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ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E OS EFEITOS DA POLÍTICA COGNITIVA EM MEIO AO CONTEXTO DO PERÍODO ELEITORAL

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Edição 28, volume 1, artigo nº 7, Janeiro/Março 2014 D.O.I: 10.6020/1679-9844/2807

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ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E OS EFEITOS DA POLÍTICA

COGNITIVA EM MEIO AO CONTEXTO DO PERÍODO

ELEITORAL

PUBLIC ADMINISTRATION AND THE EFFECTS OF THE

COGNITIVE POLICY IN MIDDLE TO CONTEXT OF THE

ELECTION PERIOD

Luciane Maria Gonçalves Franco1, Cristiano do Nascimento2

1

Pontifícia Universidade Católica do Paraná/ Programa de Doutorado em Gestão Urbana/Curitiba, Paraná, Brasil, lutc@tce.pr.gov.br

2

Universidade Federal do Paraná/ Programa de Pós-graduação em Contabilidade/Curitiba, Paraná, Brasil, cristiano.do.nascimento@live.com

Resumo – Este estudo tem por objetivo investigar a perspectiva da política

cognitiva e a relação entre cidadão e político. Para isto, o presente ensaio formal visa a descrever, como fenômeno, as transformações sofridas pela Ciência Política desde os referenciais de Platão e Aristóteles até o advento da Política Cognitiva. Esta política está diretamente relacionada ao comportamento dos governantes, ante à expectativa do cidadão em se tratando da missão da administração pública. Em nenhum momento anterior, percebeu-se estar o processo tão corrompido e subordinado a política cognitiva, impregnada na mente dos gestores e dos cidadãos, como força modeladora a causar efeitos patológicos a toda sociedade. A política cognitiva está presente nas ações dos governos, especialmente a conduzir o comportamento dos agentes políticos enquanto candidatos, em períodos eleitorais.

Palavras chaves: Administração Pública. Política Cognitiva. Período Eleitoral. Setor Público.

Abstract – This study aims to investigate the perspective of policy cognitive and the relationship between citizen and politician. To this end, this paper aims to describe formally, as a phenomenon, the transformations undergone by the Political Science from the references of Plato and Aristotle to the advent of cognitive policy. This policy is directly related to the behavior of the

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Página 130 de 215 rulers, against the expectations of citizens when it comes to the mission of public administration. Never before, it was perceived to be as this process as corrupt and subject to this policy cognitive ingrained in the minds of managers and citizens, as shaping force to cause pathological effects on society as a whole. The cognitive policy is present in the actions of governments, especially to drive the behavior of political agents as candidates, during in elections.

Keywords: Public Administration. Cognitive Policy. Election Period. Public Sector.

1. Introdução

Os modernos estudos de administração foram inicialmente enfrentados em busca de soluções para problemas emergentes na administração pública, no âmbito dos governos e da necessidade de profissionalização dessas estruturas. A ação de administrar governos pressupõe influencia direta na vida do cidadão, à medida que cabe ao governante a missão de atender à sua finalidade precípua: proporcionar qualidade e constância no bem viver do cidadão mediante a oferta de serviços públicos. A atribuição primordial da Administração Pública é, por conseguinte, garantir resultados factíveis aos seus administrados, não se justificando sua presença senão para atender aos anseios da coletividade.

Em conformidade com o exposto por Ramos (1981), em nenhum momento anterior, o processo de socialização humana esteve na situação de nossos dias, subordinado a uma política cognitiva exercida por um mercado que desempenha o papel de força central modeladora da mente dos cidadãos. Neste ínterim, a política cognitiva consiste no uso consciente ou inconsciente da linguagem distorcida, cuja finalidade é levar pessoas a interpretarem a realidade segundo os interesses dos agentes da distorção (RAMOS, 1981, pp. 86-87).

Nestas condições, os padrões de mercado para pensamento e linguagem tendem a tornarem-se equivalentes a padrões gerais de pensamento e linguagem e culminam em padrões de vida. Deste modo, conforme Ramos (1981) os governos e as organizações estão a desempenhar uma ação progressiva e ativa sem precedentes sobre a vida dos cidadãos, ao valer-se de uma poderosa ferramenta denominada política cognitiva, que está a alcançar as mais variadas áreas e sistemas da sociedade, inclusive a administração pública.

