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DIREITO HUMANOS E A CRIMINALIZAÇÃO DO DISCURSO DE ÓDIO CONTRA POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS NO DIREITO BRASILEIRO

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DIREITO HUMANOS E A CRIMINALIZAÇÃO DO

DISCURSO DE ÓDIO CONTRA POVOS E

COMUNIDADES TRADICIONAIS NO

DIREITO BRASILEIRO

Rosana dos Santos Martins – UNIMONTES E-mail: rosana.santos.martins.adv@gmail.com. CAPES Luci Helena Silva Martins – UNIMONTES E-mail: lucihelenam@yahoo.com.br Resumo

O presente artigo busca possíveis caminhos para a compreensão e solução quanto ao problema do discurso de ódio contra povos e comunidades tradicionais, a partir da análise da legislação existente de tratados de direitos humanos. O objetivo geral do trabalho consiste, então, em analisar sobre a liberdade de expressão e o discurso de ódio contra povos e comunidades tradicionais no contexto democrático e como objetivo específico analisar a possiblidade de criminalização do mesmo base nos tratados internacionais de direitos humanos e na legislação brasileira atual. Para isso, primeiramente faz-se a análise da liberdade no ordenamento jurídico brasileiro e a definição de liberdade de expressão e discurso de ódio sob o viés das teorias de Ronald Dworkin e Jeremy Waldron. Após, busca-se analisar as leis e tratados internacionais de direitos humanos que poderiam servir de base legal para enfrentar o discurso de ódio contra povos e comunidades tradicionais. Usou-se para a realização deste trabalho pesquisa de abordagem qualitativa. No que tange ao objetivo, a pesquisa pode ser classificada descritiva, com enfoque na utilização da pesquisa de base bibliográfica e documental. Diante do estudado, as manifestações de cunho odioso contra povos e comunidades tradicionais podem ser criminalizadas com base nos tratados e convenções internacionais em que o Brasil é signtário, uma vez que a liberdade não é um direito absoluto, mas deve ser ponderado em caso de dano às comunidades tradicionais. Palavras-chave: discurso de ódio; liberdade de expressão; povos e comunidades tradicionais.

ABSTRACT

This paper seeks possible avenues for understanding and solving the problem of hate speech against traditional peoples and communities, based on the analysis of existing human rights treaties legislation. The general objective of the paper is, therefore, to analyze freedom of ex-pression and hate speech against traditional peoples and communities in the democratic context

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and the specific objective to analyze the possibility of criminalization on the same basis in international human rights treaties and legislation. current Brazilian For this, we first analyze freedom in the Brazilian legal system and define freedom of speech and hate speech under the theories of Ronald Dworkin and Jeremy Waldron. It then seeks to analyze international human rights laws and treaties that could serve as a legal basis for addressing hate speech against tra-ditional peoples and communities. A qualitative research was used for this work. Regarding the objective, the research can be classified as descriptive, focusing on the use of bibliographic and documentary research. In the face of the studied, the hateful manifestations against traditional peoples and communities can be criminalized based on the international treaties and conven-tions in which Brazil is signatory, since freedom is not an absolute right, but must be considered in case of damage. to traditional communities.

Keywords: hate speech; freedom of expression; traditional peoples and communities. 1 Introdução

O discurso de ódio pode ser entendido como manifestações de cunho odioso dirigido a um grupo ou movimento social, sendo tal manifestação proferida exatamente em razão da diferença do grupo ofendido e com base na suposta superioridade do emissor e inferioridade do atingido. Assim, faz-se necessário analisar sobre a possibilidade de criminalização do discurso de ódio contra povos e comunidades tradicionais.

A importância dessa pesquisa se faz na busca de possíveis caminhos para a compreensão e solução quanto ao problema do discurso de ódio contra povos e comunidades tradicionais, a partir da análise da legislação existente do tratados de direitos humanos.

O objetivo geral do trabalho consiste, então, em analisar sobre a liberdade de expressão e o discurso de ódio contra povos e comunidades tradicionais no contexto democrático e como objetivo específico analisar a possiblidade de criminalização do mesmo base nos tratados internacionais de direitos humanos e na legislação brasileira atual.

Para fins de cumprir os objetivos propostos para esse estudo, foi realizada uma pesquisa de abordagem qualitativa. No que tange ao objetivo, a pesquisa pode ser classificada descritiva, com enfoque na utilização da pesquisa de base bibliográfica.

