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Capacidades estatais e políticas públicas : uma análise a partir da experiência do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) no período de 1996 a 2016

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

GABRIELA SOLIDARIO DE SOUZA BENATTI

CAPACIDADES ESTATAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS: UMA

ANÁLISE A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA

NACIONAL DE FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA

FAMILIAR (PRONAF) NO PERÍODO DE 1996 A 2016

CAMPINAS 2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

GABRIELA SOLIDARIO DE SOUZA BENATTI

CAPACIDADES ESTATAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS: UMA

ANÁLISE A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA

NACIONAL DE FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA

FAMILIAR (PRONAF) NO PERÍODO DE 1996 A 2016

Prof. Dr. Antônio Márcio Buainain – orientador

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestra em Desenvolvimento Econômico, área de concentração de Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA GABRIELA SOLIDARIO DE SOUZA BENATTI E ORIENTADA PELO PROF. DR. ANTÔNIO MÁRCIO BUAINAIN.

CAMPINAS 2018

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DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

GABRIELA SOLIDARIO DE SOUZA BENATTI

CAPACIDADES ESTATAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS: UMA

ANÁLISE A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA

NACIONAL DE FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA

FAMILIAR (PRONAF) NO PERÍODO DE 1996 A 2016

Defendida em 28/02/2018

COMISSÃO EXAMINADORA

Prof. Dr. Antônio Márcio Buainain - Presidente Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

Prof. Dr. Carlos Enrique Guanziroli Universidade Federal Fluminense (UFF)

Prof. Dr. Bastiaan Philip Reydon Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

Ata de Defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à sociedade brasileira, especialmente àquela parcela que necessita do suporte de políticas públicas para seu desenvolvimento socioeconômico.

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AGRADECIMENTOS

Dedico meus sinceros agradecimentos:

A Deus e ao universo pelo dom da vida; pelas manifestações do melhor e do mais adequado a mim, mesmo que por vezes eu não compreenda de imediato; e pela possibilidade de encarar a vida com saúde, coragem e alegria.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), fundação que financiou esta pesquisa a partir de bolsa de estudos.

Ao orientador Antônio Márcio Buainain (Tuca), que sempre esteve presente e deu total suporte a este trabalho, desde sua concepção até as inúmeras alterações que foram resultado de conversas e reflexões conjuntas durante o processo de construção de conhecimento. Tuca também proporcionou valiosas experiências ao longo desses dois anos de mestrado, as quais foram muito além das disciplinas, seja em forma de seminários, reuniões, discussões, rodas de conversa, etc. Agradeço também pela disposição em apoiar ideias, ajudar a colocá-las em prática e a dialogar horizontalmente com os estudantes. Foram dois anos de aprendizado acadêmico e para a vida e Tuca contribuiu imensamente para isso. É uma honra poder conviver com uma pessoa de tamanha experiência e importância para o pensamento econômico brasileiro, fico feliz em poder continuar este relacionamento no doutorado.

Aos demais professores do NEA, especialmente àqueles com quem pude ter mais contato: Bastiaan Reydon, que contribuiu muito para o recorte desta pesquisa a partir da disciplina de seminários de dissertação e por sua participação como membro da banca avaliadora da qualificação e da defesa deste trabalho; Alexandre Gori, que também contribuiu para esta pesquisa a partir de sugestões no âmbito das disciplinas de seminários de dissertação e estrutura e evolução da agricultura; Ademar Romeiro, pelas valiosas contribuições feitas na qualificação e na disciplina de desenvolvimento socioeconômico; e Rodrigo Lanna, que contribuiu a partir da disciplina de estrutura e evolução da agricultura e, como coordenador do NEA, apoiou projetos para além desta dissertação, mas de grande importância para os alunos da pós-graduação.

Aos entrevistados: Carlos Guanziroli, Gilson Bittencourt, Pedro Loyola, Carlos Santana, Arilson Favareto, Antônio Márcio Buainain, Ademar Romeiro, Ana Celia Castro, Luiz Carlos Guedes, José Garcia Gasques, Renato Boschi, Bastiaan Reydon e Valter Bianchini, que contribuíram muito para a construção deste trabalho. Agradeço por disponibilizarem do tempo,

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conhecimento, opiniões e valiosas experiências, que sem sombra de dúvidas enriqueceram muito esta dissertação e o meu processo de aprendizado.

Ao professor Carlos Guanziroli, por sua valiosa participação como membro titular da banca avaliadora da defesa desta dissertação. O debate gerado engrandeceu muito a versão final deste trabalho.

Aos professores da pós-graduação em Desenvolvimento Econômico, que contribuíram com o pensamento sobre questões fundamentais, sejam nacionais ou internacionais, evidenciando características histórico-estruturais e tendências recentes que não podem ser negligenciadas se o objetivo é a construção de sociedades melhores.

Ao Instituto de Economia da Unicamp, por proporcionar espaços de diálogo sobre temas de fundamental importância no âmbito da economia nacional e internacional. Aos funcionários da biblioteca, por tornarem a vida acadêmica mais fácil a partir de treinamentos sobre acervo, bases de dados, programas, etc., além do suporte com as normas para elaboração de trabalhos. À secretaria de pós graduação, por sempre dar suporte e esclarecer as inúmeras dúvidas. Um agradecimento especial ao Marcelo Messias, secretário do NEA e funcionário sempre pronto a ajudar.

Às professoras Sônia Bergamasco, Maristela Simões do Carmo, Maria Angela Fagnani e Vanilde de Souza Esquerdo, da Faculdade de Engenharia Agrícola (FEAGRI) da Unicamp. Tive a oportunidade de conhecê-las na disciplina de Tópicos em mundo rural II, que contribuiu muito para esta dissertação, especialmente ao trazer diferentes olhares sobre a discussão relacionada à agricultura familiar e às necessidades deste grupo social.

Aos amigos Vahíd e Adâmara, que ingressaram comigo no mestrado como membros do NEA e sempre estiveram presentes, compartilhando conhecimentos, experiências, ideias, dúvidas, temores e filosofias. Espero manter os laços que construímos ao longo desses anos, mesmo que decidamos traçar caminhos diferentes. Às amigas Graziela e Grazielle, que me ajudaram com o tratamento dos dados e com a indicação de algumas fontes. À Graziela agradeço especialmente por todas as discussões, dicas e parcerias nos almoços e na nossa viagem ao congresso da SOBER em 2017. À Larissa, a paraguaia do NEA, por ajudar com o tratamento dos dados e por sempre ser uma presença de sabedoria, luz, felicidade e otimismo. Aos amigos Mayara, Flavio, Alirio, Carlos, Marcelo e Rafael, que ingressaram na pós graduação pelo NEA em 2017 e muito contribuíram com discussões, risadas e entusiasmo. À Camila Sakamoto e ao Andrews, por apoiarem em projetos e contribuir com discussões certamente ricas e relevantes. À Delaíde, que é minha amiga e parceira desde a graduação e tenho o prazer e a felicidade de manter o contato e realizar parcerias em artigos.

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Aos amigos Douglas, Rafaela e Maria, do Centro de Estudos do Desenvolvimento Econômico (CEDE), que me acolheram como família e tornaram a experiência do mestrado mais feliz e divertida. Com certeza são amigos para a vida.

Às amigas Mayara Bianco, Nathália Paz e Natália Siguemoto, que são amigas desde a graduação e provam que a distância não é desculpa para o afastamento. Obrigada pelas risadas, conselhos e comilanças sempre que possível. Ao amigo Renan, parceiro também de longa data, agradeço pelo prazer de tê-lo em minha vida.

À Érika Amusquivar e ao Thiago Trindade, meus orientadores na graduação e principais influenciadores na minha decisão em iniciar o mestrado. Agradeço por todas as dicas, apoio e encorajamento.

