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Sobre noções de consequência generalizadas e lógicas plurivalentes

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Academic year: 2021

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INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

CAROLINA BLASIO DA SILVA

Sobre Noções de Consequência Generalizadas

e Lógicas Plurivalentes

CAMPINAS 2017

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Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas

Biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas Paulo Roberto de Oliveira - CRB 8/6272

B612s BlaSobre noções de consequência generalizadas e lógicas plurivalentes / Carolina Blasio da Silva. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.

BlaOrientador: Marco Antonio Caron Ruffino.

BlaTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.

Bla1. Relação de consequência. 2. Lógicas multivaloradas. 3. Redução de Suszko. 4. Lógicas plurivalentes. 5. Lógicas inferencialmente multivaloradas. I. Ruffino, Marco,1963-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: On generalized notions of consequence and plurivalent logics Palavras-chave em inglês:

Consequence Relation Many-valued Logics Suszko Reduction Plurivalent Logics

Inferentially Many-valued Logics

Área de concentração: Filosofia Titulação: Doutora em Filosofia Banca examinadora:

Marco Antonio Caron Ruffino [Orientador] Marcelo Finger

Abílio Azambuja Rodrigues Filho Giorgio Venturi

Guilherme Araújo Cardoso

Data de defesa: 25-08-2017

Programa de Pós-Graduação: Filosofia

Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)

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A comissão Julgadora dos trabalhos de Defesa de Tese de Doutorado, composta pelos Professores Doutores a seguir descritos, em sessão pública realizada em 25/08/2017, considerou a candidata Carolina Blasio da Silva aprovada.

Prof. Dr. Marco Antonio Caron Ruffino

Prof. Dr. Abílio Azambuja Rodrigues Filho

Prof. Dr. Giorgio Venturi

Prof. Dr. Marcelo Finger

Prof. Dr. Guilherme Araújo Cardoso

A Ata de Defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica da aluna.

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Este trabalho não seria realizado sem o apoio constante de minha família. Agradeço muito a João que esteve sempre ao meu lado mesmo nos momentos mais difíceis e foi a inspiração para este trabalho e agradeço a Maia pela alegria que ela trouxe. Agradeço ao incentivo e à confiança de meus pais e meu irmão. E agradeço também aos meus amigos por estarem sempre dispostos a partilhar das coisas boas e ruins que a vida nos traz transcendendo as distâncias.

Em Campinas eu tive a sorte de contar com amigos e os anjos-da-guarda, Maria Érbia, Ana Cholodovskis e André Bressane, que tornaram o trabalho acadêmico e a vida à distância menos árida. Agradeço também ao acolhimento e brigadeiros das companheiras queridas da D4A, aos bate-papos acadêmicos regados a café, cerveja e companhia de meus colegas do CLE, da Base de Lógica 709 (UFRN) e do Institut für Philosophie II (Ruhr-Universität Bochum). Meu agradecimento em particular a Sanderson Molick e Evelyn Erickson: nós aprendemos juntos que cada sucesso nas pesquisas vem depois de muitas e muitas tentativas fracassadas, esforço, papel, paciência e tempo.

Agradeço também aos professores e grupos de pesquisa que me acolheram durante estes anos de doutorado e que foram cruciais para o desenvolvimento não apenas de minha tese, mas de minha vida acadêmica e intelectual. Agradeço em particular aos professores Carlos Caleiro, Arnon Avron, Anna Zamansky e Heinrich Wansing pelo conhecimento, exemplo e inspiração de seus trabalhos. Obrigada a todos os parceiros nacionais e inter-nacionais do projeto GeTFun (Marie Curie project PIRSES-GA-2012-318986 funded by EU-FP7) que encontrei e ainda espero reencontrar por este mundo velho sem porteira.

Agradecimentos especiais ao prof. Marco Ruffino, meu orientador, que acolheu meu trabalho, e foi um orientador dedicado e leitor cuidadoso, o que foi fundamental para a clareza e realização desta tese.

Este trabalho foi parcialmente fomentado por uma bolsa de doutorado do CNPq, processo de número 149706/2011-1.

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As denominadas “lógicas multivaloradas” surgem do descontentamento de que o raciocínio lógico deva se limitar apenas a enunciados verdadeiros e falsos, ou seja, não-verdadeiros. O resultado conhecido como Redução de Suszko de-monstra, contudo, que todas as lógicas podem ser caracterizadas por semânti-cas com apenas dois valores-de-verdade. Sendo assim, as lógisemânti-cas podem ser di-tas bivalentes, mesmo que suas semânticas sejam multivaloradas. Como alter-nativa à imposição da bivalência dada por este resultado, Malinowski (1990a) introduziu uma noção de consequência generalizada, associada a formalismos trivalentes: a quase-consequência. A quase-consequência possibilitou um novo olhar sobre a plurivalência das lógicas, abrindo caminho para a definição de no-vas noções de consequência tais como a quase-consequência dual (Malinowski, 2000) definida para lógicas inferencialmente paraconsistentes e a consequência plausível (Frankowski, 2004a). Não obstante, estas noções de consequência associadas a lógicas plurivalentes não possuem ao menos uma dentre as pro-priedades mais básicas da noção de consequência padrão: a reflexividade e a transitividade. Na presente tese, apresentamos as noções de quase-consequên-cia e de consequênquase-consequên-cia plausível em uma versão com conclusão múltipla e suas respectivas noções duais junto aos resultados de adequação destas a semânticas trivalentes. Propomos também a lógica tetravalente EB inspirada na lógica de

Dunn-Belnap First Degree Entailment junto a um cálculo de sequentes ade-quado. A lógica EB está associada a uma relação de consequência semântica

que expressa diversos tipos de raciocínio — o B-entailment. Apresentamos, em seguida, a contraparte abstrata do B-entailment, a B-consequence, e seus respectivos resultados de adequação a semânticas tetravalentes. A B-conse-quence generaliza e permite comparar diversas relações de consequência, in-cluindo a relação de consequência padrão, a quase-consequência e sua dual, a consequência plausível e sua dual, e também as relações de consequência apenas monotônicas. A B-consequence mostra-se, assim, ser um arcabouço conceitual promissor para pesquisas sobre lógicas plurivalentes e semânticas multivaloradas, incluindo semânticas não-determinísticas e parciais. Esta no-ção é também uma ferramenta robusta para a comparano-ção de diferentes lógicas e para a definição de sistemas lógicos. Os estudos sobre a B-consequence ainda contribuem tanto para a compreensão do conceito de relação de consequência lógica quanto para os debates sobre o pluralismo lógico.

Palavras-chave: Lógicas não-clássicas. Lógicas abstratas. Relação de

con-sequência. Lógicas multivaloradas. Redução de Suszko. Lógicas plurivalentes. Lógicas inferencialmente multivaloradas.

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The so-called “many-valued logics” arise from the dissatisfaction about the logical reasoning being limited to only true and false, that is, non-true, sta-tements. However, the result known as Suszko’s Reduction proves that all logics can be characterized by semantics with only two truth-values. Thus, a logic may be said to be bivalent even if it has a multivalued semantics. As an alternative to the imposed bivalence of the logics given by this result, Mali-nowski (1990a) introduced a generalized notion of consequence associated to trivalent formalisms: the quasi consequence. The quasi consequence allowed for a novel look at the plurivalence of logics, paving the way for new notions of consequence such as the dual quasi consequence (Malinowski, 2000) defined for inferentially paraconsistent logics and the plausible consequence relation (Frankowski, 2004a). Nevertheless, those notions of consequence associated to plurivalent logics do not enjoy at least one of most basic properties of the standard notions of consequence: reflexivity and transitivity. In this thesis, we present the notions of quasi consequence, plausible consequence and their res-pective dual notions together with the results of adequacy of these notions to trivalent semantics. We also propose the tetravalent logic EB which is inspired

on Dunn-Belnap’s logic “First Degree Entailment”. We also present a sequent calculus for EB. The logic EB is associated with an entailment relation that

can express different kinds of reasoning — the B-entailment. In the following, we present the abstract counterpart of the B-entailment, the B-consequence and their respective adequacy results to tetravalent semantics. After that, we show that the B-consequence generalizes and allows to compare several conse-quence relations, such as the standard conseconse-quence, the quasi conseconse-quence and its dual, the plausible consequence and its dual, and also purely monotonic consequences. The B-consequence thus provides a way of comparing different notions of consequence and seems to be a promising framework for research on plurivalent logics and many-valued semantics, including non-deterministic and partial semantics. The B-consequence is also a robust tool for comparing different logics and for defining logical systems. Moreover, the investigations on B-consequence also contribute both to the understanding the concept of logical consequence relation and to the debates on logical pluralism.

