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Discurso gestor e gestão do trabalho em shopping center: uma análise da organização e controle do trabalho em shoppings no Brasil

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Luísa Bonetti Scirea

DISCURSO GESTOR E GESTAO DO TRABALHO EM SHOPPING CENTER: Uma Análise da Organização e Controle do

Trabalho em Shoppings no Brasil

Dissertação submetida ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção do Grau de Mestra em Sociologia Política. Orientadora: Profª. Drª Maria Soledad Etcheverry Orchard.

Florianópolis 2018

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Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária

da UFSC. Bonetti Scirea, Luísa

DISCURSO GESTOR E GESTÃO DO TRABALHO EM SHOPPING CENTER: Uma Análise da Organização e Controle do Trabalho em Shoppings no Brasil/

Luísa Bonetti Scirea ; orientadora, Maria Soledad Etcheverry Orchard , 2018.

272 p.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política, Florianópolis, 2018.

Inclui referências.

1. Sociologia Política. 2. Discurso. 3. Gestão do Trabalho. 4. Shopping Center. I. Orchard , Maria Soledad Etcheverry . II. Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política. III. Título.

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Esta dissertação não teria sido realizada sem que tivessem me sido dadas as condições para realizar a pesquisa e escrita. Agradeço ao Governo Federal Brasileiro e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de estudos a mim concedida e pela manutenção da gratuidade do ensino, o que me permitiu cursar o programa de pós-graduação.

Agradeço ao Programa de Pós-graduação em Sociologia Política, aos professores e professoras, amigas (os) e colegas que percorreram este caminho comigo e com os(as) quais aprendi muito. Em especial, agradeço à minha orientadora, professora Maria Soledad, por ter me orientado e acompanhado durante todo o mestrado, pelo acolhimento, generosidade e paciência com que trata a todos(as) que a procuram; aos professores Raul Burgos, Jacques Mick e Ernesto Seidl, suas aulas foram fundamentais e desafiadoras para mim, marcaram minha passagem pelo mestrado. À Albertina Volkmann, Fátima da Silva e ao Otto Frederico Volkmann, que são as responsáveis por fazerem a pós-graduação funcionar, meu reconhecimento e agradecimento pelo trabalho que realizam.

À Federação dos Trabalhadores no Comércio no Estado de Santa Catarina (FECESC); ao Sindicato dos Empregados no Comércio de Florianópolis (SEC); e ao Sindicato dos Empregados em Edifícios e em Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis de Florianópolis (SEEF) e seus respectivos líderes sindicais que gentilmente atenderam minha solicitação de entrevista e participaram como interlocutores na elaboração deste material, meu grande agradecimento.

Ao meu pai, Romeu, meu grande incentivador, e à Ia, minha boadrasta, ao Vini, à Lari, à Natália, à Diane, ao Romulo, ao Milk, ao Kevin, à Nat, à Jennifer, à Carito, à Rari, ao João que foram os(as) amigos(as) mais próximos, me acompanharam durante o mestrado, ouviram minhas dificuldades e alegrias e me auxiliaram de diferentes formas a concluir esta dissertação, meu reconhecimento e agradecimento. Ao Rapha, que desafia constantemente as dimensões de ser um companheiro maravilhoso e que esteve comigo dando todo o suporte e incentivo, e também passando pelas crises junto, meu reconhecimento que esta dissertação não teria sido concluída sem você. Às minhas queridas tias, Aidê, Iaia, Carla, Dea, à minha irmã, Ju, e à minha prima, Amandinha, agradeço por todo apoio que me deram ao longo desta dissertação e da vida; à minha mãe, Vivi, a causa primeira de tudo, agradeço por sempre ter me estimulado a desenvolver uma leitura e

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RESUMO

A discussão sobre o trabalho em serviços ganha destaque contemporâneo na medida em que se expande o setor, apresentando o maior aumento de postos de trabalho comparativamente com outras áreas do mercado e trazendo novos desafios aos estudiosos do mundo laboral. O shopping center é um símbolo contemporâneo de comércio e serviços globalizados e emprega um grande número de trabalhadores(a), contudo pouco se sabe sobre as características que a gestão do trabalho assume dentro destes empreendimentos. Esta dissertação tem por objetivo compreender os efeitos de sentido da gestão do trabalho em shopping center a partir da análise do discurso gestor inscrito na coletânea de livros “Gestão em Shopping Centers” organizada pela Associação Brasileira de Shopping Center. A pesquisa é realizada a partir da teoria e metodologia da Análise do Discurso Francesa em diálogo com as discussões sobre trabalho, serviços e gestão vindas do campo da Sociologia do Trabalho. Parte-se do entendimento que a gestão do trabalho é realizada tanto de maneira direta, com trabalhadores contratados pela administração do shopping, como indireta, a partir das relações contratuais estabelecidas entre shopping center, lojas comerciais e empresas prestadoras de serviços terceirizados. Apesar das obras indicarem a existência de diferentes sujeitos e alguma variedade de formações discursivas, percebe-se uma formação discursiva dominante centrada na eficiência e disciplinamento do trabalho que vincula os sentidos da gestão do trabalho às metas de eficiência produtiva e retorno financeiro ao(à) investidor(a).

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ABSTRACT

The discussion about labor in services gains contemporary prominence as the sector expands, presenting the biggest increase of working positions comparatively with other areas in the market and bringing new challenges to scholars of the labour sphere. The shopping mall is a contemporary symbol of trade and globalized services and it employs a large number of workers. Nonetheless, little is known about the features that the new labor management assumes within these enterprises. This dissertation aims at comprehending the effects of meaning of the labor management within shopping malls from the analysis of managing discourse inscribed in the book collection “Gestão em Shopping Centers” organized by Associação

Brasileira de Shopping Center. The research is carried out based on the

theory and methodology of the French Discourse Analysis alongside with Labor Sociology’s discussions about labor, services, and management. It is understood that the labor management is carried out both directly, with workers hired by the shopping mall administration, and indirectly, from the contractual relations established between the shopping mall, commercial premises, and outsourced service companies. Even though the collection indicates the existence of different subjects and some variety of discursive formations, it is perceivable a dominant discursive formation centered in the efficiency and disciplining of labor that binds the effects of labor management meanings to the productive efficiency goals and the financial return to the investor.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Quantidade de Teses e Dissertações por Área e Período...87 Figura 2 – Total de Teses e Dissertações Em Ciências Humanas por Ciência Específica...87 Figura 3 – Total de Teses e Dissertações em Ciências Sociais por Tema...88 Figura 4 – Quantidade de Artigos e Trabalhos Acadêmicos por Período...89 Figura 5 – Quantidade de Artigos e Trabalhos Acadêmicos por Área e Período...90 Figura 6 – Temas dos Artigos e Trabalhos em Ciências

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Síntese metodológica da pesquisa ...25 Quadro 2 - Efeito Metafórico...40 Quadro 3 - Piso Salarial em Setembro 2016...131

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABL – Área Bruta Locável

ABRASCE - Associação Brasileira dos Shopping Centers ALSHOP - Associação Brasileira dos Lojistas de Shopping ADF – Análise do Discurso Francesa

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CDC – Código de Defesa do Consumidor

CEF – Caixa Econômica Federal CEO- Chief Executive Officer

CFTV – Circuito Fechado de Televisão

CIIU - Clasificación Industrial Internacional Uniforme de todas las Actividades Econômicas

CLACSO - Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales CLT - Consolidação das Leis do Trabalho

CNAE – Classíficação Nacional de Atividades Econômicas CRM – Consumers Relationship Management

CSC – Centro de Serviços Compartilhados CT – Comitê técnico

CUT – Central Única dos Trabalhadores DEM - Democratas

DIEESE – Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos

FECESC – Federação dos Trabalhadores no Comércio no Estado de Santa Catarina

FGTS - Fundo de Garantia do Tempo de Serviço GPTW – Great Place To Work

HT – Hand Talkie

IBGC - Instituto Brasileiro de Governança Corporativa IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBOPE – Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística ICSC – International Council of Shopping Centers

