III SEMINÁRIO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS REPENSANDO INTERESSES E DESAFIOS PARA A INSERÇÃO INTERNACIONAL DO BRASIL NO SÉCULO XXI Área temática: Instituições e Regimes Internacionais
ANÁLISE DO PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DO
MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE ATRAVÉS DA SUA
PARTICIPAÇÃO EM REDES INTERNACIONAIS DE
CIDADES ENTRE OS ANOS DE 2005 E 2015
Alice Duarte – Graduanda em Relações Internacionais pela Unisinos e Estagiária na Prefeitura de Porto Alegre Loïc Wable – Mestrando pela PSIA Sciences Po e pelo PPGEEIUFRGS e Estagiário na Prefeitura de Porto Alegre Marina Felisberti – Graduanda em Relações Internacionais pela UFRGS e Estagiária na Prefeitura de Porto Alegre Marcela Ávila – Graduanda em Políticas Públicas pela UFRGS e Estagiária na Prefeitura de Porto Alegre Yuri Padilha – Graduando em Relações Internacionais pela Unirritter e Estagiário na Prefeitura de Porto Alegre Rodrigo Corradi – Mestre em Relações Internacionais pela UFRGS e Coordenador da Gerência de Relações Internacionais da Prefeitura de Porto Alegre
Florianópolis, 29–30 de setembro de 2016.
Resumo: O artigo propõese a analisar a atuação da capital gaúcha nas redes globais e regionais – Cidades e Governos Locais Unidos (CGLU) e Mercocidades, respectivamente, identificando como projeto de internacionalização de municípios, apontando as especificidades da projeção da sua influência em diferentes espaços de negociação e níveis internacionais. É importante ressaltar que a perspectiva teórica do presente trabalho é a do policymaker, representado através da Gerência de Relações Internacionais da Prefeitura de Porto Alegre. A conclusão desta análise vai ao encontro da efetividade do processo de internacionalização através da continuidade de atuação política em redes internacionais de cidades.
Palavraschave: Paradiplomacia; Cooperação; Gestão em Rede.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo examinar a internacionalização de cidades, através da atuação de municípios em Redes, sob o paradigma do caso de Porto Alegre entre os anos de 2005 e 2015, encabeçada, principalmente, pela Gerência de Relações Internacionais agente diretamente envolvido neste processo. Para tanto, o artigo encontrase organizado em três grandes blocos argumentativos: (i) contextualização histórica e teórica; (ii) o contexto regional: rede mercocidades, paradiplomacia e integração regional; e (iii) o contexto global: rede cidades e governos locais unidos (CGLU) e que busca, em última instância, corroborar a hipótese da utilização de Redes de cidades como um dos mecanismos de inserção internacional de municípios. Desta forma, o trabalho pretende desenvolver a ideia de que a atuação de governos locais em Redes de cidades configura um projeto concreto e possibilitador da internacionalização de municípios, demonstrando, ainda, as especificidades da utilização de Redes nos casos tanto de projeção regional quanto de projeção internacional de cidades, atentando para os diferentes níveis e espaços de negociação entre municípios e de suas pautas. Utilizandose do marco teórico da paradiplomacia (SALOMÓN, 2012), defendese, por fim, a viabilidade de um processo de internacionalização de municípios baseado na compreensão dos governos subnacionais como agentes de política externa e, portanto, atores autônomos na gestão e implementação das suas relações internacionais.
Através de uma breve (i) contextualização histórica e teórica, o trabalho discute, em um primeiro momento, a internacionalização de cidades e a opção pela utilização do conceito de paradiplomacia, desenvolvido por Soldatos (1990) e Duchacek (1990) e posteriormente contextualizado por Salomón (2012). Em um segundo momento, ainda, propõese um resgate do contexto da emergência dos poderes locais como atores no Sistema Internacional e uma breve discussão sobre a trajetória de Porto Alegre neste cenário. Sob a perspectiva do (ii) contexto regional: rede mercocidades, paradiplomacia e integração regional, pretendeuse expor a importância da atuação de cidades em contextos, mesmo que regionais, de Redes de municípios, principalmente, no que tange a pautas de interesse comum entre cidades vizinhas, como, por exemplo, as questões fronteiriças. Por fim, discutese (iii) o contexto global: rede cidades e governos locais unidos (CGLU) e os desafios da nova agenda urbana buscando, de um modo geral, demonstrar o surgimento e a consolidação de grandes espaços de discussão e de atuação dos poderes locais em nível internacional global, a importância do desenvolvimento progressivo destes espaços e, ainda, a consolidação do processo de internacionalização de municípios, baseado no estudo de
caso da cidade de Porto Alegre, através da atuação contínua destes atores em Redes de cidades, sendo estas regionais ou não.