Key-words: Non-classical Logics. Abstract Logics. Consequence Relation.

Many-valued Logics. Suszko Reduction. Plurivalent Logics. Inferentially Many-valued Logics.

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2.1 q-matriz . . . 65

2.2 d-matriz . . . 86

3.1 FOUR . . . 97

3.2 FOUR. . . 103

3.3 B-matriz BE. . . 105

4.1 Classes abstratas de noções de consequência unidimensionais. . . 150

4.2 Ordem de inclusão das noções de consequências unidimensionais geradas por um B-entailment. . . 151

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1.1 Comparação entre as formas das consecuções de lógicas-T e lógicas-S. . . . 47

1.2 Implicação de Ł3 reduzida a dois valores-de-verdade. . . 57

2.1 Conectivos de Ł3. . . 71 2.2 Coimplicação. . . 71 2.3 Tabela da contração em Ł3 . . . 74 2.4 Conectivos primitivos de K3. . . 74 2.5 Implicação de K3. . . 75 2.6 Conectivos de J3 . . . 92

3.1 Valores-de-verdade em termos de situações epistêmicas. . . 97

3.2 Valores-de-verdade em termos de atitudes cognitivas. . . 101

3.3 Atitudes cognitivas em termos de valores-de-verdade . . . 102

3.4 Aspectos do B-entailment. . . 110

4.1 Noções de consequências unidimensionais expressas pelo B-entailment . . . 148

4.2 Conectivos unários tetravalorados. . . 152

4.3 Aspectos do B-entailment que apresentam contra-modelos. . . 153

5.1 Conectivos de EB . . . 157

5.2 Conectivos de KB 3 . . . 158

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p, p1, p2, pn, ... Átomos proposicionais

α, β, δ, ... Fórmulas proposicionais

∆, Γ, Φ, ... Conjunto de fórmulas proposicionais

L Lógica

At Conjunto de átomos proposicionais

Ω Assinatura proposicional

S Linguagem proposicional

S Conjunto de enunciados de uma linguagem proposicional

Relação de consequência padrão (com conclusão simples)

 Relação de consequência semântica padrão

m Relação de consequência com conclusão múltipla

m Relação de consequência semântica com conclusão múltipla

q q-consequence q q-entailment p p-consequence p p-entailment d q-consequence dual b p-consequence dual Ψ Γ ∆ Φ B-consequence Ψ Γ ∆ Φ B-entailment Ψ Γ ∆ Φ B-sequente Γ:Φ ` Ψ:∆ Biconsequence Q q-entailment generalizado P p-entailment generalizado T T-entailment F F-entailment T \a T \a-entailment F \a F \a-entailment T \u T \u-entailment F \u F \u-entailment σ Substituição uniforme

M Matriz de valoração semântica padrão

Q q-Matriz P p-Matriz D d-Matriz B B-Matriz MN Matriz não-determinística V Conjunto de valores-de-verdade

D Conjunto de valores-de-verdade designados

f© Função de verdade do conectivo ©

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SEM Semântica v Valoração T Valor-de-verdade “Verdadeiro” F Valor-de-verdade “Falso” I Valor-de-verdade “Indeterminado” f Valor-de-verdade estruturado {F } ⊥ Valor-de-verdade estruturado {} > Valor-de-verdade estruturado {F, T } t Valor-de-verdade estruturado {T } ⊥ > Valor-de-verdade “botop”

SOC Conjunto de agentes

s Agente

Y Atitude cognitiva “Aceitação”

Y

Atitude cognitiva “Não aceitação”

N Atitude cognitiva “Rejeição”

N Atitude cognitiva “Não rejeição”

∅ Conjunto vazio

N Conjunto dos números naturais

∪ União

∩ Interseção

℘(X) Conjunto das partes de X

F in(X) Conjunto das partes finitas de X

∈ Pertinência

⊆ Inclusão

⊂ Inclusão própria

⊇ Continência

t Relação de ordem parcial “lógica”

i Relação de ordem parcial “informacional”

u Ínfimo

t Supremo

t Inversão da ordem ≤t

i Inversão da ordem ≤i

© Símbolo para um conectivo arbitrário

∼ Negação clássica ¬ Negação ∨ Disjunção ∧ Conjunção ⊃ Implicação uniforme (K3) Implicação não-uniforme (Ł3) Coimplicação ∇ Conectivo modal de J3

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Introdução 15

1 A Bivalência da Consequência Lógica 25

1.1 Alfred Tarski e a relação de consequência lógica . . . 26 1.2 A noção de consequência com conclusão múltipla . . . 39 1.3 Semânticas multivaloradas, porém bivalentes . . . 53

2 Consequências Trivalentes 59

2.1 quarto non datur . . . 62 2.2 Trivalência plausível . . . 76 2.3 Trivalência e paraconsistência . . . 85

3 Revisitando a Lógica de Dunn-Belnap 94

3.1 A lógica de Dunn-Belnap . . . 95 3.2 Como um computador poderia pensar . . . 100 3.3 A lógica tetravalente EB . . . 109

4 Lógicas Plurivalentes 123

4.1 B-consequence . . . 124 4.2 Noções de consequência apenas monotônicas . . . 134 4.3 Consequência generalizada . . . 145

5 Considerações Finais 154

5.1 Pluralismo lógico . . . 155 5.2 Verofuncionalidade generalizada . . . 163 5.3 Resumo da ópera e futuros contingentes . . . 171

(15)

A estranheza dessa verdade deu para estarrecer de todo a gente. Aquilo que não havia, acontecia. A Terceira Margem do Rio,

Guimarães Rosa, 1962.

A noção de relação de consequência, fundamental à Lógica, é um tema discutido desde a Antiguidade, sobretudo com as obras Analíticos Anteriores e Analíticos Posteriores de Aristóteles. Segundo a tradição, uma relação de consequência lógica trata de como enunciados (sentenças, proposições) seguem de outros e como se avalia este “seguir de”.

Na idade moderna, quando a lógica matemática foi desenvolvida, a atenção dos lógicos se voltou para os aspectos que definem o “seguir de” de uma relação de consequên-cia lógica, deixando de lado as outras questões para áreas emergentes da filosofia, como a filosofia da linguagem. Chamamos de “consecução” a relação de consequência entre enun-ciados em que um enunciado, denominado conclusão, segue de um conjunto de enunenun-ciados (que pode ser vazio), denominados premissas. Um exemplo de consecução é:

(1)

Se chove, então o sertão se enche de flor. Chove.

O sertão se enche de flor. ∴

A maneira de definir a validade de uma consecução depende da compreensão que se tem da própria Lógica. Uma delas é dada em termos da validade semântica; nela é dito que uma consecução é válida porque a conclusão segue das premissas pela preservação

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da verdade, isto é, uma consecução é válida se, considerando que as premissas sejam verdadeiras, o enunciado da conclusão também é verdadeiro.

Um dos critérios de validade de uma consecução é a necessidade. A verdade da conclusão segue por necessidade da verdade da premissa. O critério de necessidade limita o objeto da Lógica aos argumentos ditos dedutivos. Em uma consecução dedutiva, a conclusão segue necessariamente das premissas, pois, sendo os enunciados da premissa verdadeiros, a conclusão também será verdadeira. Um exemplo de dedução seria:

(2)

Toda abelha é um artrópode. Todo artrópode é um animal. Toda abelha é um animal. ∴

Se consideramos os termos “abelha”, “artrópode” e “animal” da consecução acima como conjuntos e os dois enunciados da premissa como verdadeiros, temos que o conjunto “abelha” está contido em “animal”, e, por conseguinte, a conclusão é necessariamente verdadeira.

Outra característica esperada da definição de relação de consequência é a

for-malidade. Em consecuções dedutivas uma relação de consequência pode ser unicamente

determinada pela forma dos enunciados envolvidos, sem recorrer a algum tipo de conhe-cimento empírico. Podemos expressar estas consecuções de forma esquemática, expondo a estrutura das consequências válidas. Por exemplo: “Se p então q, e p; logo, q” é sempre uma consequência válida para qualquer instância de p ou de q.

