• Nenhum resultado encontrado

Afetividade no vínculo jurídico entre genitores e prole

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Afetividade no vínculo jurídico entre genitores e prole"

Copied!
63
0
0

Texto

(1)

GRANDE DO SUL

LUMA LORENZON

AFETIVIDADE NO VÍNCULO JURÍDICO ENTRE GENITORES E PROLE

Três Passos (RS) 2020

(2)

LUMA LORENZON

AFETIVIDADE NO VÍNCULO JURÍDICO ENTRE GENITORES E PROLE

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso - TCC. UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS- Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientador: MSc. Sérgio Luís Leal Rodrigues

Três Passos (RS) 2020

(3)

Dedico este trabalho à minha família, pelo incentivo, apoio e confiança em mim

depositados durante toda a minha

(4)

AGRADECIMENTOS

A Deus, primeiramente, por ter me dado saúde para poder lutar pelos meus sonhos.

Dedico à minha família, meu pai, Juarez Carlos Lorenzon e a minha mãe, Leila de Fátima Lorenzon que sempre me apoiaram e incentivaram nessa caminhada, como também meus irmãos, Juarez Júnior Lorenzon e Juma Lorenzon que, com certeza, me deram forças para não desistir, e me mostraram que vale a pena cada esforço e tempo utilizado nesse momento de aprendizado e formação. Dedico, em especial, aos meus amados sobrinhos, Murilo F. Lorenzon, Heloísa F. Lorenzon e Gael Z. Lorenzon, que foram fonte de inspiração durante todo esse processo.

Ao meu orientador MSc. Sérgio Luís Leal Rodrigues, o qual eu tive o privilégio de contar com seus ensinamentos, dedicação e disponibilidade, foi de suma importância a sua ajuda e paciência no decorrer desse trabalho.

A todos meus amigos por entenderem que em determinados momentos tive que me ausentar, para que assim, pudesse realizar esse trabalho.

Enfim, todos que colaboraram de uma maneira ou outra durante a trajetória de construção deste trabalho, meu muito obrigada!

(5)

“o amor deve ser a mais estimada de todas as coisas existentes. Esclareça-se que o amor, assim como os outros valores, é uma coisa, mas não algo concreto, palpável. Por sua própria natureza é inexaurível, jamais se esgota, sempre podemos amar mais e melhor.” Guilherme Assis de Almeida.

(6)

O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise da afetividade e sua conceituação no Direito. Apresenta os elementos caracterizadores da afetividade, bem como aborda os campos de atuação e apresenta as formas e importância do parentesco, já que os laços afetivos vem dando ensejos a vínculos da convivência familiar afetiva, deixando de ser o vínculo biológico a única forma de parentesco. Aborda, num segundo momento, a afetividade no Direito de Família entre genitores e prole, especificando de que maneira o poder familiar se impõe aos pais em relação aos filhos e, aborda também, as diversas formas de reconhecimento da filiação existentes nos dias atuais, apresentando quais são os deveres de cuidados que os genitores devem ter com relação a sua prole. Por fim, estuda a postura do Judiciário diante dessa nova perspectiva, fazendo uma breve análise das jurisprudências nos seguintes Tribunais: Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça e Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e tece considerações sobre as mesmas. Finaliza concluindo que se deve priorizar a afetividade no âmbito jurídico, em especial no Direito de Família, por ser um dos princípios basilares e de fundamental importância aos seres humanos, principalmente à prole em seu desenvolvimento.

Palavras-Chave: Afetividade. Vínculo Afetivo. Direito de Família. Relações Familiares.

(7)

The present work of conclusion of the course makes an analysis of the affectivity and its conceptualization in the Law. It presents the elements that characterize affection, as well as addressing the fields of activity and presents the forms and importance of kinship, since affective bonds have been giving rise to bonds of affective family coexistence, and the biological bond is no longer the only form of kinship. In a second step, it addresses the affectivity in Family Law between parents and offspring, specifying how family power imposes itself on parents in relation to their children, and also addresses the various forms of recognition of membership existing today, presenting which are the care duties that parents should have regarding their offspring. Finally, it studies the position of the Judiciary before this new perspective, making a brief analysis of the jurisprudence in the following Courts: Supreme Federal Court, Superior Court of Justice and Court of Justice of the State of Rio Grande do Sul and makes considerations about them. He concludes by concluding that affection must be prioritized in the legal sphere, especially in Family Law, as it is one of the basic principles and of fundamental importance to human beings, especially the offspring in their development.

(8)

INTRODUÇÃO ... 8

1 A AFETIVIDADE NO DIREITO ... 10

1.1 Conceito de afetividade ... 10

1.2 Elementos e campos de atuação da afetividade ... 15

1.3 Parentesco e afetividade ... 22

2 AFETIVIDADE ENTRE GENITORES E A PROLE ... 27

2.1 Poder familiar e afetividade ... 27

2.2 O reconhecimento da filiação ... 32

2.3 O dever de cuidado ... 38

3 VISÃO JURISPRUDENCIAL ... 43

3.1 Do Supremo Tribunal Federal ... 43

3.2 Do Superior Tribunal de Justiça ... 48

3.3 Do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul ... 53

CONCLUSÃO ... 57

(9)

INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo acerca da afetividade no Direito, em especial no Direito de Família, a fim de efetuar uma investigação em busca da real importância/relevância que o afeto exerce no convívio familiar.

A afetividade é inerente a todos os seres humanos, e se apresenta de diversas formas durante o desenvolvimento de cada indivíduo. Nesse sentido, tendo em vista a importância da afetividade no âmbito do direito, em especial no direito de família onde a afetividade é um princípio de extrema relevância para o desenvolvimento da criança, percebe-se que a falta desse afeto por parte dos pais em relação a sua prole, traz inúmeros transtornos as crianças, tais como cognitivos e emocionais, perdurando muitas vezes, até a vida adulta. Sendo assim, é muito importante que a criança tenha, desde seu nascimento, um vínculo de afeto, de carinho, e de respeito em seu convívio familiar, podendo ser ele através dos diversos tipos de parentesco, como por exemplo, natural/consanguíneo ou socioafetivo.

Apesar de sua previsão não se dar de forma expressa na legislação, nota-se através da sensibilidade dos juristas, que a afetividade é um princípio do nosso sistema brasileiro contemporâneo. Portanto, nos dias atuais é um erro afirmar que as relações baseadas no afeto são inferiores às consanguíneas, visto que há inúmeros casos em que o judiciário reconhece o afeto como sendo um dos principais pressupostos para que haja a configuração do vínculo familiar. Dessa forma, essa busca é necessária face os inúmeros casos que vem surgindo perante os Tribunais, onde famílias buscam o Poder Judiciário com a intenção de validar a afetividade como um pressuposto para que seja feito o reconhecimento da filiação socioafetiva em relação a paternidade biológica, por exemplo.

Para a realização deste trabalho foram efetuadas pesquisas bibliográficas e por meio eletrônico, analisando também as propostas legislativas em andamento, a

(10)

fim de enriquecer a coleta de informações e permitir um aprofundamento no estudo da afetividade, revelar a importância desse princípio na construção e convívio mais saudável nas relações familiares.

Inicialmente, no primeiro capítulo, será feita uma abordagem da afetividade conceituando no direito e apresentando os campos de atuação, bem como os elementos que caracterizam a afetividade no âmbito jurídico. Também, será analisado a relação entre parentesco e afetividade, demonstrando que nos dias atuais o vínculo biológico não mais é superior ao afetivo.

