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Rios, estuários e mangues: a mulher na pesca artenasal

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE NIVEL MESTRADO MARY LOURDES SANTANA MARTINS. RIOS, ESTUARIOS E MANGUES: A MULHER NA PESCA ARTESANAL. SÃO CRISTÓVÃO / SE FEVEREIRO/ 2013.

(2) MARY LOURDES SANTANA MARTINS. RIOS, ESTUARIOS E MANGUES: A MULHER NA PESCA ARTESANAL. Dissertação apresentada por Mary Lourdes Santana Martins em 25 de fevereiro de 2013 à banca examinadora constituída pelos doutores:. Prof. Dr. Ronaldo Gomes Alvim Universidade Federal de Sergipe - Orientador Prof. Dr. Cristiano Wellington Noberto Ramalho Universidade Federal de Sergipe – Coorientador Profa Dra. Lígia Albuquerque de Melo Fundação Joaquin Nabuco (FUNDAJ) – Examinadora externa Profa. Dra. Maria José Nascimento Soares Universidade Federal de Sergipe – Examinadora interna. SÃO CRISTÓVÃO/SE FEVEREIRO/ 2013.

(3) FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE. Martins, Mary Lourdes Santana Rios, estuários e mangues: a mulher na pesca artenasal / Mary Lourdes Santana Martins; orientador Ronaldo Gomes Alvim. – São Cristóvão, 2013. 140 f. : il.. M386r. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente)– Universidade Federal de Sergipe, 2013. O. 1. Pesca artesanal. 2. Mulheres – Condições sociais. 3. Itaporanga D’Ajuda (SE). I. Alvim, Ronaldo Gomes, orient. II. Título. CDU: 639.21-055.2(813.7).

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(8) A minha querida irmã Ana Karina Santana Martins, e ao meu amado pai William de Oliveira Martins.

(9) AGRADECIMENTOS. Agradeço a Deus por me conceder a graça de conviver com pessoas/anjos cuja simples presença em minha vida contribuiu direta ou indiretamente para a concretização deste trabalho. A painho pelo constante incentivo para percorrer e ultrapassar os meandros da vida pessoal e acadêmica. A minha mãe pelo apoio durante esta empreitada. A minha irmã Karina pela companhia, paciência, palavras de conforto durante os inúmeros momentos de angústia, apreensão e insegurança, e por ter lido meu trabalho “500 vezes”!! rsrs. A todos os meus sobrinhos, em especial Mellyssa por ter feito o levantamento dos pontos de pesca para a elaboração do mapa, e Laryssa por compreender minhas ausências e meus momentos de impaciência e stress. Ao Prof. Orientador Ronaldo Gomes Alvim, por me acolher, pela confiança depositada e pelas constantes palavras de incentivos. Ao Prof. Coorientador Cristiano Ramalho pela partilha generosa de conhecimentos que contribuíram para a compreensão da complexidade que envolve o universo da pesca. A Profa. Maria José Nascimento Soares toda a minha gratidão por ter me proporcionado a oportunidade de fazer ciência, quando lá em 2007, me aceitou como bolsista no Programa de Iniciação Científica. Essa conquista é com certeza produto desses anos de trabalho, nos quais partilhou de forma generosa o saber necessário à arte da ciência. Aos colegas da Turma Prodema 2011, cujas conversas e risadas contribuíram para que o mestrado se constituísse uma experiência mais leve e menos traumática. Agradeço de modo especial às meninas do “quarteto fantástico” (Ana Bárbara, Mel, Camila e Mariana) pelo companheirismo, atenção e carinho. E, ao nobre colega Roberto Wagner a quem recorri tantas vezes para me socorrer durante os sufocos da informática, sobretudo, agora na etapa final. A Andrea e a Camilinha pela amizade, consideração e carinho de sempre, e pelo esforço e preocupação em tentar recuperar o meu arquivo. Camilinha, a você sou muitíssimo grata.

(10) também por ter me emprestado a 4ª, 5ª e a 7ª temporadas da série Grey´s Anatomy, cujos episódios constituíram-se em santo remédio para me livrar dos pesadelos com a dissertação rsrsrs. A Profa. Roseane Gomes por dedicar seu tempo para tirar minhas dúvidas, indicar material e ouvir minhas angústias. A minha amiga/irmã/psicóloga Roseli, a quem serei eternamente grata por se fazer presente e paciente, ouvindo meus desabafos e anseios, pelas palavras de encorajamento e por me ajudar a manter a sanidade rsrs. As amigas Joelma, Juciara e Nayara pelo apoio de sempre. A Sérgio por ter recuperado meu arquivo corrompido. Aos motoristas Sr. José dos Anjos, Sr. Gilmar, Sr. Paulo Pita por me conduzirem com segurança e tranquilidade nas viagens à Itaporanga. Agradeço de modo especial ao Sr. Amaral, pois, além de me conduzir com segurança, também me proporcionou ótimos momentos de descontração, diminuindo assim a tensão das primeiras visitas a campo. A todo pessoal da secretaria Aline, D. Julieta e os bolsistas (Val, Wanderson, Luzia, Amanda, Jenifer e Janiele) pela atenção e presteza. As pescadoras da Comunidade Ilha do Beto, que com coragem e determinação lançam-se rio adentro, e ao margearem os rios, estuários e mangues transformam o dificultoso e desafiador cotidiano da pesca, numa experiência bela, alegre e sábia. Agradeço de modo especial a D. Vera, por ter me acolhido com afeto, apresentando-me à comunidade possibilitando o desenvolvimento deste trabalho. A D. Fátima, aos meninos Kiko e Marcos, e aos pescadores Zé Neri e Flodoaldo por facilitar meu acesso a Ilha. A CAPES, pela concessão da bolsa de estudo..

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(12) Minha profissão é muito importante, foi o serviço que aprendi. Eu sinto prazer de ser pecadora! Eu acredito que trabalho nenhum envergonha a gente Eu me sinto orgulhosa da minha profissão, sou digna daquilo que faço! (Pescadoras da Ilha do Beto. Itaporanga D´Ajuda/SE).

(13) RESUMO A pesca constitui uma das atividades produtivas mais antigas do mundo que ao longo do tempo foi realizada predominantemente por homens. A participação feminina neste setor ocorreu inicialmente de forma indireta, quando à mulher cabia a responsabilidade do beneficiamento e comercialização do pescado, a confecção e reparo dos instrumentos utilizados pelo homem para a realização da atividade. As dificuldades socioeconômicas que permeiam o cotidiano das comunidades que sobrevivem da exploração dos recursos pesqueiros constituem fatores determinantes para a inserção da mulher de forma direta na pesca. Assim, elas ocupam as margens de rios, estuários e mangues trabalhando diretamente na captura de peixes, moluscos e crustáceos para atender as necessidades de sobrevivência de suas famílias. Desta forma, a participação feminina na aludida atividade constitui uma alternativa de subsistência, fonte de trabalho e renda para inúmeras famílias em todo o país. Todavia, a atuação da mulher neste universo ocorre, com algumas exceções, num contexto de invisibilidade e desvalorização do seu trabalho, entendido como extensão das tarefas domésticas e não como pesca propriamente. Essa realidade suscitou o interesse em desenvolver um estudo, cujo objetivo principal foi analisar a importância e as atribuições da mulher na pesca artesanal, numa comunidade denominada Ilha do Beto situada município de Itaporanga D´Ajuda/SE. Além disso, a presente pesquisa buscou também investigar os significados que as pescadoras atribuem ao lugar de vida e trabalho, haja vista a íntima relação que o cotidiano da pesca proporciona. Para alcançar os objetivos propostos, a metodologia utilizada fundamentou-se na abordagem qualitativa, que se propõe não apenas descrever, mas, sobretudo analisar e compreender a realidade dos sujeitos pesquisados. Foram também adicionados à estrutura metodológica, pressupostos da história oral e aspectos da abordagem etnográfica. O desenvolvimento da pesquisa no campo empírico ocorreu mediante trabalho de campo com a realização de entrevistas semiestruturadas, conversas informais, observação direta, turnê guiada, registro fotográfico e georreferenciamento. A realização deste trabalho permitiu identificar quão importante e singular é a atuação da mulher nesta atividade, cujo envolvimento e participação não estão limitados simplesmente a uma “ajuda”. As pescadoras que compuseram a amostragem desta pesquisa reconhecem que o trabalho desempenhado na pesca, é tão essencial quanto àquele realizado por seu companheiro, contribuindo significativamente para a formação da renda familiar. Ademais, no que se refere à relação das pescadoras com o lugar, pôde-se constatar que a Ilha do Beto corresponde não somente ao local onde é possível atender as necessidades de trabalho e renda, mas também o lugar onde são estabelecidas importantes relações sociais e afetivas entre os indivíduos, e entre estes e o entorno. Palavras-Chave: Pesca artesanal, mulher, lugar..