Aos meus pais, por apoiarem minhas decisões e incentivarem a minha busca pelo conhecimento. Obrigada pelos incentivos, apoio moral e financeiro. À toda minha família, que é enorme, obrigada pelos encontros e animação de sempre. Um agradecimento especial à minha madrinha Ana Sílvia, que sempre torce por minhas vitórias.

Ao Victor, meu namorado e meu amor há quase 12 anos. Obrigada pela parceria, por dividir a vida comigo, por estar presente nas comemorações, mas também nos momentos de frustração. Obrigada pela compreensão, pelo apoio e pelo amor, sem os quais a tarefa de construir este trabalho não seria a mesma.

Enfim, a todas e todos que direta ou indiretamente contribuíram de alguma forma para a construção deste trabalho, tendo eu mencionado ou não: gratidão!

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RESUMO

O objetivo geral deste trabalho é realizar uma análise do desenvolvimento de um conjunto selecionado de diferentes dimensões de capacidades do Estado brasileiro a partir da experiência do Pronaf no período de 1996 a 2016. Foram selecionadas 5 dimensões de capacidades estatais, consideradas fundamentais para a promoção de políticas públicas: i) financiamento, ii) burocrática, iii) jurídica, iv) político-relacional e v) execução. Cada uma delas será classificada como FORTE, MÉDIA ou FRACA. Esta abordagem não se limita ao papel do Estado, mas se refere aos instrumentos, aptidões e instituições (públicas ou privadas) de que se dispõe esta instituição para realizar iniciativas em prol do desenvolvimento socioeconômico. Nesse sentido, a pergunta que move esta dissertação é: O Estado brasileiro desenvolveu, no período de 1996 a 2016, as capacidades necessárias para promover as ações relacionadas ao Pronaf? a partir dela emergiram três hipóteses que pareceram relevantes para orientar o desenvolvimento da reflexão: 1) apesar do desenvolvimento de diferentes dimensões de capacidades do Estado brasileiro em relação ao Pronaf no período 1996 a 2016, ainda há gargalos que podem comprometer a sustentabilidade e o desempenho do programa; 2) o desenvolvimento das dimensões de capacidades no período de 1996 a 2016 foi assimétrico tanto entre as diferentes capacidades quanto entre os atores públicos e privados envolvidos na promoção do Pronaf, o que implicou em alguns limites de execução; 3) o desenvolvimento de uma capacidade em particular não significa suficiência do ponto de vista dos resultados da política, como alcance, eficácia, eficiência, etc. Ou colocado no modo inverso, o não desenvolvimento de algumas capacidades específicas pode comprometer o desempenho do Estado mesmo quando outras capacidades relevantes se desenvolveram bem. Assim, busca-se contribuir para a discussão inovadora sobre as capacidades estatais, bem como para uma reflexão acerca da promoção de políticas públicas.

Palavras-chave: Capacidades Estatais, desenvolvimento rural, Estado, políticas públicas, Pronaf.

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ABSTRACT

The general objective of this work is to perform an analysis of the development of a selected set of different capabilities dimensions of the Brazilian State based on the experience of Pronaf in the period from 1996 to 2016. Five State’s capabilities dimensions, considered fundamental for the promotion of public policies, were selected: i) financing, ii) bureaucratic, iii) legal, iv) political-relational and v) enforcement. Each of them will be classified as STRONG, MEDIUM or WEAK. This approach is not limited to the role of the State, but refers to the instruments, skills and institutions (public or private) which are connected with this institution to make possible to carry out initiatives for socio-economic development. In this sense, the question that moves this dissertation is: Has the Brazilian State developed, in the period from 1996 to 2016, the capabilities that are necessary to promote the actions related to Pronaf? Three hypotheses, that seemed relevant to guide the development of reflection, emerged: 1) despite the development of different capabilities dimensions of the Brazilian State in relation to Pronaf in the period 1996 to 2016, there are still bottlenecks that may compromise the program’s sustainability and performance; 2) the development of capabilities dimensions between 1996 and 2016 was asymmetrical both among the different capacities as between the public and private actors involved in the promotion of Pronaf, which meant in some limits of execution; 3) the development of a particular capability does not mean sufficiency from the point of view of policy outcomes, such as scope, effectiveness, efficiency, etc. Or, putting in the reverse mode, the non-development of some specific capabilities can compromise State performance even when other relevant capabilities have been well developed. Thus, the aim of this work is to contribute to the innovative discussion on State capabilities in Brazil, as well as to a reflection on the promotion of public policies.

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Breve apresentação dos profissionais entrevistados ______________________ 19 Quadro 2: Capacidades estatais importantes para o desenvolvimento das funções essenciais do Estado ________________________________________________________________ 34 Quadro 3: Principais instrumentos do Pronaf ___________________________________ 54 Quadro 4: Análises do Pronaf de 1997 a 2006 - seleção realizada em estudo de Guanziroli (2007) ___________________________________________________________________ 59 Quadro 5: Análises selecionadas sobre o Pronaf - resultados importantes ____________ 63 Quadro 6: Principais dificuldades da operacionalização Pronaf no que tange à ATER __ 97 Quadro 7: Classificação das capacidades estatais analisadas a partir do Pronaf ______ 138

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 16

Problema de pesquisa e hipóteses ... 17

Objetivos ... 18

Metodologia ... 18

Estrutura do trabalho ... 22

Parte 1- Capacidades estatais e Pronaf: compreensão de conceitos e apresentação do programa ... 25

Capítulo 1 – Capacidades estatais: contexto, conceito e importância para a promoção de políticas públicas ... 26

O contexto ... 27

O conceito ... 30

Capacidades estatais, alguns impactos nos resultados de políticas públicas e alguns contextos específicos ... 38

Considerações finais: capacidades estatais na jovem democracia brasileira 39 Capítulo 2- O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf): histórico, estrutura, instrumentos e algumas avaliações... 42

Alguns antecedentes à criação do Pronaf ... 42

A criação do Pronaf ... 45

Processo de liberação de crédito ... 48

Público-alvo e pré-requisitos ... 49

Grupos e linhas de crédito ... 49

Instrumento da política: o Plano Safra da agricultura familiar ... 52

Avaliações do Pronaf: alguns exemplos do que se tem evidenciado sobre o programa ... 59

Algumas políticas complementares ao Pronaf ... 66

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Parte 2- Análise das capacidades estatais selecionadas a partir da experiência do Pronaf

no período de 1996 a 2016 ... 71

Capítulo 3- Capacidade de financiamento ... 73

Rápido detalhamento sobre as principais fontes de recursos financeiros ... 74

Recursos do Pronaf: evolução de 1996 a 2016 e contribuição das principais fontes de financiamento ... 77

Concentração de recursos do Pronaf: algumas implicações ... 82

O crédito como principal instrumento do Pronaf ... 84

Considerações Finais ... 84

Capítulo 4- Capacidade burocrática ... 86

Panorama geral das burocracias na América Latina e no Brasil ... 87

A capacidade burocrática aplicada ao caso do Pronaf ... 88

Exemplos de limites que expressam a complexidade em analisar as capacidades Estatais ... 95

Superação de limites relacionados à capacidade burocrática: o caso do Banco do Brasil ... 99

Considerações Finais ... 100

Capítulo 5- Capacidade jurídica ... 101

A capacidade jurídica aplicada ao Pronaf ... 102

Decretos sobre o Pronaf: criação do Programa e diretrizes ... 103

Definindo o público-alvo ... 104

Algumas normas relacionadas à operacionalização do Pronaf ... 105

Algumas normas relacionadas ao acompanhamento e monitoramento ... 107

Normas recentes (2017): Unidade Familiar de Produção Agrária e Cadastro Nacional da Agricultura Familiar ... 108

Considerações Finais ... 110

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Relação Estado-sociedade no caso do Pronaf ... 113

Mudanças das linhas de crédito ao longo do tempo e algumas implicações 116 Movimentos Sociais e seus reflexos no Pronaf: a segmentação de sublinhas de crédito ... 117

