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O direito à saúde na contemporaneidade: a judicialização de medicamento experimentais

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GRANDE DO SUL

JÚLIA CAROLINE ROSA PORTELLA

O DIREITO À SAÚDE NA CONTEMPORANEIDADE: A JUDICIALIZAÇÃO DE MEDICAMENTOS EXPERIMENTAIS

Ijuí (RS) 2020

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JÚLIA CAROLINE ROSA PORTELLA

O DIREITO À SAÚDE NA CONTEMPORANEIDADE: A JUDICIALIZAÇÃO DE MEDICAMENTO EXPERIMENTAIS

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso - TCC. UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: Profa. Dra. Janaína Machado Sturza

Ijuí (RS) 2020

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Dedico este trabalho à minha família, pelo incentivo, apoio e confiança em mim depositados.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por ser essencial em minha vida, e por me permitir ultrapassar todos os obstáculos encontrados ao longo da minha graduação.

Aos meus pais, Francisco e Venina, que com muito carinho e apoio, não medem esforços para que os meus sonhos se realizem. A minha irmã Isabelle, pela amizade e atenção dedicadas quando sempre precisei.

Aos ex-colegas da Defensoria Pública de Ijuí, 12ª Procuradoria Geral do Estado, e aos colegas atuais do Ministério Público de Ijuí, os quais contribuíram para o meu crescimento pessoal e profissional.

À minha orientadora, Profª Janaína Machado Sturza, pela prontidão e comentários construtivos.

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“Perguntei ao homem o que era o Direito. Ele me respondeu que era a garantia do exercício da possibilidade”. - Oswald de Andrade.

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise acerca da judicialização do acesso à saúde, no que tange aos pedidos de fornecimento de medicamentos experimentais. O estudo tem como objetivo averiguar a evolução da saúde no âmbito nacional, examinando como este direito foi tratado ao longo das sete Constituições Brasileiras, até ser reconhecida como um direito fundamental e social, bem como no âmbito internacional através de documentos que promovem e protegem a saúde. Ainda, faz parte da pesquisa a análise do princípio da reserva do possível frente a dispensação por parte do Estado de fármacos experimentais. Em razão disso, torna-se importante verificar o entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, acerca da obrigação do ente público de custear os medicamentos/terapias experimentais. A metodologia utilizada nesta pesquisa é do tipo exploratória, e em sua realização utiliza-se o método hipotético-dedutivo embasado em revisões bibliográficas disponíveis em meios on-line e em livros físicos. A partir desses resultados podemos concluir que, o Estado deva custear os tratamentos experimentais, a fim de efetivar o artigo 196, previsto na Constituição Federal de 1988, no entanto, deve estabelecer alguns parâmetros para o fornecimento, a fim de não por em risco a execução dos demais direitos sociais.

Palavras-Chave: Acesso à saúde. Evolução da Saúde. Medicamentos Experimentais. Judicialização. Reserva do Possível. Direito fundamental.

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ABSTRACT

The present work of conclusion of the course analyzes the judicialization of access to health, with regard to requests for the supply of experimental drugs. The study aims to investigate the evolution of health at the national level, examining how this right was treated throughout the seven Brazilian Constitutions, until it was recognized as a fundamental and social right, as well as at the international level through documents that promote and protect the Cheers. Still, it is part of the research the analysis of the principle of reserve of the possible against the dispensation by the State of experimental drugs. As a result, it is important to verify the jurisprudential understanding of the Federal Supreme Court and the Court of Justice of Rio Grande do Sul, regarding the obligation of the public entity to pay for experimental drugs / therapies. The methodology used in this research is exploratory, and in its realization the hypothetical-deductive method is used, based on bibliographic reviews available in online media and in physical books. From these results we can conclude that, the State must pay for the experimental treatments, in order to put into effect article 196, foreseen in the Federal Constitution of 1988, however, it must establish some parameters of supply, in order not to jeopardize the execution other social rights.

Keywords: Keywords: Access to health. Evolution of Health. Experimental Medicines. Judicialization. Possible Reserve. Fundamental right.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9

1 ORIGEM DO DIREITO À SAÚDE ... 11

1.1 Evolução do conceito de saúde ... 11

1.2 Retrospecto histórico do direito à saúde no brasil ... 16

1.3 Direito à saúde nos documentos internacionais ... 21

1.3.1 Constituição da Organização Mundial da Saúde ... 21

1.3.2 Pacto de Direitos Econômicos Sociais e Culturais ... 22

1.3.3 Primeira Conferência Internacional Sobre Cuidados Primários de Saúde - Declaração de Alma Ata ... 24

1.3.4 A Carta de Ottawa de 1986 ... 26

1.3.5 Outras conferências internacionais e regionais de promoção à saúde ... 27

2 A SAÚDE COMO UM DIREITO CONSITUCIONAL ... 31

2.1 Saúde nas Constituições Brasileiras ... 31

2.2 Judicialização dos medicamentos ... 39

2.2.1 Judicialização de medicamentos experimentais ... 41

2.3 Considerações acerca da reserva do possível e o fornecimento de medicamentos experimentais ... 47

3 ANÁLISE JUSRIPRUDENCIAL DAS DECISÕES DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL QUE VISAM O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS/TRATAMENTOS EXPERIMENTAIS ... 52

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3.1 - Apelação Cível Nº 70074910878: Rafael N. B. X Município de Gravataí e Estado Do Rio Grande Do Sul ... 53 3.2 Apelação Cível Nº 70078355310: Sandra R. L. X Município de Ijuí e Estado do Rio Grande Do Sul ... 55 3.3 Agravo de Instrumento Nº 70083080762: Miriene S. de P V. X Unimed Fronteira Noroeste RS - Coop Medica Ltda ... 58 3.4 Apelação Cível Nº 70075988626: Francisco R. S. X Unimed Porto Alegre Sociedade Cooperativa De Trabalho Médico Ltda ... 60

CONCLUSÃO ... 65 REFERÊNCIAS ... 68

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INTRODUÇÃO

Este trabalho versará sobre a judicialização do acesso à saúde, no que tange aos pedidos de fornecimento de medicamentos experimentais, pela via judicial. Estes fármacos e os demais tratamentos que ainda estão na fase experimental, não são disponibilizados pela rede pública, em razão de não haver eficácia e segurança comprovada pela ANVISA. Destaca-se que o direito à saúde é um tema amplo, por isso, não se pretende esgotá-lo nesta pesquisa.

Após o advento da Constituição Federal Brasileira de 1988 e da transição para um Estado Democrático de Direito, ocorreu o aumento substancial de demandas postulando alguma prestação no âmbito da saúde, inclusive, de medicamentos e terapias em fase experimental. Desta forma, a partir destas considerações, buscou-se responder aos buscou-seguintes problemas de pesquisa: Qual o posicionamento do STF quanto a obrigatoriedade do Estado em fornecer fármacos de caráter experimental? E qual o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, acerca destas demandas?

Além de responder as perguntas mencionadas anteriormente, esta pesquisa tem como objetivo realizar, no primeiro capítulo, um estudo acerca da origem do direito à saúde, abordando aspectos como: a sua evolução conceitual, o seu retrospecto histórico no nacional e, também apresentando os principais documentos internacionais de proteção à saúde, fazendo uma breve explanação de cada um.

Posteriormente, no segundo capítulo apresenta a análise da saúde como um direito constitucional, verificando como o tema foi tratado nas constituições brasileiras anteriores, até a promulgação da Carta Magna de 1988. Discorre-se

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também, acerca do fenômeno da judicialização da saúde, na qual dará enfoque apenas à postulação me medicamentos experimentais ou de uso off-label. Ainda, há analise no princípio da reserva do possível, levando em consideração o alto custo destes fármacos e os recursos limitados do Estado.

