Carência de ação por causa superveniente e honorários
advocatícios
O Código de Processo Civil pátrio elenca algumas condições de
ação, dentre elas: a legitimidade da parte, a possibilidade jurídica do pedido e o
interesse de agir.
A legitimidade de parte consiste no aspecto subjetivo da causa, os
sujeitos do processo, ou seja, aqueles que devem integrar o pólo ativo e passivo da
ação.
A possibilidade jurídica do pedido se relaciona com a própria
existência de fundamento legal no ordenamento jurídico apto a albergar a pretensão
autoral, ou seja, o pedido não pode ser algo proibido no ordenamento pátrio. Como
exemplo pode-se citar a cobrança judicial de dívida de jogo, que não encontra
amparo no nosso ordenamento, constituindo-se assim num pedido juridicamente
impossível.
Já o interesse de agir é a necessidade, utilidade e adequação da
propositura da ação judicial.
O CPC brasileiro determina, em seu art. 3o, que "para propor ou
contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade".
O interesse processual é o interesse de agir do titular de direitos.
Se houver propositura inadequada então haverá nulidade da ação e o resultado final
não será alcançado. O interesse processual é composto do binômio necessidade e
utilidade e sem eles não haverá tutela jurisdicional do Estado de direito.
No entanto, o interesse processual não determina a procedência
do pedido pois o mesmo irá ser apreciado quanto ao mérito. Assim, o interesse
processual surge da necessidade da tutela jurisdicional do Estado, invocada por
meio adequado, o qual determinará o resultado útil pretendido, do ponto de vista
processual.
Importante trazer a baila renomado ensinamento do doutrinador
cearense José de Albuquerque Rocha:
“ O interesse de agir é justamente essa necessidade que tem alguém de recorrer ao estado e dele obter proteção para o direito que julgue ter sido violado ou ameaçado de violação.
Por conseguinte, alguém só pode exercitar o poder de ação, ou seja, só pode pedir a proteção jurisdicional do Estado, quando tem interesse nessa prestação jurisdicional, interesse que nasce justamente do fato de o seu pretenso direito ter sido violado ou ameaçado de violação e da proibição da justiça.”1
Portanto, para que se configure o interesse de agir no deslinde do
litígio, exige-se a violação ou ameaça a direito, necessidade do ajuizamento da
ação, bem como adequação da ação escolhida, sob pena de extinção do processo
sem resolução de mérito, conforme dispõe o Código de Processo Civil Brasileiro:
“Art. 267. Extingue-se o processo sem resolução de mérito: (...)
VI – quando não ocorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual.”
O grande cerne do presente trabalho consiste em analisar os
casos em que ao ajuizar determinada ação a parte autora efetivamente detém
interesse de agir, entretanto, no decorrer do prosseguimento de tal processo ocorre
determinada situação que afasta o interesse processual, fato esse conhecido
juridicamente por carência de ação por causa superveniente ou perda de objeto.
Quando ocorre a carência de ação por causa superveniente,
efetivamente cai por terra um dos requisitos da ação, qual seja: o interesse de agir,
razão pela qual o processo deve ser extinto sem apreciação de mérito, uma vez que
perdeu seu objeto.
1
Ocorre que a partir daí surge um outro problema, qual seja, a
questão dos honorários advocatícios.
Como se sabe os honorários advocatícios são devidos pela parte
que sucumbe na ação, ou seja, aquela que perde o processo. Entretanto nos casos
de carência de ação, efetivamente não se pode falar em parte vencedora ou
vencida, haja vista que o processo não chega a ter seu mérito analisado, posto que
é extinto sem apreciação de mérito justamente por faltar o interesse de agir.
Sendo assim, em tais casos de extinção do processo sem
resolução de mérito por carência de ação por causa superveniente adota-se a teoria
do princípio da causalidade.
A adoção de tal princípio na fixação de honorários advocatícios
nos casos ora afirmados diz respeito ao entendimento segundo o qual deve ser
condenada ao pagamento de honorários a parte que deu causa ao ajuizamento da
ação.
Adotando-se a teoria em tela tem-se que os honorários
advocatícios poderão ser arcados pela parte autora, pela parte ré ou até mesmo
rateado por cada uma das partes.
