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EPISTEMOLOGIA FEMINISTA: A PESQUISA COM MULHERES EM FOCO

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EPISTEMOLOGIA FEMINISTA: A PESQUISA COM MULHERES EM

FOCO

Amanda Mota Angelo Castro Mestranda do PPGEdu – UNISINOS Bolsista da CAPES – Brasil mottaamanda@yahoo.com Edla Eggert Professora do PPGEdu – UNISINOS Bolsista Produtividade 2 edla@unisinos.br RESUMO: Esse trabalho tem como objetivo apresentar reflexões sobre a pesquisa realizada com mulheres num ateliê de tecelagem. Nosso olhar é sobre educação, gênero, invisibilidade do trabalho feminino e religião. Nossa pesquisa caminha com vistas a problematizar e compreender a questão de mulheres pentecostais e suas implicações no trabalho artesanal cotidiano da tecelagem. Entendemos que a tecelagem possui um saber, uma técnica, uma “epistemologia” da vida ordinária (Ivone Gebara 2008). Entretanto, este saber é “esvaziado” e invisibilizado devido às questões socialmente construídas relativas a gênero, sobre o “lugar” naturalizado como sendo “de mulher” e “para a mulher” (Edla Eggert 2004). Nossa pesquisa tem como base o conhecimento feminista; portanto, uma epistemologia feminista, visando trabalhar, sobretudo, com base nos estudos que vêm sendo produzidos e problematizados por feministas no Brasil e na América Latina. A metodologia dessa pesquisa ocorre por meio da observação participante, entrevistas individuais, narrativas de histórias de vida e dos grupos de discussão com base em Wivian Weller e Ralf Bohnsack 2006.

Palavras-Chave: Educação, Feminismo, Pesquisa, Trabalho, Gênero. Eixo temático: Epistemologia da educação

ABSTRACT: This work has as its objective to present reflections about the research developed with women in a weaving atelier. Our look is about the education, the gender, the invisibility of female work and the religion. Our research proceeds having in mind to problematize and to understand the issue of pentecostal women and its implications on the weaving daily handmade work. We understand that the weaving owns a knowledge, a technique, an “episthemology” of the ordinary life (Ivone Gebara 2008). However, this kowledge is “emptied” and invisibilized due to the issues socially built relating to gender,

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about the “place” naturalized as being “women’s” and “for women” (Edla Eggert 2004). Our research is based on the feminist knowledge; therefore, a feminist episthemology, aiming to work, above all, based on studies that have been produced and problematized by feminists in Brazil and in Latin America. This research’s methodology happens through participative observation, individual interviews, narratives on life histories and group discussion based on Wivian Weller and Ralf Bohnsack 2006.

Key Words: Education, Feminism, Research, Work, Gender. Main Topic: Epistemology of education

INTRODUÇÃO

Esse artigo tem como objetivo apresentar reflexões sobre uma pesquisa de mestrado ainda em andamento realizada com mulheres tecelãs.Aqui, buscamos discutir com base na nossa pesquisa empírica as peculiaridades da pesquisa com mulheres com base na epistemologia feminista.

Esta pesquisa é desenvolvida no Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS, vinculada à linha de pesquisa IV – Educação e Processos de Exclusão Social orientada pela Professora Doutora Edla Eggert.

Entendemos que a pesquisa não é neutra (FREIRE, 1997; BRANDÃO; STRECK, 2003). Sabemos, também, que o referencial epistemológico é situado, contingente e localizado (NEUENFELDT; 2008). Por esse motivo entendemos ser importante e necessário indicarmos o campo teórico de onde falamos.

Pesquisamos mulheres numa perspectiva feminista e utilizamos o conceito de gênero entendido como o estudo das relações, cultural e socialmente produzidas entre homens e mulheres, e destes entre si. Um conceito que foi sendo construído nos estudos relacionados a diversos campos do feminismo e, por isso, também de ordem ideológica, política e de lutas (SAFFIOTI, 2004).