A consecução “Sofia é alérgica a camarão; logo, Sofia não pode comer casquinha de siri.” não pode ser válida se sua formalização não levar em conta informações não declaradas, como “alergia a camarão provém do caso mais amplo de alergia a uma proteína presente em crustáceos”, “o siri e o camarão são crustáceos”, e também “é perigoso ingerir um alimento ao qual se tenha alergia”.

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ser, de alguma maneira, formalizadas. Nestas consecuções, a verdade da conclusão é no máximo muito provável e não segue necessariamente da verdade das premissas. Dois exemplos de consecuções não dedutivas são identificadas por Charles Peirce (1974): a indução e a abdução.

Uma consecução do tipo indutivo tem uma conclusão que se baseia no conteúdo dado pelas premissas. Por exemplo:

(3)

Toda criança que eu conheço gosta de brincar na areia. Maia é uma criança.

Maia gosta de brincar na areia. ∴

Diferentemente da dedução, em uma indução a conclusão pode não ser verdadeira mesmo que as premissas sejam verdadeiras.

Uma consecução do tipo abdutivo tem uma conclusão que explica ou cria uma conjectura a respeito do conteúdo fornecido pelas premissas, por exemplo:

(4)

Observa-se que há mais míopes em relação ao passado.

Isto parece ocorrer porque vive-se mais em ambientes fechados. Viver em ambientes fechados seria uma das causas da miopia. ∴

O raciocínio indutivo e abdutivo são objetos de estudo frequente em áreas como filosofia da ciência e pragmatismo e é reconhecido que a formalização de tais tipos de raciocínio pode trazer benefícios para o desenvolvimento científico. Não há consenso, en-tretanto, sobre como formalizar estes raciocínios. Há mesmo quem defenda a inviabilidade de formalizar tais argumentos que não contemplam o critério de necessidade, incluindo-os por conseguinte na chamada “Lógica Informal” (Groarke, 2016). Contudo, assumindo que tais formalismos existam, a pergunta a ser feita é por que não considerá-los como lógicas legítimas mesmo não respeitando o critério de necessidade?

Uma terceira característica esperada de uma consecução é a normatividade. A normatividade, em geral, impede que os enunciados da premissa de uma consecução

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sejam verdadeiros e o enunciado da conclusão seja falso. Se as normas dadas não forem obedecidas ocorre um erro que impede a consecução. Por exemplo: sabendo que a seguinte consecução é válida, “Se chover, Ana vai para casa, mas se fizer sol, Ana vai passear. Chove. Logo, Ana vai para casa.”, podemos afirmar que Ana vai para casa após verificar que está chovendo.

A primeira definição formal da noção de relação de consequência da Lógica Clás-sica de Primeira Ordem é atribuída a Rudolf Carnap pelo lógico polonês Alfred Tarski (1936): Uma sentença ϕ segue logicamente do conjunto de sentenças Γ = {γ1, ..., γn},

n ∈ N, se e somente se a união de Γ com {¬ϕ} é contraditória. A definição de Carnap, contudo, não é suficiente para expressar uma sentença universal como consequência de infinitas instâncias individuais e este seria um caso intuitivo e inequívoco de consequência lógica que não é contemplado pela definição de Carnap.

Tarski redefiniu a noção de relação de consequência em seu artigo ‘Sobre o ceito de consequência lógica’ (1936) “de modo a se obter um conceito apropriado de con-sequência” (p. 413). Uma de suas motivações era oferecer uma definição geral que pudesse ser aplicada a todas as linguagens formais utilizadas pelos lógicos matemáticos (Gómez-Torrente, 1996). Com a noção de relação de consequência tarskiana tornou-se possível demonstrar, por exemplo, que uma sentença universal da forma ∀xϕ é consequência da coleção de todas as instâncias de ϕ, mesmo que tal coleção seja infinita.

A noção de relação de consequência desenvolvida por Tarski é atualmente adotada com poucas modificações por grande parte dos sistemas lógicos formais e respeita as seguintes propriedades:

Reflexividade: Um enunciado segue de si mesmo.

Monotonicidade: Se um enunciado ϕ segue de um conjunto de enunciados Γ, então este

mesmo enunciado ϕ segue de uma extensão Γ0 do conjunto de enunciados Γ.

Transitividade: Se um enunciado ϕ segue de um conjunto de enunciados ∆ e todo

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De acordo com a definição semântica de consequência tarskiana, um enunciado ϕ é consequência semântica de um conjunto de enunciados Γ, se, e somente se, qualquer interpretação em que todos enunciados de Γ são verdadeiros também interpreta ϕ como verdadeiro. Essa noção que preserva a verdade das premissas na conclusão satisfaz os critérios de necessidade, formalidade e normatividade. Mesmo nas lógicas multivaloradas, cuja semânticas possuem mais do que dois valores-de-verdade, essa característica é ob-servada na forma da preservação de um subconjunto dos valores-de-verdade, o chamado conjunto de valores designados ou distinguidos.

Um exemplo de lógica multivalorada é a Lógica do Paradoxo (LP ). A semântica de LP possui três valores-de-verdade: verdadeiro, falso e verdadeiro-e-falso; e destes, dois são designados: o verdadeiro e o verdadeiro-e-falso. A validade da consequência lógica de LP é definida como: se todas as premissas possuem como valor-de-verdade o verdadeiro ou o verdadeiro-e-falso, então a conclusão é ou verdadeira ou verdadeira-e-falsa. A validade da consequência lógica é definida, portanto, como a preservação do subconjunto de valores-de-verdade que contém os valores designados.

A concepção de multivaloração na lógica moderna foi introduzida pelo lógico polonês Jan Łukasiewicz no início do século XX, o qual acrescentou valores-de-verdade intermediários aos valores tradicionais verdadeiro e falso. De acordo com Łukasiewicz, os valores intermediários poderiam solucionar o problema dos futuros contingentes descrito no De Interpretatione IX de Aristóteles. A noção de multivaloração, no entanto, receberia duras críticas de outro lógico polonês, Roman Suszko.

A crítica à multivaloração, conhecida como Tese de Suszko, afirma que existem “apenas dois valores-de-verdade: o verdadeiro e o falso” (Suszko, 1977). Para Suszko, as ideias de Łukasiewicz sobre multivaloração se baseavam em uma confusão entre

valores-de-verdade referenciais —aquilo que as sentenças denotam— e valores-de-verdade inferenciais— os valores que determinam a validade da consecução lógica que, no caso,

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se-riam apenas valores referenciais e não valores inferenciais, que são os valores propse-riamente lógicos (Suszko, 1975b; Malinowski, 1993).

De acordo com Suszko, a concepção da semântica com dois valores-de-verdades só pode ser alterada no nível ontológico, com o acréscimo de novos valores referenciais. No nível lógico, no entanto, a bivalência da lógica é preservada dada a própria estrutura da relação de consequência, cuja definição semântica depende da partição dos valores-de-verdade entre designados e seu complemento. Os valores-valores-de-verdade se refeririam, portanto, a duas coisas diferentes: os elementos do conjunto de valores-de-verdade da se-mântica —os valores-de-verdade referenciais— e os valores-de-verdade que são suficientes para definir a validade da relação de consequência —os valores-de-verdade inferenciais.

Como a relação de consequência semântica das lógicas multivaloradas é definida com base na bipartição do conjunto de valores-de-verdade, um dos resultados que se segue é que uma lógica pode ser caracterizada por uma semântica com apenas dois valores-de-verdade: um valor-de-verdade que representa o conjunto de valores designados e outro que representa o complemento deste conjunto de valores designados. Este resultado, co-nhecido como Redução de Suszko, colocou em xeque a existência de lógicas legitimamente multivaloradas.

Faremos aqui uma distinção conceitual entre as noções de “valor” e de “valên-cia”. A primeira noção está relacionada aos valores-de-verdade referenciais e a última aos valores-de-verdade inferenciais. Dizemos que uma semântica é multivalorada quando ela possui mais de dois valores-de-verdade referenciais. Chamamos, por sua vez, “bivalente” uma lógica cuja semântica possui dois valores-de-verdade inferenciais, ou seja, uma lógica que pode ser caracterizada por uma semântica com apenas dois valores-de-verdade. Uma lógica multivalorada caracterizada por uma semântica multivalorada pode ser bivalente. Uma lógica plurivalente seria uma lógica que pode ser caracterizada apenas por semânticas que possuem mais de dois valores-de-verdade inferenciais. Uma lógica plurivalente seria uma lógica “multivalorada de uma forma mais profunda” (Béziau, 1997), e é justamente

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a existência de lógicas plurivalentes que Suszko questiona.