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Página 131 de 215 Importante teoria a se delinear, em amplitude mundial, é a Electoral Budget Cycle (EBC), que se propõe a explicar fenômenos relacionados às variáveis políticas em tempos eleitorais. Suas versões preliminares constam do trabalho de Nordhaus (1975) intitulado “The Political Business Cycle” e do artigo “Political Control of the Economy” de Tuffe (1978). No Brasil, a literatura dessa Teoria Política eleitoral, tem suas evidências em trabalhos como o de Botelho (2002) que escreveu “Determinantes do comportamento fiscal dos estados brasileiros”, e também em artigos como “Federalismo Fiscal, Ciclos Políticos e Reeleição: uma breve análise do caso mineiro”, de Araújo Jr, Shikida e Silva (2002), e o artigo “Ciclos Eleitorais e Política Monetária: Evidências para o Brasil” de Fenolio e Gonçalves (2007). Estes estudos denotam que agentes políticos fazem uso da política cognitiva como instrumento de manipulação do cidadão.

Ao abandonar a hipótese de que os “atores políticos são agentes benevolentes que tomam decisões que visam o bem-estar social a nova economia política nos alerta para o fato de que incentivos privados dos governantes, por exemplo, a busca da reeleição pode exercer importante influência” (FENOLIO; GONÇALVES, 2007, p. 465). Diante do exposto, infere-se a seguinte questão de pesquisa: A política cognitiva está presente nas relações e comunicações entre o candidato detentor de cargo público eletivo e o cidadão contemporâneo, durante o período pré-eleitoral? Deste modo, desponta como objetivo principal investigar a perspectiva da política cognitiva e a relação entre cidadão e político com um olhar direcionado ao espaço tempo do período eleitoral. Ressalta-se que o marco teórico balizador das reflexões expressas no presente ensaio orientam-se pela percepção de Guerreiro Ramos (1981) acerca da abordagem central, política cognitiva.

A proposição de reflexão sobre o tema administração pública e política cognitiva em relação ao espaço tempo tido como período eleitoral se justifica em razão de, em período eleitoral, existir a possibilidade dos governantes virem a utilizarem-se de faculdades específicas, enquanto candidatos. Por isso estão, de maneira excepcional, sujeitos aos freios da legislação, devido às suas tendências a engendrar esforços para obter diferencial em relação aos demais candidatos, pela via de uso da máquina administrativa a fim de alcançar reputação e prestígio, mediante realização de obras, do incremento de serviços, da redução de impostos,

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Página 132 de 215 da criação de novos programas. Pois se acredita que tais condutas tendem a influenciar sobremaneira a mente do cidadão.

2. Metodologia

O presente estudo está estruturado como um ensaio formal, a tomar por base pesquisas do tipo bibliográficas, descrita como qualitativa e fenomenológica. Para Rauen (2006, p. 209), o “ensaio é a exposição metódica dos estudos realizados e das conclusões originais, após o exame do assunto”. O ensaio do tipo formal denota convergências com a forma de texto acadêmico e científico e deve ser breve, sereno, antidogmático e original.

No presente estudo, formula-se a sequência descritiva do histórico de política clássica até o alcance de sua contextualização como política econômica, mediante o uso de fontes bibliográficas tradicionalmente recepcionadas pelo meio acadêmico. A pesquisa bibliográfica ou de referências opera com base em acervo de fontes referenciais e o fato de ser qualitativa implica em não haver conformação com dados.

Por sua vez, os estudos fenomenológicos preocupam-se em estudar “os fenômenos tais e quais vivenciados por uma consciência, com vistas à busca da essência” (RAUEN, 2006, p.46-49). Neste trabalho, o fenômeno em estudo é a (in)volução da política rumo ao surgimento da política cognitiva, a afetar diretamente o modo de vida do cidadão contemporâneo. Deste modo, busca-se atender ao objetivo proposto, qual seja, investigar a perspectiva da política cognitiva e a relação entre cidadão e político com um olhar direcionado ao espaço tempo do período eleitoral.

3. Referencial teórico

O referencial teórico, revisão de literatura, marco teórico ou theorical arguments, ou ainda theoretical background, para Boaventura (2004) objetiva revisar ou demonstrar o que foi escrito sobre o tema, compreende a análise e síntese de informações, no

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Página 133 de 215 intuito de definir as linhas de ação para abordar o problema e gerar idéias novas e úteis.