Portanto homens e mulheres são ensinados a serem o que são na cultura que estão inseridos. Seguindo esta idéia, somos ensinados/as desde a infância como devemos ser meninas e meninos e nos portarmos, como homens ou mulheres, para sermos socialmente aceitos. Gênero é sempre influenciado por fatores sociais como raça, etnia, cultura, classe social e idade e religião. (GEBARA 2000, FIORENZA, 2009).

Compreendemos que o movimento feminista tanto na militância como na academia conquistou muito, porem sabemos que ainda temos um longo caminho a percorrer para a conquista de direitos iguais entre os sexos (SAFFIOTI, 2004), por esse motivo, entendemos a

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importância da pesquisa com mulheres numa perspectiva feminista para que os avanços permaneçam.

A PESQUISA COM MULHERES ENTRE TRAMAS E FIOS

Nossa pesquisa empírica ocorre em um ateliê de tecelagem onde trabalham mulheres que vivem na cidade de Alvorada¹ região metropolitana de Porto Alegre.

Com poucas opções de trabalho e para evitarem o longo trajeto de deslocamento até Porto Alegre (onde muitas mulheres de Alvorada trabalham, sobretudo nas atividades do comércio, serviços gerais e em casas de família como empregadas domésticas) algumas trabalhadoras buscaram na tecelagem uma forma de sustento, tanto para elas como para suas famílias - várias destas mulheres são chefes de família.

As mulheres do ateliê trabalham de segunda a sexta, em turno integral, produzindo peças de vestuário feminino e produtos para casa. Para a realização deste trabalho, estão organizadas em uma cooperativa². Nenhuma delas aprendeu o ofício da tecelagem na família e sim com a tecelã coordenadora do atelier, que ensinou a arte da tecelagem para as demais.

No ateliê, mulheres “ganham a vida” fazendo arte entre tramas e fios. Sendo uma arte milenar, a tecelagem é uma das formas mais antigas de artesanato presente nos dias atuais. No ateliê os fios tramados entre dores nas costas e conversas ganham forma e cores, num processo de criação e produção, encantador.

O foco do nosso olhar é a Educação, Gênero, Religião e o trabalho feminino. Nosso objetivo principal de pesquisa é compreender como as femilinidades aprendidas na sociedade e reafirmadas na igreja pentecostal Assembléia de Deus, interferem no trabalho cotidiano de tecelagem produzido por mulheres.

A tecelagem é uma das formas mais antigas de artesanato presente nos dias atuais. Por volta de 5000a.c a tecelagem era feita entrelaçando pequenos galhos e ramos para construir barreiras, escudos ou cestas. Teia de aranha e ninho de pássaros podem ter sido as fontes para a criação da tecelagem.

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¹ Alvorada emancipou-se no dia 17 de setembro de 1965, conforme a lei estadual nº 5026, e o nome de Alvorada, acredita-se que seja uma referência ao seu povo constituído em sua maioria por trabalhadores que acordavam nas primeiras horas da manhã para trabalhar na capital do Rio Grande do Sul (Porto Alegre). Com 72,9 Km2, e área urbana legal de 52 Km2 o município é um dos menores do Estado. A economia é baseada principalmente no comércio e no setor de serviços, além da maioria da população trabalhar no município de Porto Alegre, fazendo com que a cidade seja conhecida também como cidade-dormitório. Sua População segundo dados do IBGE de 2008 conta com 211.233 habitantes. Informações obtidas no site da prefeitura de Alvorada <http://www.alvorada.rs.gov.br> Acessado em 25/10/2009.

² O cooperativismo representa a união entre pessoas voltadas para um mesmo objetivo. Uma organização dessa natureza caracteriza-se por ser gerida de forma democrática e participativa, de acordo com aquilo que

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pretendem seus associados. As sociedades cooperativas estão reguladas pela Lei no 5.764, de 1971 que definiu a Política Nacional de Cooperativismo. Informações obtidas no site da receita federal <www.receita.fazenda.gov.br/.../pr634a646.htm>. Acessado em 10/08/2009 (BRASIL, 1971).