Apesar das duras críticas, definições alternativas de consequência, cujos forma-lismos associados não podem ser caracterizados, em geral, por semânticas com apenas dois valores-de-verdade, apareceram na literatura da lógica a partir dos anos 90 (cf. Mali-nowski, 1990b; Langholm, 1996; Bochman, 1998). Não é claro, contudo, o estatuto destes formalismos enquanto lógicas legítimas, pois estas noções de consequência não possuem algumas propriedades fundamentais da relação de consequência padrão, como a reflexivi-dade e a transitivireflexivi-dade. Outra diferença crucial é que a noção de valireflexivi-dade das consecuções geradas por estas noções de consequência não são definidas pela preservação da verdade ou de um certo conjunto de valores designados das premissas para a conclusão.

A primeira contestação à tese de Suszko surge com a noção de quasi entailment, ou q-entailment, de Grzegorz Malinowski (1990a), cuja definição foi motivada pela ontologia de Łukasiewicz. Malinowski foi além da partição dos valores-de-verdade entre designados e não-designados, apresentando uma semântica plurivalente associada a uma noção não padrão de relação de consequência. Ao criar o q-entailment, Malinowski triparticiona o conjunto dos verdade tomando dois subconjuntos disjuntos dos valores-de-verdade: os valores designados, ou aceitos, e os valores anti-designados, ou rejeitados. Como a união dos valores aceitos com os valores rejeitados não precisa ser igual ao conjunto dos valores-de-verdade, é criada uma margem para valores-de-verdade que nem são aceitos e nem são rejeitados.

A definição de validade de um q-entailment é dada por: uma consecução é válida se a partir de enunciados não rejeitados conclui-se um enunciado aceito; alternativamente, podemos dizer que é incompatível que todos enunciados da premissa de uma consecução sejam não rejeitados e a conclusão seja não aceita. Esta noção não é reflexiva, pois um enunciado de valor nem aceito e nem rejeitado não pode ser consequência dele mesmo já que neste caso a premissa é não rejeitada e a conclusão é não aceita.

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re-lação de consequência semântica, o chamado plausible-entailment, ou p-entailment. O p-entailment foi criado para raciocínios que lidam com conjecturas e está associado a uma matriz semelhante à do q-entailment. A definição de validade do p-entailment é dada por: uma consecução é válida se dadas premissas aceitas, a conclusão é não rejei-tada; alternativamente, é incompatível que todas premissas sejam aceitas e a conclusão rejeitada.

O p-entailment é reflexivo, mas não transitivo. Para verificar que a transitivi-dade falha, suponha que as premissas de uma dada consecução sejam aceitas e que destas só se concluam enunciados cujo valor é não-rejeitado. Suponha também que parte des-tes enunciados sejam premissas de um segundo argumento, e que desdes-tes se infere uma consequência rejeitada. Como não pode ser o caso que as premissas sejam aceitas e a consequência rejeitada, a transitividade não pode ser uma propriedade desta noção de consequência.

Novas noções de consequência para lógicas plurivalentes foram definidas seguindo a ideia de criar novos tipos de matrizes generalizadas, que introduzem partições ao con-junto de valores-de-verdade. Isto possibilitou um novo olhar sobre as lógicas multivalora-das e plurivalentes. Ao longo do presente trabalho, apresentamos de forma comparativa algumas destas noções de consequência existentes na literatura e contribuímos com novas definições e resultados para o estudo das lógicas plurivalentes. As questões que norteiam nossa composição são: Quais são as características das noções de consequência associadas às semânticas plurivalentes? O que estas noções têm em comum com a noção de con-sequência padrão? O que faria com que os formalismos associados a estas noções sejam ou não considerados lógicas?

Organizamos a presente tese em cinco capítulos. No primeiro capítulo, “A Biva-lência da Consequência Lógica”, apresentamos os fundamentos da definição de relação de consequência mais usual da lógica contemporânea: a relação de consequência com con-clusão simples. Junto a esta, mostramos os resultados de correção e completude de sua

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contraparte semântica. Apresentamos também a definição formal e as propriedades da relação com conclusão múltipla, mostrando como esta definição é mais expressiva que a relação de consequência com conclusão simples ao mesmo tempo que mantém suas prin-cipais propriedades. Mostramos também como as lógicas associadas a uma relação de consequência padrão — isto é, uma relação de consequência com conclusão simples ou com conclusão múltipla — podem ser caracterizadas por semânticas com apenas dois valores-de-verdade, resultado conhecido como Redução de Suszko. Este resultado coloca em cheque a existência das lógicas plurivalentes uma vez que demonstra que as lógicas padrão podem ser caracterizadas por semânticas com apenas dois valores-de-verdade: o verdadeiro e o falso.

No segundo capítulo, “Consequências Trivalentes”, estudamos a relação de quase-consequência, que não é reflexiva, e a relação de consequência plausível, que não é transi-tiva. Estas noções estão associadas a lógicas trivalentes cujas semânticas podem possuir valores-de-verdade para enunciados indeterminados. Estudamos também a relação de quase-consequência dual e a relação de consequência plausível dual, noções também as-sociadas a lógicas trivalentes, mas que são caracterizadas por semânticas que possuem valores-de-verdade para enunciados inconsistentes. Apresentamos exemplos ilustrativos de lógicas paracompletas e paraconsistentes associadas a estas noções de consequência comparando-as com suas respectivas definições usuais associadas a noções de consequên-cia padrão.

O terceiro capítulo, “Revisitando a Lógica de Dunn-Belnap”, apresenta uma nova proposta de lógica tetravalente, a EB, baseada nas ideias de Dunn e Belnap que

origi-naram o First Degree Entailment (E). A lógica EB é caracterisada por uma semântica

baseada nas atitudes cognitivas de aceitação e rejeição por uma sociedade de agentes. Di-ferentemente das situações epistêmicas usadas na semântica de E, as atitudes cognitivas não coincidem com valores-de-verdade e parecem mais efetivas para considerar o conteúdo informacional de enunciados “ditos verdadeiros” tanto quanto os enunciados “ditos falsos” como determinantes da noção de validade, como pretende esta lógica. Após analisar

(24)

al-guns formalismos associados à semântica de E, introduzimos a lógica tetravalente EBcuja

relação de consequência semântica subjacente —o B-entailment— é capaz de expressar diversos tipos de raciocínio em relação à aceitação e à rejeição. Apresentamos também um cálculo de sequentes correto e completo para EB.

No quarto capítulo, “Lógicas plurivalentes”, apresentamos a definição canônica abstrata da B-consequence e demonstramos os resultados de correção e completude desta noção com o B-entailment. Apresentamos também o resultado de redução que demons-tra a tedemons-travalência das lógicas associadas ao B-entailment. Em seguida, apresentamos a B-consequence como um arcabouço conceitual geral e uniforme para expressar e compre-ender as diferentes noções de consequência apresentadas ao longo desta tese, incluindo as próprias noções de consequência padrão e noções de consequência puramente monotôni-cas.

No último capítulo, “Considerações finais”, fazemos alguns apontamentos para futuras pesquisas que o estudo sobre a B-consequence pode contribuir aos debates sobre o pluralismo lógico, no estabelecimento de relações de oposição, comparações e definições de conectivos, lógicas e sistemas lógicos, e nos estudos sobre verofuncionalidade. Finalizamos com uma síntese e discussão dos resultados obtidos ao longo da tese.

(25)

A Bivalência da Consequência Lógica

Obviously any multiplication of logical values is a mad idea. The Fregean axiom and Polish mathematical logic in the 1920?s,

Roman Suszko, 1977.

Ao longo deste primeiro capítulo, dividido em três seções, mostramos caracterís-ticas das noções de consequência lógica com conclusão simples e com conclusão múltipla junto ao resultado de que as lógicas associadas a qualquer uma destas noções são funda-mentalmente bivalentes.

Na primeira seção, “Alfred Tarski e a relação de consequência lógica”, apresen-tamos os fundamentos da definição mais usual de relação de consequência das lógicas contemporâneas, a noção de consequência com conclusão simples, desenvolvida por Al-fred Tarski.

