• Nenhum resultado encontrado

Entre a nação e a barbarie : uma leitura das contribuições de Caio Prado Jr., Florestan Fernandes e Celso Furtado a critica do capitalismo dependente

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Entre a nação e a barbarie : uma leitura das contribuições de Caio Prado Jr., Florestan Fernandes e Celso Furtado a critica do capitalismo dependente"

Copied!
299
0
0

Texto

(1)

ENTRE A NAÇAO E A BARBÁRIE

Ulla leitura das contribuições de Caio Prado

Jr. r Florestan Fernandes e Celso Furtado à =ítica do capitalismo dependente

'

d

<.-\

a-~-,ç:;t-L ),~.~ I Campinas, 1997 lUtlCAilll'" 'IIIIJI.,.!Ofi!CA CENTI'!Ai.

(2)

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELO

CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO DO INSTITUTO DE ECONOMIA

Sampaio Jr., Plínio Soams de Arruda

Sa47e Entre a nação e a barbárie: uma leitura das contribuições de Caio Prado Jr., Florestan Fernandes e Celso Furtado à crítJca do

capitalismo dependente/ Plinio Soares de Arruda Sampaio. -Campinas, SP: [s.n.], 1H97.

Orientador : João Manuel Cardoso de Mello

Tese (doutorado)- Universidade Estadual de Campinas. Insti-tuto de Economia.

1. Capitalismo ~BrasiL"· 2. Economia ~ Brasil.-·: 3. Brasil - Condi-ções econõmicas?í.4. Prado Jr., Caio, 1907..:·. 5. Fernandes, Florestan, 1920 ~. 6. Furtado, Celso, 192Q-. L Mello, João Ma-nuel Cardoso de. IL Universidade Estadual de Campinas. Institu-to de Economia. IIL TítLIIO.

(3)

Os estudos que resultaram na presente dissertação foram financiados por bolsas de estudos da Capes (1991-1992) e do CNPq (1992-1994). Também recebi importante apoio institucional do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE-Unicamp) e do Instituto de Economia do Setor Público da Fundação do Desenvolvimento Administrativo de São Paulo (Fundap-Iesp). Aproveito a oportunidade para agradecer o respeito e a gentileza

com que sempre fui tratado pela direção e pelos funcionários dessas organizações públicas.

Embora as idéias aqui defendidas sejam de minha exclusiva responsabilidade, elas foram enriquecidas pelas críticas de meus colegas, dentre os quais destaco José Carlos Braga, José Luiz Fiori, Luciano Coutinho, Octávio Rodriguez, Sônia Draibe e Wilnês Henriquez. Daniela Prates e Marco Antonio Cintra contribuíram para aprimorar importantes elos da argumentação. Agradeço particularmente as discussões e a ajuda que recebi de Fernando Sampaio, José Geraldo Portugal, Liana Aureliano, Márcio Percival, Rui Affonso e Vicente Rodríguez. O competente trabalho de revisão de Caia Fittipaldi, de Fernando Sampaio e de minha mulher, Maria Hirszman, foram decisivos para melhorar a qualidade da redação final. A normatização das referências bibliográficas contou com o profissionalismo de Norma Batista Norcia e de sua generosa

(4)

equipe, Ana Cristina Leão e Ruth Aparecida de Oliveira. A revisão final contou com o providencial apoio de Elenira Fonseca, Karla Krepsky e Renata Corrêa.

Gostaria de manifestar um reconhecimento especial a M. Bruno Therét, do Centre National de Recherche Social (CNRS), que me abriu as portas de Paris. Sempre atento às minhas necessidades e preocupações, sua generosidade e sua inteligência foram fatores determinantes não só para que minha estadia no exterior transcorresse dentro da mais completa tranqüilidade, mas também para que eu tivesse acesso ao instigante debate da comunidade uni ver si tária francesa. Minha maior gratidão vai para meu orientador, Prof. João Manuel Cardoso de Mello, em quem admiro a coragem de não se deixar intimidar pelas grandes questões e a grandeza de espírito de interpretar a crítica como meio de impulsionar o conhecimento.

Agradeço, nas figuras de Maria Edy Chonchol, Liana Aureliano e Violeta Gervaiseau, os favores e o carinho que recebi dos amigos. Devo uma gradidão especial a meus pais que me apoiaram com integral cumplicidade em todos as etapas desta empreitada. Por fim, queria dizer que a energia e as esperanças aqui contidas estão dedicadas à Maria, uma mulher extraordinária e uma companheira querida, que soube valorizar meu esforço, compreender minhas ausências e dar tempo ao tempo para que o pensamento pudesse fazer seu caminho.

(5)
(6)

INTRODUÇÃO . . . • . . . • . . • . . . • 2

CAPÍTULO 1 - Transnacionalização do capita1ismo e di1emas do desenvolv~nto nacional . . . 10

l. A crise cio desenvolvimento nacional . . . 10 2. A

crise

da teoria do desenvolvimento . . . 32 CAPÍTULO 2 - Introdução à problemática do desenvolvimento

capitalista nacional. . . . 65

Introdução . . . 65 l. A problemática do desenvolvimento capitalista nacional. 67 2. Desenvolvimento capitalista autodeterminado . . . 84 3. Os àilemas do desenvolvimento dependente . . . 99 CAPÍTULO 3 - Caio Prado Jr. e o substrato social do

capitalismo dependente . . . 109

Introdução . . . 109 1. Mercado e desenvolvimento capitalista nacional 116 2. Industrialização como ciclo de substituição de

importaçêes . . . 128 3. "Imperialismo total" e industrialização periférica .... 133 4. Observações finais . . . 145 CAPÍTULO 4 - Florestan Fernandes - Capitalismo dependente e luta de classes . . . 147 Introdução . . . 14 7 1. Economia e concorrênc~a no capitalismo dependente . . . 153 2. Luta de classes e racionalidade do capitalismo

(7)

b) Racionalidade do capitalismo dependente . . . 173

3. Capitalismo dependente e revolução burguesa atrasada .. 180

4. ?:evolução burguesa atrasada e "imperialismo total" . . . . 187

5. Observações finais . . . 193

CAPÍTULO 5 - Celso Furtado - Progresso técnico e desenvolvimento nacional . . . 196

Introdução . . . 196

l. Estrutura centro-periferia e incorporação de progresso técnico . . . 201

2. Modernização e subdesenvolvimento . . . 209

3. to1odernizaçào

e

industrialização . . . 220

4. Capitalismo t~ansnacional e a "nova dependêncian . . . 228

5. Observações finais . . . 232

CAPÍTULO 6 - Entre a Nação e a barbárie . . . 234

Introdução . . . 234

1. :::mperíalismo x Nação: as tarefas da revolução nacional 241 2. Dependência x Nação -Os desafios da revolução democrática . . . 249

3. Modernização x Nação - As bases técnicas de um sistema econômico nacional . . . 257

4. Observações finais: . . . 271

(8)

INTRODUÇÃo

O objetivo desta dissertação é mostrar que as obras de Caio Prado ,Jr., Florestan Fernandes e Celso Furtado nos fornecem importantes elementos para o resgate do enfoque crítico sobre a problemática do desenvolvimento nacional.

Expoentes

de uma geração de intelectuais engajados na construção da nação, suas reflexões enfatizam a necessidade de superar as relações externas e internas que perpetuam o subdesenvolvimento. A recuperação dessa perspectiva anal i ti c a nos permite vislumbrar novas soluções para problemas do desenvolvimento nacional que pareciam já equacionados, mas que foram recolocados pela transnacionalização do capitalismo.1

o leitor não encontrará aqui uma exegese dos autores nem uma hermenêutica dos conceitos. Nosso objetivo foi outro. Procuramos aproveitar o ângulo privilegiado de observação, propiciado pelos desdobramentos históricos e pelos desenvolvimentos teóricos, para, respeitando o espírito das abordagens dos autores, encontrar novas respostas para os problemas contemporâneos das populações que sofrem as agruras do capitalismo dependente. Organizamos a problemática em torno das seguintes questões: quais as estruturas e as dinâmicas

Quando ressaltamos o fato àe que os três autores pertencem à mesma geração queremos àestacar que suas visões de mundo foram condicionadas por problemas comuns - no caso o dilema da construção da nação. A propósito ver K. Mannheim , O problema sociológico das gerações (1952), IN:

(9)

responsáveis pelo desenvolvimento das economias dependentes?; em que circunstâncias, a situação de dependência é compatível com o processo de construção da nação?; quais as rupturas históricas indispensáveis para a superação da dependência?; e quando, frente ao perigo da "barbárieu, essa ruptura se torna inadiável?