No Brasil algumas nações indígenas conheciam e praticavam a tecelagem. Trabalhavam com algodão e trançados de palha. Com a chegada dos portugueses ao Brasil a tecelagem passa a ser tramada no tear então trazidos pelos portugueses.

Em 1785 houve a proibição da confecção têxtil no Brasil. A tecelagem sobrevive então na clandestinidade e nas regiões mais afastadas do Brasil, principalmente no interior dos estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Somente em 1809 a tecelagem sai da clandestinidade, entretanto no estado do Rio de Janeiro, sede da corte imperial, a tradição da tecelagem não conseguiu se manter viva devido a ser mais fácil à identificação dos teares e sua destruição.

No século XVIII, correspondente ao ciclo da mineração havia uma grande necessidade de concentrar a mão de obra nas minas de ouro e lavoura, pois as riquezas eram enviadas a Coroa Inglesa e por acordos comerciais Portugal era obrigado a importar tecidos da Inglaterra. A atividade da tecelagem foi proibida por Da. Maria I que em 1785 decretou a queima de todos os teares. Este decreto foi revogado por D. João em 1809 e assim a indústria de tecelagem nacional renasceu. (Lanzelotti,Gilberto)

A tecelagem possui um saber, que observamos ser predominantemente feminino e por essa razão “perde” muito de sua “técnica”, “importância” e “saberes”.

O esvaziamento da potência desse saber se dá por vários motivos, entre eles, segundo Marcela Lagarde (2005) acontece pelo fato da sociedade em geral acolher a idéia de que as mulheres têm como missão última e valor maior: a maternidade, ou seja, tomarem o cuidado para com os outros como tarefa básica. E segundo Eggert (2004) isso ocorre pelo fato da sociedade reafirmar a mulher como “responsável” pela esfera privada, tendo com base principal o trabalho doméstico, o amor materno e a obediência.

Segundo Perrot, as mulheres ao longo da historia da humanidade trabalharam, porem seu trabalho foi invisibilizado, ora por ser um trabalho doméstico, ora pelo fato da mulher realizar trabalho artesanal ou de ajudante do marido no trabalho informal ou no negocio do marido, principalmente nos comércios. Perrot afirma que:

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As mulheres sempre trabalharam. Seu trabalho era da ordem do domestico, da reprodução, não valorizado, não remunerado. As sociedades jamais poderiam ter vivido, ter-se reproduzido e desenvolvido sem o trabalho domestico das mulheres que é invisível. (Perrot, 2006, p. 109)

Na escuta junto às tecelãs em vários momentos identificamos depoimentos: “isso é um trabalho, coisinha de mulheres para ajudar na renda familiar”. Constatamos, porém que a maioria dessas mulheres sustenta suas casas com as chamadas “coisinhas de mulheres”. Segundo o Fórum Brasileiro de Economia Solidária dados de 2007, 60% das associadas são compostas por mulheres e entre as atividades principais estão à produção de peças de vestuário, alimentação e artesanato.

Durante a empiria descobrimos no ateliê que mulheres pentecostais, alem de tecer ensinavam as demais companheiras de trabalho os ensinamentos religiosos.

A Igreja Assembléia de Deus foi fundada no norte do Brasil em 1911, hoje ela é a segunda instituição religiosa em numero de fieis e templos em solo Brasileiro, perdendo apenas para a Igreja Católica, apesar de seu expressivo numero de fieis, Mariano (2005, p. 15) afirma que “Os crentes são minoria no país quanto aos estudos sobre religião, o que escrito sobre eles é bem pobre se comparado ao catolicismo ou ao afro-brasileiro”.

A pesquisano ateliê iniciou em 2007 onde então trabalhavam por volta de quinze mulheres, no ano de 2009 observamos que a crise financeira mundial afetou o atelier. Os pedidos foram reduzidos pela metade. Por falta de pedidos, algumas mulheres saíram do ateliê em busca de trabalho, permaneceram então no ateliê oito mulheres.