Por fim, no terceiro capítulo será realizada a análise de quatro julgados provindos do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, com a finalidade de elucidar e averiguar, qual está sendo o entendimento dos magistrados, acerca do fornecimento de medicamentos de caráter experimental e de uso off-label, e o dever do Estado e dos plano de saúde privados em fornece-los.

A metodologia a ser utilizada nesta pesquisa é do tipo exploratória e, em sua realização, utiliza-se o método hipotético–dedutivo. Para a elaboração deste estudo foram realizadas pesquisas bibliográficas em livros físicos e em sites da internet, havendo a análise, também, da legislação e de jurisprudências, com o intuito de complementar o estudo acerca do tema e enriquecer o conteúdo com informações pertinentes ao assunto.

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1 ORIGEM DO DIREITO À SAÚDE

Neste capítulo serão abordados pontos pertinentes à compreensão da origem do direito à saúde, analisando em primeiro momento, as suas transformações conceituais ao longo da história. Em um segundo momento, discorre acerca do retrospecto histórico do direito à saúde, pontuando os principais acontecimentos que ocorreram no Brasil. Por fim, destacam-se alguns dos documentos internacionais mais relevantes de promoção da saúde.

1.1 Evolução do conceito de saúde

Com o objetivo de definir a saúde, devem-se levar em consideração diversos fatores, como o aspecto histórico, questões biológicas, culturais e sociais. Mariana Filchtiner Figueiredo (2007, p. 270) esclarece que à saúde “é resultado de uma longa evolução na concepção não apenas do direito, mas da própria ideia do que seja saúde, em si mesma considerada”.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a saúde como “um estado completo de bem-estar físico, mental e social e não meramente ausência de doença”, tal esta definição sofreu duras críticas. Na visão de Cortina (1998, apud Amanda Silva; Edith Barbosa; Alexandre Moura, 2010, p. 01), a proposta da OMS, não somente seria pouco realista, mas também suscetível de criar enormes frustrações na medida em que nenhuma sociedade poderia conseguir que todos os seus membros gozassem desse perfeito bem-estar físico, mental e social.

Nesse sentido, Moacyr Scliar (2007, p. 30):

[...] O conceito de saúde reflete a conjuntura social, econômica, política e cultural. Ou seja: saúde não representa a mesma coisa para todas as pessoas. Dependerá da época, do lugar, da classe social. Dependerá de valores individuais, dependerá de concepções científicas, religiosas, filosóficas. O mesmo, aliás, pode ser dito das doenças. Aquilo que é considerado doença varia muito. [...]

Deste modo, a Organização Mundial da Saúde em uma tentativa de conceituar à saúde, propôs uma definição que acreditava que seria universalmente aceita. No

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entanto, deve-se levar em consideração que cada nação está inserida em situações distintas. Todavia, os Estados tem a liberdade de realizar diversos manejos para buscar adequar-se ao estabelecido pela OMS.

Neste sentido, Sturza e Martini (2017, p. 398) ressaltam que:

[...] Neste sentido, em uma visão bastante avançada para a sua época de construção, a OMS expandiu o conceito de saúde historicamente atrelado à prevenção e principalmente à cura, abarcando, essencialmente, a promoção da saúde. Todavia, esse conceito usado pela OMS é amplo e, praticamente, inexeqüível, já que tem um forte componente de idealização e a importância de associar a saúde à própria defesa da vida em sua plenitude. Assim, a saúde pode ser entendida como um valor universal compartilhado por todos que defendem a vida e o caráter dual da saúde se manifesta no paradoxo de que tanto ela pode ser vista como um valor universal quanto sua realização concreta implica na necessidade de sua politização, para que, além de uma orientação ético-normativa, ela se transforme em uma política pública que amplie a democracia e assegure a universalização do direito à saúde a toda a população. [...]

Inicialmente, a acepção de saúde apareceu fortemente ligada a uma explicação mágica da realidade, onde os povos primitivos viam o enfermo como vítima de demônios e espíritos malignos, de forma semelhante, Scliar (2007, p. 30) assevera que “para os antigos hebreus, a doença não era necessariamente devida à ação de demônios, ou de maus espíritos, mas representava, de qualquer modo, um sinal da cólera divina, diante dos pecados humanos”.

Posteriormente, na cultura clássica grega, ocorreu uma significativa evolução no conceito de saúde, dado que, buscou-se uma explicação racional para os acontecimentos, descartando elementos mágicos e religiosos. Levou-se em consideração a observação empírica, a importância do ambiente, o trabalho e a posição social do indivíduo, assim, além de lidar com os problemas de saúde, procuravam entender as relações entre o homem e a natureza, entre tais inquietações, estava à explicação da saúde e da doença, como oriundos de processos naturais e não sagrados. (LUCIANA DE FÁTIMA LEITE LOURENÇO et

al, 2010, p. 20).

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[...] Essa visão religiosa antecipa a entrada em cena de um importante personagem: o pai da Medicina, Hipócrates de Cós (460-377 a.C.). Pouco se sabe sobre sua vida; poderia ser uma figura imaginária, como tantas na Antigüidade, mas há referências à sua existência em textos de Platão, Sócrates e Aristóteles. Os vários escritos que lhe são atribuídos, e que formam o Corpus Hipocraticus, provavelmente foram o trabalho de várias pessoas, talvez em um longo período de tempo. O importante é que tais escritos traduzem uma visão racional da medicina, bem diferente da concepção mágico-religiosa antes descrita. O texto intitulado “A doença sagrada” começa com a seguinte afirmação: “A doença chamada sagrada não é, em minha opinião, mais divina ou mais sagrada que qualquer outra doença; tem uma causa natural e sua origem supostamente divina reflete a ignorância humana”. [...]

Deste modo, a partir das perspectivas de Hipócrates, foi possível se desenvencilhar da cultura e das práticas mágicas, procurando distinguir de forma racional os sintomas ocasionadores de determinadas enfermidades, libertando-se das magias, anteriormente praticadas pelos povos.

Ainda na Antiguidade, as medicinas hindu e chinesa apresentaram uma nova forma de compreensão da doença, pautadas na noção de equilíbrio. Surgiu, assim, o modelo holístico de saúde, que associava a ideia de proporção justa ou adequada com a de saúde e doença. Dessa maneira, a saúde era compreendida como consequência do equilíbrio entre os elementos que compõem o organismo humano. Um desequilíbrio desses elementos permitiria, portanto, o aparecimento da doença (SILVA, 2017, p. 06).

Com a passagem para a Idade Média, houve um regresso na área sanitária, sob a influência do cristianismo e em virtude da ocorrência de inúmeras pestes e, associado com outros surtos epidêmicos, os doentes passaram a ser considerados como um mal da sociedade, tal motivo levou o afastamento destes indivíduos do convívio social.

Neste sentido, vem corroborar as considerações de Figueredo (2007, p. 78):

[..] Um período de pestilências e surtos epidêmicos decorrentes, entre outros, de movimentos populacionais, conflitos militares, miséria, promiscuidade e falta de higiene nos burgos. As práticas médicas desenvolvidas pelas tradições ocidental (grega e romana) e oriental (árabe e judaica). A doença voltou a ser vista como um castigo divino, resumindo-se os cuidados sanitários à preocupação de afastar o doente do convívio social, para evitar o contágio e a visão de doença. O único contraponto se deu pelo fortalecimento da caridade, com o surgimento dos primeiros

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hospitais, “mas apropriadamente hospícios, ou asilos, nos quais os pacientes recebiam, se não o tratamento adequado, pelo menos conforto espiritual”. [...]

