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O tratamento punitivo ao trabalho escravo no Brasil: considerações a partir dos princípios da dignidade da pessoa e do direito de liberdade

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GRANDE DO SUL

RENATA DOS SANTOS

O TRATAMENTO PUNITIVO AO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DOS PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA E

DO DIREITO DE LIBERDADE.

Três Passos (RS) 2015

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RENATA DOS SANTOS

O TRATAMENTO PUNITIVO AO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DOS PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA E

DO DIREITO DE LIBERDADE.

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS- Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: MSc. Ester Eliana Hauser

Três Passos (RS) 2015

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Dedico este trabalho a Deus por estar ao meu lado nas horas certas e à minha família, pelo apoio, incentivo e confiança em mim depositados durante toda a minha jornada.

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AGRADECIMENTOS

À minha família, que sempre esteve presente e me incentivou com apoio e confiança nas batalhas da vida e com quem aprendi que os desafios são as molas propulsoras para a evolução e o desenvolvimento, acreditando na minha capacidade.

À minha orientadora Ester Eliana Hauser, com quem eu tive o privilégio de conviver e contar com sua dedicação e disponibilidade, me guiando pelos caminhos do conhecimento.

Ao meu namorado, que por vários momentos me incentivou nesta jornada, e por muitas vezes compreendeu meus momentos de dificuldade.

À minha colega Dalila, que colaborou sempre que solicitada, com boa vontade e generosidade, enriquecendo o meu aprendizado.

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“Creio na liberdade onipotente, credora das nações robustas; creio na lei, emanação dela, o seu órgão capital, a primeira das suas necessidades; creio que, neste regime, não há outros poderes soberanos, e o soberano é o Direito, interpretado pelos tribunais; creio que a própria soberania popular necessita de limites, e que estes limites vêm a ser as suas Constituições..." Rui Barbosa

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O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise sobre a realidade do trabalho escravo no mundo atual e, em especial no Brasil, demonstrando que, em que pese a “escravidão” tenha sido abolida há séculos, muitos trabalhadores do século XXI continuam sendo explorados e submetidos a condições semelhantes a de escravidão e que, não obstante isso, a lei penal tem representado um frágil instrumento para o enfrentamento de tal questão. Procura demonstrar que, em que pese o significativo valor dos direitos atingidos, em especial a liberdade humana, mesmo nos casos em que se dá a penalização dos autores, a lei penal estabelece reprimendas insignificantes, face a dimensão da violação produzida e o grau de lesividade das condutas perpetuadas. Neste processo são violadas não somente garantias sociais trabalhistas, mas também o direito de liberdade e a própria dignidade de milhares de indivíduos todos os dias.

Palavras-Chave: Trabalho escravo. Dignidade da Pessoa Humana. Direito de Liberdade. Redução à condição análoga a de escravidão.

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This course conclusion work is an analysis of the reality of slave labor in the world today, and especially in Brazil, demonstrating that, despite the "slavery" was abolished centuries ago, many twenty-first century workers are still exploited and subjected to conditions similar to slavery and that, despite this, the criminal law has represented a fragile instrument for dealing with this issue. Seeks to demonstrate that, despite the significant value of the affected rights, especially human freedom, even where it gives the punishment of perpetrators, criminal law establishes insignificant reprimands, given the scale of the infringement produced and the degree of harmfulness the perpetuated conduct. In this process are violated not only labor social guarantees, but also the right to freedom and dignity of thousands of individuals every day.

Keywords: Slave labor. Dignity of human person. Right to Freedom. Reduction to a condition analogous to slavery.

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INTRODUÇÃO ...08

1 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, O DIREITO DE LIBERDADE E O

TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL ... Erro! Indicador não definido.1 1.1 A dignidade da pessoa na Constituição Federal Brasileira de 1988... 11 1.2 O direito de liberdade na Constituição Federal Brasileira de 1988 ... 17 1.3 O trabalho escravo no Brasil: considerações históricas e aspectos

contemporâneos ... 21

2 A TUTELA PENAL DA LIBERDADE E O TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ... Erro! Indicador não definido.8 2.1 O tratamento penal ao direito de liberdade e a organização do trabalho .... 30 2.2 O princípio da proporcionalidade e o crime de redução à condição análoga a escravidão: proibição do excesso x proibição de proteção deficiente ... 38 2.3 O trabalho escravo no Anteprojeto de reforma ao Código Penal e no projeto de Lei nº 236 do Senado Federal ... 42 2.4 A dignidade da pessoa humana, o direito de liberdade e o trabalho escravo – considerações criticas ... Erro! Indicador não definido.8

CONCLUSÃO ... 53

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo acerca da realidade do trabalho escravo e seu tratamento punitivo no Brasil, de acordo com o Código Penal Brasileiro, a Constituição Federal de 1988, tendo como base no princípio da dignidade da pessoa humana e o direito de liberdade.

A partir desse estudo pretendemos verificar qual é a realidade do trabalho escravo no Brasil e analisar qual é o tratamento jurídico dado a esta forma de trabalho pela lei penal brasileira, bem como se a proteção penal hoje conferida ao direito de liberdade, cerceado pela submissão ao trabalho escravo, pode ser considerada suficiente.

Para tanto são questões fundamentais ao presente estudo verificar a dimensão exata da exploração de trabalho escravo no Brasil, quais as políticas de enfrentamento as situações de trabalho escravo no país, se a tutela penal ao direito de liberdade é adequada e consegue frear, de forma significativa, as ações de exploração ao trabalho que se ampliam na atualidade e que submetem trabalhadores a condições análogas a de escravidão no país, bem como se a tutela hoje conferida pela lei penal é compatível com o respeito à dignidade humana e com a exigência de proporcionalidade, princípios estruturantes do Estado Democrático de Direito e do Sistema Punitivo.

Nesse viés, a principal justificativa para o tema proposto é analisar o país em que vivemos através da realidade exposta da escravidão, pois apesar da abolição da escravatura, grande parte da sociedade sofre por exploração no trabalho, algo que

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geralmente não se vislumbra punição. Nesse contexto, a temática possui especial relevância quando dimensionada a partir de princípios inseridos na sociedade, porquanto devem ser seguidos de modo a regularizar este cenário. É, pois, com o intuito de contribuir, senão para que a punição se torne efetiva, ao menos para fomentar o debate e enriquecer a reflexão sobre a matéria.

No que tange aos objetivos dessa pesquisa, busca-se abordar a dignidade da pessoa humana e o direito de liberdade, para fins de análise acerca do trabalho escravo no Brasil. Pretende-se analisar a dignidade da pessoa bem como compreender o direito de liberdade na Constituição Federal Brasileira de 1988, a partir de direitos fundamentais, avaliando a realidade do trabalho escravo no Brasil, descrevendo as formas, os locais e o âmbito de abrangência de tais atividades no país, com o fim de avaliar a tutela penal de liberdade e o trabalho escravo no Brasil, a partir de algumas considerações sobre o princípio da proporcionalidade.

Para tanto é discutido o tratamento penal dado ao direito de liberdade, verificando a proibição do excesso e a proibição da proteção deficiente, tendo em vista o princípio da proporcionalidade e o crime de redução à condição análoga a escravidão. Pretende-se também analisar o trabalho escravo no anteprojeto de novo Código Penal e no Projeto de Lei Nº 236 do Senado Federal, para obter uma conclusão acerca da dignidade da pessoa humana, do direito de liberdade e o trabalho escravo, a fim de melhor compreender as necessidades do país frente à proteção dada à sociedade.