2 Sobre a liberdade na democracia

Em um país onde impõe-se uma homogeneidade racial, social, e também sexual aos seus cidadãos, qualquer “desvio” é rechaçado (BAHIA, 2015). A proteção às minorias e grupos vulneráveis advém da necessidade de ruptura de uma sociedade patriarcal, machista e preconceituosa que discrimina e exclui aquele que é diferente dos “padrões” socialmente aceitos.

Atualmente, a liberdade está consagrada como um direito fundamental dos homens e a nossa CRFB declara várias formas de liberdade:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à

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segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;

VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-eximir-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

A liberdade de expressão é uma garantia presente no Estado Democrático de Direito. Mas nem sempre foi assim. Está foi expressa, pela primeira vez em 1687, no Bill of Right, que era um documento oriundo da Revolução Gloriosa que trazia direitos aos cidadãos da Inglaterra.

Mais adiante, a liberdade de expressão começa a incorporar outros documentos como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, exemplo disso é o artigo 10 que afirma que “ninguém pode ser molestado por suas opiniões, incluindo opiniões religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida”; e futuramente, na Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, sd) ao dispor que:

Artigo XIX

Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

Existem determinados discursos que nada acrescentam para o debate e possuem apenas a intenção de agredir e ferir o outro, e estes são definidos com discurso de ódio. Este pode ser entendido segundo Oliveira (2013, p. 19) como “qualquer manifestação de cunho odioso dirigido a um grupo social, tendo tal manifestação sido proferida exatamente em razão da diferença do grupo ofendido”.

Logo, a violência a grupos minoritários e vulneráveis podem ser física, moral, simbólica e principalmente por discursos de ódios mascarados como liberdade de expressão. Cabe então ao Estado possibilitar a liberdade de expressão e a pluralidade dentro do cenário político de forma que se tenha respeito e uma contribuição para a formação de uma democracia participativa e igual.

3 A questão do discurso de ódio

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intimidar ou assediar pessoas em virtude de sua raça, cor, etnicidade, nacionalidade, sexo ou religião, ou que têm a capacidade de instigar a violência, ódio ou discriminação contra tais pessoas.

Não há consenso sobre o discurso de ódio. De um lado, há quem defenda como uma manifestação legítima. De outro, há quem negue sua manifestação O debate sobre a possibilidade de restrições ao discurso de ódio é um dos mais ricos e profundos no campo do direito e da filosofia política. Temos então os filósofos John Rawls e Jeremy Waldron que apresentam teorias quanto ao discurso de ódio.

Ronald Dworkin foi um jurisfilósofo do Direito norte-americano que defendia que qualquer tentativa do Estado de impor limites a discursos e manifestações de cunho odioso viola o direito fundamental à liberdade de expressão e, por conseguinte, afeta a legitimidade democrática.

A liberdade de expressão nos Estados Unidos é entendida como a liberdade negativa fundamental, o centro, a essência e base da democracia, principalmente em razão da Primeira e Quarta Emenda. A partir desse argumento que o autor vai defender sua tese quanto a liberdade.

O autor apresenta que o princípio da igual consideração e respeito aplicado à política exige que todas as opiniões sejam ouvidas, independente do seu teor. Para Dworkin, assim como ninguém pode ser proibido de votar porque suas opiniões são desprezíveis, também “não se pode negar a ninguém o direito de falar, escrever ou manifestar-se pelo rádio ou pela televisão pelo simples fato de as opiniões dessa pessoa serem insultuosas demais para ser levadas em consideração”. (DWORKIN, 2006, p. 379/380)

Da mesma forma que Stuart Mill (sd) com sua tese sobre o mercado livre de ideias, Dworkin entende que a “liberdade deve alcançar inclusive as formas mais desprezíveis de opinião como sacrifícios a serem suportados para resguardar um amplo campo aberto de debate de ideias” (POTIGUAR, 2016, p. 61/62).

Ronald Dworkin utiliza não somente da ideia de que a liberdade de expressão promovida em um amplo espectro eleva a qualidade de um Estado Democrático, mas afirma que ela é uma condição de legitimidade política da própria democracia (DWORKIN, 2010).

Em uma corrente oposta, Jeremy Waldron acredita que os discursos de ódio podem vir a danificar elementos importantes da democracia. O autor então defende que a democracia se fortaleceria com restrições legais a esse tipo de manifestações. Essa tese é apresentada em seu livro, intitulado “The harm in the hate speech”, em tradução livre: O dano nos discursos de ódio.