Nossa leitura pretende reconstituir a cadeia de causalidade que caracteriza a interpretação de cada um desses autores sobre as dificuldades enfrentadas pelas sociedades dependentes para controlar o seu destino.2 O principal desafio consiste em criar as condições necessárias para que o processo de acumulação de capital fique subordinado à vontade da sociedade nacional. Não se trata, portanto, de discutir a dinâmica do capitalismo em si mesmo, mas de apresentar os

dilemas que as sociedades dependentes enfrentam para

transformar o capitalismo em instrumento de aumento

progressivo da eficiência econômica e elevação sistemática do

pensamento brasileiro sobre os dilemas da formação do Estado nacional pode ser encontrada em IANNI, O. A Idéia de Brasil moderno, 1992.

2

Nossa leitura seguirá o critério de compreensão das doutrinas

econômicas, proposto por Maurice Dobb, segundo o qual, " ( .. ,) a análise t.eórica, ( ... ), tem inevitavelmente a sua história causal. Tipos diferentes de história causal podem ter implicações diversas no dominio daquilo que é possível realizar e alcançar por meio de política e ação social; ela é, por conseguinte, relevante, e até fundamental, para estabelecer alternativas

viáveis - se, de fato, existe qualquer alternativa viável para a estrutura

socioeconõmica existente e isto inteiramente dentro dos li~tes do

raciocinio <<positivo>> e não-normativo", DOBB, M., Teorias do Valor e da Distribuição desde Adam Smith, 1977, p. 45. Por esse motivo, adotaremos o

critério de ordenação das idéias sugerido pelo autor:" ( ... ) é possivel

caracterizar e classificar teorias econômicas, mesmo as mais abstratas, conforme o modo como descrevem a estrutura e raizes da sociedade econômica, conforme o significado desse modo de descrever para o julgamento histórico

e a prática social contemporânea. Com efeito, proceder deste modo é parte

essencial da interpretação intelectual das teorias em questão, e do seu

lugar na história das idéias; e sem essa apreciação, algo essencial

faltaria na nossa compreensão de teorias particulares, tratadas

(10)

bem-estar social do conjunto da população. o ob~'c:.ivo último é estabelecer uma espécie de portulano que nos permita delimitar o campo de discussão da problemática do desenvolvimento nacional. Antes de almejar conclusões definitivas,

nosso

intúito consiste em definir uma pauta de questões capaz de

reabrir a

discussão

sobre

os

problemas históricos das

sociedades capitalistas dependentes de origem colonial.3

A teoria econômica de Caio Prado nos auxilia a tratar a particularidade da incerteza estrutural responsável pela elevadíssima instabilidade dessas economias e pelas suas recorrentes crises de reversão estrutural. A reflexão de Florestan Fernandes sobre a revolução burguesa atrasada nos permite entender por que a combinação de forças produtivas em diferentes idades históricas dá às economias dependentes uma certa estabilidade, mas bloqueia a possibilidade de o circuito fechado do subdesenvolvimento ser rompido. Finalmente, a teoria do subdesenvolvimento de Celso Furtado é essencial para explicar a irracionalidade do movimento de incorporação de progresso técnico baseado na modernização dos padrões de

consumo das elites domdnantes.

interna e a fortiori na nossa compreensão do desenvolvimento do

pensamento econômico", Teorias do Valor . . . , 1977, p. 52.

~. A propósito não custa lembrar a advertência de Baran, em A Economia política do crescimento [1959], " ( . . . )seria deseable romper com la larga tr:adición de la economia acadérnica de sacrificar la importancia del terna a la elegancia del método analítico; es mejor tratar en forma imperfecta de lo que es sustancial, que llegar al virtuosismo en el tratamiento de lo que no importa", p. 39, É a mesma idéia que inspira a epígrafe de seu livro: "La ciencia social necesita menos uso de técnicas elaboradas y un mayor valor para enfrentar se a los problemas centrales en vez de esquivarias. Pero exigir esto, seria desconocer las razones sociales que han hecho de esta ciencia lo que es", BERNAL apud EARAN, P.A. - La Economia . . . , 1959, s.p.

(11)

Além da complementariedade de suas abordagens sobre a problemática

mesma

visão

do desenvolvimento, os sobre a gravidade

autores compartilham uma

do momento histórico.

Interpretando as tendências do capitalismo no Brasil, os três pensadores chegam à dramática conclusão de que, em algum momento entre 1950 e 1980, a contradição entre capitalismo dependente e construção da nação transformou-se em aberto antagonismo. A missão civilizatória do capitalismo dependente teria atingido o limite de suas possibilidades e, para sobrevi ver como projeto nacional, a sociedade brasileira não disporia de outra alternativa senão romper com as relações econômicas, sociais e culturais responsáveis por sua posição subalterna no sistema capitalista mundial e pela perpetuação das assimetrias herdadas da sociedade colonial.

Para os três autores, a continuidade da dependência está levando o Brasil à barbárie. A urgência de uma ruptura fica evidenciada na conclamação de Caio Prado a favor da "revolução brasileira", na insistência de Florestan Fernandes no caráter anti-social,

brasileira, Furtado, em

antinacional e antidemocrático da burguesia bem como na eloqüente advertência de Celso "A Construção Interrompida", de que a transnacionalização do capitalismo ameaça a propria unidade do

Brasil como Estado nacional. Tais constatações são

perfeitamente condizentes com o que se observa no dia-a-dia da sociedade, pois saltam aos olhos as evidências de que estamos atravessando um período de progressiva desarticulação dos processos responsáveis pela formação de nossa nacionalidade.

(12)

Afinal, não é isto que nos revelam a desestruturação do sistema econômico nacional; a decomposição do tecido social; a exacerbação das rivalidades inter-regionais; a perda da identidade cultural; e o desmantelamen~o do aparelho de Estado'?

Rejeitando o

conformismo

de quem postula que as sociedades dependentes não têm outra escolha senão aceitar as tendências espontâneas do sistema capitalista mundial; e recusando o imobilismo de quem se nega a procurar alternativas que transcendam os marcos do

status quo,

as reflexões de Caio Prado, Florestan Fernandes e Celso Furtado abrem novas possibilidades para o desenvolvimento das nações emergentes. Diante da discussão que circunscreve as opções de nossa sociedade à escolha binária entre o modernismo acelerado dos neoliberais e a nostalgia de um nacional desenvolvimentismo extemporâneo, elas representam alternativas criativas.

Por enquanto, o coro a favor da modernização à qualquer cutso impede que a razão de nossos grandes intelectuais e as advertências de nossa realidade sejam ouvidas. Mas, um dia, ficará claro que nosso destino não pode continuar nas mãos de classes dominantes aculturadas, cujo Unico projeto é viver à

semelhança dos países desenvolvidos, wna pretensão

descompassada com as necessidades do conjunto da população e com as possibilidades de uma economia dependente. O contraste entre as previsões sombrias dos pensadores do Brasil e o otimismo dos acadêmicos que vendem a ilusão de que o Brasil está ascendendo ao "primeiro mundou nos faz lembrar o sábio

(13)

conselho do Padre Viera: "Se quereis profetizar os futuros, consultai as entranhas dos homens sacrificados: consultem-se as entranhas dos que se sacrificaram e dos que se sacrificam; e o que elas disserem, isso se tenha por profecia. Porém, consultar de quem não se sacrificou, nem se sacrifica, nem se há de sacrificar, é não querer profecias verdadeiras; e querer

cegar o presente e não acertar o futuro".