Conselhos de Desenvolvimento Sustentável: lócus de participação social (pelo menos em teoria) ... 119

A capacidade político-relacional e o MDA ... 121

Desafio de representação social ... 122

A academia e sua importância para a capacidade político-relacional ... 122

Considerações finais ... 123

Capítulo 7- Capacidade de execução ... 125

Capacidade de execução no Pronaf e a inadimplência: qual deve ser a estratégia? ... 126

A importância em acompanhar de perto os stakeholders envolvidos nas operações do programa ... 130

Relatórios de avaliação: o que se evidencia ... 131

Considerações finais ... 134

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 135

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 141

ANEXOS ... 159

ANEXO 1: O conceito de agricultura familiar no Brasil: como definir? .... 159

ANEXO 2- Público-alvo do Pronaf: seu papel para o desenvolvimento rural, suas potencialidades e gargalos ... 177

ANEXO 3- Resposta ao pedido de número de funcionários da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário (Sead) ao e-Sic: sistema eletrônico do serviço de informação ao cidadão ... 190

ANEXO 4- Resposta do Banco Central do Brasil à solicitação de dados sobre inadimplência ... 192

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ANEXO 5- Resposta do Banco do Brasil à solicitação de dados sobre inadimplência ... 194

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INTRODUÇÃO

O objetivo geral desta dissertação é realizar uma análise do desenvolvimento de um conjunto selecionado de diferentes dimensões de capacidades do Estado brasileiro a partir da experiência do Pronaf entre os anos de 1996 a 2016. Essas capacidades serão analisadas tendo em vista sua centralidade para a promoção do desenvolvimento socioeconômico, de maneira geral, e do desenvolvimento rural, especificamente. Em consonância com os debates em curso sobre o papel das instituições nos países em desenvolvimento, em especial após a crise de 2008-2009, o debate sobre o Estado e suas capacidades para cumprir o papel que lhe cabe ganhou centralidade. A partir deste debate, toma-se como pressuposto que iniciativas em prol do desenvolvimento não acontecem espontaneamente, mas têm no Estado a principal (mas não única) mola propulsora, especialmente para o suporte aos grupos mais fragilizados da sociedade. Desta forma, o foco não se limita ao seu papel como criador de políticas públicas, mas sim às capacidades que esta instituição deve possuir para realizar este tipo de ação de maneira exitosa. A questão se direciona, assim, às estruturas e à dinâmica na relação entre Estado, instituições e organizações (tanto públicas quanto privadas), setores e sociedade, ou seja, os stakeholders, que possam sustentar uma estratégia para alcançar as vias de desenvolvimento desejadas1. Esta abordagem, certamente rica, ainda não foi aplicada para os estudos relacionados ao desenvolvimento rural no Brasil.

O conceito de capacidades estatais é abrangente, complexo e multidisciplinar, desenvolvido no contexto de estudos de sociologia política e economia política, e vem adquirindo centralidade nas análises sobre a efetividade do Estado ou “boa governança”. De modo geral, o conceito não se reduz ao Estado como instituição monolítica, mas considera todo o aparato institucional a que este se conecta, envolvendo atores como sociedade, organismos públicos e privados. Desta maneira, o conceito pode ser definido como “o conjunto de instrumentos e instituições de que dispõe o Estado para estabelecer objetivos, transformá-los em políticas e implementá-las” (FERNÁNDEZ, PUENTE, 2014; SOUZA, C., 2016, p 51). As capacidades específicas de um Estado estão relacionadas com a trajetória histórica e suas estruturas e aprendizagens, por isso este conjunto de aptidões não é algo dado ou estático, mas que se constrói e evolui (ou não) ao longo do tempo. Além disso, cada capacidade se conecta e a fragilidade em uma delas pode comprometer o desenvolvimento de outra dimensão. Diversas

1 A ideia é que o Estado não é monolítico, ou seja, é um ator fundamental, mas muitas vezes as necessidades vão além das capacidades desta instituição e por isso é fundamental a interação com os stakeholders.

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são as dimensões de capacidades que um Estado possui, variando em tipo, a depender das instituições políticas presentes ou do foco de análise pretendido (no sentido de recorte analítico), e em grau (alta capacidade versus baixa capacidade, ou forte e fraca, bem desenvolvida e débil, etc.).

Quando o tema em questão são as políticas públicas, é possível apontar pelo menos 5 dimensões centrais, que são consideradas fundamentais para que essas iniciativas sejam exitosas (essas dimensões são destacadas em BERKMAN, SCARTASCINI, STEIN, TOMMASI, 2014; BOSCHI & LIMA, 2002; EVANS, 2011; GOMIDE, 2016; GOMIDE, PIRES, 2014, 2016): 1) capacidade de financiamento, que é a aptidão do Estado em extrair recursos da sociedade para aplicá-los em suas iniciativas da maneira eficiente; 2) capacidade burocrática, que deriva do conceito weberiano de burocracia, contemplando as competências da administração pública para colocar em prática as políticas, agindo de maneira coordenada para a produção de resultados; 3) capacidade jurídica, que se refere à habilidade dos governos para criar condições de legalidade para que as políticas públicas operem da maneira desejada e focada no cumprimento de seus objetivos; 4) capacidade político-relacional, que se refere às habilidades do Estado em expandir os canais de inclusão, interlocução e negociação com os diversos atores (ou stakeholders), processando conflitos e prevenindo o direcionamento de suas decisões a interesses específicos; e 5) capacidade de execução, que relaciona-se com a função básica do Estado de fazer cumprir as regras e as decisões que emanam das instituições e políticas públicas em geral. Este conjunto de 5 dimensões será analisado nesta dissertação, a partir da experiência do Pronaf entre os anos de 1996 a 2016.

Problema de pesquisa e hipóteses

A pergunta que moveu este estudo foi a seguinte: o Estado brasileiro desenvolveu, no período de 1996 a 2016, as capacidades necessárias para promover as ações relacionadas ao Pronaf? A partir deste problema de pesquisa emergiram três hipóteses, que pareceram relevantes para orientar o desenvolvimento da reflexão:

1) Apesar do desenvolvimento de diferentes dimensões de capacidades do Estado brasileiro em relação ao Pronaf no período 1996 a 2016, ainda há gargalos que podem comprometer a sustentabilidade e o desempenho do programa;

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2) O desenvolvimento das dimensões de capacidades no período de 1996 a 2016 foi assimétrico tanto entre as diferentes capacidades quanto entre os atores públicos e privados envolvidos na promoção do Pronaf, o que implicou em alguns limites de execução;

3) O desenvolvimento de uma capacidade em particular não significa suficiência do ponto de vista dos resultados da política, como alcance, eficácia, eficiência, etc. Ou colocado no modo inverso, o não desenvolvimento de algumas capacidades específicas pode comprometer o desempenho do Estado mesmo quando outras capacidades relevantes se desenvolveram bem.

Objetivos

A partir do que se propõe a discutir neste trabalho, tendo em vista o problema de pesquisa e o objetivo geral, que é realizar uma análise do desenvolvimento de um conjunto selecionado de diferentes dimensões de capacidades do Estado brasileiro a partir da experiência do Pronaf entre os anos de 1996 a 2016, os objetivos específicos nortearam a criação dos capítulos, seções e subseções. Estes objetivos podem ser expressados da seguinte maneira:

I) Apresentar o conceito de capacidades estatais e discutir sua importância do ponto de vista da promoção de políticas públicas;

II) Apresentar o Pronaf (antecedentes, histórico e alguns resultados);

III) Analisar o conjunto das 5 capacidades estatais selecionadas a partir da experiência do Pronaf entre os anos de 1996 a 2016.

Metodologia

A metodologia utilizada nessa dissertação envolve três dimensões: (i) revisão da bibliografia que trata das temáticas abordadas, (ii) apresentação e exploração de dados oficiais do governo federal e de outras instituições, nacionais ou não, como Banco Central do Brasil, Tribunal de Contas da União, Banco Interamericano de Desenvolvimento e Banco Mundial; (iii) entrevistas com especialistas de diversas áreas, como acadêmica, ministerial, bancária e de extensão rural.