2 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA E TEÓRICA
2.1 A Internacionalização de cidades: o município como um agente da política externa subnacional
No final da década de 80, Duchacek (1990) e Soltatos (1990) observaram ações internacionais praticadas por entes subnacionais como uma possível tendência dentro do Sistema Internacional, em especial quando inserida em contextos de federações que possuíam unidades regionais ou provinciais. Embora avesso aos acordos internacionais dos séculos XVIII e XIX, que conferiam legitimidade para a atuação acerca da diplomacia, da guerra e do comércio exterior somente aos Estadosnacionais soberanos, cuja expressão deveria ser indivisível e monopolística (DUCHACEK, 1990), os autores observaram diversos casos de “relações transnacionais” entre governos subnacionais nos Estados Unidos da América, no Canadá e na Bélgica (DUCHACEK, 1990; SOLDATOS, 1990). Seus esforços para determinar as causas dessa nova tendência e capacidade dos governos locais culminaram no inegável reconhecimento dos governos nãocentrais como novos atores internacionais, assumindo que “seus atos legais e suas atividades de lobby afetam a política internacional e, logo, atraem atenções e reações extranacional” (DUCHACEK, 1990, p. 12, tradução própria), dando origem à expressão “paradiplomacia” (DUCHACEK, 1990, p. 15; SOLDATOS, 1990, p. 35). Essa conclusão, na época, desafiava os governos centrais a trabalharem de forma cooperativa junto a seus entes federados, trazendo o conceito como uma nova possibilidade de inserção no sistema internacional ou como uma crescente ameaça à soberania dos Estados com relação às suas políticas externas (DUCHACEK, 1990).
Soldatos (1990), que reconhecia a paradiplomacia como um fenômeno que segmentava atores e eventualmente políticas nacionais, entendia esse processo como uma possibilidade de racionalização.
“(...) a paradiplomacia, ao invés de ser considerada como um processo de conflito, pode ser uma racionalização, onde governos federais podem aceitar ou até estimular o papel internacional de suas unidades federadas como complementares (coordenadas, conjuntas ou monitoradas) aos seus esforços internacionais” (SOLDATOS, 1990, p. 49).
Salomón (2012) observa o surgimento de estruturas burocráticas de gestão das relações internacionais em governos estaduais brasileiros no contexto favorável da redemocratização e descentralização da década de 80. A autora entende o fenômeno como uma reação às mudanças sistêmicas que a globalização sugere à contemporaneidade, percebendo os governos subnacionais como agentes de política externa e, portanto, alertando sobre as limitações da utilização do termo “paradiplomacia” no contexto atual.
Sua primeira ressalva diz respeito a frequente confusão das expressões “diplomacia” e “política externa” (SALOMÓN, 2012). A diplomacia, caracterizada pela dimensão da implementação das políticas internacionais, corresponde a apenas um dos aspectos relativos à política externa e, consequentemente, não abrangendo todas as possibilidades de atuação internacional dos governos subnacionais. Além disso, Salomón (2012) alerta sobre a escolha do prefixo “para” utilizado no termo, que traz um sentido de subordinação e inferioridade que deve ser questionado quando analisamos os limites da ação internacional de estados e municípios.
Assim, aceitamos o termo “paradiplomacia” como o atualmente mais conhecido e utilizado dentro e fora da academia, embora não se deva esquecer durante a leitura do presente artigo que, ao utilizar tal expressão, denotamos a política externa subnacional, fruto da ação de estados e municípios como agentes do sistema internacional (SALOMÓN, 2012). Da mesma forma, é importante lembrar que faremos uso das ferramentas dispostas pela Análise de Política Externa para compreender as ações internacionais do município de Porto Alegre, percebendo os processos de tomada de decisão e a implementação da política externa com enfoque específico nas experiências que envolvem o policymaker em questão, neste caso a estrutura da Gerência de Relações Internacionais da Prefeitura de Porto Alegre.