3.1. O governo da cidade, a política clássica e a economia política

Dos diálogos de Platão, em “A República”, urge o significado de vida que uma cidade pode oferecer ao cidadão: uma cidade justa e verdadeira, preparada para a excelência do bem viver para a felicidade. Para o filósofo, uma cidade bem governada “só pode ser aquela que reproduz, na medida do possível, o real, e o real é uno, imutável e sempre o mesmo, a boa legislação implantada pelo filósofo que o conhece, deverá, portanto, tentar preservar sua unidade, imutabilidade e identidade” (PLATÃO, 2006, p. xxv). Para Platão, o melhor dos governantes era aquele que não deixava a si e à cidade contaminarem-se pelas investidas das benesses políticas e do interesse particular de obter vantagem econômica.

O melhor governante é precisamente aquele que, conhecendo o real, justamente por isso não tem vontade de governar; é aquele que não é movido pelas benesses que tanto atraem os homens à vida política, porque aprendeu a desdenhar dos bens materiais e saberá, como legislador, impedir que a riqueza se insinue na cidade e comprometa a sua unidade (PLATÃO, 2006, xxxvii).

Os gregos destacam-se em descrever a cidade ideal, a cidade da vida em comum. Aristóteles (2001) afirmou: “admitamos que o bem é aquilo que se deve buscar em si e por si”. Para o filósofo o cidadão deveria buscar a excelência das coisas, o viver bem e isso significava buscar a polis, a Política. A política é a expressão sinônima da virtude, da excelência, da boa vida em comum praticada na cidade, pois conforme salienta Aristóteles (2001, p. 21) “é a ciência política, a ciência da conduta individual do homem este formado pelo nous”. O nous, segundo Voegelin (1978), é uma força estruturadora da psique humana que o permite resistir à desordem, a qual foi utilizada por Sócrates, Platão e Aristóteles em seus atos de resistência à doença da idade. A política de Aristóteles, então, “resume os preceitos finalista e eudomista da sua ética: Todos aspiram a viver bem e à felicidade. Toda ação humana está orientada para o bem e para a felicidade que se define como criatividade da alma dirigida pela virtude perfeita” (ARISTÓTELES, 2001, p. 21).

Na Itália, em tempos de final da Idade Média, quando se ouviam os primeiros rumores do Renascimento, Maquiavel propugna uma revisão da Política,

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Página 134 de 215 dissociando-a da Ética clássica dos gregos. Maquiavel (2003) explica o que é e como governar, além de dispor sobre qualidades do bom governante, numa ruptura com o governo modelado no pensamento clássico grego. A partir de então, o governo é construído pela força do discurso, mas muitas vezes era necessário a utilização da força da guerra. Um príncipe, antes de ser amado, que fosse temido e usasse de extrema prudência perante os males causados à vida humana por parte da Santa Sé italiana, em que o príncipe não deve, pois, temer a má fama de cruel, desde que por ela mantenha seus súditos unidos e leais, afinal ele será mais piedoso do que aqueles que, por excessiva piedade, deixam acontecer assassínio ou rapinagem (MACHIAVEL, 2003).

Como visto o panorama histórico vai influir sobremaneira na logicidade do termo política, que aos poucos se vai esvaziando da essência ensinada pelos gregos e tomando contornos idealizado em termos de política econômica.

No início do século XX, o sociólogo Max Weber, entendeu a política como o conjunto de esforços feitos com vistas a participar do poder ou a influenciar a divisão do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado e que todo homem que se entrega à política aspira ao poder (WEBER, 1994). Na perspectiva pessoal, Weber (1994) salienta que ou se vive para a Política ou se vive da Política, e de forma complementar expõe que o homem político era aquele que vê na política permanente fonte de rendas e, portanto, vive da política. Nesta perspectiva, tem-se a definição de como deveria ser o homem político: economicamente independente das vantagens da atividade política; detentor de fortuna pessoal; desobrigado de consagrar toda a sua capacidade de trabalho e pensamento à consecução de sua subsistência (WEBER, 1994).

Ressalta-se a existência de três qualidades determinantes do homem político: paixão no sentido de “propósito a realizar”, como devoção apaixonada a uma “causa”, ao deus ou ao demônio que a inspira; um sentimento de responsabilidade que determine sua atividade; e uma proporção que é capaz de permitir que os fatos ajam sobre si no recolhimento e na calma interior do espírito, sabendo, por conseqüência, manter a distancia dos homens e das coisas (WEBER, 1994).

