• Nenhum resultado encontrado

JITTERBUGS E ICKIES-O SWUING AMERICANO E O CONSUMISMO DOS JOVENS. A Criação da juventude.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "JITTERBUGS E ICKIES-O SWUING AMERICANO E O CONSUMISMO DOS JOVENS. A Criação da juventude."

Copied!
19
0
0

Texto

(1)

C A P Í T U L O 2 1

Jitterbugs

e I c k i e s

O swing americano e o consumismo dos jovens

* * * O ^ 0 1 QJ U "ÕJ c c o o (D o •D 1 o E O o

'ca

u

X

QJ

X

" O o c d) > " D u -O) l/l o o D ' o O c I Q O i O o u c D U O

^

>

(V

c o LLT 0) D ) Q C CD O O f N QJ o

<

>

QJ Ü O

<

QJ

O CO

~o CCL

AdolfHitler é um quadrado e tem o ouvido ruim. Ele é um excêntrico,

um pouco amalucado, mas cheio de sentimentalismo. Atraente, mas não

maravilhoso. Ele pode chorar lágrimas de crocodilo, mas não dança swing.

- "Outstonding Ickies", The

Jitterbug,

NQ 1 (1938)

JITTERBUGS

DA CALIFÓRNIA VÃO PARA A CIDADE, 12 DE DEZEMBRO DE 1939

(2)

Às 7H DA MANHÃ do dia 3 de março de 1937, os componentes da Benny Good-man Orchestra chegaram ao/Paramount Theater, com seus 3.664 lugares, na T i m e s Square, para ensaiar o show de estreia da sua próxima temporada. Eles não imaginavam que fosse acontecer algo de especial, mas o que viram naquela hora pouco musical os fez pensar se não estariam ainda sonhando. Embora a bi-lheteria ainda estivesse fechada, já havia uma multidão de seiscentos ou setecentos fas, a maioria colegiais dos bairros de Nova York," dançando, gritando e acendendo fogueiras para afastar o frio.

Às 7:30, os "fãs multiplicavam-se a cada minuto, jorrando das saídas do metrô da Times Square como abelhas de uma colmeia fumegante". Uma hora depois, a apresentação começou com ás primeiras notas abafadas do tema carac-terístico da orquestra, "Lets Dance"» que lentamente foram ficando mais altas conforme os músicos iam surgindo de dentro do alçapão. Esta composição espe-tacular teatral garantia que a platéia lotada ficasse de pé, e foi como todos ficaram, dançando freneticamente pelos corredores e aglomerando-se na tribuna da orques-tra, enquanto os porteiros tentavam, como loucos, recuperar o controle.

Essas cenas repetiram-se em cada um dos cinco shows naquele dia: ninguém deu importância ao filme de Claudette Colbert que dividia a bilheteria, Maidof Salem. No fim da semana, a platéia subia ao palco, para ficar mais perto de seus ídolos a fim de achar mais espaço para seus passos acrobáticos. Os garotos do swing, como Goodman mais tarde admitiu, eram mais do que apenas espectadores passivos: "Nós olhávamos para eles, eu acho, [como se] fossem eles o espetáculo e nós a platéia."

A temporada no Paramount marcou o momento em que Benny Goodman e sua orquestra atravessaram a estrada para a fama que, como o estilo de jazz que ele tocava, o swing, se espalharia por todos os Estados Unidos e o mundo ociden-tal. Sinalizado por frases melódicas acompanhando o solista, o swing fundia a inebriante espontaneidade do clássico estilo "hot^dos anos 1920 com a força dramática de urr~ grande orquestra. As canções de Goodman, como "Sing Sing Sing", tinham o ai.anjo forte do baterista Gene Krupa e a bateria ritmada e sel-vagem, eram um convite para o frenesi no qual os adolescentes dos meados da década de 1930 estavam felizes em embarcar.

A popularidade do swing foi estimulada pelo rádio, a mídia que mais crescia nesse período. Durante o ano de 1937, a orquestra de Goodman apresentou-se regularmente no CamelCaravan da CBS, um programa semanal patrocinado pela marca de cigarros. Usando gravações remotas, assim como estúdios comuns, shows

como Camel Caravan e Lets Dance, da NBC, sintonizaram o swing diretamente

para os lares de toda a América. Para os jovens fãs, estes "salões de baile de faz-de-conta" eram um novo fenômeno "imediata e inebriantemente real, mas ao mesmo tempo parte do tecido do mundo fantástico dos sonhos".

(3)

FÃS COM A ORQUESTRA DE BENNY GOODMAN, FEIRA MUNDIAL DE NÔVA YORK, 1939

Escutando nos seus quartos de dormir ou inserindo níqueis numa vitrola automática, a jukebox, os adolescentes americanos descobriram que o acesso ao swing era fácil e rápido. Apresentando grandes orquestras compostas de músicos excelentes - a de Goodman incluía Lionel Hampton, Harry James e Gene Krupa em março de 1937 - , o swing pretendia desde o início ser uma música física, ani-mada, da qual se podia participar. Red Norvo, que tocava o vibrafone na orquestra de Goodman, recapitulou isso ao contar à Variety que o swing "era um ritmo que inspira o ouvinte a acelerar a cadência com um balanço ultramoderno. Você sabe, eles fazem você balançar .

A música popular do início dos anos 1930 fora dominada por crooners de "voz doce" como Rudy Vallee e Bing Crosby. Apesar do seu séquito feminino fanático, eles eram artistas de voz macia e atitudes contidas. Com o swing, o compasso da vida se acelerou e, a partir de 1937, introduziu todo um mundo adolescente, com a sua própria gíria, revistas, modas e heróis. Isto foi gerado pelos próprios fãs. "O jazz é uma indústria importante hoje em dia e depende do consumo de mas-sa", o editor de Jitterbug notou. "Se o jazz quer continuar existindo, tem de en-tender que os jitterbug! são importantes."

(4)

O swing abriu um novo capítulo na história da juventude e da comunicação de massa. A surpresa e a condenação demonstradas por muitos jornalistas adultos diante de comícios em massa de swing - "hiderismo musical" foi um comentário1

- só ressaltavam o fato de que os adolescentes americanos estavam operando num comprimento de onda diferente do dos adultos. O swing não era só liberdade musical e física, era uma liberdade muito mais ampla em todas as suas formas: a verdadeira emancipação, não apenas dos músicos negros que foram os pioneiros do estilo, mas dos teens, dos adolescentes cuja maioridade a música anunciava.