Entrementes, a pesquisa está estruturada em dois capítulos. O primeiro capítulo trata do princípio da dignidade da pessoa humana, do direito de liberdade e o trabalho escravo no Brasil, para o qual se destinam três subtítulos, já no segundo capítulo discorre-se acerca da tutela penal de liberdade, o trabalho escravo no Brasil com considerações a partir do princípio da proporcionalidade.

Quanto à metodologia utilizada para esta pesquisa, foi do tipo exploratória. Utilizou-se no seu delineamento a coleta de dados em fontes bibliográficas disponíveis em meios físicos e na rede de computadores. Momento em que se observou a seleção de bibliografia e documentos afins à temática e em meios físicos

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e na Internet, interdisciplinares, capazes e suficientes para que responda o problema proposto, corrobore ou refute as hipóteses levantadas e atinja os objetivos propostos na pesquisa, a leitura e fichamento do material selecionado, bem como a reflexão crítica sobre o material selecionado e a exposição dos resultados obtidos através de um texto escrito monográfico.

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1 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, O DIREITO DE LIBERDADE E O TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL

O presente estudo versa sobre o trabalho escravo no Brasil e tem como referência os princípios presentes no texto da Constituição Brasileira de 1988, que consagram o valor da dignidade humana e os direitos fundamentais como instrumentos fundamentais à construção de um país melhor, sendo que demonstram a importância do respeito ao próximo e os direitos de cada ser humano. Entrementes, apesar destes princípios, ainda vislumbra-se a realidade do trabalho escravo no país, o que demonstra o descaso com a humanidade e a dignidade das pessoas a ele submetidas, pois a humilhação pela qual estes seres passam é histórica, passando despercebida para a maioria da sociedade brasileira.

1.1 A dignidade da pessoa na Constituição Federal Brasileira de 1988

O princípio da dignidade da pessoa humana está consagrado, na Constituição Federal de 1988, como um dos fundamentos da República Brasileira. Esta, inclusive surgiu como reação ao período autoritário anterior e foi a primeira na história do constitucionalismo pátrio a prever um título próprio destinado aos princípios fundamentais, situado na parte inaugural do texto, logo após o preâmbulo e antes dos direitos fundamentais.

A compreensão da ideia de dignidade humana exige, entretanto, um recorte histórico. Inicia-se, deste modo, com uma ideia de dignidade a partir da Segunda Guerra Mundial:

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, há reação de toda a nação diante da barbárie cometida pelos nazistas e fascistas. O interesse em proteger os direitos humanos e fundamentais, é ainda maior, tomando grandes proporções dentro do mundo jurídico, dando ensejo à criação de vários instrumentos de defesa, como os Pactos Internacionais, assim como a criação da ONU, a fim de resguardar o ser humano (CHEMIN, Disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-jan-23/importancia_principio_dignidade_humana_constituicao_88).

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Na sequência, foi criada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, isto no ano de 1948, a qual traz grande proteção ao ser humano, referente aos seus direitos e garantias. Acerca dos Direitos Humanos:

Os Direitos Humanos, tomados pelas bases de sua existencialidade primária, são assim aferidos da legitimação de todos os poderes sociais, políticos e individuais. Onde quer que eles padeçam lesão, a Sociedade se acha enferma. Uma crise desses direitos acaba sendo também uma crise do poder em toda sociedade democraticamente organizada (BONAVIDES, 2005, p. 574).

De acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948:

Artigo 1º

Todas os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

Artigo 2º

1. Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. [...]

Artigo 3º

Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Artigo 4º

Ninguém será mantido em escravidão ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas.

[...](http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf, acesso em 1º de junho de 2015).

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, que delineia os direitos humanos básicos, foi adotada pela Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. (site http://pt.wikipedia.org/wiki/Declara %C3%A7%C3% A3o _Universal _dos_Direitos_Humanos).

Entrementes, a referida Declaração dos Direitos Humanos traz

Em seu preâmbulo, governos se comprometem, juntamente com seus povos, a tomarem medidas contínuas para garantir o reconhecimento e efetivo cumprimento dos direitos humanos, anunciados na Declaração. Eleanor Roosevelt apoiou a adoção da DUDH como declaração, no lugar de tratado, porque acreditava que teria a mesma influência na comunidade internacional que teve a Declaração de Independência dos EUA para o povo americano. Nisto, ela se provou correta. Mesmo não obrigando [governos] legalmente, a DUDH foi adotada ou influenciou muitas constituições nacionais desde 1948. Tem se prestado também como fundamento para um

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crescente número de tratados internacionais e leis nacionais, bem como para organizações internacionais, regionais, nacionais e locais na promoção

e proteção dos direitos humanos

(sitehttp://unesdoc.unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf, acesso em 1º de junho de 2015).

Para Chemin (2009), com o término das guerras e períodos que suprimiram e mitigaram direitos, instaura-se visão de que a dignidade da pessoa humana passa a embasar qualquer direito, sendo a essência que projeta o ordenamento jurídico, passando a ter valor supremo e fundamental, logo convergem todas as demais leis a um único ponto. Isso, justamente para se evitar reações políticas, como as já apontadas anteriormente, de tornar o homem mercadoria, objeto de interesse dos demais.

Nesse sentido, a partir das ideias de Pauline de Moraes Chemin (2009), vislumbra-se a importância deste princípio:

Dessa forma, o princípio da dignidade da pessoa humana nasce para proteger o ser humano, mantendo e garantindo o viver com dignidade, e o respeito recíproco. No século XX, o homem busca felicidade, o viver dignamente, condutas respeitosas e confiança. No entanto, cabe ressaltar, que o pensar não deve estar voltado só para si, mas também no outro, de forma a realizar, não somente a sua própria felicidade, mas também a do próximo. Este princípio constitucional contemporâneo atinge toda a humanidade, é axioma jurídico e princípio matricial do século XX. A sua adoção no sistema jurídico estabelece uma nova forma de pensar e se relacionar o Direito. No século XXI torna-se uma garantia contra todas as formas de abjeção humana.

Cumpre salientar, quanto à dignidade da pessoa humana, como refere C. Starck (1981), citado por Sarlet (2009, p. 32), “de que o ser humano é dotado de um valor próprio e que lhe é intrínseco, não podendo ser transformado em mero objeto ou instrumento.” Para Sarlet (2009, p. 67), a dignidade da pessoa humana representa uma:

Qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência da vida em comunhão com os demais seres humanos.

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Diante disso, resta demonstrado que o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, se resume no respeito, na honra, nos direitos fundamentais efetivados, na seriedade, o que assegura uma existência decente das pessoas.

Lado outro, Ingo Wolfgang Sarlet (2009, p. 32), refere que no pensamento estoico a dignidade da pessoa humana era tida como:

Qualidade que, por ser inerente ao ser humano, o distinguia das demais criaturas, no sentido de que todos os seres humanos são dotados da mesma dignidade, noção da liberdade pessoal de cada indivíduo, bem como à ideia de que todos os seres humanos, no que diz com a sua natureza, são iguais em dignidade.

Segundo Santos (2007) em meados da Idade Média, Severino Boécio, formulou um novo conceito de pessoa para a época, o que foi posteriormente retomado por São Tomás de Aquino, acabando por influenciar a noção contemporânea de dignidade da pessoa humana, por defini-la como substância individual de natureza racional.

