• Nenhum resultado encontrado

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA"

Copied!
15
0
0

Texto

(1)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017

1

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA Relações InteRnacIonaIs PaRa educadoRes (RIPe)

Issn: 2318-9390 | v. 4, 2017 | P. 9-22

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA

TENSIONS AT THE SOUTH CHINA SEA Daiana Winter Jung1 João Estevam dos Santos Filho1 Mateus Schneider Borges1

RESUMO

Este artigo trata das tensões envolvendo a região conhecida como Mar do Sul da China. O objetivo do trabalho é demonstrar que tais problemas são ao mesmo tempo fruto de disputas regionais, geralmente territoriais, que envolvem a construção da própria Ásia e especificamente da região tratada, mas também resultado de uma disputa político-militar e econômica a nível global, entre duas grandes potências: China e Estados Unidos. Por esses fatores, o Mar do Sul da China configura-se como uma importante área a ser estudada e geopoliticamente relevante para entender a configuração do Sistema Internacional. Palavras-chave: Mar do Sul da China; Tensões; Sistema Internacional.

1 INTRODUÇÃO

O Mar do Sul da China ou Mar da China Meridional é um mar marginal1, fazendo parte do Oceano Pacífico. A sua área cobre cerca de 3,5 milhões de km², possuindo centenas de ilhotas que formam o arquipélago do Mar do Sul da China. Os Estados que possuem acesso ao mar da China Meridional são a República Popular da China, Hong Kong, Macau, Repú-blica da China (Taiwan), Filipinas, Malásia, Brunei, Indonésia, Singapura, Tailândia, Cam-boja e Vietname. Sua importância geoestratégica se dá devido a disputas políticas e eco-nômicas na região, que é conhecida como “garganta do Pacífico” por reunir num pequeno espaço o tráfego de recursos naturais, como gás natural e petróleo, e outras mercadorias do comércio internacional dos Estados que ali residem, além dos Estados Unidos. Os EUA têm cerca de 1,2 trilhão de dólares transitando na região. “É uma área onde mais de meia dúzia de países têm sobreposições territoriais sobre um fundo do mar com reservas comprovadas de petróleo de sete bilhões de barris e cerca de 900 trilhões de pés cúbicos de gás natural” (CRONIN & KAPLAN, 2011, p. 5).Atualmente, as tensões na região não são uma crise propriamente dita, pois não há conflito bélico, porém a área tem grande potencial para um futuro conflito. Por ainda não ser um fenômeno concreto, é necessário fazer uma análise

1 Mares Marginais são os golfos de grandes dimensões que penetram nos continentes, como o Golfo do México. 1 Estudantes de Relações Internacionais na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

(2)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017 em partes para poder compreender as causas e consequências dos acontecimentos no Mar do Sul da China. Por isso, este artigo foi dividido em três partes: perspectiva histórica, aná-lise a nível regional e anáaná-lise a nível global. A primeira parte tenta elucidar a formação da região analisada desde os impérios tributários até o século XX. A segunda procura mostrar como as relações e disputas regionais se distribuem e permeiam a futura crise do Mar do Sul da China. Por fim, a terceira parte analisa essas tensões num nível global e como essas disputas regionais afetam os demais atores do Sistema Internacional.

2 PERSPECTIVA HISTÓRICA

O sudeste asiático teve influência chinesa e indiana, além de, posteriormente, muçulma-na, criando um ambiente diversificado e complexo, que muitas vezes é obscurecido pela sua denominação simplista: Ásia.Segundo Visentini (2014), a civilização chinesa teve um amplo alcance, criando um sistema tributário2 centrado nas similaridades dos povos que habitavam essa região. Isso foi possível na medida em que ela possuía um alto grau de centralização e grande capacidade de manter seus valores através das diferentes dinastias ao longo do tempo. Outro traço importante é a alta capacidade de absorção dos povos

bár-baros3, por meio da assimilação dos valores e manutenção das instituições chinesas, pois a

China não possuía capacidade para subjugar todas as sociedades vizinhas pela força. Assim, a absorção dos inimigos para sua órbita de influência era uma defesa, já que eles não tinham qualquer intenção de expandir seu império e conquistar colônias4. Por fim, essa civilização possuía um alto grau de hierarquização, sendo a China o centro e topo dessa hierarquia. Países como Coreia, Tailândia, Vietnã, Laos, entre outros, faziam parte da zona de influ-ência da civilização chinesa.

Outra grande civilização que contribui para a formação da Ásia é a indiana. Ao con-trário da civilização chinesa, a indiana possuía uma grande diversidade étnica, religiosa e cultural, devido ao passado de consecutivas invasões e migrações. “A cada nova conquista/ migração se estabelecia uma nova casta ou religião, que se sobrepunha às já existentes, criando hierarquias e complexas divisões de trabalho e papéis sociais” (VISENTINI, 2014, p. 85). Dado esse ambiente heterogêneo e complexo, os impérios hindus não foram capazes de estabelecer um centro político como os chineses.

2.1 C

OlOnialiSMO

2 Antes do conceito de Estado-Nação, o sistema de organização política era chamado de “Sistema Tributário”. Esta

era a forma pela qual os países se relacionam entre si. A palavra Tributário se dá devido a necessidade dos países “satélite” do império de enviar tributos ao centro de poder. Um exemplo disso é o império tributário chinês, sendo a China o centro de poder e países, como Coreia e Mongólia, pertencentes ao império.