* * *

Com sua entrada no mundo adulto adiada como uma questão de política "governamental, alguns dos jovens da América começaram a fazer suas próprias exigências^Bm julho de 1936, o American Youth Congress emitiu uma Declaração ylos Direitos da Juventude Americana-. "Queremos trabalhar, produzir, construir,

mas milhões de nós são forçados a ficar ociosos. Nós nos formamos em escolas e faculdades equipadas para carreiras e profissões, mas não existem empregos. Podemos nos encontrar nas estradas, ou nos campos supervisionados do exército, isolados dos amigos e da família. Nós nos recusamos a ser a geração perdida." Rejeitando o modelo do colegial consumidor dos anos 1920, os ativistas es-tudantis do American Youth Congress criaram uma nova carta de direitos, afir-mando a sua solidariedade para com o "povo negro", trabalhadores em greve e forças progressistas por toda pane. Embora não chegando a afirmar que os jovens constituíam "um grupo social distinto", não obstante eles declaravam que "nossos problemas e aspirações estão intimamente vinculados aos de todas essas pessoas"^ Alegando um eleitorado em potencial de mais de um milhão, eles continuaram agitando no sentido de melhorias práticas.

Em fevereiro de 1937, a "Peregrinação dos jovens por empregos e educação" marchou sobre Washington para protestar sobre a morte de um proposto Esta-tuto Nacional da Juventude. Este estaEsta-tuto teria aumentado as medidas da National Youth Administration ao conceder educação pública gratuita para estudantes de nível secundário. Mas o organismo juvenil governamental foi estropiado por re-trocessos e hostilidade da direita. Apesar do seu alto nível de comprometimento e suas boas intenções, a National Youth Administration não conseguiu erradicar os problemas juvenis causados pela Depressão.//

Muitas das suas medidas eram práticas e esclarecidas. Ele oferecia uma associa-ção com programas educativos adultos e cursos práticos visando a orientar os jovens

1 Cortesia do professor Harry D. Gideonie, da Columbia Universicy, cicado no New York Times em 2 de novem-bro de 1938.

(5)

para empregos de tempo integral. Iniciava também um programa de amplitude nacional de assistência aos estudantes do ensino secundário com mais de 16 anos, com um pagamento mensal de no máximo seis dólares. Outro progresso foi a ins-tituição de projetos para residentes em trinta estados: campos onde os jovens po-diam ficar até seis meses enquanto trabalhavam, gerenciando a si mesmos e vivendo com seus próprios pares.

Entretanto, a National Youth Administration podia alcançar "apenas parte dos jovens que estão em circunstâncias desesperadoras". Embora 500 mil jovens passassem pela NYA nos primeiros dois anos e meio de vida da instituição, tra-tava-se de um pequeno percentual dos 4 milhões de jovens de 16 a 24 anos de idade ainda desémpregados no fim de 1937. Como o presidente do American Youth Congress, William W. Hinckley, se queixou, "para jovens americanos, vi-vendo no que deveria ser o auge da sua vida, o período da juventude dourada, oferece-se no sétimo ano de crise o privilégio de trabalhar para comprar balas e cigarros".

Apesar de todas as suas tendências socialistas, o grupo juvenil governamental não reduziu o materialismo essencial da vida americana. Os indícios estavam nos

a

próprios documentos da NYA. Roupas eram consideradas "uma despesa essencial" da escola. Como um supervisor notou, "em geral, mais ou menos depois do se-cundo cheque de pagamento, o garoto aparece no trabalho usando uma calça

nova. Elas provavelmente lhe custaram dois ou três dólares, mas são dele e ele as comprou com o seu próprio dinheiro. Talvez com os seus próximos pagamentos ele comprará um par de sapatos. A menina desabrochará num vestido de 2,95 dólares. Você não pode saber o que isso significa para ela"5

Apesar da Depressão, a definição americana de cidadania bem-sucedida conti-nuava dependendo da aquisição de artigos de consumo. Embora os adolescentes americanos tivessem possuído um considerável poder de compra durante as duas décadas anteriores, uma boa parte desse poder, particularmente para os que ain-da não tinham iain-dade para estar na faculain-dade, ficava condicionado à aprovação e ao controle dos adultos. Com a oferta de empregos para jovens patrocinada pelo governo, as crianças do baby-boom dos anos de 1920-21 - que estavam completan-do 16 e 17 anos - decidiram que, se iam ser tratacompletan-dos como possuicompletan-dores de seus próprios direitos, então exercitariam esses direitos como quisessem.

fio primeiro mercado juvenil tinha se concentrado na cultura colegial aparente e rica dos anos de 1920. No fim dos anos 1930, com uma crescente proporção de jovens americanos permanecendo no ensino secundário, o mercado de con-sumidores adolescentes em potencial havia se expandido tanto em idade quanto em classe. Quando os Lynd retornaram a Muncie, observaram que o ritmo ain-da era definido pelas "meninas de classe alta". A partir de 1935, promoveu-se uma nova versão do estilo da menina colegial para mulheres jovens americanas sob o

(6)

nome comercial de

subdebs —

a contração de "subdebutante", o que refletia a sua origem rica, se náo na realidade, pelo menos em aspiração. /

As primeiras tentativas de atender a essa economia juvenil expandida tinham a intenção de tranqüilizar. Em maio de 1936, a Vogue publicou um exame da ju-ventude americana com o utulo "Quinze anos já é velho?" no qual a autora Ruth Pickering opinava: "Na cidade de Nova Yorlc, numa época em que fórmulas con-vencionais são difíceis de encontrar, o antigo direito de exploração juvenil disputa com o direito à proteção dos adultos. Com o título de subdebutante, porque elas freqüentam escolas particulares e suas mães passaram pelo complicado processo de conseguir convites para bailes por assinatura, elas são iguais a todas as crianças na adolescência."

Com fotos sóbrias e um texto que citava Booth Tarkington, a matéria da Vogue não obstante detectava uma precocidade subjacente entre os seus temas: "Q jo-vem quer a independência precoce, se possível. Visões de invadir um Harlem sel-vagem ou o Village Pirate s Den são miragens nos horizontes da liberdade total. Eles anseiam pelos postos avançados de Nova York porque dizem que ali os es-tudantes universitários se reúnem, aqueles contemporâneos mais velhos que po-dem se movimentar livremente. Uma incursão nesse território proibido serve como distintivo de maioridade. Sofisticação é a ambição. Sofisticação é a sua própria palavra usada freqüentemente."

Uma independência quase adulta era a meta desse grupo "inquieto", como era o seu "anseio por maiores limites de idade". Como de costume, o que não se falava nessa nova precocicíkde era sobre sexo, e era isso que a mídia adolescente formadora de caráter continuava a policiar./Um dos primeiros usos que a mídia fez do termo subdeb ocorreu numa coluna de conselhos regular iniciada durante

o ano de 1935 pelo Ladies' Home Journal, enquanto que, em 1936, a Scholastic

introduzia uma nova coluna assinada por Gay Head, "Menino sai com menina , publicada durante muito tempo - foi a primeira de muitas cartilhas detalhas , sobre etiqueta.

