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Resenha sobre o artigo: Oficinas Psicossociais com crianças: repensando o fazer

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Academic year: 2021

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Resenha sobre o artigo:

Oficinas Psicossociais com crianças: repensando o fazer

ABADE, Flávia Lemos e CRUZ, Jaíza Pollyanna Dias. As Oficinas Psicossociais com crianças In: XIII Colóquio Internacional de Psicossociologia e Sociologia Clínica, 2009, Belo Horizonte. Das solidões às solidariedades: vínculos sociais contemporâneos em análise. , 2009. v.único.

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* Ana Elisa Vieira

Psicóloga Clínica

O artigo retrata a experiência das psicólogas Flávia Abade e Jaíza Dias que ao trabalharem com grupos de crianças em uma instituição localizada no entorno da PUC Minas, utilizando a metodologia de Oficinas Psicossociais, foram convidados a repensar suas práticas. As dificuldades quanto ao uso da metodologia proposta por Afonso (2002;2003) e seu grupo de colaboradores, as motivaram a buscar novos conhecimentos para possibilitar a continuidade do trabalho e a sistematizar nossas observações e compartilhá-las com a equipe.

Foram apresentados neste artigo alguns aspectos relevantes para o trabalho em grupo proposto na metodologia das Oficinas e a experiência acumulada com os grupos de crianças, até concluírem que há muitos aspectos a serem analisados ao se abordar o trabalho de Oficinas Psicossociais com crianças.

As psicólogas constataram que as etapas para construção da oficina – análise da demanda, pré-análise, enquadre e planejamento flexível e a condução da oficina precisam ser flexibilizadas. Ao longo do processo de pesquisa-intervenção perceberam que não era possível, por exemplo, realizar a avaliação do encontro nem a reflexão após a utilização das técnicas em dinâmica de grupo.

O relato das psicólogas revelaram, também, que fazer pesquisas prévias sobre temas a serem trabalhados e consultar as crianças sobre o seu real desejo em participar dos grupos não foi suficiente para produzir uma oficina organizada na direção de ajudar as crianças, embora o vinculo entre elas e a equipe tenha se estabelecido. Elas só queriam

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brincar, bagunçar, não se concentravam no tema gerador e era difícil conversar sobre as brincadeiras.

Mas o que acontece nos grupos onde as crianças são os protagonistas? De que forma seria possível ajudá-las? Através da Interpretação analítica?

De fato, as oficinas têm como característica a criatividade que, segundo Corcione (2007) implica na capacidade de inventar o novo, tanto no que diz respeito ao modo de trabalhar, como ao produto construído.

Este mesmo autor segue acrescentando que não há receitas para se fazer oficinas, toda experiência sugere a soma de ingredientes adequados e somados de forma a corresponder às características locais, a cada público e objetivo. “ O prazer de fazer oficina se fundamenta exatamente na consciência de estar experimentando algo singular e de estar aprendendo a experimentar”.(CORCIONE, 2007, pg.39).

Pichon-Reviere, em sua teoria dos grupos operativos, traz uma idéia interessante sobre trabalho com grupos, para ele a oficina que visa a promoção da saúde, deve trabalhar com dois tipos de tarefa, a externa, caracterizada pelo cuidado com a saúde através de informações objetivas, racionais, conscientes e a interna que visa capacitar o grupo para ser capaz de lidar com a vida subjetiva, relacional emocional.

Os profissionais que trabalham promovendo a saúde das crianças devem agregar essas duas perspectivas ao seu trabalho, a informação consciente pode ser bastante útil, mas penso que seja, principalmente, na sua saúde psíquica desenvolvida a partir do lúdico e da interação com o grupo, que se encontram os principais recursos para as crianças desenvolverem seu potencial para a saúde e educação.

Outra idéia importante apresentada no livro “Oficinas em Dinâmica de grupo na área de saúde”, foi o conceito de grupo discutido por Kurt Lewin. Para este autor, o grupo é um espaço vital, cuja dinâmica resulta da interação de seus membros dentro de um contexto. Dessa forma, seria campo apropriado para a mudança de práticas, idéias, atitudes. As

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mudanças sociais, segundo Lewin (apud Afonso 2006) precisam estar enraizadas nas relações de grupos em constante movimento.

Acredito que as crianças possam em grupo gerar mudanças na cultura, sendo multiplicadoras de um contexto desde que sejam observadas suas particularidades. Assim, no caso de oficinas a serem realizadas com crianças, penso que seria necessário lembrar que as mesmas se expressam, por meio das palavras, mas também pelo corpo, diretamente ou por intermédio de brincadeiras. Decherf (1986) refere que no grupo de crianças ocorre uma associação livre pluriexpressiva: elas exprimem seus afetos e conflitos através de modos de expressão diversos como o verbal, o gestual e o lúdico.