Backes et al (2019, p. 113), lecionam que, no final da Idade Média devido às crescentes epidemias, retomou-se a ideia de contágio entre os homens, sendo as causas o envenenamento das águas pelos leprosos, judeus ou por bruxarias. Outrossim, no Renascimento, os estudos empíricos originaram a formação das ciências básicas e com isto, surge a necessidade de descobrir a origem das matérias que causavam os contágios.

Assim, apenas na Revolução Francesa que se começou a pensar na saúde como um bem acessível a todos, destacando-se neste período a internação dos doentes mentais em hospícios, o que, em termos de saúde, poderia ser analisado hoje como uma prática não acessível a todos, mas sim como um processo de exclusão dos diferentes (MARTINI, STURZA, 2017, p. 401).

Adentrando no século XIX, Herzlich (2004, p. 03), esclarece a aparição da bacteriologia e a concepção de que para cada doença, existe um agente etiológico que poderia ser combatido com produtos químicos ou vacinas, desse modo, a medicina foi direcionada para atuação do corpo, em busca de um estado biológico normal. De acordo com Silva (2017, p. 06) “tal modelo focou-se na explicação da doença e passou a tratar o corpo em partes cada vez menores, reduzindo a saúde a um funcionamento mecânico.”

Cury (2005, p. 34), refere que, apesar da formulação de mecanismos voltados para a proteção e a manutenção da saúde datar do início dos séculos, as concepções modernas da saúde pública somente foram evidenciadas no decorrer da Revolução Industrial dos séculos XVIII e XIX. Esses entendimentos, por sua vez, se intensificaram durante o século XX, com o surgimento do Welfare State (Estado de Bem-estar Social) e o término das duas grandes guerras mundiais que impulsionaram a criação de organismos internacionais, tais como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e, por conseguinte, a elaboração de uma definição contemporânea da saúde.

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A luz dessa perspectiva:

[...] A prevenção complexifica o tema incorporando ao mesmo uma situação antecipada no sentido de evitar a ocorrência da doença através de serviços básicos garantidores da salubridade pública. Percebe-se, então, que a saúde não se restringe mais à busca individual e passa a ter uma feição coletiva na medida em que a saúde pública passa a ser apropriada pelas coletividades como direito social, como direito coletivo, bem como alarga-se o seu conteúdo. Tem-se a prevenção da doença. [...] (MARTINI; STURZA 2017, p. 403 apud MORAIS, 1997, p.188).

Posteriormente, em 1978 na Conferência de Alma-Ata, foi aprovado um conceito ampliado de saúde, destacou-se as desigualdades de saúde entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos; a responsabilidade governamental na provisão da saúde, e a importância da participação de pessoas e comunidades no planejamento e na implementação dos cuidados à saúde (BEZERRA, SORPRESO, 2016, p. 04).

Finalmente, adentra-se no século XXI, auge da expansão dos meios de comunicação e em especial da informática. Vive-se um momento em que a criatividade humana alcançou uma extraordinária expressividade, colocando-se em um novo sistema de alcance global. Este século herdou fantásticas experiências científicas e tecnológicas, que promoveram o crescimento da produção e proporcionaram condições de bem-estar e de acesso a serviços, como nos setores da saúde. (MARTINI, STURZA, 2017, p. 29).

De acordo com Buss (2000, p. 174) a nova concepção de saúde:

[...] importa uma visão afirmativa, que a identifica com bem-estar e qualidade de vida, e não simplesmente com ausência de doença. A saúde deixa de ser um estado estático, biologicamente definido, para ser compreendida como um estado dinâmico, socialmente produzido. Nesse marco, a intervenção visa não apenas diminuir o risco de doenças, mas aumentar as chances de saúde e de vida, acarretando uma intervenção multi e intersetorial sobre os chamados determinantes do processo saúde-enfermidade: eis a essência das políticas públicas saudáveis [...]

Nota-se que a concepção do conceito de saúde, passou inevitavelmente por diversas áreas do conhecimento, como a medicina, filosofia, sociologia, a antropologia, biologia, direito e demais ciências. Deste modo, a definição de saúde se transforma continuamente ao longo do tempo, uma vez que, o processo de

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evolução da sociedade é visto, também, como um processo de modificação da saúde e dos problemas sanitários.

Dessa forma, percebe-se que a partir do fim do século XX e início do século XXI, a preocupação com a saúde tornou-se um tema relevante a ser discutido pelos Estados, pois se constatou a necessidade de ampliar a proteção deste direito. No Brasil, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, à saúde foi elevada ao patamar de direito fundamental e social.

1.2 Retrospecto histórico do direito à saúde no Brasil

Inicialmente, ressalta-se que para uma melhor compreensão da evolução do direito à saúde no Brasil, serão abordados alguns dos principais eventos que ocorreram ao final do século XIX, até a institucionalização do Sistema Único de Saúde. Deste modo, não se pretende esgotar o assunto, mas destacar alguns pontos relevantes.

No período entre 1897 e 1930, os assuntos relacionados à saúde eram tratados no Mistério da Justiça e Negócios Interiores, sendo que a sua assistência se mantinha limitada às ações de saneamento e combate a endemias. Além disso, surgiu o chamado “sanitarismo campanhista” permanecendo até o final da década de 1940, tal política visava dar apoio ao modelo econômico agrário-exportador, isto é, procuravam assegurar melhores condições de saúde para os trabalhadores empregados na produção e na exportação. (AYLTON PAULUS JÚNIOR; LUIZ CORDONI JÚNIOR, 2006, p. 14).

Nesse sentido, Celiane Camargo Borges (2002, p. 02), esclarece:

[...] No início do século, época das grandes imigrações, a economia brasileira iniciava suas exportações, principalmente de café, e corria sérios riscos nos portos, com a iminência de doenças como a peste, febre amarela e, consequentemente, a possibilidade de proibição de aportar seus navios em outros países devido a essas endemias, A mobilização da Saúde Pública nessa época foi direcionada para a criação de grandes campanhas, como a vacinação em massa da população, com o objetivo de controle da salubridade local. [...]

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Cumpre observar que, em 1923, os trabalhadores das grandes indústrias ferroviárias instituíram as chamadas caixas de aposentadorias e pensões (CAPs), tendo como função a prestação de benefícios, tais como aposentadorias, pensões e assistência médica, para seus filiados e dependentes. Posteriormente, no mesmo ano a Lei Eloy Chaves garantiu tal modalidade de seguro para todos os estabelecimentos que possuíam mais de cinquenta empregados. (BORGES, 2002, p. 03).

No entanto, cada CAPs estabelecia seu regulamento, que refletia nos anseios de cada segmento da classe trabalhadora. Em razão da falta de regras em comum, às CAPs ficaram extremamente fragilizadas, sendo necessário unificá-las e substitui-las pelos Institutos de Aposentadoria e Pensão - IAPs. (MERCANTE, 2002, p. 237). De caráter nacional os IAPs passaram a ter participação direta do Estado. (BORGES, 2002, p. 03).

A luz desta perspectiva, Paulus Júnior e Cordoni Júnior (2006, p. 14), sistematizam que:

[..] O modelo inicial da assistência médica não era universal e baseava-se nos vínculos trabalhistas. Tinham direito aos benefícios somente trabalhadores que contribuíam para a Previdência, ou seja, aqueles “com carteira assinada”. [...]