Para muitas mulheres jovens, a castidade ainda era o ideal. As virgens con-tinuavam sendo "mercadoria de qualidade". Esperava-se também que elas mol-dassem a sua personalidade conforme os rapazes com quem saíam: "Os meninos amam dirigir o espetáculo e ser o espetáculo." Mas a florescente indústria dos conselhos chegou a minúcias quase absurdas para abafar a espontaneidade adoles-cente - refletindo o lado muito formal e arregimentado da América. Em Eti-quette for the Teens, publicado pelo Home Institute, apoiada pela Igreja durante o ano de 1937, "o conselho amigável, sensato, atualizado - escrito na linguagem dos teens' empilhava quarenta páginas de regras implacáveis/

Os manuais de etiqueta eram uma projeção adulta tão óbvia de como os adolescentes deveriam agir que acentuavam o fato de que, na segunda metade

(7)

dos anos 1930, pais e autoridades estavam preocupados em não perder o con-trole da juventude americana^\o mesmo tempo, o uso da palavra-código "teens pelo conservador Home Institute foi um reconhecimento inicial de que havia um mundo juvenil proeminente que se tornara uma força social suficiente para garantir o seu próprio nome enquanto marca. Apesar dos esforços dos adultos, entretanto, seria a juventude do swing a unir todos estes diferentes elementos numa subcultura coerente.

• • •

Em janeiro de 1938, a Goodman Orchestra apresentou-se no seu evento de maior prestígio, bem no coração da cultura clássica, o Carnegie Hall. Naquele mo-mento, o comportamento animalístico da platéia foi quase ritualizado. A Metro-nome observou que os jovens ficaram loucos durante o climático "Sing Sing Sing": "Um depois do outro, os garotos começaram a criar uma nova dança, agitando-se ainda agitando-sentados. Homens mais velhos, parecendo pihguins em camarotes tra-dicionais nas laterais, foram mais adiante e começaram a se sacudir de pé." No fim; a multidão "começou a aplaudir, bater com os pés, ovacionar, gritar".

Mulheres jovens estavam bem na frente. Muitas presidentes de fãs-clubes eram meninas ainda na escola secundária ou na faculdade^s fãs do swing eram mais fáceis de identificar do que seus companheiros masculinos, adotando um estilo que consistia de blusas e suéteres, sapatos sem salto, meias soquete brancas e um vestido curto pregueado que rodopiava para cima na pista de dança. Era uma roupa adaptada para o conforto, a praticidade e a facilidade dos movimentos. A vocalista da Goodman Orchestra, Helen Ward, notou que, no início, as me-ninas "vestiam-se todas elegantes, mas quando a dança pegou fogo, as garotas

começara nf a usar saAdle shoes

jf\sso estava muito longe da composição cuidadosamente policiada da subdeb. Para o jovem fã do swing, Leonard Pratt, as meninas mais conservadoras que usavam "sapatos de salto alto, meias de seda e um bonito vestido azul" ficavam ^deslocadas". Como que desprezando todas as regras de etiqueta, entre as

liberda-des permitidas compartilhadas pelas fãs do swing também se incluía o sexo. "As meninas acenavam para nós e muitos dos rapazes solteiros da banda respondiam com um gesto para que se encontrassem com eles na porta dos fundos do teatro", o saxofonista de Goodman, Art Rollini, lembrou. "Choviam cartas de fãs para cada um dos componentes da banda, dando números de telefone.'/

/Os fãs do swing do sexo masculino usavam calças largas e paletós compridos, com longas correntes penduradas do cinto para o bolso ou girando no dedo. Cha-péus pork pie, de copa lisa e abas reviradas, também eram os preferidos, assim

(8)

como suéteres de pele artificial c mangas bolero.2 Muitas das coisas eram copiadas

'dos estilos dos negros urbanos, como eram as danças executadas por jitterbugs-. o sbag, o Lindy hop, o Suzie-Q. Benny Goodman lembrou-se claramente de ter visto seu primeiro jitterbug em 1934, quando um dançarino começou "a ficar doido-£>eus olhos reviravam, braços e pernas começaram a girar como um moi-nho de vento no meio de um furacão — a sua atenção, concentrada no ritmo, o transfprmava num derviche rodopiante".

Estas improvisações "neoafricanas" haviam começado quando uma "van-guarda folclórica" começou a improvisar o charleston no Harlem. No seu romance parties, Carl Van Vechten citou a "primeira aparição oficial" do Lindy hop como tendo ocorrido "Numa maratona de dança negra encenada no Manhattan Casino, em 1928". A característica mais usual era o afastamento do seu parceiro, quando era possível tentar "qualquer coisa que você imaginasse". Quando o Lindy hop passou para o lado da platéia branca, virou outra coisa: o termo mais popular para os jovens do swing, o jitterbug, veio dos movimentos saltitantes, nervosos da dança.3

v /Educada nas danças de ritmo rígido, a geração do fim dos anos 1930

substi-tuiu a graça e os movimentos fluidos por uma energia rude, espasmódica. Como o New York Times observou, "o jitterbug branco é mais agradável de se ver, mas o seu original negro é uma outra coisa7t)s seus movimentos nunca são tão exagera-dos a ponto de perder o controle, e existe uma dignidade quase inconfundível na sua coreografia mais violenta". Esta graça era cobiçada pelos fãs do swing que, segundo um colegial do Bronx, "desejavam ter idade suficiente para ir ao Savqy Ballroom, pois era ali que os jitterbugs realmente sensacionais se exibiam".

^Como o Lindy hop e o Suzie-Q, a gíria dos músicos de jazz de repente se gene-ralizou, tanto que ficou sendo o identificador mais fácil de cultura swing para os não convertidos.fcab Calloway ajudou no processo com o seu Hepsters Dictioruzry, lançado em 1938. Começando com os cats, os músicos de banda, esse glossário cobria cada aspecto da vida do swing. Os fãs eram alligators, jitterbugs, rug-cutters, que faziam o Suzie-Q ou o "abrir das asas" para os hide-beaters "se sacudirem" numa "passarela de diversão". Um square, também chamado de icky, era alguém que não entendia a gíria, que era unhep.

/Estas cunhagens espalhaFam-se como brilhantina entre as novas revistas voltadas para o mercado do swing: não apenas Down Beatz Metronome, mas as

publicações para fãs como Swing, Cats Meow, Jam Session e Jitterbug. Este era

J

2 Havia tamblm as jóias Jitterbug, vendidas na Macys: alfinetes na forma de diferentes instrumentos musicais. # 5 Depois do craque de 1929, a palavra

jitters

substituiu

heebtc-jeebics,

denocando extrema ansiedade.