INSS - Instituto Nacional do Seguro Social IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada PCdoB – Partido Comunista do Brasil

PDT – Partido Democrático Trabalhista PIB – Produto Interno Bruto

PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua PP – Partido Progressista

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PSB – Partido Socialista brasileiro

PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira PSOL – Partido Socialismo e Liberdade

PT – Partido dos Trabalhadores PTB – Partido Trabalhista Brasileiro

RECON – The Global Retail Real Estate Convention RH – Recursos Humanos

SC - Shopping Center

SCIELO - Scientific Electronic Library Online

SEC –Sindicato dos Empregados no Comércio de Florianópolis

SEEAC (RS) – Sindicato Intermunicipal dos Empregados em Empresas de Asseio e Conservação e de Serviços Terceirizados em Asseio e Conservação no Estado do Rio Grande do Sul

SEEF – Sindicato dos Empregados em Edifícios e em Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis de Florianópolis SEEVISSP (SP) – Sindicato do Empregados em Empresas de Vigilância, Segurança e Simulares de São Paulo

SEICON (DF) - Sindicato dos Trabalhadores em Imobiliárias e Condomínios do Distrito Federal

SIEMACO (SP) – Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Prestação de Serviços de Asseio e Conservação e Limpeza Urbana de São Paulo

SINDEC (RS) - Sindicato dos Empregados no Comércio de Porto Alegre

SINDEF (RS) – Sindicato dos Trabalhadores em Edifícios e Condomínios do Estado do Rio Grande do Sul

SINDESV (DF) – Sindicato dos Vigilantes do Distrito Federal SINDICOM (DF) - Sindicato dos Empregados no Comércio do DF SINDIFÍCIOS (SP) – Sindicato dos Trabalhadores em Edifícios e Condomínios de São Paulo

SINDILIMP (SC) - Sindicato dos Empregados em Empresas Prestadoras de Serviço de Asseio e Conservação no Município de Florianópolis SINDILOJAS (RJ) – Sindicato dos Lojistas do Comércio do Município do Rio de Janeiro

SINDISERVIÇOS (DF) – Sindicato dos Empregados em Empresas de Asseio, Conservação, Trabalho Temporário, Prestação de Serviços e Serviços Terceirizáveis no Distrito Federal

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SINDVIG/FPOLIS- Sindicato dos Empregados em Empresas de Vigilância e Segurança Privada Prestadoras de Serviços no Município de Florianópolis

SLAs – Service Level Agreements

SWOT - Strengths, Weaknesses, Opportunities, Threats TCC – Trabalho de Conclusão de Curso

TST - Tribunal Superior do Trabalho

TIC - Tecnologia da Informação e Comunicação UFSC- Universidade Federal de Santa Catarina UGT – União Geral dos Trabalhadores

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SUMÁRIO

1INTRODUÇÃO ... 21

1.2 METODOLOGIA ... 25

2 O MUNDO DO TRABALHO CONTEMPORÂNEO E AS PESQUISAS SOBRE TRABALHO E SHOPPING CENTER NO BRASIL ... 41

2.1 O MUNDO DO TRABALHO E SUAS TRANSFORMAÇÕES ... 41

2.1.1 A Expansão dos Serviços no Brasil e a Cidade de Florianópolis ... 41

2.1.2 A Crise do Mundo do Trabalho e o Conceito de Trabalho. ... 47

2.1.3 Gestão, Organização e o Controle do Trabalho ... 59

2.2 AS PESQUISAS SOBRE TRABALHO E SHOPPING CENTER NO BRASIL ... 86

3 CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO DOS SHOPPING CENTERS ... 95

3.1 SHOPPING CENTERS: SURGIMENTO E CARACTERÍSTICAS ... 95

3.2 O SHOPPING CENTER NO BRASIL ... 111

3.3 A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SHOPPING CENTERS E O TRABALHO EM SHOPPING CENTER ... 119

3.3.1 Prêmio Destaque Melhor Shopping para Trabalhar (ABRASCE & GPTW) e o trabalho em shopping centers ... 128

3.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEGISLAÇÃO E RELAÇÕES ENTRE SHOPPING CENTER, LOJISTAS E TRABALHADORES(AS) NO BRASIL ... 140

4SHOPPING CENTER, GESTÃO DO TRABALHO E EFEITOS DE SENTIDO ... 159

4.1 CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO DA SERIE DE LIVROS “GESTÃO” DA ASSOCIAÇAO BRASILEIRA DE SHOPPING CENTERS ... 159

4.2 SHOPPING, GESTÃO DO TRABALHO E EFEITOS DE SENTIDO .... 164

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 237

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ABRASCE ... 255 APÊNDICE B - Livros da série Gestão (ABRASCE) ... 261

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1 INTRODUÇÃO1

O trabalho em serviços, perpassado pelo imaginário de um trabalho “livre, criativo”, ganha destaque dentro das discussões e pesquisas sobre o trabalho na medida em que os serviços aumentam sua participação na economia mundial e o número de postos de trabalho gerados. Contudo, quando se enuncia sobre o maior centro de consumo e serviços globalizados do mundo contemporâneo, os shopping centers, pouco se fala sobre o trabalho. Esta dissertação parte do pressuposto que o trabalho é uma dimensão central para a existência do shopping center, assim como para a existência de qualquer outra organização produtiva, mesmo quando no setor de serviços.

Nossa abordagem segue um movimento de pesquisa que se iniciou em um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)2. Este focava nas relações de trabalho e sociabilidade estabelecidas entre um grupo de trabalhadoras de uma loja de shopping center, numa abordagem de caráter etnográfico e partindo de um “ponto de vista” das trabalhadoras. A partir da experiência etnográfica, percebeu-se que as relações e condições de trabalho dentro da loja ganham especificidades pela sua localização dentro de um shopping center. Os limites e possibilidades da pesquisa etnográfica focada nas trabalhadoras, em que se privilegiou as relações estabelecidas entre as trabalhadoras dentro da loja, não permitiam uma elaboração maior acerca desta “outra dimensão das relações de trabalho” que se expressava dentro da loja, mas que provinha de outros espaços e tempos, não imediatamente acessíveis às trabalhadoras. Foi buscando este “outro” das relações de trabalho de uma loja de shopping, que se voltou a atenção para o modo como se constituía as relações entre os(as) proprietários das lojas (conhecidos dentro do universo de shopping center como “lojistas”) e os(as) gestores(as) e proprietários(as) do shopping, autodenominados(as) conjuntamente como “empreendedores”.

1 Nesta dissertação optou-se por usar os dois gêneros (masculino e feminino) para se caracterizar os sujeitos. Esta é uma escolha vinculada a uma política de escrita que busca destacar a não neutralidade da língua e também para se destacar o fato de que o trabalho em shopping, assim como o trabalho dentro do setor de serviços, é majoritariamente desenvolvido por mulheres. Quando utiliza-se conceitos ou termos de autores e autoras citados(as) ou instituições, mantem-se a forma original de escrita usada por estes(as), colocando estas entre aspas.

2 BONETTI SCIREA. Luísa. “ESSA É DAS NOSSAS!”: o(s) sentido(s) e

expectativa(s) do trabalho em uma loja de shopping em Florianópolis. 2016,

64 f. TCC (Graduação) – Curso de Ciências sociais, CFH, Universidade Federal de Santa Catarina. 2016

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A dimensão da gestão, ainda que sempre presente e efetivamente sentida pelos(as) trabalhadores(as), tem limitações de apreensão sob seu ponto de vista na medida em que várias decisões se constituem em tempos, lugares e processos que vão além do domínio e contato imediato do(a) trabalhador(a). É preciso também compreender como gestores(as) pensam, organizam e controlam o trabalho e o shopping center. Uma maneira de se fazer isso é a forma como escolhemos realizar este trabalho: analisando o discurso gestor sobre shopping center.

