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GEOPOLÍTICA E INTEGRAÇÃO REGIONAL: UMA ANÁLISE DOS PROJETOS DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES ENTRE BRASIL E PARAGUAI

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UNIVERSIDADE

ESTADUAL

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UNESP

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DAYANA APARECIDA MARQUES DE OLIVEIRA CRUZ

GEOPOLÍTICA E INTEGRAÇÃO REGIONAL: UMA

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DE TRANSPORTES ENTRE BRASIL E PARAGUAI

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UNIVERSIDADE

ESTADUAL

PAULISTA

UNESP

FACULDADE

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CIÊNCIAS

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FCT

CAMPUS

DE

PRESIDENTE

PRUDENTE

P

ROGRAMA DE

P

ÓS

-G

RADUAÇÃO EM

G

EOGRAFIA

PPGG

DAYANA APARECIDA MARQUES DE OLIVEIRA CRUZ

GEOPOLÍTICA E INTEGRAÇÃO REGIONAL: UMA

ANÁLISE DOS PROJETOS DE INFRAESTRUTURA

DE TRANSPORTES ENTRE BRASIL E PARAGUAI

Tese elaborada junto ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da FCT/UNESP, sob orientação do Prof. Dr. Eliseu Savério Sposito e financiamento da FAPESP, para obtenção do título de Doutora em Geografia.

PRESIDENTE PRUDENTE 2 0 1 7

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3 FICHA CATALOGRÁFICA

Oliveira Cruz, Dayana Aparecida Marques de.

O46g Geopolítica e integração regional : uma análise dos projetos de infraestrutura de transportes entre Brasil e Paraguai / Dayana Aparecida Marques de Oliveira Cruz. - Presidente Prudente : [s.n], 2017

133 f. : il.

Orientador: Eliseu Savério Sposito

Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia

Inclui bibliografia

1. Geopolítica. 2. Integração Regional. 3. América do Sul. I. Oliveira Cruz, Dayana Aparecida Marques de. II. Sposito, Eliseu Savério. III. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Tecnologia. IV. Título.

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5 Dedico aos meus pais, Bernardo e Maria, e ao meu esposo, Fernando.

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6 Agradecimentos

À FAPESP que possibilitou a realização dessa pesquisa através do financiamento concedido (Processo FAPESP nº 2014/09913-1), sem o qual seria impossível dedicar-me exclusivamente e realizar o trabalho de campo. As opiniões, hipóteses e conclusões ou recomendações expressas neste material são de responsabilidade do(s) autor(es) e não necessariamente refletem a visão da FAPESP.

Ao meu orientador, Dr. Eliseu Savério Sposito pela orientação e disposição em ajudar sempre que necessário. Agradeço aos professores que compuseram a banca de qualificação, Dr. Nivaldo Hespanhol e Dr. Cássio Antunes de Oliveira, pela leitura atenta e avaliação minuciosa do relatório que originou essa tese. Agradeço também por terem aceitado o convite de fazer parte da banca de defesa da tese, por lerem novamente o meu trabalho e estarem dispostos a contribuir com ele. Aos professores Dr. Cláudio Egler e Drª Lisandra Lamoso que generosamente aceitaram participar da defesa e trouxeram novas reflexões para este trabalho.

Agradeço aos que gentilmente tornaram possível a realização das quatro fases do trabalho de campo, cujas contribuições foram fundamentais para o resultado dessa pesquisa: Ao Sr. Florisvaldo Fier, alto representante-geral do MERCOSUL. Aos professores da Faculdad de História, Geografía y Ciência Política da PUC/Chile, Dr. Cristian Henriquez, Dr. Johannes Hehnes e Dr. Federico Arenas Vásquez. Ao Sr. Patricio Mansilla, funcionário do Banco Inter-americano de Desenvolvimento, e integrante do Comitê de Coordenação Técnica da IIRSA. Ao economista e pesquisador do Centro de Análise e Difusão da Economia Paraguaia (CEADEP), Fernando Masi.

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7 Ao Sr. Luis María Pereira, coordenador nacional da IIRSA no Paraguai. Àqueles que tive o prazer de conhecer e que me ajudaram com dicas, informações, indicações de leituras... À Dr. Renata por permitir o acesso às atas das reuniões de construção da segunda ponte

entre Brasil e Paraguai. Ao Dr.Fabrício Vázquez pela indicação de leitura. Sou grata também aos funcionários da FCT/UNESP e das instituições onde realizei os trabalhos de campo, que gentilmente me receberam e proveram o necessário para cada etapa específica da pesquisa.

Aos amigos À Débora Reis, que tem um olhar simples e descomplicado do mundo, com quem eu converso quase todos os dias e que contribui para que a minha rotina seja mais leve e alegre. À Carolina Karoll pela amizade, por toda a sua generosidade comigo e com o meu trabalho, por todas as palavras de apoio e pela torcida para que cada etapa rendesse o resultado esperado. À Roberta Fonseca pelas conversas reflexivas e pelas risadas, pela companhia animada nos eventos acadêmicos, além das conversas de áudios longos no whats app. Ao Everton Luís de Souza Júnior que acompanhou meu longo projeto de ser um dia doutora e contribuiu de forma generosa e brilhante para que meu trabalho fosse cada vez melhor. Não há como esquecer de todo o apoio e a ajuda indispensável que tive desde o meu primeiro dia de aula na graduação até o término do meu doutorado. À Katia Kayahara por poder contar com sua presença e serenidade em tantos momentos incríveis da minha vida. Neste, não poderia ser diferente!

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8 À Cleidiane Santos de quem recebi um abraço aperto de “parabéns” pelo término dessa tese, com quem compartilhei conversas sobre as alegrias e os desafios de fazer um doutorado.

À minha querida família Com muito carinho menciono minha gratidão aos meus pais, Bernardo de Oliveira e Maria A. M. de Oliveira, que com entusiasmo sempre se preocuparam em expressar o apoio incondicional ao meu trabalho e às minhas escolhas. Lembro-me de todo o esforço com que vocês trabalharam para que eu tivesse condições de batalhar por meus objetivos. Ao meu irmão Bernard Oliveira que sempre tem algo positivo e animador para me dizer. Agradeço ao meu esposo, companheiro e amigo, Fernando Vieira da Cruz, por ter transformado o meu plano de formação acadêmica em um projeto nosso. O seu apoio foi fundamental para que eu tivesse a tranquilidade necessária para aproveitar todas as oportunidades que tive nesses últimos anos. Particularmente, os anos de realização dessa tese foram atípicos para nós, agradeço por compreender a minha ausência, por expressar com amor o seu desejo de que tudo desse certo, por encarar de forma leve e positiva as decisões que nós tomamos...

Agradeço a Deus por ter tido a oportunidade de encontrar todas essas pessoas que me ajudaram a viver mais uma realização. Sinto-me honrada por vocês terem feito parte de tudo isso.

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9 RESUMO

Geopolítica e integração regional: uma análise dos projetos de infraestrutura de transportes entre Brasil e Paraguai.

A relação assimétrica e desigual entre Brasil e Paraguai na América do Sul demonstra a complexidade do subsistema regional, que deve ser lida não só a partir do contexto econômico, mas também do contexto (geo) político regional, associado por sua vez ao sistema-mundo. Se por um lado, a ampliação da exportação de commodities e dos acordos de integração regional demandam o planejamento e investimento em projetos de infraestruturas, sobretudo de transportes; por outro lado, a fragilidade institucional e financeira dos acordos regionais contribui para o atraso no cronograma de execução desses projetos. A partir da análise do processo de integração regional sul-americano, considerando o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), o Conselho Sul-americano de Infraestrutura e Planejamento/Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (COSIPLAN/IIRSA), e o papel de liderança desempenhado pelo Brasil, afirmamos que existe uma estreita relação entre integração regional e geopolítica, na qual os projetos internacionais de infraestruturas podem ser considerados como pontos de encontro entre ambos.

Palavras-chave: Integração regional; Geopolítica; Projetos de infraestruturas de transportes; Brasil; Paraguai.