Caso o autor dê causa ao ajuizamento da ação ele é quem deverá
arcar com o pagamento dos honorários advocatícios da outra parte, bem como
ocorre o mesmo no caso em que a parte ré é quem dá causa ao ajuizamento de
ação.
Já no caso em que a carência de ação ocorra por causa de
surgimento de Lei ou qualquer outro fenômeno que não possa ser atribuído a
nenhuma das partes, conclui-se que nesse caso cada parte dever arcar com o
pagamento dos seus respectivos advogados, uma vez que a causa da perda do
objeto não pode ser atribuída a nenhuma das partes litigantes.
PROCESSUAL CIVIL – ADMINISTRATIVO – EXTINÇÃO DO
FEITO – FATO SUPERVENIENTE – AUSÊNCIA DE
INTERESSE PROCESSUAL – HONORÁRIOS – PRINCÍPIO
DA CAUSALIDADE – 1. Os honorários advocatícios são
devidos nos casos de extinção do feito, sem Resolução do mérito, em razão da superveniente perda de objeto, à luz do princípio da causalidade. Precedentes jurisprudenciais do stj:
RESP 812193/MG, desta relatoria, DJ de 28.08.2006; RESP 654909/PR, relator ministro teori zavascki, DJ de 27.03.2006; RESP 424220/RJ, relator ministro João Otávio de noronha, DJ de 18.08.2006 e RESP 614254/RS, relator ministro José delgado, DJ de 13.09.2004. 2. Extinto o procedimento, sem
Resolução do mérito, por falta de interesse de agir superveniente, o juiz deve pesquisar a responsabilidade pela demanda, bem como pelo seu esvaziamento, no afã de imputar os honorários. 3. In casu, a superveniente perda de
objeto do processo e, consectariamente, a sua extinção, sem Resolução do mérito, decorreu de ato praticado pela ré, consubstanciado na publicação das resoluções nº 302 e 303 de 08.11.2002, que revogaram a Resolução nº 210/99, impugnada
pela ação ab origine. 4. Recurso Especial desprovido. (STJ –
RESP 200501088691 – (764519 RS) – 1ª T. – Rel. Min. Luiz
Fux – DJU 23.11.2006 – p. 223)
PROCESSUAL CIVIL – EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM
JULGAMENTO DO MÉRITO – CUSTAS E HONORÁRIOS –
PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE – Extinto o processo sem
julgamento do mérito, decorrente de perda superveniente do objeto, a parte que deu ensejo à instauração da demanda arcará com o pagamento das custas e honorários advocatícios, em observância ao princípio da causalidade.
(TJDF – APC 20060150094766 – 1ª T.Cív. – Rel. Des. Nívio
Gonçalves – DJU 18.01.2007 – p. 87)
PROCESSUAL CIVIL – Ação demolitória - Fato superveniente
(art. 462 do CPC) - Perda do objeto - Extinção do processo sem análise do mérito - Honorários advocatícios devidos - Exegese do princípio da causalidade - Recurso provido.
(TJSC – AC 2006.004834-5 – Balneário Camboriú – 1ª CDPúb. – Rel. Des. Vanderlei Romer – J. 29.09.2006)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – REGIME
COMPLEMENTAR DE APOSENTADORIA – FUNCEF –
EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO – AUSÊNCIA DE INTERESSE EM AGIR POR PERDA DE
OBJETO – TRANSAÇÃO – NÃO OCORRÊNCIA –
CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS –
CORRETA – PRECEDENTES CITADOS – RECURSOS
PARCIALMENTE PROVIDOS – Cuida-se de apelações cíveis
objetivando a reforma de sentença que, em sede de ação de conhecimento, pelo rito ordinário, extinguiu o processo sem apreciação de mérito, por perda de objeto, bem como condenou as apelantes ao pagamento de honorários advocatícios. - A
superveniência de fato que esvazie o objeto do processo implica a carência da ação por ausência de interesse em agir, presente à época da propositura da ação. - Não
havendo concessões mútuas, não há falar em transação (art. 840, CC). - A transferência dos apelados para a funcef, por meio de ato implementado pela CEF, realizou exatamente o pleito autoral, ocasionando, via de conseqüência, a perda do objeto da presente demanda, circunstância esta que conduz, necessariamente, à extinção anormal do processo, ante a ausência superveniente de interesse processual. - Correta a