(14) ABSTRACT Fishing is one of the oldest productive activities of the world over time was done mainly by men. Female participation in this sector was initially indirectly, when the woman fell to the responsibility of processing and marketing of fish, the manufacture and repair of instruments used by man for that activity. The socioeconomic difficulties that pervade the daily lives of communities that survive the exploitation of fishing resources are decisive factors for the inclusion of women directly in fishing. Thus, they occupy the margins of rivers, estuaries and mangroves working directly in the capture of fish and shellfish to meet the survival needs of their families. Thus, female participation in the activity provides an alternative livelihood source of employment and income for many families across the country. But the role of women in this universe occurs with some exceptions in the context of invisibility and devaluation of their work, understood as an extension of domestic chores and not as fishing itself. This reality has stimulated the development of this study, whose main objective was to analyze the importance and responsibilities of women in fishing, a community named Ilha do Beto municipality located Itaporanga D'Ajuda / SE. Furthermore, this study also sought to investigate the meanings that attach to the fisherwomen place of life and work, given the close relationship that provides daily fishing. The methodology used in the study is based on a qualitative approach, which aims not only to describe, but to analyze and understand the reality of the people surveyed. The methodological structure still relied on assumptions of oral history and ethnographic research. The development of empirical research in the field occurred with the realization of semi-structured interviews, informal conversations, direct observation, guided tours, photographic recording and georeferencing. This work identified the importance and uniqueness of female engagement in this activity, whose involvement and participation are not limited simply to a "help". The fishers who participated in this study recognize that the work performed in fishing, is as essential as the one held by her husband, contributing significantly to the formation of family income. Moreover, it was found that the Island Beto corresponds not only to the place where you can meet the needs of work and income, but also the place where important personal relationships are established between individuals, and between them and the environment. Keywords: Small-scale fishing, woman, place..

(15) LISTA DE ILUSTRAÇÕES Imagem 1 Imagem 2 Imagem 3 Imagem 4 Imagem 5 Imagem 6 Imagem 7 Imagem 8 Imagem 9 Imagem 10 Imagem 11 Imagem 12 Imagem 13 Imagem 14 Imagem 15 Imagem 16 Imagem 17 Imagem 18 Imagem 19 Imagem 20 Imagem 21 Imagem 22 Imagem 23 Imagem 24 Imagem 25 Imagem 26 Imagem 27 Imagem 28 Imagem 29 Imagem 30 Imagem 31 Imagem 32 Imagem 33 Imagem 34 Imagem 35 Imagem 36 Imagem 37 Imagem 38 Imagem 39 Imagem 40 Imagem 41. Vila de Pescadores Reunião para apresentação da pesquisa para a comunidade de pescadores Conversa informal com as pescadoras na comunidade Colônia de Pescadores Redinha utilizada para a captura de peixe e camarão. Espécie de peixe pequena capturada com petrecho de garrafa pet Instrumento fabricado com garrafa pet e arame Tarrafa Rede de cacear Grozeira Ratoeira Pescadora demonstrando utilização do facão. Planta Pneumatofita Captura do sururu. Captura do sururu. Estratégia para evitar que a água invada o barraco durante a maré grande Momento de pausa para descanso e refeição Maçunim após a coleta Maçunim após retirada do casco Posições para a coleta do Maçunim Posições para a coleta do Maçunim Posições para a coleta do Maçunim Pescadoras migrando para áreas secas Pescadoras capturando molusco com a maré enchendo Cozimento do maçunim Mulheres desmiolando pescado no quintal dos barracos Mulheres desmiolando pescado na frente dos barracos Armazenamento em isopor com gelo para conservação do pescado Demonstração da diversidade de pescado capturado Rio Vaza Barris Pescado a ser separado pelas pescadoras Separação do pescado Camarão após processo de separação Busca da lenha Mulheres separando e cortando a lenha Mulheres colocando a lenha no barco para retornar à Ilha Outros produtos encontrados durante a extração da lenha Ponto de captação de água. Demonstração do transporte da água. Imagens da Ilha do Beto Paisagens que circundam a Ilha do Beto. 28 31 31 78 90 91 91 91 91 91 92 92 92 93 93 98 100 101 101 101 101 101 102 102 103 103 103 104 106 110 110 110 110 112 112 112 113 113 113 115 117.

(16) LISTA DE QUADROS. Quadro 1 Quadro 2 Quadro 3 Quadro 4. Demonstrativo dos povoados que tem relação com a pesca no município de Itaporanga D´Ajuda/SE. Demonstrativo das espécies de pescado, ambiente e instrumentos utilizados para a captura. Demonstrativo das Localidades do pescado na região Demonstrativo dos valores de pescado. 77 90 94 105.

(17) LISTA DE FIGURAS. Figura 1 Figura 2. Mapa do Município de Itaporanga D´Ajuda Mapa dos principais pontos de pesca. 24 95.

(18) LISTA DE GRÁFICOS. Gráfico 1 Gráfico 2 Gráfico 3. Distribuição das pescadoras por faixa etária Pescados priorizados pelas mulheres Destino do Pescado. 82 89 104.

(19) SUMÁRIO. 1 1.1 1.2 2 2.1 2.2 2.3 2.4 2.5 2.6 2.7 2.8 2.9 2.10 2.11 3 3.1 3.2 3.3 3.4 3.5 3.6 3.7 3.8 3.9 3.10 3.11 3.12 3.13 4 5 6. Introdução Mulheres na pesca artesanal: primeiras notas Um olhar sobre o surgimento da pesquisa Construto Metodológico Análise dos dados Pescando conhecimentos: tecendo as bases teóricas Origem e peculiaridades da atividade pesqueira Aspectos Gerais da atividade pesqueira em Sergipe Territórios da pesca: espaços de sobrevivência, conhecimentos e sociabilidade As condições objetivas e subjetivas da pesca artesanal Comunidades Pesqueiras e o universo da pesca: relações e desafios Da terra ao mar: a dimensão espacial do trabalho feminino na pesca O ingresso da mulher na pesca: diferentes razões A mulher no universo da pesca: da invisibilidade ao protagonismo A relação da mulher com o entorno socioambiental A categoria de análise “lugar” e seu contributo para compreensão das interações com o ambiente A concepção de lugar segundo a Geografia Humanista A pesca artesanal na Ilha do Beto: capturando a essência do trabalho feminino Aspectos históricos da pesca em Itaporanga D‟ Ajuda A participação da mulher na pesca em Itaporanga As pescadoras da Ilha do Beto: Quem são elas? A pesca e seus significados: o que dizem as pescadoras da Ilha do Beto Características da pesca na Ilha do Beto Localização dos Pontos de Pesca A Dinâmica de pesca na Ilha do Beto Colheres, facão, baldes e cestos: rumo à coleta do maçunim Redes na maré: os desafios da pesca noturna Além da pesca, outras ocupações das mulheres: Água e Lenha Entre rios, estuários e mangues: Um Lugar chamado Ilha do Beto A história do lugar: com a palavra as pescadoras Vivenciando a Ilha do Beto: conhecendo a realidade Costurando e arrematando fios: as considerações da pesquisa Referências Apêndices. 21 21 24 29 33 37 37 41 44 46 50 53 55 59 63 65 69 75 76 80 81 86 89 94 96 100 106 112 115 117 120 125 128 135.

(20) Os Barcos Nos barcos estavam aqueles (as) que tinham a missão de manter a casa de trazer o sustento e a comida (Autor desconhecido).