3 Todos os povos fora influência do império chinês, ou seja, não compartilhavam seus valores “superiores”. 4 “Na versão chinesa do excepcionalismo, a China não exportava suas ideias, mas deixava que os outros viessem

buscá-las. Povos vizinhos, acreditavam os chineses, se beneficiavam do contato com a China e a civilização, desde que reconhecessem a soberania do governo chinês” (KISSINGER, 2011, p. 35). O excepcionalismo chinês é a crença de que a China possui qualidades excepcionais, ou seja, que nenhum outro país possui, logo isso explica a sua “superioridade”.

(3)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017

3

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA Devido à falta de interesse nas nações bárbaras, as reivindicações territoriais chinesas se deram no seu entorno estratégico. Os chineses já possuíam um grande conhecimento na-val, antes mesmo das Grandes Navegações, mais precisamente durante a “dinastia Song

(960-1279), a China liderava o mundo em tecnologia náutica; suas frotas poderiam ter conduzi-do o império a uma era de conquista e exploração” (KISSINGER, 2011, p.26). A conquista e exploração chinesa, devido ao seu pouco interesse no estrangeiro, se limitou às ilhas próxi-mas, tendo até algumas expedições ao Japão na tentativa de subjugá-los. Com a instauração da dinastia Ming (1368-1644), inicia-se um novo período de exploração além-mar. Tais viagens tinham o intuito de criar novos laços comerciais e também de aumentar o império tributário. É, segundo Kissinger (2011), nesse período que os “navios do tesouro” partem, pelo Mar do Sul da China, para fora da zona de influência da civilização chinesa. As expe-dições cessaram em 1433 devido ao crescente perigo na fronteira norte da China e houve, a pedido do imperador, o desmantelamento da frota do tesouro, findando o período de exploração chinesa, enquanto, do outro lado do mundo, os europeus a iniciavam.

Segundo Roberts (2006), os primeiros contatos do ocidente com a China, se dão por meio da chegada de portugueses em 1514. Em 1517, Tomé Pires, embaixador de Portugal, rece-beu autorização para viajar até Pequim, mesmo não sendo recebido pelo imperador. De-pois de muitas negociações, nos anos de 1550, os portugueses conseguiram permissão do imperador para estabelecer um entreposto comercial em Macau e, assim, iniciar as relações comerciais entre os dois países.

Por ser a grande civilização com acesso ao mar que se localiza ao sul da China, histo-ricamente, essa região era controlada pelo país. Essa dominância se estendeu até a Era Co-lonial. Porém, com a ascensão ocidental e a crescente necessidade de expansão por novos mercados e fontes de matérias primas, as “concessões chinesas” não eram mais suficientes para as potências europeias. Após a União Ibérica, Portugal perdeu força na região, dando espaço para os holandeses e outras potências europeias que tinham interesse nos mercados asiáticos. Segundo Roberts (2006), em 1644, a dinastia Qing, substituiu a dinastia Ming e iniciou um período de expansão territorial, aumentando, assim, o poder dessa nova dinas-tia.

A Europa conseguiu, no século XVIII, através da Revolução Industrial, alcançar um novo nível tecnológico, que colocava a civilização chinesa em desvantagem. Percebendo a ameaça que as potências ocidentais representavam, o imperador chinês viu-se obrigado a fazer cada vez mais concessões aos comerciantes europeus. Durante um certo período, os chineses conseguiram manter sua soberania e controle sobre as áreas de comércio, mas isso se mostrou insustentável. Por essa razão, em 1760, todo o comércio externo chinês foi restringido ao Cantão, sob uma rígida regulamentação, segundo Senise (2008). Nesse período, a maior parte das relações comerciais com a China foi exercida pela Grã-Bretanha, através da Companhia Britânica das Índias Orientais, uma empresa monopolista. O foco da companhia era o comércio de chá chinês em troca de produtos britânicos. Nessa época, os ingleses possuíam um déficit comercial, necessitando de um produto de contrapartida

(4)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017 para equilibrá-lo. Em 1793, com a Missão Macartney5, fica claro a não colaboração chinesa para com as potências estrangeiras. Por isso, as táticas para conquistar o mercado chinês mudaram. Os ingleses acham no ópio6 a chance de ganhar o mercado chinês e escoar sua produção indiana.

O comércio do ópio era controlado pela Companhia das Índias Orientais, que lucra-va extraordinariamente com a concessão de licenças. Os impostos sobre o cultivo e o tráfico do ópio proporcionaram grande lucro aos britânicos e logo passou a ser o principal produto de exportação para a China, como forma de financiar as importa-ções britânicas de produtos chineses (VISENTINI; PEREIRA, 2012, p. 106).

Apesar da proibição do comércio de ópio China, havia um grande mercado informal, do qual os britânicos tomaram conta. Segundo Kissinger (2011), para acabar com a infra-ção, o imperador mandou, em 1838, um comissário imperial, a fim de confiscar a droga e prender os envolvidos. A Inglaterra viu essa ação como uma afronta e mandou uma frota de navios ao Cantão7 para fechar o comércio e dominar essa região, iniciando a Guerra do Ópio.

Em 1842, na segunda fase da Guerra do Ópio, depois da derrota chinesa e da ocupa-ção de Xangai, o imperador autorizou as negociações com a Inglaterra, resultando no “Tra-tado de Nanquim, o primeiro dos chamados “tra“Tra-tados desiguais”, que abriram a China ao comércio e à exploração das nações imperialistas ocidentais” (SENISE, 2012, p. 110). Este tratado ditava a abertura de 5 portos chineses ao comércio inglês e a cessão de Hong Kong. Outras nações como os Estados Unidos, em 1844, com o Tratado de Wanghia e a França, também em 1844, com seu tratado de Whampoa, fizeram parte dos tratados desiguais.