2.2 O contexto da emergência dos poderes locais como atores no Sistema Internacional e a trajetória de Porto Alegre
Com as mudanças no Sistema Internacional, que ocorreram a partir do fim dos anos 1980, como o colapso da União Soviética, o fim da bipolaridade e o aumento da globalização, houve a necessidade de que os diversos atores internacionais passassem a ser mais ativos. As organizações internacionais, as empresas transnacionais, as ONGs e, inclusive, as cidades iniciaram um processo de participação em esfera global. As cidades,
através do Movimento Municipalista Internacional (1913), liderado por Barcelona, Espanha (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2013a ), se tornaram essenciais para o prosseguimento de ações específicas, principalmente aquelas relacionadas às chamadas “Novas Agendas”, composta por pautas como o meio ambiente, as mudanças climáticas e mobilidade urbana (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2013b; MARX, 2006).
Na América Latina e, consequentemente também no Brasil, viviase com intensidade todo o contexto histórico da redemocratização e da descentralização em meados da década de 80, que criaram um cenário favorável para atividades de governos não centrais no exterior (SALOMÓN, 2012). Assim, a rápida movimentação que deu origem aos processos individuais de internacionalização de cidades teve Porto Alegre como um dos primeiros municípios a traçar uma estratégia mais estruturada de internacionalização (MARX, 2006). A principal base da política internacional da cidade era a ideologia do Partido dos Trabalhadores (PT), responsável pela administração do município na época. O binômio formado pelas iniciativas do Orçamento Participativo (OP), em 1989, política pública singular e com potencial internacional (PORTO ALEGRE, 2001a), e pelo Fórum Social Mundial (FSM) ( FÓRUM SOCIAL MUNDIAL PORTO ALEGRE, 2013) , que surgiu como contraponto ao Fórum Econômico Mundial (1971) e às políticas neoliberais, trouxeram reconhecimento para Porto Alegre, que passou a ser conhecida como a “Cidade da Democracia Participativa”. Em 2005, com a mudança de governo do município e o início da administração do Partido Popular Socialista (PPS), o caráter ideológico da administração anterior foi diminuído, porém o processo de internacionalização pelo qual a cidade estava passando seguiu forte, alicerçado, entretanto, em outras questões – como a cooperação bilateral e as Redes de cidades (MARX, 2006).
Sob uma perspectiva global de análise, destacase, neste contexto de Redes, a Cidades e Governos Locais Unidos (CGLU), formada em 2004, a maior Rede de cidades do mundo, considerada, por muitos, a “Organização das Nações Unidas (ONU) das Cidades”, com mais de 150 integrantes (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2006). Porto Alegre, corroborando seu papel de destaque na área, aparece como membro fundador da Rede, além de fazer parte do Bureau Executivo, órgão responsável pelas principais tomadas de decisão da CGLU. O município participou, ainda, dos últimos eventos relevantes da Rede, o encontro do Bureau Executivo de 2016, em Kazan, Rússia (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2016), além de ter sediado a edição de 2015, do mesmo evento, que contou com a presença de mais de 150 pessoas, de 30 diferentes países (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2014).
Ademais, a CGLU (2004) é composta por diversos comitês, que tratam de questões específicas. Porto Alegre é copresidente do Comitê de Planejamento Estratégico Urbano, em conjunto com Durban, cidade sulafricana. Tal comitê é voltado, em especial, para aquelas cidades que se situam em países em desenvolvimento e que não possuem planejamento urbano consolidado, dado o aumento desordenado de suas populações (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2012).
Sob uma perspectiva regional de análise, destacase o papel da Mercocidades (1995), uma Rede de cidades regional, originada ainda dentro do escopo do Mercosul (1991) embora hoje já contemple municípios de outros países sulamericanos que originalmente não compõem o bloco (MERCOCIUDADES, 2001). Porto Alegre foi também membro fundador e voltou sua política internacional quase que exclusivamente para a Rede durante alguns anos (20052010). A cidade participa ativamente dos eventos proporcionados pela Mercocidades (1995) e foi Secretária Executiva da Rede nos biênios 1996/97 e 2013/14, tendo sediado, portanto, as Cúpulas de 1996 e 2013. Assim como a CGLU (2004) é composta por comitês, a Mercocidades (1995) possui Unidades Temáticas (UTs). Porto Alegre, atualmente, é coordenadora de duas UTs, a de Integração Fronteiriça e a de Autonomia, Gestão e Participação (MERCOCIUDADES, 2010). A primeira foi criada como o objetivo de melhorar as condições dos municípios de fronteira e, a segunda, com o objetivo de incentivar o compartilhamento de boas práticas sobre democracia participativa e gestão municipal.