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(22) INTRODUÇÃO. MULHERES NA PESCA ARTESANAL: PRIMEIRAS NOTAS. No Brasil, o reconhecimento das mulheres como trabalhadoras da pesca é considerado um fenômeno relativamente novo. Uma das explicações reporta-se ao período histórico de criação das colônias, no início do século passado, sob a organização da Marinha a qual “[...] não admitia mulheres em seu quadro, não sendo concedido às pescadoras o direito de se cadastrarem” (LEITÃO, at all, 2009, p. 2). A efetivação das mulheres como profissionais neste setor, ocorreu somente duas décadas após a Constituição de 19881. Foi por meio da Lei nº 11.959, que os direitos das pescadoras artesanais equipararam-se aos dos homens (ALBUQUERQUE, 2012). A inserção da mulher neste universo resulta de contextos socioeconômicos distintos, como apontam os estudos de Ramalho (2006) e Woortmann (1992). Entretanto, observa-se que as diferentes literaturas que discutem a atuação da mulher nesta atividade, abordam uma diversidade de aspectos importantes para a análise e compreensão acerca das condições profissionais de vida deste grupo social. Maneschy e Álvares (2011), por exemplo, ao analisarem as comunidades pesqueiras litorâneas das regiões Norte e Nordeste, identificaram que a participação feminina neste setor, ocorre mediante precariedade, baixa renda e exclusão dos direitos previdenciários e sociais, condições igualmente observadas por Lima (2003). A este respeito, Motta–Maués (1999) acrescenta que comumente suas atividade não são reconhecidas como pesca, por passarem mais tempo em terra, assim como o produtos que capturam não são considerados pescados. Outro fator referente à realidade da identidade profissional das pescadoras é apresentado por Martins (2005), ao verificar que as atividades femininas são vinculadas ao homem, nesta perspectiva suas tarefas são vistas como auxiliares dos companheiros, associadas às tarefas domésticas.. 1. Com a promulgação da Constituição Federal do Brasil de 1988, artigo 195, a profissão de pescador artesanal é legitimada, incluindo essa categoria no sistema de seguridade social (ALBUQUERQUE, 2012). 21.

(23) Se por um lado as realidades aqui explicitadas apontam para uma fragilidade da identidade profissional das pescadoras em razão do não reconhecimento e da invisibilidade de suas funções, por outro, observa-se uma notável emergência da presença feminina neste setor. Seja trabalhando diretamente na extração e captura do pescado, ou no beneficiamento e comercialização destes produtos. A inserção da mulher na pesca possibilita não somente a produção de alimento e geração de renda para sua família. Mas, também a manutenção da própria atividade pesqueira mediante manipulação dos recursos, introdução dos filhos e transmissão de conhecimentos, apesar das condições adversas enfrentadas na profissão. É neste contexto de participação e atuação da mulher na atividade pesqueira que se insere a implementação da presente pesquisa, cujo objetivo consiste em analisar o papel das pescadoras da cidade de Itaporanga D´Ajuda/SE, bem como os significados atribuídos ao lugar de vivência e trabalho. Neste sentido, a proposição deste estudo consiste não somente em investigar as necessidades e os desafios advindos da atividade pesqueira para a mulher. Sua realização busca também verificar os significados, as características e a importância que as pescadoras atribuem ao lugar de vivência e trabalho. A abordagem do Lugar neste estudo é orientada pela Corrente Geográfica Humanista, cujo Lugar constitui o conceito mais relevante, e por seus fundamentos considerarem os aspectos da subjetividade e da afetividade humana para apreensão desta categoria. O universo deste estudo é a Ilha do Beto, uma comunidade de pescadores localizada no Povoado Nova Descoberta, em Itaporanga D`Ajuda/SE. A Ilha constitui o espaço para onde as pescadoras se deslocam para a realização da pesca artesanal, principal fonte de renda e trabalho para as famílias que ali se encontram. O lugar aqui evidenciado, além de possibilitar a realização da atividade pesqueira, constitui um local em que se processam relações sociais e um modo de vida particular, caracterizado por ralações de parentesco, amizade e vizinhança, fatores determinantes para o acesso e permanência de alguns moradores neste local. A realização do presente estudo se justifica em razão da carência de estudos científicos acerca das mulheres no exercício da atividade pesqueira no Estado de Sergipe, bem como pela necessidade de analisar seu papel na pesca artesanal. Sua implementação considera-se 22.

(24) pertinente, pois contribuirá para as discussões acerca da relação da mulher com o seu entorno socioambiental.. 23.

(25) CAPÍTULO - 1. 1. UM OLHAR SOBRE O SURGIMENTO DA PESQUISA. A pesca constituiu-se uma atividade que ao longo do tempo foi desempenhada exclusivamente por homens, todavia, esta característica há muito vem sendo modificado graças à participação do gênero feminino neste setor. É cada vez maior o número de mulheres que ocupam as margens de rios, estuários e mangues trabalhando diretamente na captura de crustáceos e moluscos, além de atuarem no beneficiamento dos produtos e na confecção e reparo dos apetrechos de pesca. Todavia, apesar de sua importante atuação neste setor, a literatura consultada para a fundamentação deste estudo, com algumas exceções aponta para a existência de atribuições ocupacionais distintas entre homens e mulheres. Devido a esta divisão sexual do trabalho, em algumas comunidades as tarefas incumbidas à mulher são entendidas como secundárias. O expressivo número de mulheres que atuam na pesca artesanal é uma realidade também encontrada em Sergipe. Nesta perspectiva, surge o interesse em realizar um estudo com a finalidade de revelar o papel desempenhado pelas pescadoras do município de Itaporanga D´Ajuda, situada no litoral sul do Estado, distante 30 km da capital (Figura 1).. Figura 1: Mapa do Município de Itaporanga D´Ajuda Fonte: Secretaria de Planejamento do Estado de Sergipe (SEPLAG). 24.

(26) O município encontra-se inserido entre três Bacias Hidrográficas, a saber: a do Rio Vaza-Barris que corresponde a drenagem principal, e uma das mais importantes bacias do território sergipano; a do Rio Sergipe e a do Rio Piauí (BONFIM et al, 2002). A região caracteriza-se pela presença de ecossistemas2 como Mata Atlântica, restingas, manguezais, campos alagados e a praia da Caueira. Por abrigar este importante conjunto de ecossistemas, Itaporanga juntamente com mais três municípios (Estância, Santa Luzia do Itanhy e Indiaroba) faz parte da Área de Proteção Ambiental do Litoral Sul, criada através do Decreto nº 13.468. A região que abrange os quatro municípios faz parte de um complexo estuarino, cuja delimitação compreende um dos estuários mais ricos em termos de produção pesqueira no Estado. A proposta de criação da APA do Litoral Sul de Sergipe constituiu-se a única alternativa possível para conservação dos ecossistemas e demais atributos ambientais e culturais da região, colaborando neste sentido, para a sobrevivência, desenvolvimento e reconhecimento das populações tradicionais extrativistas de pescadores e catadores de mangaba da região. A motivação em realizar um trabalho desta natureza surgiu durante o acompanhamento das atividades de campo realizadas pelo Prof. Dr, Ronaldo Gomes Alvim, para atender aos propósitos da pesquisa intitulada “Plano de Intervenção socioambiental na região da Área de Proteção Ambiental do Litoral Sul de Sergipe”, cujo objetivo consistiu em desenvolver atividades sócio-educativas como alternativas de geração de emprego e renda para a comunidade. Nesta perspectiva, o trabalho de campo constituiu-se de visitas a quatro municípios sergipanos (Itaporanga D´Ajuda, Estância, Santa Luzia do Itanhi e Indiaroba), com a finalidade de verificar a relevância da pesca artesanal para as populações destas localidades. As visitas periódicas às colônias de pescadores, das referidas localidades, permitiu identificar que a exploração dos recursos pesqueiros, mostra-se significativamente importante para a. 2. Ecossistema é qualquer unidade que inclui todos os organismos (a comunidade biótica) em cada área interagindo com o ambiente físico ocorrendo um fluxo de energia entre as estruturas bióticas claramente definidas e a ciclagem de materiais entre compostos vivos e não vivos. Portanto, um ecossistema é mais que uma unidade geográfica, é uma unidade do sistema funcional com entradas e saídas que podem ser tanto naturais como arbitrárias (ODUM, 2007, p. 18).. 25.