A seguir, na seção “A noção de consequência com conclusão múltipla”, apresenta-mos a definição formal e propriedades da noção de consequência com conclusão múltipla, mostrando como esta definição estende a noção de consequência com conclusão simples preservando suas características e sendo mais expressiva.

Na terceira seção, “Lógicas multivaloradas, mas bivalentes”, mostramos como as 25

(26)

lógicas associadas a uma noção de consequência com conclusão simples ou com conclusão múltipla estão sujeitas à Redução de Suszko, resultado que fundamenta a tese de que as lógicas são bivalentes, já que podem ser caracterizadas por semânticas com apenas dois valores-de-verdade.

1.1

Alfred Tarski e a relação de consequência lógica

Uma das grandes contribuições à lógica moderna e, provavelmente, uma das mais importantes ao desenvolvimento da Teoria de Modelos foi dada pelo lógico, filósofo e ma-temático Alfred Tarski, que se destacou por seus trabalhos sobre a caracterização mate-mática do conceito-de-verdade, sobre a definição da consequência lógica entre enunciados de linguagens formais, e sobre as constantes lógicas.

Tarski é um dos grandes representantes da escola de Lvóv-Varsóvia, inaugurada no final do século 19 por um dos discípulos do filósofo psicologista Franz Brentano, Ka-zimierz Twardowski, e posteriormente desenvolvida por KaKa-zimierz Ajdukiewicz, Tadeusz Kotarbinski, Stanisław Leśniewski, Jan Łukasiewicz e vários discípulos filósofos e mate-máticos destes intelectuais, incluindo Tarski, que residiu na Polônia até o final da década de 1930 (Mancosu et al., 2009, p.435).

A Escola de Lviv-Varsóvia foi heterogênea em relação seu conteúdo filosófico, mas seus intelectuais tinham em comum o método filosófico de cunho analítico. Entre os aspectos da Escola de Lviv-Varsóvia que influenciaram o trabalho de Tarski destacam-se a atitude anti-psicologista com relação à Lógica e à Teoria do Conhecimento, e a análise linguística de conceitos, como “verdadeiro” e “falso”. Neste sentido, Lviv-Varsóvia promoveu uma ruptura com as investigações descritivo-psicológicas e da ênfase na função comunicativa da linguagem presente na filosofia de Franz Brentano (para mais informações sobre a história da Escola de Lviv-Varsóvia cf. Woleński, 1989, 1995).

(27)

importância no que diz respeito ao desenvolvimento técnico de suas pesquisas em Lógica, sua filosofia a respeito das linguagens formais não sofreu a mesma influência. De fato, os primeiros intercâmbios pessoais entre o Círculo de Viena e a Escola de Lviv-Varsóvia foram estabelecidos apenas em 1930, quando Tarski visitou Viena e Carnap visitou Varsóvia. Nesta época, Tarski já havia desenvolvido seu trabalho sobre a semântica das linguagens formais.

O conceito-de-verdade em uma estrutura é apresentado por Tarski em sua mo-nografia “O conceito-de-verdade nas linguagens formais” (original em polonês de 1933, versão em alemão de 1935 e versão em inglês de 1983), onde Tarski apresenta um método para definir a verdade para uma determinada linguagem formal. De acordo com Tarski, a definição-de-verdade não seria dada pela mesma linguagem para a qual ela é formulada — a linguagem-objeto —, mas por uma linguagem capaz de descrever os enunciados e a sintaxe da linguagem-objeto — a metalinguagem.

O principal objetivo da metalinguagem é formalizar o que é dito sobre a linguagem-objeto. Para isto ela deve conter uma cópia de sua linguagem-objeto, noções de Teoria dos Conjuntos e um símbolo de predicado unário T , lido como “(...) é uma sentença verdadeira da linguagem-objeto”, juntamente a um conjunto de cláusulas suficientes para definir e justificar a definição-de-verdade. Uma definição pertinente-de-verdade de um enunciado é aquela que especifica quais são as condições para que este enunciado seja considerado verdadeiro. Para garantir uma definição precisa de relação de consequência, Tarski introduziu e empregou as noções semânticas de satisfação e modelo. Um enunciado de uma determinada linguagem-objeto é verdadeiro quando o predicado T da metalingua-gem é interpretado de modo a satisfazer este enunciado; neste caso dizemos que temos um modelo deste enunciado.

De acordo com a definição de consequência proposta por Tarski, uma consecução é válida se todos os modelos que satisfazem simultaneamente todos os enunciados que são propostos como premissas são também modelos para o enunciado proposto como

(28)

conclusão. Em particular, um enunciado ϕ é consequência semântica de um conjunto de enunciados Γ, se, e somente se, todos os modelos de Γ são modelos de α, isto é, toda valoração que atribui o valor-de-verdade verdadeiro aos enunciados de Γ também atribui o valor-de-verdade verdadeiro a ϕ.

Sob a perspectiva abstrata definimos uma lógica proposicional como um par for-mado por uma linguagem proposicional associada a uma relação de consequência (cf. Brown e Suszko, 1973). As definições de linguagem proposicional e de relação de con-sequência (com conclusão simples) são dadas a seguir.

Definição 1.1.1. Uma linguagem formal proposicional S = hAt, Ωi é definida como uma estrutura que possui um conjunto enumerável de átomos proposicionais At= {p1, p2, ..., pk, ...} e uma assinatura proposicional Ω = {Ωn}n∈N, onde cada Ωn

é um conjunto de conectivos com aridade n. Chamamos α de proposição se α ∈ At ou, para um © ∈ Ωn, α é da forma ©(α1, ..., αn), onde α1, ..., αn são proposições. Chamamos

αk∈ {α1, ..., αn}de subfórmula direta de ©(α1, ..., αn). O conjunto de enunciados

S é formado pelas proposições indutivamente definidas a partir de S.

Definição 1.1.2. Dado um conjunto de enunciados S, chamamos de relação de

con-sequência com conclusão simples uma relação binária ⊆ ℘(S)×S em que para

todos ϕ, ψ ∈ S e todos ∆, Γ ⊆ S, as seguintes propriedades são respeitadas1:

Reflexividade

Γ, ϕ ϕ

Monotonicidade

Se Γ ϕ, então Γ, ∆ ϕ

Transitividade (para Conjunto de Fórmulas)

Se ∆ ϕ e Γ δ para todo δ ∈ ∆, então Γ ϕ

1Para simplificar a notação, usaremos vírgulas no lugar dos símbolos de Teoria dos Conjuntos, por

(29)

Note que uma definição de transitividade mais restrita do que a dada acima é obtida limitando o conjunto ∆ a um conjunto finito de fórmulas ou a um conjunto unitário:

Transitividade para Conjuntos Finitos de Fórmulas

Dado ∆∗ ∈ F in(S), se ∆

ϕ e Γ δ para cada δ ∈ ∆, então Γ ϕ

onde F in(S) = {Γ∈ ℘(S)|Γé finito}.

Transitividade para Fórmulas

se Γ δ e δ α, então Γ α

Em Tarski (1936), as propriedades mínimas de uma relação de consequência em geral são a Reflexividade, a Transitividade para Fórmulas e a Compacidade. A Compaci-dade é definida como:

Definição 1.1.3. Compacidade

Se Γ ϕ, então existe Γ∈ F in(Γ) tal que Γ ϕ,

onde F in(Γ) = {Γ∈ ℘(Γ)|Γé finito}. A Compacidade é uma propriedade especialmente importante em Teoria das De-monstrações. Dada uma consecução arbitrária Γ ϕ, a Compacidade garante o resultado de que existe uma derivação de ϕ com um número finito de passos a partir de Γ. Como não iremos assumir que as relações de consequência são compactas, iremos anunciar a presença desta propriedade quando for o caso.

Quando uma relação de consequência com conclusão simples é compacta, a Transi-tividade para Fórmulas torna-se equivalente à TransiTransi-tividade para Conjuntos de Fórmulas, tal como demonstrado abaixo.

Lema 1.1.4. (Cf. Shoesmith e Smiley, 1978, Teorema 1.2) Na presença da Monotoni-cidade, a Transitividade para Fórmulas é equivalente à Transitividade para Conjuntos Finitos de Fórmulas.