**'

No Capítulo 1, examinaremos a crise do desenvolvimento nacional decorrente da transnacionalização do capitalismo; e a crise da teoria do desenvolvimento nacional, provocada pela negação dos supostos fundamentais da economia política da Cepal. Nosso objetivo é colocar em evidência os novos desafios do desenvolvimento nacional e a carência de instrumentos analíticos adequados para enfrentá-los. No Capítulo 2, faremos

uma breve introdução à problemática do desenvolvimento

capitalista nacional e à especificidade das dificuldades com que se defrontam as sociedades dependentes. Introduziremos então as particularidades das abordagens de Caio Prado Jr., Florestan Fernandes e Celso Furtado e procuraremos mostrar a complementaridade de seus enfoques.

Nos três capítulos seguintes examinaremos o modo como cada autor trata a problemática do desenvolvimento capitalista dependente. Daremos destaque às relações de causa e efeito que caracterizam suas explicações sobre as estruturas e as dinâmicas responsáveis pela continuidade do círculo vicioso do

(14)

subdesenvolvimento. Veremos então suas interpretações sobre a particularidade do marco histórico que propiciou o movimento de industrialização para substituição de importações na América Latina. No Capítulo 3, estudaremos o modo como Caio Prado vê o substrato social das economias coloniais em transição. Nossa leitura está centrada fundamentalmente na reflexão sistematizada em História e Desenvolvimento [ 1968] e Esboço dos Fundamentos da Teoria Econômica [1957]. No Capítulo 4, examinaremos a contribuição de Florestan Fernandes para a compreensão das bases sociais e políticas do capitalismo dependente. Apoiamo-nos fundamentalmente no pensamento articulado em A Revolução Burguesa [1976], em que o autor consolida sua interpretação sobre as dificuldades da revolução burguesa atrasada na era do imperialismo. No Capítulo 5, analisaremos a visão de Celso Furtado sobre as bases técnicas do subdesenvolvimento. Tomamos como ponto básico de referência a reflexão exposta em O 11ito do Desenvolvimento Econômico

[1974]. Neste livro o autar consolida sua visão de que os problemas do subdesenvolvi:nento derivam, em última instância, do colonialismo cultural.

Por fim, na Conclusão, organizaremos a discussão sobre o destino do capitalismo dependente e os desafios para sua superação. Veremos por que estes autores acreditam que as sociedades dependentes caminham sobre o fio da navalha, equilibrando-se entre a Nação e a barbárie; introduziremos então a agenda que caracteriza a revolução fundadora do Estado nacional de Caio Prado; examinaremos a visão de Florestan

(15)

Fernandes sobre os atores sociais capazes de levar às últimas conseqüências a revolução democrática e a revolução nacional; e, finalmente1 analisaremos o papel estratégico que Furtado atribui à revolução cultural como ponto de partida de uma ruptura com um passado indesejado que se projeta no presente e asfixia o futuro.

(16)

TRANSNACIONALIZAÇÃO DO CAPITALISMO E DILEMAS DO DESENVOLVIMENTO NACIONAL

<<A liberdade é o domínio de nós mesmos e da natureza,

baseado na consciência das necessidades>>, F. Engels

1. A Crise do Desenvolvimento Nacional

A exaustão do ciclo expansivo responsável pelo elevado dinamismo econômico do pós-guerra e a emergência de novas formas de transformação capitalista colocaram novos desafios para o desenvolvimento nacional. A raiz dos problemas prende-se ao fato de que, ao redefinir as fronteiras de tempo e espaço, a transnacionalização do capitalismo desarticulou as dinâmicas que sustentavam o regime central de acumulação e o part.icular equilíbrio de forças que assegurava a estabilidade da ordem internacional montada em Bretton Woods .1 São três as principais descontinuidades no padrão de desenvolvimento capitalista.

Em primeiro lugar, o fim do ciclo de difusão da Segunda Revolução Industrial rompeu os parâmetros técnicos e

John K. GALBRAITH nos fornece uma excelente sistematização do padrão de

funcionamento do regime central de acumulação em The New industrial State,

1967. A desarticulação das premissas históricas do regime central de

acumulação é discutida por BERTRAND, H. em Le Regime central d'accumulation

de l ' aprés-guerre et la crise. Cri tique de 1' économie poli tique, n. 7/8,

1979. Sobre a padrão de desenvolvimento do pós-guerra ver ainda, BARAN, F.

A e SWEEZY, P.M.- Capitalismo monopolista, 1978; J'.f.AGDOFF, H.- A Era do

(17)

econômicos que durante o pós-guerra haviam sustentado as dinâmicas virtuosas responsáveis pelo progressivo aumento dos salários reais e pela expansão do Estado de bem-estar social.2

A substancial diminuição na proporção de trabalho-vivo e trabalho-morto no processo produtivo enfraqueceu as bases de poder real da classe trabalhadora, desarticulando um dos principais mecanismos responsáveis pelo elevado dinamismo e relativa estabilidade das economias industrializadas no pós-guerra

os

aumentos sistemáticos de salário real e a progressiva expansão dos gastos públicos. 3

o sal to qual i ta ti vo na produtividade do capital transformou a usurpação de posições estabelecidas em forma dominante da concorrência intercapitalista.

o

conteúdo eminentemente tecnológico

e

financeiro da concorrência

fez

com que

a

introdução de inovações e a capacidade de mobilizar grandes volumes de recursos financeiros se tornassem as principais armas de

- Trabalho e capital monopolista, 1980; MANOEL, E. - Late Capitalism, 1978; ~GLIETTA, M. Regulación y crisis del capitalismo, 1979.

'-. A emergência de um novo paradigma tecnológico e organizacional é uma resposta do capitalismo contemporâneo aos limites técnicos e econômicos

enfrentados pelo movimento de integração dos mercados das economias

desenvolvidas que impulsionou a fase final de difusão da Segunda Revolução Industrial, A exaustão do processo de difusão de progresso técnico fica

caracterizada, no final dos anos sessenta e início dos setenta, pela

redução generalizada da produtividade industrial, particularmente nos

complexos metal-mecânico e quimico, que constituíam os carros-chefes de

expansão das forças produtivas. As novas frentes de acumulação concentram~

se fundamentalmente nos setores de telecomunicações e informações. A

propósito ver, COUTINHO, L.- A terceira revolução industrial e tecnológica. EcononUa e Sociedade, n.l, p. 69-88, 1992; MADDISON, A.- Dynamic forces in capitalist development, 1991, cap. 5 e 6; PIORE, M.J. e SABEL, C.F.- The

Second industrial divide possibilities for prosperity, 1994.

Uma atualizada discussão sobre os efeitos das transformações

tecnológicas no mundo do trabalho pode ser encontrada em GORZ,

A.-Métamorphoses du travail: Quête du sens, 1991; MATTOSSO, J.- A desordem do

trabalho, 1995; ARRIGHI, G.- Trabalhadores do mundo do final do século.

Praga Revista de Estudos Marxistas, l'J.l, 1996; RIFKIN, ,J.- O Fim dos

(18)

controle dos mercados4

Foram estes, em última análise,

os

fenômenos responsáveis pelo aparecimento de desemprego estrutural e pelos processos desestruturantes que afetaram os sistemas produtivos incapazes de acompanhar o novo ciclo de incorporação de progresso técnico.