(27) obtenção de sustento e renda de diversas famílias nos quatro municípios. Entretanto, apenas em Itaporanga D´Ajuda foi verificado uma significativa participação da mulher na pesca. Em um levantamento prévio junto à colônia de pescadores Z-93, constatou-se que as mulheres correspondem à maioria no percentual de cadastros. Muitas possuem seu próprio barco e saem para pescar em companhia de outras mulheres ou de seus familiares. Desta maneira, elas sustentam a casa com a comercialização do pescado, além de cuidarem dos afazeres domésticos. O estabelecimento deste contato inicial com os sujeitos da pesquisa foi extremamente relevante, pois o conhecimento das situações, características e particularidades que envolviam o contexto das pescadoras, suscitaram as primeiras inquietações e reflexões acerca daquela realidade, orientando desta forma, os primeiros passos para a pesquisa que seria desenvolvida posteriormente4. Outro fator importante que instigou o interesse para realização deste estudo e que merece ser aqui ressaltado, foi a minha participação no Seminário sobre Pesca Artesanal, ocorrido no ano de 2010, em Recife/PE5. Este evento possibilitou uma aproximação com os pescadores e pescadoras (principalmente), bem como o conhecimento de suas questões, desafios e conquistas no setor pesqueiro. O evento contou com a participação de estudiosos cujas produções são referências para a discussão e análise de distintas realidades que envolvem esta temática, como Antonio Carlos Diegues, Lourdes Furtado, Cristiano Ramalho, entre outros. Os referidos pesquisadores, por meio de suas falas, contribuíram para a compreensão das características e especificidade que envolve a atividade, assim como o aprofundamento das questões relacionadas a este universo. Mais que um evento científico, o seminário constituiu-se um espaço em que o pescador artesanal foi objeto e sujeito das discussões, mediante exposição e relatos de suas lutas, conflitos, desafios e conquistas. Ao retomar as atividades de campo referentes à pesquisa desenvolvida pelo professor Ronaldo Alvim, intensifiquei o contato com a colônia de pescadores para obter as primeiras informações acerca das pescadoras: o que pescavam, como, onde e com quem realizavam a. 3. Nomenclatura utilizada para designar as colônias ou associações dos pescadores e pescadoras. Os primeiros contatos com as pescadoras foram realizados durante o processo de elaboração do projeto de mestrado. 5 III Seminário Pesca Artesanal e Sustentabilidade Socioambiental: áreas protegidas e mudanças climáticas & IV Simpósio Pernambucanos sobre mulher e relação de gênero: a participação da mulher na pesca artesanal. Setembro de 2010, Recife – PE. Organização: Fundação Joaquim Nabuco.. 4. 26.

(28) atividade, o conhecimento sobre a ocorrência das espécies de pescado na região, e da utilização dos artefatos e técnicas utilizadas para a captura. Algumas pescadoras, segundo o observado, assumem a função de chefes da casa em razão da ausência dos maridos, que migram para a capital ou para cidades circunvizinhas em busca de trabalho melhor remunerado. Na maioria das vezes, estes retornam para casa mal sucedidos, ficando para elas a responsabilidade pelo sustento da família. Diante deste contexto, as mulheres encontram na pesca a alternativa para o provimento de sua família. Ademais, quando desenvolvem a pesca com os seus companheiros não consideram seu trabalho como auxiliar ou complementar, pelo contrário, reconhecem-no como sendo tão importante quanto o trabalho realizado por seus maridos. A constatação de uma realidade oposta àquela observada na literatura suscitou o interesse em realizar esta pesquisa, a qual traz como peculiaridade o reconhecimento por parte das pescadoras da importância do seu papel na atividade pesqueira cuja participação não se restringe simplesmente a uma “ajuda”. Pelo contrário, o protagonismo e a autonomia com que administram ou superam as dificuldades da profissão, constituem uma importante característica deste grupo de pescadoras. Além disto, a intensa relação que estabelecem com os ecossistemas naturais instigou um novo enfoque para a pesquisa, que seria o significado atribuído por elas ao lugar de vida e trabalho. Quando optei trabalhar com as pescadoras da Sede do Município, imaginava a princípio que elas realizassem um deslocamento diário para o local apropriado ao desenvolvimento da atividade (mangue, rio, maré, entre outros) e só retornassem ao final da tarde com pescado capturado daquele dia de trabalho. Entretanto, ao iniciar o trabalho de campo, consultou-se a presidente da colônia para fazer o levantamento dos principais bairros a fim de encontrar um número significativo de pescadoras. Deste modo, descobriu-se que a grande maioria das pescadoras, realiza a atividade em outra localidade, onde costumam passar toda a semana, e só retorna no final da semana para comercializar o pescado, contrariando deste modo, a expectativa inicial.. 27.

(29) O lugar para onde as mulheres se deslocam, situa-se no Povoado Nova Descoberta, e é conhecido por seus moradores como “Ilha do Beto” ou “Cubanacã” (Imagem 1). A localidade é freqüentada por pescadores. (homens. e. mulheres) provenientes da Sede do Município (maioria) e de povoados vizinhos (Povoado Duro e Nova Descoberta). Ao visitar a Ilha pela primeira vez, acompanhada da presidente da colônia para. Imagem 01 – Vila de pescadores na Ilha do Beto Fonte: MARTINS/2012.. apresentar a proposta de pesquisa às pescadoras, encontrei um lugar e um grupo de pessoas cujas condições de vida e trabalho assentavam-se sob um contexto de limitações socioeconômicas. Em contrapartida, a Ilha constituiu-se efetivamente o local adequado para realização do meu trabalho, pois se por um lado, aquele era o local da pobreza e precariedade das condições de vida e trabalho daqueles sujeitos, por outro, era o local da subsistência, da beleza cênica dos ecossistemas, do descanso e tranqüilidade para os seus moradores, da amistosidade e solidariedade entre os mesmos. O julgamento inicial que fiz da Ilha é resultante da primeira impressão acerca daquele local, sobre o qual lancei o olhar de visitante carregado de estranheza, apreensão, apatia e repulsa por não vivenciá-lo cotidianamente. A este respeito, Tuan (1980) faz a seguinte consideração São variadas as maneiras como as pessoas percebem e avaliam a superfície da terra. Duas pessoas não vêm a mesma realidade. Nem dois grupos sociais fazem exatamente a mesma avaliação do meio ambiente (TUAN, 1980, p. 6).. Nesta perspectiva, é que emergem pontos de vista e significados diferenciados sobre determinados lugares e/ou realidades, “[...] é a antítese do gosto desenvolvido por certas paisagens ou sentimento afetivos por lugares que se conhece bem” (TUAN, 1980, p.108). Por esta razão, pesquisadora e nativo vêm a Ilha do Beto sob diferentes aspectos. Para a primeira, em razão do olhar habituado a realidade circundante, a Ilha é o local das restrições impostas pelo isolamento, pela precariedade de algumas habitações, pelas limitações estruturais, como saneamento básico, água encanada e energia elétrica. Enquanto para o segundo, a Ilha 28.