No mesmo período ocorreu a Restauração Meiji no Japão, resultando na adoção dos sistemas ocidentais, como abertura econômica e o sistema Westfaliano de Estado-Nação8. Isso gerou um crescimento acelerado e teve como consequência a ascensão japonesa como potência no Sistema Internacional. A partir dessa mudança, o Japão passou a agir de modo imperialista nos seus arredores e buscou a expansão do seu território, assim como as de-mais potências capitalistas. As ilhas Ryukyu foram ocupadas, em 1872, pelos japoneses (VISENTINI e PEREIRA, 2012) e, aproveitando a instabilidade interna na Coreia, os ja-poneses moveram suas tropas para Seul. Como o território coreano fazia parte do sistema tributário chinês, a invasão resultou num conflito, conhecido como primeira Guerra Si-no-Japonesa. A China perdeu a guerra e foi obrigada a assinar mais um tratado desigual: o Tratado de Shimonoseki (1895). Este resultou em mais humilhações para os chineses, como o pagamento de uma indenização para o Japão, a cessão de ilhas e da região

estratégi-5 Tentativa britânica de negociação com a China que terminou em fracasso devido à “arrogância chinesa”. A partir

desse momento, as investidas inglesas ficaram mais fortes e constantes, resumidas em uma frase: “se a China con-tinuasse fechada, as portas seriam derrubadas” (PEYREFITTE apud KISSINGER, 2011, p. 60).

6 Droga entorpecente produzida através da papoula. 7 Cidade aberta aos europeus para o comércio.

8 A Paz de Westfália é uma série de tratados que encerraram a Guerra dos Trinta Anos na Europa em 1648. Ela

também inaugurou o Sistema de Estado-Nação de Westfália, o qual é o consenso entre os Estados europeus do princípio de soberania estatal e o conceito de Estado-Nação. O Estado se tornava a célula política mais importante nas questões políticas.

(5)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017

5

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA ca de Lião Tung, no sul da Manchúria, entre outros, segundo Senise (2012).

Tal evento acabou chamando a atenção das demais potências. Outras nações capita-listas queriam competir por tais territórios. Somaram-se Rússia, Alemanha, EUA, e Japão, aos tradicionais Inglaterra e França. “Cada País reagia ao avanço dos demais” (KISSINGER, 2014, p. 96). Segundo Visentini e Pereira (2012), os britânicos seguiram sua expansão em direção ao sudeste asiático, anexando a Birmânia (1866) e a Malásia (1874), controlando, desse modo, a passagem estratégica do Oceano Índico para o Pacífico. A França avançava pela Indochina em 1862, anexando a Cochinchina e o Camboja em 1863.

Entre 1883 e 1893 o resto do Vietnã e o Laos foram anexados. Mais ao sul, os ho-landeses procederam à conquista da Indonésia (Índias Holandesas), partindo dos antigos enclaves mercantilistas que ainda detinham no arquipélago (VISENTINI; PEREIRA, 2012, p. 102).

2.2 E

ManCipaçãOEaSnOvaSRElaçõESREgiOnaiS

No final século XIX, percebe-se uma Ásia dividida pelas grandes potências, com exceção do Japão. Segundo Hinton (1967), a China não foi totalmente colonizada devido ao seu extenso território, porém, perdeu vários aspectos de sua soberania. Já os demais países do sudeste asiático foram completamente subjugados pelas potências imperialistas.

Segundo Kissinger (2011), em 1898, inicia-se na China a Revolta dos Boxers, uma tentativa nacional de expulsar a presença estrangeira. Todavia, não obteve resultados po-sitivos, pois as grandes potências formaram uma coalizão para acabar com a revolta. Este evento rendeu mais um tratado desigual para a China. Apesar da perda, os ânimos chineses foram fortificados em relação à restauração de sua soberania e, em 1912, instaurou-se a República Chinesa comandada pelo Kuomintang9. Nos anos seguintes, as relações sino--japonesas se acirraram. Segundo Kissinger (2011), enquanto as demais potências se afas-taram dos domínios chineses, devido à exaustão da Primeira Guerra, o Japão continuou a ameaçar a soberania chinesa. Ao final de 1933, a Manchúria foi completamente tomada pelos japoneses e, em 1937, começou a segunda guerra sino-japonesa. O Japão conseguiu conquistar alguns territórios continentais assim como territórios ultramarinos como as ilhas Spratly, antigas colônias francesas no Mar do Sul da China. Com a declaração de guerra ao Japão pelos aliados, a guerra sino-japonesa toma um novo rumo, até a derrota final do Japão.

Na Declaração do Cairo fica determinado que o Japão deve devolver os territórios chineses anexados, incluindo: Manchúria, Formosa (Taiwan), ilha dos Pescadores, ilha Spratly e ilhas Paracel. Finalmente, no tratado de paz de São Francisco de 1951 fica deter-minado que o Japão deve renunciar a qualquer posse sobre as ilhas do Mar do Sul da China - Formosa, Pescadores, Spratly e Paracel - ficando restringido apenas às suas 4 ilhas prin-cipais segundo Santos (2015). Ao final da Segunda Guerra Mundial, vários movimentos

9 O Kuomitang da China ou Partido Nacionalista Chinês foi um partido que governou a China por um curto

(6)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017 de emancipação das antigas colônias surgiram pelo mundo. Na Ásia, em especial, tiveram uma forte influência dos novos países comunistas, tendo os movimentos revolucionários ganhando força, devido à ausência das grandes potências devastadas pela guerra.

Segundo Kissinger (2014), a Ásia acabou sendo vítima de um grande processo global: o colonialismo. O tamanho da China permitiu-a escapar da colonização por completo, mas, ainda assim, grande parte de sua soberania foi perdida. O sistema Westfaliano de Estado--Nação finalmente alcançou os países asiáticos, devido à devastação na Europa. Entretanto, o processo de emancipação foi sangrento, com diversas guerras violentas, como a Guerra Civil Chinesa (1927-49) e a Guerra do Vietnã (1961-75).