A entrevista é uma técnica importante, que permite o desenvolvimento de uma comunicação bilateral e constitui um importante meio para coleta de informações para a pesquisa (RICHARDSON, 1999). Foram realizadas 13 entrevistas (algumas presencialmente,

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outras via telefone) a partir do método de entrevista não estruturada (ou entrevista em profundidade, como também é conhecido), ou seja, foi uma conversa guiada por questões mais gerais e os entrevistados puderam contribuir com suas experiências e pontos de vista, ao invés de responderem a um questionário pré-formulado com questões fechadas, ou alternativas. Nesse sentido, o objetivo das entrevistas foi obter informações dos entrevistados a partir de suas experiências, conhecer a opinião deles, explorar o conhecimento. O conteúdo das entrevistas foi incorporado às análises e, nos casos em que se tornou necessário realizar citação direta da fala, as menções foram realizadas como as citações diretas a autores das bibliografias indicadas ao longo do trabalho, dada a importância destes entrevistados, com trajetórias e experiências ímpares. O quadro abaixo organiza, de uma maneira geral, informações sobre a formação e a atuação dos entrevistados (a apresentação segue a ordem das entrevistas):

Quadro 1: Breve apresentação dos profissionais entrevistados

Entrevistado Formação/atuação

Carlos Enrique Guanziroli

Doutorado em economia. Docente na Universidade Federal Fluminense. Experiência com formulação de políticas públicas (envolvimento na promoção do Pronaf). Pesquisa em parceria com diversos organismos nacionais e internacionais, como Unicamp, FAO, Banco Mundial, IICA, OEA, dentre outros. Principais temas de pesquisa: cadeias agroindustriais, agricultura familiar, desenvolvimento rural, política agrícola, reforma agrária e agricultura.

Gilson Alceu Bittencourt

Mestrado em desenvolvimento econômico e especialização em políticas públicas. Experiência em consultorias, como para a FAO e Cresol. Experiência em cargos no Governo Federal, como Secretário Executivo Adjunto da Casa Civil, Ministério do Planejamento, Ministério da Fazenda e Ministério do Desenvolvimento Agrário, como Secretário Nacional de Agricultura Familiar Trabalhou como assessor técnico no Departamento de Departamento de Estudos Socioeconômicos Rurais (Deser).

Pedro Augusto Loyola

Mestrado em gestão de cooperativas. Experiência em agronegócio e sistema financeiro. Experiência em representação e articulação junto às áreas técnicas dos governos e do setor privado. Principais áreas de atuação: agronegócio, estratégia competitiva, sustentabilidade, meio ambiente, logística e infraestrutura, legislação rural e políticas públicas (ênfase em crédito e seguro rural).

Carlos Augusto Mattos Santana

Doutorado em Economia Agrícola. Experiência com política agrícola, comércio internacional, análise setorial agropecuária e cooperação técnica internacional. Experiência em cargos no Governo Federal, como Ministério da Fazenda e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Experiência em cargos em organismos internacionais, como FAO e IICA. Gerência de

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pesquisa na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). Principal tema de pesquisa: gestão estratégica. Arilson da Silva

Favareto

Mestrado em sociologia. Doutorado em ciência ambiental. Docente na Universidade Federal do ABC. Experiência em pesquisa e consultoria junto a órgãos de governo, movimentos sociais e agências de cooperação internacional. Principais temas de pesquisa: planejamento e gestão do território.

Antônio Márcio Buainain

Doutorado em ciência econômica. Docente na Unicamp. Experiência na área de economia, com ênfase em economia agrícola. Experiência com políticas públicas (envolvimento na promoção do Pronaf). Pesquisa em parceria com diversos organismos nacionais e internacionais, como Unicamp, FAO, Banco Mundial, IICA, dentre outros. Principais temas de pesquisa: reforma agrária, agricultura familiar, inovação tecnológica, agronegócio e propriedade intelectual.

Ademar Ribeiro Romeiro

Doutorado em economia. Docente na Unicamp. Experiência na área de economia, com ênfase em economias agrária e dos recursos naturais. Principais temas de pesquisa: meio ambiente, progresso técnico, agricultura e meio ambiente, reforma agraria e agricultura sustentável, economia ecológica.

Ana Celia Castro

Doutorado em ciência econômica. Docente na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Experiência na área de economia, com ênfase em economia Institucional. Experiência na coordenação do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (INCT-PPED), Núcleo de Políticas Públicas: Análise e Avaliação (NUPPAA) e School for Policies, Innovation and Development Research Web (SPIDER Web). Principais temas de pesquisa: governança do conhecimento, capacidades estatais, tendências tecnológicas, inovação, competitividade, sistema agroindustrial e propriedade intelectual.

Luis Carlos Guedes Pinto

Doutorado em agronomia. Experiência como docente na Unicamp. Foi ministro da Agricultura entre 2006 e 2007. Experiência em cargos no Governo Federal, como Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB); Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); Banco do Brasil (BB); Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e Companhia Brasileira de Participação Agroindustrial (BRASAGRO), dentre outros órgãos (incluindo os de dimensão estadual).

José Garcia Gasques

Doutorado em economia. Experiência em economia com ênfase em economias agrária e dos recursos naturais. Experiência em cargos no Governo Federal, como Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Principais temas de pesquisa: política agrícola, gastos públicos na agricultura, salários, volante.

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Renato Raul Boschi

Doutorado em ciência política. Docente na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Experiência na coordenação do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (INCT-PPED) e do Núcleo de Estudos do Empresariado, Instituições e Capitalismo (NEIC). Principais temas de pesquisa: formação do Estado, democracia, políticas públicas, empresários, representação de interesses, desenvolvimento e política comparada, com ênfase em América Latina.

Bastiaan Philip Reydon

Doutorado em desenvolvimento econômico, espaço e meio ambiente. Docente. Experiência na área de Economia, com ênfase em economias agrária e dos recursos naturais. Pesquisa em parceria com diversos organismos nacionais e internacionais, como Unicamp, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Banco Mundial, dentre outros. Principais temas de pesquisa: mercado e preços de terras, governança fundiária, regularização fundiária, desenvolvimento sustentável, economia do meio ambiente, valoração do meio ambiente.

Valter Bianchini

Doutorado em meio ambiente e desenvolvimento. Especialização em formulação e análise de políticas agrícolas. Experiência na área de desenvolvimento rural, com ênfase em agricultura familiar e políticas públicas (participação na promoção de diversas iniciativas, incluindo o Pronaf). Experiência com Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER). Experiência no setor público federal e estadual, em particular como Secretário Nacional de Agricultura Familiar, no Ministério do Desenvolvimento Agrário, e Secretário de Agricultura do Estado do Paraná, no setor privado, em particular no Departamento de Estudos Socioeconômicos Rurais (Deser), e internacional, na FAO em Roma.

Os dados sobre crédito do Pronaf foram coletados de fontes diferentes em função da disponibilidade de informações. Dos anos de 1996 a 1998 foram obtidos do Relatório Técnico das Ações Desenvolvidas pelo Pronaf no Período 1995/1998, produzido pelo Ipea (SILVA, 1999). De 1999 até 2012 os dados sobre o financiamento do Pronaf passaram a ser registrados nos Anuários Estatísticos do Crédito Rural, disponíveis no site do Banco Central do Brasil. Foram utilizados os dados disponíveis no Relatório 521, referente ao Pronaf. A partir de 2013 e até 2016, os dados foram obtidos na Matriz de Dados do Crédito Rural, também disponível no site do Banco Central do Brasil.