(10)

10 ABSTRACT

Geopolitics and regional integration: an analysis of transport infrastructure projects between Brazil and Paraguay.

The asymmetric and unequal relationship between Brazil and Paraguay in South America demonstrates the complexity of the regional subsystem, which must be read not only from the economic context, but also from the regional (geo) political context, associated in turn with the world system. If, on the one hand, the expansion of commodities exports and regional integration agreements demand planning and investment in infrastructure projects, especially transportation; on the other hand, the institutional and financial fragility of the regional agreements contributes to the delay in the execution schedule of these projects. Based on the analysis of the South American regional integration process, considering the Southern Common Market (MERCOSUL), the South American Council on Infrastructure and Planning / Initiative for the Integration of Regional South American Infrastructure (COSIPLAN / IIRSA), and the leading role played by Brazil, we affirm that there is a close relationship between regional and geopolitical integration, in which international infrastructure projects can be considered as meeting points between the two.

Keywords: Regional integration; Geopolitics; Transport infrastructure projects; Brazil; Paraguay.

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11

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 15

CAPÍTULO 1 - O MERCOSUL E O COSIPLAN/IIRSA: ASSIMETRIAS, DESIGUALDADES E CONTROVÉRSIAS ... 24

1.1 O MERCOSUL: integração e disparidades regionais ... 26

1.1.1 Fundo para a Convergência Estrutural do MERCOSUL (FOCEM) ... 39

1.2 A iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (IIRSA) ... 45

1.3 A relação entre MERCOSUL e UNASUL ... 60

1.4 Considerações sobre o capítulo 1 ... 67

CAPÍTULO 2 - BRASIL: SEMIPERIFERIA DO SISTEMA CAPITALISTA ENTRE A LIDERANÇA REGIONAL E A SUBORDINAÇÃO ... 69

2.1 Brasil: semiperiferia e liderança regional... 70

2.2 A necessidade de integração regional e os projetos de infraestruturas: uma (velha) explicação geopolítica dos acordos entre Brasil e Paraguai ... 92

2.3 Considerações sobre o capítulo 2 ... 101

CAPÍTULO 3 - O ATRASO NO ANDAMENTO DOS PROJETOS DO GRUPO 3 DO EIXO DE CAPRICÓRNIO: UMA DISCUSSÃO ALÉM DO CRONOGRAMA ... 102

3.1 Geopolítica e infraestrutura de transportes ... 103

3.2 O grupo 3: Assunción-Paranaguá do Eixo de Capricórnio ... 105

3.2.1 Entraves no andamento dos projetos relacionados ao modal ferroviário ... 116

3.2.2 O dilema da construção da nova ponte ... 124

3.3 Considerações finais do capítulo 3 ... 129

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 131

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12 LISTA DE QUADROS

QUADRO 1: Acordos de mecanismos inter-regionais que o Brasil participa ... 83

QUADRO 2: Comércio Exterior - Acordos sul-americanos dos quais o Brasil faz parte. . 88

QUADRO 3: Grupos de Projetos do Eixo de Capricórnio ... 105

LISTA DE TABELAS TABELA 1: Composição da API por país (em milhões de dólares) ... 56

TABELA 2: Fontes de financiamento dos projetos do COSIPLAN/IIRSA, 2016 (em milhões de dólares). ... 64

TABELA 3: Carteira de projetos do COSIPLAN/IIRSA segundo os países membros em 2016. ... 65

TABELA 4: Projetos do Grupo 3 do Eixo de Capricórnio ... 108

LISTA DE GRÁFICOS GRÁFICO 1: Distribuição dos recursos do FOCEM de 2008 a 2016 (em %) ... 41

GRÁFICO 2: Paraguai - Total de exportação no período de 1980 a 2013 (em milhões de dólares) ... 80

GRÁFICO 3: Paraguai – Porcentagem de exportação no período de 2010 a 2013 ... 115

GRÁFICO 4: Percentual de investimento estimado por país para a execução do projeto de construção do Corredor ferroviário bioceânico Paranaguá-Antofagasta ... 124

LISTA DE MAPAS MAPA 1: Participação dos países sul-americanos no MERCOSUL ... 30

MAPA 2: Área de influência do Eixo de Capricórnio ... 51

MAPA 3: Áreas de conservação existentes no Eixo de Capricórnio. ... 53

MAPA 4: Projetos do Eixo de Capricórnio ... 54

MAPA 5: Projetos da API do Eixo de Capricórnio ... 57

MAPA 6: Delimitação dos grupos do Eixo de Capricórnio ... 106

MAPA 7: Projetos do Grupo 3: Asunción-Paranaguá ... 109

MAPA 8: Traçado do projeto de construção do Corredor ferroviário Paranaguá-Antofagasta com indicação de trechos ... 119

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13 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ACE Acordo de Complementação Econômica

ACFI Acordos de Cooperação e Facilitação de Investimento AG Acordo de Alcance Parcial Agropecuário

AIIB Banco Asiático de Investimento e Infraestrutura ALADI Associação Latino-americana de Integração ALCA Área de Livre Comércio das Américas ALCSA Área de Livre Comércio Sul-Americana ALL América Latina Logística

ANTAQ Agência Nacional de Transportes Aquaviários ANTP Associação Nacional de Transportes Públicos API Agenda de Projetos Prioritários de Integração APTF Acordo de Preferências Tarifárias Fixas

AR Cooperação e Intercâmbio de bens na área cultural ASA Cúpula América do Sul – África

ASPA Cúpula América do Sul – Países Árabes BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social BRICS Brasil, Índia, Rússia, China e África do Sul

CAF Caixa Andina de Fomento

CALC Cúpula da América Latina e do Caribe

CAN Comunidade Andina

CCT Comitê de Coordenação Técnica

CEADEP Centro de Análise e Difusão da Economia Paraguaia

CEE Comunidade Econômica Europeia

CELAC Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos CEPAL Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe

CMC Conselho do Mercado Comum

CMEC China Machinery Engineering Corporation CNPC China National Petroleum Corp

COSIPLAN Conselho Sul-americano de Infraestrutura e Planejamento CPLP Comunidade de Países de Língua Portuguesa

CRFOCEM Conselho de Administração do FOCEM

DNIT Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes

EIA/RIMA Estudo de Impacto Ambiental / Relatório de Impacto Ambiental EIDs Eixos de Integração e Desenvolvimento

ENID Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento EVETA Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental FOCALAL Fórum de Cooperação América Latina – Ásia do Leste FOCEM Fundo para a Convergência Estrutural do MERCOSUL FONPLATA Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata

G-20 Grupo dos 20

GATT Acordo Geral de Tarifas e Comércio

IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

IBAS Índia, Brasil e África do Sul

IIRSA Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana JBIC Japan Bank for International Cooperation

(14)

14 KOICA Agência de Cooperação Internacional da Coreia

Kv Kilovolt

MAI Acordo Multilateral de Investimento MERCOSUL Mercado Comum do Sul

OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico ONGC Oil and Natural Gas Corportation Limited

PAC Programa de Aceleração do Crescimento PAE Plano de Ação Estratégico

Parlasul Parlamento do MERCOSUL

PDVSA Petróleo da Venezuela S.A PIB Produto Interno Bruto

PICE Programa de Integração e Cooperação Econômica PNLT Plano Nacional de Logística e Transporte

PTR Preferência Tarifária Regional

Sinopec China Petroleum & Chemical Corporation

SGPC Sistema Global de Preferências Comerciais entre Países em Desenvolvimento

SMP Sistema de Monitoramento Permanente

TICD Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento

UA União Africana

UNASUL União de Nações Sul-americanas

(15)

15

(16)

16 Mais do que a contextualização do objeto de estudo, nessa introdução queremos apresentar rapidamente as transformações da pesquisa durante o seu processo de execução, pois contribui para a compreensão da tese aqui defendida.

Num primeiro momento, a preocupação foi analisar o papel das infraestruturas de transportes propostas pelo Conselho Sul-americano de Infraestrutura e Planejamento/Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (COSIPLAN/IIRSA) e seus rebatimentos para a integração regional, sua relação com o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) - especificamente entre Brasil e Paraguai -, a fim de pontuar os impactos dos projetos na rede urbana, tendo como referência Dourados e Cascavel, no Brasil, e Ciudad del Este, no Paraguai.