Depois de décadas de conflitos, o espaço asiático mudou completamente nos aspectos: geográficos, políticos e econômicos. Em 1970, com a ascensão dos Tigres Asiáticos, houve uma mudança econômica na região que trouxe prosperidade e dinamismo econômico. O Japão, após a adoção de instituições democráticas, conseguiu construir uma economia rival às ocidentais. Já a China, após as reformas de Deng10, nos anos 1970, conseguiu fazer sua economia crescer ao ponto de elevar o país ao status de potência do Sistema Internacional.

3 NÍVEL REGIONAL

A partir do desenvolvimento das disputas territoriais no Mar do Sul da China durante o seu processo histórico, nota-se que as tensões atuais não são embates políticos novos, ten-do-se intensificado no Sudeste Asiático principalmente no século XX com a descoloniza-ção dos países da região (TØNNESSON, 2001). Diversas nações, tais como China, Vietnã, Malásia, Filipinas, ao exercer maior autonomia sobre seus interesses nacionais, começaram a reivindicar soberania sobre certos territórios e águas, principalmente os referentes às ilhas Paracel e ilhas Spratly11. Sendo uma bacia de ampla importância estratégica, tanto eco-nômica quanto política, logo o dragão chinês começou a buscar preponderância e controle sobre parte majoritária do Mar do Sul da China ao clamar por áreas presentes em sua “linha de nove traços”12, a qual pode ser vista na Figura 1 (MCDEVITT, 2016; U.S. Department of State, 2014).

10 As reformas de Deng Xiaoping visavam o crescimento econômico chinês, as quais se destacam as

moderniza-ções nos setores da agricultura, indústria e comércio, ciência e tecnologia e militar. Durante esse período houve também uma abertura econômica e diplomática.

11 Paracel e Spratly são arquipélagos de ilhas, recifes e outras formações marinhas, sendo consideradas pontos

estratégicos devido a sua importância para o fluxo comercial da região e a suas reservas naturais, especialmente de petróleo e gás natural (ARAÚJO et al, 2014).

12 A “linha de nove traços” se refere à linha que demarca os territórios sobre os quais a República Popular da

China reivindica soberania, publicada pelo governo chinês por meio de Nota Verbal submetida à Organização das Nações Unidas em 2009 em resposta a reivindicações territoriais da Malásia e do Vietnã (CHINA, 2009). A nota, apesar de ter o mapa anexado, é ambígua em relação às reivindicações chinesas, afirmando que a “China tem soberania indisputável sobre as ilhas no Mar do Sul da China e as águas adjacentes, e goza de direitos soberanos e de jurisdição sobre águas relevantes, assim como sobre seus solo e subsolo” (grifos dos autores), o que deixa um vácuo explicativo e conceitual em determinados termos incompatível com a gravidade da questão.

(7)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017

7

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA

Figura 1 – Linha de nove traços

Fonte: CHINA, 2009

(8)

Con-RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017 venção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS) de acordo com a posição de alguns países da região como Vietnã, Filipinas e Malásia (FILIPINAS, 2009; MALÁSIA, 2009; VIETNÃ, 2009), a natureza das exigências da China serviram como catalisador de uma já complicada situação jurídica e política. Questões de soberania territorial de Es-tados do Sudeste Asiático conflitaram com o ideal de reivindicação histórica sustentado pelo governo chinês. Isso foi interpretado com receio, visto que poderia comprometer a estabilidade da região e significar o controle hegemônico da mesma por Pequim (GUAN, 2012). A efetiva ocupação de ilhas do Mar do Sul da China por algumas dessas nações, a construção de ilhas artificiais13 e o exercício de atividades militares pela China levaram a um aumento das tensões, levantando debates sobre o risco que essas disputas significariam para a biodiversidade marinha, as relações entre os países e a respectiva situação político--diplomática da região.

Notando-se a possibilidade de escalonamento dos conflitos dado o constante tensio-namento político-militar, somada à forte objeção chinesa ao envolvimento de potências extra-regionais, em especial ao dos EUA14, alternativas de resolução pacífica das disputas territoriais foram buscadas, particularmente no âmbito da ASEAN, seu mecanismo regio-nal de integração. Em 2002, foi acordada uma Declaração de Conduta entre os membros da organização e a China, uma vez que o Estado chinês não faz parte desse organismo. Neste documento, os Estados envolvidos se comprometeram a resolver as questões jurídicas e territoriais por meio pacíficos, como consultas e negociações amigáveis, respeitando os princípios da UNCLOS e consentindo que a adoção de um Código de Conduta15, constru-ído consensualmente, seria benéfica à solução da questão (ASEAN & CHINA, 2002). Con-tudo, a elaboração de tal acordo não é simples, já que a China detém importantes relações comerciais com os países do Sudeste Asiático, sendo difícil para nações em vias de desen-volvimento como as da região afirmarem sua soberania territorial sem comprometerem seu relacionamento ou entrarem em constante choque com o governo chinês. Também há dúvidas em relação à real efetividade do Código, pois não existem garantias ou meios de reforçar as medidas implementadas em caso de seu descumprimento (HIDESHI, 2013).