Todos os dados apresentados na análise da capacidade de financiamento estão deflacionados, utilizando como base o ano de 2016, ou seja, os valores históricos de financiamento foram trazidos para o valor presente, de modo a possibilitar uma comparação mais consistente dos valores ao longo do tempo. O índice de inflação utilizado foi o IPCA

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(Índice de Preços ao Consumidor Amplo), que reflete o custo de vida de famílias com renda mensal de 1 a 40 salários mínimos, e é considerado o índice oficial de inflação no Brasil. Este índice é calculado mensalmente pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e os dados estão disponíveis para consulta no site do instituto. Para deflacionar os dados de financiamento, que são anuais, foi necessário utilizar índices de inflação acumulada de cada ano, dados disponíveis no site do IPEADATA. Os resultados foram obtidos partir da fórmula Vr16=Vn(t)*Iac(16)/Iac(t), onde Vr16 é o valor real de 2016, Vn(t) é o valor nominal no período t e Iac é o índice acumulado no período t.

Em relação à análise das diferentes dimensões de capacidades do Estado brasileiro selecionadas neste trabalho, o objetivo foi classificar cada uma delas como FORTE, MÉDIA ou FRACA. Alguns parâmetros específicos nortearam a classificação, como indicado abaixo:

Capacidade de financiamento: capacidade do Estado brasileiro em administrar e ampliar os recursos voltados ao Pronaf ao longo do tempo, bem como a contribuição das principais fontes e sua estabilidade ao longo do tempo.

Capacidade burocrática: desenvolvimento e evolução do aparato administrativo responsável pela promoção do Pronaf no período analisado.

Capacidade jurídica: aparato legal que dá suporte ao Pronaf, as principais leis, decretos e portarias que dizem respeito à criação do programa e determinações do seu modus

operandi.

Capacidade político-relacional: capacidade do Estado brasileiro em conectar-se com os grupos de interesse para o desenvolvimento do Pronaf durante o período analisado.

Capacidade de execução (enforcement): buscou-se verificar a capacidade do Estado brasileiro em garantir o cumprimento dos contratos do Pronaf, bem como a capacidade de criar e manter mecanismos de controle e acompanhamento do programa ao longo do tempo. Assim, estes foram os parâmetros centrais para a classificação de cada uma das dimensões e as conclusões foram baseadas nos 3 eixos da metodologia: bibliografias, dados oficiais e entrevistas.

Estrutura do trabalho

Para que a análise das capacidades selecionadas faça sentido, é fundamental que algumas explicações iniciais sejam realizadas e, por isso, esta dissertação se divide em duas partes. Primeiramente, por ser uma metodologia inovadora e ainda não utilizada para estudos

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na área de desenvolvimento rural, é indispensável um detalhamento conceitual sobre capacidades estatais. Além disso, é importante a apresentação Pronaf: alguns antecedentes, histórico, alguns resultados e análises. Estas discussões compõem a primeira parte desta dissertação: Parte 1- Capacidades estatais e Pronaf: compreensão de conceitos e apresentação do programa. Esta parte inicial do trabalho dá as bases para que se compreenda as análises das capacidades e se constitui dos seguintes capítulos:

Capítulo 1- Capacidades estatais: contexto, conceito e importância para a promoção de políticas públicas: dada a importância do Estado para a promoção do

desenvolvimento, o objetivo deste capítulo é apresentar o conceito de capacidades estatais, destacando quais aptidões são indispensáveis para a promoção de políticas públicas.

Capítulo 2- O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf): histórico, estrutura, instrumentos e algumas avaliações: o objetivo é apresentar o

Pronaf desde sua criação, seus objetivos e instrumentos até algumas análises acadêmicas sobre o programa e alguns exemplos de programas complementares.

Dado este passo inicial e introdutório, a segunda parte do trabalho se intitula Parte 2- Análise das capacidades estatais selecionadas a partir da experiência do Pronaf no período de 1996 a 2016, e tem como objetivo realizar as análises das 5 dimensões selecionadas a partir deste programa, as quais serão classificadas como FORTE, MÉDIA ou FRACA. Assim, esta parte se divide nos seguintes capítulos:

Capítulo 3- Capacidade de financiamento: neste capítulo são apresentadas as fontes

de financiamento do Pronaf desde 1996 até 2016, bem como a evolução da sua contribuição ao longo do tempo. Também será apresentada a evolução total de recursos direcionados ao programa no recorte temporal selecionado. Algumas discussões importantes ainda se destacam: concentração de recursos em determinadas regiões e o crédito como principal instrumento do programa.

Capítulo 4- Capacidade burocrática: neste capítulo se apresenta a estrutura da

Secretaria Especial de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Agrário (Sead), que desde 2016 é a responsável pelo Pronaf, além da evolução da estrutura burocrática que dá suporte ao Pronaf desde sua criação e a evolução deste aparato ao longo do tempo. Se destacam alguns exemplos de limites e também superações de desafios relacionados a esta capacidade.

Capítulo 5- Capacidade jurídica: neste capítulo são apresentadas as leis, normas,

decretos e instrumentos em geral que dão suporte legal para que o Pronaf opere de acordo com as determinações do Estado e com os objetivos do Programa.

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Capítulo 6- Capacidade político-relacional: neste capítulo se destaca a relação

entre o Estado e os grupos de interesse desde a criação do Pronaf e seus impactos na estrutura do programa ao longo do tempo. Destacam-se alguns desafios relacionados à representação social do público alvo, bem como à experiência desta dimensão de capacidade com o extinto MDA, que desde os anos 2000 até 2016 foi o responsável pelo programa.

Capítulo 7- Capacidade de execução: nesta última dimensão a ser analisada se

destacam alguns instrumentos utilizados pelo Estado o cumprimento de suas determinações no âmbito do Pronaf, na medida em que apenas a capacidade jurídica, com a criação de leis e normas, não seria suficiente para o cumprimento das determinações. Negociações, divulgação, incentivos bem como um acompanhamento e monitoramento adequados são exemplos de ações que agem em prol do enforcement da política. São apresentadas algumas evidências de relatórios oficias do governo em auditoria ao programa.

Cada uma das análises das capacidades foi dividida em capítulos separados devido a sua complexidade e em seguida são apontadas algumas considerações finais gerais. A estrutura desta dissertação em 2 partes permite uma divisão coesa entre capítulos iniciais mais conceituais e descritivos, seguidos de capítulos de análise na segunda parte. Espera-se, assim, contribuir com a discussão inovadora sobre as capacidades estatais, bem como para uma reflexão acerca da promoção de políticas públicas.

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Parte 1- Capacidades estatais e Pronaf: compreensão de conceitos e

apresentação do programa

O objetivo da primeira parte desta dissertação é esclarecer conceitos e apresentar o Pronaf. Assim, o primeiro capítulo apresenta o conceito de capacidades estatais, que é multidisciplinar e abrangente, por isso é importante deixar muito clara a definição, que não se limita ao papel do Estado, mas leva em conta as aptidões, instrumentos e instituições (públicas ou privadas) de que dispõe o Estado e que se inter-relacionam entre si. Esta é uma abordagem inovadora e, em termos de estudos relacionados ao desenvolvimento rural, ainda não é amplamente utilizada, por isso este capítulo inicial é muito importante. Além disso, o primeiro capítulo também apresenta o conjunto de dimensões de capacidades selecionadas para a avaliação a partir do Pronaf. O segundo capítulo tem como objetivo apresentar o Pronaf: alguns antecedentes, histórico, alguns resultados e análises do programa. Assim, a discussão dos 2 primeiros capítulos constrói as bases necessárias para que seja possível compreender a segunda parte deste trabalho, que trata da análise das capacidades estatais selecionadas.

