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DOM QUIXOTE ADAPTADO: BREVE ANÁLISE COMPARATIVA EM VERSÕES BRASILEIRA E ESPANHOLA PARA O PÚBLICO JUVENIL

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Academic year: 2021

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DOM QUIXOTE ADAPTADO: BREVE ANÁLISE COMPARATIVA EM VERSÕES BRASILEIRA E ESPANHOLA PARA O PÚBLICO JUVENIL

Jéssica de OLIVEIRA1

Resumo

Em nossas pesquisas, temos nos dedicado à depreensão de representações do leitor infantil e juvenil a partir da análise discursiva de obras dirigidas a esse público sob a forma de adaptações de clássicos, como Dom Quixote. Nosso objetivo com o presente trabalho é discorrer sobre as representações inscritas em duas obras destinadas aos públicos infantis brasileiro e espanhol, a partir da análise de certas estratégias mobilizadas em sua produção e circulação, nos dois cenários. São elas: a coleção Dom Quixote em quadrinhos, de Caco Galhardo, da editora Peirópolis e Lanza em Astilero, organizado por Jesús Cuadrado, da editora Junta de Castilla-La Mancha. Em nossas análises, nos ancoramos teoricamente na Análise do Discurso de linha francesa e na História Cultural da Leitura, principalmente nas considerações de Roger Chartier.

Palavras-chave:

Adaptação, Dom Quixote, Ilustração, História Cultural.

Introdução

Desde sua primeira publicação em 1605, data já conhecida como um marco inaugural do romance moderno, até os dias de hoje, a obra universal O engenhoso fidalgo Dom Quixote de La Mancha passou por distintos momentos de recepção, reconhecimento, rememoração, recriação, sobretudo para uso escolar. Entre as formas de sua recriação encontram-se as adaptações para os públicos infantis e juvenis, não apenas quanto à linguagem e extensão das narrativas, mas também quanto ao gênero. A novela se tornou história em quadrinhos, gênero que da década de 1950 até hoje ganhou e espaço no mercado editorial.

1 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal de São Carlos. Bolsista da

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Neste artigo, objetivo fazer uma breve análise comparativa das ilustrações das capas que compõem a coleção brasileira Dom Quixote em quadrinhos (volumes 1 e 2), cuja adaptação é feita pelo cartunista Caco Galhardo, com a edição em HQ para o público espanhol Lanza em Astilero, organizada por Jesús Cuadrado.

A história das ilustrações dos livros infantis

Muitos pesquisadores brasileiros têm se dedicado à análise crítica da literatura infantil e juvenil, à sua história no que se refere aos conceitos de criança e jovem, às mudanças editoriais sofridas por este nicho no mercado editorial brasileiro, aos escritores consagrados em cada época, à consolidação e reconhecimento adquirido por este tipo de literatura, aos leitores, à literatura escolar etc.2. No entanto, não são muitas as pesquisas nacionais dedicadas

especificamente à ilustração do livro infantil e juvenil, sua história, suas mudanças técnicas, sua importância na constituição de um projeto editorial destinado ao público leitor infantil e juvenil.

A obra Livro infantil ilustrado: a arte da narrativa visual dos autores Martin Salisbury e Morag Styles (2013), dedica um capítulo à história do livro ilustrado, apresentando um breve panorama de sua evolução, a partir de uma visão que abrange principalmente as publicações nortes americanas ao longo das décadas. Segundo os autores, o livro Orbis Sensualium Pictus (O Mundo Visível, 1658), de Comenius, é geralmente visto como o primeiro livro de imagens criado especificamente para o público infantil (2013, p. 12). Assim como outros livros à época, a técnica usada em sua produção era a da xilogravura.

Os livros de contos (chapbooks) produzidos entre os séculos XVI e XIX tinham baixo custo, eram ilustrados com xilogravuras grosseiramente preparadas e impressas, e vendidos pelos mascates nas ruas para um público de nível cultural financeiro limitado (2013, p. 13).

Ao longo dos anos a técnica da xilogravura foi sendo aprimorada constantemente. Thomas Bewick é um dos nomes destacados pelos autores como responsável por aprimorar tal técnica, para cujas impressões se substituiu a base de metal pela base de madeira, material mais maleável e mais fácil de gravar, contribuindo assim para a produção de livros ilustrados e imagens pictóricas.

2 A importância desse segmento e a complexidade de aspectos dessa produção e de sua recepção pode ser

observada nas obras dos pesquisadores Diógenes Buenos Aires de Carvalho (2012, 2013, 2014), Mario Feijó (2010), Lajolo (1993) e Marisa Lajolo & Regina Zilberman (1987, 2017), assim como em artigos dedicados ao tema, a saber, Nelly Novaes Coelho (1996), João Luís C. T. Ceccantini e Benedito Antunes (2004) entre outros.