Em seu livro, Waldron (2012, p.8) apresenta a ideia de uma espécie de regulamentação que proíba declarações que possam causar algum tipo de perturbação à paz social ou insultar os membros de minorias claramente vulneráveis como adotado em alguns países como Alemanha, Canadá, Dinamarca, Reino Unido e Nova Zelândia. Assim, os países que adotam esse tipo de regulamentação apresentem definição para leis que proíbam discurso de ódio.

Waldron apresenta então dois argumentos importantes sobre os discursos de ódio. O autor afirma primeiramente que os discursos de ódio afetam a dignidade dos indivíduos; e depois, afirma que estes discursos comprometem e corrompem o ambiente democrático.

Assim, faremos uma análise sobre a dignidade e ofensa na perspectiva de Waldron e a necessidade de leis que proíbam o discurso de ódio.

Waldron (2012, p. 66) usa o conceito de Rawls de sociedade bem-ordenada definida como uma “sociedade cuja estrutura básica foi regulamentada (e conhecida por ser regulamentada) por certos princípios de justiça e habitado por pessoas que tomaram a ideia de justiça a sério”. Assim, em uma sociedade bem ordenada, todos aceitam o mesmo princípios de justiça e sabem que os demais também o aceitam. A questão levantada é se em uma sociedade bem ordenada, a lei deve tolerar discursos de ódio?

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pessoas defendem o ódio racial ou religioso, haja vista a ideia de uma sociedade bem-ordenada

ser aquela amplamente e efetivamente governada por uma concepção de justiça”. Assim, não há como se falar em sociedade bem-ordenada se os intolerantes e racistas não abrirem mão de sua missão e começarem a aceitar os princípios básicos de justiça. Waldron (2012, p.78) então afirma:

Discussão em uma sociedade com suficiente rancor e divisão para gerar discursos de ódio não pode ser discussão em uma sociedade ordenada (no sentido de John Rawls) , uma vez que tanto o ódio que esse discurso exprime e o ódio calculado para angariar são incompatíveis com o atitudes cuja prevalência entre os cidadãos - com efeito, cuja adoção universal - é supostamente definidor de uma sociedade bem ordenada sociedade. Nós não chamamos uma sociedade “bem-ordenada” a menos que estas atitudes tenham morrido e sejam substituídas por sentimentos de justiça.

As nossas sociedades, além de não serem bem-ordenadas, precisam se proteger contra a intolerância e o discurso de ódio. Uma das formas de proteção que pode ser usada é a educação; e outra forma de proteção são as leis que proíbam este tipo de discurso (CONSANI, 2015). Consani observa que Waldron, ao falar de proteção, não o diz com se as pessoas buscassem uma ideia favorita de justiça, mas baseando-se nos fundamentos da justiça que afirma que todos somos iguais e detentores de dignidade, merecendo proteção contra qualquer forma de violência e intolerância (CONSANI, 2015).

Assim, diante do exposto, percebe-se a necessidade de se permitir as várias manifestações nos espaços públicos como forma de exercício da democracia, porém deve-se punir quanto tais manifestações caudeve-sem dano ao outro, como por exemplo aos povos e comunidades tradicionais.

4 O discurso de ódio contra povos e comunidades tradicionais

No Caderno de Cartas e Moções dos Encontros Regionais de Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT, 2014), destaca-se o investimento midiático violento contra os Povos e Comunidades de Terreiro que tem gerado mortes, agressões físicas e morais, além de estimular na sociedade brasileira o ódio racial e religioso contra estes povos e comunidades.

Assim, a questão que se levanta é sobre a possibilidade de criminalizar o discurso de ódio contra povos e comunidades tradicionais com base nos tratados de direitos humanos e na legislação brasileira atual.

Com o advento da Constituição de 1988, os povos indígenas e quilombolas tiveram reconhecido seus direitos coletivos. Com o passar do tempo, o direito desses povos foram se estendo para outros grupos por meio de decretos e ratificação de documentos internacionais (BRAGA, 2016, p. 125).