O termo discurso se remete a uma dimensão simbólica, mas também prática da gestão, um “efeito de sentido entre interlocutores” (ORLANDI, 2013). Isso implica em uma concepção de linguagem, como explica Eni Orlandi (1996; 2013), como um trabalho simbólico que medeia as relações humanas e nos constitui neste processo. Ou seja, a mediação executada pela linguagem é entendida não como um instrumento, mas “como relação constitutiva, como ação que transforma. Não consideramos nem a linguagem como um dado nem a sociedade como um produto; elas se constituem mutuamente. [...]” (Orlandi, 1996, p.17) A partir dessa concepção, a linguagem não é translúcida ou neutra, mas seus sentidos se constituem a partir dos sujeitos e discursos inscritos na história.

O que chamamos de discurso gestor sobre shopping center é um tipo de discurso formado por diferentes enunciadores(as): investidores(as), proprietários(as), associações, pessoas empregadas na gestão dos empreendimentos. Nesta dissertação focamos especificamente nos enunciados do discurso gestor produzidos e/ou articulados pela Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE) a partir de sua série de livros “Gestão” (em shopping center). Nesta série, idealizada como algo semelhante a um manual ou material de consulta para gestores(as) e investidores(as) de shopping centers, indica-se o que seria uma “gestão profissional” destes empreendimentos, assim como o que seriam o shopping center, o trabalho e os sujeitos que perpassam este empreendimento. O interesse específico na ABRASCE se justifica pelo seu destaque e reconhecimento na articulação e na defesa de interesses dos grupos e sujeitos que se vinculam à gestão e à propriedade destes empreendimentos no Brasil. Assim, por meio da sua coletânea de livros, a ABRASCE não apresenta apenas uma síntese do que seria a gestão, a “gestão profissional” de um shopping center, mas também legitima as práticas de gestão ali apresentadas.

Acreditamos que estudar o discurso gestor no que se refere à gestão do trabalho em shopping center, um modelo de empreendimento do setor de “serviços” que é também um símbolo contemporâneo do consumo

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globalizado, é uma dimensão relevante para se conhecer mais sobre o trabalho contemporâneo. E, como indicado acima, apesar do setor de serviços ser uma área em expansão na economia mundial e possuir um grande número de trabalhadores(as), o trabalho no setor não foi tão amplamente pesquisado na sociologia do trabalho brasileira, tradicionalmente vinculada ao trabalho fabril.

Deste modo, esta dissertação, contribui para se pensar como a organização e controle do trabalho (gestão do trabalho) dentro dos shopping centers é exercida por seus gestores de forma direta (sobre trabalhadores(as) contratados(as) diretamente pela administração) mas também indireta (influenciando e/ou controlando, através de mecanismos diversos, as condições e modos de realizar o trabalho dentro de lojas, quiosques, empresas terceirizadas responsáveis pelo estacionamentos, limpeza e manutenção etc.). A gestão e estruturação do empreendimento, as relações contratuais entre “empreendedores” e “lojistas”, entre “empreendedores” e empresas terceirizadas são fundamentais para se caracterizar e compreender a dinâmica das relações de trabalho que se estabelece em todos os demais setores destes empreendimentos.

Como objetivo principal, esta dissertação busca compreender quais os efeitos de sentidos da gestão do trabalho em shopping centers brasileiros são produzidos a partir do discurso gestor inscrito na série de livros “Gestão” de organização da ABRASCE. A análise se desenvolve em dois âmbitos. No primeiro, busca-se a compreensão das condições de produção mais amplas, com a emergência e desenvolvimento do shopping center nos Estados Unidos e no Brasil, as características dos shopping centers no Brasil, o surgimento e atuação da ABRASCE, a legislação brasileira e alguns conflitos que perpassam o empreendimento. No segundo âmbito realiza-se uma análise do discurso gestor textualizado na série “gestão” buscando os efeitos de sentido que a gestão do trabalho assume nesta coletânea. A metodologia escolhida para realizar a análise foi a Análise do Discurso Francesa, que será discutida na secção 1.2 desta dissertação.

A análise conduzida nesta dissertação, além da Introdução (secção 1) e Considerações Finais (secção 5), está dividida em três secções principais. Na secção 2 desta dissertação apresentamos um breve panorama do setor de serviços no Brasil e em Florianópolis, cidade em que realizamos as entrevistas com os sindicatos participantes desta pesquisa. Em seguida, apresentarmos as discussões sobre as transformações que ocorrem no mundo do trabalho a partir dos anos 1970, pensando em como essas transformações contribuem para uma “crise” no Mundo do Trabalho ao mesmo tempo em que elas trazem nova luz a este

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campo e ao conceito de trabalho. Discutimos também o desenvolvimento da gestão e a emergência de novas formas pensar, organizar e controlar o trabalho, de realizar a gestão do trabalho. Por fim, apresentaremos um mapeamento bibliográfico realizado a partir de três bases de dados e dividida em três etapas: a primeira etapa desta busca foi dirigida a produções que apresentam intersecções entre trabalho e shopping center; em seguida mapeamos o lugar que o shopping center ocupa dentro das pesquisas em Ciências Sociais; em terceiro lugar, fizemos buscas de material bibliográfico sobre shopping center produzido em outras áreas das Ciências Humanas, das Ciências Aplicadas, da Linguística, das Letras e Arte .

Na secção 3 apresentamos as condições de produção e desenvolvimento dos shopping centers no Brasil. Estas envolvem tanto uma breve descrição da história e emergência deste modelo de empreendimento na Europa e nos Estados Unidos, quanto sua adaptação ao Brasil, com seus principais financiadores, investidores, estruturação legal deste tipo de empreendimento e sua vinculação com a legislação brasileira. O surgimento dos shopping centers no Brasil se confunde com a própria história e atuação da Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE). Esta é a principal associação de shopping centers no Brasil, atuando na defesa legal e política dos empreendimentos, assim como na formação e qualificação de gestores(as) para o setor. Em torno dela se articula, legitima e difunde um discurso gestor sobre shopping center no Brasil. A compreensão desses aspectos, condições de produção mais amplas a partir de qual se produz e articula o discurso gestor sobre shopping center, é fundamental para se compreender a dinâmica e gestão das relações de trabalho dentro deste empreendimento.

Na secção 4, última secção em que desenvolvemos a análise, buscaremos os efeitos de sentidos da gestão do trabalho em shopping center a partir da análise do discurso gestor inscrito na série de livros “Gestão”, organizada pela ABRASCE. Apresentamos primeiramente as condições imediatas de produção das obras para em seguida passar para a análise discursiva. A análise das obras foi realizada focando-se na gestão do trabalho, a partir dos eixos de análise escolhidos: as imagens vinculadas aos sujeitos “empreendedor”, “lojista”, “trabalhador”, ao trabalho, ao shopping center, à gestão; formas diretas e indiretas de organizar e controlar o trabalho dentro de shopping centers; mecanismos e técnicas de exercício de poder disciplinar que perpassam a gestão nas obras. Assim, ainda que em alguns dos livros a gestão do trabalho não fosse o tema central, buscou-se compreender e analisar os aspectos que

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influenciavam nos efeitos de sentido da gestão do trabalho dentro do shopping.

1.2 METODOLOGIA

Na trajetória metodológica desta pesquisa, seguiu-se por diferentes caminhos, não realizados necessariamente de forma sequencial, mas como frentes de trabalho muitas vezes concomitantes. O Quadro 1, abaixo, apresenta uma síntese das estratégias metodológicas desta pesquisa.

Quadro 1 – Síntese Metodológica da Pesquisa

Pergunta Norteadora:

Quais os efeitos de sentidos da gestão do trabalho em shopping centers brasileiros são produzidos a partir do discurso gestor inscrito na série de livros “Gestão” de organização da Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE)?