No segundo capítulo será analisado mais especificamente a afetividade no Direito de Família entre genitores e prole, demonstrando de que maneira o poder familiar se estabelece nas famílias. Abordará as diversas formas de reconhecimento da filiação existentes nos dias atuais e demonstrará quais são os deveres de cuidados que os genitores devem ter com relação a sua prole.

Por fim, o terceiro capítulo busca analisar os entendimentos jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul no que tange essa temática.

A partir desse estudo verifica-se que a afetividade apresenta características essenciais para a construção e desenvolvimento mais saudável de crianças e até mesmo das relações familiares em que convivem, em razão de se dar através do respeito, carinho e do afeto entre as pessoas, sejam elas famílias socioafetivas ou famílias naturais/consanguíneas.

(11)

1 A AFETIVIDADE NO DIREITO

No presente capítulo será abordado a afetividade no direito. Fará uma breve conceituação, demonstrando a importância do afeto nas relações jurídicas, se consagrando como um princípio que deve permear a aplicação das leis, e também, suas consequências em caso de não haver esse vínculo afetivo. Apresentará os elementos essenciais caracterizadores da afetividade.

As diferentes formas de parentesco também serão analisadas, uma vez que atualmente existem, por exemplo, a socioafetiva, que se dá em função do afeto existentes entre as pessoas, e a consanguínea ou natural que se refere as pessoas ligadas pelo fator biológico.

1.1 Conceito de afetividade

A afetividade é algo que emana do ser humano e se dá no relacionamento com as demais pessoas. Dessa forma, pode-se dizer que a afetividade não pode ser mensurada ou quantificada, pois não é um objeto físico, e nem ocupa lugar no espaço. Porém, também não pode-se dizer que é um objeto ideal, o qual só pode ser concebido no plano das ideias.

Portanto, segundo Santos (2011, p. 49):

É possível afirmar que a afetividade não é substantiva, mas sim adjetiva, na medida em que só pode ser concebida como uma qualidade inerente aos seres humanos e, quiçá, aos animais superiores. Mas, a afetividade é também o conjunto dos afetos presentes em cada pessoa, podendo ser estudada e organizada para dela se extrair uma funcionalidade adequada ao perfeito equilíbrio do ser humano. Sob esse aspecto, a afetividade assume formato substantivo.

A afetividade é um objeto complexo, e se apresenta de diversas formas. Podendo ser um fenômeno psíquico e jurídico. Psíquico no sentido de ser inerente a todos os seres humanos, o qual é determinante para a formação da personalidade, e dessa forma constitui-se em um valor a ser protegido no mundo jurídico. Ou seja, cabe ao direito atribuir sentido a essa afirmação feita pela psicologia.

(12)

Dessa maneira, ao falarmos em afetividade não podemos deixar de mencionar, pelo menos, os três grandes modelos de famílias, presentes ao longo da história, os quais demonstram a evolução da afetividade nas relações familiares. São elas a família patriarcal tradicional, a família nuclear e a família plural ou democrática.

A família patriarcal tradicional, primeiro modelo familiar do início do século XIX e que esteve presente até meados do século XX, se refere, segundo Giddens (2005, p.99):

A família tradicional era acima de tudo uma unidade econômica e de parentesco. Os laços de casamento não eram individualizados como são agora, e o amor ou envolvimento emocional não eram a base primordial do casamento, como se tornaram subsequentes.

O segundo modelo familiar, considerado como a família nuclear, tem como critério o amor e surgiu em meados do século XVIII, na Europa, marcando o início da época moderna. Nesse período, homens e mulheres estão inseridos no mercado de trabalho, ou seja, ambos são provedores, porém, todas as tarefas relacionadas ao lar continuam sendo realizadas somente pelas mulheres.

A família dita ‘moderna’ torna-se o receptáculo de uma lógica afetiva cujo modelo se impõe entre o final do século XVIII e meados do século XX. Fundada no amor romântico, ela sanciona a reciprocidade dos sentimentos e os desejos carnais por intermédio do casamento. Mas valoriza também a divisão do trabalho entre os esposos, fazendo ao mesmo tempo do filho um sujeito cuja educação sua nação é encarregada de assegurar. (ROUDINESCO, 2003, p.19).

Por fim, o terceiro modelo familiar, denominado de família plural ou democrática, tem como base o reconhecimento da afetividade. Dessa forma, passa a reconhecer como família, não apenas as oriundas do casamento, possibilitando formas familiares distintas das então existentes. Rocha, Scherbaum e Oliveira (2018, p. 39) salientam que:

A mudança de tais parâmetros só ocorreu com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que, pautadas nos paradigmas da igualdade e da dignidade da pessoa humana, imprimiu novos rumos ao Direito de Família no intuito de humanizar as relações familiares.

(13)

Nesse mesmo sentido, segundo Santos (2011, p. 105) “autores mais recentes assumem abertamente a influência dos aspectos interiores da personalidade na formação e na aplicação do Direito.” Afirma que o Direito se constrói também com base na afetividade, e não apenas a partir da intelectualidade.

De tal maneira, Santos (2011, p. 106) sustenta que:

A virada paradigmática da Modernidade para a Pós-Modernidade promoveu uma verdadeira revolução nos valores vigentes na sociedade. E o direito, que antes se destinava exclusivamente à proteção do patrimônio material, passou a tutelar também outros aspectos importantes da existência humana. A afetividade, então, desponta como um valor necessário à constituição e ao desenvolvimento da pessoa, a merecer proteção do ordenamento jurídico.

Ou seja, a afetividade se consagra como valor jurídico, em consequência da virada paradigmática da Modernidade para a Pós-Modernidade, em decorrência dos estudos feitos pelas ciências psicológicas e das transformações sociais que mostram a relevância desses aspectos no desenvolvimento sadio dos indivíduos e, por conseguinte seus reflexos na qualidade de vida social.

Portanto, a afetividade de uma forma mais abrangente seria um fator inerente aos seres humanos, que por sua vez constitui e projeta a personalidade, repercutindo na vida social e até mesmo política do indivíduo. O afeto é apontado nos dias atuais, como o principal fundamento das relações familiares e encontra-se nas condutas de cada indivíduo. É um sentimento de carinho e cuidado com o outro e está diretamente ligado a formação do caráter de cada pessoa. Por isso, a ausência de afeto, principalmente quando criança, pode trazer diversos transtornos em sua vida adulta. Sendo extremamente importante para a criança a construção de laços afetivos, que resultará em uma vida social mais saudável. .

Pode-se dizer que a afetividade é constitutiva de todos seres humanos, sendo um conjunto de afetos, emoções, paixões que compõem a esfera instintivo-afetiva. É uma característica essencial de todos os humanos. E por isso, emerge como valor

(14)

jurídico ligado aos direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana, no pós-modernidade.

Entretanto, Santos (2011, p. 113-114) refere que:

A afetividade não é estática. Ela surge com relacionamentos que estabelecemos durante a vida, desde a primeira infância até a idade adulta. Portanto, ela se desenvolve dentro de cada um. Além disso, a afetividade pode ser mal formada ou, então, sofrer deformação depois de formada, o que resulta em alterações do psiquismo, produz alterações de comportamento e de conduta e, enfim, altera o nosso padrão de relacionamentos, prejudicando a convivência.

Essa má formação e deformação da estrutura afetiva da criança, traz problemas futuros na estrutura do Estado, mas principalmente na qualidade de vida social e na própria personalidade do indivíduo, pois resulta numa desestruturação da própria pessoa. Sendo assim, fica claro a importância que a boa formação dessa estrutura afetiva causa na personalidade, sendo possível se constituir como pessoa.