Em segundo lugar, a extrema mobilidade do capital internacional elevou a volatilidade do capital, comprometendo o

controle

das sociedades nacionais sobre as empresas transnacionais. Os aumentos nas escalas mínimas de produção fizeram com que os novos processos produtivos exigissem um espaço econômico de referência mais amplo, que tendia a ultrapassar os limites das fronteiras dos Estados nacionais.5 A integração do sistema financeiro internacional levou ao paroxismo a liberdade de movimento de capitais, generalizando, para as economias centrais, um problema que até então se restringia aos países subdesenvolvidos: a incapacidade de circunscrever o circuito de valorização do capital ao espaço econômico nacional.6

; Ver OECD - La Technologie et l'économie, 1992; CAWSON, A. et al. Hostile brothers ... , 1990; CHESNAIS, F.- Science, technology and competitiveness. Science Technology Industry STI Review, n.l, 1986; CHESNAIS, F., SERFATI, C. Mondialisation financiére et gestion global des prchives par les groupes à specialisation industrielles, 1993.

". Sobre as características do novo ciclo de internacionalização do capital ver, MICHALET, C. A.- Le Capitalisme mondial, 1981; ESTÉVEZ, J.,

LICHTENSZTEJN, S. (Ed. )- Nueva fase del capital financiero, 1981; e CHESNAIS, F.- La mondialisation du capital, 1995.

6. Para Robert Reich, os vincules do capital com a sociedade nacional depende da importância relativa do espaço econômico nacional na concorrência intercapitalista em escala mundial, o que é condicionado pela quantidade e qualidade de seu mercado interno, assim como da eficiência comparativa de seu sistema produtivo no contexto internacional. Por isso, ele considera que o capital só pode ser considerado como um instrumento a serviço da nação quando a sociedade for capaz de: (a) evitar a dualização social, defendendo a integração do conjunto da população no mercado de trabalho; (b) ter a primazia no que diz respeit.o à eficiência da força de trabalho e à qualidade da infra-estrutura econõmica: e, (c) manter um

(19)

Por fim, a crise do sistema monetário iaternacional intensificou a vulnerabilidade das economias nacionais às vicissitudes do capital internacional. ' A emergência de mecanismos privados de criação de ativos financeiros

internacionais r livres de controles das autoridades

monetárias, potencializou a instabilidade do sistema monetário e financeiro internacional. A falta de controle sobre os movimentos de capitais solapou a capacidade dos Estados nacionais de determinar o valor da moeda, dos juros e do câmbio.8 A ampla disponibilidade de crédito internacional incitou os Estados nacionais a aumentarem indiscriminadamente o endividamento externo, em detrimento de ajustes reais, o que provocou urna crescente diferenciação entre países credores e devedores. Isto permitiu aos Estados Unidos impor ao resto do mundo o ônus de financiar seu crescimento econômico e

estimulou o sobreendividamento externo dos países da

periferia. Donde as três particularidades que caracterizam o

aparelho estatal capaz de subordinar o processo de acumulação aos desígnios da sociedade. São estes, de seu ponto de vista, os principais responsáveis pela capacidade de cada espaço socioeconômico intensificar a densidade relativa de seu mercado interno e de aumentar a competitividade dinâmica de

sua economia. Robert Reich tira as conseqüências do processo de

transnacionalização do capitalismo para a economia dos Estadas Unidos em

The Work of Nations, 1992; Uma crítica desta abordagem encontra-se em

LABCH, C. The Revo1t of the elites, 1995.

--. A origem das dificuldades decorre do fato de que a assimetria na forma de participação das Estados Unidos, da Comunidade Econômica Européia e do Japão no processo de integração dos mercados solapa as bases materiais da

hegemonia econômíca norte-americana. A propósito consultar BLOCK, F. - The

Origins af international econamic disorder, 1977.

" Os processos de liberalização e desregu1amentação dos sistemas

financeiros nacionais e o desenvolvimento de inovações destinadas a

minimizar os riscos macroeconômicos dos agentes financeiros, ao implicar forte elevação na mobilidade dos capitais, aumentam ainda mais a crise de confiança no sistema de relações monetárias internacionais. Uma análise detalhada da crise do regime monetário internacional a partir de 1971-1973

é feita por AGLIETTA, M. El Fin de 1 as divisas claves, 1982. As

(20)

funcionamento do sistema monetário internaci.onal: (a) sua

extrema

vulnerabilidade

a

crises sistêmicas; (b) o

aparecimento de uma forte tendência ao fracionamento das relações econômicas internacionais em torno de três áreas

monetárias:

o dólar,

o iene e

o marco alemão;

e

(c) a impossibilidade de conciliar a progressiva liberdade de movimento de capital e a autonomia da política econômica dos Estados nacionais. :J

Ao intensificar a concentração e a centralização de capitais, o desenvolvimento desigual do sistema capitalista mundial provocou deslocamentos no poder econômico e político que tenderam a minar bases do Estado nacional burguês. No plano econômico, o cerne do problema está na dificuldade de conciliar a crescente mobilidade dos capitais e o caráter predatório da concorrência, com a capacidade da sociedade nacional de preservar o controle sobre os centros internos de decisão; a coerência de seus sistemas produtivos e a reprodução de mecanismos de solidariedade orgânica entre as classes sociais. No plano político, a questão central é que a disputa pelo monopólio das novas tecnologias e pelo controle dos mercados mundiais acirrou as rivalidades entre Estados nacionais. Tudo isto é agravado pelo fato de que a ausência de

mecanismos supranacionais de coordenação das políticas

econômicas dos países centrais aumentou a instabilidade da

de Bret:ton Vloods e a emergência dos mercados "globalizados". Economia e Sociedade, n.4, p. 11-20 1995.

Como mostra a história financeira internacional, as crises de sobreendi vidamento externo tendem a polarizar-se em violentas oposições de interesses. KINDLEBERGER, C.P. - Manias, panics and crashes, 1978.

(21)

economia mundial,

alimentando

pressões

adic~onais

para

a

defesa da estabilidade das moedas nacionais e reduzindo o ritmo do processo de acumulação em escala mundial.

Sem questionar os mecanismos que impulsionaram a transnacionalização do capital, os países centrais têm procurado amenizar

as

conseqüências mais

nefastas

deste processo, lançando mão de políticas neomercantilistas que acirram ainda mais o estado de "guerra econômica". Obrigados a concorrer para atrair investimentos produtivos, para preservar a estabilidade da moeda e para defender o emprego industrial, os Estados nacionais desencadearam uma corrida para

transformar o espaço econômico ao qual se vinculam em base estratégica da concorrência intercapitalista em escala mundial. :o Daí o incessante esforço para aumentar a produtividade da força de trabalho, melhorar a qualidade da infra-estrutura econômica e ampliar a dimensão de seus respectivos espaços econômicos. O resultado mais conspícuo deste processo é a formação de três grandes blocos econômicos - o Nafta, liderado pelos Estados Unidos; a União Européia, que se organiza em torno da economia alemã; e a Bacia Asiática, que tem o Japão como pólo de aglutinação.::

Contudo, como é um contra-senso imaginar que todas as economias possam ser consideradas, ao mesmo tempo, áreas

1'' SWEEZY, P., The triumph of financial capital. Monthly Review, n.2, 1994.

:I Ver GILPIN, R. - The Political economy of international relations, 1987; e TUSSIE, D. Trading in fear? In: MURPHY, C.N., TOOZE, R. (Ed.) The New international political economy, 1991, cap.4. Uma interessa"i1te discussão sobre os condicionantes da trajetória de ajustamento dos pt:incipais países capitalistas pode ser vista em ZYSMAN, J. - Government, Market and Growth, 1983.