Entrementes Kant (apud SARLET, 1968, p. 134 e 141), traz uma ideia de pensamento racional, alegando que apenas seres racionais tem a autonomia de vontade para agir por si próprio e de acordo com as leis, com base nesta premissa:

o Homem, e, duma maneira geral, todo o ser racional, existe como um fim em si mesmo, não simplesmente como meio para uso arbitrário desta ou daquela vontade. Pelo contrário, em todas as suas ações, tanto nas que se dirigem a ele mesmo como nas que se dirigem a outros seres racionais, ele tem sempre de ser considerado simultaneamente como um fim.

Na verdade, este princípio é algo que subordina as pessoas, bem como todos os órgãos públicos e privados, os quais devem seguir e respeitar a legislação de modo a transmitir este respeito e proteção ao ser humano, para que haja uma base que fundamente a elaboração, a interpretação e aplicação das normas jurídicas.

Sarlet (2009) define dignidade da pessoa humana como um conceito inclusivo, pois sua aceitação não significa privilegiar a espécie humana acima de outras espécies, mas sim, aceitar que do reconhecimento resultam obrigações para com os outros seres e correspondentes deveres mínimos e análogos de proteção.

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A partir desta definição, pode-se observar que quem proporciona esta dignidade, nada mais é do que o próprio ser humano, e é este quem deve conduzir o seu próprio direito, bem como assegurá-lo para si. Algo que poderá ser dirigido também, a outras espécies, pois a dignidade constitui uma qualidade a ser conquistada.

Sarlet (2009) frisa, no entanto, a partir do pressuposto de que a dignidade não é objeto de desconsideração, que não devemos nos esquecer de que ela é disponibilizada para toda e qualquer pessoa, independente de sua raça, cor, classe social, e até mesmo em relação aos seus antecedentes criminais, todos somos iguais em dignidade, pois a partir de reconhecidos como pessoas, somos dignos de ser tratados como humanos, tendo direito a usufruir da dignidade da qual nos é conferida.

O reconhecimento no âmbito do direito constitucional positivo brasileiro, da dignidade da pessoa humana como fundamento de nosso Estado democrático de Direito refere-se ao artigo 1º, inciso III, da Constituição de 1988:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III - a dignidade da pessoa humana; (VADE MECUM, 2015, p. 05)

Entrementes, o princípio da dignidade da pessoa humana, como um princípio constitucional, é o princípio-matriz de todos os direitos fundamentais, onde a pessoa humana é melhor valorizada do que no Estado Liberal, posta em um patamar diferente.

Ainda, Sarlet (2009, p. 70) registra que:

a dignidade da pessoa humana foi objeto de expressa previsão no texto constitucional vigente mesmo em outros capítulos de nossa Lei Fundamental, seja quando estabeleceu que a ordem econômica tem por finalidade assegurar a todos uma existência digna (artigo 170, caput), seja quando, na esfera da ordem social, fundou o planejamento familiar nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável (artigo 226, § 6º), além de assegurar à criança e ao adolescente o direito à

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dignidade (artigo 227, caput). Mais adiante, no artigo 230, ficou consignado que “a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”. Assim, [...] a dignidade da pessoa e, nesta quadra, a própria pessoa humana, mereceram a devida atenção por parte da nossa ordem jurídica positiva.

De acordo com os pensamentos de Ingo Wolfgang Sarlet (2009), a finalidade deste princípio é assegurar ao mínimo os direitos do ser humano, os quais devem ser respeitados pela sociedade e pelo poder público de forma a preservar o valor social do homem. Por isso, faz parte de um direito fundamental elencado na Constituição Federal, que tem como fim garantir uma existência digna, devendo ser elencada não só diante da sociedade e do poder público, mas também frente às relações interindividuais de cunho civil e comercial.

Nesse viés, Ingo Wolfgang Sarlet (2009), diz que a positivação do princípio da dignidade da pessoa humana deu-se a partir do século XX, após a Segunda Guerra Mundial, momento em que passou a ser reconhecida expressamente nas Constituições e a contar da Declaração Universal da ONU de 1948.

A Segunda Guerra Mundial foi a grande instigadora para a normativização dos direitos fundamentais, de onde se originou o princípio da dignidade da pessoa humana. Nela viveram-se momentos de tortura, de violação dos seres humanos em sua honra, em seu corpo e até mesmo seu agir, momentos de grande sofrimento, o qual gerou a indignação e iniciativa com o intento de formar um Estado de respeito, direito e valores.

Ainda, importa analisar, com base no pensamento de Santos (2012), a imprescindibilidade de respeitar as pessoas individualmente, como também cabe ao Estado desenvolver meios para convivência em sociedade de maneira harmoniosa. Nesta seara, a norma Constitucional de 1988 concedeu à dignidade humana valor supremo e fundante da República Federativa do Brasil, a qual deve ser observada e seguida por todos indistintamente.

Como se pode verificar, ao olhar de Sarlet (2009) a dignidade, como qualidade intrínseca da pessoa humana, não poderá ser concedida pelo

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ordenamento jurídico. Isso significa que apesar da dignidade da pessoa humana correr risco de violação, em face da proteção e ao respeito por ela resguardado, esta não pode ser retirada do ser humano, pois lhe é uma condição inerente.

Ao olhar de Sarlet (2009, p. 79), o reconhecimento da condição normativa da dignidade, assumindo feição de princípio constitucional fundamental, não afasta o seu papel como valor fundamental geral para toda a ordem jurídica, mas, pelo contrário, outorga a este valor uma maior pretensão de eficácia e efetividade.

Com relação aos direitos fundamentais Schmitt (apud BONAVIDES, 2005, p. 561), estabeleceu dois critérios formais de caracterização:

Pelo primeiro, podem ser designados por direitos fundamentais todos os direitos ou garantias nomeados e especificados no instrumento constitucional. Pelo segundo, tão formal quanto o primeiro, os direitos fundamentais são aqueles direitos que receberam da Constituição um grau mais elevado de garantia ou de segurança; ou são imutáveis ou pelo menos de mudança dificultada, a saber, direitos unicamente alteráveis mediante lei de emenda à Constituição. Já no ponto de vista material, os direitos fundamentais, variam conforme a ideologia, a modalidade de Estado, a espécie de valores e princípios que a Constituição consagra. Em suma, cada Estado tem seus direitos fundamentais específicos.

No que tange aos direitos fundamentais, inicia-se uma discussão acerca da dignidade da pessoa humana, a partir de sua previsão na Constituição e como deve ser preservada.

1.2 O direito de liberdade na Constituição Federal Brasileira de 1988

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, foram estabelecidos em seu Título II, dos direitos e garantias fundamentais, sendo que para fins de organização, dividiu referido título em cinco capítulos: direitos individuais e coletivos, direitos sociais, nacionalidade, direitos políticos e partidos políticos.

Esta forma de organização corresponde à própria evolução dos direitos humanos que, por seu caráter histórico, foram se consolidando aos poucos, em

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consonância com a demanda de cada época, portanto, costuma-se dividi-los em gerações ou dimensões.

Para Paulo Bonavides (2005), a divisão está amparada no surgimento histórico dos direitos fundamentais, sendo que doutrinadores tem trocado o termo “gerações”, por “dimensões”, pois o termo “gerações” daria uma ideia de substituição, enquanto que os direitos fundamentais não se sobrepõem, um não substitui o outro.