Conclui-se, portanto, que a afetividade é inerente à personalidade, e por isso, encontra-se na base de toda relação jurídica. Santos (2011, p.151-152), faz uma breve análise da afetividade no âmbito do Direito de Família:

É nas relações jurídicas do Direito de Família que a afetividade se manifesta de maneira mais expressiva, uma vez que as próprias relações familiares são permeadas pelos afetos. Podemos dizer que as relações familiares, antes de serem jurídicas, são afetivas.

Com o texto da Constituição de 1988, não resta dúvida de que surge um novo modelo de família onde o afeto, respeito, liberdade, igualdade, dignidade, solidariedade são de extrema importância. Passando-se a perceber, desde então, um novo Direito de Família.

O ente familiar não é mais uma única definição. A família torna-se plural. Há realmente, uma passagem intimamente ligada às modificações políticas, sociais e econômicas. Da superação do antigo modelo de grande família, na qual avultava o caráter patriarcal e hierarquizado de família, uma unidade centrada no casamento, nasce a família moderna, com progressiva eliminação da hierarquia, emergindo certa liberdade de escolha; o casamento fica dissociado

(15)

da legitimidade de filho. Começam a dominar as relações de afeto, de solidariedade e de cooperação. (FACHIN, 1997, p. 586-587).

Nesse mesmo sentido, afirma Paulo Luiz Netto Lôbo (2008. p.48):

Demarcando seu conceito, é o princípio que fundamenta o direito de família na estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão de vida, com primazia sobre as considerações de caráter patrimonial ou biológico. Recebeu grande impulso dos valores consagrados na Constituição de 1988 e resultou da evolução da família brasileira, nas últimas décadas do século XX, refletindo-se na doutrina jurídica e na jurisprudência dos tribunais. O princípio da afetividade especializa, no âmbito familiar, os princípios constitucionais fundamentais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da solidariedade (art. 3º, I), e entrelaça-se com os princípios da convivência familiar e da igualdade entre cônjuges, companheiros e filhos, que ressaltam a natureza cultural e não exclusivamente biológica da família. A evolução da família “expressa a passagem do fato natural da consanguinidade para o fato cultural da afinidade”.

A afetividade se apresenta de várias formas, sendo assim, um objeto complexo. Portanto, o acolhimento da afetividade nas relações familiares se deu de tal forma e intensidade que a afetividade passou a ser reconhecida como um princípio jurídico, a partir de valores e princípios adotados pela própria Constituição em matéria de Direito de Família.

De tal maneira, é possível sustentar que a afetividade na Constituição de 1988 se dá de forma implícita. Já no Código Civil de 2002, é possível afirmar que a afetividade nas suas disposições se dá de forma implícita e de forma explícita, reforçando assim o papel principiológico no tratamento dos temas de Direito de Família. Ou seja, o afeto não pode ser considerado como um mero dever de cuidado dos genitores, mas sim um elemento fundamental, de relevância essencial na criação e desenvolvimento da criança.

Como dito em diversas oportunidades, a afetividade é constitutiva da personalidade do ser humano, sendo então, este, um valor jurídico a ser preservado, protegendo a dignidade da pessoa humana. E, em se referindo a matéria de Direito de Família, a afetividade é um princípio que deve permear a aplicação da lei.

(16)

1.2 Elementos e campos de atuação da afetividade

O afeto deriva da convivência familiar, sendo este, uma condição para a vida humana. Porém, muito embora a Constituição de 1988 não tenha mencionado de forma expressa a afetividade ou afeto, é possível perceber, a partir da leitura, sua consagração como um princípio constitucional e também como um elemento legitimador da família contemporânea. Quatro são os elementos fundamentais que se encontram na Constituição Federal de 1988 e que se referem ao princípio da afetividade, vejamos, conforme Almeida (2019):

a) a igualdade entre todos os filhos, independentemente de sua origem (art. 227, § 6º, CF);

b) a adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente ao plano da igualdade de direitos (art. 227, §§ 5º e 6º, CF);

c) a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os adotivos, tem a mesma dignidade de família constitucionalmente protegida (art. 226, § 4º, CF);

d) o direito à convivência familiar como prioridade absoluta da criança e do adolescente (art. 227, CF).

Foi positivado no art. 227, § 6, da CF/1988 o direito à igualdade entre todos os filhos. E, da mesma forma, nos art. 1.596 do CC/2002 e no art. 20 da Lei 8.069/1990, denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo de igual teor à norma constitucional.

CF - Art. 227, § 6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. CC, Art. 1.596 e ECA, Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Quando se fala em adoção, há de se falar em igualdade de direitos referentes aos filhos biológicos e socioafetivos, ou seja, filho adotivo passa a ter os mesmos direitos que filhos naturais ou consanguíneos, como refere o art. 227, §§ 5º e 6º da CF/1988. Da mesma maneira, filhos socioafetivos, também têm os mesmos direitos.

(17)

CF- Art. 227, § 5º. A adoção será assistida pelo poder público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros.

§ 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Em relação a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os adotivos, tem a mesma dignidade de família constitucionalmente protegida. É o que pontua o art. 226, § 4º, CF/1988:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

E, por fim, com base no art. 227, da CF/1988, o direito à convivência familiar como prioridade absoluta da criança e do adolescente.

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Desse modo, Lôbo (2019), de forma clara, descreve:

Se todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem, é porque a Constituição afastou qualquer interesse ou valor que não seja o da comunhão de amor ou do interesse afetivo como fundamento da relação entre pai e filho. A fortiori, se não há qualquer espécie de distinção entre filhos biológicos e filhos adotivos, é porque a Constituição os concebe como filhos do amor, do afeto construído no dia a dia, seja os que a natureza deu seja os que foram livremente escolhidos. Se a Constituição abandonou o casamento como único tipo de família juridicamente tutelada, é porque abdicou dos valores que justificavam a norma de exclusão, passando a privilegiar o fundamento comum a todas a entidades, ou seja, a afetividade, necessário para realização pessoal de seus integrantes.

Dessa forma, valoriza-se as funções afetivas da família. A família e o casamento passam a ter um novo perfil, voltados muito mais nos interesses afetivos de seus integrantes, sendo esta a concepção de família eudemonista.

(18)

Segundo Dias (2006, p. 61), a concepção eudemonista da família se refere:

Essa é a concepção eudemonista da família, que tem como função social realizar a felicidade das pessoas que integram a família, em detrimento de seu aspecto patrimonial. A comunhão de afeto é incompatível com o modelo único, matrimonializado da família, por isso, a afetividade entrou nas cogitações dos juristas, buscando explicar as relações familiares contemporâneas.

Segundo Amarilla (2014, p. 100):

Pretendeu o constituinte, assim, projetar por todo o campo jurídico – quer constitucional, quer infraconstitucional – a recognição da família como fenômeno cultural e social, fundando-a e legitimando-a nos laços de afeto, sem qualquer subordinação a critérios biológicos. De fato, ao exalar a igualdade entre os filhos, independentemente de sua origem, estabeleceu a ordem constitucional a ausência de primazia entre filiação biológica e a não biológica, dissociando de vez a parentalidade do casamento e do sexo.

Como a afetividade é parte constitutiva dos seres humanos, e a Constituição protege esses aspectos da pessoa humana, as relações de afeto possuem um valor vigente, iniciando sua proteção através da dignidade humana e após, nos princípios da igualdade e da solidariedade, que estão previstos na Constituição. No âmbito do Direito de Família, de forma abrangente, poderíamos dizer que seria não oferecer um tratamento indigno aos tipos de família, formas de filiação e parentesco.