(30) constitui o local de trabalho, descanso e tranquilidade, caracterizado pelo desenvolvimento de ricas relações sociais entre os indivíduos. A referida pesquisa objetivou analisar a importância do papel da mulher pescadora na Comunidade Ilha do Beto/Itaporanga D´Ajuda, Sergipe. Seguindo dos objetivos específicos que consistem em: demonstrar as atividades desenvolvidas pelas pescadoras; verificar os significados atribuídos ao lugar; e relatar a história do lugar a partir das narrativas das pescadoras. Os quais serão apresentados ao longo desta dissertação.. 1.1 Construto Metodológico da Pesquisa. Esta é uma pesquisa do tipo qualitativa que se propõe não apenas descrever, mas, sobretudo, analisar e compreender a realidade dos sujeitos pesquisados. A escolha por este tipo de pesquisa se deu em razão da necessidade que o estudo requer de apreender o papel desempenhado pela mulher na atividade pesqueira, bem como identificar as características e significados atribuídos ao lugar, suscitando desta maneira, como afirmam Amorozo e Viertler “[...] uma abordagem integrada que inclua não apenas os aspectos mais diretamente observáveis, mas também, a compreensão do contexto onde ocorrem as interações dos grupos humanos com o ambiente” (2010, p. 65). Para identificar os elementos, características e significados que as pescadoras atribuem ao lugar, foram agregados a esta pesquisa pressupostos da História Oral, propiciando assim maior fidedignidade aos fatos ocorrente e a organização do cotidiano das pescadoras. Com essa metodologia torna-se possível entender o olhar do grupo social em estudo, decodificando-o por meio das suas narrativas o real sentido do lugar, de modo a estabelecer um contato dialógico, ultrapassando desta maneira os simples olhares de pesquisador/objeto (SILVA; MARTINS, 2011). A utilização desta metodologia possibilitou ainda a apreensão e o registro das histórias e experiências das pescadoras em relação ao seu lugar de vivência e trabalho. Optou-se por essa estratégia metodológica como forma de privilegiar os sujeitos, ou seja, as pescadoras, bem como o diálogo e a criação textual desse diálogo, adquirindo por meio das falas e relatos um material de riqueza informativa e interpretativa. Por isso, as falas das pescadoras foram evidenciadas ao longo desta dissertação. 29.

(31) Pode-se incluir também à estrutura metodológica da pesquisa, aspectos da abordagem etnográfica, haja vista a necessidade de imersão no universo investigado, a fim de estabelecer uma aproximação do vivido para descobrir os fatos e discuti-los com os sujeitos pesquisados. Para tanto, foram utilizados alguns instrumentos e procedimentos para a execução da referida pesquisa, que em seu caráter empírico se deu por meio da realização de um exaustivo trabalho de campo, o qual permitiu a obtenção de informações e conhecimentos acerca da realidade estudada. Faz-se necessário mencionar que este momento foi fundamental para aproximação e envolvimento com o grupo pesquisado. A conversa informal quase sempre acompanhada de um suco ou uma fruta oferecida pelas pescadoras, ou a satisfação em me presentear com uma corda de caranguejo ou um quilo de camarão sinalizava-me que havia conquistado a confiança do grupo, o que certamente viabilizou a aplicação dos instrumentos de investigação. Assim, as atividades de campo não se restringiram à realização das entrevistas, minhas visitas à Ilha objetivaram também o estabelecimento e o estreitamento de relações com os sujeitos. Nesta perspectiva, corroboro com Ramalho ao afirmar que “[...] ter objetividade não é o mesmo que deixar de lado qualquer relação subjetiva com o tema, isto é, objetividade e subjetividade se mesclam na construção do assunto” (2006, p. 32). As atividades de campo tiveram início em 03/02/12 com uma visita à Colônia de Pescadores, para verificar junto à Presidente o local apropriado para o desenvolvimento da pesquisa. Foi durante esta visita que tomamos conhecimento da existência da Ilha do Beto, a presidente da colônia também antecipou algumas particularidades inerentes à rotina de trabalho das pescadoras, como o período que passam na Ilha e quando retornam à sede do município para comercializar o pescado.. 30.

(32) No dia 10/02/12 foi realizada a primeira visita à Ilha para apresentar a proposta de pesquisa às pescadoras (Imagem 02). Além disto, buscamos neste encontro, verificar algumas informações sobre a dinâmica da atividade pesqueira das mulheres, como o horário que saem para pescar, as principais espécies capturadas, quantos dias pescam durante a semana, entre outras informações. Em função das mulheres pescarem à noite, foi acordado com o orientador a possibilidade de dormir na localidade para acompanhar toda a rotina de trabalho das pescadoras. De posse das informações, o trabalho de campo fora organizado da seguinte forma: no primeiro momento foram realizadas visitas para conversas informais (Imagens 03) e realização de entrevistas, a fim captar informações da rotina de trabalho das pescadoras; no segundo momento foram realizadas incursões para acompanhar o trabalho da pescadora no ambiente de pesca (rio, mangue, estuário, dentre outros), inclusive durante a noite, sendo necessário para tanto, pernoitar na Ilha para acompanhar a atividade das pescadoras neste turno. As visitas para observação e realização das entrevistas concentraram-se nos meses de março a maio, sendo que neste mês ocorreu minha primeira visita para dormir na Ilha. No mês de setembro, foi realizada mais uma visita à localidade, com o objetivo de marcar os principais pontos de pesca para onde as mulheres se deslocam para desenvolverem a captura do pescado.. 31.

(33) O trabalho de campo ocorreu mediante utilização dos seguintes instrumentos e técnicas: Observação Direta: Consiste da observação e registro livre dos fenômenos observados em campo (ALBUQUERQUE et al, 2010). Esta técnica foi utilizada com a finalidade de estabelecer os primeiros contatos com a comunidade a fim de captar as peculiaridades do cotidiano mediante conversas informais. Foram registrados os seguintes aspectos a partir desta técnica: descrição do local, destacando-se os fatores e característica mais importantes do ambiente da pesquisa; as interações entre os sujeitos, ou entre estes e o pesquisador; descrição das situações que chamaram atenção; descrição das atividades realizada pelas pescadoras. Entrevista semiestruturada: é considerada um dos principais meios para a coleta de dados, permitindo a liberdade e a espontaneidade do informante, enriquecendo desta forma a investigação. No presente estudo este instrumento foi utilizado para verificar as atribuições da mulher na atividade pesqueira, bem como identificar as características, significados e importância que as pescadoras atribuem ao seu lugar de vivência e trabalho. As perguntas foram parcialmente formuladas antes de ir a campo, sem, contudo restringir a possibilidade de novas indagações, que possibilitaram o aprofundamento dos questionamentos norteadores da pesquisa. A amostragem dos sujeitos que participaram da pesquisa foi intencional. As informantes foram selecionadas por possuírem características que são do interesse da pesquisa, levando-se em consideração fatores como idade, tempo que exerce a profissão, procedência, tempo que reside no local entre outros aspectos. O contato com as pescadoras entrevistadas ocorreu mediante utilização da técnica “Bola de Neve” na qual o próprio informante indica uma pessoa para participar da pesquisa e assim sucessivamente. Na Ilha residem 15 (quinze) pescadoras, foram realizadas 13 (treze) entrevistas, pois à medida que avançava o número de entrevistadas, as repostas se repetiam. Turnê Guiada: trata-se de uma técnica utilizada para trabalhar em campo que normalmente, necessita de informante chave, ou seja, aquele indivíduo que tem um conhecimento aprofundado da localidade estudada, (ALBUQUERQUE et all, 2010). Optou-se trabalhar com esta metodologia, para verificar in locus as informações já fornecidas durante a realização das entrevistas, bem como fornecer novas informações, permitindo o acompanhamento da rotina de trabalho das pescadoras. Neste momento, elas demonstraram e descreveram as características dos principais ambientes que utilizam para exercerem suas 32.

(34) atividades, as espécies que costumam pescar ou capturar, as técnicas utilizadas, entre outros fatores relevantes. Esta técnica mostra-se significativamente importante, pois, possibilitou observar e entrevistar as pessoas nas situações em que o conhecimento delas é posto em prática, possibilitando, desta forma, a aquisição de resultados mais ricos do que a entrevista fora do contexto de aplicação do conhecimento (CARDONA apud AMOROZO; VIERTLER, 2010). Registro fotográfico: A fotografia é mais uma técnica para obtenção de dados (SOUTO, 2010). Neste sentido, sua utilização se deu para registrar as peculiaridades do cotidiano das pescadoras, orientando-se pelas informações obtidas durante as entrevistas. Diário de campo: instrumento onde foram anotadas as informações resultantes das observações e das conversas informais, bem como dos objetos, lugares, acontecimentos e atividades, na possibilidade de registrar as impressões do pesquisador em relação aos fatos observados na comunidade onde foi desenvolvido o estudo. Georreferenciamento: técnica utilizada para demarcação por meio do uso de GPS, com a finalidade de elaborar um mapa com os principais pontos de pesca utilizados para a captura do pescado.. 1.2 Análise dos dados coletados na Pesquisa. Os dados coletados mediante entrevistas foram transcritos, categorizados analisados e interpretados. Estas etapas envolveram processos distintos: na transcrição: foram apresentadas as opiniões das informantes de maneira fiel como se os dados falassem por si só; na categorização: foram reunidas as informações de acordo com a semelhança e divergência dos relatos das pescadoras; para a análise, foi necessário ir além do que foi transcrito, fazendo uma decomposição dos dados e suas relações, orientando-se mediante a fundamentação teórica da dissertação; por fim, na interpretação buscou-se os sentidos das falas e das ações, para se chegar a uma compreensão ou explicação dos dados (GOMES apud MINAYO, 2002).. 33.