A escolha dos países se deu pela natureza da relação entre eles estabelecida, pelas assimetrias no comércio regional e pelo descompasso econômico. Discutimos a necessidade de associar a análise do intercâmbio comercial no MERCOSUL à sua rede de transportes; ela indicava que a ampliação dessa rede contribuiria com a diminuição dos custos de circulação intra-regional e com a queda dos preços das commodities tornando essas mercadorias mais competitivas no mercado internacional.

Concluímos que a relação desigual e assimétrica entre os membros maiores (Argentina e Brasil) e menores do bloco (Paraguai e Uruguai) (ALVAREZ, 2011) é uma reprodução na escala regional, da relação de centralidade e subordinação que os membros maiores possuem no contexto global.

Foi então que começamos a refletir sobre o papel de semiperiferia do Brasil na economia-mundo. O papel de semiperiferia é caracterizado justamente por ser intermediário entre os países do centro do sistema capitalista e da periferia, por isso, a semiperiferia ocupa o papel de centro do subsistema, enquanto no contexto global, permanece como subordinado (IANNI, 1996). Do ponto de vista econômico essa subordinação ocorre principalmente pelo crescente volume de exportação de commodities para a Ásia e Europa, enquanto a exportação de manufaturas possui destaque no mercado interno e regional. No caso do Brasil, em 2012, segundo a Organização Mundial do Comércio (2015), as principais regiões importadoras de produtos primários do Brasil foram Ásia (32,6 bilhões de dólares) e Europa (21,8 bilhões de dólares), enquanto os principais importadores de manufaturas brasileiras no mesmo ano foram América do Sul e Central (32,5 bilhões de dólares).

(17)

17 Esse perfil é característico da economia mundial emergente, considerada por Benko (1998) como um mosaico de regiões produtivas e especializadas, que em um processo complexo de crescimento localizado se torna cada vez mais dependente de outras regiões. Embora o Brasil tenha se aproximado do sul global e apresentado mudanças significativas em sua política externa (através do aprofundamento de acordos de cooperação sul-sul, ocorridos, sobretudo, a partir do governo de Luiz Inácio Lula da Silva), sua estratégia de inserção econômica no mercado internacional baseada na exportação de commodities foi aprofundada. Um exemplo é que em 2016, a China que é o principal destino das

commodities do Brasil importou 35,1 bilhões de dólares, sendo 14,3 bilhões de dólares de

soja, equivalente a 41% do total (Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, 2017).1 A ampliação da exportação de commodities do Brasil, resultou em perda na projeção do mercado de produtos manufaturados para os chineses, tanto em relação aos países que integram o MERCOSUL, como no próprio mercado interno.

Sabendo que não só o Brasil, como os demais países da América do Sul ocupavam o papel de produtores de commodities na divisão territorial do trabalho, nos atentamos ao fato de que semelhança na agenda produtiva dos países sul-americanos dificulta a promoção de uma integração produtiva, por isso, o foco da integração regional está muito mais relacionado à necessidade de facilitar a circulação do que já é produzido, ao invés de promover a articulação entre diferentes cadeias produtivas. Daí a elaboração de projetos para a construção, ampliação ou adequação das redes de infraestruturas (transporte, energia e comunicação) para melhor atender os fluxos do mercado internacional, observando o potencial logístico que permite expandi-los.

Neste contexto, tomamos como referência a discussão feita por Santos (2008) sobre a relação dialética entre fixos e fluxos. No âmbito da integração regional ela pode ser pensada a partir do incremento técnico das infraestruturas (fixos) para criação, fortalecimento e estímulo de novas trocas (fluxos) no espaço geográfico, enquanto essas trocas demandam a criação de novos fixos, cuja especificidade é servir a reprodução do capital, a partir de aparatos infraestruturais dispersos espacialmente na forma de rede (SILVA JÚNIOR, 2009). Entendemos que se por um lado, a proposta de integração sul-americana visa diminuir os descompassos entre fixos e fluxos no subcontinente, por outro

1

Além da soja, os principais produtos importados do Brasil pela China foram: minérios de ferro e seus concentrados (21%), Óleos Brutos de Petróleo (11%) e celulose (6,2%) (Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, 2017).

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18 lado, contribui para reforçar a desigualdade entre os espaços, ao fortalecer as hierarquias já existentes ou ao criar novas hierarquias a partir do incremento técnico.

Para nós, a rede urbana seria um dos principais exemplos da criação ou fortalecimento dessas hierarquias; pretendíamos analisá-las considerando as cidades de Dourados e Cascavel, no Brasil, e Ciudad del Este, no Paraguai. Nossa hipótese era que a hierarquia estabelecida entre essas cidades e as demais cidades seria reforçada devido ao dinamismo das interações espaciais. Em função disso, um dos objetivos era analisar os desdobramentos dos projetos de integração regional na rede urbana.

Selecionamos, portanto, dois projetos do COSIPLAN/IIRSA: a construção do “Corredor ferroviário bioceânico Paranaguá-Antogafasta” e a construção da segunda ponte internacional “Puerto Presidente Franco - Porto Meira” (que compõe o Eixo de Capricórnio da iniciativa, formado por Argentina, Brasil, Bolívia, Chile e Paraguai).

No decorrer da pesquisa nos deparamos com informações que indicaram novos caminhos e possibilidades acerca do objeto de estudo. Pois, percebemos que mesmo com as justificativas para a implantação das infraestruturas propostas pelo COSIPLAN/IIRSA, ainda assim, havia um atraso no andamento e execução dos projetos, principalmente pela dificuldade dos países em discutir as prioridades dos projetos e de cumprir o que havia sido planejado.

Os primeiros indícios de tal fato aconteceram no ano de 2015, com a sistematização e análise das primeiras informações resultantes das entrevistas realizadas durante o trabalho de campo, que foram confirmadas com o término do mesmo2.

Neste contexto, surgiu-nos o questionamento: Quais os principais motivos que dificultam a execução dos projetos? Deparamo-nos com o fato de que os aspectos econômicos e de planejamento não davam conta de explicar os descompassos, a manutenção das assimetrias e a dificuldade no desenvolvimento dos projetos, principalmente em relação ao não cumprimento dos cronogramas. Percebemos que os projetos selecionados para análise nesta pesquisa, embora fossem justificados pelo impacto

2

O trabalho de campo foi realizado em três fases. A primeira fase consistiu na realização de entrevista com o Sr. Florisvaldo Fier, alto representante-geral do MERCOSUL, em junho de 2015, na cidade de São Paulo. A segunda fase foi realizada no mesmo mês, em Santiago no Chile, e contou com as seguintes atividades: pesquisa bibliográfica nas bibliotecas da CEPAL e da PUC/Chile, entrevista com o Sr. Patricio Mansilla (funcionário do Banco Inter-americano de Desenvolvimento e integrante do Comitê de Coordenação Técnica da IIRSA) e com o Dr. Johannes Hehnes (da Faculdad de Historia, Geografia y Ciência Política da PUC/Chile). A terceira fase foi a realização de entrevistas em Assunção do Paraguai, nos dias 23 e 24 de novembro de 2015, com o economista e pesquisador do Centro de Análise e Difusão da Economia Paraguaia (CEADEP), Fernando Masi, e com o coordenador nacional da IIRSA no Paraguai, Sr. Luis María Pereira.

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19 regional que causariam, sequer conseguiam ser finalizados pelos países por conta das constantes alterações em sua estrutura, bem como por dificuldades quanto ao financiamento. Dessa forma, como seria possível analisar o impacto das infraestruturas na rede urbana e nas cidades selecionadas, se algumas delas nem sequer haviam saído do papel?

O descompasso entre o discurso e a prática é ilustrado através da coexistência dos argumentos em prol da integração e das estratégias dos países com maior influência regional para a garantia de seus interesses individuais. Os exemplos dessa coexistência podem ser encontrados no atraso e adiamento na execução dos projetos e nos imprevistos e alterações repentinas dos projetos originais.