No ano de 1948 o governo federal formula o Plano SALTE visando o desenvolvimento da saúde, alimentação, transporte e energia. No tocante à saúde, tinha como objetivo elevar o nível sanitário da população, sobretudo a rural, devido aos graves problemas da época como a fome, o elevado índice de mortalidade infantil, e a falta de recursos nos hospitais com pessoal médico e de leitos. Contudo, a resposta do setor privado ao referido plano, foi negativa, pois os projetos apresentados possuíam um caráter social, e não comercialmente vantajoso, para uma empresa particular. (FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS, 2009, s/p).

Posteriormente, em 1953 foi criado o Ministério da Saúde, o qual se dedicava às atividades de caráter coletivo, como as campanhas e a vigilância sanitária, paralelamente, a assistência médica começa a se desenvolver no âmbito das

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instituições previdenciárias, que neste momento serviam como importante instrumento para amenizar tensões sociais e controlar a forma de trabalho. (PAULUS JR; CORDONI JR, 2006, p. 14).

Acerca da criação do Ministério da Saúde, Wanda Hamilton e Cristina Fonseca (2003, p. 792) contribuem:

[...] A intenção de criar um ministério específico para o setor da saúde não era uma proposta original daquele período de nossa história política. No decorrer do processo de institucionalização da saúde pública no Brasil intensificada a partir dos primeiros anos do século XX, quando se iniciaram os debates relativos ao tema e começaram a ser implementadas reformas na área da saúde , encontram-se várias propostas relativas à criação de um Ministério da Saúde que, por diferentes razões, não chegaram a se concretizar. [...]

Em 1966, criou-se o Instituto Nacional de Previdência Social – INPS, firmando-se como o principal órgão de financiamento dos firmando-serviços de saúde, prestando assistência somente para os contribuintes. No entanto, com a crescente demanda na busca de auxílio médico, o seguro passou a ser privatizado.

Luiz Jr e Aylton Jr (2006, p.14) lecionam:

[...] A assistência médica individualizada passou a ser dominante e a política privilegiou a privatização dos serviços e estimulou o desenvolvimento das atividades hospitalares. O processo de industrialização acelerado observado a partir do Presidente Jucelino Kubitscheck de Oliveira fortaleceu a economia dos centros urbanos e gerou força de trabalho a ser atendida pelo sistema de saúde. Tal fato aprofunda a necessidade de o Estado atuar na saúde do trabalhador, mantendo e restaurando sua capacidade produtiva[...].

Ainda, os referidos autores (2006, p. 15), salientam que a partir de 1972, a previdência iniciou a sua ampliação, concedendo o benefício previdenciário às empregadas domésticas e aos trabalhadores rurais, garantindo a esses trabalhadores a assistência médica no sistema de saúde, e em 1973 foram inseridos nesse programa os trabalhadores autônomos.

Em meados dos anos 70, surgiu no Brasil o Movimento da Reforma Sanitária Brasileira, na qual se constituiu de amplas mobilizações dos brasileiros pela redemocratização dos serviços de saúde, expressando a sua indignação frentes a

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desigualdades e o interesse comercial na saúde. Caracterizou-se como uma ação política concertada em torno de um projeto de sociedade inclusiva e solidária, tendo a saúde um direito universal de todos. (SOUTO; OLIVEIRA, 2016, p. 205).

Nesta seara:

[...] Sensibilizados com essa crise, alguns profissionais de saúde se mobilizam, preocupados com a assistência oferecida à população e com as dificuldades de acesso e tratamento da maior parte da sociedade. Unem-se com profissionais de outros setores, como políticos, intelectuais, sindicalistas e lideranças populares, num movimento crítico, mostrando os efeitos do sistema econômico vigente sobre as condições de acesso à assistência à saúde da população. Esse movimento crítico não somente evidencia os prejuízos desse sistema para a saúde, mas também traz propostas de novas modalidades para uma outra concepção do pensar e fazer saúde, mais humana e universal, podendo somente ser alcançada através da uma ampla reforma sanitária. Essa mobilização denominou-se movimento sanitário e teve início na década de 70. [...] (BORGES, 2002, p. 04).

Em 1976, foi implantando o Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento para o Nordeste. Tendo como objetivo levar saúde pública às regiões carentes, adotou um sistema de atenção primária à saúde com o envolvimento local, no entanto, a ideia que seria apenas desenvolvida no Nordeste do país, alcançou abrangência nacional. (AYLTON JR; LUIZ JR. 2006, p. 15).

Em consonância com o exposto:

[...] O objeto central do Programa era dotar as comunidades do Nordeste - cidades, vilas e povoados até 20 mil habitantes - de uma estrutura básica e permanente de saúde pública capaz de contribuir na solução dos problemas médico-sanitários de maior reflexo social. A rede de serviços, fundamentalmente estadual e municipal, se desdobrava em três níveis de atuação: elementar, intermediário e de apoio. Os dois primeiros estavam constituídos por unidades operadas por pessoal de nível elementar. As unidades de apoio, estrategicamente localizadas, estavam formadas por unidades integradas de saúde, dispondo de recursos humanos de nível profissional e, em alguns casos, de facilidades para hospitalização. [...]. (MERCANTE, 2002, p. 246).

Em 1977, o Governo Brasileiro criou o Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social – SINPAS, tendo como objetivo a reorganização da previdência social, com a ampliação da cobertura e a implantação de um modelo de atenção à saúde, que privilegiou o produtor privado de serviços e propiciou a criação do

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complexo médico-industrial e de um padrão de organização da prática médica, orientado para a lucratividade. (FLEURY; ALVES, 2004, p. 983).

No ano de 1977, o Ministério da Saúde reconhecia o importante papel que os municípios exerciam, os quais se empenhavam para estruturar uma rede de serviços básicos dentro dos princípios da atenção primária à saúde. Contudo, em que pese havia esse reconhecimento, à época, nada foi feito. Ato contínuo, em 1978, foi realizado em Campinas/SP, o primeiro encontro municipal do setor da saúde, o qual resultou na constatação de que a atenção primária à saúde é prioridade dos municípios, deixando os casos mais complexos, como atendimentos securitários e terciários, para os Estados e União. (AYLTON JR; LUIZ JR. 2006, p. 15).

A Sétima Conferência Nacional de Saúde, foi realizada em 1986, tendo como tema principal a extensão das ações de saúde através dos serviços básicos (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2019). Nessa conferência, foi proposta uma política social para erradicar a miséria e atenuar a pobreza, pela satisfação das necessidades básicas da população. Assim, a saúde passaria a influenciar o processo de desenvolvimento nacional, exercendo uma função social integradora (RIBEIRO, 2007 apud. MOTA; SCHREIBER, 2011, p. 840).

Nesse contexto foi realizada a 8ª Conferência Nacional de Saúde, conferindo um novo caráter às conferências de saúde, como um espaço de participação da sociedade civil nas deliberações sobre as políticas de saúde. A partir dessa conferência, legitimou-se a ideia da Reforma Sanitária, que ampliou o conceito de saúde – promoção, proteção e recuperação – e foi aprovada a criação do Sistema Único de Saúde, instituído na Constituição de 1988. (CENTRO CULTURAL DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2016, p.01).

Acerca das teses defendidas na 8ª Conferência Nacional de Saúde:

[...] O reconhecimento da saúde como direito inerente à cidadania, o consequente dever do Estado na promoção desse direito, a instituição de um sistema único de saúde, tendo como princípios a universalidade e integralidade da atenção, a descentralização, com comando único em cada esfera de governo, como forma de organização e a participação popular

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como instrumento de controle social, foram teses defendidas na VIII CNS. [...] (MERCANTE, 2002, p. 248).