Segundo Paulo Bonavides (2005), a divisão das dimensões é realizada, com base no lema da revolução francesa: liberdade (1ª dimensão), igualdade (2ª dimensão) e fraternidade (3ª dimensão).

Ainda, podemos afirmar que existem os direitos de primeira, segunda e terceira geração, mas há doutrinadores que dizem existir, ainda, a quarta e quinta geração.

Segundo Gilmar Antonio Bedin (2002), “a primeira geração de direitos surgiu com as declarações de direitos de 1776 (Declaração da Virgínia) e de 1789 (Declaração da França) e pode ser denominada de direitos civis ou liberdades civis clássicas”.

Bedin (2002), afirma que através destes direitos se estabelece um marco divisório, estando de um lado à esfera pública (Estado), do outro, a esfera privada (sociedade civil), pois é a partir da característica desta divisão que se estrutura o pensamento liberal e o pensamento democrático.

Nesse linha José Eliaci Nogueira Diógenes Júnior (http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11750>) registra que:

Os direitos de primeira geração ou dimensão referem-se às liberdades negativas clássicas, que enfatizam o princípio da liberdade, configurando os direitos civis e políticos. Surgiram nos finais do século XVIII e representavam uma resposta do Estado liberal ao Absolutista, dominando o século XIX, e corresponderam à fase inaugural do constitucionalismo no Ocidente. Foram frutos das revoluções liberais francesas e norte-americanas, nas quais a burguesia reivindicava o respeito às liberdades

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individuais, com a consequente limitação dos poderes absolutos do Estado. Oponíveis, sobretudo, ao Estado, são direitos de resistência que destacam a nítida separação entre o Estado e a sociedade. Exigem do ente estatal, precipuamente, uma abstenção e não uma prestação, possuindo assim um caráter negativo, tendo como titular o indivíduo.

Podem exemplificar os direitos de primeira dimensão o direito à vida, à liberdade, à propriedade, à liberdade de expressão, à liberdade de religião, à participação política, etc.

Percebe-se, deste modo, que o direito à liberdade corresponde aos direitos de primeira geração, definidos como direitos civis. Porém definir liberdade não é uma tarefa das mais fáceis, pois o termo é amplo, podendo ensejar variadas determinações. A Constituição Federal, entretanto, regulamenta o direito à liberdade como: liberdade de locomoção (art. 5º, inciso XV da CF); liberdade de opinião ou pensamento (art. 5º, inciso IV da CF); liberdade de expressão de atividade intelectual, artística, científica e de comunicação (art. 5º, inciso IX da CF); liberdade de informação (art. 5º, inciso 220 da CF); liberdade de consciência e crença (art. 5º, inciso VI da CF); liberdade de reunião (art. 5º, inciso XVI da CF); liberdade de associação (art. 5º, inciso XVII da CF) e liberdade de opção profissional (art. 5º, inciso XIII da CF).

No pensamento de Cunha Júnior (apud DUARTE, 2012, http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11053)

Por mais que a Constituição tenha definido o direito à liberdade nas formas acima elencadas, pode-se afirmar tratar-se a liberdade “de um direito subjetivo de buscar a felicidade e a satisfação pessoal, podendo fazer tudo aquilo não vedado pela lei [...].”

Na verdade, podemos dizer em outras palavras que:

O homem se torna cada vez mais livre na medida em que amplia seu domínio sobre a natureza e sobre as relações sociais. O homem domina a necessidade na medida em que amplia seus conhecimentos sobre a natureza e suas leis objetivas. Então, não tem cabimento sobre a discussão sobre a existência e não existência da liberdade humana com base no problema da necessidade, do determinismo ou da metafísica do livre-arbítrio, porque o homem se liberta no correr da história pelo conhecimento e consequente domínio das leis da natureza, na medida em que, conhecendo as leis da necessidade, atua sobre a natureza real e social para transformá-la no interesse da expansão de sua personalidade (SILVA,

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apud, DUARTE, 2012, http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1105 3).

Ao ver de Schmitt (apud BONAVIDES, 2005, p. 561), os direitos fundamentais compreendem direitos do homem, os quais possuem em face do Estado. Portanto, correspondem a uma concepção de direitos absolutos, que só excepcionalmente se relativizam “segundo o critério da lei” ou “dentro dos limites legais”.

Assim, pode-se conceituar a liberdade como:

O direito de agir segundo o seu livre arbítrio, de acordo com a própria vontade, desde que não prejudique outra pessoa, é a sensação de estar livre e não depender de ninguém. Liberdade é também um conjunto de ideias liberais e dos direitos de cada cidadão ( http://www.significados.com.br/liberdade/).

Quanto ao direito, este nasce da condição eminentemente social do ser humano e, vivendo desta forma, suas atitudes interferem na vida de outros homens. Para que esta interferência tivesse um caráter construtivo, foi necessário criar-se algumas regras que preservassem a paz nesse contexto, assim, de forma escrita ou não, algumas normas de comportamento foram formando-se ao longo do tempo, tornando-se hoje um grupo de regras as quais chamamos Direito (http://www.coladaweb.com/direito/direito-a-liberdade).

A partir destes conceitos de liberdade e de direito chega-se ao conceito que é o direito de liberdade, o qual é citado nas mais diversas formas, sempre considerando o indivíduo como parte de um grupo, no qual influi e do qual recebe influência, ou seja, torna-se necessário à vida em sociedade a definição de regras claras, escritas ou não, para um convívio harmonioso entre as pessoas.

O direito de liberdade é consagrado na Constituição Federal de 1988, na forma de todo o artigo 5º, que em seus diversos incisos se manifesta acerca do direito de liberdade, incluindo a liberdade civil, liberdade de consciência, liberdade de ensino, liberdade de imprensa, liberdade de pensamento, liberdade de religião, liberdade de reunião e liberdades individuais.

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A presente pesquisa interessa-se pela liberdade enquanto direito cerceado nas situações de trabalho escravo. Em que pese a principal preocupação, nestes casos, refira-se ao acesso aos direitos trabalhistas, classificados como direitos sociais de segunda geração, o estudo focará a violação da dignidade humana e o direito de liberdade.

1.3 O trabalho escravo no Brasil: considerações históricas e aspectos contemporâneos

Ao analisar a dignidade da pessoa humana, bem como o direito de liberdade de uma forma sucinta, percebe-se que, com a exploração de trabalho escravo no Brasil, tais valores são radicalmente violados.

O Brasil foi a última nação do mundo ocidental a abolir o trabalho escravo de forma oficial, o que ocorreu no final do século XIX. No entanto, em termos práticos, esse problema continua a existir nos dias atuais. Informações recentes estimam a ocorrência de 200 mil trabalhadores no país vivendo em regime de escravidão, segundo dados do Índice de Escravidão Global, elaborado por Organizações Não Governamentais (ONGs) ligadas à Organização Internacional do Trabalho (OIT) (http://www.brasilescola.com/brasil/trabalho-escravo-no-brasil-atual.htm).

O regime de escravidão é, segundo a OIT, todo o regime de trabalho degradante que prive o trabalhador de sua liberdade. Isso ocorre no Brasil, em maior parte, em espaços rurais distantes de centros urbanizados e rotas de transporte para fuga, onde os trabalhadores são geralmente coagidos a continuarem laborando sob

a alegação da existência de dívidas com fazendeiros.