Segundo Decherf (apud Abade e Cruz, 2007), seria necessário, então, que os coordenadores das oficinas percebessem esse encadeamento de expressões e ajudassem as crianças a estabelecer um elo entre os sentimentos que ela experimentava, os brinquedos e as atitudes que adotava através da interpretação cuidadosa.

Interpretar é, sobretudo, permitir que a criança estabeleça elos entre sua vida inconsciente e sua vida consciente, para que possa se conhecer melhor e tirar maior proveito de suas capacidades diversas. A interpretação em grupo é particularmente delicada: o analista deve levar em conta a presença dos outros e, em princípio, não poderá utilizar a história pessoal do paciente, a fim de evitar qualquer indiscrição ou ferimento narcísico (Decherf, 1986, p. 119).

Acredito que a interpretação só deva ser utilizada em casos extremos. Na perspectiva da psicanálise aplicada à prevenção no campo social a técnica é da associação livre, cabendo ao próprio sujeito a elaboração de suas questões e ao analista a disponibilização de uma escuta aberta e acolhedora, fazendo também intervenções pontuais sem interpretar.

Nesse sentido, Zimerman (2000) refere que só cabem intervenções eventuais de ordem interpretativa nas situações em que fatores inconscientes inter-relacionais venham a ameaçar a integração ou a evolução exitosa do grupo.

Penso que o que poderá ser incluído na direção de uma possibilidade de ajuda deveria ser “perguntado” às próprias crianças, quem sabe do tipo de apoio e ajuda que

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precisa para superar suas dificuldades são elas mesmas. Ao brincar, bagunçar, elas apresentam suas demandas, conflitos e resistências.

A partir dessa perspectiva penso que as oficinas com crianças podem ter um enquadre diferente. Tomando como referência o enquadre do trabalho realizado pela psicanálise aplicada ao campo da prevenção social, penso que as brincadeiras, os temas geradores devem ser totalmente livres, dessa forma as crianças encontrariam prazer, desenvolveriam a sua forma de fantasiar e isso os ajudaria no manejo da realidade e na integração dos sentimentos ambivalentes.

O esforço precisa ser na direção de proporcionar para essas crianças um espaço de acolhimento, que se revele transformador no sentido de libertar, empoderar. Isso supõe confiar nas possibilidades do outro decidir, fazer livres escolhas, e expressar sentimentos e angústias com foco na construção de realidades que façam sentido para elas.

Para Dolto (1985) os espaços de acolhimento, como devem ser as oficinas com crianças, são um espaço de palavras, de construção de vínculos, onde a criança é recebida prioritariamente como uma pessoa. O acolhedor deve representar um apoio, um receptor de angústias, que através da escuta, da transferência, permite um encontro significativo e profundo entre o acolhedor e as crianças e entre as próprias crianças que fazem parte do grupo.

É preciso destacar a importância do brincar para o desenvolvimento infantil. Através do jogo, ensina Maza (2009), as crianças nos mostram seu mundo interno, manifestam suas dificuldades e sua relação com seus pais e também com seus pares. Além disso, o jogo permite criar, construir, desenvolver a auto- confiança e o pensamento.

Penso que esse tipo de enquadre exige um cuidado maior com as intervenções que devem ser mais cuidadosas, mas centradas no apoio, que permitiriam, consequentemente, que as crianças se sentissem mais seguras ao expressarem tudo que vier ao pensamento. O tratamento psicanalítico em um ambiente de liberdade psíquica, segundo Maza( 2009), permite que as crianças sejam recebidas como elas são: sem críticas, julgamentos

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conselhos, nem diagnósticos. É necessário acreditar na capacidade da criança construir seu modo de interação através do lúdico, supondo que no decorrer do processo ela vá encontrando possibilidade e limites de estar no mundo em relação com a comunidade que a cerca.

Ainda pensando no enquadre, considero que o trabalho com crianças deva ser ainda mais flexível em relação ao número de encontros, tipo de participantes e duração das oficinas. A opção mais adequada seria o planejamento passo a passo, como foi a escolha das psicólogas, mas se tratando de crianças penso que o número de encontros precisa ser definido sempre ao longo do processo, as crianças que participam não devem ser necessariamente as mesmas e a duração de cada encontro deve ser aberta, de acordo com as demandas livres que as crianças trazem a cada encontro.

Há ainda uma consideração importante a fazer. Penso que entender a demanda das crianças envolve incluir as famílias nesse contexto de socialização e construção de vínculos.

S a l v a d o r M i n u c h i n , i m p o r t a n t e p e s q u i s a d o r d a t e o r i a s i s t ê m i c a , p o n t u a q u e a f a m í l i a é u m s i s t e m a a b e r t o e d i n â m i c o , o n d e s e u s m e m b r o s s e i n f l u e n c i a m m u t u a m e n t e e c o n s t a n t e m e n t e e s ã o i n f l u e n c i a d o s e i n f l u e n c i a m o m e i o e m q u e v i v e m . A f a m í l i a é c o n s i d e r a d a c o m o o p r i n c i p a l a g e n t e s o c i a l i z a n t e d a c r i a n ç a , a o n d e e s t e t e n d e a s e m o l d a r à s f o r m a s b á s i c a s d o c o m p o r t a m e n t o s o c i a l , s e n d o o s a g e n t e s s ó c i o - c u l t u r a i s d e c a r á t e r c o m p l e m e n t a r .