(22)

prioritárias de interesse do capital internacional, o esforço para

suplantar

as

vantagens

concedidas

pelas regiàes concorrentes constitui uma verdadeira tarefa de Sísifo. Não é de estranhar que a lógica do "salve-se quem puder" tenha contribuído para minar as bases do Estado nacional. Ao debilita r a capacidade de a sociedade controlar as forças do

mercado, o novo padrão de transformação capitalista

desarticulou as premissas econômicas e poli ticas que haviam tornado possíveis os sistemas econômicos nacionais relativamente autônomos e autocentrados. 1.2 É neste contexto que surgem as pressões para a completa remodelação do mundo do trabalho, a crise do Estado de bem-estar social, a força arrebatadora da ideologia neoliberal e os processos que abalam a própria noção de identidade nacional. 13

Se as sociedades que fazem parte do centro capitalista revelaram alguma capacidade de atenuar os efeitos mais destrutivos da transnacionalização do capital sobre suas sociedades (reforçando a escala de suas economias e o alcance

de suas estruturas estatais), as tendências que estão provocando o estilhaçamento da nação manifestaram-se com força

l2

Para uma interessante discussão sobre as características do padrão de acumulação emergente, ver CHESNAIS, F., A globalização e o curso do capitalismo de fim-de-século, Economia e Sociedade, n.S, p. 1-30, 1995,; e BRAGA, J.C. A financeirização da riqueza, Economia e Sociedade, n.2, p. 25-58, 1993.

:J Um resumo da discusão recente sobre o impacto do novo padrão de transformação capitalista sobre a Estado nacional pode ser: encontrado em IANNI, O. - A Sociedade global, 1992. Ver também, KURZ, R. - O Colapso da modernidade, 1992; CAMILLERI, ,J.A., FALK, J . - The End of sovereignty?, 1992; JESSOP, B. - Changing forms and functions of the State in an era of globalízation and regionalization, 1992; DESSAI, M., REDFERN, P. - Global governance, 1995; ARRIGHI, G. - O Longo século XX, 1996.

(23)

redobrada nas regiões periféricas.:4 Encerrado o ciclo de

convergência tecnológica que caracterizou a difusão espacial da Segunda Revolução Industrial, o desenvolvimento desigual do capitalismo voltou a promover uma brutal concentração espacial do progresso técnico, ampliando o hiato entre desenvolvidos e

subdesenvolvidos.'~

O novo marco histórico reduziu dramaticamente - e este é seu traço fundamental o grau de liberdade das economias dependentes, para impulsionar o processo de consolidação de

seus

Estados nacionais. A perda de controle sobre os movimentos de capitais tornou ainda mais fluídos os vinculas das empresas transnacionais com as economias dependentes. A situação é bem diferente da fase final de difusão do fordismo, no pós-guerra. O objetivo, então, era evitar que as unidades

produtivas deslocadas para

a

periferia sofressem a

concorrência de produtos importados. A poli t i c a de conquista

de mercados internos periféricos levava o capital

internacional a exigir um espaço econômico bem delimitado. Por isso, ainda que o horizonte de valorização do capital internacional fosse transnacional, o processo produtivo operava sob marcos institucionais rigidamente demarcados, e o ciclo de reprodução ampliada do capital produtivo tendia a circunscrever-se ao espaço econômico nacional.:6

~4

LAIDI, Z. (Org.)- L'ordre mondial relâché, 1992.

:.õ ARRIGHI, G. A desigualdade mundial na distribuição da renda e o futuro do socialismo. In SADER, E. (Org.) - O Mundo depois da queda, p. 85-120, 1995; CHESN~S, F., Present international patterns of foreign direct investment , .. In: SEMINÁRIO A INSERÇÃO INTERNACIONAL DO BRASIL NOS ANOS 90, 1990, v. 2.

:>i O padrão de internacionalização de capital do pôs-guerra foi

(24)

Na era da mundialização do capital estamos assistindo a um fenômeno muito diferente: trata-se de quebrar as barreiras entre os diferentes espaços econômicos nacionais. Nesse contexto, o objetivo das empresas transnacionais não é controlar o

processo

de industrialização das economias periféricas, mas diluir a economia dependente no espaço do mercado global, para poder explorar as potencialidades

econômicas da periferia sem

sacrificar

sua mobilidade

espacial. Por isso as transnacionais nào querem fronteiras econômicas rigidamente definidas1 mas uma ancoragem territorial que tende a se cristalizar em torno de espaços econômicos regionais fluidos. 17 Do chamado Terceiro Mundo, o capital internacional espera obter livre acesso aos mercados periféricos, para que possa decidir em função de suas estratégias de valorização da riqueza em escala mundial ~ se os mercados periféricos serão explorados mediante produtos

importados

ou

mediante a produção local.

o

capital

internacional espera, também, que os mercados periféricos lhe

garantam a flexibilidade indispensável para que possam

maximizar o aproveitamento das potencialidades económicas de cada região do globo - como reservas de matéria~prima e como plataformas de exportação de mercadorias que requeiram mão~cte~ obra barata. E o capital internacional espera, ainda, eliminar

firms, 1967. Ver também, COUTINHO, L. The internationalization of oligopoly capital, 1974; VERNON, R., International investment and international trade in the product cycle, Quarterly Jour:nal of Economics, v. 80, p. 190-207, 1966; Idem, Multinationals and national sovereignity, Harvard Business Review, 1967.

', CHESNAIS, F. La rnondialisation . . . ,. 1995; BONEFELD, W., HOLLOWAY, T. (Ed.) - Global capital, national state and the pclitics of money, 1995;

(25)

qualquer tipo de reserva de mercado ao capital nacional para que as grandes empresas transnacionais possam açambarcar os segmentos produ ti vos e de serviços que possam oferecer boas oportunidades de negócios. :e

A adversidade do contexto histórico é agravada pelo fato de que o colapso da União Soviética e a crise do movimento socialista diminuíram dramaticamente o poder de barganha das economias periféricas na ordem internacional. Sem o 'fantasma comunista' para intimidá-las, as nações hegemônicas passaram a exigir que os países dependentes se adaptassem incondicionalmente às suas exigências. Não estamos mais na época da Aliança para o Progresso, quando a industrialização subdesenvolvida era tida como um antídoto contra a revolução socialista, e às grandes potências capitalistas precisavam do apoio de burguesias dependentes relativamente fortes e articuladas em escala nacional. :9 Na lógica

da ordem internacional hoje emergente, o desenvolvimento nacional fica

excluído do horizonte de possibilidades dos países

periféricos. Cabem-lhes, agora, basicamente, três funções na economia mundial: franquear o espaço econômico à penetração do capital internacional; coibir o êxodo de correntes migratórias que possam vir a gerar instabilidade nos países centrais; e

MORTIMORE, M., Las transnacionales y la industría en los países en desarrollo. Revista de la Ceual, n.51, p. 15-36, 1993.

u OCDE - La technologie . . . , 1992; Idem - Intégration des pays en

dévelopement dans le systême commercial internacional, 1992; Idem, Investissement direct international, 1992; Idem Promouvoir

l'investissement direct étranger dans les pays en dévelopement, 1993: OMAN,

C. Intégration régionale et pays en dévelopment, Paris, OECD, 1993.

' 9 ROSTOW,W.W. A Est:::atégia americana, 1965; DAVIDSON, P.

(26)

aliviar o stress produzido pelas regiões Ü<.ê::E:wolvidas no ecosistema mundial, aceitando o triste e paradoxal papel de pulmão e lixo da civilização ocidental.20

A incompatibilidade entre a natureza predatória dos conflitos que regem a reorganização da ordem internacional e a existência de uma ética de solidariedade baseada no princípio da autodeterminação dos povos e na cooperação internacional revela o que as sociedades periféricas podem esperar da

transnacionalização

do capitalismo. Expostas á fúria da globalização e ao arbítrio dos países ricos, as nações emergentes ficam sujeitas a processos de reversão neocolonial que desarticulam seus centros internos de decisão e quebram a espinha dorsal do sistema econômico nacional.

Em primeiro lugar, a concentração de progresso técnico nas economias centrais reforça a dependência tecnológica das regiões periféricas, seja porque os saltos na produtividade do trabalho aumentam o grau de obsoletização relativa de seu parques produtivos, seja porque a assimilação das estruturas difundidas dos centros capitalistas exige que se cumpram determinados requisitos que não estão inscritos no movimento anterior da economia, (tanto no que diz respeito à infra-estrutura econômica quanto; ao grau de qualificação da mão-de-obra; e à magnitude das escalas mínimas de produção). Donde a

_o Sobre o que se espera das economias dependentes, ver: SAMPAIO JR.