(30)

Demonstração. Seja uma relação monotônica e transitiva para fórmulas. Considere um ∆∗ ∈ F in(Γ) tal que ∆

ϕ. Suponha também que, para todo δ ∈ ∆, temos Γ δ. A demonstração de que Γ ϕ é feita por indução sobre a cardinalidade de ∆, junto às propriedades de Transitividade para Fórmula e Monotonicidade.

Para demonstrar a recíproca basta restringir a Transitividade para Conjuntos de Fórmulas a conjuntos unitários de fórmulas. Sendo assim, se Γ β e ∆, β ϕ, pela propriedade de Transitividade para Conjuntos Finitos de Fórmulas em {β}, então Γ, ∆ ϕ.

Teorema 1.1.5. (Cf. Shoesmith e Smiley, 1978, Teorema 1.4) Para relações monotô-nicas e compactas, a Transitividade para Fórmulas é equivalente à Transitividade para Conjuntos de Fórmulas.

Demonstração. Seja uma relação monotônica, compacta e transitiva para fórmulas. Suponha que ∆ ϕ e, para cada δ ∈ ∆, Γ δ. Por Compacidade, existe um conjunto finito ∆∗ ∈ F in(∆) tal que ∆

ϕ. Dada a hipótese, para cada δ ∈ ∆∗ ⊆∆, temos Γ δ, e, pelo Lema 1.1.4, concluímos que Γ ϕ. Para demonstrar a recíproca, tome uma relação monotônica, compacta e transitiva para conjuntos e restrinja que a Transitividade para Conjuntos se aplique apenas a conjuntos unitários de fórmulas.

A noção de lógica abstrata que adotamos, de acordo com (Brown e Suszko, 1973), atualizou a definição tarskiana de noção de consequência impondo-lhe a proprie-dade de Invariância por Substituição2. A propriedade de Invariância por Substituição se baseia na seguinte definição de substituição uniforme:

Definição 1.1.6. Seja ϕ(p1, ..., pn) uma proposição ϕ cujo conjunto de átomos

proposici-onais é {p1, ..., pn}. Denominamos substituição uniforme um endomorfismo3 σ em S,

2(Brown e Suszko, 1973) e outros autores adotam o termo “estruturalidade” para esta propriedade.

Evitamos o uso deste nome para não confundir com o termo “subestruturalidade” empregado em deter-minados tipos de sistemas dedutivos.

3Um endomorfismo em um conjunto estruturado é um mapeamento deste conjunto nele mesmo

(31)

tal que σ(ϕ(p1, ..., pn)) é o resultado de aplicar a substituição σ à proposição ϕ substituindo

simultaneamente os átomos proposicionais p1, ..., pn por σ(p1), ..., σ(pn).

Dizemos que é invariante por substituição quando a seguinte propriedade é respeitada:

Definição 1.1.7. Invariância por Substituição Se Γ ϕ então σ(Γ) σ(ϕ),

onde σ é uma substituição uniforme e σ(Γ) = {σ(γ)|γ ∈ Γ}. Definição 1.1.8. Uma lógica L é uma estrutura formada por um par L = hS, i, onde

S é o conjunto de enunciados de uma linguagem e é uma relação de consequência. Chamamos uma lógica L = hS, i de lógica-T quando for uma relação de consequência com conclusão simples invariante por substituições4.

Um dos objetivos do presente capítulo a partir daqui será demonstrar que qual-quer lógica-T é fundamentalmente bivalente. Para isto, iremos, ainda nesta seção, demons-trar que toda lógica-T possui uma semântica adequada, isto é, uma semântica correta e completa. Na seção 1.3, mostraremos que qualquer semântica adequada a uma lógica-T pode ser reduzida a uma semântica com apenas dois valores-de-verdade pelo teorema conhecido como Redução de Suszko.

As semânticas das lógicas proposicionais podem ser definidas com base em uma matriz como a seguinte:

Definição 1.1.9. Dado um conjunto de enunciados S de uma linguagem proposicional, uma matriz é uma tupla M = hV, D, Oi tal que V é um conjunto não-vazio —que chamamos de conjunto de valores-de-verdade—, D é um subconjunto5 de V —que

tal que, dado um símbolo de operação n-ária µ de A e {α1, · · · , αn} um subconjunto do domínio de A,

f (µ(α1, · · · , αn)) = µ(f (α1), · · · , f (αn)).

4Usamos “T” para denominar as lógicas com relação de consequência com conclusão simples em

referência a Alfred Tarski.

5Em (Dunn e Hardegree, 2001; Urquhart, 2001) D é definido como um conjunto não-vazio. Esta

(32)

chamamos de conjunto de valores designados— e O contém uma função n-ária f©:

Vn → V para cada conectivo n-ário © da assinatura proposicional da linguagem de S.

Tais funções são denominadas funções-de-verdade. Chamamos o conjunto V − D de conjunto de valores não-designados.

Exemplos de matrizes seriam a matriz da lógica proposicional clássica, definida como MLP C = h{T, F }, {T }, {f¬, f∨}i, e a matriz da Lógica do Paradoxo, que pode ser

definida como MLP = h{T, ⊥>, F }, {T, ⊥>}, {f¬, f

, f∧}i. Em ambos os casos podemos tomar f¬(T ) = F e f¬(F ) = T , e tomar f∧(T, T ) = T e f∧(x, y) = F se x = F ou y = F ; no caso de MLP tomamos ainda f¬(⊥>) = ⊥> e tomamos f∧(x, y) = ⊥> se x = ⊥> e y 6= F ,

ou se x 6= F e y = ⊥>.

Definição 1.1.10. Dada uma matriz M = hV, D, Oi e o conjunto de enunciados S de uma linguagem proposicional, definimos uma valoração baseada em M como um ho-momorfismo v : S → V, isto é, uma função tal que, dado um conjunto de enunciados 1, · · · , ϕn} ⊆ S e para qualquer símbolo conectivo n-ário © ∈ Ω, v(©(ϕ1, . . . , ϕn)) =

f©(v(ϕ1), . . . , v(ϕn)). Uma semântica SEM baseada em M é o conjunto de todas

valo-rações baseadas em M.

Dizemos que uma linguagem é verofuncional quando o valor dos enunciados é unicamente determinado pelo valor de suas subfórmulas diretas.

Definimos uma relação de consequência semântica com conclusão simples baseada em uma matrix M, denotada por , como:

Definição 1.1.11. Dado Γ ⊆ S e ϕ ∈ S,

Γ |= ϕ sse não existe v ∈ SEM tal que v(Γ) ⊆ D e v(ϕ) ∈ V − D,

onde v(Γ) = {v(γ)| para todo γ ∈ Γ}. A noção de validade subjacente a relações de consequência semântica com con-clusão simples tem como característica a preservação da verdade, ou do conjunto de

(33)

valores-de-verdade designados, das premissas para a conclusão. Uma leitura alternativa da validade de uma consecução, que utilizamos no presente trabalho, é dada em termos da incompatibilidade entre as premissas cujos valores são designados com uma conclusão cujo valor é não-designado. Dizemos que a consecução de Γ a ϕ é válida se, e somente se, nenhuma valoração de SEM atribui às fórmulas de Γ um valor designado e um valor não-designado a ϕ. É fácil verificar que a tupla hS, i é uma lógica.

Quando existe uma valoração de SEM que atribui às fórmulas de Γ valores desig-nados e atribui um valor não-designado a ϕ, dizemos que a consecução de Γ a ϕ é inválida, denotada como Γ 6 ϕ.

Γ 6|= ϕ sse existe v ∈ SEM tal que v(Γ) ⊆ D e v(ϕ) ∈ V − D.

Definição 1.1.12. Dizemos que uma semântica SEM é completa com respeito a uma lógica L = hS, i quando a relação de consequência semântica baseada em SEMé tal que  ⊆ , e dizemos que SEM é correta em relação a L, se ⊆ . Quando = , dizemos que SEM é uma semântica adequada para L, ou que L é caracterizada por SEM.

Apresentamos abaixo o resultado geral de adequação demonstrado pela primeira vez por Wójcicki (Wójcicki, 1970; Wójcicki, 1988), no qual é demonstrado que é possível definir uma semântica correta e completa para toda lógica associada a uma relação de consequência com conclusão simples e invariante por substituições.

A semântica definida para se obter este resultado é baseada no chamado de fibrado de Lindenbaum, uma família de matrizes, as matrizes de Lindenbaum, definidas a partir da própria linguagem da lógica dada. Uma das peculiaridades das matrizes de Lindenbaum é usar o conjunto de fórmulas da linguagem da lógica sobre a qual esta é definida como um conjunto de valores-de-verdade.