É a dignidade da pessoa humana que permite e determina que seja destinado tratamento igualitário aos filhos, independentemente de sua origem, se advêm ou não do casamento. Por ser princípio fundamental, dita um limite de atuação do Estado e garante que a partir dele se promova a dignidade da pessoa humana, valor espiritual e moral inerente à pessoa. (ZENI, 2019, p.70).

O Estado deve promover às pessoas que compõem a família, a dignidade. Porém, todos, como parte integrante da família, devem agir para que ocorra efetivamente. Em especial os pais ou responsáveis em relação aos filhos que sejam menores.

Nas relações familiares, parte-se do pressuposto de que a afetividade é inerente à personalidade e, dessa forma, é a base de toda a conduta jurídica. De acordo com Santos (2011, p.151-152) “é nas relações jurídicas do Direito de Família

(19)

que a afetividade se manifesta de maneira mais expressiva, uma vez que as próprias relações familiares são permeadas pelos afetos”. Assim, é de extrema importância ter um ambiente familiar que seja favorável para o desenvolvimento dos laços afetivos, pois de acordo com Santos (2011, p. 154):

É na família que nos sentimos à vontade para exprimir abertamente os nossos sentimentos e receber os estímulos daqueles que nos cercam; afetar e sermos afetados em um grau de liberdade que não se encontra nas outras espécies de relacionamentos.

Nesse mesmo sentido, Rocha, Scherbaum e Oliveira (2018, p. 134) referem que:

A afetividade, reconhecida como envolvimento afetivo que possibilita o pleno desenvolvimento do ser humano, de sua individualidade e de sua privacidade, adentrou no elenco principiológico do Direito de Família como elemento nuclear que reflete a constitucionalização de modelos de famílias eudemonistas e igualitários.

Porém, é importante destacar que há uma distinção entre os fatos indicativos da presença da afetividade e o regramento jurídico da afetividade. Os fatos desenvolvem-se no meio social, ou seja, na experiência concreta, e serão reconhecidos pelo Direito a partir da incidência do princípio da afetividade, portanto.

Com base nas palavras de Calderón (2017, p. 397), o princípio da afetividade possui duas faces, o que possibilita a exata percepção de seu sentido, são elas:

A primeira delas é a face de dever jurídico, voltada para as pessoas que possuam algum vínculo de parentalidade ou de conjugalidade (aqui incluídas não só as relações matrimoniais, mas todas as uniões estáveis de alguma forma reconhecidas pelo sistema). Essa face do princípio vincula tais pessoas a condutas recíprocas representativas da afetividade inerente a tal relação. A segunda faceta do princípio é a face geradora de vínculo familiar, voltada para as pessoas que ainda não possuam um vínculo reconhecido pelo sistema (seja de parentalidade, seja de conjugalidade), pela qual a incidência do princípio da afetividade consubstanciará um vínculo familiar entre os envolvidos. Nesta particularidade resta abarcada a noção da posse de estado. Ou seja, a presença de um dado conjunto fático fará incidir o princípio da afetividade de modo a configurar, a partir de então, um vínculo familiar decorrente daquela relação.

(20)

Dessa forma, fica claro que essas duas faces não se confundem, porém não se excluem. Pois a partir do reconhecimento do vínculo familiar, face geradora de vínculos, incidirá a outra face, sendo esta a de dever jurídico. De tal maneira, o princípio da afetividade não possui um sentido rígido ou mesmo definitivo, pois será sempre levado em consideração a situação concreta específica de cada caso.

Há, assim, um conjunto de elementos que externa a relevância da afetividade no nosso sistema jurídico, a indicar que diversas disposições legais visam tutelar situações afetivas existenciais. Esse movimento legislativo, entre avanços e retrocessos, e apesar de estar aquém do que se demanda dele na atualidade, parece que está alinhado com a transição constatada na própria família brasileira. Também não ignoram e não se afastam desse posicionamento a jurisprudência e a doutrina pátrias, que há muito fazem coro no sentido de reconhecer paulatinamente a afetividade. (CALDERÓN, 2017, p. 90).

Outra particularidade do princípio da afetividade que merece destaque é a dimensão objetiva e dimensão subjetiva.

A dimensão objetiva envolve a presença de fatos tidos como representativos de uma expressão de afetividade, ou seja, fatos sociais que indiquem a presença de uma manifestação afetiva. A dimensão subjetiva trata do afeto anímico em si, do sentimento de afeto propriamente dito. Esta dimensão subjetiva do princípio certamente escapa ao Direito, de modo que é sempre presumida, sendo que constatada a dimensão objetiva da afetividade restará desde logo presumida a presença da sua dimensão subjetiva. Dito de outro modo, é possível designá-lo como princípio da afetividade jurídica objetiva, o que ressalta o aspecto fático que é objeto da apreensão jurídica. (CALDERÓN, 2017, p. 397-398).

A afetividade busca aproximar as pessoas e é elemento de extrema relevância para a formação e estruturação familiar. Portanto, não se pode olvidar que é por meio do amor que se busca demonstrar o afeto. Dessa maneira, o ambiente familiar passou a ser ligado por laços de afetividade - de forma pública, contínua e duradoura, tendo assistência mútua entre os membros daquela entidade familiar. Ademais, o reconhecimento jurídico da afetividade deve se dar sempre com equilíbrio e razoabilidade, em conformidade com os demais elementos do sistema jurídico.

(21)

A palavra afeto como sinônima de afeição, de simpatia, de amizade, de amor; ou então como sentimento, paixão; no sentido psicológico, afeto é o elemento básico da afetividade. Afetividade, no sentido comum é a qualidade ou caráter do que é afetivo – relativo ao afeto. No sentido psicológico, afetividade é o conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sob a forma de emoções, sentimentos e paixões. (SANTOS, 2011, p. 51).

No entanto, com base na compreensão da afetividade, no campo de atuação da Psicologia, pode-se afirmar que possui inúmeras vertentes, entre elas, de forma abrangente, a Psicologia Comportamental de Pierre Debray-Ritzen e Badrig Melekian, na Psicologia do Desenvolvimento de Jean Piaget e na Psicanálise de Sigmund Freud. A afetividade também é abordada na filosofia por Baruch de Spinoza. Dessa forma vejamos de que forma se dá em cada uma das vertentes acima citadas:

De Spinoza, extraímos que somos essencialmente passionais, afetivos, desejantes e que nos realizamos na convivência com os demais. Em Freud, percebemos a descoberta de uma tese antropológica fundamental, afetiva originária, que movimenta o psiquismo e orienta as pulsões. Na expressão de Piaget, a afetividade apresenta-se de modos variados, conforma os estágios de evolução do ser humano, saindo da apatia, passando pelo egocentrismo até alcançar a socialidade, que é o estágio mais evoluído da personalidade. Por último, Pierre Debray-Ritzen e Badrig Melekian dizem que a afetividade e a intelectualidade somadas compõem os processos interiores da atividade psíquica que se passa no interior dos organismos e que os move, produzindo aquilo que se chama de comportamento. (SANTOS, 2011, p. 72).

Nesse sentido, Santos (2011, p. 95) esclarece que “a afetividade se relaciona com o Direito, sob o ponto de vista da coercitividade, indagando-se, então, sobre a possibilidade de se exigir juridicamente a prestação de afetos.”