P.S.A. -Padrão de reciclagem da divida externa e política econômica no

Brasil, 1988, cap. 2; WILLIAMSON, J. El cambio en las políticas

econórnicas de Améci ca Latina, 1991; NAÇÕES UNIDAS Relatório da Comissão Brut1and sobre a situação do meio ambiente, 1987; HOBSBAWN, E. - A Era dos Extremos, 1995.

(27)

dificuldade para dar continuidade ao processo de constituição de forças produtivas que funcionam como um todo orgânico.21

Em segundo lugar, a integração do mercado financeiro internacional reforçou a dependência financeira das economias

satélites. 22 À mercê das vicissitudes das finanças

internacionais, as regiões periféricas viram-se forçadas ora a gerar megasuperávits comerciais, destinados a pagar o serviço da dívida externa, ora a produzir megadéficits comerciais para, mediante a compra maciça de produtos estrangeiros, viabilizar a absorção de empréstimos internacionais. Compromete-se, assim, o papel do mercado interno como centro dinâmico da economia. 23

Em terceiro lugar, a hegemonia da ideologia neoliberal levou a dependência cultural

ao

paroxismo, tornando as sociedades periféricas particularmente indefesas ante os movimentos especulativos do capital. ·

,,

Negando a vontade política como meio de construção da nação, as sociedades

-l para uma breve discussão sobre as características do padrão tecnológico

emergente, consultar, COUTINHO, L.C., A terceira revolução ... , Economia e

Sociedade, n.1, p. 69-88, 1992; SALM, c., FOGAÇA, A., Modernização

industrial e a questão dos recursos humanos, Economia e Sociedade, n.l, p.

111-134, 1992; WOMACK, J. et a1. - The Machine that changed the world,

1990. Sobre os pré-requisitos técnicos e econômicos para a absorção do novo padrão tecnológico, ver CORIAT, B., TADDEI, D. - Made in France, 1993.

-2• Sobre a estratégia dos bancos credores internacionais nas economias

dependentes, ve~ CEPAL - El compo~tamiento de los bancos transnacionales y

la crisis internacional de endeudamiento, 1989; DEVLIN, R. - La evolución

del problema de la deuda externa en América Latina y el Caribe, 1988 .

... J. para uma discussão sobre o assunto, ver interessante pesquisa sobre o

caso brasileiro, em CARNEIRO, R. Superávit comercial e crescimento

sustentado, 1990.

DAVIDSON, P., What international payment scheme would Keynes have

suggested for the twenty-first century? In: SEMINÁRIO A INSERÇÃO

INTERNACIONAL NO BRASIL NOS ANOS 90, 1990; MINSKY, H.P., Integração

financeira e política monetária, Economia e Sociedade, n.3, p. 21-36, 1994;

KREGEL, J .A., Riscos e implicações da globalização financeira para a

(28)

periféricas ficaram sem instrumento para negoc.i.E<.r os termos de sua inserção no sistema capitalista mundial, e para preservar as premissas mais elementares de um Estado nacional.25 Deixadas ao livre jogo das forças de mercado, as tendências da divisão social do trabalho vêm restringindo as indústrias das economias dependentes aos setores mais atrasados, de baixo conteúdo tecnológico, nos quais ainda é possivel obter vantagens comparativas no comércio internacional às custas da superexploração da força de trabalho e da degradação do meio ambiente.26

Portanto, na fase atual do processo de desenvolvimento capitalista, as economias periféricas já não contam com a possibilidade de fuga para a frente, mediante estratégias que combinem crescimento econômico e avanço no processo de construção das bases materiaisT sociais, politicas e culturais do Estado nacional burguês. 27 Sem possibilidade de controlar nem os fins nem os meios do processo de acumulação, as contradições entre dependência e desenvolvimento nacional

tornam-se agudas e ameaçam transformar-se em antagonismos abertos.

Na América Latina, a mudança no contexto histórico desarticulou os processos que haviam permitido a várias economias da América Latina sair da condição

primário-1996; COUTINHO, L.c., BELLUZZO, L.G.M., Desenvolvimento e estabilização sob finanças globalizadas, Economia e Sociedade, n.7, p. 129-154, 1996.

~s. A propósito ver debate proposto por FIORI, J. L. - A governabilidade democrática na nova ordem econômica, 1997.

-" MOHOUD, E.M. Changernent technique e division internationale du

travail, 1993; AMIN, S. - La déconnexion, 1986; ARRIGHI, G., DRAGEL, J.,

(29)

exportadora e avançar na formação de uma base produtiva voltada para o atendimento de um mercado interno nacionalmente articulado. A industrialização para substituição de importações que avançava pela linha de menor resistência, ancorada no Estado e impulsionada pelo capital internacional -revelar-se-ia particularmente vulnerável às novas tendências do sistema capitalista mundial. A valorização da riqueza desvinculada de avanços nas bases técnicas e financeiras do capital havia gerado um sistema produtivo que operava com baixos índices de produtividade, elevados níveis de proteção e

ínfimo grau de concorrência. A incapacidade de absorver a superpopulação excedente permanentemente marginalizada do

mercado de trabalho tinha comprometido os mecanismos de transferência dos aumentos de produtividade para os salários, criando bloqueios que restringiram a ampliação da capacidade de consumo da sociedade. 28

No Brasil, a exaustão do processo de substituição de importações deu início a um período de estagnação da renda per

capita, de obsolescência das forças produtivas, de

enfraquecimento da estrutura de capital das empresas nacionais

e de desmantelamento do Estado desenvolvimentista.

Interrompia-se, assim, um longo ciclo de expansão das forças

"' A respeito, ver FURTADO, C., Globalização das estruturas econômicas e identidade nacional. Estudos Avançados, n.l6, 1992.

28

• No período do pós guerra, a ausência de um sistema nacional de ciência

e tecnologia e a inexistência de um padrão de financiamento autônomo não comprometeram a expansão das forças produ ti_ vas porque o capí tal internacional estava diretamente envolvido no processo de industrialização. O atraso nas relações sociais não representou um empecilho ao desenvolvimento das forças produtivas porque o mercado interno era suficientemente amplo para viabilizar a assimilação das tecnologias

(30)

produtivas durante o qual a economia brasileira havia ampliado seu mercado interno, internalizado as estruturas fundamentais da Segunda Revolução Industrial e cristalizado as bases do Estado nacional burguês. 29

Sem condições de enfrentar os desafios da concorrência internacional, a sobrevivência da indústria brasileira ficou ameaçada e o Estado nacional tornou-se sujeito a processos de reversão neocolonial que colocam em risco a própria continuidade do processo de construção da nação. 30

O impacto das novas tendências do sistema capitalista mundial sobre a economia nacional foi sobredeterminado pela

submissão da política econômica às pressões dos

credores

internacionais para que o país reciclasse a dívida externa, bem como pelo apoio incondicional oferecido aos movimentos do grande capital, de fuga para a liquidez e de busca de mercados externos - expedientes utilizados pelas grandes empresas para mitigar as incertezas provocadas pela exaustão do padrão de acumulação. São tais processos os principais responsáveis pela crise do padrão monetário brasileiro, cujo sintoma mais

amortizadas da Segunda Revolução Industrial e porque as exigências de ~ualificação da força de trabalho eram mínimas.

- . O desempenho da economia brasileira foi estudado por CARNEIRO, R. Crise, estagnação e hiperinflação, 1991. o mais completo balanço da situação da indústria brasileira encontra-se em COUTINHO, L.C., FERRAZ, J.C. (Org.), Estudo da comoetitividade da indústria brasileira, 1994. Para uma interessante discussão sobre a crise do Estado, consultar FIORI, J.L. -A crise do Estado desenvolvimentista no Brasil, 1986.