Nossa pesquisa então passa a acompanhar momentos de despedidas, tristezas, desanimo, desesperanças e a busca das tecelãs que permaneceram no oficio da tecelagem para que de alguma forma a crise fosse vencida, acompanhamos ali a felicidade ser adiada, a felicidade de ter trabalho, a felicidade de poder produzir, de poder “ganhar a vida”, de poder manter o sustento necessário para sobreviver. Passaram a fazer do cotidiano das mulheres tecelãs as palavras tristes e poéticas de Gebara (2000, p. 95): “Cada dia que passa se adia a justiça para amanhã, a plenitude do amor para depois, a felicidade para a eternidade”, a tristeza, o desgaste e o cansaço pareceu ter tomado os “ares” do ateliê.

Nesse momento de angústia, passamos a observar algo interessante: as mulheres, dirigidas por uma tecelã que trabalha há dez anos no ateliê, fiel da igreja pentecostal Assembléia de Deus passou a incorporar uma rotina antes não realizada durante o trabalho de tecelagem, ela passou a “transmitir” ensinamentos da igreja no ateliê por meio de orações,

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palavras da bíblia lidas no início da manhã e conversas informais sobre Deus e Fé com suas colegas.

Dessa forma elas instituíram um ritual de a cada manhã de ler um versículo bíblico e orar pelo bom andamento dos seus trabalhos e suas famílias. Isso tem trazido bem estar ao grupo segundo o relato de todas. A fala de uma das tecelãs durante a observação participante retrata bem como o coletivo recebe a nova pratica “É, eu acho que esta sendo bom né? Eu acredito Nele, a Tecelã 2 tem falado muito que Ele pode nos ajudar a mudar toda a situação aqui no ateliê, eu acredito Nele, eu preciso acreditar né? Porque preciso trabalhar.” (TECELÃ

1, 2009³).

Ao que parece, a necessidade organiza o desejo ou, na linguagem religiosa, Deus vem ao encontro de quem pede e acredita. Ainda não temos elementos para uma analise mais detalhada, mas entendemos que essa busca por um amparo e uma solução que vem das alturas compõe uma aprendizagem que, na educação das mulheres está profundamente relacionada a um “pensamento mágico” segundo Lagarde (2005). Segundo essa autora, as mulheres são as que transmitem, rezam e choram o sentido comum da vida. A concepção do mundo é a partir da associação de idéias semelhantes que simplificam a assimilação e a interpretação das coisas, e por aprender que as forças vêm de fora, dos outros elas facilmente buscam fora de si mesmas as respostas necessárias para suas inseguranças e necessidades. Aqui podemos relacionar uma série de itens os quais são muito mais comprados lidos e freqüentados pelas mulheres do que pelos homens como, por exemplo: as cartas de tarô, a leitura dos horóscopos, a leitura das mãos, a freqüência nos círculos de oração e nas igrejas.

Para essas mulheres a religião e os exercícios de fé que vem ocorrendo no ateliê diariamente têm um pouco dessa mistura entre o mágico e o milagre. No livro Segundo Sexo Simone de Beauvoir (2009) também aponta nessa direção quando escreve sobre a mulher mística, que esta acostumada a estar de joelhos, esperando que a salvação dessa, que venha Do Outro, que venha de “fora”, que venha de um homem e não delas mesmas. A frase: “Foi Deus quem quis assim”, é muito ouvida no ateliê nesses momentos de incertezas.

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³ CASTRO, A. MA. Diário de campo. Anotações com base em conversas realizadas no dia 10 de agosto de 2009. As tecelãs são identificadas na pesquisa por números.

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Como as femilinidades aprendidas na sociedade e reafirmadas na igreja pentecostal Assembléia de Deus, interferem no trabalho cotidiano de tecelagem produzido por mulheres? Como os rituais instituídos dentro do ateliê interferem no trabalho e ensinam outras mulheres os ensinamentos da religião para o feminino? Essa pergunta, ainda sem resposta, mas com algumas suspeitas é a principal questão em nossa pesquisa.