(http://www.brasilescola.com/brasil/trabalho-escravo-no-brasil-atual.htm)

É possível afirmar que o trabalho escravo nunca foi abolido totalmente no território brasileiro. No entanto, apenas em 1995 o governo reconheceu oficialmente perante a OIT a existência desse tipo de problema no país, embora este tenha sido um dos primeiros no mundo a realizar esse tipo de pronunciamento. Atualmente, apesar da grande quantidade de trabalhadores escravizados no país, o Brasil é considerado internacionalmente um dos países mais avançados em esforços

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governamentais e não governamentais para acabar com esse problema. (http://www.brasilescola.com/brasil/trabalho-escravo-no-brasil-atual.htm)

Esta realidade precisa ser transformada para que se assegure o direito frente ao trabalho escravo, buscando sua eliminação, para que o trabalhador tenha acesso aos direitos sociais e trabalhistas mínimos, que lhe assegure dignidade e, simultaneamente, o exercício do direito de liberdade.

O conceito de trabalho escravo utilizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) é o seguinte: “forma de trabalho escravo é trabalho degradante, mas o recíproco nem sempre é verdadeiro. O que diferencia um conceito do outro é a liberdade”.(http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/brasil/projetos/documento.php ).

Infelizmente a grande miséria vivenciada pelo ser humano, o alto índice de desemprego, automação e a falta de políticas que viabilizem a reforma agrária, atraem muitos trabalhadores a se submeterem à condição análoga a de escravo. Diante disso, é que surge o Estado, intervindo através de normas para garantir o mínimo de dignidade possível ao trabalhador e ser humano, a fim de protegê-lo.

Para Bentemuller (2012), se estabeleceu a escravidão no Brasil a partir da chegada dos portugueses, onde a primeira relação de trabalho foi o “escambo”, no qual o povo indígena que aqui vivia era recompensado por novidades, como espelhos, pulseiras, materiais baratos, pois o povo nativo - que podemos ou chamar de aborígenes -, carregavam a madeira pau-brasil para os colonizadores.

Nesse contexto, para Bentemuller (2012), em Portugal, 1530, iniciou-se o período de colonização com o cultivo da cana-de-açúcar. A partir das primeiras expedições portuguesas ao Brasil deu-se inicio a escravidão indígena, normalmente recrutada de assentamentos jesuíticos. A Coroa portuguesa, nesse fio, legalizou a escravidão dos aborígenes e o fez por meio das Cartas de Doação das capitanias hereditárias, pois a mão de obra indígena, no século XVI, era cerca de três vezes mais barata que a negra.

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Ainda, Bentemuller (2012) reflete acerca do momento, em que, grandes expedições para a caça ao índio eram organizadas pelos bandeirantes paulistas, o qual levou a grande devastação das missões jesuíticas, provocando uma grande extensão do trabalho escravo. Então, a Legislação da Coroa reconheceu como sendo legal a compra de índios prisioneiros condenados pelas tribos ao sacrifício ritual. Estimulou-se as lutas intertribais, momento em que ocorreu o surgimento da “escravidão voluntária”, onde os índios eram estimulados pelos portugueses, ofereciam seus filhos como escravos, os quais perpetuavam essa condição aos seus filhos. Segundo Pedroso (2006, p. 50) “A mão-de-obra indígena foi um fator de contribuição decisivo no desenvolvimento econômico da colônia e o escravismo praticado levou a um efetivo genocídio do indígena de proporções incomparáveis”.

No entanto, surgiram as leis pombalinas:

As leis pombalinas de 1755 e 1758 aboliram a escravidão indígena, porém, não tiveram muita efetividade. Em 1766, uma Carta Régia autorizou a prisão dos índios vagabundos, o que, na realidade, eram sinônimos de índios livres, gerando a perpetuação da escravidão aborígene (BENTEMULLER, 2012, p. 04).

Diante do exposto, para Bentemuller (2012), eram os jesuítas quem lucravam com a liberdade dos índios, pois o aborígene explorava as drogas do sertão (guaraná, cacau, gengibre, baunilha), e mantinham a catequização destes.

Lado outro, Bentemuller (2012), passou a não mais interessar a escravidão do índio, nem para a Igreja e nem para a burguesia, pois os lucros com o tráfico negreiro eram mais exorbitantes, sendo que o dinheiro era repartido entre os traficantes, a Coroa Portuguesa e a Igreja Católica.

Na sequência, para Bentemuller (2012), iniciou-se a escravidão do negro africano, o qual foi trazido para trabalho em canaviais e engenhos de açúcar, mais precisamente no ano de 1559, quando o tráfico negreiro teve seu inicio oficialmente. Cerca de 40.000 (quarenta mil) escravos africanos foram trazidos ao Brasil entre os anos de 1576 e 1600, triplicando este número, indo para aproximadamente 150.000 (cento e cinquenta mil) entre os anos de 1601 e 1625.

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Os escravos, tanto os negros, quanto os índios, sofriam maus tratos, bem como trabalhavam por até 18 horas diárias. Entrementes, Rodrigo Garcia Schwarz (2008, p.98), traz uma analise de momentos de rebeliões e fuga dos escravos:

Por volta do século XVI foram descobertas as “minas gerais” na região central do Brasil, provocando a migração da sociedade colonial do litoral para o interior. O africano passou a ser mais explorado que nos canaviais, levando ao aumento das fugas, formação de quilombos, matança dos senhores, rebeliões e suicídios. Entre 1720 e 1741, a quantidade de escravos trazidos ao Brasil superou a marca de 310.000 (trezentos e dez mil).

Não havia controle algum dos Senhores frente aos escravos no processo de mineração, o que ensejava aos negros esconder minérios para, futuramente, comprar a própria alforria (BENTEMULLER, 2012, p. 05).

Em prosseguimento, se deu o inicio do movimento abolicionista:

O sistema capitalista não comportava mais o escravismo, era necessário o trabalho assalariado para a formação de um mercado consumidor dos produtos industrializados. A Inglaterra, pólo central de desenvolvimento da Revolução Industrial, estimulava a migração do sistema mercantilista para o industrial. As colônias inglesas, localizadas nas Antilhas, não mais utilizavam a mão de obra escrava, assim, o açúcar produzido se tornava mais caro que o brasileiro, que era beneficiado pela manutenção do escravismo, prejudicando os interesses ingleses (BENTEMULLER, 2012, p. 05).

Mas apesar da declaração oficial do fim do trabalho escravo no Brasil a partir da Lei Áurea em 1888, a realidade de exploração ainda persiste.

A assinatura da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, representou o fim do direito de propriedade de uma pessoa sobre a outra, acabando com a possibilidade de possuir legalmente um escravo no Brasil. No entanto, persistiram situações quem mantêm o trabalhador sem possibilidade de se desligar de seus patrões. Há fazendeiros que, para realizar derrubadas de matas nativas para formação de pastos, produzir carvão para a indústria siderúrgica, preparar o solo para plantio de sementes, algodão e soja, entre outras atividades agropecuárias, contratam mão-de-obra utilizando os contratadores de empreitada, os chamados “gatos”. Eles aliciam os trabalhadores, servindo de fachada para que os fazendeiros não sejam responsabilizados pelo crime (SAKAMOTO, 2006, p. 27).

Nesse sentido, ao discorrer sobre o trabalho escravo, Ela Wiecko V. de Castilho (2008, p. 07), menciona a importância da penalização ao tráfico de pessoas, uma vez que tais condutas encontram-se totalmente relacionadas.