Perguntas

Secundárias: Métodos Fontes Focos de Análise

Como pensar o trabalho contemporâneo e o trabalho dentro dos serviços? Quais são os objetivos e características da gestão moderna? pesquisa bibliográfica Banco de Teses e Dissertações da CAPES; Scientific Electronic Library Online (SCIELO);

Rede de Bibliotecas Virtuais do Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales (CLACSO); Indicações e sugestões bibliográficas da banca de qualificação, orientadora e colegas. Características e discussões da Sociologia do Trabalho; o conceito de trabalho; características do trabalho em serviços; formas de organizar,

controlar e disciplinar o trabalho contemporâneo; características da gestão moderna. Quais autores(as) e obras abordam o trabalho em shopping center ou o shopping center? pesquisa bibliográfica Banco de Teses e Dissertações da CAPES; Scientific Electronic Library Online (SCIELO);

Rede de Bibliotecas Virtuais do Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales

(CLACSO)

Tipo de pesquisa, temas, área de conhecimento, em que medida o "trabalho" aparece nas pesquisas sobre shopping

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Como surge e quais as características do shopping center no mundo e no Brasil? pesquisa documental; observação assistemática Material documental e bibliográfico IBGE, SEEF,

SEC, FECESC, DIEESE, ABRASCE, pesquisas anteriores, Exposhopping 2016. Características do Setor de serviços no Brasil, SC e Florianópolis; Desenvolvimento e características dos shopping centers no Brasil (principais empresas, financiadores, associações, características do negócio) Quais sujeitos, instituições e discursos podem ter influência na organização, controle e disciplinamento do trabalho dentro dos shopping centers e como se relacionam com o tema. pesquisa documental, entrevista e observação assistemática

SEEF, SEC, FECESC; Exposhopping 2016, site institucional da ABRASCE, legislação trabalhista, Ministérios Públicos do Trabalho. Disputas trabalhistas; condições de trabalho e atuação sindical dentro dos shoppings; atuação política e

institucional da ABRASCE. Compreender os efeitos de sentidos da gestão do trabalho em shopping center Análise do Discurso Discurso gestor textualizado na coletânea de livros “Gestão” elaborados pela ABRASCE

Formas diretas e indiretas de organizar e controlar o trabalho dentro de shopping

centers; mecanismos e técnicas de exercício de poder

disciplinar; como o shopping center, o trabalho, o(a) trabalhador, empreendedor(a)

e o(a)lojista são retratados.

Fonte: elaboração própria

Para entender como o shopping center e as relações de trabalho apareciam nas produções acadêmicas e também buscar referências de estudos anteriores que pudessem substanciar esta pesquisa, foi feito um levantamento bibliográfico ao longo de 2016, até início de 2017. Foram escolhidas três fontes de dados baseando-se em sua relevância e abrangência: o Banco de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - reúne resumos e textos completos de teses e dissertações nacionais defendidas a partir de 1987-, a Scientific Electronic Library Online (SCIELO) - reúne um grande número de artigos nacionais e internacionais de áreas variadas3 – e a Rede de Bibliotecas Virtuais do Consejo Latinoamericano de Ciencias

3 Fazem parte da coleção da SCIELO periódicos do Brasil, Argentina, África do Sul, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Espanha, México, Peru, Portugal, Uruguai, Venezuela.

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Sociales (CLACSO) – reúne artigos e textos de 616 centros de pesquisa em Ciências Humanas e Sociais de seus diferentes países membros4.

Buscamos pelo termo “shopping”, sem o termo “center”. A escolha foi feita para evitar outros temas relacionados à palavra “center”, na intenção de direcionar especificamente pesquisas sobre shopping center. A inclusão do termo “trabalho” junto com “shopping” não gerava resultados. Na primeira etapa da busca se selecionava trabalhos que possuíam o termo “shopping”, localizado em partes variadas. Estes números eram contabilizados e, com objetivo de encontrar trabalhos em que o termo tivesse significativa importância, selecionou-se numa segunda etapa da busca apenas os documentos que possuíssem “shopping” em seu título. Nestes trabalhos, aprofundamos as informações obtidas, separando-os por área científica, tema e data de produção. As pesquisas inicialmente eram concentradas na área das Ciências Sociais, mas, como apareciam poucos resultados, e para se ter um efeito comparativo, expandiu-se o critério, abarcando também as Ciências Sociais Aplicadas e Letras e Artes.

Vários(as) autores(as) e trabalhos encontrados nos resultados da busca no Banco de Teses e Dissertações da Capes apareciam também nos artigos do banco de dados SCIELO. Por isso, na secção 2.2 - em que apresentamos os resultados da busca bibliográfica – os resultados aparecem separados entre “teses e dissertações” (CAPES) e “artigos e trabalhos acadêmicos variados” (SCIELO E CLACSO). As resenhas de livros foram retiradas dos resultados, e o mesmo artigo publicado duas vezes em duas revistas diferentes foi contabilizado como apenas uma publicação.

Uma outra estratégia de pesquisa foi a realização de pesquisa documental e sobre o trabalho e trabalhadores(as), desenvolvimento e características do setor de serviços e dos shopping centers no Brasil, e pesquisa bibliográfica e teórica sobre a organização, controle e disciplinamento do trabalho. As informações foram levantadas a partir de pesquisas anteriores encontradas através da busca bibliográfica inicial, através de nova busca, agora no SCIELO, CLACSCO, google acadêmico, de referências que surgiram por indicação de professores(as), colegas ou ainda através de uma “rede de referências”: trabalhos e pesquisas que eram citados e referenciados nas obras já encontrados. Também se utilizou dados referentes a pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

4 Entre os membros da CLACSO estão os 47 países da América Latina mais Canadá, Estados Unidos, Alemanha, Espanha, França e Portugal.

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(IPEA); Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social; publicações e informações disponibilizadas pela Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE); e dados levantados pela pesquisa sobre o perfil dos(as) trabalhadores(as) do comércio e serviços encomendada pela Federação dos Trabalhadores no Comércio no Estado de Santa Catarina (FECESC).

Houve também contato com sindicatos locais, no intuito de levantar informações sobre possíveis conflitos ou demandas dos trabalhadores em shopping centers na região. Consegui realizar entrevistas e fui gentilmente atendida pela FECESC, pelo Sindicato dos Empregados no Comércio de Florianópolis (SEC) e pelo Sindicato dos Empregados em Edifícios e em Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis de Florianópolis (SEEF). Outros sindicatos de Florianópolis e São José também foram contatados, mas não tiveram interesse em participar da pesquisa5.

No que se refere ao levantamento de leis que teriam regulariam o funcionamento do shopping e o trabalho dentro deste, buscou-se inicialmente livros e artigos na área do direito que mencionassem a organização jurídica dos empreendimentos e as leis que a regulariam e a legis. As buscar levaram a um dos próprios livros da coletânea de gestão da ABRASCE, “Aspectos Jurídicos em Shopping Center”(2011) e outros escritos pelo advogado Ladislau Karpat (2004) e Mário Cerveira Filho (2000), advogado da Associação Brasileira dos Lojistas de Shopping (ABRALSHOP).

No projeto inicial desta dissertação também estavam previstas entrevistas com gestores e observação “em campo” em shopping centers da Grande Florianópolis. Os contatos e pedidos de entrevistas foram feito por meio das assessorias de comunicação dos empreendimentos, sendo que apenas um dos shopping centers respondeu positivamente ao pedido. Os pedidos e contatos de entrevistas ocorram ao mesmo tempo em que esta pesquisa tramitava no Comitê de Ética da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), tendo alguns ajustes feitos no projeto. Ao fim da

5 O Sindicato dos Empregados em Empresas Prestadoras de Serviço de Asseio e Conservação no Município de Florianópolis respondeu ao contato afirmando que no que se referia ao trabalho em Shopping Center, “não seria com eles, mas com sindicato dos comerciários”; o Sindicato dos Empregados em Empresas Prestadoras de Serviços e Asseio e Conservação de São José e Região respondeu de maneira semelhante; e o Sindicato dos Empregados em Empresas Prestadoras de Vigilância e Segurança Privada Prestadora de Serviços do Município de São José afirmou que não haviam terceirizados em vigilância nos shoppings da região. Outros sindicados apenas não responderam aos contatos.

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tramitação, quando autorizada e registrada a pesquisa, foi retomado o contato com fins de realizar as entrevistas nas instituições que se interessaram em participar. Ao shopping center que mostrou interesse em participar foi enviado um roteiro prévio de entrevista para apreciação. Depois disso, contudo, não houve mais retorno aos contatos e, devido aos encaminhamentos e prazos necessários para terminar a dissertação, esta parte da pesquisa ficou inviabilizada.