Consolidando o processo de evolução do sistema público de saúde, a Constituição Federal de 1988 consagrou o acesso universal e igualitário aos serviços de saúde como um direito de cidadania (CF, art. 196), ademais, estabeleceu no seu artigo 198, a criação de um sistema único, o qual posteriormente foi regulamentado pela Lei 8.080/90, garantindo uma “igualdade de assistência, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie” (art. 7º, inciso IV), bem como a gratuidade da atenção de modo a impedir que o acesso à saúde fosse dificultado por alguma barreira econômica. (MERCANTE, 2002, p. 250).

Deste modo, a criação do Sistema Único de Saúde, foi uma conquista de todos os brasileiros, visto que, após sucessivas tentativas e movimentos que buscavam o reconhecimento deste direito, a Lei 8.8080/90 foi a primeira ferramenta regulamentada que garante o acesso à saúde de forma igualitária, universal e humana, para todos aqueles que necessitam de cuidados. Ainda, ressalta-se que atualmente o SUS é o maior sistema público do mundo, e o Brasil é o único país que conta com serviços gratuitos e de forma universal.

1.3 Direito à saúde nos documentos internacionais

A saúde é reconhecida por meio de tratados e declarações de direito internacional, os quais desempenham um papel importante na busca de proteger e assegurar o direito à saúde. Deste modo, percebe-se que este direito ocupa um lugar de destaque no âmbito internacional.

1.3.1 Constituição da Organização Mundial da Saúde

Preliminarmente, destaca-se que a Organização Mundial da Saúde é uma agência especializada das Nações Unidas que tem como foco lidar com questões relativas à saúde global. No âmbito da criação da ONU, já havia a preocupação e a intenção de criar uma organização mundial dedicada exclusivamente à saúde.

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[...] Foi expressa ao afirmar que as Nações Unidas devem favorecer níveis mais altos de vida, trabalho efetivo e condições de progresso e desenvolvimento econômico e social. Conforme disposto na Carta, as Nações Unidas devem buscar a solução dos problemas internacionais econômicos, sociais, sanitários e conexos e o respeito universal e efetivo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião.[...] (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2019, p. 143)

Desta forma, a primeira menção à saúde, no plano internacional, enquanto direito humano fundamental, ocorre na constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS), em 1946, a qual é um dos instrumentos mais relevantes de proteção e promoção da saúde. Alleyne (2006, p. 06), esclarece que foi por meio da OMS que os “países buscaram reunir a perícia e os recursos para abordar as questões de saúde”, isto é, esse tema não era objeto de discussão entre os governos, até então.

O objetivo primordial da Organização Mundial da Saúde, conforme disposto no artigo 1º da sua constituição, é “a aquisição, por todos os povos, do nível de saúde mais elevado que for possível”. Para isso, a organização atua como autoridade e coordenadora dos trabalhos internacionais no domínio da saúde Destaca-se, ainda, que a OMS possui o entendimento de saúde como um estado de completo bem-estar físico, mental e social, não consistindo apenas na ausência de doença ou de enfermidade (CONSTITUIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1946)

Ademais, outras funções importantes da OMS, de acordo com sua constituição, podem ser caracterizadas da seguinte forma: i) auxiliar os Governos, a seu pedido, a melhorar os serviços de saúde; ii) fornecer a assistência técnica apropriada e, em caso de urgência, a ajuda necessária, a pedido dos Governos ou com o seu consentimento; iii) estabelecer e manter os serviços administrativos e técnicos julgados necessários, compreendendo os serviços de epidemiologia e de estatística; iv) estimular e aperfeiçoar os trabalhos para eliminar doenças epidêmicas, endêmicas e outras, dentre outras funções elencadas em seu artigo segundo (CONSTITUIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1946).

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Desde a sua criação a ONU tem sido um importante vetor para a aprovação de documentos jurídicos internacionais que reconhecem e estabelecem algumas garantias jurídicas de proteção do direito à saúde, tais como o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (ONU, 1966).

O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), elenca um rol de direitos que garantem a dignidade à pessoa humana, sendo estes inalienáveis a todos os membros da família humana. Ainda dispõe a obrigação dos Estados em promover o respeito universal e efetivo dos direitos e das liberdades da pessoa humana (PACTO INTERNACIONAL DOS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS, 1966).

Flávia Piovesan (apud Maria Stella Gregori, 2013, p. 204) contribuí:

[...] O intuito desse Pacto foi permitir a adoção de uma linguagem de direitos que implicasse obrigações no plano internacional, mediante a sistemática da international accountability. Isto é, como outros tratados internacionais, esse Pacto criou obrigações legais aos Estados partes, ensejando responsabilização internacional em caso de violação dos direitos que enuncia [...].

O artigo 12, do PIDESC, dispõe que é dever dos Estados Partes, que participam do Pacto, reconhecerem o direito de todas as pessoas de gozar do melhor estado de saúde, física e mental possível de atingir. Ademais, estabelece as medidas que os Estados devem adotar a fim de assegurar o pleno exercício do direito à saúde. (PIDESC, 1966)

Acerca das medidas a serem tomadas pelos Estados Partes, Gregori (2013, p. 201), esclarece:

[...] Quais as medidas que os Estados Partes deverão adotar, como fim de assegurar o pleno exercício desse direito, a saber: i) a diminuição da mortinatalidade e da mortalidade infantil, bem como o desenvolvimento são das crianças, isto quer dizer, que obriga o Estado a cuidar da saúde da mãe e da criança, tanto no pré como no pós-natal; ii) a melhoria de todos os aspectos de higiene do trabalho e do meio ambiente, pressupõe medidas de prevenção a acidentes de trabalho e respeito ao meio ambiente; iii) a prevenção e o tratamento das doenças epidêmicas, endêmicas, profissionais e outras, bem como a luta contra essas doenças, estabelece que o Estado invista em programas de prevenção à doenças e promoção à saúde e, iv) a criação de condições que assegurem a todos assistência

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médica e serviços médicos em caso de enfermidade, ou seja, impõe medidas que garantam acesso igual a todos, proibindo qualquer tipo de discriminação[...]

Portanto, o direito à saúde, foi incorporado à ordem internacional de proteção de direitos humanos como um direito social, sendo dever de todo Estado Parte assegurar a qualquer ser humano o direito de ser saudável. Frisa-se que o Estado Brasileiro, em que pese, tenha assinado o Pacto em 1966, somente o ratificou em 1992, quando já estava submetido à Constituição Federal de 1988, a qual instaurou uma nova fase no país, ao recolocá-lo no plano democrático. (GREGORI, 2013, p. 206).

1.3.3 Primeira Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde - Declaração de Alma Ata

A Primeira Conferência Internacional Sobre Cuidados Primários de Saúde ocorreu em Alma Ata, no Cazaquistão, em 1978. Essa conferência visava a promoção da saúde como elemento fundamental a ser desenvolvido pelos governos dos Estados. Além disso, promovia a proteção da saúde dos povos como uma questão indispensável para o constante desenvolvimento social e econômico, contribuindo para a melhor qualidade de vida e para a paz mundial, ficando como responsabilidade dos povos participar no planejamento e na execução dos cuidados da saúde (MATTA, MOROSIN, 2009, p. 25).