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Além da obrigação dos Estados Partes de estabelecer medidas de natureza administrativa e civil visando modificar as práticas análogas à escravidão, de mulher crianças, a Convenção fixou a obrigação de definir como crimes, entre outras, a conduta transportar escravos de um país a outro, de mutilar ou aplicar castigos, de escravizar alguém ou de incitar alguém a alienar a sua liberdade ou de quem esteja sob sua autoridade.

A preocupação com o tráfico de pessoas surgiu especialmente em razão do fenômeno do tráfico de mulheres para fins de exploração sexual, assim como o favorecimento à prostituição como aliciamento (Castilho, 2008, p. 07). Além disso, cresceu a preocupação com as crianças e adolescentes, abrangendo também, todas as mulheres:

A Convenção de 1910 definia o tráfico e o favorecimento à prostituição como o aliciamento, induzimento ou descaminho, ainda que com o seu consentimento, casada ou solteira menor, para a prostituição. Tratando-se de mulher casada ou solteira maior, a conduta só deveria ser punida se aquelas condutas tivesse sido praticadas “com fraude ou por meio de violências, ameaças, abuso de autoridade ou qualquer outro meio de constrangimento”. Era permitido, porém, aos Estados Partes dar a mesma proteção à mulher casada ou solteira maior independentemente da fraude ou constrangimento.

Pode-se visualizar que a proibição do trabalho escravo trouxe melhoras à realidade brasileira, apesar de que, ainda existem casos em nosso país que são encobertos, na maioria das vezes, não são descobertos pelas autoridades, para fins de punição.

No tocante a esta questão, vale mencionar que:

O governo federal brasileiro assumiu a existência do trabalho escravo contemporâneo perante o país e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1995. Assim, o Brasil se tornou uma das primeiras nações do mundo a reconhecer oficialmente a ocorrência do problema em seu território. De 1995 até 2014, mais de 47 mil trabalhadores foram libertados de situações análogas a de escravidão (http://www.escravonempensar.org.br/sobre-o-projeto/o-trabalho-escravo-no-brasil/).

Nesse viés, a partir da informação de Bremer (2009), através de dados fornecidos pela Rede Social Justiça e Direitos Humanos e do Movimento Humanos Direitos, evidencia-se que entre 25 mil a 40 mil pessoas, ainda são vítimas do trabalho escravo no Brasil.

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Ainda, para Kalil:

segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o tráfico de pessoas movimenta aproximadamente 32 bilhões de dólares por ano. Ainda, a OIT coloca que se trata de uma violação de direitos humanos que já atingiu 2,5 milhões de pessoas no mundo, sendo que 57% esteve envolvido com o tráfico de pessoas para fins de trabalho escravo. (Disponível

em:<http://www.cptnacional.org.br/index.php/publicacoes/noticias/artigos/27 42-trafico-de-pessoas-e-escravidao-moderna> acesso em outubro de 2015)

Por outro lado, o processo de libertação de trabalhadores escravizados alerta para uma situação extremamente assustadora, uma vez que o número de pessoas libertadas é muito elevado, tendo em média cinco libertações ao dia no país.

Nesse sentido, o site da Secretaria de Direitos Humanos, Presidência da República divulga dados estatísticos do Trabalho escravo no Brasil.

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Fonte: Disque 100 – SDH

A partir dos dados acima apresentados, os quais trazem um comparativo de denúncias no disque 100, por grupo vulnerável e por violação, nota-se um aumento excessivo nas denúncias, tendo como a violação mais denunciada a jornada excessiva de trabalho, que no ano de 2011, somando os grupos vulneráveis, tem-se um total de 30 denúncias, sendo que no ano de 2012, o mesmo grupo vulnerável tem um histórico de 100 denúncias.

Portanto, é notável um aumento excessivo nas denúncias, pois cada vez mais a sociedade está consciente de seus direitos.

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Nesse sentido, a partir das notícias reproduzidas pelo site Justificando (http://justificando.com/2015/10/23/20-marcas-da-industria-textil-que-foram-flagradas -fazendo-uso-de-trabalho-escravo-/), foram flagradas, 20 (vinte) marcas de indústrias têxtis fazendo o uso do trabalho escravo no Brasil, sendo elas a Renner, loja varejista de roupas, as Marias, Seiki, Resgate, Unique Chic, Atmosfera, M. Officer, Fenomenal, Le Lis Blanc e Bo.Bô, Cori, Emme e Luigi Bertolli, bem como a Gangster, Hippychick, Talita Kume, Gregory, Caso Zara, Collins, Pernambucanas, 775, IBGE e as lojas Marisa.

Nessa senda, todas estas indústrias praticavam o crime de redução à condição análoga a escravidão, onde os trabalhadores tinham sua dignidade e liberdade violadas, sendo explorados e submetidos a situações indignas.

Diante desta realidade ainda, percebe-se a necessidade da aplicabilidade dos princípios constitucionais no agir do ser humano, algo que traz uma base a ser introduzida no dia-a-dia de cada um.

Por outro lado cabe também discutir o papel cumprido pela lei penal em relação ao enfrentamento do trabalho escravo no Brasil, uma vez que em que pese esta conduta estar criminalizada evidenciam-se taxas significativas de exploração.

Neste sentido importante avaliar se e em que medida as sanções penais previstas são adequadas, considerando o princípio da proporcionalidade, para a proteção ao direito de liberdade. Para isso impõe-se uma análise da legislação penal brasileira em vigor, bem como um estudo em torno do tratamento punitivo ao trabalho escravo no Anteprojeto de reforma ao Código Penal e no Projeto de Lei Nº 236 do Senado Federal, bem como quanto à dignidade da pessoa humana, o direito de liberdade e o trabalho escravo. Mas este será o tema do próximo capítulo.

2. A tutela penal da liberdade, o trabalho escravo no Brasil: considerações a partir do princípio da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana.

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Como visto no capítulo anterior o trabalho escravo no Brasil teve início a partir da descoberta do país pelos portugueses, os quais exploraram inicialmente o trabalho do índio e, posteriormente, a mão de obra de negros trazidos do continente africano.

No decorrer do tempo, houve a abolição da escravidão, momento em que foram criadas leis abolicionistas, as quais serviram como forma de combate à escravidão. No entanto a realidade vivenciada no país indica a persistência da exploração do trabalho, em condições semelhantes as vivenciadas por negros nos séculos XVII e XVIII.

Nos dias de hoje, o trabalho escravo ainda se mostra presente, pois mesmo após sua abolição e diante das penalidades previstas, ainda existe o explorador do trabalho escravo, aquele que infringe a legislação penal, bem como a norma constitucional que trata do direito de liberdade.

Segundo a OIT (apud PENA 2009, p. 01):

É considerado escravo todo o regime de trabalho degradante que prive o trabalhador de sua liberdade. Isso ocorre no Brasil, em maior parte, em espaços rurais distantes de centros urbanizados e rotas de transporte para fuga, onde os trabalhadores são geralmente coagidos a continuarem laborando sob a alegação da existência de dívidas com fazendeiros.(http://www.brasilescola.com/brasil/trabalho-escravo-no-brasil-atual.htm)

Para o enfrentamento desta forma de violência foram produzidas, no país, normas penais cujo intuito é tutelar o direito de liberdade consagrado como Direito Fundamental pela Constituição Federal de 1988. O direito penal, por sua vez, tem a função primordial de proteção de bens jurídicos que sejam essenciais à coexistência e desenvolvimento do homem.