Definição 1.1.13. Dada uma lógica-T arbitrária L = hS, i e um conjunto arbitrário

(34)

É fácil verificar que o fecho Γ de um conjunto de fórmulas Γ possui as seguintes propriedades:

Proposição 1.1.14. 1. Γ ⊆ Γ 2. Se Γ ⊆ ∆, então Γ 3. (Γ ) = Γ

Demonstração. 1. Tome γ ∈ Γ arbitrário. Por Reflexividade, temos que Γ γ. Pela definição de fecho γ ∈ Γ . Logo, Γ ⊆ Γ .

2. Suponha Γ ⊆ ∆, e tome γ ∈ Γ arbitrário. Pela definição de fecho, Γ γ, e por Monotonicidade ∆ γ. Pela definição de fecho, temos que γ ∈ ∆ . Logo, Γ . 3. (Γ ) = Γ . (Γ ) Γ foi demonstrado em 1. Tome γ ∈ (Γ ) arbitrário. Logo, pela definição de fecho, Γ γ. Além disso, pela definição de fecho, Γ δ para todo δ ∈ Γ . Por Transitividade, temos Γ γ, que pela definição de fecho é γ ∈ Γ .

Definição 1.1.15. Seja L = hS, i uma lógica-T arbitrária e tome Γ ⊆ S. Uma matriz

de Lindenbaum (para Γ em L) é uma matriz da forma MΓ = hS, Γ , Oi, onde S é o conjunto de enunciados de L, Γ é o conjunto de valores designados formado pelo fecho de Γ, e O é o conjunto de conectivos da linguagem de L.

Note que, de acordo com a definição 1.1.10, uma valoração baseada em uma matrix M = hV, D, Oi para uma lógica L = hS, i é um homomorfismo de S em V. Contudo, no caso das matrizes de Lindenbaum, temos que V = S, o que faz com que as valorações basedas nestas matrizes sejam endomorfismos σ em S. De acordo com a definição 1.1.6, os endomorfismos de uma matriz de Lindenbaum são as substituições uniformes de L.

Como já vimos, em uma matriz de Lindenbaum MΓ= hS, Γ , Oi, o conjunto de valores-designados é definido como o fecho de um subconjunto de S e a semântica SEMΓ

(35)

baseada em MΓ é dada pelo conjunto dos endomorfismos baseados em MΓ. Sendo assim, dado ∆ ⊆ S e ϕ ∈ S, uma consecução ∆ Γ ϕ baseada em MΓ é válida quando não existe uma substituição uniforme em SEMΓ que, aplicada aos enunciados de ∆ resulte em enunciados de Γ e aplicada a ϕ resulte em um enunciado que não pertence a Γ (cf. definição 1.1.11). Em outras palavras,

∆ Γ ϕsse não existe σ ∈ SEMΓ tal que σ(∆) ⊆ Γ e σ(ϕ) /∈ Γ .

Definição 1.1.16. Chamamos de fibrado de Lindenbaum de L a família F = {MΓ|Γ ⊆ S} de matrizes de Lindenbaum geradas a partir da linguagem de L. Usando o fibrado de Lindenbaum definimos LF = hS, Fi, —que denominamos superlógica de L— em que F é o resultado da interseção das relações de consequência semântica definidas a partir de cada uma das matrizes de Lindenbaum contidas no fibrado de Lindenbaum, isto é, F = T{Γ|MΓ ∈ F }.

É fácil perceber que uma semântica adequada para LF pode ser definida tomando SEMF =S{SEMΓ|MΓ ∈ F }.

Definição 1.1.17. Dada uma lógica-T arbitrária L = hS, i, chamamos Γ ⊆ S de teoria

não-trivial se existe β ∈ S tal que Γ 6 β.

Definição 1.1.18. Dada uma lógica-T arbitrária L = hS, i e β ∈ S, dizemos que Γ ⊆ S é uma teoria (β-)saturada quando:

Γ 6 β (Γ é não-trivial) e Γ, α β para todo α /∈ Γ

Uma teoria Γ é maximal se Γ é saturada para todo β /∈ Γ. Dizemos que Γ é uma teoria

fechadaquando γ ∈ Γ sempre que Γ γ.

Proposição 1.1.19. Se Γ é saturada maximal, então Γ é fechada.

(36)

γ /Γ tal que Γ γ. Logo, Γ, γ β, para β ∈ S arbitrário. Por Transitividade, temos que Γ β. Absurdo, pois Γ é não-trivial.

Apresentamos a seguir duas versões do teorema de adequação de Wójcicki, cujo resultado demonstra que é possível definir uma semântica adequada para uma lógica-T arbitrária, a saber, a semântica baseada no fibrado de Lindenbaum desta lógica. Este teorema demonstra que a superlógica de uma lógica é a própria lógica e, desta maneira, é demonstrado que toda lógica-T possui uma semântica adequada, a saber, a semântica de sua respectiva superlógica. A primeira versão do teorema de adequação de Wójcicki demonstra a adequação para lógicas-T, cuja noção de consequência associada não ne-cessariamente é compacta, mas respeita a Transitividade para Conjuntos, já a segunda versão do teorema demonstra a adequação para lógicas cuja relação de consequência com conclusão simples é compacta.

Teorema 1.1.20 (Adequação de Wójcicki). Toda lógica-T possui uma semântica ade-quada.

Demonstração. Tome uma lógica-T arbitrária L = hS, i e construa a superlógica LF = hS, Fibaseada no fibrado de Lindenbaum de L.

Para demonstrar a correção de LF em L é suficiente mostrar que uma matriz arbitrária contida no fibrado de Lindenbaum é correta para L. Seja ∆ α uma consecução de L e considere uma valoração σ ∈ SEMΓ tal que σ(∆) ⊆ Γ . Por Invariância por Substituição temos que σ(∆) σ(α). Por Reflexividade, para todo σ(δ) ∈ σ(∆), Γ σ(δ). Por Transitividade, Γ σ(α). Dada a definição de fecho, σ(α) ∈ (Γ ) , e disto (proposição 1.1.14.3 ), segue que σ(α) ∈ Γ . Logo, por definição de Γ, ∆ Γ α.

Para demonstrar a completude, suponha que ∆ 6 α. Por Transitividade para Conjuntos o fecho de ∆ é tal que ∆ 6 α (proposição 1.1.14.3 ). Por Reflexividade α / . Note também que ∆ ⊆ ∆ (proposição 1.1.14.1 ). Defina a matriz de Lindenbaum M∆= hS,, Oie suponha por absurdo que ∆ ∆ α. Por definição, não existe σ ∈ SEM∆ tal

(37)

que σ(∆) ⊆ ∆ e σ(α) /∈ ∆ . No entanto, σ pode ser tomada como a função identidade. Temos assim um absurdo, logo ∆ 6∆α. E pela definição de superlógica de L, ∆ 6F α.

A segunda versão do teorema de Wójcicki depende do lema a seguir, conhecido na literatura como Extensão de Lindenbaum-Asser. Este lema demonstra como estender uma teoria não-trivial arbitrária (cf. Definição 1.1.18) de uma lógica associada a uma noção de consequência com conclusão simples compacta a uma teoria saturada maximal. Esta teoria saturada maximal será usada para demonstrar o resultado de completude desta lógica em relação ao seu fibrado de Lindenbaum. Este resultado não é construtivo, e depende do axioma da escolha, mais especificamente de sua formulação alternativa conhecida como Lema de Zorn.

Proposição 1.1.21 (Lema de Zorn). Se todo subconjunto totalmente ordenado de um conjunto parcialmente ordenado possui um limite superior, então este conjunto possui um elemento maximal.

Lema 1.1.22 (Extensão de Lindenbaum-Asser). Toda teoria não-trivial Γ de uma lógi-ca-T L pode ser estendida a uma teoria saturada maximal ΓSAT.

Demonstração. Seja Γ 6 β. Defina SAT (Γ, β, L) como a coleção de teorias β-saturadas que estende Γ em L. Note que SAT (Γ, β, L) é um conjunto parcialmente ordenado pela relação ⊆. Tome como C um subconjunto totalmente ordenado de SAT (Γ, β, L).