Com as novas observações sobre o objeto de estudo que surgiram no final de 2015 passamos a analisar o objeto de estudo sob uma nova perspectiva, considerando novas referências voltadas à geopolítica. Isso ocorreu porque parte dos resultados parciais obtidos indicavam que o atraso no cumprimento do cronograma dos projetos, bem como as alterações realizadas ao longo do tempo, não estavam relacionados apenas às questões financeira, incluía as divergências políticas e institucionais, das quais o Brasil aparecia como protagonista, por desempenhar o papel de liderança regional.

Por fim, considerando este contexto, no início do ano de 2016, redefinimos os rumos desta pesquisa, passando a defender que há uma estreita relação entre integração regional e geopolítica. Os projetos regionais de infraestrutura estão relacionados aos dois aspectos. No caso da América do Sul, eles têm um papel duplo de melhoria na circulação e de estratégias para manutenção das vantagens oriundas dos acordos regionais (que não se restringem ao uso das infraestruturas, mas abrangem também a elaboração, alteração e execução dos projetos) para a expansão da influência e consolidação da liderança regional brasileira.

Diante disso, estabelecemos três hipóteses, são elas:

1. Por desempenhar o papel de semiperiferia no sistema capitalista, o Brasil tem a dupla função de líder e subordinado. Tal papel indica uma reprodução na escala regional das relações que o país possui na escala global caracterizadas por desigualdades e assimetrias3.

3

Essas duas características são intrínsecas ao sistema capitalista de produção, portanto, existem em todas as escalas e acordos. Nosso objetivo em mencioná-las se deve ao fato de que entre o Brasil e os demais países sul-americanos, essas desigualdades e assimetrias possuem características específicas presentes desde a disponibilidade de recursos financeiros para a realização dos projetos até os aspectos legais dos acordos regionais; elas são históricas e estão associadas não só a forma como os países se relacionam, mas também à

(20)

20 2. A fragilidade institucional dos acordos regionais (MERCOSUL e União de Nações Sul-americanas - UNASUL) é responsável pela dificuldade na execução dos projetos de infraestrutura de integração entre os países. Essa fragilidade se dá principalmente pela ausência da supranacionalidade e de um sistema de financiamento capaz de suprir as demandas existentes.

3. Embora as alterações nos projetos de infraestrutura propostos entre Brasil e Paraguai sejam justificadas pelas dificuldades atuais de investimento ou por questões técnicas, os exemplos pretéritos de alterações em projetos de infraestrutura que encontramos entre os dois países indicam que os atrasos nos cronogramas também devem ser interpretados considerando a geopolítica, já que a partir deles é possível ampliar a influência e liderança regional.

Considerando as hipóteses apresentadas, o objetivo geral é discutir a relação entre

integração regional e geopolítica considerando os projetos de infraestrutura de transportes propostos no Grupo 3 (Assunção-Paranaguá) inseridos no Eixo de Capricórnio do COSIPLAN/IIRSA. Os objetivos específicos são:

1. Identificar os principais problemas relacionados na integração Brasil-Paraguai e as ações realizadas pelos Estados para minimizá-los, bem como o papel do COSIPLAN/IIRSA e do MERCOSUL para promover essa integração;

2. Discutir os critérios de escolha do Grupo 3 (Assunção-Paranaguá) do Eixo de Capricórnio do COSIPLAN/IIRSA e de seus projetos de infraestrutura de transportes;

3. Verificar e pontuar os aspectos políticos e econômicos que justificam o atraso e as alterações dos projetos, e seus rebatimentos sobre a integração regional.

Como ponto de partida para a análise aqui proposta, consideramos as principais referências:

 A análise do sistema-mundo de Immanuel Wallerstein, que possui quatro eixos principais: Eixo histórico-crítico, que explica a história do capitalismo e da modernização a partir de seu início no século XVI, entendendo que a modernização tornou-se global ao longo do século XIX; Eixo de análise-crítica dos principais acontecimentos e processos ao longo do século XX histórico, que teria sido iniciado em 1870 e que possivelmente se

estrutura política, econômica e social de cada país. Embora exista um discurso que prevê a diminuição dessas desigualdades e assimetrias a partir da integração entre os países, percebemos que elas se mantêm pouco alteradas, demonstrando a relação de dependência e subordinação entre periferia e semiperiferia.

(21)

21 estenderá até 20504; Eixo duplo de estudos da história imediata e definição de possíveis cenários prospectivos da evolução do sistema-mundo capitalista; Eixo

epistemológico-crítico que se opõe aos limites das ciências sociais atuais e resulta na proposta da

unidisciplinaridade, com as “ciências sociais-históricas”. Dentre as principais influências de Wallerstein estão: Marx, Braudel e Kondratiev5. Apesar de considerar os eixos desenvolvidos pelo autor como pontos de partida para a reflexão do objeto de estudo dessa tese, nossa principal referência está na existência do sistema-mundo no modo capitalista de produção, que se manifesta em fases cíclicas de expansão e contração, alterando geograficamente no decorrer da história, os papéis econômicos de centro, semiperiferia e periferia (WALLERSTEIN, 1974)6. Defendemos que o Brasil desempenha o papel de semiperiferia, desde a década de 1970, quando passou a ser o centro do subsistema regional.

 A geopolítica na bacia platina e a contribuição de Mário Travassos. Por se tratar do primeiro geopolítico brasileiro que analisou o papel exercido pelo Brasil

4

A delimitação cronológica do século XX histórico está relacionada aos processos fundamentais e determinantes, que está associado, dentre outras coisas à construção e decadência da hegemonia estadunidense. De acordo com Rojas (2007), a cronologia do século XX histórico começa com o fim da guerra civil nos Estados Unidos e com a derrota da França na guerra franco-prussiana, após esses fatos, as disputas vão se tornando cada vez mais ampliadas, até que finalmente, com o término da segunda guerra mundial emerge uma nova potência hegemônica, os Estados Unidos. É nesse período que os Estados Unidos passa a enxergar a América do Sul com maior relevância geopolítica, sobretudo, o Brasil, por conta da disponibilidade de recursos naturais e de sua dimensão econômica e comercial (BANDEIRA, 2008).

Apesar do fim do século XX cronológico, o século XX histórico não teria sido concluído, pois ele será equivalente a todo o processo lento de formação, afirmação e decadência da hegemonia estadunidense. O fim do século XX incluirá ainda outros processos como: a descolonização do planeta e a conquista da independência política pelos países coloniais com a desintegração dos impérios coloniais, e a crise resultante de um longo processo de revolução das estruturas culturais da sociedade contemporânea, iniciada no final da década de 1960 (ROJAS, 2007).

5

As ideias contidas no primeiro eixo de análise tem influência de Marx no que se refere à compreensão da história do capitalismo, que está baseada na lógica de acumulação marcada pela luta de classes, em que o Estados cede aos interesses dominantes.

O segundo eixo de análise do sistema-mundo tem influência de Braudel com a teoria dos diferentes tempos históricos, e o enfoque na larga duração histórica, conforme afirma ROJAS (2007, p. 19): “es también clara la enorme deuda de Wallerstein con la obra de Fernand Braudel, de la que toma en primer la teoría de los diferentes tiempos históricos y en especial el enfoque de la larga duración histórica, pero también algunos conceptos centrales como el de economía-mundo, o algunas tesis específicas como la de la relación particular entre monopolios y libre competencia dentro de las dinámicas globales del capitalismo”. Braudel também teve influência na análise do sistema-mundo de Wallerstein, com a crítica da inter/multi/pluri/transdisciplinaridade feitas no Eixo “epistemológico crítico”.

O terceiro eixo tem como referência os ciclos de Kondratiev, que é o ponto de partida para o estabelecimento de cenários prospectivos na análise do sistema-mundo (ROJAS, 2007).