Jinertaucc

era um termo estabelecido para as bebidas alcoólicas durante a Lei Seca, refletindo o desastroso impacto da bebida ilegal venenosa no siscema nervoso.

(9)

um mundo dentro de si mesmo^Em "The Diary of a Jitterbug", o narrador masculino anônimo contou a sua visita ao "grande Festival de Swing no Orchestra Hall", com " j i t t e r b u g s do Cats Meow": "Duke Ellington estava lá, suave e sofis-ticado, e sua banda*certamente nos eletrizou." O impenetrável código do leigo do fim dos anos 1920 tinha sido adotado por uma grande parte da juventude americana.

Isto fora percebido como um modismo, mas enraizou-se. Para Benny Good-man, a mistura racial de sua orquestra e o estilo swing surgiram "do nosso tipo de governo". O crítico britânico Francis Newton4 considerava que o jazz era

"uma música de protesto e rebeldia". A política progressista do New Deal teve um profundo impacto sobre o swing. A figura central nessa associação foi do especialista da indústria musical John Hammond, que combinou ativismo polí-tico com a descoberta, promoção e gravação de artistas como Billie Holiday, Bessie Smith, Fletcher Henderson e Count Basit.Jí

A influência de Hammond sensibilizou Goodman, que havia crescido num ambiente judeu pobre: em 1937, Goodman doou mil dóláres ao Comitê de Au-xílio à Democracia Espanhola e organizou um show beneficente chamado "Estre-las para a Espanha". Uma expressão prática da associação entre swing e política esquerdista foi encontrada no primeiro cabaré integrado de Nova York, a casa noturna e jront popular Café Society, em Greenwich Village. Anunciado como o "rendez-vous de celebridades, debutantes e plebe", o clube era freqüentado por astros e celebridades como o boxeador Joe Louis, Paul Robeson e até Eleanor Roosevelt.

Músicos negros como Duke Ellington e Count Baise davam "um exemplo e um objetivo" para os jovens negros. Para o escritor Ralph Ellison, a exposição conferida aos músicos negros numa época em que .os únicos heróis disponíveis eram desportistas - como o campeão mundial de peso-pesado Joe Louis e o ven-cedor da medalha de ouro nas Olimpíadas, Jesse Owens - era "novidade no mun-do lá fora". Ele pediu que "tomun-dos aqueles que escrevem com tanto conhecimento sobre os meninos negros não terem figuras masculinas com quem se identificar considerassem aflonga e internacional carreira de Ellington e sua banda".

O relacionamento entre todas essas facções nem sempre foi harmonioso, na medida em que o swing se tornava um grande negócio. Muitos negros nas bandas integradas eram adorados no palco e tratados como lixo quando fora dos refletores. As transmissoras de rádio também temiam os boicotes por audiências do sul e de potenciais patrocinadores, e assim limitavam o tempo no ar dado aos pioneiros do swing,como Count Basie e Chick Webb. Bandas de negros, portanto, ficavam

(10)

sem a exposição, a aclamação do público e os ganhos de seus pares brancos. Era uma repetição do Renascimento do Harlem.

Nem o vínculo entre a esquerda e o swing era sempre fácil. Havia um abismo de gerações entre os garotos do swing e seus correspondentes mais velhos. A Va~ riety notou que "os adolescentes de 1938, graças ao swing e ao jitterbug, eram espécimes muito diferentes dos jovens sérios, conscientes da depressão do início da década de 1930, que tinham se rebelado contra os mais velhos ingressando em sindicatos e em vários movimentos "progressistas". Estes joven£agora quase com trinta anos, nutriam por seus sucessores adolescentes um mal disfarçado desdém".

Entretanto, era impossível deter o swing. No fim de agosto de 1938, 100 mil fãs apinharam-se no Soldier Field, em Chicago, para um evento de massa chamado de Chicago Swing Jamboree. Quase tantos quanto os do lado de dentro aglomeravàm-se do lado de fora, empurrando e se acotovelando até que, "com um rugido ensurdecedor", os portões se abriram. Lá dentro a atmosfera parecia "uma bacanal, um boogie-woogie de salão de segunda classe": "Parecia que toda a geração mais jovem da cidade - uma geração nascida desde a Guerra Mundial e marcada pela Depressão — soltava os cabelos, perdia os chapéus e dançava por onde houvesse espaço ao som dos ritmos agitados dos gorilas tocadores de jazz."

/t^uando a banda de Jimmy Dorsey atacou com "Fiat Foot Floogie", a mul-tidão, já enlouquecida, irrompeu, correndo para as pistas de dança, escalando as Arquibancadas do estádio, forçando a banda a se proteger e quebrando o

equipa-mento de palco. Enquanto a ordem era restaurada, os fãs faziam os seus próprios ritmos para acompanhar um grupo de homens e mulheres negros que serpentea-vam dançando no meio da multidão. A imprensa de Chicago ficou chocada com esta exibição maciça de "êxtase jitterbug : um jornal chamou de "a mais estranha manifestação de exuberância talvez jamais vista desde a malfadada cruza-da infantil na Icruza-dade Média".Jj

//O que mais assustava, porém, era o fato de a multidão ser uma mistura de raças - como os ideais promovidos pela própria música. O swing fez algumas incursões na segregação: as grandes orquestras, por exemplo, integraram-se uma -década antes das organizações esportivas ou militares. Este elemento "sincrético" chocou os críticos adultos. O bispo católico de Dubuque denunciou o sV/ing como "diabólico" e "comunista": "Nós permitimos que sessões de jazz, jitterbug e orgias de ritmos canibalísticos ocupem um lugar no nosso esquema de coisas, incentivando a nossa juventude no caminho da vida fácil para o inferno."/

(11)

/A crescente popularidade e consagração pública do swing representava o fato de que, depois de passar quase uma década perdida e em desvantagem na Grande Depressão, a juventude americana começava a recuperar seu status privilegiado. Isto se refletia na produção de Hollywood. Os criminosos brutais, condenados

^pelo destino em filmes como O inimigo público número 1 e Are Thest Our

Chil-drenforam substituídos pelos garotos de rua de Cidade dos meninos- um grande Insucesso em 1938, estrelando Spencer Tracy e o ingênuo Mickey Rooney - que

foram vistos reagindo a um tratamento justo e solidário. Eles não eram essencial-mente maus, apenas injustiçados.y

O Código de Produção significou que os retratos selvagens de delinqüência juvenil ficaram mais raros a partir dos meados da década. Além dos Dead End Kids - os "garotos abandonados que não prestavam para nada" que, alternando entre ousadia c ameaça, roubaram o Dead End sob outros aspectos exagerados -os principais adolescentes de Hollywood podiam ser encontrad-os no seriado de Henry Aldrich e de Andy Hardy. Montados no"cenário clássico do livro para me-ninos, a América provinciana, esses filmes eram extremamente populares: o astro do seriado de Andy Hardy, Mickey Rooney, foi a maior renda de bilheteria nos Estados Unidos em" 1939.