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Capítulo 1 – Capacidades estatais: contexto, conceito e importância para a

promoção de políticas públicas

O Estado é um ator importante na promoção do desenvolvimento e, para que suas inciativas tenham sucesso, as decisões de cunho estratégico são cruciais. No meio rural e entre os países em desenvolvimento, as intervenções do Estado em geral incluem ações voltadas especificamente para a agricultura, utilizando os conhecidos instrumentos de política agrícola, e ações voltadas para o desenvolvimento rural e para a redução da pobreza que historicamente é uma marca do meio rural.2 Apesar de importante, a atuação do Estado sempre foi objeto de

intensas controvérsias, classificadas em polarizações simplificadas e dualistas tais como liberais versus estatizantes, desenvolvimentistas versus ortodoxos, Estado mínimo versus Estado inchado, Estado ineficiente versus setor privado eficiente etc. A própria literatura sobre capacidades estatais emerge como alternativa a muitas dessas polarizações, chamando a atenção que, mais importante que o tamanho, são as capacidades estatais para desempenhar funções gerais e específicas que lhe cabem, e que variam de sociedade para sociedade, de cultura para cultura. A análise do papel desempenhado pelo Estado no período recente -os últimos 50 anos- para promover a agricultura e o desenvolvimento rural revela ações relevantes, assim como lacunas igualmente importantes (BUAINAIN, 1999; BUAINAIN, SOUZA FILHO, 2001; GARCIA, VIEIRA FILHO, 2014; LAGARES, 2003).

Buainain (1999) analisou a trajetória da política agrícola desde meados dos anos 1960 até o início dos anos 1990, mostrando que se passou de uma intervenção planejada – que não é um conceito rigoroso que expressa um padrão bem definido de intervenção do Estado na economia, mas a função do Estado como principal articulador e impulsionador do processo de acumulação de capital e de uma transformação socioeconômica estrutural — para um período de intervenção caótica, no qual as ações do Estado se voltavam à resposta desordenada às situações e pressões conjunturais, perdendo de vista os objetivos estratégicos de longo prazo . A perda de eficiência e eficácia da intervenção do Estado levaram à emergência, ainda segundo Buainain (1999), de um novo padrão de intervenção, no qual o estado deixa de ser protagonista e transfere para o mercado o papel central de regulação da produção.

2 A pobreza se reproduziu nos centros urbanos, mas em termos percentuais é mais acentuada no meio rural. Isso pode ser explicado na medida em que as transformações socioeconômicas se reproduziram com maior intensidade no meio urbano, que também concentra maiores níveis de renda. Para dar um exemplo, em 2011 a renda domiciliar per capita era de R$ 828 na área urbana, enquanto na área rural esse valor era de R$ 350 (SAKAMOTO, 2014).

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O Estado brasileiro, então, pode ter deixado de desempenhar alguns papeis como responsável pela promoção de iniciativas de desenvolvimento no rural, saindo “à francesa”, enquanto o setor privado foi ocupando espaços (BUAINAIN et al, 2013a). Este processo de afastamento do Estado e maior protagonismo do setor privado se verifica em especial em relação à agricultura patronal, e mais particularmente em relação ao financiamento aportado pelo setor privado, inclusive não bancário3. Em contrapartida, esta hipótese da saída à francesa é cabalmente contestada quando se avalia o papel desempenhado pelo Estado para promover a agricultura familiar. Pode-se questionar as escolhas, os instrumentos e os resultados, mas não a ausência de ações. De fato, o Estado arca com todos os custos de manutenção do Pronaf, que cresceu desde sua criação.

Nesse sentido, para que o Estado possa cumprir com este papel de promover as iniciativas voltadas à agricultura familiar e desenvolvimento rural, é necessário que algumas capacidades estejam bem desenvolvidas, de modo que as iniciativas sejam experiências de sucesso. A partir destas considerações, será apresentado neste capítulo o conceito de capacidades estatais e sua importância para a promoção de políticas públicas. Assim, o objetivo é apresentar a discussão das capacidades estatais, que serão objeto de análise a partir do Pronaf, destacando aquelas necessárias para que as políticas públicas possam ser experiências de êxito.

O contexto

A agricultura familiar está diretamente relacionada à promoção do desenvolvimento rural, até porque grande parte dos pobres rurais estão inseridos neste segmento. Assim, identificar a realidade destes agricultores e verificar seus principais problemas faz parte das capacidades estatais; transformar esta identificação em políticas públicas é um passo adiante; colocar em prática tais políticas, utilizando instrumentos tecnicamente bem desenhados, mobilizando recursos financeiros adequados, estabelecendo relações e alianças com a sociedade e criando regras para dar sustentação às ações são elementos que, finalmente, compõem o quadro de capacidades estatais necessárias para responder aos problemas identificados (uma discussão sobre esta temática está brevemente apresentada no anexo 2). Estes componentes refletem o conjunto “ótimo” de capacidades fortes e bem definidas, seria o modelo almejado.

3 O financiamento público cresceu, mas o privado ganhou um grande espaço, especialmente a partir dos anos 1980, quando o Estado enfrentou uma crise fiscal que acarretou em restrição da capacidade de crédito para atender às crescentes demandas da agricultura, especialmente na região Centro-Oeste, que expandia a cultura de soja. O setor privado permitiu a criação de mecanismos adjacentes de financiamento, que garantiram a continuidade de fornecimento de crédito ao produtor brasileiro de grande porte (GALVÃO, 2014).

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Ou seja, para que as políticas sejam experiências de sucesso é necessário que o Estado tenha um conjunto de capacidades bem desenvolvidas e inter-relacionadas, e não apenas a vontade ou uma e outra capacidade isoladamente. É importante ressaltar também que não basta que o Estado tenha as capacidades necessárias para promover políticas públicas eficazes, na medida em que elas têm reflexos sobre os vários grupos integrantes do sistema, os quais têm interpretações diferentes sobre a ação do Estado. Assim, é importante que haja uma simetria entre as capacidades e a interpretação dos agentes sobre os resultados delas, pois isso pode determinar o sucesso ou o fracasso das iniciativas.

O papel do Estado na economia e na sociedade é foco de muitos debates, a partir de diferentes teorias. Esquematicamente, algumas delas atribuem maior protagonismo ao Estado, enquanto outras restringem seu papel à correção de possíveis falhas de mercado e à provisão dos chamados bens públicos. Souza, J. (2016) ressalta que durante décadas o foco central dos estudos foi o papel do Estado, assumindo, implicitamente, que o mesmo tinha capacidade para desempenhar o conjunto de papeis atribuídos. Pouco se estudou o próprio Estado e suas capacidades para formular, implementar, avaliar políticas públicas e para enfim alcançar os objetivos propostos. No entanto, com base na experiência dos últimos 50 anos é possível fazer no mínimo duas afirmações categóricas: (i) o Estado é um ator fundamental para promover o desenvolvimento sustentável e para a construção de estruturas socioeconômicas mais eficientes, equilibradas e equitativas; e (ii) as capacidades do Estado são limitadas. Nesse sentido, torna-se necessário compreender as competências e habilidades que o Estado possui e deve possuir para promover ações em prol do desenvolvimento socioeconômico a partir de um conjunto de dimensões consideradas estratégicas. Além disso, arranjos institucionais que conectem o Estado à sociedade e a outras instituições devem ser criados, de modo a suprir a limitação de algumas capacidades e garantir a eficácia das ações.

No âmbito internacional, o período posterior à II Guerra Mundial foi dominado pela expectativa de superação dos problemas criados pela própria guerra e pelo atraso econômico e social com base em políticas de desenvolvimento baseadas na ação do Estado. Esta visão de um Estado forte, garantidor do bem-estar social, enfraqueceu-se muito a partir dos anos 1970, quando a crise internacional colocou em evidência tanto as falhas como também o fracasso de muitos Estados desenvolvimentistas. Naquele contexto ganharam força as propostas de reforma estrutural que tinham como um dos eixos a reforma do Estado, a liberalização econômica e desregulamentação das atividades para estimular o empreendedorismo do setor privado, e que ficou conhecida no embate político ideológico como “neoliberalismo”, mais um rótulo que um

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conceito ou categoria analítica propriamente dito. A partir do final da década de 1990 estas concepções começaram a ser questionadas com base nas evidências de que a receita não estava produzindo os bolos prometidos, nem em termos de crescimento e muito menos de distribuição e equidade. A instabilidade financeira e os altos índices de pobreza e desemprego verificados em diversos países ressaltaram a necessidade de um Estado mais atuante, capaz de lidar com estes problemas (BICHIR, 2015; CERQUEIRA, 2015).