Para estabelecer uma política de desenvolvimento sustentável os povos, foi publicado o Decreto nº 6.040/07, trazendo no seu art. 3º, I, o conceito de povos e comunidades tradicionais (BRASIL, 2007):

Art. 3º Para os fins deste Decreto e do seu Anexo compreende-se por: I - Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa,

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ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição;

Assim, temos como marco dos direitos humanos sobre povos e comunidade tradi-cionais a Convenção nº 169 da OIT sobre povos indígenas e tribais que alterou a Convenção nº 107 da mesma OIT, datada da década de 1950, que tratava de maneira integralista e paternalista os povos indígenas e tribais e não reconhecia a diversidade dessas comunidades (BRAGA, 2016).

Porém, mesmo tendo seus direitos, os povos e comunidades tradicionais sobrem preconceitos e discriminações, sendo alvos de perseguições, discursos de ódio e morte.

A Constituição de 1988 dispõe expressamente que “a lei punirá qualquer discrimi-nação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais” (art. 5º, XLI). Já, o artigo 13, § 7º, da Convenção Americana de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário, determina que:

1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.

O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressa-mente fixadas pela lei a ser necessária para assegurar:

[...]

5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda

apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência. (BRASIL, 1992)

A Lei 12.288/2010, que instituiu o Estatuto da Igualdade Racial, estabelece, em seu art. 26, que o poder público adotará as medidas necessárias para coibir a utilização dos meios de comunicação social para a difusão de proposições, imagens ou abordagens que exponham pessoa ou grupo ao ódio ou ao desprezo por motivos fundados na religiosidade de matrizes africanas.

Além disso, o art. 20 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de-termina a proibição por lei de qualquer apologia do ódio nacional, radical, racial ou religio-so que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade ou à violência (BRASIL, 1992).

E por fim, temos “Princípios de Camden sobre a Liberdade de Expressão e Igualda-de”. Os Princípios representam uma interpretação progressiva dos padrões e normas internacio-nais, das práticas aceitas pelos Estados (como refletidas em legislações nacionais e julgamentos de tribunais nacionais) e dos princípios gerais do direito reconhecidos pela comunidade das nações.

Assim, o documento apresenta no seu 12º princípio uma proposta para que os Esta-dos possam elaborar um texto legal acerca do discurso do ódio (ARTIGO 19, 2009) e acrescenta que:

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12.1. Todos os Estados devem adotar legislação que proíba qualquer promo-ção de ódio religioso, racial ou nacional que constitua uma incitapromo-ção à discri-minação, hostilidade ou violência (discurso do ódio).

[...]

12.3. Os Estados não devem proibir críticas ou debates envolvendo ideias, crenças ou ideologias particulares, ou religiões ou instituições religiosas, a menos que sejam expressões do discurso do ódio, conforme definição no Prin-cípio 12.1.

Diante das recomendações presentes nos Princípios de Camden sobre a Liberdade de Expressão e Igualdade, tem-se que o Estado precisa ter um papel ativo quanto a proibição e combate ao discurso de ódio. Logo, diante de discursos de ódio contra os povos e comunidades tradicionais, faz-se necessário o acesso à justiça como meio de reparação, bem como políticas públicas de conscientização.

Percebe-se que os tratados e convenções sobre direitos humanos oferece arcabouço legal para a criminalização do discurso de ódio contra povos e comunidades tradicionais, uma vez que tais legislações impõem ao Estado o dever de proibir qualquer forma de discriminação. Assim, diante da falta de legislação específica sobre o discurso de ódio, deve-se fazer uma inter-pretação com base nos tratados e convenções de direitos humanos no qual o Brasil é signatário.

5 Conclusões

A democracia representa em sua essência a participação de todos, principalmente na formação da vontade estatal e a liberdade de expressão se apresenta como uma forma de se participar ativamente dos espaços públicos, porém as manifestações de cunho odioso se apresentam como uma forma de minar a diversidade nos espaços público por causar um temor e impedir, até pela violência verbal com que é conduzida essa manifestação, a participação das minorias na vontade estatal.

Diante do exposto, percebe-se que a proteção da liberdade de expressão não abarca o denominado discurso do ódio que consiste na divulgação de mensagens que difundem e estimulam o ódio racial, preconceito e discriminação e outras formas de ataques baseados na intolerância e que confrontamos limites éticos de convivência com o objetivo de justificar a privação de direitos, a exclusão social e até a eliminação física daqueles que são discriminados.

Assim, as menifestações de cunho odioso contra povos e comunidades tradicionais podem ser criminalizadas com base nos tratados e convenções internacionais em que o Brasil é signtário, uma vez que a liberdade não é um direito absoluto, mas deve ser ponderado em caso de dano às comunidades tradicionais.

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