3 O CONTEXTO REGIONAL: REDE MERCOCIDADES E INTEGRAÇÃO REGIONAL
Em 1995, representantes de governos locais do Cone Sul reuniramse no seminário “Mercosul: Oportunidades e Desafios para as Cidades”, realizado no âmbito Mercosul (1991), na cidade de Assunção, Paraguai, com discussões que pautaram principalmente o papel das cidades, municípios e províncias. Neste seminário, os municípios de Córdoba (Argentina), La Plata (Argentina), Rosário (Argentina), Brasília (Brasil), Curitiba (Brasil), Florianópolis (Brasil), Porto Alegre (Brasil), Rio de Janeiro (Brasil), Salvador (Brasil), Assunção (Paraguai), Montevidéu (Uruguai) firmaram a Declaração de Assunção (1995), na qual registrouse o desejo de formação de uma Rede de cidades, já denominada por Mercocidades (MERCOCIUDADES, 2010).
“Mercocidades tem uma proposta de integração regional, porque entende a integração regional como a estratégia comum para posicionarmos o contexto
planetário e incidir nos âmbitos de decisão global” (RODRIGUES, 2015, p. 11, tradução própria). 1
Conforme observado no Estatuto e Regulamento da Rede, escrito em novembro de 2015, na Assembleia Geral da Mercocidades, ocorrida na cidade de São Paulo (Brasil), a integração entre cidades justificase pelo importante ambiente de interação humana proporcionado a esta iniciativa de organização de cidades em rede, estabelecendo o município, e sua atuação através de iniciativas assertivas, como ator substancialmente importante no espaço internacional.
“(...) as cidades constituem espaços de interação humana de importância crescente e suas organizações administrativas representam entidades ativas de participação política que não podem estar alijadas à globalização das relações internacionais” (MERCOCIUDADES, 2015).
Deste modo, o governo local exerce papel de agente de política externa nos contextos regional e global , conceito já ilustrado no marco teórico deste trabalho. Com base 2 nessa justificativa, a integração entre os atores envolvidos na Rede tem o objetivo de impulsionar a troca de boas práticas, informações e tecnologia, visando o estabelecimento de cooperação política, econômica, social e cultural entre seus membros. Dessa forma, com base nos objetivos mencionados, criase possibilidade para que novas agendas regionais sejam pautadas, contribuindo para um canal de comunicação que favoreça o surgimento de soluções para problemas situados no meio urbanos (GOMES et al., 2015).
Considerando os diversos impactos causados pela urbanização, o modelo de integração proposto pela Rede possibilitou um grau maior de legitimidade aos governos locais sulamericanos, devido à proximidade destes para com a sociedade civil. Essa proposta descentraliza os tradicionais conceitos de diplomacia e integração (SOLDATOS, 1990), proporcionando maior espaço para a gestão da política externa pelos entes subnacionais (SALOMÓN, 2012), promovendo a formação de agendas tanto regionais quanto globais, tornando as cidades e seus cidadãos protagonistas neste modelo de atuação.
A estrutura da Rede dáse por meio de diversos órgãos, sendo composta por uma Assembleia Geral, um Conselho, uma Comissão Diretiva, a Presidência, a Vicepresidência,
1 No original: “Mercociudades tiene una propuesta de integración regional, porque entiende a la
integración regional como la estrategia común para posicionarrnos en el contexto planetario e incidir en los ámbitos de decisión global.”
a Secretaria Técnica Permanente e outras 15 Unidades Temáticas (UTs), consideradas como subredes dedicadas ao debate e implementação de ações e projetos envolvendo as principais demandas de interesse comum das cidades (MERCOCIUDADES, 2016).
Ainda no âmbito das Unidades Temáticas da Rede, atualmente, Porto Alegre representa a coordenação de duas destas UTs, Autonomia, Gestão e Participação e Integração Fronteiriça. A primeira dessas, criada em 1998, nasce com o intuito de gerar um espaço que promova a pesquisa e debates de cunho técnicos e políticos.
O objetivo da UT criada em 1998 é promover a pesquisa, bem como um debate técnico e político sobre os processos de transformação e de descentralização política e administrativa das cidades da região, abrangendo ainda tópicos como os processos de modernização administrativa, as estratégias de participação cidadã, os sistemas jurisdicionais, a autonomia e o orçamento municipal (MERCOCIDADES, 2016).