Já no campo educacional ou da pedagogia é recente o interesse pelo estudo da afetividade. Podemos citar o educador francês Henri Wallon, pois foi ele o grande estudioso que se aprofundou na questão da afetividade no processo evolutivo. Defende que a vida psíquica é formada por três dimensões e que atuam de forma integrada, são elas: motora, afetiva e cognitiva.

Dessa forma, a teoria walloniana traz grandes contribuições para o entendimento das relações entre educando e educador, além de situar a escola como um meio fundamental no desenvolvimento

(22)

desses sujeitos. A noção de domínios funcionais “entre os quais vai se distribuir o estudo das etapas que a criança percorre serão, portanto, os da afetividade, do ato motor, do conhecimento e da pessoa” (WALLON, 1995, p. 117). Eles são construtos teóricos que ajudam na compreensão dos processos de desenvolvimento e são

postos como indicadores na condução dos processos

ensino/aprendizagem. (FERREIRA, ACIOLY-RÉGNIER, 2020).

Dessa maneira, Wallon demonstra que a afetividade é expressada por diferentes maneiras: por meio da emoção, do sentimento e da paixão. Elas surgem durante toda a vida do indivíduo, porém, apresentam uma evolução, assim como o pensamento infantil. Vejamos, de acordo com Ferreira e Acioly- Régnier (2020):

Uma das contribuições centrais de Wallon está em dispor de uma conceituação diferencial sobre emoção, sentimentos e paixão, incluindo todas essas manifestações como um desdobramento de um domínio funcional mais abrangente: a afetividade, sem contudo, reduzi-los uns aos outros. Assim podemos definir a afetividade como o domínio funcional que apresenta diferentes manifestações que irão se complexificando ao longo do desenvolvimento e que emergem de uma base eminentemente orgânica até alcançarem relações dinâmicas com a cognição, como pode ser visto nos sentimentos.

Contudo, pode-se notar, nas palavras do estudioso Wallon, que a integração é um conceito fundamental na formação do educando e que este destaca a importância da afetividade no processo de desenvolvimento da personalidade da criança, para Ferreira e Acioly- Régnier (2020), onde “se iniciaria de forma sincrética e gradativamente adquiriria contornos mais nítidos através dos processos de diferenciação”.

(23)

1.3 Parentesco e afetividade

Pode-se dizer, de acordo com Resende (2019), que “parentesco é a relação de vinculação existente entre indivíduos que descendem uns dos outros ou de um tronco comum, bem como entre um cônjuge e os parentes do outro consorte, além de entre adotante e adotado”.

É necessário destacar a diferenciação entre os conceitos de parentesco e de família, isso porque os cônjuges e companheiros podem ser considerados família, mas não são parentes entre si. Com as alterações nas famílias contemporâneas, foi redefinido o sentido de parentalidade que até então existiam, sendo estes os vínculos biológicos ou registrais. Dessa forma, o cenário se alterou com o reconhecimento do elo socioafetivo, sendo este, também formador de um vínculo parental.

Há, portanto, diferentes espécies de parentesco, podendo ser estes o parentesco natural, que se refere ao vínculo consanguíneo; o civil, oriundo do vínculo jurídico, decorrente da socioafetividade; e também, por afinidade, que se estabelece entre cada cônjuge ou companheiro e os parentes do outro.

Fugimoto (2019) classifica as espécies de parentesco em natural ou consanguíneo, o afim e o civil:

1) Natural ou consanguíneo, que é o vínculo entre as pessoas descendentes de um mesmo tronco ancestral, portanto ligadas, umas às outras, pelo mesmo sangue. P. ex.: pai e filho, dói irmãos, dois primos, etc. O parentesco por consangüinidade existe tanto na linha reta como na colateral até o quarto grau. Será matrimonial se oriundo de casamento, e extramatriomonial se proveniente de união estável, relações sexuais eventuais ou concubinárias.

2) Afim, que se estabelece por determinação legal (CC, art. 1.595), sendo o liame jurídico estabelecido entre consorte, companheiro e os parentes consangüíneos, ou civis, do outro nos limites estabelecidos na lei, desde que decorra de matrimônio válido, e união estável. 3) Civil (CC, art. 1.593, in fine) é o que se refere à adoção, estabelecendo um vínculo entre adotante e adotado, que se estende aos parentes de um e de outro. (...) O parentesco civil abrange o socioafetivo (CC, arts. 1.593, in fine, e 1.597, V), alusivo ao liame entre pai institucional e filho advindo de inseminação artificial

(24)

biológica entre o filho gerando relação parento-filial apesar de não haver vínculo biológico entre o filho e o marido de sua mãe, que anuiu na reprodução assistida.

Portanto, o Código Civil de 2002, reconheceu a existência de parentesco e dissociou o estado de filiação somente de origem genética/natural, sendo a outra a socioafetiva. No que concerne, o reconhecimento da parentalidade socioafetiva, como nova forma de parentesco, esta é pontuada pelo art. 1.593 do CC/2002, em sua parte final, onde usa a expressão “outra origem”. Vejamos: “Art. 1.593: O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem.“

Com base no art. 1.593 do CC/2002, Amarilla (2014, p. 152) destaca:

Esta regra, simples em sua redação mas poderosa na repercussão de seu conteúdo, permite o reconhecimento judicial dos vínculos de parentesco, incluindo-se aí obviamente o vínculo de parentalidade, fora e além dos critérios biológicos, emparelhando em direitos os filhos que compartilham com seus ascendentes a mesma linhagem genética e todos os outros cujo vínculo parental decorre de origem diversa.

Então, com base no artigo 1.593 do CC/2002, fica claro existir o parentesco natural ou consanguíneo - assim também conhecido, que se dá através do vínculo biológico. E o parentesco civil, que se refere a todo e qualquer tipo de parentesco, porém, sem que haja o vínculo biológico, nesse sentido podemos citar o parentesco decorrente da adoção e da filiação socioafetiva.

Em relação a adoção, a criança é inserida como um novo membro da família, e é nesse momento que se torna parente em linha reta dos novos pais, formando-se o parentesco. Uma ressalva é feita pois a filiação adotiva possui o mesmo tratamento do parentesco natural.

Com base nas palavras de Araújo (2019), o parentesco pode formar-se através da adoção, vejamos:

O parentesco pode formar-se, então, através da adoção de uma criança. Quando a partir daquele momento será incorporado mais um membro à família, tornando-se a criança um parente em linha reta aos novos pais. Vale ressaltar que para efeitos legais, o parentesco

(25)

em linha reta não traz nenhuma limitação, sendo parente até onde houver ascendente ou descendente em linha reta, já em linha colateral até o 4º grau em determinados casos. Portanto, esta nova criança incorporada ao seio de uma nova família terá sua ascendência sem limitação à nova família.

Ademais, está previsto também pelo Conselho Federal de Justiça em seu Enunciado n. 256 e aprovado na III Jornada de Direito Civil, que o parentesco civil abrange o parentesco socioafetivo, sendo uma relação de afeto e constituída pela convivência. Enunciado n. 256 CFJ: “A posse do estado de filho constitui modalidade de parentesco civil”.

Além da adoção, o parentesco Civil pode decorrer também da filiação socioafetiva, onde o que liga essas pessoas é o vínculo afetivo.