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Em relação às ilustrações coloridas nos livros infantis, ainda segundo os autores “até a década de 1930, a cor normalmente era inserida à mão” (2013, p. 14) e foi George Baxter quem inventou uma outra técnica:

Ele patenteou o seu processo, que utilizava uma chapa principal de aço para a criação do contorno e dos detalhes e sombreamento em preto, para posterior aplicação de diferentes chapas de cobre, madeira e zinco, com cores individuais. Cada chapa tinha de ser perfeitamente alinhada. (2013, p. 14).

É importante observar, no que se refere a estes primeiros processos editoriais, que a litografia já existia nesse momento3, no entanto, sabemos que uma técnica editorial não

substitui de imediato uma anteriormente utilizada. Ao longo da história das produções editoriais uma técnica, ocasionalmente, convive com outra pelos mais variados motivos. A título de exemplo, conforme o historiador Roger Chartier (2014, p. 105), a impressão, pelo menos nos quatro primeiros séculos de sua existência, não causou o desaparecimento nem da comunicação manuscrita nem da publicação manuscrita.

Outro nome importante no processo de desenvolvimentos das técnicas de ilustração dos livros infantis foi Randolph Caldecott. Com este ilustrador, segundo Salisbury e Styles (2013, p. 12), surge o livro ilustrado moderno, no final do século XIX, pois a inovação encontra-se no fato de que a ilustração expande a função da imagem em relação ao texto verbal ao invés de simplesmente duplicá-lo ou decorá-lo.

A importância que as ilustrações detêm no âmbito infantil e juvenil, atualmente, suscitou uma importante reflexão sobre a diferenciação entre livro ilustrado e livro com ilustração. Peter Hunt (2010, p. 234), estudioso da literatura infantil nos diz que

os livros ilustrados podem desenvolver a diferença entre ler palavras e ler imagens: não são limitados por uma sequência linear, mas podem orquestrar o movimento dos olhos. Além disso, podem explorar essa relação complexa; as palavras podem aumentar, contradizer, expandir, ecoar ou interpretar as imagens – e vice-versa.

Estas características acerca do livro ilustrado são pensadas em contraposição ao livro com ilustração. Para o autor tal distinção é, em grande parte, organizacional.

A ilustração nas HQs juvenis: uma comparação entre a adaptação brasileira e a adaptação espanhola

Por meio da análise comparativa entre as adaptações brasileiras e a adaptação espanhola podemos depreender representações acerca dos leitores juvenis de nacionalidades

3 Segundo Salisbury e Styles (2013, p. 148) “A litografia foi inventada por Aloísio Senefelder, na Alemanha, no

final do século XVII, e é o ancestral dos modernos métodos de impressão comercial. O processo explora a heterogeneidade entre óleo e água, permitindo que uma imagem seja transferida de uma superfície lisa para o papel”.

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diferentes, de modo a contrastá-las naquilo em que se assemelham e também em suas diferenças. A análise atenta e minuciosa destas inscrições auxilia no aprofundamento de nossas reflexões a respeito das representações do leitor infantil e juvenil brasileiros.

Para a análise a que nos propomos, a capa das adaptações constitui o primeiro material a ser analisado. A leitura da capa é o primeiro modo de entrada em um livro. O mesmo se dá com livros destinados a leitores juvenis e infantis, ainda que as publicações sejam pensadas para serem lidas juntamente com um mediador. Este não é ocaso das adaptações aqui analisadas, por se tratarem de adaptações no formato HQ e pressuporem leitores juvenis.

Figura 1 – Dom Quixote em quadrinhos, volume 14.

Figura 2 – Dom Quixote em quadrinhos, volume 25.

As adaptações acima foram orientadas, quando de sua publicação, para o público juvenil brasileiro. Podemos visualizar as cores vibrantes, os traços característicos do cartum, já que Caco Galhardo, adaptador do clássico, é cartunista e trabalha também com tiras publicadas na Folha de S. Paulo. As cores vibrantes aparecem também no título dos livros assim como também nas informações extras, relativas ao nome da coleção/série a que a publicação pertence e ao nome do adaptador. Há, portanto, uma confluência entre linguagem verbal e linguagem visual nestas capas objetivando chamar a atenção do suposto leitor para este clássico que se tornou um cânone escolar destinado a estudantes brasileiros. Embora o

4 GALHARDO, C. Dom Quixote em quadrinhos. São Paulo: Peirópolis, 2005. v.1. (Série Clássicos em HQ)

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título geralmente não faça parte da lista de livros lidos durante o ano nas aulas de leitura, nas quais há preferência pela leitura de livros clássicos de autores brasileiros, ele é produzido com vistas a circular no ambiente escolar, a ser adquirido pelos programas de aquisição de livros para as bibliotecas escolares, por se entender que se trata de uma obra do cânone universal, sobre a qual é preciso dispor de algum conhecimento.