A China demonstra, por meio de uma posição moderada e voltada à diminuição das tensões e de uma diplomacia amigável, mais disposição para realizar negociações bilate-rais com os outros países envolvidos ao invés de no âmbito multilateral representado pela ASEAN. Pouco a pouco, ela reafirma sua posição preponderante sem agravar a situação político-territorial da região, mas alterando signitivamente seu status quo. Historicamente, o governo chinês busca se afirmar como uma potência marítima ao adotar uma estratégia

13 A China empreendeu diversas atividades de construção de ilhas artificiais em sete recifes de corais que ocupa

nas ilhas Spratly entre dezembro de 2013 e outubro de 2015 (SOUTHERLAND, 2016).

14 Na reunião do Fórum Regional da ASEAN (ARF) de julho de 2010, a ex-Secretária de Estado Hillary Clinton

manifestou os interesses estadunidenses no Mar do Sul da China ao afirmar que os Estados Unidos buscam de-fender “o livre trânsito na região, a liberdade de acesso aos oceanos comuns asiáticos e a estrita observância do cumprimento do direito internacional no Mar do Sul da China”.

15 O Código de Conduta da ASEAN, ao contrário de uma Declaração de Conduta, é um documento de caráter

vinculante que determina premissas para as relações entre os Estados do Sudeste Asiático (ARAÚJO et al, 2014). Dado o seu cunho vinculativo, ele impõe obrigações a todos os países signatários, incorrendo em pena aos mesmos caso haja descumprimento de algum de seus parâmetros.

(9)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017

9

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA de conciliação entre o crescimento de seu poder e uma política pragmática com os países da região, a fim de preservar sua estabilidade (MORTON, 2016). Dessa forma, segundo Taylor Fravel (2011), somente um contexto de fortes alianças militares e formação de uma eventual coalizão16 entre Estados Unidos e as nações que reclamam partes do Mar do Sul da China poderia levar a uma mudança da política chinesa, tornando-a mais cooperativa e disposta a utilizar os mecanismos de resolução de controvérsias da ASEAN ou a impulsio-nando em direção ao uso da força e emergência de um conflito armado.

Diversos países que possuem costa no Mar do Sul da China reivindicam parte de seu território, sendo muito comum a ocorrência de sobreposição. Vietnã, China e Taiwan reclamam a soberania das ilhas Paracel, com um histórico de disputas sino-vietnamitas conflituoso dada a firme posição de ambos17 e a ocupação chinesa do arquipélago. Apesar de oficiais vietnamitas já terem afirmado sua convicção de que “Pequim nunca desistirá de suas reivindicações”, a cooperação entre os dois governos aumentou nos últimos anos, principalmente por meio de patrulhas conjuntas (COLE, 2013; GOH, 2005). Os dois pa-íses também disputam o domínio das ilhas Spratly, sendo a relação entre China e Vietnã uma das mais tensas da região e tendo a maior ilha desse arquipélago ocupada por Taiwan (MORTON, 2016). Em dezembro de 2014, o Estado vietnamita fez uma submissão à Cor-te PermanenCor-te de Arbitragem18 como resposta a um documento de posição do governo chinês, reivindicando o território completo de ambos os arquipélagos Spratly e Paracel e o cumprimento da legislação da UNCLOS nas questões do Mar do Sul da China (CALVO, 2015).

Conforme visto na figura 2, parte dessas ilhas é reclamada da mesma forma pelo sul-tanato de Brunei, sendo sua área reduzida a um pequeno recife dentro de sua Zona Econô-mica Exclusiva (ZEE)19. A Malásia reivindica também as áreas presentes em sua ZEE, assim como poucas ilhas da cadeia das Spratlys (COLE, 2013). As Filipinas detém um forte rela-cionamento com os Estados Unidos, apesar de Washington não ter se mostrado ativo na defesa de suas ilhas ocupadas no arquipélago Spratly, reivindicado em sua totalidade pelo governo filipino (COLE, 2013). O ápice da disputa no início de 2013, quando as Filipinas iniciaram um procedimento arbitral contra a China na Corte Permanente de Arbitragem,

16 A China teme que a Indonésia intensifique suas relações militares com os EUA, com os quais já tem um

his-tórico cooperativo. Pequim tenta contrabalancear essa possibilidade, o que, entretanto, é considerado difícil em razão das disputas territoriais existentes entre os dois países em torno das ilhas Natuna, vistas negativamente pelo governo indonésio (WESTAD, 2012).

17 Em dezembro de 2014, o porta-voz do Ministro de Relações Exteriores Le Hai Binh afirmou à imprensa que

“novamente, o Vietnã reitera que tem completa evidência histórica e fundação legal para reafirmar sua soberania sobre o arquipélago das Hoang Sa (ilhas Paracel) e das Truong Sa (ilhas Spratly), assim como sobre seus direitos legais e interesses no Mar do Leste (Biēn Dông)” (CALVO, 2015).

18 A Corte Permanente de Arbitragem é um tribunal internacional que tem como finalidade “facilitar a arbitragem

e outras formas de resolução de disputas entre Estados”, sendo estabelecida em 1899 na 1ª Conferência de Paz de Haia (PERMANENT COURT OF ARBITRATION, 2017).

19Zona Econômica Exclusiva, de acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (1994),

é “uma área além do e adjacente ao Mar Territorial” em que o Estado signatário tem “direito à exploração de recursos naturais, vivos ou não-vivos, nas águas sobrejacentes ao solo oceânico e do solo oceânico e seu subsolo e a outras atividades referentes a exploração econômica, como as de produção de energia proveniente de águas, correntes e ventos”. Também se estabelece jurisdição na ZEE para o “estabelecimento e uso de ilhas artificiais, instalações e estruturas; pesquisa científica marinha; e a preservação e proteção do ambiente marinho”.

(10)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017 que teve todo o seu curso e suas decisões negados por Pequim.

Figura 2 – Reivindicações territoriais no Mar do Sul da China.