"". Um balanço do desempenho das economias latino-americanas na década de oitenta pode ser visto em CEPAL - El desar.rollo de América Latina en los aiios ochenta, 1981. Sobre os custos sociais do ajustamento das economias latino-americanas, ver GARCIA, N. E. Deuda externa y empleo (América Latina, 1980-1986), 1988. Uma análise mais recente pode ser encontrada em PANORAMA SOCIAL DE AMÉRICA LATINA, l997. Sobre o novo papel das economias latino-americanas na economia mundial, ver BRADFORD JR., C. I. (Org.) Options Stratégiques pour L'amerique Latine dans les Années 90, 1992;Idem

(31)

-conspícuo foi

a

dificuldade de debelar

a

tendência à aceleração da

inflação,

ao

longo

de toda a década dos oi tenta. 31

Até o início da década dos noventa, a subordinação da poli ti c a econômica ao esquema convencional de reciclagem da dívida externa transformou a transferência de recursos reais ao exterior no principal eixo de articulação da intervenção do Estado na economia. 32 Nesse período, para evitar uma violenta

crise de desvalorização de ativos produtivos, as autoridades

econômicas

sustentaram

artificialmente a rentabilidade corrente das empresas e o valor contábil de seus patrimônios, adotando medidas para evitar uma recessão aberta e prolongada e resistindo às pressões para a liberalização da economia.33

Premido pela urgência de administrar a extrema instabilidade da economia, o Estado brasileiro não articulou

Mobiliser les Investissements Internationaux pour L'amerique Latine, 1993; Idem - Redéfinir L'État en Amérique Latine, 1994.

~~ Uma interessante análise das raizes estruturais do processo

inflacionário que acometeu as economias dependentes que mais haviam

avançado na construção de um sistema econômico nacional encontra-se em

ALMEIDA, J.S.G., BELLUZZO, L.G.M., Enriquecimento e Produção, Novos Estudos

CebraP, n.23, p. 121-128, 1989.

~L. O padrão de reciclagem da di vida externa foi armado para viabilizar a

gradativa diminuição da carteira dos bancos privados nos países devedores, a diversificação do risco de suas aplicações e o fortalecimento de sua base de capital. A propósito ver, DEVLIN, R., La deuda externa vs. el desarrollo económico: Ame.rica Latina en la enc.rucijada, Estudios Cieplan, n. 17, p.

69-100, 1985; SAMPAIO JR., P.S.A., Auge e declínio da estratégia cooperativa de reciclagem da dívida externa, Novos Estudos Cebrap, n.25, P. 118-135, 1989.

~,

-.ALMEIDA, J.S.G., NOVAIS, L.F., A empresa 1ider na economia brasileira,

1991. O predomínio dos inte.resses dos grandes grupos econômicos acarretou

forte assimetria na distribuição dos sacrifícios impostos pela crise do

padrão de industrialização. A ausência de medidas compensatórias para

amparar a população atingida pelo desemprego e pela aceleração dos preços, a política deliberada de arrocho salarial e o colapso da infra-estrutura de serviço pUblico implicaram significativo aumento na exclusão social. Ver,

BRANDÃO, J. L., GOTTSHALK, A., Recessão, pobreza e familia - a década pior

do que perdida, São Paulo em Perspectiva, v. 4, n.1, p. 100-109, 1990. Para

(32)

um plano de reorganização pr:Jdu;::iva . . -:;_ renegociação da dívida externa não significou a superação do estrangulamento cambial

e o ajuste privado não teve C·2mo contrapartida um au.."'rtento da competítividade dinâmica da economla brasileira. 04 Por isso,

ainda que a estratégia de protelar o enfrenta.mento dos problemas colocados pelo novo contexto internacional tenha evitado a hiperinflação aberta, ela só agravou o atraso relativo do parque produtivo. Mais do que isso: ao preservar os vínculos financeiros dos credores externos com os mutuários internos, particularmente com as unidades de gasto do setor

público, a reciclagem da dívida externa reforçou

extraordinariamente a influência da comunidade financeira

Política social e pactos conservadores no Brasil: 1964-1992, Economia e Sociedade, n. 8, p. 183-238, 1997 .

. A hipótese aqui desenvolvida é a de que foi a ação do Estado que evitou que a fuga generalizada para a liquidez provocasse uma violenta crise de liquidação de ativos produtivos. Na primeira metade dos anos oitenta, tal estratégia se traduziu em medidas que procuravam compatibilizar a geração de megasuperávits comerciais com a- preservação de um patamar de demanda efetiva suficiente para evitar crises abertas de liquidação. Para tanto, foram tomadas medidas destinadas a contrabalançar os efeitos da contração do mercado interno sobre a contabilidade das empresas, tais como estímulos

às exportações, estatizaçào da divida externa e defesa artificial da

rentabilidade corrente do grande capital industrial. Na segunda metade da

década, o crescente risco de que os grandes detentores de riqueza

financeira fugissem concentradamente oara ativos reais e moeda estrangeira

colocou a política econômica inte9ralmente a reboque dos movimentos

especulativos do mercado financeiro e dos grandes grupos exportadores.

Conciliar os compromissos assumidos com os credores internacionais com a preservação da confiança na moeda nacional tornou-se, assim, o principal

desafio das autoridades econômicas. A impossibilidade de alcançar

.simultaneamente essas duas metas levou à adoção de um padrão de gestão

econômica que combinava a suspensão temporária dos pagamentos aos credores

internacionais com a administração ad hoc da tendência à aceleração

inflacionaria. Sem raio de manobra para arbitrar o nível das taxas de juros

e as condições de liquidez dos ativos financeiros, a política

antiinflacionária ganhou um caráter paradoxal, assumindo a forma ora de

"choques" - destinados a controlar diretamente os preços e desindexar a

economias, quando o processo inflacionário ameaçava fugir completamente de qualquer controle -, ora de uma política de "coordenação" dos aumentos de preços e reindexação da economia, cruando, após a liberação dos preços, a

aceleração inflacionaria voltava a l;anhar impeto. CARDOSO DE MELLO, J.M.,

BELLUZZO, L.G.M. (Org,) - FMI x Brasil A armadilha da recessão, 1984, Ler

também, SAMPAIO JR., P.S.A. -Padrão de reciclagem . . . , cap. 3 a 7; SAMPAIO JR., P.S.A., AFFONSC, R.B.A., KANDIR, A. -Ajustamento e estabilizacão no

(33)

-inter:1acional sobre

os

::umas :la oolítica

econômica

brasileira. :;c E ao chancelar ~ ajuste privado em direção a ativos financeiros e às expcr':ações, o movimento de ajuste privado provocou o encilhamento financeiro do setor público.""'

No final dos anos oitent:a, a falta de perspectiva em relação à retomada do financiamento externo, o crescimento acelerado da dívida pública e o progressivo encurtamento do perfil de vencimento dos títulos públicos evidenciavam que a crise dos padrões de financiamento externo e interno havia atingido o clímax. 37 Impotente ante os grandes detentores de riqueza financeira e dependente dos

setores

geradores de divisas internacionais, o Estado brasileiro ficou sem instrumentos para fazer política econômica.-~·'' Por esse motivo, o agravamento da incerteza e a extrema fragilidade financeira do setor público diminuíam dramaticamente o raio de manobra do Estado para continuar resistindo ao impacto desagregador do novo padrão de concorrência intercapitalista sobre o parque industrial brasileiro.

É dentro dessa conjuntura que se dá a inflexão na política econômica do início dos anos noventa, quando o Brasil

35

SAMPAIO JR., P.S.A., Dívida externa; por que nossos governos não

enfrentam os bancos internacionais? Revista Nossa América, 1990; BOMTEMPO,

H.C., Transferências externas e financiamento do governo federal. IN

BATISTA JR., P .N. (Org.) Novos ensaios sobre o setor externo da economia

brasileira, 1988; CAVALCA.NTI,C Transferências de recursos ao exterior e

substituição de divida externa por divida interna, 1988.

