB e de sua composição. Assumindo λ = 0,5 e diferentes valores desses fatores representados pelas colunas, o autor estimou os efeitos de um aumento de 1% taxa na Selic sobre a taxa de câmbio, como demonstra a tabela:

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Tabela 2 - Efeitos de um aumento de 1% na taxa Selic sobre a taxa de câmbio

Fonte: Blanchard (2004) p. 30

Os valores das colunas 1, 3 e 5 se referem aos efeitos na depreciação de diferentes níveis de D, μ e θ* deixando os demais fatores na média do período. É interessante observar como a pouca diferença entre os níveis das linhas 3 e 4 geram impactos significativos. Um aumento da relação dívida/PIB de 53% para 63% é suficiente para mais que triplicar tal efeito, o que pode explicar a alta volatilidade no EMBI, segundo o autor. Para a proporção da dívida em dólar também é significativo, o que pode ter sido uma das razões pelas quais o governo se esforçou posteriormente para diminuir essa proporção.

Os valores em negrito da terceira linha se referem a média dos fatores entre janeiro de 1999 e janeiro de 2004, e implicam que o aumento de 1% na Selic naquele momento levaria a uma depreciação aproximada de 2,58% (sendo 2,79% de efeito indireto mais -0,21% de efeito direto da apreciação).

Os resultados obtidos por Blanchard na tabela 2 são fortes, uma vez que para quase todos os níveis, mesmo que não muito elevados, de dívida/PIB, proporção dessa em dólar e aversão ao risco é esperado uma depreciação cambial. Nesse sentido, o autor coloca em questionamento a eficácia da política monetária dentro do RMI, que utiliza a taxa de juros como principal instrumento. Segundo o autor, é preciso que exista um ambiente fiscal diferente do encontrado em 2002 para que um aumento na Selic refletisse em apreciação.

Ressalta algumas limitações do modelo como: não ser dinâmico, o que o faz depender apenas da dívida do próximo período e não da futura trajetória como um todo, faltar um alinhamento como tratamento da rigidez nominal, para justificar que a taxa de juros é controlada somente pelo Banco Central e para derivar os efeitos de alterações na taxa de câmbio sobre a inflação, e focar somente em um canal de transmissão da política monetária. Sobre o foco no canal do câmbio, acrescenta que apesar do canal da demanda agregada ser mais convencional,

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acredita que para o caso brasileiro pode não ser o mais forte. Pelas elevadas taxas de juros praticadas e ainda maiores taxas exigidas nos empréstimos a pessoas físicas e empresas, o Governo Brasileiro é que acaba sendo o maior tomador de empréstimos da economia, recaindo o aumento de juros principalmente sobre a dinâmica fiscal.

Sendo assim, o autor revela um cenário de dominância fiscal para o período, onde um aumento da taxa de juros para diminuição da inflação acaba por provocar depreciação ao expelir ainda mais o capital estrangeiro, agravar a situação fiscal e levar ao aumento futuro da inflação. Apesar de ir em encontro com Sargente e Wallace e com a TFNP ao considerar que a macroeconomia padrão pode não ser garantida em todos os cenários, principalmente sobre condições fiscais desfavoráveis, Blanchard modela uma suposição diferente ao demonstrar como a desconfiança sobre um possível default pode superar o efeito da atração da taxa de juros, invertendo o sinal da política fiscal sobre a política monetária.

Certamente a análise da política monetária deveria ser melhor explorada para se chegar as conclusões de Blanchard. Já em 2003, o governo brasileiro fez aumentos na taxa Selic na ordem de 0,5 p.p. e 1 p.p. em janeiro e fevereiro que não foram acompanhados de forte depreciação cambial, muito pelo contrário como mostrado no gráfico 7 com a trajetória decrescente da taxa de câmbio. Nesse sentido, o autor comenta que provavelmente o compromisso com a austeridade do novo governo acabou dominando qualquer efeito perverso da taxa de juros sobre a dinâmica da dívida. Dessa forma, os resultados não são gerais mas despertam a importância da percepção dos agentes sobre a conjuntura fiscal.

Referências

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