imposição do pagamento da verba honorária à parte que deu causa ao ajuizamento da demanda, mormente quando a extinção do feito sem exame de mérito, face a ausência de interesse processual, por perda de objeto, decorreu da satisfação extrajudicial do pedido formulado na peça vestibular. - Ressalte-se, no entanto, que nas causas em que
não há condenação, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz (art. 20, § 4º, do CPC). In casu, tendo em vista o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, é razoável a redução da verba honorária fixada na sentença que deverá ser corrigida a partir da publicação da sentença. - Precedentes citados. - Recursos parcialmente
providos. (TRF 2ª R. – AC 2000.51.01.033551-0 – 5ª T.Esp. –
ADMINISTRATIVO – PROCESSUAL CIVIL – PENSÃO – EX-COMBATENTE – PERDA DE OBJETO – EXTINÇÃO – 267, VI – Do CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INDEVIDOS. - Extinção do processo sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, VI, decorrente da falta de interesse de agir superveniente tendo em vista o reconhecimento administrativo do direito autoral. - Desta forma, sendo caso de extinção do
processo por perda de objeto, o Juiz deve perquirir quem deu causa, de modo objetivamente injurídico, à instauração do processo. -Incabível, portanto, a condenação da Autora ao
pagamento de honorários advocatícios. Afinal, à época da propositura da presente ação seu direito não estava reconhecido administrativamente, existindo certamente o interesse de agir do autor, condição necessária para a instauração e admissibilidade da ação, o que deve ser levado em conta pelo Juiz. - Recurso não provido. Sentença
confirmada. (TRF 2ª R. – AC 2001.02.01.032496-3 – 2ª T. –
Rel. Des. Fed. Sergio Feltrin Correa – DJU 07.12.2004 – p. 284)
CIVIL PROCESSUAL CIVIL – BUSCA E APREENSÃO –
PURGA DA MORA – PERDA DO OBJETO – EXTINÇÃO SEM
JULGAMENTO DE MÉRITO – CONDENAÇÃO EM CUSTAS E
HONORÁRIOS – PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE –
GRATUIDADE DE JUSTIÇA – DECLARAÇÃO – PRESUNÇÃO
JURIS TANTUM – Se o autor tinha interesse processual
quando da propositura da demanda, mas houve carência superveniente da ação, pela perda do objeto, o juiz deve avaliar se o réu deu causa ao ajuizamento da demanda (princípio da causalidade). Em caso positivo, deve condená-lo em honorários do advogado com base no CPC 20, § 4º. Revela-se cabível o benefício da gratuidade de justiça,
valendo a declaração assinada pelo requerente, quando não contrariada pelos demais elementos do processo. A presunção conferida à declaração é juris tantum, devendo-se observar a realidade econômica do requerente em cada caso. Apelo não provido. (TJDF – APC 20050110012174 – 6ª C.Cív. – Relª Desª Ana Maria Duarte Amarante – DJU 01.12.2005 – p. 296)
PROCESSUAL CIVIL – CAUTELAR – PERDA DE OBJETO:
EXTINÇÃO DA AÇÃO PRINCIPAL – SUCUMBÊNCIA –
RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DE CUSTAS E
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – I. A cautelar perdeu seu
objeto em razão da extinção sem julgamento do mérito da ação principal por indeferimento da inicial. II. Extinto o processo
pela perda superveniente do interesse de agir, a
responsabilidade pelo pagamento das despesas
processuais é definida com fundamento no princípio da causalidade. III. Embora a ação principal tenha sido extinta
cinco dias após o ajuizamento da cautelar, a autora não se manifestou, tendo o feito prosseguido e a ré apresentado contestação. IV. A atuação da autora exigiu da parte contrária providências em defesa de seus interesses. Assim, há uma relação de causa que determina a responsabilidade daquela pelo pagamento dos honorários advocatícios. V. A teor do estatuído no artigo 20, § 4º do CPC, o valor da verba honorária que melhor atende às peculiaridades do feito é o de R$ 150,00.
VI. Recurso parcialmente provido. (TRF 3ª R. – AC
2004.61.17.003395-3 – (1067879) – 2ª T. – Relª Desª Fed.
Cecilia Mello – DJU 01.12.2006 – p. 439)