Neste sentido, a respeito da realização da Primeira sobre Cuidados Primários de Saúde:

[...] A Declaração de Alma Ata foi motivada pela marcante desigualdade social e regional (intra e entre países) nas condições de saúde. A meta de Saúde para Todos no ano 2000 apontou os Cuidados Primários de Saúde como a chave para a sua realização. Portanto, no contexto da Declaração de Alma Ata, a equidade em saúde e APS constituem dois lados de uma mesma moeda. Isto quer dizer que uma se realiza através da efetivação da outra [...] (FIOCRUZ; CNJ, 2018 p. 446)

Deste modo, através da conferência realizada na cidade de Alma-Ata, foi conferida maior ênfase aos cuidados da saúde, passando a ser entendida como um recurso de suma importância para o desenvolvimento social da população.

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Posteriormente, foi proposta uma meta, entre os países membros, denominado de “Saúde para todos no ano 2000”, para que através da Atenção Primária à Saúde (APS) conseguissem atingir o nível máximo de saúde até o ano de 2000.

Em síntese, a Atenção Primária à Saúde, foi definida na Declaração de Alma Ata como:

[...] Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem fundamentadas e socialmente aceitáveis, colocadas ao alcance universal de indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a um custo que a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e autodeterminação. Fazem parte integrante tanto do sistema de saúde do país, do qual constituem a função central e o foco principal, quanto do desenvolvimento social e econômico global da comunidade. Representam o primeiro nível de contato dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional de saúde, pelo qual os cuidados de saúde são levados o mais proximamente possível aos lugares onde pessoas vivem e trabalham, e constituem o primeiro elemento de um continuado processo de assistência à saúde. [...] (DECLARAÇÃO DE ALMA-ATA, 1978).

Buss (2000, p. 170), esclarece que a conferência trouxe um novo enfoque para a área da saúde, sendo através da meta “Saúde Para Todos no Ano de 2000” foi estabelecido a adoção de um conjunto de oito elementos basilares, quais sejam: educação dirigida aos problemas de saúde prevalentes e métodos para sua prevenção e controle; promoção do suprimento de alimentos e nutrição adequada; abastecimento de água e saneamento básico apropriados; atenção materno infantil, incluindo o planejamento familiar; imunização contra as principais doenças infecciosas; prevenção e controle de doenças endêmicas; tratamento apropriado de doenças comuns e acidentes; e distribuição de medicamentos básicos.

Por fim, nesse contexto, Morosin e Matta (2009, p. 25-26), destacam que embora as metas estabelecidas em Alma-Ata jamais terem sido atingidas plenamente, a APS tornou-se uma referência importante para às reformas sanitárias ocorridas em diversos países entre os anos de 1980 e 1990. A referida Declaração simboliza uma proposta num contexto imensamente maior que um pacote seletivo de cuidados básicos em saúde, deste modo, salientou a necessidade de criação de sistemas de saúdes universais, ou seja, concebeu a saúde como um direito humano.

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1.3.4 A Carta de Ottawa de 1986

A Primeira Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, foi realizada em Ottawa, em 1986, na qual contém as orientações para atingir a “Saúde para Todos no ano 2000”, sendo adotas cinco estratégias essências, sendo elas: política pública, ambiente saudável, reorientação do serviço de saúde, reforço da ação comunitária e criação de habilidades pessoais. Ademais, essa Conferência, foi a primeira resposta às crescentes expectativas de se conseguir um novo movimento de saúde pública, a nível mundial. (CARTA DE OTTAWA, 1986).

A fim de esclarecer as cinco estratégias principais estabelecidas na Carta de Ottawa, Heidmann et al (2006, p. 354) elucidam que:

[...]1) Implementação de políticas públicas saudáveis: a promoção à saúde inclui, além dos cuidados de saúde, outros determinantes como: renda, proteção ambiental, trabalho, agricultura. A saúde deve estar na agenda de prioridades dos políticos e dirigentes em todos os níveis e setores, que devem tomar consciência de suas decisões e responsabilidades. A Carta de Ottawa sugere ações legislativas, fiscais e organizacionais visando à diminuição das desigualdades sociais e à melhoria da qualidade de vida da população. Sugere, também, a adoção de uma postura intersetorial para a formulação de políticas públicas e sua ação sobre o setor saúde. 2) Criação de ambientes favoráveis à saúde: propõe a proteção do meio ambiente e a conservação dos recursos naturais como parte da estratégia de promoção à saúde. Para que isto ocorra, sugere ações que objetivem o monitoramento de mudanças das áreas tecnológicas, do trabalho, produção de energia e urbanização, que interferem na saúde da população. 3) Reorientação dos serviços de saúde: recomenda que a reorientação dos serviços de saúde deva voltar-se na direção de um enfoque na saúde e não na doença, que apontem para a integralidade das ações de saúde. Propõe, para isto, mudanças na formação dos profissionais e nas atitudes das organizações dos serviços de saúde. 4) Reforçando a ação comunitária: implementação de ações e recursos existentes na comunidade e que possam intensificar a auto-ajuda e o apoio social necessários ao desenvolvimento da participação popular nos assuntos de saúde, o empowerment comunitário. 5) Desenvolvimento de habilidades pessoais: capacitar as pessoas para “aprenderem através da vida” e se “prepararem para todos os estágios” é uma das estratégias prioritárias da nova promoção à saúde. Apoia, também, o desenvolvimento pessoal e social mediante a divulgação de informação, educação para a saúde e intensificação das habilidades vitais. [...]

Desta forma, as estratégias adotadas pela Carta de Ottawa são consideradas referências da promoção à saúde em todo mundo, uma vez que, representou uma resposta à crescente demanda por uma nova visão de saúde pública no mundo, apesar de que muito embora as articulações e discussões fossem focalizadas nas

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necessidades dos países industrializados, os problemas que atingem as demais regiões também foram levados em consideração. (STURZA, ROCHA, 2017, p. 01).

1.3.5 Outras Conferências Internacionais e Regionais de Promoção à saúde

A Segunda Conferência Internacional sobre Promoção à Saúde, popularmente conhecida como Declaração de Adelaide, foi realizada 1988, na Austrália, e teve como tema central às políticas públicas voltadas para a saúde, reafirmando as cinco linhas de ação da Carta de Ottawa e da Declaração de Alma Ata. Enuncia que as políticas se caracterizam pelo interesse e preocupação explícita de todas as áreas das políticas públicas, em relação à saúde e à equidade e pelos compromissos com o impacto de tais políticas sobre a saúde da população. Identificou quatro áreas prioritárias para promover ações imediatas em políticas públicas saudáveis: apoio à saúde da mulher; alimentação e nutrição; tabaco e álcool; criação de ambientes favoráveis (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2019, p. 35).

Ademais, abordou profundamente os componentes das políticas públicas saudáveis para a qualidade de vida da população, no entanto, para que fosse concretizado seria necessário a intersetorialidade, através de novas parcerias e alianças com sindicatos, comércio, indústria e associações acadêmicas. Outrossim, considerou que os setores governamentais de agricultura, comércio, educação, indústria e comunicação, deveriam levar em consideração a saúde como fator essencial. (LOPES et al, 2010, p. 464).

A Declaração de Sundsvall foi a Terceira Conferência Internacional de Promoção da Saúde, realizada na Suécia em 1991, caracteriza-se como a primeira conferência a reconhecer o ambiente nas ações de promoção da saúde. Destacou a existência de milhões de pessoas que vivem em extrema pobreza e privação, em ambientes degradados, ameaçando a saúde de todos que estavam nessa situação. Tornando a meta “Saúde para Todos no ano 2000”, muito difícil de atingir. (DECLARAÇÃO DE SUNDSVALL, 1991, p. 01).