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A distinção desses papéis tem como referência o conceito de economia-mundo desenvolvido por Braudel (1987). A economia-mundo ocupa um espaço geográfico específico e é composta por um centro e por zonas sucessivas, definidas como intermediárias e dependentes. De acordo com Braudel (1987) a diferença entre ele e Wallerstein no que se refere ao conceito de economia-mundo é que enquanto Wallerstein indica seu surgimento apenas na Europa, no século XVI, Braudel defende que o mundo já estava dividido em zonas econômicas mais ou menos centralizadas, no qual coexistiam várias economias-mundo.

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22 internacionalmente (MIYAMOTO, 1995 e MELLO, 1987), Travassos influenciou muitos outros geopolíticos brasileiros (como Lysias Rodrigues e Couto e Silva), baseado em Ratzel (no que se refere às concepções de espaço e posição) e Mackinder (e sua teoria do poder terrestre)7 indicou a necessidade de elaboração de uma política de comunicação brasileira. A política de comunicação brasileira defendida por Travassos consistia na expansão das redes de transportes, cujo intuito principal era a projeção continental do país para a neutralização da influência argentina na bacia do Prata, especialmente sobre a Bolívia e o Paraguai. Utilizamos este autor para demonstrar de que maneira as estratégias em busca da liderança regional brasileira eram estabelecidas (do ponto de vista geopolítico) no início do século XX, e como elas estavam relacionadas à expansão da rede de infraestruturas.

 A imaginação geopolítica moderna discutida por Agnew (2005) da qual faz parte a hierarquização do mundo e os padrões de crescimento e desenvolvimento euro-americanos. Afirmamos que a partir dos primeiros geopolíticos brasileiros iniciou-se o processo de criação da imaginação geopolítica brasileira. Ela sustenta o discurso de reprodução, no subsistema, a relação de dependência e subordinação com os países do centro do sistema capitalista.

 A hipótese de Bertha Becker de que a partir do fim da Guerra Fria surge uma nova geopolítica, cuja base está relacionada à racionalidade, à logística e às mudanças resultantes da revolução científico-tecnológica (BECKER, 2000). A autora é contrária à abordagem ratzeliana e realista clássica das relações internacionais, em que o Estado é o único agente político no sistema internacional, cabendo, portanto, considerar outros agentes como as corporações internacionais, os grandes bancos e a sociedade civil

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Embora outros geopolíticos clássicos tenham influenciado a geopolítica brasileira, como Mahan e Spykman (com a teoria do poder marítimo), Mackinder foi a principal referência dos primeiros estudos geopolíticos no país, que além de sua teoria do poder terrestre, tinham como referência também Ratzel, sobretudo, no uso dos conceitos de espaço, posição e poder (MELLO, 1987 e MIYAMOTO, 1995).

Majoritariamente, os estudos de geopolítica no Brasil foram desenvolvidos até a década de 1980 por militares (MIYAMOTO, 1995), já que nas universidades o termo geopolítica não era bem visto, por conta da forma como ele foi utilizado pela escola alemã, quando os princípios de Ratzel, Kjellén (primeiro a utilizar geopolítica em 1899) e Mackinder foram distorcidos pelo alemão Karl Hauschofer, que teve suas ideias utilizadas pelo nazismo alemão (MELLO, 1987).

Segundo Miyamoto (1995) desde o início dos estudos geopolíticos no Brasil (1920) até a década de 1990, os principais temas pesquisados foram: transportes, mudança da capital federal, fronteiras e a divisão territorial do país. Em relação aos estudos de geopolítica e transportes, Miyamoto (1995) destaca dois autores: Moacir Silva e Lima Figueiredo. Os autores defendiam a integração nacional, maior fluidez das riquezas nacionais e uma nova saída para o Pacífico através da expansão da rede de transportes. Figueiredo, influenciado por Travassos defendia a criação da ferrovia Santos-Arica, via Corumbá-Santa Cruz de la Sierra através da Estrada de Ferro do noroeste do Brasil (MIYAMOTO, 1995).

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23 organizada. Segundo Becker, há ainda que incorporar novos temas de debate no âmbito da geopolítica, como as redes de circulação e comunicação; a cooperação internacional; a redefinição da relação sociedade-natureza; etc. Todos estes temas são relevantes para a análise da complexidade e seletividade da economia no cenário internacional, em que o Brasil desempenha um papel intermediário.

A tese está estruturada em três capítulos, que contemplam as hipóteses e objetivos definidos. O capítulo 1, “O MERCOSUL e o COSIPLAN/IIRSA: assimetrias, desigualdades e controvérsias” discute o papel do Brasil como liderança de dois acordos de integração, que embora tenham passado por transformações distintas ao longo do tempo permanecem com dificuldades comuns no que se refere ao sistema de solução de controvérsias e ao financiamento dos projetos de infraestruturas. O capítulo é dedicado à análise desses acordos, por isso apresenta detalhadamente o histórico de criação, a organização, os aspectos institucionais e seus respectivos conflitos. Por fim, apresenta as possibilidades de convergência entre o MERCOSUL e a UNASUL.

O segundo capítulo “Brasil: semiperiferia do sistema capitalista entre a liderança regional e subordinação” trata sobre o imaginário geopolítico brasileiro baseado na expansão da influência do Brasil na Bacia do Prata e sua consolidação como semiperiferia do sistema capitalista, cujo papel complexo permite a manutenção de uma liderança regional, enquanto permanece na condição de subordinado aos países centrais. O capítulo 2 trata também da utilização de projetos de infraestrutura como estratégias para a expansão da influência brasileira, ao observar o caso do Paraguai e os projetos propostos pelo Brasil na década de 1970. Pontua também os acordos estabelecidos pelo Brasil com o sul global, através da cooperação sul-sul, apresentando-os como estratégia de manutenção da liderança regional resultantes da mudança na agenda política brasileira dos anos 2000.

O terceiro capítulo “O atraso no andamento dos projetos do Grupo 3 do Eixo de Capricórnio: uma discussão além do cronograma”, analisa a proposta e andamento dos projetos de construção do “Corredor ferroviário bioceânico Paranaguá-Antogafasta” e da construção da segunda ponte internacional “Puerto Presidente Franco - Porto Meira”. O capítulo inclui nesta análise as justificativas de elaboração dos projetos (com foco para a integração entre o Brasil e o Paraguai), as dificuldades do processo de execução destes projetos, o debate sobre o custo e a busca por financiamento das obras e os conflitos oriundos das alterações nos projetos originais.

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CAPÍTULO 1 -

O MERCOSUL E O

COSIPLAN/IIRSA: ASSIMETRIAS,

DESIGUALDADES E

CONTROVÉRSIAS

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25 O MERCOSUL e a iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (IIRSA) são acordos regionais dos quais o Brasil faz parte que possibilitam ampliar seu poder regional e projeção internacional, por ocupar uma posição intermediária de semiperiferia.

MERCOSUL e IIRSA tiveram algumas similaridades no que se refere ao contexto em que foram criados. Isso se deve, sobretudo, ao cunho neoliberal das iniciativas de integração regional, visando à inserção competitiva no comércio internacional das mercadorias produzidas no subcontinente.

O MERCOSUL, criado em 1991, com a assinatura do Tratado de Assunção por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, surgiu logo após a quebra de acordos cobertos pelo Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) em busca de uma maior autonomia para o fortalecimento da economia regional. Já o surgimento da IIRSA se deu no ano 2000, ainda sob influência do regionalismo aberto, como resultado da proposta dos presidentes sul-americanos em uma reunião ocorrida em Brasília.

Desde a criação do MERCOSUL, o bloco passou por algumas modificações relacionadas a temas importantes para a integração regional. Dentre elas podemos citar: o fortalecimento da estrutura organizacional do bloco; a proposição do sistema de solução de controvérsias; a criação do Fundo para a Convergência Estrutural do MERCOSUL (FOCEM); a adesão da Venezuela ao bloco etc. A maior parte desses temas foram regulamentados por meio dos Protocolos adicionais ao Tratado de Assunção, no entanto, alguns deles ainda precisam ser discutidos e aprimorados. Além dos aspectos tratados do ponto de vista jurídico, recentemente, a mudança no protagonismo político dos Estados Partes trouxeram novos temas ao debate do bloco, que remetem principalmente às possibilidades de flexibilização do MERCOSUL, contrariando o fortalecimento do bloco.