O vínculo afetivo, emocional, liga estas pessoas de tal modo que torna-se impossível separá-lo da convivência cotidiana. É o caso, por exemplo do homem que acredita ser seu um filho que nasceu na constância do casamento e descobre que não o é e a mãe quer se separar e voltar para o pai biológico da criança, mesmo já se passando alguns anos de convivência. Estes anos de convivência, com aquele que pensava ser o pai e não o era, fizeram com que o amor estreitasse a relação entre este filho e este pai de tal modo que ele sinta ser impossível deixar de amá-lo. Neste caso tem-se uma relação de parentesco por socioafetividade. (ARAÚJO, 2019).

Dessa maneira, o vínculo decorre da relação socioafetiva entre pais e filhos, e tem como principal característica o afeto e o sentimento existente entre eles, deixando de ser superior a filiação biológica em relação ao filho afetivo. Ou seja, as relações socioafetivas, quando devidamente comprovadas, também geram vínculos de parentesco. É o caso, por exemplo, dos filhos adotivos e da filiação socioafetiva, onde a relação parental se dá por meio do vínculo afetivo e não pelo laço consanguíneo.

Nesse sentido, vale destacar que aquele que ama, cuida, educa e sustenta nem sempre será o pai biológico. Podemos mencionar a expressão: “pai é quem cria”. Pois muitas vezes os pais biológicos não exercem essa função e são substituídos por pessoas que exerçam tais funções, passando o vínculo biológico para o afetivo. Evidente fica, que essa relação de parentesco e afetividade diz

(26)

respeito a um vínculo caracterizado pelo amor, afeto, respeito, cuidado, afinidade, etc., e não somente pelo laço biológico.

Com a elevação do afeto como um princípio jurídico, reconheceu-se o vínculo paterno/materno-filial socioafetivo e afirma, de maneira pontual, Amarilla (2014, p. 102):

Tomando-se então por premissa o que não é o compartilhamento de dados genéticos o que assegura e legitima a parentalidade e a filiação, mas, sim, o cuidado, o amparo e o carinho dedicados por pais e mães em proveito do desenvolvimento corporal, psíquico e emocional de seus filhos, sejam eles biológicos ou não. Dentro desse contexto, tem-se que a parentalidade corresponde à situação na qual uma pessoa vivencia a condição de pai, mãe ou filho de alguém, independentemente de qualquer vínculo biológico. Tal condição ou estado é inaugurado no íntimo de cada um dos autores da cena familiar, estabilizando-se e consolidando-se com a convivência contínua, duradoura e qualificada, emergindo a afetividade como elemento primordial para a aferição do liame parental.

Como referido acima, o que assegura o parentesco entre genitores e prole não é tão somente o fator biológico, mas sim a relação de afeto existente entre ambos.

O parentesco socioafetivo nos dias atuais, passou a ficar lado a lado dos já conhecidos vínculos biológicos e registrais. De tal forma, que a afetividade passou a ser considerada com um princípio do Direito de Família brasileiro, alterando os conceitos de parentalidade, e prevalecendo até mesmo, em alguns casos, o parentesco socioafetivo em relação ao parentesco biológico.

Dessa forma, o parentesco socioafetivo tem os mesmos efeitos do parentesco natural. Quais sejam, de acordo com Heloisa Helena Barboza (2019):

São efeitos pessoais: a) a criação do vínculo de parentesco na linha reta e na colateral (até o 4º grau), permitindo a adoção do nome da família e gerando impedimentos na órbita civil, como os impedimentos para casamento, e pública, como os impedimentos para assunção de determinados cargos 11 públicos; b) a criação do vínculo de afinidade. Sob o aspecto patrimonial são gerados direitos (deveres) a alimentos e direitos sucessórios.

(27)

Conforme estabelecido no art. 227, §6º da Constituição Federal de 1988: “Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”. Ou seja, independentemente da forma de filiação, todos possuem os mesmos direitos. Então, o parentesco entre genitores e prole, nos dias atuais, pode se estabelecer em virtude da relação de afetividade, onde pais e filhos não são ligados pelo fator consanguíneo, mas sim, pela relação de amor, de afeto e respeito à qual é denominada de socioafetividade.

Portanto, nas palavras de Calderón (2017, p. 214):

A evolução da sociedade brasileira acabou por considerar elos biológicos, afetivos, presuntivos, registrais e adotivos como suficientes para o estabelecimento da filiação e do parentesco. A filiação socioafetiva possui agasalho constitucional, a partir da previsão de igualdade entre todos os filhos (art. 227, § 6º, da CF, repisado no art. 1.596 do CC), e legal, a partir da parte final do art. 1.593 do Código Civil (quando assevera que o parentesco pode ser de outra origem); dentre diversos outros dispositivos do nosso ordenamento.

Percebe-se que a legislação, a doutrina e jurisprudência pátria acolhem o reconhecimento do parentesco socioafetivo. E, uma vez reconhecido judicialmente esse vínculo de parentesco, implicará, necessariamente no restante da família, que pertencem ao grupo familiar. Portanto, o parentesco socioafetivo, em regra, decorre do reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva, gerando todos os efeitos pessoais e patrimoniais que lhe são inerentes.

(28)

2 AFETIVIDADE ENTRE GENITORES E A PROLE

Nesse capítulo será abordado a afetividade no direito de família, ou seja, entre genitores e prole. Será feita uma análise do poder familiar, o qual era chamado de pátrio poder, e de que forma ele se impõe aos pais em relação aos filhos. Analisará as formas de reconhecimento da filiação no âmbito do Direito de Família.

E, por fim, quais são os deveres de cuidados impostos aos pais já que não mais é exercido somente pelo pai, mas sim conjuntamente, pelos dois genitores a partir do poder familiar. Demonstrará também, que há diversos direitos e deveres dos pais que estão explícitos e implícitos na Constituição Federal.

2.1 Poder familiar e afetividade

Como já foi visto até aqui, a afetividade é constitutiva da personalidade e por isso passa a ser um valor jurídico a ser preservado, devendo, principalmente, em Direito de Família, permear a aplicação da lei. Nessa seara do Direito de Família, com a pós-modernidade, surgiu a equalização de forças na relação conjugal e parental. Desde então, tem-se o Princípio da Igualdade na Chefia Familiar, ou seja, tanto o pai como a mãe exercem o poder familiar de provedores educacionais, materiais e afetivos da prole. Hoje, podemos dizer, que a expressão correta passa a ser poder familiar. Diferentemente do que se via no passado, onde apenas a figura paterna exercia o poder absoluto de controle, sendo esta chamada de “pátrio poder”.

A Constituição Federal, em seu art. 226, § 5º, dispõe que:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

(29)

Art. 1.631. Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade.

Ou seja, de acordo com o expresso nos artigos acima referidos, compete ao pai e a mãe à titularidade e exercício do poder familiar de forma igualitária, sendo irrenunciável, pois é o Estado que fixa as normas para seu exercício. Em casos de filhos havidos fora do casamento, estes somente estarão submetidos ao poder familiar, após legalmente reconhecidos, pois é através do reconhecimento que se estabelece, juridicamente, o parentesco.

Pode-se dizer que, com a separação judicial, o divórcio e dissolução de união estável surgirá a partir de então, um modo diferente de exercer o poder familiar, sendo este o sistema de guarda. Existe duas formas mais utilizadas nesses casos de guarda, a primeira é quando um dos genitores detêm a guarda unilateral e o outro, o direito de visitação. A segunda utilizada nesses casos é a guarda compartilhada. Desse modo, o juiz reconhece a importância da afetividade nas relações humanas, e familiares, ao dispor sobre a guarda e o regime de visitação dos pais aos filhos. É através dos aspectos afetivos que permeiam essas relações que será determinado as soluções que melhor se encaixam aos interesses das partes envolvidas.