(35) Os elementos de reflexão teórica que ancoraram este estudo oportunizaram analisar a importância do papel da mulher pescadora na Ilha do Beto em Itaporanga D´Ajuda/SE. Do qual convido a todos para esse emaranhado de informações capturados pelo nosso olhar. Este estudo está estruturado em quatro capítulos. O primeiro intitulado “Mulheres na pesca artesanal: primeiras notas” visa apresentar uma contextualização do tema e sua justificativa, destacando neste item a importância do estudo para o Estado de Sergipe. Tem-se ainda neste momento a trajetória do surgimento do estudo, bem como a metodologia com os procedimentos realizados e as técnicas empregadas para alcançar os objetivos propostos na realização da pesquisa in locus. O segundo capítulo “Pescando conhecimentos: tecendo as bases teóricas” traz o referencial teórico o qual será abordado no primeiro momento um breve histórico da pesca artesanal, sua definição bem como as especificidades e a relevância desta prática, a caracterização dos sujeitos envolvidos nesta atividade os chamados pescadores artesanais, uma explanação sobre comunidades tradicionais e os conhecimentos inerentes a estes grupos, e por fim a caracterização das comunidades pesqueiras; o segundo momento reporta-se inicialmente a uma sucinta discussão sobre gênero, retratando o período histórico em que esta discussão ganha ressonância no Brasil. Em seguida, demonstra-se o processo de inserção da mulher na atividade pesqueira, apresentando as causas, as dificuldades e os desafios enfrentados; por último são feitas algumas considerações acerca da relação que a mulher estabelece com o entorno socioambiental a partir da pesca, e neste ínterim são apresentadas as ideias da corrente Geográfica Humanista, a qual apresenta importantes subsídios para o desenvolvimento e análise da discussão acerca da relação que o indivíduo pode estabelecer com o lugar. Faz-se necessário mencionar que neste capítulo teórico vão estar presentes incursões do universo empírico a partir dos depoimentos e observações realizadas, mostrando a conexão do debate teórico com o universo empírico. O terceiro capítulo “A pesca artesanal na Ilha do Beto: capturando a essência do trabalho feminino” será desenvolvido as atividades da pesquisa de campo fazendo uso dos instrumentos metodológicos com base nos depoimentos das pescadoras bem como no registro fotográfico a partir das observações e vivencias com as pescadoras de modo a apresentar aos leitores o quão singular é essa atividade para a vida em comunidade, especialmente, as pescadoras da Ilha do Beto.. 34.

(36) O quarto capítulo “Costurando e arrematando fios: as considerações da pesquisa” apresentamos as considerações finais relativas as nossas inquietações acerca do papel da mulher pescadora trazendo elementos essenciais da sua atuação nesta atividade, destacando ainda a forma como a pescadora se relaciona com o lugar de vivência e trabalho e quais são os significados e sentidos que fundamentam esta relação. Por fim, elencamos os referencias que nortearam o estudo para a produção do conhecimento que resultou na elaboração de uma valiosa dissertação que sobremaneira contribuirá para as reflexões sobre o papel da mulher no exército da profissão de pescadora.. 35.

(37) 36.

(38) CAPÍTULO 2. 2. PESCANDO CONHECIMENTOS: TECENDO AS BASES TEÓRICAS. O significativo número de mulheres envolvidas na atividade pesqueira no município de Itaporanga D‟Ajuda é fundamentalmente o fato que impulsiona e justifica a realização desta pesquisa. Por esta razão, nesta seção é dedicada especial atenção a pesca artesanal, atividade que constitui fonte de alimento e renda para as mulheres e para as famílias que elas sustentam ou ajudam a sustentar. Como a pesca artesanal está intrinsecamente relacionada aos aspectos sociais e ecológicos do meio onde estão inseridas, a categoria de análise “lugar” foi eleita no sentido de melhor compreender a forma como as mulheres se relacionam entre si e se apropriam do espaço.. 2.1 Origem e peculiaridades da atividade pesqueira. A pesca é uma das atividades produtivas mais antigas da humanidade. Em períodos anteriores ao aparecimento da agricultura, ela representou uma importante fonte de alimento para as sociedades primitivas. No Brasil, o desenvolvimento desse ofício antecede a chegada dos navegadores portugueses. Os indígenas já capturavam peixes, moluscos e crustáceos, que constituíam parte importante de sua dieta alimentar. Este trabalho continuou a se desenvolver no Brasil Colônia e deu origem a inúmeras culturas litorâneas ligadas à pesca, entre as quais se destacam a dos jangadeiros, em todo litoral nordestino, a dos caiçaras, no litoral entre Rio de Janeiro e São Paulo, e a dos açorianos no litoral de Santa Catarina e Rio Grande do Sul (DIEGUES, 1999). Tais grupos societários tiveram origem com a miscigenação entre índios, europeus e negros, originando, assim, uma cultura6 particular que os diferenciam de outras comunidades. 6. A cultura corresponde ao conjunto dos comportamentos, saberes e saber-fazer característico de um grupo humano ou de uma sociedade dada, sendo essas atividades adquiridas através de um processo de aprendizagem e 37.

(39) do interior e centros urbanos do país. Da cultura indígena, as populações litorâneas herdaram o preparo do peixe para a alimentação, o feitio das canoas e jangadas, as flechas e os arpões; da cultura portuguesa, herdaram os anzóis, pesos de metal, redes de arremessar e de arrastar; e da cultura negra, herdaram a variedade de cestos e outros utensílios utilizados para a captura dos peixes (DIEGUES, 1983). Em Sergipe, as comunidades pré-históricas, denominadas de Cultura Canindé ou Xingó, Tradição Aratu e Tradição Tupi-Guarani salvo as peculiaridades inerentes ao seu modo de vida, compartilharam traços comuns, como, por exemplo, a forma de apropriação do espaço e a realização da pesca como principal atividade. O primeiro grupo pertencente à Cultura Canindé ou Xingó, ocupou áreas hoje identificadas como terraços e ilhas, atraídos pela presença abundante de água. Desenvolveram caça, coleta e a pesca/catação de mariscos. Já o segundo grupo (Tradição Aratu) encontrava-se por toda a faixa litorânea, suas aldeias localizavam-se próximo a riachos afluentes e em área de floresta (mata atlântica), tendo como principal trabalho a caça e a coleta. O terceiro agrupamento (Tradição Tupi-Guarani) também localizado em áreas litorâneas próximo às bacias dos rios São Francisco, Japaratuba, Sergipe, Vaza-Barris, Piauí e Real. Realizavam a pesca, a caça e a agricultura como principais atividades. Acerca disso, cabe destacar que diferentemente dos anteriores, eram hábeis em construir canoas para facilitar a locomoção (SANTOS, 2012). Seja enquanto fruto da herança sociocultural desses povos indígenas, seja decorrentes de suas identidades, outros grupos tiveram sua fonte de subsistência assentada na pesca, como outras tribos indígenas, quilombolas e aqueles que eram exclusivamente pescadores, cujo fazer cultural foi construído a partir de uma intrínseca relação com os recursos hidrográficos sergipano. Por esta razão, fazem-se necessárias discorrer algumas considerações acerca destas populações (SANTOS, 2012). Os Xocós constituem a única etnia indígena remanescente do Estado7, localizada na Ilha de São Pedro, município de Porto da Folha às margens do Rio São Francisco. A pesca era praticada no Rio São Francisco e lagoas existentes na região, constituindo, além de fonte de alimento, uma importante fonte de renda, pois o excedente do pescado era comercializado. Atualmente, em razão da construção de hidrelétricas e de obras destinadas a contenção de transmitida ao conjunto de seus membros (Kroeber apud Laplantine, 2007, p. 120). Esta constitui uma das cinqüenta definições do termo cultura elaboradas por Kroeber um dos mestres da antropologia americana. 7 Existiram em Sergipe mais de dez tribos indígenas, destas, muitas foram expulsas do território sergipano, outras dizimadas pelos portugueses nas constantes disputas por terras (FUNAI, 2012). 38.