A necessidade de discussão e aprimoramento de temas relevantes para a integração regional também se aplicam à IIRSA que, diferentemente do MERCOSUL, passou por uma transformação mais profunda do ponto de vista político, haja vista a inserção, no ano de 2011, ao Conselho Sul-americano de Infraestrutura e Planejamento (COSIPLAN), cuja denominação alterou-se para COSIPLAN/IIRSA. A principal mudança decorrente dessa inserção foi a implantação de fóruns para discussão dos projetos, que tiveram pouca representação do ponto de vista prático já que não vieram acompanhados por um sistema de solução de controvérsias ou por um sistema de financiamento para os projetos.

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26 As mudanças no MERCOSUL e na IIRSA são objeto deste capítulo. Nossa intenção é pontuar, a partir dessas iniciativas de integração regional, de seus diferentes contextos e de suas transformações, os desafios para a integração na América do Sul. Percebemos que tais desafios estão relacionados à manutenção da relação de subordinação e liderança entre os países sul-americanos, ao mesmo tempo em que refletem as assimetrias regionais.

Especificamente daremos ênfase nesse capítulo a dois pontos de destaque no MERCOSUL e na IIRSA: a fragilidade do sistema de solução de controvérsias e a dificuldade em estabelecer um sistema de financiamento que corresponda à demanda dos países porque a maior parte deles não tem condições de arcar com os custos da integração regional.

Para tanto, este capítulo está dividido em três partes. Primeiramente, trataremos sobre os dois pontos citados observando o caso do MERCOSUL, adicionado a análise do intercâmbio comercial no bloco e entre Brasil e Paraguai. Em seguida faremos o mesmo para o COSIPLAN/IIRSA, observando a organização do acordo e sua proposta de regionalização. Por fim, nossa preocupação é apresentar a relação entre ambas as iniciativas no processo de integração regional sul-americano.

1.1 O MERCOSUL: integração e disparidades regionais

Argentina e Brasil foram protagonistas das iniciativas que antecederam a formação do MERCOSUL. Tais iniciativas estiveram relacionadas à cooperação econômica entre os países, tendo como exemplo a experiência de integração europeia, iniciada na década de 1950 (após a Segunda Guerra Mundial), com a criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, que aproximou do ponto de vista político e econômico os seguintes países: Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo e os Países Baixos.

A ampliação desta comunidade para outros setores econômicos (além do gerenciamento do carvão e do aço na indústria pesada) resultou na assinatura do Tratado de Roma, em 1957, criando a Comunidade Econômica Europeia (CEE), que em 1992, passou a denominar-se União Europeia.

Embora os rumos do processo de integração tenham sido distintos, a experiência da integração europeia é um ponto de referência para o estudo da integração sul-americana

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27 por ter sido iniciada num momento de transformação no cenário internacional (após Segunda Guerra Mundial), demonstrando a nova estratégia dos países utilizadas naquele momento, que consistia dentre outras coisas, no estabelecimento de blocos para o fortalecimento do mercado regional, visando à inserção mais competitiva de suas mercadorias no mercado internacional.

No momento em que Argentina e Brasil iniciaram sua aproximação através dos acordos de cooperação da década de 1970, a CEE já havia estabelecido uma zona de livre comércio de mercadorias, formada pelos países que assinaram o Tratado de Roma, além da tarifa externa comum para as importações de mercadorias originárias de países que não faziam parte da CEE. Ou seja, o processo de integração já se consolidava como uma união aduaneira, o qual viria em 1993 tornar-se um mercado comum com a livre circulação de

mercadorias, serviços, pessoas e capitais.

A União Europeia seguiu o caminho previsto para a integração. Desde a década de 1960 passou por vários processos de adesão de outros países europeus ao bloco; criou o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (em 1974), com medidas de investimento nas regiões mais pobres, para o fomento à infraestrutura e criação de empregos; os países assinaram o Ato Único Europeu (em 1986), que aumentou a influência do Parlamento Europeu frente às diferenças nas legislações nacionais; instituíram o euro como moeda única, introduzida para transações comerciais e financeiras (em 1999), ampliando sua circulação em 2002 (UNIÃO EUROPEIA, 2017).

Com a crise econômica de 2008 e o recente Brexit8, o processo de integração europeu indica novas estratégias e rumos da integração regional, que também vem ocorrendo em outras regiões. Ainda que existam fatores internos para o enfraquecimento dos blocos, como a mudança no cenário político regional sul-americano, entendemos que há uma tendência de enfraquecimento desses acordos a partir de uma nova estratégia através dos acordos bilaterais. Neste novo cenário de reorganização dos acordos, a China tem ampliado seu papel econômico, sendo protagonista de muitos desses novos acordos ou iniciativas bilaterais.

Como dito anteriormente, a aproximação entre Argentina e Brasil foi iniciada no fim da década de 1970, quando foi solucionado o conflito pela utilização dos recursos

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28 hídricos da Bacia do Paraná9, seguido pelo acordo do desenvolvimento nuclear para fins pacíficos e pela busca da integração setorial entre os países, em 1985 (através da assinatura da Declaração do Iguaçu)10.

Naquele momento de redemocratização, os presidentes José Sarney, do Brasil e Raúl Alfosín, da Argentina, reuniram-se oportunamente para a inauguração da Ponte Internacional Tancredo Neves, entendida, à época, como símbolo de união entre Argentina e Brasil.11 Outro ponto que culminou na aproximação dos dois países foi o posicionamento de ambos durante a Guerra das Malvinas que ocorreu em 1982. Segundo Oliveira (1998), o envolvimento na guerra demonstrou a limitação estratégica da Argentina e a importância da cooperação diplomática com o Brasil.

Diante da aproximação inicial política e econômica entre os dois países, Argentina e Brasil firmaram o Programa de Integração e Cooperação Econômica (PICE), instituído em 1986, pela Ata de Integração Brasileiro-Argentina. Composto por protocolos setoriais, o intuito do programa era ampliar o comércio entre os dois países através da diminuição das tarifas alfandegárias, indicando metas, porém sem fixar prazos rígidos (ALVAREZ, 2011). Para Oliveira (1998), do ponto de vista econômico, o programa teve bons rebatimentos, pois contribuiu com o aumento do intercâmbio comercial entre os dois países, sendo que a Argentina duplicou a exportação ao Brasil, que por sua vez passou a ser o primeiro destino dos produtos argentinos.

Já entre 1988 e 1991 foi instituído o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento (TICD), que ao contrário do anterior (PICE), estabeleceu um sistema geral, universal e automático, pelo qual foi determinado o prazo de dez anos para a conformação de uma área de livre comércio entre os países (ALVAREZ, 2011). É interessante ressaltar que dentre as considerações feitas para a elaboração do tratado constam: a necessidade de consolidar o processo de integração econômica entre Argentina e Brasil no contexto da integração latino-americana e a decisão dos governos dos dois países em prepará-los para os desafios do século XXI (BRASIL, 1989).

9

A solução deste conflito teve como marco a assinatura do Tratado Tripartite Itaipu-Corpus, em 1979. Segundo Oliveira (1998) este tratado impulsionou uma aproximação entre os vizinhos rivais ao encerrar uma antiga disputa de poder energético na Bacia do Prata.

10 A Declaração do Iguaçu destaca os planos técnico, econômico, financeiro e comercial, apresentando como

necessária a participação das indústrias argentinas e brasileiras, bem como de suas respectivas estatais.

11

A ponte foi inaugurada por conta da demanda da população, sobretudo das cidades de Puerto Iguazú e Foz do Iguaçu. Foi a primeira obra inaugurada, desde 1947 (com a inauguração da Ponte Internacional entre as cidades de Uruguaiana e Pado de los Libres), por isso foi um marco significativo no processo de integração física entre os países (BRASIL, 1985).