A o contrário de Hollywood, a indústria musical não tinha um código de con-duta externamente imposto. Não era possível proibir a música por causa das suas

associações. Em vez disso, as autoridades começaram a examinar melhor a associa-ção entre músicos e drogas, colocada diante dos refletores pela ostensiva prisão de Louis Armstrong por porte de maconha, em 1931 - que ocorreu apenas al-guns meses depois de Harry Ansjinger ter sido indicado como comissário de drogas narcóticas dos Estados Unidos^Os homens da lei tinham os seus próprios esque-mas de criação de empregos como ninguém mais: com o Volstead Act morto e enterrado, era hora de criar um novo demônio.

^nslinger mirava especificamente a maconha como associada ao jazz, e a sua ."campanha foi incrementada por histórias sensacionalistas amplamente divulgadas. A mais famosa foi o artigo de julho de 1937 que Harry Anslinger escreveu em co-autoria com o amanuense de J. Edgar Hoover, Courtney Ryley Cooper: "Maco-nha: assassina da juventude." Eles se dispuseram a desfazer a grande popularidade da droga que diziam ser tão perigosa quanto uma "cascavel". Em confissões sen-sacionalistas como "Eu fui um viciado em drogas" da True e em filmes como o /sensacionalista Reefer Madness, a maconha estava implicada numa nova explosão

de delinqüência juvenil, suicídios e assassinatos emocionantes,,

A promoção da droga como o novo inimigo público número um por Anslin-ger teve grande sucesso. Em 1937, a aprovação do Marijuana Tax Act tornou ilegal a sua posse se não fosse por motivos médicos. Ele também buscou estender o elo entre músicos e drogas durante a década de 1930^Quase todas as principais

(12)

bandas gravaram pelo menos uma canção sobre maconha, ou sobre ser "viciado cm maconha". Entretanto, a maconha não chegou em grande grau até a platéia branca. Mesmo o sinótico, se não histérico, levantamento da delinqüência juvenil de Courtney Ryley no fim dos anos 1930, Designs in Scarlet, encontrou muito poucas evidências consistentes sobre seu uso.

Essas campanhas não conseguiram impedir que o swing se tornasse uma parte reconhecida de uma tendência geral entre os adolescentes americanos. A pesquisa da Life sobre o "Problema juvenil: 1938" apresentava, entre os seus representantes escolhidos com muito cuidado, um "garoto de escritório" de Maryland, Kenneth Jones, que não fumava nem bebia e queria ser "um político republicano".

Entre-tanto, este rapaz típico passava o seu tempo de folga do emprego numa companhia de seguros tocando bateria numa banda de swing e escutando discos de Jimmie Lunceford com "sua garota".

Para alguns comentaristas, o entusiasmo destes jovens fas do jazz oferecia um otimismo e uma energia muito necessários: um tônico para um país cansado. "O swing é a voz da juventude esforçando-se para ser ouvida neste nosso mundo de rápidas transformações", o New York Times opinou no iijício de 1939. "O swing é o ritmo do nosso tempo. O swing é real. O swing está vivo." Confdrme a guU tura americana continuava a atravessar o Atlântico, a excitação musical e os cantos de sereia da liberdade sensibilizavam os jovens europeus que, diante da desgraça do fascismo ou do lúgubre beco sem saída do desemprego, começavam a sonhar com algo mais.

* * *

^O swing começou a chegar à Europa no fim da década de 1930. O gosto dos britânicos e dos franceses pelo hot jazz havia se estabelecido durante a década de 1920, e a chama se mantivera viva com um núcleo irredutível de fãs que afluíam em bando para ver astros visitantes como Louis Armstrong^Em 1935, a visita de Cab Calloway aos Estados Unidos foi marcada por um encontro de jazz onde "as pessoas subiam ao palco e depois tentavam arrancar nossas roupas quando saíamos do teatro". Nos meados dos anos de 1930, havia revistas dedicadas ao tema como a HotMusic e a Swing, e o crítico francês Charles Delaunay publicou

a sua revolucionária Hot Discography.

/A entrada do swing na Grã-Bretanha foi dificultada quando o Sindicato dos Músicos proibiu bandas americanas visitantes, cm 1935. A moda prevalecente era a favor dos passos recomendados - o foxtrote, a valsa, o quickstep - mas, lá pelo fim da década, o estilo livre do swing começou a se tornar mais popular. Em novembro de 1938, um repórter do Mass-Observation no Streatham Locarno notou um novo estilo de dança chamado trucking. "A idéia do swing é você ir

(13)

inventando enquanto dança: estas pessoas estão fazendo swing com seus pés, troca de pés e bamboleios; é tudo muito diferente dos passos formais do foxtrote"/ As danças animais tinham voltado sob um novo disfarce e, como na década de

1910, elas eram, para muitos freqüentadores dos salões de baile, uma interrup-ção alienígena.

/Nem na Grã-Bretanha nem na França a adoção do estilo swing foi conside-rada excepcional. Entretanto, na Alemanha, ser fã do swing era mais arriscado. "O regime havia desprezado o jazz desde o início. A visão deles foi resumida por uma líder da Juventude Hitlerista no verão de 1936: "O negro tem muita facili-dade para o ritmo, e sua arte' talvez seja indígena, mas, não obstante, ofensiva aos nossos sentimentos. Certamente essa coisa pertence aos hotentotes e não a um clube de dança alemão. O judeu, por outro lado, tem tramado estas aberrações de propósito."//

/A Alemanha nazista tinha sido um Estado muito censurado desde o início. Em setembro de 1933, o ministro da Propaganda Joseph Goebbels instituíra o Reichskulturkammer, com seis seções distintas para rádio, teatro, cinema, redação criativa, imprensa e música. O Reichsmusikkammer dispunha-se a controlar as atividades de cada músico na Alemanha, introduzindo cartões de sócios, sem os quais era proibido tocar em público. Em dezembro de 1937, a música "alienígena" foi oficialmente condenada.