Demonstramos que SC é um limite superior de C, isto é:

(i) Para todo ∆ ∈ C, temos ∆ ⊆SC. Óbvio.

(ii) S

C ∈ SAT(Γ, β, L). Seja Φ um conjunto finito arbitrário tal que Φ ⊆ S

C. Temos que existe Σ ∈ C tal que Φ ⊆ Σ. Dado que Σ é β-saturado, Σ 6 β. Por Monotonicidade, Φ 6 β. Dado que Φ é finito e arbitrário, por Compacidade concluímos queS

C 6 β.

(38)

Demonstramos agora a segunda versão do teorema de adequação de Wójcicki, que demonstra que o fibrado de Lindenbaum é adequado para sua respectiva lógica associada a uma relação de consequência com conclusão simples compacta.

Teorema 1.1.23(Adequação de Wójcicki para lógicas compactas). Uma lógica associada a uma relação de consequência com conclusão simples compacta possui uma semântica adequada.

Demonstração. Tome uma lógica associada a uma relação de consequência com conclusão simples compacta L = hS, i e construa a superlógica LF = hS, Fi baseada no fibrado de Lindenbaum de L.

A correção de LF a L é demonstrada como no teorema 1.1.20. Para demonstrar a completude, suponha que ∆ 6 α. Note que ∆ é uma teoria não-trivial. Tome a extensão saturada maximal de ∆, ∆SAT, cuja existência é garantida pelo Lema 1.1.22. Como ∆SAT

é fechada (proposição 1.1.19), ∆ ⊆ ∆SAT e α /∈ ∆SAT. Defina a matriz de Lindenbaum

M∆SAT = hS, ∆SAT, Oi e suponha por absurdo que ∆ ∆SAT α. Por definição, não existe σ ∈ SEMSAT tal que σ(∆) ⊆ ∆SAT e σ(α) /∈ ∆SAT. Note contudo que σ pode ser

tomada como a função identidade. Temos assim um absurdo, logo ∆ 6∆SAT α. E pela

definição de superlógica de L, ∆ 6F α.

Os resultados apresentados sustentam que toda lógica-T, ou toda lógica associ-ada a uma relação de consequência com conclusão simples que respeite apenas uma versão mais fraca da Transitividade, desde que seja compacta, possui uma semântica adequada, a saber, a semântica construída com base no seu próprio fibrado de Lindenbaum. Este resultado juntamente com o teorema de redução de Suzsko, demonstrado na Seção 1.3, mostra que qualquer lógica-T é fundamentalmente bivalente. Antes de continuarmos as considerações sobre a bivalência das lógicas-T, apresentaremos a noção de consequên-cia com conclusão múltipla, que estende a noção com conclusão simples e também está associada a semânticas bivalentes.

(39)

1.2

A noção de consequência com conclusão múltipla

A noção de consequência com conclusão múltipla admite vários (ou nenhum) enunciados como premissas e vários (ou nenhum) enunciados como conclusão. A primeira definição formal de relação de consequência lógica com conclusão múltipla surgiu com o cálculo de sequentes de Gentzen na década de 1930, sendo mais tarde desenvolvida de forma abstrata por Dana Scott (1971; 1974), Shoesmith e Smiley (1978), Segerberg (1982) e outros.

Em uma relação de consequência com conclusão múltipla, uma consecução tem um conjunto de enunciados como premissa (múltipla), a qual é entendida metalinguisti-camente como uma conjunção de enunciados, e esta acarreta um conjunto de enunciados como alternativas de conclusão, entendida metalinguisticamente como uma disjunção de enunciados. Um exemplo de tais alternativas em linguagem natural seria: “√2

√ 2 é um número racional ou√2 √ 2 é um número irracional”.

Para definirmos a noção de consequência com conclusão múltipla, usamos a noção de quase-bipartição de conjuntos.

Definição 1.2.1. Uma quase-bipartição de um determinado Θ ⊆ S é um par hΓ, ∆i tal que Γ ∩ ∆ = ∅ e Γ ∪ ∆ = Θ.

Definição 1.2.2. Dado um conjunto de enunciados S, chamamos de relação de

con-sequência com conclusão múltipla uma relação binária m ⊆ ℘(S) × ℘(S) tal que,

para todo ϕ ∈ S e todo ∆, Γ, Σ, Π ⊆ S, as seguintes propriedades são respeitadas6:

Reflexividade

• Γ, ϕ m ϕ,

Monotonicidade

• Se Γ m ∆, então Σ, Γ m ∆, Π

6Usaremos m sobrescrito para denotar uma relação de consequência com conclusão múltipla e

dife-renciar da notação , usada na noção de consequência com conclusão simples. A fim de simplificar a notação usaremos vírgulas ao invés dos símbolos de Teoria dos Conjuntos. Exemplo: Γ, ϕ m ϕ, ∆ :=

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Transitividade Forte

• Se Γ, Σ m Π, ∆ para toda quase-bipartição hΣ, Πi de um dado Θ ⊆ S,

então Γ m

A definição de transitividade para conclusão múltipla não é, como poderia ser esperado, dada por “se Γ m Θ e Θ m ∆, então Γ m ∆”. Esta última definição é

inapropriada devido à estrutura desta noção de consequência. Em Θ ∆ as fórmulas de Θ são consideradas conjuntivamente e em Γ m Θ as fórmulas de Θ são

considera-das disjuntivamente, fazendo com que seja necessária uma versão da transitividade que considera todas as quasi-partições de Θ (Shoesmith e Smiley, 1978, p. 29).

Se restringirmos Θ a um conjunto unitário, Θ = {α}, obtemos uma versão em conclusão múltipla da Transitividade para Fórmulas:

Transitividade para Fórmulas

• Se Γ m α,∆ e Γ, α m ∆, então Γ m ∆.

Algumas versões em conclusão múltipla da transitividade são:

Transitividade 1 Se Γ m α,∆ para cada α em Θ e Γ, Θ m ∆, então Γ mTransitividade 2 Se Γ, β m∆ para cada β em Θ e Γ m Θ, ∆, então Γ m

Transitividade 3 Se Γ m α,∆ para cada α em Σ, e Γ, β m ∆ para cada β em Π e

Γ, Σ m Π, ∆, então Γ m

Todas estas formas são mais gerais do que a Transitividade para Fórmula e mais restritas do que a Transitividade Forte, em relações monotônicas. A Transitividade 1 e a Transitividade 2 são independentes entre si e isoladamente são mais restritas do que a Transitividade 3, contudo, na presença da propriedade de Monotonicidade, a Transitivi-dade 1 juntamente com TransitiviTransitivi-dade 2 são equivalentes à TransitiviTransitivi-dade 3 (para mais detalhes cf. Shoesmith e Smiley, 1978, Teoremas 2.5–2.7).

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A relação com consequência múltipla é dita invariante por substituição, quando, dada qualquer substituição uniforme σ (cf. Definição 1.1.6), a seguinte propriedade é respeitada:

Invariância por Substituição

• Se Γ m ∆ então σ(Γ) m σ(∆)

Analogamente à noção de consequência com conclusão simples, uma relação com consequência múltipla m é dita compacta se respeita a seguinte propriedade:

Compacidade

• Se Γ m ∆, então existe Γ∈ F in(Γ) e ∆∈ F in(∆) tal que Γ

m , onde F in(Φ) = {Φ∈ ℘(Φ)|Φé finito}. Como não iremos assumir que as relações de consequência com conclusão múltipla são sempre compactas, iremos anunciar a presença desta propriedade quando for o caso.

A noção de consequência com conclusão múltipla respeita a propriedade de Tran-sitividade Forte. No cálculo de sequentes de Gentzen, contudo, é a TranTran-sitividade para Fórmulas que corresponde à regra do corte (Gentzen, 1935). Isto acontece porque, em geral, no cálculo de sequentes, as relações de consequência associadas são compactas, e em uma relação compacta a Transitividade Forte é equivalente à Transitividade para Fórmulas.

Transitividade para Conjuntos Finitos de Fórmulas

• Se Γ, Σ m Π, ∆ para cada quase-bipartição hΣ, Πi de Θ ⊆ F in(S),

então Γ m ∆.

Lema 1.2.3 (Shoesmith e Smiley (1978), teorema 2.2). Na presença da Monotonicidade, a Transitividade para Fórmulas é equivalente à Transitividade para Conjuntos Finitos de Fórmulas.

Referências

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