A psicanalista infantil Françoise Dolto acredita que a construção da infância se dá na interação entre as crianças e seus familiares. Para ela, a mãe se constitui em uma referência para a criança e a introduz na vida, graças ao vínculo de convivência que estabelece com ela, lhe dando sentido, identidade e a humanizando.

Nesse sentido Bowlby (1989) refere que:

(...) “o que se acredita ser essencial à saúde mental é que o bebê e a criança pequena tenham a vivência de uma relação calorosa, íntima e contínua com a mãe (ou mãe substituta permanente – uma pessoa que desempenha, regular e constantemente, o papel de mãe para ele) na qual ambos encontrem satisfação e prazer. É esta relação complexa, rica e compensadora com a mãe, nos primeiros anos, enriquecida de inúmeras maneiras pelas relações com o pai e com os irmãos e irmãs, que os

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psiquiatras infantis e muitos outros julgam atualmente, estar na base do desenvolvimento da personalidade e saúde mental” (BOWLBY,1989,p.13)

Masa ( 2009) considera fundamental para a construção de vínculos entre pais e filhos, por exemplo, o processo de acolhimento das mães. Acolhê-las significa ajudá-las a ter um estado mental aberto para receber o depósito sentido como bom e como mal da parte do seu objeto amado( o filho), quer dizer que ela deve ser capaz de receber as identificações projetivas da criança pequena. Deverá ser capaz de acolher seu filho.

Penso que no grupo os familiares podem encontrar segurança, apoio em relação às suas inquietações de serem pais. Sendo maternados a chance de aprender a acolher seus filhos aumenta podendo, enfim, caminhar na direção de acreditar no seu potencial de serem pais, na possibilidade de amar seu filho e serem amados enquanto pais com aquilo que eles possuem de melhor.

O trabalho em grupo com crianças e seus familiares revelou-se uma ferramenta fundamental para promoção da saúde e prevenção de doenças. O trabalho em grupo proporciona uma interação entre as pessoas, elas tanto aprendem, como são sujeitos do saber, ainda que a base deste saber seja apenas sua experiência de vida.

O mais importante é que elas sejam capazes de ressignificar suas histórias dentro de um contexto, muitas vezes, marcado por um cenário de extrema vulnerabilidade social. Nesse sentido, cabe aos profissionais de saúde desenvolver ações educativas sem esquecer que para acolher é preciso olhar para a sua própria infância, reconhecer que foram maternados nas suas primeiras experiências com seus pais, o que lhes permitiria, a princípio, reconhecer o seu potencial para acolher.

Considero que o artigo produzido pelas psicólogas de Minas Gerais trouxe uma grande contribuição à psicologia e a todos os profissionais de saúde que se propõem a trabalhar com grupos a partir da metodologia de Oficinas Psicossociais. Temos muito a aprender, a leitura desse trabalho revela-se de extrema importância na medida em que nos remete à necessidade de estarmos sempre refletindo sobre a nossa prática e a importância da pesquisa, da produção e publicação de trabalhos que visem à disseminação de novos conhecimentos na área da promoção da saúde e educação.

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Referências:

ABADE, Flávia Lemos e CRUZ, Jaíza Pollyanna Dias. As Oficinas Psicossociais com crianças In: XIII Colóquio Internacional de Psicossociologia e Sociologia Clínica, 2009, Belo Horizonte. Das solidões às solidariedades: vínculos sociais contemporâneos em análise. , 2009. v.único. Disponível em: http://www.fafich.ufmg.br/coloquioenriquez/tcompletos/311

AFONSO, Lúcia. (org) Oficinas em dinâmica de grupo na área da saúde. Belo Horizonte: Edições do Campo Social, 2003.

BOWLBY, John. Uma base segura: aplicações clínicas da teoria do apego. Porto Alegre.Artes Medicas, 1989

CORCIOLE, Domingos. Fazendo Oficina. Modulo Complementar- V.1. Odontologia em Saúde Coletiva 1. 20071.1

DECHERF, Gerard. Édipo em grupo: psicanálise e grupos de crianças. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986.

DOLTO. Françoise. La cause dês enfantes. Páris, Robert Lffont, 1985.

LEWIN, kurt. Problemas de dinâmica de grupo. São Paulo. São Paulo: Cutrix, 1998.

MASA, Bibiana. La Casa de La Familia. Lima: Universidade Nacional Mayor de San Marcos, 2009.

MINUCHIN,S. Famílias: funcionamento e tratamento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990 PICHON- REVIEIRE, E. O processo grupal. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

Referências

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