Portanto, incumbem aos pais alguns direitos e deveres em relação a prole, que são inerentes ao poder familiar, ou seja, aos genitores da prole. Assim, preceitua o art. 1.634 do Código Civil:

Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:

I - dirigir-lhes a criação e a educação;

II - exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584;

III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; IV - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;

V - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;

VI - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

(30)

VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

Em alguns casos pode haver a extinção e suspensão do poder familiar. A extinção que se dará por fatos naturais, de pleno direito ou por decisão judicial, previsto no art. 1.635 do Código Civil, e a suspensão, esta temporária, se dará conforme as seguintes hipóteses, elencadas no art. 1.637 do Código Civil, quais sejam:

Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar: I - pela morte dos pais ou do filho;

II - pela emancipação, nos termos do art. 5o, parágrafo único; III - pela maioridade;

IV - pela adoção;

V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.

Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.

Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.

Ou seja, em casos de extinção do poder familiar a perda é permanente e abrange toda a prole, pois as causas de extinção são bastante graves e por isso colocam todos os filhos em risco. Nesses casos, podem, através de procedimento judicial, recuperar o poder familiar, caso consigam provar que o motivo que ensejou a perda não mais exista. Já na suspenção a perda do poder familiar é temporária e não abrange toda a prole, perdurando somente o tempo necessário. Assim que cessada a causa que motivou, pode àquele que foi suspenso, voltar a exercer o poder familiar. Essa suspenção pode ser total ou parcial.

Estabelece o Estatuto da Criança e Adolescente, em seu art. 129, as consequências previstas caso haja o descumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar:

(31)

Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:

I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;

I - encaminhamento a serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família; (Redação dada dada pela Lei nº 13.257, de 2016)

II - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico; IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;

V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua freqüência e aproveitamento escolar;

VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;

VII - advertência; VIII - perda da guarda; IX - destituição da tutela;

X - suspensão ou destituição do pátrio poder poder

familiar. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência Parágrafo único. Na aplicação das medidas previstas nos incisos IX e X deste artigo, observar-se-á o disposto nos arts. 23 e 24.

Art. 130. Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia comum.

Parágrafo único. Da medida cautelar constará, ainda, a fixação provisória dos alimentos de que necessitem a criança ou o adolescente dependentes do agressor. (Incluído pela Lei nº 12.415, de 2011)

Nesse sentido, Santos (2011, p. 176) explica:

O poder familiar impõe aos pais o dever de zelar pelo bem-estar dos filhos (CF, art. 229; CC, art. 1.634) e o descumprimento dos deveres produz uma série de consequências jurídicas, que vão desde a perda da guarda dos filhos, até a destituição do poder familiar, sem prejuízo de processo criminal por abandono de incapaz.

Como observado, o não cumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar acarreta várias consequências previstas no ordenamento jurídico. Nos dias atuais, não se pode mais dizer que o poder familiar é apenas um poder, mas sim, um conjunto de deveres que são impostos aos pais em benefício dos filhos. Vejamos:

É necessário ter presente que o poder familiar, na atualidade, não pode mais ser concebido apenas como um poder, mas também

(32)

como um conjunto de deveres impostos aos pais. A despeito da deficiência da legislação civil devemos entender que tanto os deveres quanto os poderes inerentes ao poder familiar são instituídos única e exclusivamente para benefício dos filhos. Nessas condições, quando a lei determina que os pais podem manter os filhos sob sua guarda e vigilância, ou que o pai que não detém a guarda pode realizar visitas, na verdade devemos entender que os pais devem manter os filhos sob a guarda e devem realizar visitas, posto que essas medidas não são direitos atribuídos aos pais em seu próprio benefício, mas sim deveres impostos pela lei em benefício dos filhos. (SANTOS, 2011, p. 176-177).

Em relação ao poder familiar, considerando os aspectos afetivos, muitas vezes pode acontecer casos onde o genitor se aproveite da confiança que lhe é naturalmente depositada e assim exceda no exercício dos seus direitos. Nessa situação ocorre o chamado abuso de poder.

O abuso de direito é conduta ilícita apta a gerar o dever de indenizar. Nas hipóteses tratadas, a criança se vê privada de manter e desenvolver laços afetivos com quem a gerou, o que representa prejuízos para a sua constituição psíquica e, enfim, para a sua constituição plena como ser humano. (SANTOS, 2011, p. 168).

Dessa forma, o desprezo da afetividade no relacionamento entre genitores e prole, pode implicar em danos extrapatrimoniais aos últimos, e neste caso, resulta em responsabilidade civil e indenização pecuniária. Santos (2011, p. 179) afirma:

Diante da impossibilidade de recomposição da relação afetiva, o único remédio adequado é a substituição pecuniária, mediante condenação do ofensor ao pagamento de indenização por danos morais. A responsabilidade civil, então, tem lugar daqueles casos em que as medidas afirmativas e corretivas se mostraram insuficientes e a conduta do ofensor acabou por induzir danos ao patrimônio afetivo da vítima.

Vale destacar que os deveres inerentes ao poder familiar, não envolvem apenas o sustento material, mas também os aspectos relacionados com a proteção da estrutura afetiva da criança e adolescente. Dessa forma, pode-se perceber o quão importante e necessário se faz para a prole ter um conjunto de deveres cumpridos pelos pais, pois a falta de cuidado ou mesmo o descaso desprendidos à proteção da prole podem causar danos irreversíveis a estrutura psíquica.

(33)

2.2 Reconhecimento da filiação

Em se tratando do reconhecimento da filiação, é necessário que o pai trate o filho como seu, sendo esta relação reconhecida pela sociedade, não bastando que o filho use o nome do pai. Pode-se dizer que é a exteriorização da convivência familiar e do afeto, devendo ser de forma continua. É de fundamental importância o reconhecimento da filiação para a concretização dos direitos da personalidade, pois é dessa forma que o indivíduo passará a conhecer a sua identidade genética.

Segundo Amarilla (2014, p. 102), o reconhecimento do vínculo paterno/materno-filial socioafetivo, está diretamente ligado a elevação da afetividade à condição de valor e princípio jurídico.

Tomando-se então por premissa o que não é o compartilhamento de dados genéticos o que assegura e legitima a parentalidade e a filiação, mas, sim, o cuidado, o amparo e o carinho dedicados por pais e mães em proveito do desenvolvimento corporal, psíquico e emocional de seus filhos, sejam eles biológicos ou não. Dentro desse contexto, tem-se que a parentalidade corresponde à situação na qual uma pessoa vivencia a condição de pai, mãe ou filho de alguém, independentemente de qualquer vínculo biológico. Tal condição ou estado é inaugurado no íntimo de cada um dos autores da cena familiar, estabilizando-se e consolidando-se com a convivência contínua, duradoura e qualificada, emergindo a afetividade como elemento primordial para a aferição do liame parental. (AMARILLA, 2014, p. 102).

Portanto, quando se fala em paternidade socioafetiva, este se refere aos vínculos baseados exclusivamente nos afetos, seja qual for a realidade biológica. Ou seja, caracteriza-se pela posse do estado de filiação, sendo este uma situação de fato a gerar efeitos jurídicos.