O Reichsrundfiinkkammer censurou o rádio. Esta mídia fazia parte integrante da propaganda de Goebbels e, fora os discursos e canções nazistas, ele a preenchia com músicas leves. O jazz era um problema espinhoso, tendo gozado de conside-rável sucesso na Alemanha de Weimar nas mãos de visitantes como Josephine Ba-ker ou Sidney Bechet, ou de bandas domésticas como os Syncopators, de Stefan Weintraub. Embora visto por muitos nazistas como "a podridão de uma sociedade decadente", o hot jazz era parte da sociedade tecnológica, consumista, que o re-gime continuou a promover até o fim dos anos 1930.f/

Era mais fácil dizer que se controlava a mídia do que fazê-lo. Os hot clubs remanescentes faziam uso tocai das brechas no seu Estado totalitário. Até o fim de 1937, pequenos grupos em Düsseldorf (como o International Rhythm Club), Berlim (o Melodie Klub) e em outras cidades como Leipzig ainda conseguiam comprar discos de jazz produzidos na Alemanha. Ao mesmo tempo, eles podiam viajar dentro da Alemanha para ver as bandas. Graças ao poderoso transmissor da Rádio Luxemburg, eles também podiam escutar shows não censurados e, como as viagens internacionais não foram restringidas até 1938, ir ao exterior encontrar seus ídolos.

tfO status do jazz continuava ambíguo. Ele era ativamente visado pelo grupo policial da Juventude Hitlerista depois da lei de 1936. Havia cenas freqüentes, como a destruição de discos que ocorria quando membros da tropa descobriam

(14)

um grupo de adolescentes escutando jazz numa praia do Báltico. Os espiões do R e i c h s m u s i k k a m m e r , facilmente reconhecíveis por suas roupas surradas, eram regularmente vistos em nightclubs e salões de dança. Ao mesmo tempo, Goebbels era forçado a ceder ao gosto alemão pelo jazz exibindo, tarde da noite, um mí-nimo de tépidas produções domésticas na rede de emissoras alemãs/

Ai dificuldades de ser um entusiasta do jazz foram suportadas com boa dispo-sição porque a música continha a promessa de um outro inundo. O grupo nasci-do entre 1920 e 1925 sofrerá com a pressão para ingressar na Juventude Hitlerisfa,* mas um pequeno, porém persistente, número de hot clubs continuava a levar a „' vida do jazz até onde fosse possível/lodo os membros do International Rhythm Club, de Werner Daniels, sediado cm Düsseldorf, adotaram nomes anglo-ame-ricanos e se cumprimentavam com saudações como "Swing high". Identificando-se com os negros do Harlem, e não com a Juventude Hitlerista, eles formaram uma banda amadora de jazz antes que o serviço militar os convocasse.^

O maior grupo era o Hamburg Swing Youth. Centrado em adolescentes cos-mopolitas como o meio-cipriota Demetrius "Kaki" Geordiadis e o grego nascido na Holanda, Andreas Panagopoulous, uma "turma do rinque de gelo" formóu-se durante o inverno de 1937. Primeiro, eles formóu-se reuniam nas casas dc formóu-seus pais ricos, vestindo roupas escandalosas e exibindo uma insultante predileção pela mú-sica inglesa. Nesta fase, seu impulso nada mais era do que se divertir. Entretanto, quando começaram a aparecer em público, desfilando pelas ruas mais elegantes da cidade, assobiando refrãos do swing, os problemas começaram.

A introdução da "dança social" chamada swing na segunda metade de 1937 colocou os fãs do jazz em conflito declarado com as autoridades. Baseado

livre-mente no Lindy hop visto no filme americano Broadway Melody ofl936, o swing

enfatizava os movimentos de braços e pernas soltos dos pares. Havia a dança de rosto colado, mas, segundo o historiador Michael Kater, os parceiros "em geral acompanhavam a velocidade agitada da banda propulsora, aproximando-se e afas-tando-se um do outro e transpirando sexualidade". Comparada com% sucedâneo nazista, esta dança selvagem era mais excitante para os praticantes do "Swing Hei-ni" ou "Swing Baby".

Entretanto, ela infringia a rígida disciplina militarista que os nazistas busca-vam inculcar em toda a juventude alemã. Durante 1937, a SS explicitamente de-nunciou Benny Goodman e George Gershwin. A isto se seguiram as interdições locais ao jazz dançado em público. Em Hamburgo, o administrador local conde-nou a dança swing como "um dos mais terríveis produtos de danças negras do pe-ríodo". Em Berlim, o salão de baile Moka Eíti foi coberto de cartazes de verboten semelhantes. Entretanto, estas tentativas de controle foram ignoradas com sucesso pelo Swing Heinis. O sistema panóptico de Goebbels ainda não estava vendo tudo.

(15)

* * *

sua vez, o vírus nazista atravessara o Atlântico. Em fevereiro de 1939, o Ger-man-American Bund realizou seu maior comício até aquele momento no Madison Square Garden. "O salão estava abarrotado com 20 mil homens, mulheres e mui-tas crianças", escreveu o investigador disfarçado, John Roy Carlson. "No alto da plataforma dos alto-falantes erguia-se uma enorme figura de George Washing-ton, ladeada por suásticas gigantescas. De algum ponto nos fundos do salão vinha um som abafado de tambores; como uma legião nazista à paisana, 1.200 solda-dos marchavam por trás das bandeiras com a suástica e as flâmulas do Partido Nacional-Socialista Alemão!"

Apesar da confessada intenção das organizações fascistas de formar grupos de jovens em faculdades em todo o país, os rapazes a quem este programa atraía vinham na sua maior parte "de lares destruídos ou desmoralizados, e tinham registros de crimes sexuais, incorrigibilidade e pequenos furtos ou outro compor-tamento antissociaT.^barlson notou o diálogo de um seguidor "típico" do padre Charles E. Coughlin: "'Leia a Justiça Social e veja como solucionar a questão dos judeus'. 'Como?' Eu me virei para o jovem adolescente espinhento. 'Coloque-os contra a parede e ra-ta-tá neles!'"

As acirradas batalhas de rua formaram o cenário para o romance de James T. Farrell sobre um jovem seguidor de Coughlin, Tommy Gallaghers Crusade. O seu jovem fascista pode ter sido pouco mais do que um incômodo, mas o Bund foi uma ameaça política mais séria. Formado por Fritz Julius Kuhn, um veterano do putscfi de Munique, o objetivo do Bund era congregar apoio para Hitler nos Estados Unidos e dar aos americanos de origem alemã, vítimas de preconceito durante a Grande Guerra, uma oportunidade para conhecerem sua herança cultu-ral. Nos seus programas juvenis, as crianças aprendiam a falar alemão e a saudar .a suástica.