METODOLOGIA

A metodologia desta pesquisa ocorre por meio da observação participante, entrevistas individuais, narrativas de histórias coletadas por meio dos grupos de discussão com base nos estudos de Wivian Weller e Ralf Bohnsack (2006).

O conceito de experiência tem para nosso grupo de pesquisa um investimento de estudo e debate, pois a trajetória de quem compõe o grupo aponta para duas realidades que sempre consideraram a experiência como desencadeadora da produção do conhecimento: a educação e o feminismo.

Estamos levando em consideração o exercício de (re) leituras, dos processos de ensino – aprendizagem num lugar de ensino não–formal e suas implicações no cotidiano do trabalho de mulheres.

Para Paulo Freire, a história não é pensada cronologicamente, a partir de um calendário, de fatos históricos longe da nossa realidade. A história tem um sentido de mudança, de transformação, de deslocamento, portanto, podemos pensar aqui em uma outra forma de história, uma outra forma de “contar” o tempo e a própria história. Nesta perspectiva podemos ter um processo de mudança.

As histórias de vida vem sendo utilizadas em muitos campos, incluindo o da educação popular que buscar através dessas histórias um sentido a fatos e movimentos tanto da vida cotidiana quanto coletiva, a experiência dos Círculos Populares de Cultura do norte e nordeste do Brasil foram um divisor de águas para se perceber a educação popular como uma força a ser resgatada (Eggert 2003).

Através da fala, da problematização e do exercício de contar suas histórias de vida, algumas pessoas conseguiram refazer e reviver suas próprias histórias e assim transformar a cultura do silêncio, passando a ler o mundo em que vivem, para assim poder transformar sua própria realidade. Sobre este tema Paulo Freire afirma que:

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O homem (sic) não pode participar ativamente na história, na sociedade, na transformação da realidade se não for ajudado a tomar consciência da realidade e da sua própria capacidade para a transformar....Ninguém luta contra forças que não entende, cuja importância não meça, cujas formas e contornos não discirna; ... Isto é verdade se refere às forças da natureza ... isto também é assim nas forças sociais.... A realidade não pode ser modificada senão quando o homem descobre que é modificável e que ele o pode fazer. (Freire, 1977, p. 48).

Nosso desejo é que por meio de narrativas das histórias de vida das mulheres que estão diariamente na arte e na técnica da tecelagem, essas possam, em alguma medida, resgatar suas próprias histórias, fazer um caminho para si (Josso, 2004) e ressignificar suas trajetórias apropriando-se de sua própria história como nos ensina Freire.

Ninguém lê o mundo isoladamente, “É imprescindível uma leitura do mundo que contextualize, geste e emoldure um sentido para a palavra” (PASSOS, 2008, p. 240), para que assim possa ocorrer a transformação do mundo que vivemos, principalmente das relações desiguais entre os sexos.

Entendemos que, por meio desse conjunto metodológico, ampliaremos nossa formação como pesquisadoras e simultaneamente estaremos provocando um pensar com as mulheres que aceitaram nossa inserção, no ateliê.

EPISTELOMOGIA FEMINISTA

Como já foi afirmado no inicio desse artigo, as mulheres sempre trabalharam ao longo da história da humanidade, portanto, sempre foram atuantes na sociedade mesmo sendo excluídas da maior parte dos direitos sociais e tendo como lugar principal a esfera privada e não a pública. Lembrando que estamos nos referindo aos séculos de exclusão e silenciamento das mulheres no espaço publico e, pensando sobre a pesquisa, cabe aqui uma pergunta: qual serão as conseqüências disso na pesquisa com mulheres?

Segundo Perrot (2006) o pouco registro escrito deixado pelas mulheres ao longo da história devido a sua exclusão das instituições formais de ensino é um fator complicador na pesquisa sobre mulheres.