Concomitantemente à pesquisa documental e bibliográfica, foi feita a observação e participação na feira Exposhopping – ABRASCE, realizada conjuntamente ao 14° Congresso Internacional Shopping Centers organizado pela instituição, realizado em São Paulo no mês de Setembro 2016. O congresso e a feira eram realizados simultaneamente e tinham como tema a comemoração dos cinquenta anos da indústria de shopping center no Brasil e os quarenta anos da ABRASCE. A feira (exposhopping) era de livre acesso a visitantes mediante a uma identificação prévia, já o congresso era necessário realizar uma inscrição e pagamento de taxa. Foi realizada apenas a visitação à feira, participando da abertura e atividades realizadas no dia 12 de setembro, que incluía uma mesa redonda sobre os 50 anos da indústria de shopping center no Brasil e o prêmio ABRASCE 2016.

A pesquisa de campo tinha como foco mapear entidades e sujeitos6 presentes no evento, temas debatidos, como a instituição se articula nacional e internacionalmente a outras instituições e associações e entender melhor os critérios de participação na entidade e as premiações do setor. Na feira também foi possível adquirir a coletânea de livros da ABRASCE da série “Gestão em Shopping Center” e o Censo Brasileiro de Shopping Centers 2015/2016.

O tom do evento era de um grande “espetáculo”, tendo uma segurança reforçada e equipe de filmagem da ABRASCE acompanhando as principais autoridades e uma grande abertura, com grande uso de efeitos visuais e sonoros. Houve falta de energia elétrica em vários momentos, causada, segundo a fala da organização do evento, pela sobrecarga dos geradores de energia. O evento foi suspenso e retomado algumas vezes, gerando desconforto e tensão pois o problema não era resolvido e causava atraso no evento. Depois da terceira ou quarta vez que isso aconteceu, percebi que um rapaz nos seguia7 pela feira. Destoávamos dos demais participantes, que estavam vestidos formalmente, eram

6O mapeamento de Empresas e Pessoas Envolvidas no 14° Congresso Internacional de Shopping Centers e Exposhopping – ABRASCE está disponível no Apêndice I.

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pessoas que trabalhavam no ramo e se conheciam. Podemos nos perguntar em que medida o contexto político e social brasileiro também ajudou a tensão causada no evento, na medida em que o ano de 2016 foi de grande instabilidade política, acontecendo o processo de impeachment da Presidenta Dilma e a condução de Michel Temer ao poder e uma série de protestos populares.

Os dados e informações coletados, as pesquisas encontradas e as leituras realizadas nestes primeiros procedimentos de pesquisa foram reunidas aos textos selecionados para análise discursiva e organizadas a partir da teoria/metodologia da Análise do Discurso Francesa (ADF), que orienta esta pesquisa. Segundo esta corrente, a ADF comporia o chamado “dispositivo teórico da intepretação”, teoria e conceitos que orientam a análise; enquanto que as teorias da organização, controle e disciplinamento do trabalho vindos da sociologia do trabalho e das contribuições de Michel Foucault, também em intercâmbio com a ADF, compõem o “dispositivo analítico” desta dissertação. O dispositivo analítico seria o “campo de questões em que se efetua a análise”, é construído pelo(a) analista. Este dispositivo influência nos conceitos e sentidos da análise, os quais não seriam os mesmos se mudássemos o dispositivo analítico.

A última frente de trabalho desta pesquisa foi a análise do discurso gestor buscando os efeitos de sentido da gestão do trabalho em shopping center. Este discurso será aqui circunscrito ao corpus de pesquisa8 composto pela coletânea de livros “Gestão” publicados pela ABRASCE. O discurso gestor sobre shopping center é um tipo de discurso formado por diferentes enunciadores: empreendedores, consultores, associações, pessoas empregadas na gestão dos empreendimentos. Nesta dissertação focamos especificamente nos enunciados do discurso gestor produzidos e/ou articulados pela ABRASCE, maior associação do setor, a partir de sua série de livros sobre shopping centers, “Gestão”. Nesta série, idealizada como algo semelhante a um manual ou material de consulta para gestores e empreendedores de shopping, indica-se o que seria a gestão “profissional” destes empreendimentos, assim como o que seriam o shopping center, o trabalho e os sujeitos que perpassam este empreendimento. O interesse específico na ABRASCE se justifica pelo

8 O corpus desta pesquisa pode ser compreendido como o que na Análise do Discurso se chama “texto”, a unidade empírica de análise. Neste sentido, o texto ou corpus aqui selecionado para análise, é um estado determinado do processo discursivo, não o esgota. O corpus/texto de análise é formado por diferentes enunciados e diferentes posições de sujeito, de tal forma que pode haver enunciados de diferentes formações discursivas em cada texto.

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seu destaque e reconhecimento na articulação e na defesa de interesses dos grupos e sujeitos que se vinculam à gestão e à propriedade destes empreendimentos no Brasil. Deste modo, o discurso gestor articulado pela/em torno da ABRASCE garante legitimidade às práticas de gestão de shopping ali indicadas, servindo como um modelo aos empreendimentos brasileiros. Por meio da sua coletânea de livros, a ABRASCE não apresenta apenas uma síntese do que seria a gestão em shopping center, da “gestão profissional” de um shopping center, mas também legitimada as práticas de gestão ali apresentadas.

Os textos aqui analisados de modo algum esgotam o que seja o discurso gestor, mas seriam um “estado determinado de um processo discursivo” (ORLANDI, 1996, p.59). Tampouco esta análise se propõe a ser o “verdadeiro” sentido, as análises e conclusões aqui produzidas são sínteses sempre provisórias, efeitos de sentido produzidos a partir de um ponto de leitura possível, dentro de uma área de conhecimento, neste momento histórico, com as finalidades de leitura e pesquisa aqui apresentadas. A própria leitura e apropriação da teoria/metodologia da Análise do Discurso Francesa se faz a partir de uma pesquisadora que parte de uma problemática e de um universo conceitual da Sociologia do Trabalho. Isso indica que a análise aqui desenvolvida terá particularidades e limites em relação a análise que é realizada na Análise do Discurso no âmbito da linguística e por outros(as) pesquisadores(as) a partir de outras perguntas e/ou abordagens. Como Eni Orlandi (1996) indica, o sentido se constrói em uma leitura que é sempre uma relação entre sujeitos. Na medida em que busco suas obras para fundamentar minha análise, construo um sentido do que seja a ADF e produzo um diálogo entre nossas áreas de conhecimento.

[...] a leitura é o momento crítico da produção da unidade textual, da sua realidade significante. É nesse momento que os interlocutores se identificam como interlocutores e, ao fazê-lo, desencadeiam o processo de significação do texto. Leitura e sentido, ou melhor, sujeitos e sentidos se constituem simultaneamente, num mesmo processo. [...] (ORLANDI, Eni P. Discurso e

Leitura. São Paulo: Cortez, 1996, p.09-10)

A partir dessas indicações, podemos começar a apresentar a Análise do Discurso Francesa. Esta se constitui como uma teoria/metodologia de caráter interdisciplinar que surge na França nos

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anos 19609 a partir do diálogo entre Psicanálise, Linguística e Marxismo. Existem outras Análises do Discurso, sendo a “Crítica10”, desenvolvida inicialmente na Inglaterra e que se fundamenta na obra de Norman Fairclough e a “Francesa”, baseada na obra de Michel Pêcheux, duas das versões mais de Análise do Discurso mais trabalhadas no Brasil.

Michel Foucault influenciou essas duas correntes de Análise do Discurso, mas sua proposta acaba por formar um terceiro modo de realizar uma análise discursiva. Análise do Discurso proposta por este estaria, como indica Pedro Souza (2011), mais vinculada aos procedimentos de validação e controle discursivos realizados dentro de quadros institucionais do saber e práticas científicas.