Em consonância com os debates em curso sobre o papel das instituições nos países em desenvolvimento, em especial após a crise de 2008-2009, uma tendência emergiu, reacendendo as discussões sobre o papel do Estado e principalmente sobre a importância das capacidades estatais para alcançar resultados sociais e econômicos desejáveis, ou seja, para que a instituição possa executar o script que lhe cabe (CINGOLANI, CROMBRUGGHE, THOMSSON, 2013; GOMIDE, 2016). Em muitos países em desenvolvimento observou-se o revigoramento do protagonismo do Estado, tendo como foco não apenas a infraestrutura e operação de empresas estatais, mas também o enfrentamento das desigualdades sociais por meio de programas que exigem capacidades estatais fortes. Nesse contexto, a questão fundamental deixou de ser o tamanho do Estado, mas sim sua capacidade para cumprir funções históricas imprescindíveis e que as levasse a cabo com eficiência (KLIKSBERG, 2001). Esta abordagem das capacidades estatais passou então a ser apresentada como ferramenta para viabilizar o desenho e implementação de uma nova estratégia de desenvolvimento.

A centralidade da discussão sobre as capacidades Estatais é ressaltada, fundamentalmente, pela corrente neoinstitucionalista, que enfatiza a autonomia relativa do Estado. Skocpol (1985) afirma que os Estados são organizações que exercem domínios sobre territórios e sociedades, podendo possuir objetivos que não correspondem às demandas e interesses dos grupos sociais. Diante de tal autonomia, ressalta-se a importância de se relacionar os interesses Estatais com os de diferentes atores interessados (ou stakeholders). No que se refere aos papéis, o foco do debate não é mais o que opõe liberais defensores do Estado mínimo aos desenvolvimentistas que atribuem ao estado um papel de protagonista que vai muito além da correção das falhas do mercado. Na prática, o foco central, pelo menos nos países desenvolvidos, é como corrigir as falhas do mercado, como regular as atividades econômicas e financeiras para impedir os desvios que foram revelados na crise de 2008 sem eliminar os incentivos embutidos na liberdade econômica, que novos arranjos são necessários para que o Estado desempenhe um papel mais ativo na promoção do desenvolvimento, sem incorrer nos problemas que explicam o fracasso do desenvolvimentismo principalmente na América Latina.

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Evans (2011) ressalta que as capacidades estatais representarão um papel fundamental para o desenvolvimento socioeconômico neste século, mais do que no século passado, o que demanda uma sinergia entre Estado e sociedade para a realização dos objetivos.

O conceito

É necessário deixar muito clara a definição das capacidades estatais, conceito desenvolvido no contexto de estudos de sociologia política e economia política acerca do papel do Estado na promoção do desenvolvimento econômico e que vem adquirindo centralidade nas análises sobre a efetividade do Estado ou “boa governança”. É preciso explicitar que capacidades estatais, do Estado ou do governo, bem como governança pública e governança, são conceitos inter-relacionados e igualmente complexos, que geraram importantes esforços analíticos de medição e avaliação, além de debates no campo metodológico.4 Trata-se de uma ideia abrangente, marcada por forte multidimensionalidade e multidisciplinaridade, características que facilitam interpretações às vezes intuitivas, comum aos estágios iniciais das pesquisas inovadoras. Ainda que isto não seja necessariamente ruim, pode produzir confusões devido ao uso do conceito interpretado com diferentes significados. Em um nível mais amplo, o conceito refere-se à criação e à manutenção da ordem em um território, o que exige um conjunto de medidas para a proteção da soberania. Esta abordagem guiou uma primeira geração de estudos que avançaram na compreensão da formação dos aparatos governamentais e embasou estudos sobre a autonomia do Estado em relação à oposição de grupos da sociedade. Em um nível mais específico, o conceito se relaciona às capacidades que os Estados que já superaram seus estágios iniciais de construção devem possuir para atingir, de forma efetiva, os objetivos que pretendem a partir de suas políticas públicas (GOMIDE, PIRES, 2016; MANN, 1984; SCARTASCINI, TOMMASI, 2014; SIKKINK, 1991; TILLY, 1975; SKOCPOL, 1979; WEISS, 1998; WEISS, 2006).

Nesta perspectiva mais específica, o Estado é um ator com interesses e recursos próprios, munido de um conjunto de estruturas administrativas, jurídicas e arrecadatórias, se diferenciando do restante dos atores sociais e econômicos.5 As capacidades específicas de um

4 Esses esforços e debates ocorrem especialmente por se tratar de um conceito inovador, especialmente no Brasil. Esses detalhes, contudo, não serão abordados neste trabalho, que se restringirá à apresentação do conceito de capacidades estatais e análise de um conjunto delas a partir do Pronaf.

5 E sobre esta instituição existe um extenso debate, que vai desde o seu conceito até suas funções e limites. O Estado pode ser um Leviatã, como proposto por Hobbes (1979), que deve ser forte e centralizado para garantir a

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Estado estão relacionadas com a trajetória histórica e suas estruturas e aprendizagens, por isso este conjunto de aptidões não é algo dado, mas se constrói e varia ao longo do tempo. Nesse sentido, Boschi e Gaitán (2008), bem como Boschi e Diniz (2011), ressaltam que o Estado deve possuir um conjunto de aptidões para alcançar um determinado fim (mas essencialmente para promover o desenvolvimento socioeconômico), e estas aptidões se relacionam às habilidades da burocracia estatal para implementar as metas oficiais, mesmo diante da oposição de grupos da sociedade ou em circunstâncias socioeconômicas desfavoráveis. Esta capacidade pressupõe outras, como a de agir com relativa autonomia para enfrentar interesses diversos, contar com uma burocracia tecnicamente preparada e empoderada para implementar, de forma coerente e autônoma, políticas de desenvolvimento. Desse modo, simplificadamente, o conceito de capacidade estatal pode ser considerado como “o conjunto de instrumentos e instituições de que dispõe o Estado para estabelecer objetivos, transformá-los em políticas e implementá-las” (FERNÁNDEZ, PUENTE, 2014; SOUZA, C., 2016, p 51).

O conceito tem adquirido centralidade nos estudos sobre boa governança ou governança e crescimento (ACEMOGLU, TICCHI, VINDIGNI, 2011; FUKUYAMA, 2013), que se referem aos atributos que caracterizam o “Estado em ação”, ou seja, que permitem a identificação de problemas, a formulação de soluções, a execução de ações e a entrega dos resultados. Este processo envolve atores, instrumentos e processos que devem ser coordenados, de modo a resultar em políticas públicas de desenvolvimento. Para isto, além de profissionais competentes e de técnicas eficientes de gestão, que produzam ações coordenadas e orientadas para resultados, a produção de políticas públicas passa a exigir do Estado outras capacidades, tais como estabelecer, manter e coordenar a relação entre as organizações do setor público, privado e a sociedade civil. Importa dizer que o conjunto de capacidades, por si só, não é determinante do sucesso ou qualidade das iniciativas. As capacidades são complexas e não são estáticas, podendo ser construídas e destruídas ao longo do tempo. Ademais, esse processo não necessariamente é linear e envolve questões como demanda e oportunidade.

É importante destacar que o processo que envolve a criação de políticas públicas requer arranjos institucionais e estruturas mais complexas, que são reflexo das próprias modificações que ocorreram nas relações entre Estado, sociedade e mercado. Neste contexto,

segurança e os direitos básicos dos cidadãos, como alimentação. Ou pode ser resultado de uma fusão entre direito e poder político, resultando em um Estado Democrático de Direito, como sugere a teoria de Habermas (1994). Outros autores tradicionalmente enquadrados no campo das Ciências Políticas e Ciências Sociais ainda podem ser citados, como John Locke, Jean-Jacques Rousseau, Max Weber, Georg Friedrich Hegel, Immanuel Kant, Georges Burdeau, Nicos Poulantzas, dentre outros muitos importantes autores, cada qual apresentando suas interpretações específicas sobre o Estado e suas atribuições.