Fonte: BURGESS, 2012

4 NÍVEL GLOBAL

Para além das disputas de caráter eminentemente regional, o Mar do Sul da China também é caracterizado por tensões de cunho global. Isso porque elas envolvem os interesses di-vergentes de duas grandes potências20: Estados Unidos e China. Entretanto, é importante ressaltar que, apesar de as tensões entre esses dois Estados poderem serem analisadas se-paradamente, na prática, elas se combinam - e até se confundem - com questões regionais. Essas disputas de interesses entre as duas grandes potências no Mar do Sul da China tam-bém podem ser divididas, basicamente, em duas ordens de tensões: uma de caráter políti-co-militar e outra, econômica, com foco nas questões comerciais.

Desde o fim da Guerra Fria, os EUA têm se engajado em uma busca pelo estabeleci-mento de uma hegemonia21 no Sistema Internacional. Para isso, o país utiliza-se do que se chama de “comando os comuns”. Isso significa que os EUA têm a capacidade de utilizar as “áreas que não pertencem a nenhum Estado e que proveem acesso a grande parte do globo”

20 Aqui trabalha-se com a ideia de que o atual Sistema Internacional é composto de três grandes potências: uma

que é possui capacidades claramente superiores às demais (EUA), uma decadente (Rússia) e outra ascendente (China). Isso porque as variáveis utilizadas para classificar os Estados como grandes potências resumem-se em: capacidade de desferir um segundo ataque nuclear; comando do espaço sideral e a capacidade de não ser derrotado em uma guerra convencional (CEPIK, 2014).

(11)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017

11

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA (POSEN, 2003, p. 8), ou seja, o mar, o espaço e o ar. Mas, ao mesmo tempo, eles conseguem negar o uso dessas áreas para outros Estados, uma vez que a preponderância militar norte--americana seria superior a dos demais atores (POSEN, 2003). Assim, a partir da década de 1990, os Estados procuram estabelecer uma capacidade de projeção militar de dimensões globais, o que inclui também toda a região do Pacífico - e, consequentemente, o Mar do Sul da China. No entanto, também é importante ressaltar que tal estratégia levou a reações por parte de outros atores no Sistema Internacional, sendo um deles a China.

Entre 1995 e 1996, ocorreu o episódio conhecido como Crise do Estreito de Taiwan22. Em um dos pontos mais altos de tensão desse evento, os EUA enviaram dois grupos de porta-aviões para o Estreito de Taiwan, ante uma série de exercícios militares chineses perto das áreas territoriais taiwanesas (ROSS, 2000). Apesar de a crise haver sido resolvida, com os Estados Unidos voltando atrás em suas ações de elevar as relações com Taiwan e mantendo a concordância com o princípio de “uma só China”, o episódio foi marcante para o governo chinês. Isso porque, ao conseguir adentrar o Estreito de Taiwan com uma força naval superior, percebeu-se que a capacidade dissuasória naval chinesa era muito inferior em relação à norte-americana. Assim, “Pequim começou a desenvolver as capacidades necessárias para tornar o envolvimento dos Estados Unidos em encontros futuros crescentemente arriscado e, em alguns casos e contextos, proibitivamente custoso” (CHRISTENSEN, 2012, p. 6).

Dessa forma, por mais de uma geração, a China tem aumentado seus gastos milita-res e reformado as suas Forças Armadas, desenvolvendo “uma série de mísseis, sensomilita-res [...] interconectados e outras tecnologias, designados a negar liberdade de movimentação a potências hostis no ar e nas águas de sua costa” (BIDDLE & OELRICH, 2016, p. 7). Assim sendo, a China impediria o emprego de grupos de porta-aviões norte-americanos na área que vai da costa chinesa até a chamada Primeira Cadeia de Ilhas23 (CHRISTENSEN, 2012). O alcance das capacidades de negação de área que a China tem desenvolvido (sobretudo no que se refere aos alcances de seus mísseis) pode ser vista na Figura 2.

Com o aumento das capacidades militares chinesas - sem falar do constante cresci-mento econômico da China -, os EUA têm se visto na obrigação de dar uma resposta aos acontecimentos. Dessa maneira, a partir de 2011, a administração Obama passou a enga-jar-se mais no Pacífico, um movimento que tem sido denominado “Pivô para Ásia”24. Essa estratégia foi justificada pelo governo como uma maneira de manter a posição de proemi-nência norte-americana por meio de um aumento da presença do país na região do Pacífico (CLINTON, 2011). Em termos político-militares, essa estratégia tem sido paralelamente - e conjuntamente - desenvolvida com um instrumento próprio para a manutenção da

ca-22 Essa Crise teve início após o governo norte-americano adotar algumas políticas contrárias ao princípio de “uma

só China”, apoiada pelo Estado chinês em relação a Taiwan. Além disso, o governo anterior (George H. W. Bush), havia iniciado políticas em relação a Taiwan contrárias à política externa chinesa, como a venda de caças para o governo taiwanês (ROSS, 2000).

23 A Primeira Cadeia de Ilhas do Pacífico começa no território japonês e perpassa Taiwan, Filipinas, Malásia e vai

até a Indonésia (CHRISTENSEN, 2012).

24 Medida também chamada de “estratégia de rebalanceamento”, uma vez que um de seus principais objetivos e

(12)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017 pacidade de projeção dos Estados Unidos na região e, sobretudo, no Mar do Sul da China, área em que o país asiático teria maior capacidade dissuasória25.