Nesta dissertação, pensando na adequação ao tema e familiaridade com a metodologia, optamos pela Análise do Discurso Francesa, nos subsidiando nos trabalhos de Eni Orlandi (1996; 2005; 2013),) e Pedro Souza (2011, 2014). Uma das principais características da Análise do Discurso Francesa é permitir que a análise vá além da intenção imediata dos enunciadores do discurso e da visão dos gestores e empreendedores sobre a gestão do trabalho no shopping center, pois ela vincula a língua com a história e a política, mostrando como os sentidos se constroem para além das intenções de seus enunciadores, podendo ser outros.

A ADF elabora uma crítica às Ciências Sociais e a Linguística tradicional pela forma de conceber a linguagem e o sentido. Para a Análise do Discurso Francesa o sentido não é uma propriedade literal dos termos, mas um efeito de linguagem. Como nos diz Orlandi (2013, p.30), “os sentidos não estão só nas palavras, nos textos, mas na relação com a exterioridade, nas condições que eles são produzidos e que não dependem

9 Esta data marca o surgimento da Análise do Discurso Francesa, desenvolvida por Michel Pêcheux. O termo análise do discurso já era usado, contudo, no início da década de 1950 por Zellig Harris, mas, segundo Helena Brandão (2012) numa perspectiva que não vincula significado com história. Émile Benveniste também teria usado o termo em sua teoria enunciativa. Segundo Brandão (2012), ambos autores marcariam diferentes posições acerca da teoria do discurso, resultado numa versão americana (Harris) e outro europeia (Benveniste).

10 Norman Fairclough, em seu livro Discurso e Mudança Social (2001) considera a abordagem da Análise do Discurso Francesa, representada por Michel Pêcheux e seus colaboradores, como também sendo uma abordagem crítica, assim como a sua, pois combinaria uma teoria social do discurso com um método de análise textual, ainda que as duas diferissem em aspectos metodológicos e teóricos. No Brasil, contudo, a Análise do Discurso proposta por Pêcheux ganha o termo de “Francesa” e a de Fairclough de “Crítica”. Para conhecer melhor as duas propostas, ver Fairclough (2001) e Orlandi (2013).

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só das intenções dos sujeitos”. Disto resulta o conceito de discurso como uma prática, como “efeito de sentido entre locutores” (ORLANDI, 2013, p.21). Esse conceito promove uma inclusão do sujeito falante na língua, o qual era excluído na distinção clássica de Ferdinand Saussure entre Língua e Fala. O discurso aparece como a palavra em movimento, proferida pelo sujeito falante. Como afirma Pedro Souza (2011), o discurso está presente em

[...] toda situação em que há pessoas falando, conversando, debatendo, dialogando, expondo ideias, portanto palavras sendo ditas, oralmente ou por escrito, ou até mesmo por meio de formas não verbais de linguagem. Em todas essas práticas de linguagem, há discurso, ou seja, efeito de sentido entre interlocutores. Isso se estende às situações em que se lê um livro, assiste-se a um filme ou a um espetáculo teatral, escuta-se uma música popular ou erudita. O que se interpõe entre o indivíduo e essas diferentes modalidades de linguagem é discurso, isto é, o regime simbólico em que um simples ruído ou uma simples imagem produz sentido e, por isso mesmo, demanda interpretação. (SOUZA, 2011, p.11 –grifo nosso)

Os efeitos de sentidos indicam que os sentidos do discurso podem ser múltiplos, não se esgotam no sentido intencionado pelo emissor, podendo inclusive ser muito diferentes deste. Por isso, para Orlandi (1996), mesmo a “literalidade” seria um efeito discursivo na medida em que todos os sentidos são sempre “sentidos possíveis”, assim a sedimentação de um sentido, a literalidade, se faz mediante a instauração de um sentido dominante sobre outros, “[...] a história dos sentidos cristalizados é a história do jogo de poder da/na linguagem. ” (Orlandi, 1996, p.21) Os sentidos têm um regime de produção discursiva, podem ser vários, mas não qualquer um. Assim, as condições de produção de um discurso seria o passo inicial para a compreensão de como um texto produz sentidos:

Podemos considerar as condições de produção em sentido estrito e temos as circunstâncias da enunciação: é o contexto imediato. E se as considerarmos em sentido amplo, as condições de

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produção incluem o contexto sócio-histórico, ideológico. (ORLANDI, 2013, p.30)

Todo dizer é também é determinado tanto pelo interdiscurso: conjunto de formulações feitas e já esquecidas que determinam o dizer, o intradiscurso (a formulação, a enunciação).“[...] Em outras palavras, o interdiscurso determina o intradiscurso: o dizer (presentificado) se sustenta na memória (ausência) discursiva” (ORLANDI, 2013, p.83). O interdiscurso, memória discursiva, é afetado por dois esquecimentos: o primeiro, do inconsciente, quando acreditamos que as palavras que pronunciamos somos nossas, quando elas já foram ditas por outros sujeitos em outros contextos; e o segundo, da ordem da ordem da enunciação, quando acreditamos que “[...] o que dizemos só pode ser dito com aquelas palavras e não outras” (ORLANDI, 2013, p. 35), cria-se a ilusão referencial, uma naturalização da ligação palavra e coisa.

A intertextualidade, repousa na “relação de sentido” não se confunde com o interdiscurso, que é um outro mecanismo de funcionamento do discurso. O intertexto ou relações de sentido diz respeito às relações de sentido de um texto com outro, o esquecimento não é estruturante. Além do intertexto, outros mecanismos de funcionamento do discurso são as “antecipações” - “todo sujeito tem a capacidade de experimentar, ou melhor, de colocar-se no lugar em que o seu interlocutor ‘ouve’ suas palavras” (ORLANDI, 2013, p.39) - e as “relações de forças”:

[...] o lugar a partir do qual fala o sujeito é constitutivo do que ele diz. Como nossa sociedade é constituída por relações hierarquizadas, são relações de força, sustentadas no poder desses diferentes lugares, que se fazem valer na “comunicação. […]. (ORLANDI, 2013, p.39-40) Relação de sentido, antecipações e relações de força são os mecanismos de funcionamento discursivo que repousam nas “formações imaginárias” - imagens dos sujeitos, são “projeções que permitem passar das situações empíricas – os lugares dos sujeitos – para as posições dos sujeitos no discurso” (ORLANDI, 2006, p.40). O que significa dentro do discurso não é o indivíduo empírico, mas a sua posição enquanto sujeito; não é a situação empírica, mas a posição discursiva.

[...]Esse mecanismo [Formação Imaginária] produz imagens dos sujeitos, assim como do objeto

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do discurso, dentro de uma conjuntura sócio-histórica. Temos assim a imagem da posição sujeito locutor (quem sou eu para lhe falar assim) mas também da posição sujeito interlocutor (quem é ele para me falar assim, ou para que eu lhe fale assim?), e também a do objeto do discurso (do que eu estou falando, do que ele me fala?). É todo um jogo imaginário que preside a troca de palavras. [...] (ORLANDI, 2013, p.40 – grifo nosso)

Para trabalhar com formações imaginárias é relevante destacar as diferentes posições que o sujeito pode assumir dentro do texto. Para a Análise do Discurso Francesa, o sujeito são posições no discurso, um indivíduo que enuncia, um texto pode assumir diferentes posições sujeito. Como indica Orlandi (1996, p.61), podemos entender a locução (“eu” do discurso”), a enunciação (perspectiva que esse “eu” assume) e a autoria (função social que o “eu” assume) como funções enunciativas do sujeito falante. Como destaca Orlandi (1996, p.61),

O falante é o material empírico bruto, e enquanto enunciador é o sujeito dividido em suas posições no texto. [...] O autor, então, enquanto tal, apaga o sujeito produzindo uma unidade que resulta de uma relação de determinação do sujeito pelo seu discurso.[...] (ORLANDI, 1996, p.61-62)

A autoria, seria uma função desse sujeito e pressupõe coerência. Souza (2011) indica que o sujeito se torna autor “[...] quando, ao se relacionar com o texto, ele não pode mais se expor à deriva do sentido, sem assumir a responsabilidade do lugar do efeito de sentido de suas palavras. Essa é a condição para que ele se torne enfim autor. [...]” (SOUZA, 2011, p.97) Essa coerência estaria vinculada a uma formação discursiva em que essa posição sujeito se inscreve: “[...] como há a vocação totalizante do sujeito (autor), estabelece-se uma relação de dominância de uma formação discursiva sobre as outras na constituição do texto. ” (Orlandi, 1996, p.60)