Já a Unidade Temática de Integração Fronteiriça nasce com o objetivo de ofertar um espaço onde demandas situadas nas regiões fronteiriças possam ser debatidas e que, por consequência, soluções para estas sejam encontradas. A referente UT pauta questões relacionadas ao desenvolvimento socioeconômico, infraestrutura, provisão de bens e serviços, comércio fronteiriço, transporte e demais demandas similares para os governos locais envolvidos. A integração fronteiriça trabalha com demandas pertencentes a governos vizinhos que, por consequência da demarcação territorial, pertencem a soberania de diferentes Estados nacionais (GARCIA, 2014).
O município de Porto Alegre também fazse presente na subcoordenação de outras quatro UT’s: Cooperação Internacional; Juventude; Segurança Cidadã e Turismo. Além das seis unidades acima mencionadas, há também outras 9, ligadas a questões envolvendo desenvolvimento sustentável, tecnologia e capacitação e cultural, chegando ao total de 15 Unidades Temáticas.
A participação do município de Porto Alegre dáse desde o primeiro momento da Rede, no qual 11 governos locais de Argentina, Brasil e Uruguai firmaram, juntos, a Ata de Fundação da Mercocidades, em novembro de 1995. Além de estar entre os membros fundadores, a capital gaúcha também já assumiu duas vezes a Secretaria Executiva da Rede, nos biênios de 1996/97 e 2013/14, espaço de maior representação da instituição (SUSIN, 2015).
A internacionalização de Porto Alegre, com protagonismo da Gerência de Relações Internacionais desse município, no ambiente organizado pela Rede Mercocidades, ainda,
fortalece iniciativas advindas, por exemplo, do Orçamento Participativo (1989) e sua inserção em diversas cidades, municípios e províncias da região. O projeto, fundado em 1989, é, ainda hoje, marca da cidade e ferramenta de internacionalização desta. Sendo assim, através da inserção da cidade de Porto Alegre na Rede, a participação e inclusão cidadã nos governos locais da América do Sul, também, se tornaram mais presente, fortalecendo a democracia na região (SALOMÓN, 2012).
Deste modo, devido à intensificação progressiva da Rede Mercocidades, a instituição tem firmadose, ao longos destes anos, como uma ferramenta fundamental no auxílio do processo de integração regional no subcontinente americano, causando forte impacto para internacionalização de governos locais, estando estes, hoje, contabilizados em 286 membros da Rede, situados em Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai, Venezuela, Chile, Bolívia, Colômbia e Peru (RODRIGUEZ, 2015).
4 O CONTEXTO GLOBAL: CIDADES E GOVERNOS LOCAIS UNIDOS E A INSERÇÃO DE PORTO ALEGRE
Sendo a maior organização que promove a cooperação entre cidades no mundo, a Rede Cidades e Governos Locais Unidos (CGLU), permite o estabelecimento de um diálogo entres mais de mil centros urbanos de diferentes 136 países, além de cooperar com a representação das autoridades locais em instituições internacionais para defender seus valores e papéis nas agendas da governança mundial.
A CGLU atua nas áreas da democracia local, da descentralização, da cooperação e do desenvolvimento local relativas à melhoria dos serviços urbanos (acesso à água, alojamento, transportes, etc.). Criada em 2004 a partir da fusão da Federação Mundial das Cidades Unidas (FMCU) e da União Internacional das Autoridades Locais (IULA), a CGLU uniu forças com a rede Metropolis para ampliar a coordenação dos membros. Além disso, vários acordos de cooperação foram assinados com organizações internacionais, entre elas agências das Nações Unidas como a UNHabitat e o Banco Mundial. A estrutura da organização gira em torno dos seus presidentes e copresidentes, cargos ocupados prefeitos eleitos pelos membros da rede a cada 6 anos e que trabalham junto aos seus respectivos vicepresidentes regionais. Esse organograma constrói o núcleo duro da Rede, que opera através do seu Conselho Mundial e seu do Bureau Executivo. Para coordenar esse conjunto, existe também uma Secretaria Permanente, localizada em Barcelona, que tem uma função administrativa e organizacional como órgão responsável pela preparação dos encontros e das agendas entre as municipalidades membros da rede.
Desde seu congresso fundador, em Paris, a rede evoluiu rapidamente graças a acordos com atoreschave da cooperação internacional e a abertura à diversidade dos membros. As reuniões do Bureau Executivo, os Congressos Mundiais e as participações nas cúpulas internacionais como membro consultivo reforçam a presença da CGLU e confirmam sua ação de advocacia dentro da sistemática internacional das municipalidades do mundo. Finalmente, a CGLU atua como plataforma de compartilhamento de informações e de boas práticas, possibilitadas através das suas iniciativas de “aprendizado ativo” (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2015a), que formulou metodologias próprias para o compartilhamento de políticas públicas entre as municipalidades que compõem a rede (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2015b).