Para cumprir tal desiderato, em um Estado democrático de Direito, o legislador seleciona os bens especialmente relevantes para a vida social e, por isso mesmo, merecedores da tutela penal” (PRADO, 2013, p. 70).

Nesse viés, ao discutir a relação entre direitos fundamentais e Direito Penal, Feldens (2005, p. 94) observa que a Constituição brasileira

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Ao prescrever determinadas matérias sujeitas à necessidade de tutela penal, a Constituição teve em mente a magnitude desses bens. Todavia, isso não significa que esses bens ocupem, necessariamente, uma posição de primazia valorativa, nem mesmo na consciência do constituinte. O provável, aliás, seja o contrário. Quiçá por desconfiar do juízo de conveniência inerente ao legislador penal, a Constituição impôs a criminalização de condutas atentatórias a determinados bens jurídicos, os quais não se pode afirmar – pelo menos em tom de generalidade – sejam os mais valiosos previstos na própria Constituição, sendo que não necessitava fazer o mesmo em relação à proteção da vida, por exemplo, certamente porque a necessidade de sua proteção se lhe afigurava, desde já, como uma evidência.

Dentre as normas de cunho penal, destaca-se o delito de redução a condição análoga a de escravidão, insculpida no art. 149 do Código Penal. Isso porque a exploração de trabalho escravo fere garantias trabalhistas, mas especialmente a liberdade pessoal do sujeito, bem como à dignidade da pessoa humana. Estes têm a sua liberdade ferida quando são privados do seu direito à liberdade de ir e vir (status libertatis), e a sua dignidade, momento em que são submetidos a condições degradantes e desumanas de trabalho.

No que tange às condições à que são submetidos os trabalhadores, no caso o trabalho forçado e o trabalho degradante, passamos a diferenciá-las e classifica-las.

A condição de trabalho forçado é conceituado a partir do entendimento da OIT, que diz que

é “todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual ela não tiver se oferecido espontaneamente”. Pode-se entender, portanto, que sua principal característica é o trabalho compulsório na relação de trabalho, limitando ou extinguindo a liberdade de ir e vir do empregado. (http://www.trabalhosfeitos.com/ensaios/Diferen%C3%A7a-Entre-Trabalho-For%C3%A7ado-e-Degradante/410037.html).

Ainda, quanto à condição de trabalho degradante, segue-se a definição de Luis Camargo de Melo:

“Submissão às condições precárias de trabalho pela falta ou inadequado fornecimento de boa alimentação e água potável; alojamento sem as mínimas condições de habitação e falta de instalações sanitárias; não utilização de transporte seguro e adequado aos trabalhadores; não cumprimento da legislação trabalhista, desde o registro na CTPS, passando

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pela falta de exames médicos admissionais e demissionais, até a

remuneração ao empregado”

(http://www.trabalhosfeitos.com/ensaios/Diferen%C3%A7a-Entre-Trabalho-For%C3%A7ado-e-Degradante/410037.html).

Entrementes, após a definição e diferenciação das condições de trabalho do ser violado, se faz necessário avaliar a tutela penal conferida ao direito de liberdade e algumas questões a respeito da organização do trabalho, o que será tratado no próximo capítulo.

2.1 A proteção penal ao direito de liberdade e a organização do trabalho

Como mecanismos destinados a impedir a violação ao direito de liberdade inúmeros são os dispositivos que visam protege-la em suas mais diversas formas. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 define, no artigo 4º, a liberdade como:

Poder fazer tudo o que não prejudique a outrem: em consequência, o exercício dos direitos naturais de cada homem só tem por limites os que assegurem aos demais membros da sociedade a fruição desses mesmos direitos. Tais limites só podem ser determinados pela lei (DECLARAÇAO, 1789, p.1).

De igual forma, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 proclama os ideais de liberdade.

I - todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos;

II - todo homem tem capacidade para gozar os direitos e liberdades estabelecidas nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição;

III - todo homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal; IV - ninguém será mantido em escravidão ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas (ONU, 2009, p. 01).

Do mesmo modo, no texto da Constituição Brasileira podem ser encontrados inúmeras referências ao Direito de Liberdade e, de igual modo, garantias destinadas à sua proteção.

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No âmbito da legislação penal brasileira a proteção ao direito de liberdade encontra-se consagrada no capítulo VI do título I da Parte Especial do Código Penal. A partir do art. 146 o legislador define inúmeras condutas ofensivas ao direito de liberdade prevendo sanções de natureza penal para os infratores.

O capítulo está dividido em quatro seções, sendo que em cada uma delas protege-se um aspecto distinto do direito de liberdade. Na primeira seção estão definidos os crimes contra a liberdade individual, sendo eles o constrangimento ilegal (art. 146), a ameaça (art. 147), o sequestro e o cárcere privado (art. 148) e a redução a condição análoga a de escravidão (art. 149). Os bens protegidos por tais normas são a liberdade de autodeterminação, a tranquilidade, a intimidade, o direito de ir e vir e a própria dignidade da pessoa humana.

Na segunda seção está definido o crime de violação e domicílio. Neste delito (art. 150) o direito protegido é inviolabilidade domiciliar.

Já a terceira seção dispõe acerca dos crimes contra a inviolabilidade de correspondência, como a violação de correspondência (art. 151, caput), a sonegação ou destruição de correspondência (I, § 1º do art. 151) e a violação de comunicação telegráfica, radioelétrica ou telefônica (II e ss., § 2º do art. 151), bem como a correspondência comercial (art. 152), onde o bem jurídico protegido é a liberdade individual da inviolabilidade do sigilo.

Ainda, na quarta seção estão definidos os crimes contra a inviolabilidade de segredos, sendo eles a divulgação de segredo (art. 153) e a violação de segredo profissional (art. 154 e 154-A), a partir dos quais tem como bem jurídico protegido a preservação de atos ou fatos secretos ou confidências.

O crime de redução a condição análoga a de escravidão está situado no capítulo IV, nos crimes contra a liberdade individual e na seção I, dos crimes contra a liberdade pessoal, isto no artigo 149 do Código Penal Brasileiro:

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Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a csujeitando-ondições degradantes de trabalhsujeitando-o, quer restringindsujeitando-o, psujeitando-or qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

§ 1o Nas mesmas penas incorre quem:

I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;

II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

§ 2o A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: I – contra criança ou adolescente;

II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. (VADE MECUM, 2015, p. 534)

Na verdade, para Bremer (2009), em pleno século XXI, para caracterizar nítida redução a condição análoga a de escravo, se faz necessária a submissão por sujeição absoluta, ou seja, a escravidão, pois conforme a Lei a submissão deve ser por completo, impedindo o sujeito, de exercer o seu direito à liberdade.

Logo, é de grande importância para Silva (2014, http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=14231), discorrer acerca da presença do direito de liberdade no crime em discussão:

Enfim, não se pode olvidar que o elemento mais importante para a definição do crime não é o cerceamento da liberdade nem a simples lesão à saúde da pessoa, mas a existência de uma relação trabalhista a justificar tais violações. Caso inexista relação ou vínculo trabalhista entre autor e vítima, não se configura o crime de redução à condição análoga de escravo, devendo, neste caso, verificar a presença de outros elementos a tipificarem algum crime relacionado à ameaça, violência ou à restrição da liberdade.