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[...] Esta conferência sublinha quatro aspectos para um ambiente favorável e promotor de saúde: a dimensão social, que inclui a maneira pela qual normas, costumes e processos sociais afetam a saúde; a dimensão política, que requer dos governos a garantia da participação democrática nos processos de decisão e a descentralização dos recursos e das responsabilidades; a dimensão econômica, que requer o reescalonamento dos recursos para setores sociais, incluindo a saúde e o desenvolvimento sustentável e a utilização da capacidade e conhecimento das mulheres em todos os setores, inclusive o político e o econômico [...].

Para inverter esta realidade, a Conferência apresentou soluções, nas quais consistem em tornar os ambientes físicos, sociais, econômicos e políticos, mais apropriados à saúde. Tais soluções podem ser tomadas por governantes, com o auxílio dos ativistas comunitários nas áreas de saúde e meio-ambiente, visto que todos têm um papel relevante na criação destes ambientes saudáveis para a população. (DECLARAÇÃO DE SUNDSVALL, 1991).

A Quarta Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada em Jacarta em 1997, teve como tema central a Promoção da Saúde no Século XXI, sendo a primeira a incluir o setor privado do apoio à promoção da saúde. Ainda, reexaminou as estratégias anteriormente adotadas para a promoção da saúde, a fim de identificar as estratégias necessárias para enfrentar os desafios do século XXI. (DECLARAÇÃO DE JACARTA, 1997).

A luz desta perspectiva, Lopes et al (2010, p. 464) elucidam que:

[...] Buscou-se nessa conferência refletir sobre o aprendizado de promoção da saúde, bem como reexaminar os determinantes de saúde identificando as direções e estratégias necessárias para enfrentar os desafios da promoção da saúde no século XXI. A Declaração de Jacarta reafirma a participação popular e o empoderamento das pessoas através do acesso a educação e informação, e destaca outros determinantes da saúde, que são os fatores transnacionais; estes incluem a integração da economia global, os mercados financeiros e o comércio, o acesso aos meios de comunicação de massa e a tecnologia em comunicação, assim como a degradação ambiental devido ao uso irresponsável dos recursos. Este evento reconheceu que os métodos em promoção da saúde, baseados no emprego de combinações das cinco estratégias de Ottawa, são mais eficazes que os enfoques centrados em um único campo, e que diversos cenários, tais como cidades, comunidades locais, escolas, lugares de trabalho, estabelecimento de atendimento a saúde entre outros, oferecem oportunidades práticas para a execução de estratégias integrais e que a participação é essencial para o processo de tomada de decisão, o cuidado da saúde de si, do outro e do entorno.[...]

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Além disso, afirma que a saúde é um direito humano fundamental e essencial para o desenvolvimento social e econômico. Outrossim, elenca pré-requisitos para saúde, sendo: paz, abrigo, instrução, segurança social, relações sociais, alimento, renda, direito de voz das mulheres, um ecossistema estável, uso sustentável dos recursos, justiça social, respeito aos direitos humanos e equidade. Enfatizando que a pobreza é, acima de tudo, a maior ameaça à saúde. (DECLARAÇÃO DE JACARTA, 1997).

A Quinta Conferência Internacional de Promoção da Saúde, mais conhecida como a Declaração do México, foi realizada na cidade do México, no ano de 2000, através dessa Declaração foi reforçado a importância das ações de promoção à saúde nos programas e políticas governamentais, em nível local, regional, nacional e internacional. Confirma o valor das ações intersetoriais para assegurar a implementação das ações de promoção e ampliar as parcerias na área da saúde (HEIDMANN et al, 2006, p. 355).

A Declaração do México enfatiza no seu artigo 1º e 2º, o reconhecimento da saúde como um valioso meio para desfrutar a vida, e necessária para o desenvolvimento econômico social e para a equidade, bem como, reconhecem que a promoção da saúde é um dever e responsabilidade central dos governos, compartilhada por todos os setores da sociedade (DECLARAÇÃO DO MÉXICO, 2000). Ressalta-se que o grande marco do evento realizado no México, foi o comprometimento dos governos em “adotarem a promoção da saúde como política pública e desenvolverem estratégias para melhorar os determinantes da saúde e reduzir as iniquidades em seus países”. (LOPES et al, 2010, p. 465).

Por fim, Heidmann et al (2006, p. 355), ressaltam que as Conferências Regionais, Sub-regionais e Específicas de Promoção à Saúde, foram elaboradas para discutir problemas específicos dos países latino-americanos e/ou determinados países, sempre incorporando as tendências e experiências internacionais da promoção à saúde de outras regiões do mundo. Podendo-se destacar a Declaração de Santa-Fé de Bogotá (1992), que evidenciou as estratégias para recriar a promoção à saúde na América Latina.

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Deste modo, observa-se que a promoção da saúde exerce uma crescente influência no planejamento do sistema de saúde em diversas regiões do mundo, inclusive no Brasil. Assim, importante analisar como o Brasil comportava-se com relação à saúde nas suas Constituições anteriores, a fim de analisar se em algum momento implementou alguma das estratégias de saúde discutidas em tais conferências em seu ordenamento jurídico.

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2 A SAÚDE COMO UM DIREITO CONSITUCIONAL

Após a análise da origem do direito à saúde, prudente averiguar o tratamento que este direito recebeu ao longo das sete Constituições Brasileiras, uma vez que, a saúde não recebia a proteção que possui hoje. Ademais, será analisada a obrigatoriedade do Estado e dos planos privados de saúde em fornecer medicamentos de caráter experimentais. Por fim, será apresentado um breve estudo acerca da reserva do possível e o fornecimento de medicamentos em fase experimental.

2.1 Saúde nas Constituições Brasileiras

A Constituição Imperial de 1824, não mencionou expressamente o direito à saúde, visto que, preocupou-se em assegurar os direitos civis e políticos dos cidadãos. Contudo, conferiu somente a garantia dos “socorros públicos” a população, sem mais explicações do se tratavam ou como deveriam ser distribuídos e a quem cabia sua realização.

Nesse sentido, vejamos o artigo 179 da Constituição Imperial de 1824:

Art.179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte

(...)

XXXI. A Constituição tambem garante os soccorros públicos.

Souza (2007, p. 15), esclarece que os socorros públicos, eram entendidos como os auxílios exercidos pelo Estado à porção desamparada da sociedade, como viúvas, órfãos, presos, inválidos e miseráveis, garantidos pela Constituição Política do Império do Brasil de 1824, cuja definição não é encontrada nesse documento, mas passível de ser identificada no corpo das Leis e Decisões do Governo do período estudado. Este termo utilizado pelo documento oficial abrange de maneiras distintas a população, estendendo seus benefícios a outras camadas, além dessa marginalizada pela sociedade, seguindo critérios de prestação de servidão e defesa dos interesses do Estado.

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A segunda Constituição Brasileira, foi promulgada em 1891, a qual marcou a transição da monarquia para a república. Contudo, Lessa (2014, p. 03), refere que a Constituição Republicana de 1891, não menciona nenhum dispositivo à ordem econômica e social, não trazendo qualquer regulamentação ou normatização relacionada ao direito à saúde. Tal panorama se justifica pela ideologia liberal ainda bastante presente no final do século XIX.

Ainda nesse sentido, Sturza e Brandt (2016, p. 04) observam:

[...] A sociedade continuava em processo de estruturação e a saúde ainda era uma questão “celestial”, sendo tais fatos agravantes do retardamento em relação à Constituição anterior. Todavia, esta constituição representou grandes transformações com o surgimento da federação e da república, além do incremento dos poderes regionais ou locais, caracterizados pela política dos governadores e do coronelismo regionais, sem, contudo, delimitar à saúde a sua verdadeira relevância [...].