Há três situações que são bastante comuns e que configura-se a paternidade socioafetiva. A primeira delas, segundo Santos (2011, p. 160) diz sobre a figura do padrasto, onde “há casos em que o novo marido ou companheiro da mãe assume inteiramente a figura paterna, desenvolvendo laços afetivos profundos em relação aos filhos da esposa ou companheira”. A segunda situação que é muito frequente também, é com relação ao homem que começa a namorar uma mulher que tem um filho não reconhecido pelo pai ou que se encontra grávida. Nesses casos, Santos

(34)

(2011, p. 160) afirma que “com frequência acontece de o homem nessas condições, afeiçoar-se verdadeiramente pelo filha da companheira, e assumir efetivamente a condição de pai”. A terceira situação bastante comum de acordo com Santos (2011, p. 160) “é aquela em que os pais ou o irmão registram o neto ou o sobrinho como se fosse filho, com o intuito de acobertar uma gravidez indesejada da filha ou irmã”.

Existe, ainda, a adoção à brasileira, que também é modalidade de paternidade socioafetiva, porém se constitui mediante prática de ilícito civil e penal. Santos (2011, p. 164), esclarece:

Adoção à brasileira, como o próprio nome sugere, é uma criação tipicamente nacional e ocorre naquelas situações em que alguém registra filho alheio como próprio. Ao tempo em que vigoravam valores morais mais rígidos em nossa sociedade, era muito comum os avós registrarem o neto como filho próprio para encobrir a gravidez indesejada da filha solteira, protegendo a filha e o neto da maledicência. Hodiernamente, é muito comum que o homem registre, como próprios, os filhos anteriores da mulher a quem venha se unir pelo casamento ou por união-estável. Essa conduta configura o crime previsto no art. 242 do Código Penal, mas sua prática é corrente no meio social e normalmente é marcada por forte caráter altruístico que lhe retira a reprovabilidade. Por outro lado, o fato constitui ato ilícito civil, visto que o art. 1.604 do Código Civil estabelece, a contrario sensu, que o registro civil pode ser anulado, mediante prova de erro ou falsidade.

Porém, em ambos os casos, é possível notar que a criança é tratada e considerada como se filha fosse, mantendo dessa maneira, uma relação paterno-filial. Configurando-se nesses casos a paternidade socioafetiva. Santos (2011, p. 161) afirma que:

Em verdade, sempre que falamos em paternidade socioafetiva estamos nos referindo aos vínculos que se baseiam exclusivamente nos afetos, independentemente da realidade biológica. Além disso, essa modalidade de relação paterno-filial caracteriza-se pela posse do estado de filiação, que é uma situação de afeto apta a gerar efeitos jurídicos.

Para que seja feito o reconhecimento da filiação, e este, por ser um tema complexo, deve ser tratado pelo Direito, mas com recurso também de outras áreas do conhecimento, como uma equipe multidisciplinar, tais como às ciências médicas, psicológicas e sociais. De acordo com Santos (2011, p. 162):

(35)

É evidente que a afetividade ingressa nesse questionamento, devendo a equipe multidisciplinar, presente nos foros judiciais, fornecer ao juiz uma avaliação acerca da natureza da intensidade dos laços de afeto que ligam a criança àquele que se apresenta como pai afetivo. A questão é saber se, em cada caso, esse vínculo afetivo é tão intenso e definido, a ponto de infirmar a paternidade biológica, pois não basta que o pai tenha dado sustento material ao pretenso filho: é necessário que ambos se considerem como pai e filho e que se apresentem como tais na vida em sociedade.

Quando se fala em disputa pela paternidade, envolvendo de um lado o pai biológico e do outro o pai socioafetivo, Santos (2011, p. 163) pontua:

Nos casos em que a disputa pela paternidade envolve de um lado o pai biológico que tem apenas o elo consanguíneo e, do outro, o pai socioafetivo que demonstra a natureza paterno-filial e a intensidade dos laços que mantém com a criança, bem como que a situação se encontra consolidada pelo decurso de tempo e pela ausência do pai biológico, a decisão deve ser pela prevalência do vínculo socioafetivo.

No entanto, ao pai biológico não basta ter a seu favor o vínculo genético, pois não é suficiente para determinar a paternidade. Sendo necessário que a este, se some o elemento afetivo, para configurar o que é chamado de paternidade integral. Dessa forma, a afetividade é decisiva para a definição de paternidade, pois sempre será socioafetiva, salvo quando a um embate entre a paternidade biológica e socioafetiva.

No embate entre paternidade biológica e socioafetiva, ou se reconhece que o vínculo socioafetivo é suficiente para determinar a paternidade ou na ausência ou na insuficiência deste vínculo, deve-se permitir que o pai biológico assuma sua função e construa a paternidade socioafetiva a partir da realidade biológica. (SANTOS, 2011, p.164).

Com base no Código Civil Brasileiro de 1916, este estabeleceu que os filhos incestuosos ou adulterinos não poderiam ser reconhecidos. E se fossem reconhecidos, através da ação de filiação, o ato tornava-se nulo a partir do momento em que se provasse que o filho realmente era adulterino ou incestuoso. E, somente era possível realizar a ação de investigação de paternidade se existisse alguma das provas referidas no artigo 363 do CC/1916, vejamos:

(36)

Art. 363. Os filhos ilegítimos de pessoas que não caibam no art. 183, I a VI, têm ação contra os pais, ou seus herdeiros, para demandar o reconhecimento da filiação:

I – se ao tempo da concepção a mãe estava concubinada com o pretendido pai;

II – se a concepção do filho reclamante coincidiu com o rapto da mãe pelo suposto pai, ou suas relações sexuais com ela;

III – se existir escrito daquele a quem se atribui a paternidade, reconhecendo-a expressamente.

Porém, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, § 6º, proibiu qualquer tratamento diferenciado entre os filhos havidos na relação de casamento e entre os não havidos na constância casamento.

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 6º – Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Portanto, através do referido artigo, acima transcrito, é nítido que toda criança tem direito ao convívio familiar e até mesmo em sociedade, constituindo um direito fundamental, seja a criança fruto da relação do casamento ou não.

Nessa mesma seara, a Lei n° 8069/90 de 13 de julho de 1990, denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), reconhece expressamente como sendo o dever da família assegurar a criança e ao adolescente condições dignas de desenvolvimento. Aborda o reconhecimento da filiação, classificando em seus artigos 26 e 27, como direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, independente de origem.

Art. 26. Os filhos havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente, no próprio termo de nascimento, por testamento, mediante escritura ou outro documento público, qualquer que seja a origem da filiação.

Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes.

Referências

Documentos relacionados

Há 10 anos o município de Extrema executa o Projeto Conservador das Águas, inspirado no Programa Produtor de Águas da Agência Nacional de Águas – ANA, pioneiro no Brasil

Apesar de este trabalho trazer dados parciais de fenômenos ainda em verificação, observamos os seguintes aspectos morfossintáticos do português falado na comunidade

O  contribuinte  A.  AZEVEDO  INDÚSTRIA  E  COMÉRCIO  DE  ÓLEOS 

Para Valcanaia, que também é professor da Sustentare Escola de Ne- gócios, em Joinville, uma das coisas mais importantes que as empresas podem fazer com seus gestores é permitir

A compreensão das professoras a respeito dos processo de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos com a SD é de que eles são capazes de aprender e se desenvolver, desde

1º Primeiro achamos os fatores de serviço da mesma forma que no exemplo anterior, neste caso da tabela 3 para triturador acionado por motor de combustão com 4 cilindros Fs = 3.

§ 4º - Os pedidos de aprovação do projeto de construção de Estação Rádio Base (ERB) e equipamentos afins serão analisados pela Secretaria Municipal de Infraestrutura e

§ 1º - A multa prevista para a infração do disposto no “caput” deste artigo será de R$200,00 (duzentos reais) com apreensão do equipamento pela fiscalização. § 2º -