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as tomadas de decisão e a execução de programas são ou podem ser compartilhadas entre atores governamentais e não governamentais. Estas transformações que envolvem o relacionamento do Estado com outros atores da sociedade implicam em novas interpretações sobre as capacidades da instituição em desenvolver políticas públicas, que envolve a necessidade de grandes volumes de recursos financeiros, humanos e administrativos. Arranjos institucionais sofisticados, que envolvam transferência e distribuição de funções de maneira coordenada para atores estatais não estatais podem contribuir para o desenvolvimento de algumas capacidades, bem como a criação de novas, na medida em que adicionam mais capilaridade e oportunidades para o aprendizado e a partir de reflexões e experiências coletivas (GOMIDE, PIRES, SILVA, 2014).

Em síntese, Boschi e Gaitán (2008), ao discutir questões relacionadas ao desenvolvimento na América Latina, ressaltam a importância das burocracias públicas e a existência e funcionamento de canais que conectem o Estado à sociedade civil, com o objetivo de conferir legitimidade, aceitação e eficácia às suas ações em prol do desenvolvimento. A tarefa de formular e implementar políticas públicas cabe principalmente aos governos, articulada a pelo menos duas instituições do Estado: o Poder Executivo e a burocracia estatal. Mas isso não significa que o Estado atue sozinho, pelo contrário, as instituições e organizações, de modo geral, devem atuar de maneira sistêmica e complementar em prol dos objetivos desejados. Nesse sentido, como ressalta Leite (2011), o Estado não é o único ator na gestão de políticas públicas – apesar de ser o ator fundamental -, existe um conjunto de organizações que se inter-relacionam, podendo, inclusive, criar novas aptidões e aprimorar a experiência das políticas públicas. A qualidade da atuação do Estado dependerá, em grande medida, da gestão de seus recursos financeiros, humanos, tecnológicos –diretamente influenciados pelas capacidades estatais— e dos benefícios para o público-alvo.

Echebarría et al (2006) afirmam que os Estados devem ter a capacidade de manter a estabilidade macroeconômica e garantir o crescimento econômico; planejar políticas de longo prazo factíveis, implementar e fazer cumpri-las ao longo do tempo; além de garantir que essas iniciativas sejam massificadas. Para estes autores, as capacidades dos Estados, quando bem desenvolvidas, devem ter como reflexo a criação de políticas públicas eficazes e de qualidade. Estas políticas, para que sejam classificadas como eficazes e de qualidade, devem contemplar um conjunto de 6 características: (i) a primeira delas é a estabilidade ao longo do tempo; (ii) a segunda é a adaptabilidade, necessária para permitir ajustes decorrentes do próprio aprendizado, seja em função de falhas observadas a partir da experiência, seja decorrente de

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mudanças no contexto ou até mesmo em função da ampliação da escala de implementação (scale up); (iii) coerência e coordenação são características indispensáveis e se relacionam com o grau em que as políticas são consistentes com outras políticas relacionadas e resultam de ações bem coordenadas entre os atores que participam na sua concepção e implementação; (iv)

qualidade de implementação e execução são outras dimensões destacadas; (v) consideração pública, no sentido do grau em que as políticas perseguem o interesse público, ou as demandas

do público alvo; (vi) eficiência, na medida em que as políticas refletem uma alocação de recursos escassos que devem assegurar altos retornos. As capacidades adequadas e bem desenvolvidas deveriam levar os Estados a produzirem, nesse sentido, políticas públicas com as características apontadas acima.

É importante ressaltar, assim como apresentado por Gomide (2016), que as capacidades não são um conjunto de atributos fixos e atemporais, mas variam no tempo, no espaço e por área de atuação. Ou seja, um Estado pode ter contado com muita capacidade administrativa no passado e ter perdido esta capacidade devido a mudanças no sistema político, evolução das relações Estado – Sociedade, fragilização da própria burocracia, dentre outros. Scartascini e Tommasi (2014) ressaltam que as capacidades estatais são o resultado de investimentos em diversas dimensões ao longo do tempo e são resultado de processos sociais, por isso, para compreendê-las, é importante analisar em uma perspectiva intertemporal, reforçando a ideia de que não são atributos dados, mas que se desenvolvem ao longo da história. A identificação de diferentes tipos de capacidade estatal contribui para a produção de rendimentos analíticos, já que dirige o olhar do analista para determinados atores, agências e fenômenos. Em um nível mais geral, tendo em mente o modelo do estado democrático ocidental, é possível destacar as capacidades dos congressos nacionais, que devem ser democráticos6 e compostos por legisladores profissionais dotados das capacidades técnicas para discutir e supervisionar as políticas. É importante também a autonomia do Poder Judiciário, que pode oferecer um "mecanismo de durabilidade" que pode aumentar a probabilidade de alcançar acordos intertemporais e contribui para melhores resultados das políticas públicas, com estabilidade e qualidade de implementação e operacionalização. Finalmente, destaca-se a

6 Embora a construção e desenvolvimento das capacidades em um regime democrático seja uma noção amplamente aceita e desejada, há algumas evidências que não podem deixar de ser mencionadas. O Chile, país referência em estabilidade econômica e qualidade de suas burocracias, teve como base política na construção dessas capacidades a ditadura. A China, longe de ser considerado um país democrático à luz do modelo ocidental, tornou-se uma das economias mais dinâmicas do mundo. Além disso, muitos países do Oriente Médio registram altas taxas de crescimento, mesmo a partir de regimes monárquicos. Assim, independentemente do valor inequívoco da democracia, não se pode dizer que sua associação direta com o desenvolvimento de capacidades seja a única forma de alcança-lo.

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capacidade do funcionalismo público, no sentido de que uma burocracia forte, independente e profissional seja indispensável para a aplicação flexível e eficaz de políticas públicas, bem como a sua coordenação entre ministérios (ANASTASIA, OLIVEIRA, 2015; SCARTASCINI; TOMMASI, 2014). A eficácia das intervenções políticas é condicional, então, à existência ou ao nível e adequação dessas capacidades. Neste nível mais geral, Echebarría et al (2006, p. 132), destacam uma lista de capacidades importantes, que se relacionam com os elementos que devem estar presentem em políticas públicas de qualidade. Estes elementos chave estão organizadas no quadro abaixo:

Quadro 2: Capacidades estatais importantes para o desenvolvimento das funções essenciais do Estado

1. Definir e manter prioridades entre as muitas demandas (que em geral são conflitantes);

2. Alocar os recursos onde estes têm potencial de ser mais efetivos; 3. Inovar quando políticas existentes falham;

4. Coordenar objetivos conflitantes em um todo coerente;

5. Ser capaz de impor perdas a grupos poderosos nas negociações;

6. Representar interesses difusos e não organizados para além dos que estão concentrados e bem organizados;

7. Assegurar a implementação efetiva das políticas governamentais;

8. Garantir a estabilidade das políticas para que estas tenham tempo para operar em função de seus objetivos;

9. Realizar e manter compromissos internacionais nos domínios do comércio e defesa nacional, de modo a garantir o bem-estar do Estado a longo prazo;

10. Manejar clivagens políticas para garantir que a sociedade não se degenere em uma guerra civil;

11. Garantir a adaptabilidade da política quando as mudanças nas circunstâncias a exigirem;

12. Garantir a coerência entre os domínios políticos, de modo que novas políticas possam se encaixar nos espaços existentes;

13. Garantir uma coordenação política eficaz entre os diferentes atores que operam no mesmo domínio de políticas.

Referências

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