Todo o funcionamento da linguagem é marcado também por relações de paráfrase e polissemia. “[...] Os processos parafrásticos são aqueles pelos quais em todo dizer há sempre algo que se mantém, isto é, o dizível, a memória. A paráfrase representa assim o retorno aos mesmos espaços do dizer. Procuram-se diferentes formulações do mesmo dizer sedimentado. A paráfrase está do lado da estabilização. Ao passo que, na

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polissemia, o que temos é deslocamento, ruptura de processos de significação. [...]” (ORLANDI, 2013, p.36) Pedro Souza (2011) destaca que

A despeito da mudança na estrutura de uma frase dada, seu sentido pode se conservar ou tender a se modificar conforme a memória, o dizível em que se produz. Se duas formulações linguisticamente diferentes retomam a mesma memória discursiva, então elas mantêm entre si uma relação parafrástica. Por outro lado, tendo ou não a mesma estrutura sintática, há formulações que remetem a uma diversidade de significação. Esse é o jogo da polissemia: o dizer pode ser formulado de modo idêntico, mas se expõe de modo a produzir uma ruptura com lugares já estabelecidos de sentido. (SOUZA, 2011, p. 61)

A paráfrase, deste modo, seria uma

[...] matriz de sentido, pois não há sentido sem repetição, sem sustentação no saber discursivo, e a polissemia é a fonte da linguagem uma vez que ela é a própria condição de existência dos discursos pois se os sentidos – e os sujeitos – não fossem múltiplos, não pudessem ser outros, não haveria necessidade de dizer. A polissemia é justamente a simultaneidade de movimentos distintos de sentido no mesmo objeto simbólico. (ORLANDI, 2013, p.38)

Pedro Souza ainda destaca que

[...] o funcionamento discursivo da paráfrase consiste em produzir mecanismos de controle da instabilidade interdiscursiva. Com isso, concluímos que a paráfrase é da ordem da formação discursiva, enquanto a polissemia é da ordem do interdiscurso. (SOUZA, 2011, p. 61)

Dentro das relações de paráfrase é possível observar os deslizes de sentidos, as transferências, “tomada de uma palavra por outra” (ORLANDI, 2013, p.44) chamadas de “metáfora”.

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Em princípio não há sentido sem metáfora. As palavras não têm, nessa perspectiva, um sentido próprio, preso a sua literalidade. Segundo Pêcheux

(1975), o sentido é sempre uma palavra, uma expressão ou uma proposição por uma outra palavra, uma outra expressão ou proposição; e é por esse relacionamento, essa superposição, essa

transferência (metaphora), que elementos

significantes passam a se confrontar, de modo que se revestem de um sentido. (ORLANDI, 2013, p.44)

A partir do efeito metafórico, outros sentidos se articulam a diferentes formações discursivas.

[...] deslizes produzidos nas relações de paráfrase que instalam o dizer na articulação de diferentes formações discursivas, submetendo-os à metáfora (transferências), aos deslocamentos: possível “outros”. Falamos a mesma língua mas falamos diferente. Dizemos as mesmas palavras, mas elas podem significar diferente. As palavras remetem a discursos que derivam seus sentidos das formações discursivas, regiões do interdiscurso que, por sua vez, representam no discurso as formações ideológicas. ” (ORLANDI, 2013, p.79-80) Para a Análise do Discurso, a constituição do sentido de um discurso também vem da formação discursiva em que se inscreve.

O discurso se constitui em seus sentidos porque aquilo que o sujeito diz se inscreve em uma formação discursiva e não em outra para ter um sentido e não outro. Por aí podemos perceber que as palavras não têm um sentido nelas mesmas, elas derivam seus sentidos das formações discursivas em que se inscrevem. As formações discursivas, por sua vez, representam no discurso as formações ideológicas. Desse modo, os sentidos sempre são determinados ideologicamente. Não há sentido que não os seja. [...]. (ORLANDI, 2013, p.43)

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Assim, a Formação discursiva para a Análise do Discurso determina o que em uma formação ideológica dada (uma posição em uma conjuntura sócio-histórica dada) pode e deve ser dito. É pelas formações discursivas que podemos compreender os diferentes sentidos. “Palavras iguais podem significar diferentemente porque se inscrevem em formações discursivas diferentes. ” (ORLANDI, 2013, p.44) - Vincular mais a metodologia à pesquisa, dar mais exemplos dos conceitos dentro da situação de pesquisa]

Estes são alguns dos principais conceitos para se entender o campo da Análise do Discurso Francesa e o modo como esta atua. A construção da análise apresentada nesta dissertação orientou-se pelos procedimentos de análise sugeridos por Eni Orlandi (2013) e Pedro Souza (2011). Como uma síntese deste processo, podemos destacar os seguintes pontos, não necessariamente sequencias:

1- Realização de uma leitura prévia e tabulação na qual se seleciona parágrafos ou trechos que se referiam ou que estabelecem relação com os eixos de análise escolhidos: trabalhadores(as), lojistas, empreendedores(as), trabalho, shopping, gestão.

2- A partir dessa primeira seleção, realizar uma análise da “materialidade linguística” (ORLANDI, 2013, p.65) a partir da análise das formações imaginárias, desnaturalização da ligação “palavra-coisa”: existem muitas maneiras de enunciar sobre a gestão do trabalho contemporâneo, o modo como o fazemos, os termos que usamos, o “não-dito” que está sempre presente, tudo isso vincula nossa fala em uma formação discursiva ou outra. Essa desnaturalização “palavra-coisa” se utiliza da análise das paráfrases e memória discursiva.

[...] o como se diz, o quem se diz, em que circunstâncias etc. Isto é, naquilo que se mostra em sua sintaxe e enquanto processo de enunciação (em que o sujeito se marca no que se diz), fornecendo-nos pistas para compreendermos o modo como o discurso que pesquisamos se textualiza. Observamos isso em função das formações imaginárias (a imagem que se tem de um eleitor universitário, de um docente, de um candidato a reitor, de movimento social etc.), em suas relações de sentido e de forças (de que lugar fala “x” e “y”, etc.), através dos vestígios que deixam no fio do discurso.” (ORLANDI, 2013, p.65)

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Nesse momento da análise é fundamental o trabalho com as paráfrases, sinonímia, relação do dizer não-dizer, etc. Esta etapa prepara o analista para que ele comece a vislumbrar a configuração das formações discursivas que estão dominando a prática discursiva em questão. O que ele faz é tornar visível o fato de que ao longo do dizer se formam famílias parafrásticas relacionando o que foi dito com o que não foi dito, com o que poderia ser dito, etc. Estes outros dizeres aí observados dão as delimitações das formações discursivas que intervêm, fazendo as palavras significarem de maneira x ou y. (ORLANDI, 2013, p. 78)

3- A partir da análise da materialidade linguística passa-se ao objeto discursivo, em que se busca “[...]incidir uma análise que procura relacionar as formações discursivas distintas – que podem ter-se delineado no jogo de sentidos observados pela análise do processo de significação (paráfrase, sinonímia etc.) – com a formação ideológica que rege essas relações. [...]” (ORLANDI, 2013, p.78) Ao mesmo tempo em que se analisa, ao longo de todo o procedimento analítico, o mecanismo parafrástico, deve-se observar os efeitos metafóricos, indicados no Quadro 2, abaixo, que seriam deslizes de sentido realizados por uma substituição contextual produzidos nas relações parafrásticas.

4- No último momento da análise, “[...]passamos ao mesmo tempo do delineamento das formações discursivas para a sua relação com a ideologia, o que nos permite compreender como se constituem os sentidos desse dizer. [...]” (ORLANDI, 2013, p.67). Qual formação ideológica se relaciona com a formação discursiva da gestão do trabalho a partir da série de livros da ABRASCE; como isso informa o sentido da gestão que perpassa os livros da série.