(40) enchentes, houve o desaparecimento de importantes espécies de peixe, fato que contribuiu para uma diminuição significativa das pescarias. A pesca só não desapareceu por completo graças à existência de uma complexa rede de lagoas e tanques que oferece a esta comunidade indígena a possibilidade de exploração da piscicultura em cativeiro (FUNAI, 2012). Já as comunidades quilombolas ocuparam (e ainda ocupam) áreas rurais do Estado banhadas por rios e marés, obtendo da pesca artesanal e da agricultora suas principais formas de sobrevivência, associadas em alguns casos, ao artesanato (SEMARH, 2010). Mas são os pescadores que constituem o principal grupo que depende e que produziu formas ricas de apropriação dos recursos pesqueiros. Essas populações se formaram ainda no período colonial, desenvolvendo relações sociais e de subsistência, com modos de vida particular, que garantiam o manejo sustentável dos recursos naturais, resultado do conhecimento de várias gerações. A identidade com o lugar expressa e é a expressão dos laços culturais. Os pescadores constituem um grupo que, também, na sua luta pela subsistência, conjuga essa atividade com outras, como a agricultura e a produção de artesanato, em algumas localidades. No estado de Sergipe, estas comunidades tradicionais de pesca são representadas pelas 24 colônias de pescadores existentes tanto no litoral como no interior do Estado (SEMARH, 2010). Diante do exposto, depreende-se que a exploração dos recursos pesqueiros, assumiu importância não somente econômica, mas também cultural e simbólica. Sociedades inteiras em determinados períodos históricos dependeram quase que exclusivamente desta atividade para a reprodução social de seus membros (Diegues, 2004). Esta dependência se deu não apenas no passado, atualmente inúmeras populações das mais diversas regiões do mundo encontram na pesca sua fonte de subsistência e renda. No Brasil a atividade pesqueira assume formas diferenciadas, haja vista a combinações dos fatores produtivos, das relações sociais que se estabelecem e as particularidades naturais de cada ambiente pesqueiro. A esse respeito Diegues (1983), discute três categorias essenciais, a saber: a pesca de autossubsistência ou primitiva, pesca de pequena produção mercantil e a pesca capitalista. A pesca de autossubsistência é desenvolvida por pequenos agrupamentos humanos, onde a atividade é somente uma dentre outras de subsistência. Ela é realizada em sociedades nas quais a produção de valores de uso é central, com reduzida mediação da moeda nas trocas 39.

(41) existentes. Já a pesca de pequena produção mercantil, o produto final, ou seja, o pescado é uma mercadoria. Dentro desta forma de organização, encontram-se duas sub-formas: a produção dos pescadores-lavradores8 e a produção dos pescadores artesanais9. Por fim, a produção capitalista, caracteriza-se pela realização da pesca por empresas organizadas em diversos setores (captura, industrialização e comercialização) visando somente à produção de mercadorias em que há separação entre trabalho e capita (DIEGUES, 1983) A pesca constitui uma atividade complexa. Além dos fatores socioculturais e econômicos anteriormente mencionados, sua realização pode diversificar-se ainda em razão das variedades de habitats, ecossistemas e espécies de pescado, inibindo uma forma homogenia de expressar-se em todos os lugares e regiões. Tais aspectos contribuem para utilização de uma multiplicidade de apetrechos de pesca, no sentido de melhor adaptar a atividade aos tipos de habitats, de correntes e marés, tipos de fundo, comportamento dos peixes, crustáceos e moluscos, além das peculiaridades inerentes ao modo de vida dos pescadores (VASCONCELLOS, et al, 2007). A exploração dos recursos pesqueiros é realizada nos mais diversos ecossistemas aquáticos. A pesca marítima ou oceânica se caracteriza pela separação da terra com o mar. Neste ambiente, a pesca é caracterizada pela mobilidade das espécies, sobretudo, o peixe, razão que obriga os pescadores estarem sempre migrando de um ambiente para outro (DIEGUES, 1995). A pesca realizada em rios, estuários, mangues, praias, baías e lagos é denominada estuarina, continental ou de águas interiores. Os recursos pesqueiros provenientes deste tipo de pesca destacam-se em qualidade e em volume, devido à diversidade dos tipos de corpos d´água existentes (RAMOS, 1999). Sobre esta modalidade, Ramalho (2006) acrescenta ainda a forte dependência do meio natural, sua realização é orientada pelas fases lunares, pelo ritmo das marés e a existência de cardumes. Isto significa dizer que o horário e a duração do 8. A produção dos pescadores-lavradores é uma atividade ocasional, a propriedade típica de produção é a doméstica (familiar e/ou grupo de vizinhança), o pescado é tanto para o consumo quanto para a venda constituindo-se umas das principais fontes de dinheiro disponível para a compra de algumas mercadorias essenciais. Assim, a pesca corresponde a uma atividade complementar destinada a produzir valor de troca (DIEGUES, 1983, p. 161). 9 Aqui a pesca deixa de ser uma atividade complementar para tornar-se a principal fonte de produção de bens destinados à venda. A atividade pesqueira passa a ser a principal fonte de renda, propiciando, em determinadas situações, uma maior produção de excedentes. Esse novo tipo de pesca caracteriza por explorar ambiente marinhos e costeiros, exige conhecimentos mais específicos que os utilizados pelo pescador-lavrador. É somente neste estágio que surge o pescador artesanal como tal, que passa a viver exclusivamente ou quase exclusivamente da sua profissão (DIEGUES, 1983, p. 155). 40.

(42) trabalho dos pescadores é determinado pelo ciclo das águas e das condições naturais de cada habitat. Por esta razão, as pessoas que se ocupam do trabalho pesqueiro possuem um modo de vida diferenciado dos demais grupos, como os agricultores, pois, de acordo com Ramalho (2006) existem aspectos que fazem da pesca uma atividade singular, dentre eles, o desenvolvimento de estratégias que permitem aos pescadores lidarem com a inconstância do mar. A este respeito Skinner e Turekian teorizam que “[...] quando lançada ao mar, nunca se sabe o que, nem o quanto ou a qualidade do produto que uma embarcação trará à terra, nem tampouco em que espaço de tempo” (apud RODRIGUES; GIUDICE, 2011, p. 120).. 2.2 Aspectos Gerais da atividade pesqueira em Sergipe. O Brasil produz mais de um milhão de toneladas de pescado por ano, segundo o Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), o setor gera cerca de 3,5 milhões de empregos diretos e indiretos e ocupa, hoje, 800 mil profissionais entre pescadores e aquicultores (FAO, 2012). Trata-se de um setor intensivo em força de trabalho, ocupando a grande maioria dos trabalhadores do mar. A pesca realizada em pequena escala artesanal e de subsistência responde por mais de 50% do total mundial de capturas e emprega cerca de 98% dos 51 milhões de pessoas diretamente envolvidas com a coleta e processamento dos recursos marinhos (BERKES et al apud REBOUÇAS, et all 2006). No Brasil são produzidos por ano 1 milhão e 240 mil toneladas de pescado, deste total, a pesca artesanal responde por cerca de 45% (MPA, 2011). Em Sergipe as modalidades de pesca marítima e continental/estuarina caracterizam-se da seguinte forma: na primeira, realizada em alto mar, o principal produto capturado é o camarão (CEPENE, 2007). A pesca do peixe ocorre, em menor quantidade, em razão das limitações estruturais das embarcações. A segunda modalidade é realizada em diferentes ambientes como rios, estuários, lagos, açudes e mangues. Esta variedade de ambientes contribui para uma diversificação do pescado em relação à primeira. As pescarias geralmente são diárias e dependem das marés. Utilizam como principal equipamento de captura a rede de emalhar (em diversas formas e comprimentos), arrastão de praia, tarrafa, linhas (linha de mão e pequenos espinhes, denominados grozeira) e redinha (pequeno arrasto manual) (CEPENE, 2007). Segundo estudo de Ramos (1999) a pesca continental/estuarina de pesca apresenta uma 41.