Importa salientar que, existe uma classificação direta a esse crime:

O crime é classificado como permanente, ou seja, aquele em que o momento consumativo se protrai no tempo por vontade do sujeito ativo. Tendo tal fato em vista, é possível prisão em flagrante enquanto perdurar a conduta (BREMER, Felipe Fiedler, 2009, p. 10).

Outrossim, cabe ressaltar que, a jurisprudência deixa claro que quando o sujeito coloca a si próprio em situação de sujeição total, não caracteriza-se crime por parte do réu, pois foi de livre e espontânea vontade do réu submeter-se à esta situação.

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Deste modo, através da penalização atribuída a tal crime, chegamos à conclusão de que são raras as pessoas que são penalizadas por isto, sendo que na maioria das vezes a tutela é trabalhista e não penal.

A partir da penalização prevista ao delito de redução a condição análoga à de escravo, tem-se que o trabalho escravo não é caracterizado apenas por infrações trabalhistas, mas sim por infringir a liberdade e a dignidade da pessoa humana. De acordo com as ideias de Bremer (2009, p. 13), se faz necessário alguns comentários acerca da competência para julgamento:

Conforme Informativo 450 daquele Tribunal, a competência para julgamento do crime de redução à condição análoga à de escravo pertence à justiça federal na maioria dos casos, tendo em vista que quaisquer condutas que violem não só o sistema de órgãos e instituições que preservam, coletivamente, os direitos e deveres dos trabalhadores, mas também o homem trabalhador, atingindo nas esferas em que a Constituição lhe confere proteção máxima, enquadram-se na categoria dos crimes contra a organização do trabalho, se praticadas no contexto de relações de trabalho.

Além da tutela ao direito de liberdade, a legislação penal também descreve condutas típicas que atentam contra a organização do trabalho. Nestes casos pretende-se tutelar a liberdade de trabalho, inserida dentre os direitos fundamentais elencados na Constituição brasileira de 1988.

Segundo Queiroz (ano, p. 460-461) ao tipificar tais delitos a preocupação inicial do legislador era proteger os fatores econômicos relativos a atividade produtiva e não propriamente a dimensão social do trabalho e de sua prestação por parte de quem o necessita. Para o autor, na atualidade, tais delitos precisam ser vistos a partir dos bens jurídicos dignidade, liberdade, segurança do trabalho, valores que se conectam com a dimensão social do trabalho, adequando-se a norma penal as disposições constitucionais.

Nestes elementos se é possível, plenamente, enaltecer a liberdade do exercício laboral com bem máximo tutelado, porque há interesse público quanto a sua preservação. Trata-se de parcela evidente do princípio fundamental liberdade e por consequência da própria dignidade humana, valor absoluto e eixo vetor de toda ordem jurídica e política brasileira. Significa dizer que a reserva penal estatuída nestes tipos, ainda que um único individuo seja diretamente atingido, transcende o enfoque individual

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do trabalhador como vítima destas figuras típicas, porque há interesse coletivo quanto a garantia dos princípios da liberdade e, sobretudo, da dignidade humana. (FRANCISCO, 2013, p. 461).

Considerando o bem jurídico mencionado são tipificadas diversas condutas que atentam contra a organização do trabalho, que ocorrem quando é ferida a liberdade individual do trabalhador, o que está juridicamente disposto nos artigos 197 a 207, os quais estão dispostos no título IV da Parte Especial do Código Penal brasileiro. Tendo em vista os objetivos do presente trabalho serão analisados somente os delitos que, de forma direta, atentam contra a liberdade do trabalhador.

Entrementes, o atentado contra a liberdade de trabalho trata-se do primeiro crime contra a organização do trabalho, o qual está disposto no artigo 197 do Código Penal Brasileiro, e como dito por Junqueira (2009, p. 253) “o bem jurídico tutelado é a liberdade, com a especificidade da referência às relações de trabalho. Tem como hipóteses frequentes as turbações ao direito de trabalho e greve”1

.

Já o artigo 198 do mesmo Código, dispõe acerca do crime de atentado contra a liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta, que se dá sempre que alguém for constrangido, “mediante violência ou grave ameaça, a celebrar contrato de trabalho, ou a não fornecer a outrem ou não adquirir de outrem matéria prima ou produto industrial ou agrícola”, com penas de detenção e multa. Junqueira (2009, p. 255) refere que

O tipo é confuso, pois mistura condutas, normas e bens jurídicos diferentes, eis que fala em primeiro da liberdade de celebrar contrato de trabalho, e então do isolamento econômico forçado em boicote. Muito melhor seria a separação das condutas em tipos diferentes.

Ainda, separando as condutas, elencamos o atentado à liberdade de contrato de trabalho a ter como objeto jurídico a liberdade de contratar, já a

1 O art. 197 tipifica a conduta de “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça:

I- a exercer ou não exercer arte, ofício, profissão ou indústria, ou a trabalhar ou não trabalhar durante certo período ou em determinados dias.

Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência;

II- a abrir ou fechar o seu estabelecimento de trabalho, ou a participar de parede ou paralisação de atividade econômica:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência”. (VADE MECUM, 2015, p. 541)

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boicotagem violenta tem como bem jurídico tutelado é o direito a participar do livre mercado e a livre iniciativa.

Na mesma toada, se faz necessário a analise do artigo 199 do Código Penal Brasileiro2, o qual dispõe sobre o delito de atentado contra a liberdade de associação, tendo como bem jurídico tutelado a liberdade de associação, o que Junqueira (2009, p. 256) deixa explícito:

O direito de associação é constitucional, e não pode sofrer restrições não previstas na Constituição, sendo verdadeiro esteio da democracia. O pensamento ganha força quando tem maior número de adeptos, e passa a protagonizar posição política na sociedade.

Já no que se refere ao artigo 2033 do Código Penal, aí está imposta a pena ao crime de frustração de direito assegurado por lei trabalhista, no qual se tem como bem jurídico tutelado a proteção de todo e qualquer direito que seja protegido pela legislação trabalhista. Segundo Francisco (2013) trata-se de norma penal em branco, que será complementada pela Consolidação das Leis do Trabalho e pela Constituição Federal. O mesmo autor observa, em relação a este dispositivo que

Esta forma de submissão humana, extraindo do indivíduo sua força de trabalho sem compensá-lo como prevê a lei trabalhista, ou cerceando-lhe a liberdade de locomoção ou de opção para aquisição de mercadorias, é sem dúvida, algo abjeto, desprezível, inclusive porque em certa medida assemelha-se a escravidão. Porquanto deveria ter e que merecido na legislação penal reprimendas mais severas. (FRANCISCO, 2013, p. 482).

2 O art. 199 tipifica a conduta de “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a participar ou

deixar de participar de determinado sindicato ou associação profissional:

Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência”. (VADE MECUM, 2015, p. 541)

3 O art. 203 tipifica a conduta de “Frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do

trabalho:

Pena – detenção, de 1 (um) ano a 2 (dois) anos, e multa, além da pena correspondente à violência. § 1.º Na mesma pena incorre quem:

I – obriga ou coage alguém a usar mercadorias de determinado estabelecimento, para impossibilitar o desligamento do serviço em virtude de dívida;

II – impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza, mediante coação ou por meio de retenção de seus documentos pessoais ou contratuais.

§ 2.º A pena é aumentada de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço) se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental”. (VADE MECUM, 2015, p. 541)

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