Para Gebara (2000) com pouca história escrita pelas mulheres, ao longo do tempo, o conhecimento passou a ser totalmente controlado pelos homens, sendo assim, ela afirma que “um conhecimento despreza a contribuição das mulheres não é apenas um conhecimento

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limitado e parcial, mas um conhecimento que mantém um caráter de exclusão” (2000, p 117), e aqui, não nos referimos a todos os homens, mas de um padrão normativo, por isso, quando discutimos o monopólio do conhecimento pelos homens, falamos de um modelo de homem que, em sua maioria é branco, heterossexual e com um certo nível de poder, portanto, podemos afirmar que esse monopólio também é excludente.

A epistemologia científica, exercida pelas instituições formais de ensino, busca em alguma medida processar e filtrar o conhecimento. A epistemologia da vida ordinária busca a partir do cotidiano, da vida das pessoas comuns entender e filtrar os conhecimentos produzidos a margem das instituições formais. No caso das mulheres, Eggert (2008) afirma que por muito tempo as mulheres foram por elas mesmas esquecidas, e por conseqüência foram esquecidas pela academia.

Devido às questões levantadas, a pesquisa com mulheres requer algumas abordagens peculiares, para além da epistemologia reflexiva ou científica, aqui, pensamos e sabemos que não podemos abandonar de forma alguma esta epistemologia, entretanto precisamos de outras alternativas.

Para Gebara (2008), outra forma é a epistemologia da vida ordinária que segundo ela é a epistemologia de todos/as nós, de todos/as os/as mortais.

Por volta dos anos 70, influenciada pelo movimento feminista, a epistemologia feminista surge e vem produzindo conhecimento ao redor do mundo. Segundo Gebara “o feminismo denúncia à produção de um conhecimento considerado cientifico, cuja conseqüência é a exclusão das mulheres e uma cultura marginalizante”. (2000, p. 115)

A epistemologia feminista tem denunciado e alertado sobre a supergeneralização, apontando que os valores, as experiências, os objetivos e as interpretações dos grupos dominantes são apenas os valores, experiências, objetivos e interpretações desses grupos, não da humanidade como um todo. Sobre isso, Gebara afirma que:

Sem duvida, o conhecimento produzido por uma elite a serviço dos detentores do poder é mais valorizado do que qualquer outro produzido, por exemplo, por um grupo de catadores de lixo. Não só a questão das classes sociais aparece de forma marcante em todos os processos epistemológicos, mas também a questão da raça, do gênero, das idades, e da orientação sexual. Nossa maneira de expressar nosso conhecimento do mundo é reveladora de nosso lugar social e cultural. E este lugar condiciona nossa confiança e desconfiança, nossa valoração maior ou menos em relação ao que proposto como conhecimento. (Gebara, 2008, p 32)

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Portanto, foi a partir das questões de classe social, gênero, raça, etnia, entre outros que surgiu uma área da epistemologia dedicada a compreender a forma como o gênero influencia aquelas concepções e práticas e como elas têm sistematicamente colocado em desvantagem as mulheres e outros grupos subordinados.

Por esse motivo, podemos afirmar que pesquisar mulheres, numa perspectiva feminista é desafiar uma lógica dominante de um mundo hierárquico e patriarcal (GEBARA, 2000, 2008).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O olhar epistemológico feminista, tanto ordinário como cientifico permite reler a história e sem sombra de dúvida os resultados das inúmeras perspectivas abertas têm sido dos mais criativos e instigantes.

A epistemologia feminista vem rompendo paradigmas estabelecidos, descobrindo e redescobrindo a vida e a produção das mulheres ao longo da história e de tantas outras que hoje fazem histórias e produzem como as mulheres de nossa pesquisa que tentamos em alguma medida que suas produções saiam da invisibilidade, que se percebam como atuantes em sua própria história porque esta não esta dada como afirma Freire:

...Gosto de ser homem (sic) de ser gente, porque sei que a minha passagem pelo mundo não é predeterminada, preestabelecida. Que meu “destino” não é um dado, mas algo que precisa ser feito e de cuja responsabilidade não posso me eximir.” (Freire, 1999, p 58)

Essa busca, por algo que precisa ser construído e que é de nossa responsabilidade requer alguns instrumentos, Eggert afirma que: “buscar instrumentais de outros campos do conhecimento, para alimentar caminhos talvez inusitados; questionar as hierarquias; rever as margens onde as mulheres geralmente se encontram, no ato de produzir conhecimento...” (2009, p 32), são partes desses instrumentos.