Quando Carlson infiltrou-se num acampamento do Bund em Long Island - um dos 24 na América —, encontrou um mini Estado nazista: "Às três horas um carro apareceu e 12 membros uniformizados do Jugendscha.fi saíram em fila. O Jugendschaft (a divisão juvenil masculina do Bund) seguia os moldes dájuven-tude Hitlerista. Seus membros usavam botões com a suástica e levavam o seu emblema - um pequeno raio contra um fundo preto. As curtas adagas que car-regavam tinham a inscrição Blut undEhre (Sangue e Honra), significando aliança eterna à Pátria.'^

' Ele havia emigrado para Detroit a fim de trabalhar na Fábrica da Ford e foi incentivado pelo antissemitismo expresso por Ford em

Dtarborn Independem.

(16)

Estes fenômenos malignos ocorriam contra o pano de fundo de uma situação internacional cada vez pior. No verão, o estado de espírito na América era tão tenso quanto seu clima úmido: os jornais diários estavam cheios de notícias sobre a crise de Danzig, com colunas defendendo a posição isolacionista./tm agosto, uma primeira página do New York Daily Mirror retratava um membro do Bund de Brooklyn, de 19 anos, Helen Vooros, fazendo a saudação nazista. O seu testemunho ao Dies un-American Investigating Committee foi inequívoco: "A Alemanha", ela disse, "esperava conquistar os Estados Unidos no futuro."7

Esta ameaça ecoou porque, dez anos depois do craque, mais de um quarto de todos os alunos que abandonaram as escolas estavam tendo dificuldade para encontrar trabalho. Os bebês nascidos na explosão demográfica da década de 1920 estavam perigosamente à solta. Uma importante pesquisa da American Youth Comission, Youth TellTheir Story, relatou que os adolescentes na América "ficam muito à toa, e prefeririam estar fazendo outra coisa". Courtney Ryley Cooper estimou que "4 a 5 milhões de jovens entre 16 e 25 anos estão fora da escola e do mercado de trabalho, vagando sem rumo suas comunidades em busca de uma válvula de escape para suas energias".

Os jovens da América estavam aparentemente maduros para qualquer coisa - assassinato, motim ou revolução - e naquele momento crucial não havia, segundo o ensaísta e jornalista Walter Lippman, "uma fé garantida" que os fizesse alistar seu apoio. Em um ensaio fundamental, o artigo de capa do número de julho de 1939 da revista Life sobre "Américas Future", Lippman evocou a idéia de John Fiske do Destino Manifesto da América. "Nossas preferências nacionais valem pouco nos grandes movimentos históricos", ele concluiu. "O que Roma foi para o mundo antigo, o que a Grã-Bretanha tem sido para o mundo moder-no, a América será para o mundo de amanhã."

O ímpeto por trás deste olhar de bola de cristal vinha da abertura da Feira Mundial de 1939, realizada em Flushing Meadows, Nova York. Desde a Exposi-ção de Chicago de 1893, a América havia se sobressaído nesses eventos teatrais. Intitulada "O mundo de amanhã", a feira de 1939 era uma exibição genuina-mente global, com contribuições de mais de sessenta nações (excetuando-se a Alemanha). Ao mesmo tempo, as formas aerodinâmicas dos pavilhões e o logotipo trançado da feira do Pherisphere e do Trylon foram reproduzidos pelo mundo inteiro: símbolos de sonho da utopia tecnológica prestes a acontecer.

A Feira Mundial atraiu muita publicidade prévia. "Uma vez antevisto o Mundo de amanhã", entusiasmou-se o Harpers Bazaar, "não se pode mais olhar para trás". O artigo do Harpers vendia a feira para os leitores adolescentes: "No dia 30 de abril de 1939, vamos começar a olhar para o fututo. b&o para o fu-turo como aquele evocado pelas velhas senhoras nos salões de chá ciganos, mas

(17)

o futuro real, contado por cientistas, arquitetos, artistas, inventores e especialistas em ilunfinação num fantástico mundo novo, erguido de um monte de lixo nas planícies Flushing. Você pode entrar ali como uma menina moderna. Você vai sair como uma garota do futuro.

* * •

/ÍDurante este quente e lânguido verão, a Mecro-Goldwyn-Mayer estreou O mágico de Oz em Nova York. Foram quase dois anos para esta versão do clássico de Baum chegar às telas, quase quarenta anos depois da primeira publicação do livro. O estúdio tinha planejado o filme como um épico para competir com o mercado dominado por ShirleyTemple, da Fox, a maior renda de bilheteria de 1936, 1937 e 1938. Ele também estava destinado a coincidir com o estilo da Hollywood con-temporânea que os roteiristas Florence Ryerson e Edgard Allan Woolf chama-ram de "a debandada de volta às horas simples, despreocupadas, da infância" J

Para conseguir esta idílica simplicidade, O mágico de Oz tinha sido uma filmagem extremamente complexa. Com muitos cenários, um imenso elenco de extras e inovações tecnológicas radicais, a produção levou quase seis meses e ultrapassou o orçamento, terminando com quase o dobro do custo de um filme importante da MGM. O estúdio foi obrigado a pagar sérias indenizações e co-locou em ação um vigoroso ataque promocional em massa que começou em maio de 1939 e continuou crescendo nos três meses seguintes até estourar nas bilhe-terias no mundo inteiro.

Todas as mídias estavam incluídas, fossem cartões-postais gratuitos, distribui-ção de folhetos, flâmulas nos saguões dos cinemas, cartazes, produtos vinculados e elegantes livros de campanha, ou uma multidão de fotografias posadas e artigos diferentes, cada um visando precisamente às diferentes revistas e jornais mais lidos. A melodia tema do filme, "Over the Rainbow", tinha sido escrita pelos autores Yip Harburg e Harold Arlen com a intenção de ser uma "canção de saudade". Interpretada pela protagonista de 16 anos, Judy Garland, em agosto ela foi a mais tocada no país.

A MGM decidiu enviar Judy Garland numa turnê que coincidisse com a estreia do filme em cada cidade. A estrela em ascensão seria acompanhada pelo rapaz mais cotado do país: Judy Garland e Mickey Rooney já tinham se

estabele-cido como um dueto no filme de 1938, Love Finds Andy Hardy, e o estúdio

que-ria promover o seu próximo musical, Babes in Arms. Ambos eram consumados e populares veteranos do vaudeville, mas ninguém poderia ter previsto a reação que se iniciou com a primeira aparição do par - no dia 9 de agosto em Washing-ton - e ela foi aumentando nos três dias seguintes em Connecticut.