(43) função social altamente relevante, pois constitui a fonte de existência de inúmeras famílias no Estado envolvidas direta ou indiretamente nesta modalidade. De acordo com o Ministério da Pesca (2012), além das referidas modalidades a produção de pescado no Estado também é proveniente da Aquicultura10, muito presente e desenvolvida na região Sul e Metropolitana, com o cultivo de camarão (principalmente) e peixe. Sergipe possui um total de 26. 104 pescadores ativos (homens e mulheres), dos quais 25.000 são regularmente filiados às colônias. Existem 23 colônias em funcionamento das quais 06 são presididas por mulheres, a saber: Amparo do São Francisco, Barra dos Coqueiros, Itaporanda D´Ajuda, Santa Luzia, Propriá e Aracaju (MPA, 2012). O Estado sergipano possui a menor dimensão territorial do país, entretanto esta característica não compromete a riqueza da biodiversidade local, a qual se apresenta de forma heterogênea e com características distintas de acordo com cada região: litoral, agreste e semiárido. A linha litorânea possui aproximadamente 163 km, apresentando em sua extensão os estuários11 dos rios São Francisco, Japaratuba, Sergipe, Vaza-Barris e Piauí/Real (ESTUDOS BIOLÓGICO E SOCIOECONÔMICO RESEX DO LITORAL SUL DE SERGIPE, 2007 ),. além de outros. ecossistemas como manguezais12, praias e restingas13. Tais ambientes apresentam uma rica biodiversidade com a presença de crustáceos (caranguejo (Carcinus maenas), siri (Callinectes sapidus), aratu (Goniopsis cruentata ), guaiamum (Cardisoma guanhumi) e camarão),. moluscos (sururu (Mytella falcata), ostra (Crassostrea rhizophorae), maçunim14 (Anomalocardia brasiliana) e variedades de peixes). Espécies essas que apresentam importante valor para o 10. Cultivo de organismos cujo ciclo de vida em condições naturais se dá total oi parcialmente em meio aquático. Assim como o homem aprendeu a criar aves, suínos, bovinos, bem como a planta milho e trigo, também aprendeu a cultivar pescado. Desta forma, assegurou produtos para o consumo com mais controle e regularidade. Definição extraído do site do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), www..mpa.gov.br 11 Os estuários são ambientes de transição entre o oceano e o continente, ocorrendo nas desembocaduras dos rios, resultando na diluição da água salgada. Em condições naturais, são biologicamente mais produtivos por apresentarem altas concentrações de nutrientes, favorecendo a produção primária, podendo ter ou não manguezais em seus domínios (MIRANDA et al., 2002). 12 Ecossistema influenciado pelo regime da maré e descarga fluvial que apresenta formação arbustiva-arbórea de espécies adaptadas a alta salinidade e com fauna típica associada. (ESTUDOS BIOLÓGICO E SOCIOECONÔMICO RESEX DO LITORAL SUL DE SERGIPE, 2007) 13 Tipo de vegetação localizada nas áreas de terra firme que sofrem maior influência dos depósitos arenosos marinhos. Possui vegetação predominantemente rasteira, arbustiva e arbórea de pequeno porte (ESTUDOS BIOLÓGICO E SOCIOECONÔMICO RESEX DO LITORAL SUL DE SERGIPE, 2007) 14 É popularmente conhecido também como “berbigão”, “vôngole” e “chumbinho”. 42.

(44) consumo e comercialização contribuindo significativamente para o desenvolvimento da pesca na região. O litoral sul do Estado é compreendido por cinco municípios: São Cristóvão, Itaporanga D´Ajuda, Estância, Santa Luzia do Itanhy e Indiaroba. Essa região é conhecida historicamente como a principal fornecedora de peixe e do caranguejo uça para o estado (ADEMA, 1984). Atualmente, a região vem sofrendo forte pressão sobre os recursos pesqueiros, devido à sua sobrexploração, resultante principalmente da falta de oportunidade de emprego para a comunidade local, que obtém da pesca ou coleta de mariscos a única fonte de renda possível (ESTUDOS BIOLÓGICO E SOCIOECONÔMICO RESEX DO LITORAL SUL DE SERGIPE, 2007).. Em razão da disposição do quadro natural e das limitações socioeconômicas, as populações do litoral sergipano encontram no extrativismo uma das principais estratégias de sobrevivência. Esses grupos populacionais compreendem os pescadores artesanais, marisqueiras, apanhadores de caranguejo, catadoras de mangaba e outras frutas nativas, artesãos, entre outros que encontram no extrativismo a forma de assegurar o sustento de sua família ainda que tais atividades proporcionem um baixo rendimento (MOTA; PEREIRA, 2009). Ao analisar as estratégias de sobrevivência realizadas pelas populações rurais do Estuário do Rio Vaza-Barris, Takahashi; Pereira (1992) apud Mota; Pereira (2009), afirmam ser a pesca a atividade que ocupa o maior número de pessoas, envolvendo homens, mulheres e crianças. Segundo informações do MPA, é importante ressaltar que Sergipe é único estado que apresenta o número de pescadoras cadastradas (54,99%) maior que o número de pescadores (45,01%) (CENSO 2009/2010). Estima-se que nos últimos dois anos tenham adentrado mais mulheres que homens para este ramo de atividade (MINISTÉRIO DA PESCA, 2012). O desemprego, a ausência dos maridos e a necessidade de aumento da renda familiar, constituem os principais fatores que impulsionam as mulheres a adentrarem no universo da pesca15. Assim, muitas assumem o papel de chefes da casa, encontrando na pesca a única alternativa para o provimento da família. Outro aspecto importante que concorre para esta realidade, diz respeito ao quadro físico natural do Estado, que conta com extensas áreas de 15. Realidade observada no Município de Itaporanga D´Ajuda/SE, a partir de levantamento junto às pescadoras da colônia Z-9, em junho de 2010. 43.

(45) manguezais, além de numerosos rios e estuários favoráveis à atividade pesqueira realizada por mulheres, pois são nestes ambientes que se encontram as espécies de pescado comumente capturadas por elas, como caranguejo, aratu, siri, peixe, camarão, sururu e maçunim.. 2.3 Territórios da pesca: espaços de sobrevivência, conhecimentos e sociabilidade. De maneira geral, as regiões estuarinas caracterizam-se por serem áreas altamente produtivas, utilizadas pelas comunidades pesqueiras que habitam seu entorno, sobrevivendo da pesca de variadas espécies. Mais que fonte de obtenção de sustento e renda para tantas famílias, os ambientes aquáticos configuram-se em lugares que “[...] abriga e incentiva a existência de comunidades pesqueiras coesas, distintas e independentes” (CORDELL, 2001, p. 139). A apropriação destes espaços possibilita também o desenvolvimento de uma forma de organização assim como a criação de um modo de vida específico inerente a estas populações. A combinação de fatores naturais como a oscilação das marés e a ocorrência de determinadas espécies acabam por influenciar no desenvolvimento de estratégias que permitem aos pescadores identificarem os locais mais favoráveis à obtenção do pescado, o conjunto destes fatores são determinantes para a apropriação destes ambientes. É o que os autores Cordell (2001) e Silva (2006) denominam em seus estudos de territorialidade da pesca pelo homem. O território aqui evidenciado corresponde aos lugares habitados por espécies passíveis de pesca, que por sua vez impõem uma organização quanto àquelas a serem pescadas, bem como os apetrechos utilizados e áreas de coleta. Neste sentido, a apropriação dos territórios pelo homem dar-se-á quando “[...] se conhece o ambiente natural para usar ferramentas por ele elaboradas, mas determinadas por este ambiente” (SILVA, 2006, p. 32). Além disto, a escolha pelos lugares mais favoráveis à obtenção do pescado deve levar em consideração outros fatores, como facilidade de acesso, histórico de capturas anteriores e abundância da espécie naquele local. Levando-se em consideração essas circunstância é que alguns grupos de pescadores apropriam-se dos espaços marítimo e estuarinos, exercendo um controle sobre os recursos, apesar desses espaços serem de livre acesso no Brasil. 44.

Referências

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