A cidade de Porto Alegre, membro desta Rede desde seu lançamento, é responsável a partir de 2015 por coordenar a representação da América Latina, além de participar de discussões nas diferentes agendas do ano 2016, como a 2 a Assembleia Mundial em Quito ou a 5 a Cúpula Mundial dos Líderes Locais e Regionais em Bogotá. Porto Alegre foi também a sede da Reunião do Bureau Executivo da CGLU em 2015 (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2014), e acolheu vários outros encontros da organização, ajudando dessa forma a inserir o Rio Grande do Sul no mapa das Relações Internacionais.
A capital gaúcha tem um papel particular na organização da CGLU devido a sua
presença na coordenação do Comitê de Planejamento Urbano Estratégico, assumindo a responsabilidade de responder aos desafios complexos do desenvolvimento urbano a longo prazo, como a pobreza, o crescimento econômico e as reformas políticoadministrativas. Essa abordagem técnica da cooperação internacional mostra a necessidade de incluir no diálogo político os atores que já provaram a capacidade deles de inovação e propor soluções originais aos assuntos modernos. Porto Alegre demonstrou ter esse caráter através da implementação do Orçamento Participativo na rotina de funcionamento da municipalidade e da decisionmaking (PORTO ALEGRE, 2001). Essa estratégia revelouse frutífera na articulação da sociedade com as autoridades municipais e na participação dos cidadãos na construção das prioridades e dos projetos da cidade.
Assim, destacase o duplo papel que Porto Alegre assumiu na sua articulação nesta Rede. Por um lado, a representação do continente latinoamericano no âmbito internacional, como membro da CGLU e da Rede Mercociudades, para a promoção da unidade e da cooperação entre os governos locais em ambas as redes. De outra perspectiva, também destacase a participação ativa do município nas discussões técnicas e teóricas acerca do planejamento urbano e estratégico, frente especialmente representada no comitê presidido
por Porto Alegre (Brasil) e Durban (África do Sul) (UNITED CITIES AND LOCAL GOVERNMENTS, 2012).
Estabelecer uma coesão dos centros urbanos fora dos desacordos entre os países é um objetivo ambicioso que é conjugado os esforços feito por organizações intergovernamentais como o Mercosul. O integração rápida e efetiva de Porto Alegre nos canais de fortalecimento da cooperação urbana entre os governos subnacionais ajudou fortalecer a posição exemplar da cidade na liderança urbana global, provando sua capacidade de gestão em políticas públicas.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme demonstrado ao longo do desenvolvimento do trabalho, reiteramos que a atuação de municípios nas de Redes internacionais de cidades é uma ferramenta possibilitadora do processo de internacionalização destes agentes. Os governos locais, neste sentido, assumem papel de suma importância para a dinâmica internacional atual, redefinindo, através da ideia de “política externa subnacional” (SALOMÓN, 2012), o conceito de ator internacional, assim como a dinâmica de relacionamento entre os atores do Sistema Internacional, configurando um momento de redefinição na configuração de cenários mundiais no século XXI. A articulação de cidades no formato de Redes comprovouse como uma ferramenta efetiva para a criação de canais de discussão e para o aumento do escopo de possíveis soluções para problemas comuns às esferas municipais, como o compartilhamento de políticas de boas práticas entre cidades em âmbito regional ou internacional.
Ainda, a análise do caso de Porto Alegre realizada ao longo do artigo, apontou que a internacionalização de municípios, baseada nas atuações destes em Redes de cidades, mostrouse bastante efetiva. Graças às novas relações estabelecidas nos canais de comunicação promovidos pelas Redes, foram estabelecidos novos pontos de cooperação bilateral entre municípios, que criaram oportunidades para eventos internacionais de cidades, trazendo maior visibilidade para o município de Porto Alegre.
Assim, o sucesso obtido pela capital gaúcha em seu processo de internacionalização, ocorrido através das Redes internacionais de cidade e, logo, graças às parcerias firmadas com outras cidades ao redor do mundo, possibilita sua replicação por outros governos locais. A experiência portoalegrense, portanto, comprovou, neste caso, a importância das Redes de cidades para a internacionalização de municípios e relembra que
estará sempre aberta para novas trocas com outras municipalidades e organizações internacionais durante os próximos anos. 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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