Entretanto, essa estratégia não é realizada exclusivamente com as forças norte-ame-ricanas, uma vez que os EUA contam com aliados regionais para garantir a sua capacidade projeção no Pacífico, como o Japão, as Filipinas, Singapura, Vietnã e até mesmo a Índia (CHRISTENSEN, 2012). Importante ressaltar que, por utilizar parceiros regionais no Mar do Sul da China que possuem um histórico de disputas territoriais com o Estado chinês, como apresentado anteriormente, a estratégia de rebalanceamento militar norte-america-na, de caráter global, confunde-se com pontos de tensão especificamente regionais.

A atuação dos EUA com os parceiros regionais é relativamente diversificada. Por um lado, tem-se continuado ações levadas a cabo pela administração Bush, como a realização de operações principalmente por meio de empregos rotativos ao invés de empregos de bases permanentes. Também é utilizado emprego de tropas na Austrália e de meios navais em Singapura, além de cooperação militar com as Filipinas (MAYIN, 2012). Ao mesmo tempo, os Estados Unidos têm realizado exercícios e operações navais a fim de reafirmar a sua livre navegação no Pacífico, principalmente no Mar do Sul da China (VALENCIA, 2016, p. 1).

Também é importante notar que, apesar da relevância das tensões militares exis-tentes no Mar do Sul da China entre as duas grandes potências, tais divergências também adentram outros campos, como o econômico. Isso porque, com o recente crescimento econômico chinês em ritmo acelerado - em que pese a desaceleração ocorrida no início da década de 2010 -, os Estados Unidos tem utilizados de meios para contrabalancear econo-micamente a China, ainda dentro dessa política de “Pivô para a Ásia”. Uma dessas iniciati-vas mais relevantes e mais discutidas é a Parceria Transpacífica (TPP, da sigla em inglês)26.

O TPP é uma acordo negociado entre 12 países e impulsionado pelos EUA, que “bus-ca liberalizar e estabelecer regras e disciplinas governando comércio e investimento entre seus 12 membros” (WILLIAMS, 2016, p. 1). Apesar de defendido pelo governo Obama (2009-2017) como estratégico econômica, política e securitariamente, já que aumentaria a presença comercial norte-americano nos países da região, ao mesmo tempo que possi-bilitaria a criação de mais um mecanismo de presença norte-americana em áreas como o próprio Mar do Sul China (MANYIN, 2012), argumenta-se que, por excluir a China, ele procura afastar os Estados asiáticos do último, servindo como um fator de tensão regional e global.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho buscou realizar uma análise descritiva das tensões existentes na

25 Capacidade que um Estado tem de “convencer” os demais Estados do Sistema Internacional de que o custo de

realizar uma ofensiva militar contra ele excede os ganhos.

26 Entretanto, é importante notar que a atual administração norte-americana, liderada por Donald Trump, tem

(13)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017

13

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA região denominada Mar do Sul da China. Para fins analíticos, foi necessário separar dois níveis de tensões e conflitos em potencial: um regional e outro global. Apesar de tal separa-ção ter sido feita aqui, é importante sempre ressaltar que esta não é passível de ser feito na realidade, em virtude do entrelaçamento entre os dois níveis. Assim, as crises e divergên-cias político-militares, bem como as econômicas, que prevalecem na região são resultado da combinação dos processos relativos a cada nível de análise.

Como demonstrado, as tensões de caráter regional são fruto de um longo processo histórico que, em determinado ponto, confunde-se com a própria história da formação do continente asiático e com as mudanças de fases históricas e na estrutura do Sistema In-ternacional. Tal fato é perceptível ao levar-se em conta que muitas das disputas regionais, bem como divergências políticas são fruto de eventos como o colonialismo, o imperialismo japonês e ocidental (Europa e Estados Unidos), as revoluções - tanto nacionalistas quanto marxistas -, dentre outros tantos processos pelos quais passaram os Estados da região. Essas tensões transformaram-se na medida em que também foram vistas mudanças na estrutura sistêmica e na economia política internacional. Algumas delas podem ser listadas, tais como o fim dos impérios coloniais e da bipolaridade, a emergência do fenômeno conhecido como globalização e o desenvolvimento de novas tecnologias. Esses fatos somam-se às antigas disputas regionais para tornar as tensões no Mar do Sul da China ainda mais complexas.

Outra variável que nos auxilia no entendimento dos fenômenos políticos e econômi-cos existentes refere-se ao nível global. Tal nível está diretamente relacionado à estrutura do Sistema Internacional e, por consequência, à polaridade vigente. Como ressaltado no texto, há indícios de que a atual estrutura seja composta por três grandes potências (EUA, Rússia e China). Assim, o que se observa no Mar do Sul da China é a competição político--militar e econômica entre duas grandes potências que, aliando-se a atores regionais, pro-curam interferir na balança de poder da região. Entretanto, o que mais se vê nesse padrão de rivalidade entre as potências é uma conduta de caráter mais ofensiva levada a cabo pelos EUA e uma mais defensiva estabelecida pela China, que procura fazer frente ao poderio, tanto militar quanto econômico do primeiro.

aBSTRaCT

This article addresses the tensions involving the region known as South China Sea. The objective of the work is to demonstrate that such problems are at the same time product of regional disputes, generally territorial ones, that involve the construction of Asia itself and specifically the regional addressed, but also the result of a political-military and economic dispute in the global level, among two great powers: China and United States. For these factors, the South China Sea configures itself as an important area to be studied and geopolitically relevant to understand the configuration of the International System.

(14)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017

R

EfERênCiaS

AQUINO, Rubim Santos Leão de. CAIRO, CONFERÊNCIA DO. In: SILVA, Francisco Carlos Teixeira da; MEDEIROS, Sabrina; VIANNA, Alexander Martins (Org.). Enciclo-pédia de Guerras e Revoluções - Vol. II: 1919-1945: A Época dos Fascismos, das

Dita-duras e da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Rio de Janeiro: Elsevier, 2015. p. 1-2. BIDDLE, Stephen; OELRICH, Ivan. Future Warfare in the Western Pacific: Chinese Antiaccess/Area Denial, U.S. AirSea Battle, and Command of the Commons in East Asia.