Figura 3 – Lanza en Astillero: El caballero Don Quijote

y otras sus tristes figuras, volume único.6

Em comparação às adaptações brasileiras, a capa espanhola acima se difere em seu projeto visual ao trazer uma imagem mais realista do Quixote. Esta obra conta com a participação de 25 ilustradores de diferentes nacionalidades, os quais estão listados em destaque no canto superior esquerdo. Fernando Vicente é o ilustrador da capa. Conforme especificado em seu site pessoal7, o ilustrador explora, estilisticamente em suas produções, a

presença constante e realista da figura humana, combinada com outros elementos, como podemos ver acima em uma ilustração que mistura o humano com partes mecânicas de um autômato.

Esta é uma edição comemorativa do VI Centenário de publicação da obra de Cervantes, produzida em HQ, aliada a uma linguagem verbal por meio da qual se destacam os nomes dos ilustradores/adaptadores que produziram um livro tão heterogêneo em suas representações do Quixote. Em seu interior, cada imagem apresenta o estilo peculiar de seu ilustrador, segundo uma técnica, uma visão, um traço específico.

Algumas conclusões

Todas as publicações editoriais visam um ou mais objetivos em seus projetos. Em nossa pesquisa, a depreensão de representações dos leitores infantis e juvenis em adaptações é

6 CUADRADO, J. (Org.). Lanza en astillero: El Caballero Don Quijote y otras sus tristes figuras. Junta de

Castilla-La Mancha, 2005.

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possível ao analisarmos atentamente certas características editoriais que evidenciam o objetivo de um projeto, seu público-alvo em específico e sua representação, etc.

Ao olharmos de modo mais atento para as capas das adaptações brasileiras e espanhola em formato HQ é possível depreender objetivos diferentes desses projetos editoriais. As capas da adaptação de Galhardo trazem a linguagem do cartum, de modo a atrair os jovens por meio dessa linguagem estética com a qual estariam mais familiarizados, linguagem também capaz de fomentar a curiosidade sobre a história desse clássico publicado sob a forma de uma série/coleção. Explora-se na capa não apenas a imagem em estilo cartum como também se imagetiza o verbal, ou seja, se explora a dimensão plástica da linguagem verbal empregada na referência ao título. Por seu formato, extensão, publicação em duas edições, trata-se de uma proposta editorial de grande apelo junto aos professores e profissionais da educação, tendo em vista sua participação nos editais de compra do Mistério da Educação, conforme o PNLD (Programa Nacional do Livro e do Material Didático) para compor o acervo de bibliotecas e/ou serem entregues aos alunos.

Além da utilização da linguagem do cartum, própria do universo juvenil, estes dois volumes trazem informações sobre o clássico e sobre a obra na contracapa e nas duas orelhas do livro. Desse modo, a representação inscrita nessa estratégia didática de apresentação e de contextualização da narrativa indicia se tratar de um público-alvo que desconhece o clássico Dom Quixote e, portanto, é preciso apresentá-lo de uma forma capaz de gerar identificação e curiosidade.

A edição espanhola, em seu projeto editorial, visa explorar o novo, experimentar formas alternativas de linguagem imagética artística, de modo a inovar na forma de apresentação de um personagem bastante conhecido pelos jovens espanhóis. Para tanto se destaca na capa a quantidade de ilustradores que trabalharam na produção coletiva desta obra. A edição não nos apresenta nenhuma informação sobre Quixote ou Cervantes na contracapa e não possui orelha. Além disso, a imagem do personagem na capa é intrigante e gera reflexões sobre os efeitos de sentido propostos pelo ilustrador na representação do personagem, em sua humanidade acrescida de partes mecânicas, em certa medida futurista. A representação que se faz de um público leitor espanhol no momento de uma publicação de uma obra como esta é a de que é preciso rememorar o clássico de Miguel de Cervantes, próprio de sua cultura, para atrair o público leitor, o que para isso torna necessário recorrer a releituras desse personagem tão conhecido, apresentá-lo em novas roupagens, instigando a curiosidade e reforçando o caráter universalista e duradouro da imagem dessa personagem, sempre aberta, atemporal, e por isso adaptável a outras linguagens e realidades.

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REFERÊNCIAS

CHARTIER, R. A mão do autor e a mente do editor. Tradução de George Schlesinger. São Paulo: Editora Unesp, 2014.

CUADRADO, J. (Org.). Lanza en astillero: El Caballero Don Quijote y otras sus tristes figuras. Junta de Castilla-La Mancha, 2005.

GALHARDO, C. Dom Quixote em quadrinhos. São Paulo: Peirópolis, 2005. v.1. (Série Clássicos em HQ)

GALHARDO, C. Dom Quixote em quadrinhos. São Paulo: Peirópolis, 2013. v.2. (Série Clássicos em HQ)

HUNT, P. Crítica, Teoria e Literatura Infantil. Tradução de Cid Knipel. São Paulo: Cosac Naify, 2010.

SALISBURY, M; STYLES, M. Livro infantil ilustrado: a arte da narrativa visual. São Paulo: Rosari, 2013.

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