Em 1934, foi promulgada a terceira Constituição Brasileira, sendo a primeira a fazer menção à saúde, ampliou o rol dos direitos individuais, trazendo consigo algumas preocupações sanitárias de incumbência da União e dos Estados, os quais deveriam encarregar-se dos cuidados da saúde, bem como da assistência pública.

No seu artigo 10 e 121, a Constituição de 1934, garantiu assistência médica e sanitária aos trabalhadores e às gestantes, vejamos:

Art 10. Compete concorrentemente á União e aos Estados: (...)

II - cuidar da saúde e assistência públicas; (...)

Art 121. A lei promoverá o amparo da producção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a protecção social do trabalhador e os interesses economicos do paiz.

§ 1.º A legislação do trabalho observará os seguintes preceitos, além de outros que collimem melhorar as condições do trabalhador:

(...)

h) assistencia medica e sanitaria ao trabalhador e á gestante, assegurado a esta descanso antes e depois do parto, sem prejuizo do salário e do emprego, e instituição de previdencia, mediante contribuição igual da União, do empregador e do empregado, a favor da velhice, da invalidez, da maternidade e nos casos de accidentes de trabalho ou de morte;

Outrossim, a Constituição de 1934 foi revogada e então promulgou-se a Carta Constitucional de 1937, a qual implementou o regime ditatorial outorgado por Getúlio

(34)

Vargas. Essa Constituição, tinha como foco principal o fortalecimento do Poder Executivo. Apesar de não demonstrar interesse à saúde, manteve a competência da União para legislar normas de proteção à saúde, bem como determinou a obrigação da legislação trabalhista em proteger à saúde dos trabalhadores.

Nesta seara, dispõe o artigo 16 da Constituição de 1937:

Art. 16. Compete privativamente à União o poder de legislar sobre as seguintes matérias

(...)

XXVII - normas fundamentais da defesa e proteção da saúde, especialmente da saúde da criança.

(...)

Art. 137. A legislação do trabalho observará, além de outros, os seguintes preceitos:

(...)

l) assistência medica e higiênica ao trabalhador e à gestante, assegurado a esta, sem prejuízo do salário, um período de repouso antes e depois do parto;

Com o fim do período ditatorial, promulgou-se a Constituição de 1946, a qual tentou manter um texto intermediário entre às Cartas Magnas de 1934 e 1937, seu objetivo era redemocratizar o país, permitindo com que este se desenvolvesse através de medidas de proteção aos direitos individuais. Em que pese, não inovar na questão na saúde, demonstrou clara preocupação com a saúde do trabalhador e as gestantes.

Deste modo, observa-se o artigo 157 da Constituição de 1946:

Art 157 - A legislação do trabalho e a da previdência social obedecerão nos seguintes preceitos, além de outros que visem a melhoria da condição dos trabalhadores:

(...)

VIII - higiene e segurança do trabalho;

IX - proibição de trabalho a menores de quatorze anos; em indústrias insalubres, a mulheres e a menores, de dezoito anos; e de trabalho noturno a menores de dezoito anos, respeitadas, em qualquer caso, as condições estabelecidas em lei e as exceções admitidas pelo Juiz competente;

X - direito da gestante a descanso antes e depois do parto, sem prejuízo do emprego nem do salário;

A luz desta perspectiva, Lessa (2014, p. 05) esclarece que:

[...] Neste período o direito a saúde era resumido na prestação de uma assistência médica, proporcionado pelos sindicatos que detinham a

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competência para a execução destes serviços aos filiados através de institutos, mantido pelas contribuições dos associados. A solução dos problemas de saúde da população continuou fortemente vinculada à situação trabalhista dos indivíduos. As pessoas que trabalhavam de forma informal continuavam não tendo acesso a assistência médica, eram atendidos por Unidades Sanitárias dos Estados, ou pelas instituições médicas de cunho filantrópicas, assim os indivíduos eram considerados como indigentes. [...]

Posteriormente, em 1967 foi promulgada uma nova constituição e novamente o Brasil volta para um regime autoritário, através de um golpe militar. Nesse contexto, as políticas de saúde dos governos militares buscavam incentivar a expansão do setor privado, objetivando ampliar a compra de serviços pela previdência, facultando incentivos fiscais às empesas, para contratação de companhias privadas ou cooperativas de médicos, que prestassem serviços de saúde, aos seus funcionários. Ainda, os definidores dessas políticas objetivavam também a privatização de parte dos serviços médicos estatais, então considerados inadequados por não serem lucrativos (PAIVA; TEIXEIRA, 2014, p. 17).

Neste sentido, contribuem, Rocha e Sturza (2008, p. 16):

[...] No período de 1964 e anos seguintes, expediram-se alguns Atos Institucionais, os quais deveriam manter a ordem constitucional vigorante. O Brasil enfrentava neste período severas modificações não só no campo político, mas também no campo social. A população perdeu seus direitos de cidadão comum, prevalecendo o ordenamento da ditadura militar, a qual, em sua essência, caracterizava um período paradoxal. Mesmo sendo o Brasil um dos signatários da Declaração Universal dos Direitos do Homem, tal fato não acarretou em grandes modificações neste período, o qual apenas retornou à situação da Carta de 1934. Assim, as questões de saúde ainda eram problema do executivo e necessitavam, primordialmente, da implementação de políticas públicas. [...]

Por fim, em 1988 foi promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil, pondo fim ao regime ditatorial e instituindo um governo democrático. Como oportunamente dito a Constituição Cidadã, como também é chamada, de forma inaugural inseriu à saúde no rol dos direitos sociais (art. 6º caput), representando uma grande evolução no ordenamento jurídico nacional, uma vez que, anteriormente à saúde não era assegurada de forma plena pelos Textos Constitucionais, desta forma, a alçou em patamares nunca antes conquistados.

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[...] É espantoso como um bem extraordinariamente relevante à vida humana só agora é elevado à condição de direito fundamental do homem, sendo esquecida na maioria das nossas Constituições e, quando lembrada, sempre de forma inconsistente e sem a devida importância. [...]

Cumpre discorrer que o artigo 6º, da Constituição Federal, estabelece outros direitos sociais e fundamentais como: educação, alimentação, trabalho, moradia, segurança, proteção à maternidade e à infância, dentro outros. Todavia o direito à saúde é visto como um dos direitos mais relevantes no âmbito social, uma vez que, está inteiramente ligado com o direito à vida e a dignidade da pessoa humana.

Leciona, José Gomes Canotilho (1998, p. 78):

[...] O processo de fundamentalização, constitucionalização e positivação dos direitos fundamentais colocou o indivíduo, a pessoa, o homem como centro da titularidade de direitos”. Entende-se assim que a saúde deve ser o Direito Fundamental, entre os fundamentais - Direito Humano Essencial, já que a saúde é a garantia da vida; sem a saúde o ser humano não se integraliza enquanto ser em dignidade. [...]

O direito fundamental à saúde está positivado em nosso ordenamento jurídico como um direito fundamental e social, estando expresso no texto constitucional, no artigo 6º, no rol dos direitos sociais, e também nos artigos 196 a 200, os quais preceituam que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, bem como regulamentam acerca da forma como o Estado deverá efetivar e fiscalizar o acesso deste direito à população.

Nessa linha, novamente cumpre trazer à baila o texto constitucional, desta vez, o teor do caput do artigo 198 da CF/88:

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

Deste modo, afigura-se nítido que a própria Constituição traz uma direção para a atuação do Estado, impondo-lhe o dever de criar um sistema de saúde, o qual restou positivado em nível infraconstitucional pela Lei n.º 8.080/90, cunhando a denominada sigla SUS (Sistema Único de Saúde).

Referências

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