(18)

Em Nova York, a intensa publicidade prévia chegou ao a'pice. O concurso para ser um dos 150 membros da "comissão oficial de boas-vindas" havia recebi-do 250 mil inscrições. Quanrecebi-do Garland e Rooney chegaram a Manhattan ao meio-dia da segunda-feira, 14 de agosto, os poucos selecionados foram submer-sos por uma "multidão cercada por cordas, que gritava, delirante, transpirando", de 10 mil fãs que encheram a Grand Central Station. O New York Daily News retratou Judy Garland nuijia pose de quem está sendo crucificada entre dois policiais que tentavam salvá-la, o rosto contorcido num rito de dor e choque.

No dia da estreia oficial no Capitol Theatre, terça-feira, 15, a fila começou a se formar na Broadway às 5:30 da manhã. Quando os 5 mil bilhetes começaram a ser vendidos às oito horas, a polícia estimou haver 15 mil pessoas do lado de fora do teatro, no fim formando uma fila que dava de cinco a seis voltas no quar-teirão entre as ruas 50 e 51, a Broadway e a Oitava Avenida. Desta vez, os repór-teres analisaram bem este enxame predominantemente feminino e observaram que "cerca de 6 0 % da multidão era formada por menores de idade".

Pasmos com a recepção que tiveram, Garland e Rooney rapidamente se re-cuperaram e foram os mais profissionais possíveis nos números de dança e canto que se intercalavam com as performances do filme em si. No final do dia, eles haviam dado sete shows para 37 mil clientes: segundo o Holywood Repórter, "o excedente encheu quase todas as outras casas da Broadway, congestionaram os restaurantes, as lanchonetes e as confeitarias". Com notícias delirantes, este pa-drão continuou por quase duas semanas até a última aparição de Rooney no dia 30 de agosto: performances abarrotadas, ruas congestionadas, astros atacados.

Outras demonstrações de massa por atores de cinema já haviam ocorrido: mais notadamente depois da morte de Rodolfo Valentino, cm agosto de 1926. Enrretanto, esta invasão das ruas de Manhattan foi marcada pela natureza da /multidão - não vampiresca e não violenta - e a natureza dos astros, desta vez bem

vivos h a aconteceu quase a despeito de Hollywood, que tinha pouca noção do que fosse o mercado adolescente. Apesar da excessiva publicidade, O mágico de Oz não tinha sido planejado como um filme juvenil, mas como uma história de fadas que havia se subordinado à crescente popularidade dos seus dois astros.^ /Nem eles eram adolescentes típicos. Judy Garland e Mickey Rooney eram 'produtos altamente especializados de uma educação para o vaudeville inseguro,

itinerante: nada parecidos com os garotos da casa ao lado. Eles também personi-ficavam a elisão etária que marcara o marketing adolescente até então. Embora homenageados por Hollywood como "o espírito e personificação da juventude", Rooney tinha l,60m de altura, pequeno para a sua idade. Aos 17 anos, podia parecer ter 12, como no seu veículo de 1938, Boys Town\ "A maioria dos atores chega a esta idade em que começam a crescer e atingem o que chamam de ida-de ida-desengonçada", ele disse, "e aí eles têm que parar, eu não cresci assim."

(19)

A sua coestrela era igualmente excêntrica. Presà por um contrato ao "reino feudal" da Metro-Goldwyn-Mayer em 1935, Judy Garland tinha passado por uma reforma desde os 13 anos de idade. Seu corpo - deficiente pela perspectiva de Hollywood - foi impiedosamente remodelado: cintas para a cintura, jaquetas para os dentes, benzedrina em 1937 quando o seu peso se tornou excessivo. Com 16 anos durante'a filmagem de Oz, Garland tinha os seios enfaixados para pa-recer ter 12 - algo entre a Dorothy do livro e a adolescente desabrochada do Oz no teatro, em 1902. Mas o processo industrial de transformar humanos em astros e estrelas não significava nada para os fãs./

A fome da multidão jovem - por algo que fosse deles, por uma desculpa para se expressarem - fez o evento. Uma vez dentro do Capitol, eles encontraram o que qi|:riam: a nova tecnologia estonteante que dava às seqüências coloridas "lima estranha, acentuada qualidade" e oferecia uma metáfora para sua própria situação. A vida insípida de Dorothy abrindo-se numa busca de liberdade, amiza-de e transformação, onamiza-de você podia encontrar amigos como você mesmo e ser quem você queria ser.

No dia 27 de agosto, Judy Garland e Mickey Rooney visitaram a Feira Mun-dial, que se manteve aberta especialmente para a recém-coroada realeza da nova cultura juvenil. Durante cerca de duas horas, eles viajaram no Stratoship, no Aerial Joyride, na Road ofTomorrow e ao redor do Ford Building. Eles visitaram

oThea-ter of Time and Space e o Theme Exhibit of the Worlds Fair, onde você podia olhar lá embaixo a "Democracia", "a cidade jardim planejada e integrada do futu-ro". Foi, Garland mais tarde lembrou, "a noite mais maravilhosa da minha vida".

No dia 29 de agosto, a Macys de Nova York causou furor com anúncios de página inteira para os "Vestidos de Judy Garland" em liquidação no seu "Depar-tamento Juvenil" especial. Havia também artigos vinculados aos shows no Capitol e uma lateral na página mostrando um chapéu do "Mágico de Oz". "Desenhadas e escolhidas pela própria Judy Garland", estas peças de crepe e lã acinturadas ti-nham como alvo "as teenagers que têm exatamente a idade de Judy,.. meninas que estão crescendo com idéias adultas. Elas acreditam firmemente que ninguém é jo-vem demais para um certo glamour". Três dias depois, a Europa entrava em guerra.

Referências

Documentos relacionados

O trabalho utiliza, como base, a proposta de Sandra Ramalho e Oliveira, em seu artigo “Imagem também se lê” (2006) para a leitura de imagens, iniciando pelo escaneamento

  Imunidade  adquirida,  provocada  e  passiva...   Usar  preservativo  e

E porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas.. E porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a

A ira de Deus se revela contra os nossos pecados, e a Sua perfeita justiça exige a nossa condenação eterna, mas a misericórdia e longanimidade de Deus também

Atualmente, os plásticos cintiladores de pequeno volume (até 9 litros) são produzidos rotineiramente no IPEN-CNEN/SP pela polimerização do monômero de estireno, contendo

O folclore brasileiro é riquíssimo, pois teve suas origens em três grandes culturas, a indígena, a africana e a europeia, o que levou a uma grande diversidade de

A finalidade deste estudo foi determinar não somente a prevalência e a distribuição espacial da LVC, mas também verificar os sinais clínicos em cães com

Mesmo que seja um profeta, como foi o caso do primeiro homem, você não tem justificativa para desobedecer à palavra de Deus.. O ensino é o seguinte: se Deus tirou a vida de