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Quadro 2 - Efeito Metafórico

Extraído de: ORLANDI, 2013. a, b, c, d e, b, c, d e, f, c, d e, f, g, d e, f, g, h

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2 O MUNDO DO TRABALHO CONTEMPORÂNEO E AS PESQUISAS SOBRE TRABALHO E SHOPPING CENTER NO BRASIL

2.1 O MUNDO DO TRABALHO E SUAS TRANSFORMAÇÕES

2.1.1 A Expansão dos Serviços no Brasil e a Cidade de Florianópolis

O termo “serviços” vem do “setor de serviços”, um dos setores da divisão clássica da Economia em extração e a produção de matéria-prima (setor primário); transformação da matéria-prima (setor secundário); e a prestação de serviços e comercialização (setor terciário). Esse “setor de serviços” engloba alguma variedade de atividades e profissões, prestação de serviços diversos, transportes, turismo, informática, educação.

Atualmente essa divisão clássica é contemporaneamente repensada na medida em que emergem novos processos produtivos que provocam deslocação e fragmentação da produção, produção em rede, terceirização de atividades e a incorporação de serviços aos produtos. Estas transformações indicam que a própria fronteira entre “produtos” e “serviços” apareceriam cada vez mais “borradas”, como aponta Mario Sérgio Salermo (2001). O autor critica a divisão estanque entre serviços/indústria e destaca como os serviços estão cada vez mais se incorporando aos produtos e à produção industrial - servicialização da indústria - ao mesmo tempo em que ocorre uma industrialização dos serviços, com a utilização de técnicas de produção e organização do trabalho dentro de empresas de serviços, como as redes fast food e o telemarketing. A grande internacionalização e globalização da produção a nível mundial também pode ser um fator que ajuda a explicar esse crescimento do setor.

Levando em conta a presente discussão e problematização da definição de serviços, definimos este tal como apresentado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)11, aquilo que é “resultante de um processo em que produção e consumo são coincidentes no tempo e espaço”. Este setor é apontado como destaque econômico mundial e nacionalmente12, isso pelo significativo aumento na participação do PIB

11 Definição apresentada no Texto para Discussão n. 457. Disponível em: http://www.ipea.gov.br.

12 O crescimento dos serviços é uma realidade constatada há décadas pelas pesquisas do IBGE. Destacamos também o texto para discussão n.457 do IPEA que em 1997 já apontava para a importância desse fenômeno. Assim também

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dos países e a crescente geração de postos de trabalho, o que ocorre mundialmente desde a metade do século XX. Mesmo tendo-se iniciado esse crescimento há algumas décadas, a economia clássica pouca atenção dava ao setor, tendo retomado o interesse a partir do expressivo crescimento do mesmo, é o que afirma Anita Kon (2007), uma das autoras que se destacam no estudo dos serviços na economia.

Para se ter uma dimensão dos serviços no Brasil, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o setor de serviços foi responsável por 69,4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2013, contra 24,9% da Indústria e 5,7% da Agropecuária13. Segundo o Boletim Mercado de Trabalho de Abril de 2017 14 do IPEA, no primeiro trimestre de 2017, existiam no Brasil cerca de 88,9 milhões de pessoas ocupadas, destas, o maior percentual, 19,4% de pessoas ocupadas estavam no comércio, reparação de veículos e motocicletas, seguido de 16,9% de pessoas ocupadas no setor de Administração pública, defesa, seguridade social, educação, saúde humana e serviços sociais. A indústria geral detinha 12,8% de pessoas ocupadas. Outros serviços ainda contavam com 4,8% de pessoas ocupadas; Alojamento e alimentação com 5,6% e Transporte, armazenamento e correio com 5,1%. Do primeiro trimestre de 2012 para o primeiro trimestre de 2017, a Indústria Geral e a Agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura foram as áreas com maior queda de ocupação, ficando em 1,9 pontos percentuais a menos cada uma.

A tendência do crescimento dos serviços e diminuição dos setores agrícolas e industriais na economia brasileira já aparecia na Pnad/IBGE de 2001, a qual apresentava um aumento do pessoal ocupado no comércio de mercadorias de 4,6% em relação ao ano anterior, e um aumento de 3,8% do pessoal ocupado nos serviços. A agricultura já apresentava uma

autores que já abordaram o tema, como a economista Anita Kon (1992; 2007) e os diversos autores organizados no livro de De Negri e Kubota (2006), publicado pelo IPEA.

13 Dados do IBGE disponíveis em: http://saladeimprensa.ibge.gov.br. As atividades consideradas como serviços pelo IBGE seguem a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE 2.0), sendo um conjunto de atividades (serviços de informação, transporte, armazenagem e correio, comércio, serviços imobiliários e aluguel, administração, saúde e educação pública, intermediação financeira e seguros, e outros serviços) presentes em diferentes secções. A CNAE é definida a partir Clasificación Industrial Internacional Uniforme de todas las Actividades Econômicas – CIIU, de âmbito internacional. 14 Este boletim e dados apresentados são elaborados pelo IPEA a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad)/IBGE. Os dados e o boletim estão disponíveis em: http://www.ipea.gov.br.

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crescente quebra no número de empregos gerados, e teve uma diminuição de 3,6% na participação dentro do total da população ocupada, ficando em 20,6% na Pnad 2001. O total da população ocupada pelos diversos ramos da indústria era 19,9%, o total do comércio ficava em 14,3; e a soma dos vários ramos em serviço detinha 43,3% do total da população brasileira ocupada.

A cidade de Florianópolis é uma das cidades do Brasil em que os “serviços” se destacam, sendo referência dentro do estado de Santa Catarina por sua produção de softwares, turismo, comércio e demais serviços. Florianópolis tem uma população estimada em pouco mais de 477.000 habitantes15, é a segunda maior cidade do estado, mas a sexta menor capital do país. Segundo dados do IBGE16, em 2014, Florianópolis tinha uma média de 4,8 salários mínimos mensal por habitante, é a maior renda por habitante do estado e a vigésima quinta do país, mas 24,6% da população (com rendimento nominal) possuía uma renda mensal per capita de até ½ salário mínimo. Apesar de ser um valor alto, esta taxa colocava a cidade na posição 5328 dos 5570 municípios do Brasil, indicando que o valor era baixo em comparação com os demais municípios brasileiros. Do total da população 69,4% estava trabalhando, colocando a cidade na posição 19 do total dos municípios brasileiros. A cidade, junto com Vitória (Espírito Santo), possuía o maior Índice de Desenvolvimento Humano das capitais brasileiras e a terceira maior dentre todas as cidades do Brasil.

Em pesquisa pioneira encomendada pela Federação dos Trabalhadores do Comércio do Estado de Santa Catarina (FECESC) e desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Catarinense (2014)17, foi

15 Dados de 2016 do IBGE. Disponíveis em: www. cidades.ibge.gov.br. 16 Dados do IBGE disponíveis em: www. cidades.ibge.gov.br.

17 A pesquisa tinha como objetivo investigar o perfil socioeconômico dos(as) trabalhadores(as) do comércio no estado de Santa Catarina e traz o perfil mais completo dos(as) trabalhadores(as) do setor. A pesquisa foi feita por amostra a partir do número de trabalhadores(as) vinculados aos sindicatos de comércio em Santa Catarina, proporcional ao número de trabalhadores(as) por sindicato. Selecionando-se, posteriormente, os principais municípios e, desse total, foram realizadas as 2000 entrevistas da amostra. Buscou-se a repreentatividade de cada ramo de atividade no comércio, assim, as 2000 entrevistas foram realizadas entre trabalhadores(as) de diferentes ramos, tais quais: Combustíveis e lubrificantes; Supermercados, Hipermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo; Tecidos, vestuário e calçados; Móveis e eletrodomésticos; Artigos farmacêuticos, médicos, Ortopédicos, de perfumaria e cosméticos; Equipamentos e materiais para escritório, Informática e de comunicação; Livros, jornais, revistas e papelaria; Outros artigos de uso pessoal e doméstico; Veículos e motocicletas,

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