Nossa busca é desafiadora, entretanto, acreditamos ser inegável as conquistas das mulheres no campo científico nos poucos anos de epistemologia feminista. E acreditamos que nossa pesquisa soma com os trabalho de muitas outras feministas que buscam em alguma medida novos caminhos de luta, justiça, respeito e igualdade entre os sexos.

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O feminismo tem produzido uma crítica contundente ao modo androcêntrico de produção do conhecimento, além dessa critica tem buscado e operado num alternativo de operação e articulação na esfera do conhecimento.

Sabemos que mulheres trazem uma experiência histórica e cultural diferenciada da masculina, uma experiência que muitas vezes esta as margens. Entretanto, nessas margens encontramos experiências cruciais para a pesquisa com mulheres, e por esse motivo, como já citado anteriormente valorizamos o conceito de experiência (JOSSO, 2004; EGGERT, 2009; DEWEY, 1976) que tem, para nosso grupo de pesquisa, um lugar singular de investimento de estudo e debate.

REFERÊNCIAS

BRANDÃO, Carlos Rodrigues; STRECK, Danilo. Pesquisa participante. O saber da partilha. São Paulo: Idéias e Letras, 2006.

DEWEY, John. Experiência e Educação. São Paulo: C. E. Nacional, 1976.

EGGERT, Edla. domÉsTICO Espaços e tempos para as mulheres reconhecerem seus corpos e textos.In: STRÖHER, Marga J (Org.). À flor da pele: ensaios sobre gênero e corporeidade. São Leopoldo: Sinodal, 2004.

EGGERT, Edla. Educação popular e teologia das margens. São Leopoldo: Editora Sinodal, 2003.

EGGERT, Edla. Narrar Processos: Tramas da violência domestica e possibilidades para a educação. Florianópolis: Editora Mulheres, 2009.

FIORENZA, Elisabeth Schussler. Caminhos da sabedoria: uma introdução à interpretação Bíblica feminista. São Bernardo do Campo: Nhauduti, 2009.

FREIRE, Paulo. A mensagem de Paulo Freire: textos de Paulo Freire selecionados pelo INODEP. São Paulo: Nova Crítica, 1977.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. 25.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.

GEBARA, Ivone. Rompendo o silencio: uma fenomenologia feminista do mal. São Paulo: Vozes, 2000.

JOSSO, Marie-christine. Experiências de Vida e Formação. São Paulo: Cortez. 2004

LAGARDE, Marcela. Cautiverios de las mujeres: madresposas, monjas, putas, presas y locas. 4.ed. Ciudad del México: UNAM, 2005.

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LANZELOTTI, Gilbert. História da tecelagem artesanal no Brasil. Disponível em: <http://guiadecorar.com.br/posts/visualiza/1493>. Acesso em: 10 out. 2009.

NEUENFELDT, Eliane; BERGSCH, Karen; PARLOW, Mara (Org.). Epistemologia, violência, sexualidade: olhares do II Congresso Latino-Americano de Gênero e Religião. São Leopoldo: Sinodal, 2008.

PERROT, Michelle. Minha historia sobre as mulheres. São Paulo: Contexto, 2006.

SAFFIOTI, H. I. B. Gênero e patriarcado. In: VENTURI, Gustavo; RECAMÁN, Marisol; OLIVEIRA, Suely de. A mulher brasileira nos espaços públicos e privados. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2004.

THOMPSON, Paul. A voz do passado: historia oral. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 2002.

WELLER, Wivian. Grupos de discussão na pesquisa com adolescentes e jovens: aportes teórico-metodológicos e análise de uma experiência com o método. In.: Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.2, p. 241-260, maio/ago, 2006.

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