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29 O tratado estava previsto para ser cumprido em duas etapas. Num primeiro momento, o foco estaria voltado para a harmonização e coordenação de políticas setoriais; num segundo momento, o objetivo era avançar rumo à formação do Mercado Comum. Porém, de acordo com Oliveira (1998), no ano de 1990, a Ata de Buenos Aires foi assinada com a decisão de acelerar o processo de formação do mercado comum, diminuindo o tempo estabelecido no TICD pela metade, devendo ser alcançado, portanto, em dezembro de 1994. Para a autora, o impacto dessa nova decisão atraiu, definitivamente, Paraguai e Uruguai12, levando a assinatura do Tratado de Assunção, que é o marco legal do MERCOSUL.

Bandeira (2008) e Sorj e Fausto (2011) afirmam que a criação do MERCOSUL foi também uma resposta à proposta de criação da Área de Livre Comércio das Américas (a ALCA), feita pelos Estados Unidos. A ALCA tinha como intuito a maior abertura do mercado sul-americano para as corporações internacionais e investimentos estrangeiros, com a participação mínima do Estado (BANDEIRA, 2008).

A assinatura dos vários tratados e protocolos entre Brasil e Argentina significou uma mudança de rumo na forma de conduzir as relações internacionais entre os dois países. Segundo Miyamoto (1995), os países deixaram de lado a lógica da geopolítica do conflito, substituindo-a pela visão de cooperação (que foi fortalecida com os governos Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner), assim a Bacia do Prata consolidou-se como uma possibilidade de integração regional.

A assinatura do Tratado de Assunção por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai teve como intuito impulsionar a internacionalização. Foram estabelecidos como objetivos do MERCOSUL: a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países; o estabelecimento de uma tarifa externa comum; a coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais entre os membros; e o compromisso dos mesmos em harmonizar suas legislações visando fortalecer o processo de integração (MERCOSUL, 1991).

Os países que assinaram o tratado passaram a ser denominados como Estados Partes. Em 2012, a Venezuela passou a integrar o grupo dos Estados Partes, passando, portanto, a ser um dos membros efetivos, com poder de voto e veto. Além dos cinco

12

De acordo com Escudero (1992 apud Alvarez, 2011), a necessidade de circulação de produtos, de apoio à internacionalização, e de modernização produtiva, também motivaram Paraguai e Uruguai a aderirem ao processo de integração, protagonizados por Argentina e Brasil. Soma-se a isso, a postura de pendularidade alternada adotada por Paraguai e Uruguai entre os dois grandes líderes na Bacia do Prata (MELLO, 1986).

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30 Estados Partes (Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela), os demais países sul-americanos também participam do bloco, conforme mostra o Mapa 1.

MAPA 1: Participação dos países sul-americanos no MERCOSUL

De acordo com Alvarez (2011), a decisão de formar o bloco gerou uma grande expectativa de negócios e contribuiu para o aumento no intercâmbio comercial entre os países13, pois não se tratava de um acordo que seguia tradicionalmente etapas pré-definidas, mas de uma iniciativa que foi contra qualquer precedente gradual. Para Marques (2001), um dos problemas gerados a partir disso foi a inconsistência jurídica responsável por um cenário de incertezas e conflitos regionais. Tal cenário passou a significar uma

13 De acordo com Schvarzer (2001) em 1986, antes da criação do MERCOSUL, o intercâmbio de

mercadorias entre Brasil e Argentina era menor, sendo 8% do total de exportações da Argentina para o Brasil e 5% do Brasil para a Argentina, esses valores subiram para 25% e 14%, respectivamente, após a criação do bloco econômico. Da mesma forma, Schvarzer (2001) menciona o aumento das exportações dos dois países para o resto do mundo, destacando que por conta das políticas de cunho neoliberal tomadas por Argentina e Brasil no fim da década de 1980 e início dos anos de 1990, o perfil da balança comercial dos países permaneceu baseado em exportação de produtos primários e importação de produtos industrializados.

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31 barreira para a evolução do bloco, principalmente por conta da dificuldade na solução de conflitos associado à incorporação das normas do MERCOSUL pelos Estados Partes. O Tratado de Assunção estabeleceu em seu anexo III um sistema provisório para a solução de controvérsias, que foi aprimorado apenas em protocolos posteriores (de Brasília e de Olivos), porém não trouxeram soluções definitivas, como veremos no decorrer deste capítulo.

Na verdade, o foco do Tratado de Assunção esteve relacionado ao período transitório entre a assinatura pelos Estados Partes e o período estipulado para o alcance do mercado comum14 (precisamente até a data de 31 de dezembro de 1994). Em função disso foram adotados temporariamente: um Regime Geral de Origem, um sistema de Solução de Controvérsias e Cláusulas de Salvaguarda (anexos II, III e IV do Tratado de Assunção).

Após o Tratado de Assunção, outros protocolos adicionais foram assinados, visando o aprofundamento de alguns pontos pertinentes para o avanço da integração regional. O primeiro deles foi o Protocolo de Brasília, assinado em 1991, cujo objetivo foi apresentar mecanismos de solução de controvérsias, com a utilização de meios jurídicos para a resolução de conflitos comerciais entre os países.

Apesar da necessidade da proposta de aprimoramento dos mecanismos de solução de controvérsias, Marques (2001) afirma que o protocolo de Brasília foi muito criticado por ter perdido a oportunidade de criar um sistema de acesso à Justiça, através de um Tribunal do MERCOSUL. Ao invés disso, o procedimento adotado a partir deste protocolo foi um sistema ad hoc de arbitragem, que acabou dependendo muito mais da diplomacia, do que apresentando na prática uma solução para os conflitos (MARQUES, 2001).

A criação do Tribunal Permanente de Revisão do MERCOSUL15 ocorreu apenas com as duas atualizações do Protocolo de Brasília, a saber: o Protocolo de Olivos (em 2002) e seu protocolo modificativo (em 2007). A partir do Protocolo de Olivos ficou estabelecido que quando há uma controvérsia, os países devem primeiramente tentar resolver de forma direta. Se não houver solução para a controvérsia é necessário notificar o

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O alcance deste primeiro objetivo do tratado deveria ser alcançado a partir da livre circulação de bens; estabelecimento de uma tarifa externa comum e uma política comercial comum em relação aos terceiros; posicionamento uníssono em foros econômicos regionais e internacionais; coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais; compromisso com a harmonização das legislações dos países, visando o fortalecimento do processo de integração.

15

A estrutura organizacional do tribunal é composta por: um árbitro de cada Estado Parte e mais um árbitro eleito por unanimidade pelos países, e pela Secretaria do Tribunal, que é composta por um secretário de qualquer um dos Estados Partes que supervisiona quatro áreas específicas da secretaria (área jurídica, biblioteca, informática e administração).

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32 Grupo do Mercado Comum através da Secretaria Administrativa do MERCOSUL, dando, a partir disso, seguimento ao processo16.

Embora a criação do tribunal tenha sido um primeiro passo para o aprimoramento da criação de mecanismos para a solução de controvérsias, o Tribunal Permanente de Revisão do MERCOSUL, tem uma atuação frágil por tratar apenas de controvérsias que são submetidas diretamente ao tribunal, ou que passaram por outras instâncias. Além disso, não há obrigatoriedade dos Estados Partes em acatar as decisões determinadas pelo tribunal, pois nem todas as constituições permitem a aplicação direta das normas do MERCOSUL.17 Isso se deve ao próprio sistema de funcionamento do bloco, que é intergovernamental, o que quer dizer que mesmo as decisões tomadas pela maioria podem não ser acatadas por um país, já que o direito interno deste país é entendido como superior ao acordo. Ou seja,

o Estado-Membro detém a mesma liberdade de ação que possuía antes de pertencer ao organismo internacional, pois não há restrições ao seu poder nacional. As decisões internas, assim sendo, podem ser tomadas ainda que contrariem o intuito integracionista. O Estado Parte não sofre, ademais, qualquer ingerência na sua autonomia individual (LORENTZ, 1999, P. 31).