_,, A relação entre ajustamento privado e desajustamento das finanças

públicas é estudada em TEIXEIRA, E. e BIASOTO JR., G. Setor oúblico nos

anos oitenta: desequilíbrios e ruptura do padrão de financiamento, 1988.

~. WATKINS, A.J., Perspectivas latinoamericanas en los mercados

financieros, Revista de la Cepal, n.37, 1989.

30

• A respeito da perda na capacidade de fazer política monetária ver

ALMEIDA, J.S.G., BELLUZZO, L.G.M., Crise e reforma monetária no Brasil. São

Paulo em Perspectiva, n.1, p. 63-75, 1990. Sobre a crise fiscal consultar,

(34)

passou a sancionar sis-cematicamente as pressões liberalizantes da comunidade financeira internacional. Percebendo o perlgo

que significava continuar .insistindo em uma política de

resistência às exigências da globalização sem apontar para a superação do impasse gerado pela exaustão da industrialização pesada perigo representado pela crescente presença das forças populares na vida política nacional as classes dominantes brasileiras unificaram-se monoliticamente em torno de um objetivo comum: a promoção de uma nova rodada de modernização dos padrões de consumo. 39 Capitulando ás

recomendações do Consenso de Washington, a política econômlca passou a articular-se, desde então, em função da necessidade 'ajustar' o Brasil às exigências da mundialização do capital. "'1

A liberalização da economia fez com que a

industrialização pesada, há tempo agonizante, entrasse em fase terminal, desencadeando um processo de desestruturação do

:s f: emblemática da z:.ova escala de prioridades das classes dominantes

brasileiras a consigna do candidato Collor de Mello: "o carro brasileiro e um carroça". Florestan Fernandes fez a crônica do processo político que desembocou na liberalização da economia em artigos publicados na imprensa, sobretudo na Folha de São Paulo. Alguns desses artigos foram reunidos nos

livros Democracia e Desenvolvimento, 1994; e Em busca do Socialismo, 1995.

4

c No caso brasileiro, a liberalização da economia foi implementada em

dois tempos. Primeiro, seguindo o ritual imposto pela comunidade financeira internacional para a volta ao mercado de crédito externo, as autoridades iniciaram uma oolitica de liberalização comercial e de abertura do sistema

financeiro. Pa"ralelamente, selaram um acordo de .renegociação da dívida

externa nos moldes do Plano Brady. Segundo, após a recuperação da

capacidade de endividamento externo do pais - fato determinado em última

instância pela elevada liquidez internacional e pela diminuição do peso dos haveres no Brasil na carteira dos bancos privados internacionais -, foi implementada uma política de estabilização baseada na ancoragem da moeda

nacional em uma taxa de cambio (sobrevalorizada} e na aceleração da

abertura comercial e financeira, da privatização das empresas públicas e da

desnacionalização da economia. Sobre a estratégia de l.iberalização da

economia brasileira na década de noventa, ver, PORTUGAL, J .G. (Org. J,

Gestão estatal no Brasil, 1991; Idem, Gestão estatal no Brasil, 1995;

PRATES, D.M. Abertura financeira e vulnerabilidade externa: a economia

brasileira na década de noventa, 1997. A propósito da política de

(35)

aparelho produtivo que está c::::-mprometendo os El_OS estratégicos

do sistema econômico brasileiro''~ Não é difícil imaginar os efeitos desagregadores que as tendências em curso provocam em uma sociedade com w.-n território de dimensões continentais; imenso contingente populacional; acentuadas heterogeneidades regionais; secular desequilíbrio social; grau de urbanização equivalente ao de países industrializados; e parque industrial altamente diversificado.

A crise do padrão de industrialização pesada desarticulou um dos principais

mecanismos

ideológicos à e legitimação ideológica do status quo nas classes operárias e nas camadas mais desfavorecidas da população: a ilusão de classificação social alimentada pela elevada mobilidade social verificada ao longo do ciclo de substituição de importações. A falta de dinamismo do novo modelo econômico e sua elevada instabilidade diminuíram significativamente o multiplicador de emprego dos setores mais produtivos da economia. A liberalização da economia e os efeitos destrutivos da nova onda tecnológica sobre as estruturas da Segunda Revolução Industrial fizeram com que aumentasse dramaticamente a heterogeneidade estrutural da base produtiva; fizeram aumentar também a importância relativa do desemprego tecnológico provocado pela modernização

das forças produtivas e pela concorrência de produtos importados. A década de noventa marcou, assim, uma radical

-11 SILVA, G. A.L. e LAPLANE, M.F., Dinâmica recente da indústria

brasileira e desenvolvimento competitivo, Economia e Sociedade, n.3, p.

81-98, 1994; LAPLANE, M.F., SARTE, F., Investimento direto estrangeiro e a

(36)

degradação no estatuto :::abalho na sociedade brasileira, revertendo o lento e tortJoso processo de formação de um mercado de trabalho relativamer:te homogêneo.<:

Além de agravar a crise s:Jcial no campo e na cidade, a ruptura das bases materiais que sustentavam as correntes migratórias começou a fomentar perigosas rivalidades

inter-reg1onais e processos de segregação social. 43

Por isto, o esgotamento do processo de substituição de importações minou a solidez material e social do pacto federativo brasileiro, colocando em questão a própr1a coesão territorial do pais. Esboçada no pós-guerra e consolidada durante a ditadura mil i ta r,

a

unidade

que

sedimentava os interesses das oligarquias regionais baseava-se em dois pilares fundamentais: o pânico em relação à emergência do povo na política e o

consenso em torno da industrialização corno objetivo

estratégico das classes dominantes. H O segundo pilar teve que

ser imolado para que uma parcela da população brasileira

p. 143-182, 1997; e COUTINHO, L., A Especialização Regressiva: Um Balance do Desempenho Industrial Pós Estabilização, 1997.

Tal processo se consubstanciava em um padrão de absorção de mão de obra: os trabalhadores expulsos do campo tendiam a ser empregados em atividades de baixa produtividade nas cidades à espera de sua eventual absorção nas atividades industriais de elevada produtividade. A propósito ver, RODRÍGUEZ, O. - Agricultura, subempleo e distribución del ingresso, 1983; PORTUGAL, J.G. Crescimento acelerado e absorção de força de trabalho no Brasil, 1988. As mudanças no funcionamento do mercado de trabalho são discutidas em, BALT~~' P.E.A., Estagnação da economia, abertura e crise do emprego urbano no Brasil, Economia e Sociedade, n.6, p. 75 112, 1996; CEPAL La transformac-ión sacio ocupacional de Brasil, 1960-1980 y la crisis social de los 80, 1986; BALTAR, P., HENRIQUE, W., Emprego e renda na crise contemporânea no Brasil. In OLIVEIRA, C.A.B. et al. O

do e final do 1994.

nem

Referências

Documentos relacionados

pp.. Trata-se de um documento preparatório ao edital de licitação que dá as diretrizes viáveis quanto às perspectivas mercadológicas; quantitativos de usuários; elasticidade

O relatório encontra-se dividido em 4 secções: a introdução, onde são explicitados os objetivos gerais; o corpo de trabalho, que consiste numa descrição sumária das

Neste trabalho foram avaliados os parâmetros de qualidade de polpa de acerola congelada, segundo o Regulamento Técnico para Fixação dos Padrões de Identidade e Qualidade

This paper is about a support information management system for a wind power (WP) producer having an energy storage system (ESS) and participating in a day-ahead electricity

From these observations, and given the fact that the middleware has not been sys- tematically optimised, we believe that some improvements can be introduced such as: using less

Convênio de colaboração entre o Conselho Geral do Poder Judiciário, a Vice- Presidência e o Conselho da Presidência, as Administrações Públicas e Justiça, O Ministério Público

•   O  material  a  seguir  consiste  de  adaptações  e  extensões  dos  originais  gentilmente  cedidos  pelo 

Figura A.24 – Curvas analíticas construídas a partir da análise de extratos por LC- MS/MS, provenientes de amostras de pimentão verde fortificadas com os