International Security, v. 41, n. 1, p.7-48, jul. 2016. MIT Press - Journals.

CASSEL, Rodrigo dos Santos; BATISTA, Thaís Jesinski. Maritime Security in Southe-ast Asia. In: UFRGSMUN Model United Nations Journal: Empowering people,

overco-ming challenges, Porto Alegre, 2016.

CEPIK, Marco. Segurança Internacional: Da Ordem Internacional aos Desafios para a América do Sul e para a CELAC. In: SORIA, Adrián Bonilla; ECHANDI, Isabel Alvarez.

Desafíos Estratégicos del Regionalismo Contemporáneo: CELAC e Iberoamérica.

San José: Flacso, 2014. p. 307-324.

CHRISTENSEN, Kyle D.. Strategic Developments In The Western Pacific: Anti-Access/ Area Denial And The Airsea Battle Concept. Journal Of Military And Strategic Stu-dies, v. 14, n. 3, p.1-24, 2012.

CLINTON, Hillary. America’s Pacific Century. 2011. Disponível em:

<http://foreig-npolicy.com/2011/10/11/americas-pacific-century/>. Acesso em: 28 nov. 2016. HINTON, Harold C. A China comunista na política mundial. Rio de Janeiro: O

Cruzeiro, 1967.

KAPLAN, Robert; CRONIN, Patrick. Cooperation from Strenght. The United States, China and the South China Sea. Center for a New American Security,Washington, 2012. Disponível em: <https://s3.amazonaws.com/files.cnas.org/documents/CNAS_Coopera-tionFromStrength_Cronin_1.pdf>. Acesso em: 6 fev. 2017.

KISSINGER, Henry. Sobre a China. Penguin Press, 2011.

KISSINGER, Henry. Ordem Mundial. Penguin Press, 2014.

MANYIN, Mark E.. Pivot to the Pacific?: The Obama Administration’s “Rebalancing”

(15)

RIPE: Relações Internacionais para Educadores | Vol. 4 | 2017

15

TENSÕES NO MAR DO SUL DA CHINA POSEN, Barry. Command of the Commons: The Military Foundation of U.S. Hegemony.

International Security, Massachusetts, v. 28, n. 1, p.5-46, 2003.

ROBERTS, John A. G. História da China. Edições Texto & Grafia, 2006.

ROSS, Robert S.. The 1995–96 Taiwan Strait Confrontation: Coercion, Credibility, and the Use of Force. International Security, v. 25, n. 2, p.87-123, out. 2000. MIT Press -

Journals.

SANTOS, Paula Marquês dos. Japão. In: FREIRE, Maria Raquel (Org.). Política exter-na: as relações internacionais em mudança. 2. ed. Coimbra: Imprensa da Universidade de

Coimbra, 2015. p. 325-354.

SENISE, Maria Helena Valente. Tratado De Nanquim (1842). In: MAGNOLI, Demétrio (Org.). História da paz: os tratados que desenharam o planeta. 2. ed. São Paulo:

Contexto, 2012. p. 101-124.

VALENCIA, Mark J.. Latest U.S. FONOP in the South China Sea: Tilting at

Wind-mills. 2016. Disponível em: <http://thediplomat.com/2016/11/latest-us-fonop-in-the--south-china-sea-tilting-at-windmills/>. Acesso em: 28 nov. 2016.

VISENTINI, Paulo Fagundes; PEREIRA, Analúcia Danilevicz. História mundial con-temporânea (1776-1991): Da independência dos Estados Unidos ao colapso da União Soviética. 3. ed. Brasília: Funag, 2012.

VISENTINI, Paulo Fagundes. A Ásia no sistema internacional e a China como pivô. Con-juntura Internacional, Belo Horizonte, v. 11, n. 1, p.83-91, maio 2014.

WILLIAMS, Brock R.. The Trans-Pacific Partnership: Strategic Implications.

Referências

Documentos relacionados

O objetivo deste trabalho foi realizar o inventário florestal em floresta em restauração no município de São Sebastião da Vargem Alegre, para posterior

Ao passo que o homem eterno como tal nada deve ao homem moderno (LIMA, 1958, p. Não significa que a vida seja para ele sinônimo de mudança e transformação. Julga importante elaborar

The Project’ KPIs, were designed by Europcar according to the “LinkedIn Strategy Guideline” and divided in two parts: one regarding Sales Navigator Usage (i.e. number of

O SFTP, também conhecido como protocolo de transferência segura de arquivos, permite o acesso confiável e movimento de dados de um local para outro.. Ele inclui alguns recursos

D de um parafuso ´e uma v.a. Suponha que o raio R de uma esfera seja uma v.a. Qual ´e a probabilidade de que foram escolhidas 2 bolinhas de uma cor e 2 bolinhas de outra cor? Qual ´e

Artigo 24 - Dependem da aprovação por Maioria Simples e, cumulativamente, de cotistas que representem, necessariamente, (a) no mínimo 25% (vinte e cinco por cento) das cotas emitidas

libras ou pedagogia com especialização e proficiência em libras 40h 3 Imediato 0821FLET03 FLET Curso de Letras - Língua e Literatura Portuguesa. Estudos literários

A presente dissertação constitui um estudo reflexivo e circunstaciado, no âmbito da Geografia do Turismo, sobre a relação entre turismo e urbanização, a partir da análise