O modelo intergovernamental está associado à geração de crises institucionais, pois depende da diplomacia para o alcance da solução de controvérsias, facilitando a mudança repentina de posicionamentos dos países que fazem parte do acordo, além de tornar o processo burocrático (KERBER, 2000). Baseando-se na regra da unanimidade e na reciprocidade como o cenário desejável e possível para colocar em prática as decisões tomadas no âmbito do MERCOSUL, novas atribuições são dadas aos Ministros dos Estados Partes: a resolução de controvérsias e a promoção de harmonização das normas e dos procedimentos administrativos (BAPTISTA, 1996).

A obrigatoriedade em acatar as decisões do bloco só existiria caso o MERCOSUL tivesse um caráter supranacional, mas isso é interpretado como um risco à autonomia e soberania dos Estados Partes (SANAHUJA, 2010). Por outro lado, a adoção do princípio da supranacionalidade no MERCOSUL seria uma possibilidade para a diminuição da desigualdade jurídica no bloco, porque a partir disso, os Estados Partes passariam a

16

Embora as discussões acerca do sistema de solução de controvérsias tenham sido feitas apenas com o Protocolo de Brasília e suas modificações posteriores, o anexo III do Tratado de Assunção estabeleceu um sistema provisório para a resolução de controvérsias através de negociações intergovernamentais diretas. Caso os países não entrassem em acordo, era preciso submeter a controvérsia ao Grupo do Mercado Comum, que no período de sessenta dias deveria apresentar um parecer sobre o assunto. Todavia, na permanência da controvérsia, ela deveria ser submetida ao Conselho do Mercado Comum.

17

Entrevista realizada com o Alto Representante-Geral do MERCOSUL, Sr. Florisvaldo Fier, em junho de 2015 na cidade de São Paulo.

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33 cumprir todas as determinações estabelecidas. Destarte, um debate mais profundo deveria ser realizado acerca do direito interno dos países, demandando inclusive a adaptação das respectivas constituições, principalmente do Brasil e do Uruguai que não tratam sobre a questão.18

O fato de nem todos os Estados Partes incorporarem o princípio da supranacionalidade gera consequências legais no momento da incorporação das normas. Nota-se então, que embora o Protocolo de Brasília e suas atualizações tenham sido assinados com a função de aprimorar mecanismos para a solução de controvérsias, poucos avanços ocorreram na prática, porque isso não está ligado a mecanismos imediatos, mas a natureza do bloco econômico.

A fim de regulamentar a relação do MERCOSUL com outros países, blocos econômicos e organismos internacionais, foi assinado em 1994 o Protocolo de Ouro Preto. Com a assinatura deste protocolo, o MERCOSUL passou a ter personalidade jurídica de Direito Internacional, passando a funcionar de maneira mais autônoma. Isso significou muito para os Estados Partes, pois a partir do Protocolo de Ouro Preto, os países passaram a negociar internacionalmente como um bloco, aumentando o poder de negociação.

O Protocolo de Ouro Preto definiu a estrutura organizacional do MERCOSUL, que passou a ser composta pelos seguintes órgãos: Conselho do Mercado Comum (responsável pela condução política do bloco); Grupo do Mercado Comum (órgão executivo do MERCOSUL); Comissão de Comércio do MERCOSUL (responsável por acompanhar o Grupo do Mercado Comum para garantir a aplicação de instrumentos da política comercial); Comissão Parlamentar Conjunta (órgão representativo do parlamento dos Estados Partes); Foro Consultivo Econômico Social (órgão representativo dos setores econômico e social); e a Secretaria Administrativa do MERCOSUL (responsável pelo apoio operacional).

O protocolo de Ouro Preto tratou de uma das metas do MERCOSUL estabelecidas com a assinatura do Tratado de Assunção, que era tornar-se um mercado comum em 1994.

18

A Venezuela indica a aceitação da supranacionalidade em sua constituição, a Argentina também, desde que haja reciprocidade com os demais membros; Brasil e Uruguai não apresentam essa questão em suas respectivas constituições, já o Paraguai é o Estado Parte que se posiciona a favor da supranacionalidade, definindo, inclusive, os tratados internacionais como superiores ao direito interno do país, bem como uma sistemática de incorporação desses tratados (KERBER, 2013). É interessante observar que a Constituição da República Bolivariana da Venezuela traz um posicionamento a favor da supranacionalidade como herança das alterações pretéritas que foram requisito da CAN (Acordo de Cartagena), do qual fez parte antes do MERCOSUL (KERBER, 2013). Além disso, outro fator a ser considerado é que as constituições do Brasil e do Uruguai são as únicas anteriores à assinatura do Tratado de Assunção, por isso não tratam sobre o assunto, no entanto, desde 1991, poderia ter havido uma inclusão de aspectos relacionados ao tema nas respectivas constituições para tornar mais eficaz o processo de integração regional.

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34 Isso não ocorreu pela falta de estabelecimento de uma tarifa externa comum, por isso o bloco passou de uma zona de livre comércio para uma união aduaneira imperfeita19. A partir da assinatura do protocolo foram incorporados “uma série de instrumentos orientados ao aperfeiçoamento da união aduaneira, alguns já anunciados em março de 1991 quando se firmou o Tratado de Assunção. Ou seja, tratava-se de livre comércio dentro da região e uma política comercial comum com terceiros” (BERLINSKI, 2006, p. 81 – tradução livre da autora)20.

Na ocasião de assinatura do protocolo de Ouro Preto, os Estados Partes sabiam que a meta de transformar o MERCOSUL em um mercado comum, no prazo estabelecido no Tratado de Assunção, seria impossível. Para não perder a credibilidade do acordo por conta do descumprimento da meta estabelecida21, eles optaram por aprovar a união aduaneira (ainda que incompleta), a solução foi aceitar taxas diferenciadas, sendo mantidas algumas exceções, as quais foram sendo alteradas ao longo do tempo (KUME e PIANI, 2011).

Quatro anos após o Protocolo de Ouro Preto, foi assinado em 1998, o Protocolo de Ushuaia, que trouxe uma dimensão diplomática para o MERCOSUL, pois os protocolos anteriores tratavam estritamente do caráter comercial das relações entre o MERCOSUL e os países vizinhos. Com o Protocolo de Ushuaia passou-se a defender o compromisso democrático como fundamental para o andamento dos acordos de integração, que incluiu além dos Estados Partes, o Chile e a Bolívia.

O Protocolo de Ushuaia estabeleceu as medidas que devem ser aplicadas aos países mencionados caso haja quebra com o compromisso diplomático. As medidas estabelecidas no artigo 5º do protocolo compreendem desde a suspensão do direito de participar dos órgãos do MERCOSUL, até a suspensão dos direitos e deveres que envolvem o processo de integração.

19

A união aduaneira caracteriza-se pelo estabelecimento de uma tarifa externa comum para as mercadorias importadas, além da criação de uma zona de livre circulação das mercadorias dos países que fazem parte do acordo. O MERCOSUL é considerado uma união aduaneira imperfeita, pois mantém uma lista de exceções na tarifa de importação, ou seja, um mesmo tipo de mercadoria pode ter diferentes taxas de importação dependendo do país que a importou. Além disso, não houve a criação de uma zona de livre circulação de mercadorias, já que elas têm salvaguardas para entrar nos países (medidas compensatórias para a manutenção da produção interna de um país, a fim de aumentar sua competitividade perante os demais, caso exista risco de prejuízo em decorrência do aumento das importações), mesmo tendo sido produzidas por um dos Estados Partes.

O status de união aduaneira imperfeita demonstra a fragilidade institucional do MERCOSUL.

20

“una serie de instrumentos orientados al perfeccionamiento de la unión aduanera, algunos ya anunciados em marzo de 1991 cuando se firmó el Tratado de Asunción. Es decir, se trataba de libre comercio dentro de la región y uma política comercial común com terceros países” (BERLINSKI, 2006, p. 81)

21

Kume e Piani (2011) classificam como ousado o estabelecimento de um objetivo desse porte, diante das diferenças tarifárias nacionais e da falta de estabilização macroeconômica, que dificultavam o estabelecimento de uma tarifa externa comum (KUME e PIANI, 2011).

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