Para Ramos (1981, p. 4), Weber é conhecido como “verdadeiro crente na insuficientemente qualificada excelência da lógica inerente à sociedade centrada no mercado”. Contudo, esta proposição não alcança sucesso ao considerar-se que,

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Página 135 de 215 contrariamente a exemplo de Adam Smith, Weber não negligenciou a lógica do mercado, mas “a interpretou como requisito funcional de um determinado sistema social, reconhecendo-a como um ethos da existência humana em geral”, sendo em nível de sociedade, no entanto, o homem, “incapaz de resolver essa tensão empreendendo uma análise social do ponto de vista da racionalidade substantiva” (RAMOS, 1981, pp.4-5).

De outra senda, “todo homem vive numa base de troca, de alguma forma, torna-se um comerciante, e a própria sociedade passa a ser aquilo que constitui, de fato, uma sociedade comercial” (SMITH, 1965, p. 22). Portanto, admitia-se a existência de uma força propulsora a conduzir a vida humana consoante os valores confeccionados no mercado.

Noutra vereda paralela, proposta como uma ciência social geral, a economia política concebe algo que será conhecido por vida humana associada, como um resultado da livre interação dos interesses de seus membros. O termo vida associada parece denunciar a fragilidade da sociedade em termos de proporcionar ao humano o retorno à essência do bem viver. Ou seja, o viver em sociedade trará prejuízos à própria essência da vida humana.

Dessa forma, a economia política, a sociedade e a ciência social formal legitimam a isenção da economia doméstica de regulação política. O comércio torna-se a essência da sociedade e a natureza humana é definida conforme as qualificações que um homem tem como comerciante (RAMOS, 1981).

Os teóricos formais atribuem uma dinâmica própria a esse tipo de coletividade, que orienta a interação dos interesses individuais no sentido de uma ordem de conjunto, da qual ninguém está individualmente consciente. Desse modo, a política passa a ser mera articulação de interesses (liberalismo), ou a expressão da sociedade agindo em conjunto, de acordo com suas leis (socialismo). A idéia de ciência social envolve uma redução da vida humana associada, visto como a socialidade é uma dimensão imperfeita da existência humana (RAMOS, 1981).

3.2. O homem normal e o homem patológico

A abordagem antropológica da sociedade centrada no mercado alberga uma nova concepção de política, construída ao longo da história denominada de Política

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Página 136 de 215 Cognitiva, descrita por Guerreiro Ramos, a trazer noções da existência sobre dois tipos de homem: o normal e o patológico.

Azevêdo (2006, p. 236), ao consubstanciar-se de estudos de Guerreiro Ramos, que por sua vez elaborou análise crítica a certa sociologia acadêmica guiada por naturalistas como o francês Emile Durkheim, “as ciências sociais haviam assumido um postulado que se empenhou em considerar como indivíduo normal aquele tipo de homem conformado ou adequado aos quadros psicológicos normativos dos sistemas sociais prevalecentes”. Destarte, este era o homem segundo o modelo de mercado.

A patologia da conformidade social, descrita por Azevêdo (2006, pp. 238-239), afirma, consoante o cunho ideológico de Guerreiro Ramos, que, em essência, o homem normal era “um homem ajustado, não confrontador, e cuja maior característica seria o constante comportar-se de modo a alcançar um estado de perfeita adaptação ao meio social em que vive”. Ou seja, é anormal ou patológico todo homem que não venha a adequar-se ao modelo de mercado. Nesta esteira, o dito homem normal passa a ser desenhado sob um espectro patológico, desvinculado da essência do bem viver.

Esse modelo de homem é, em suma, um indivíduo vulnerável e refém do modelo que impõe normas e faz uso de uma política cognitiva, que transforma suposições comerciais e mercadológicas em modelo de vida humana.

3.3. Administração como ciência e o seu nascedouro no setor público

Os primeiros estudos da administração como ciência demonstram ter seus registros a partir de observações no campo da administração pública ou, mais precisamente, no governo norte-americano. Antes mesmo de Taylor emergir como um dos principais representantes do Business Management, autores norte-americanos passaram a debruçar-se em distinguir para fazer apologia à necessidade de profissionalismo e gerenciamento no âmbito dos Governos, e é exatamente nesse contexto que emerge a ciência da administração com suas raízes na prática da política moderna: “a Ciência da Administração é o mais recente fruto do estudo de Ciência Política, iniciado há cerca de dois mil e duzentos anos atrás. É uma criação do nosso século, quase de nossa própria geração” (WILSON, 1946, p. 350).

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Página 137 de 215 Não obstante, a prática administrativa passasse a ser entendida como gerenciamento em termos de funcionalidade, Wilson (1946, p. 350) não deixou de destacar como elemento essencial à ação promissora do Estado ao aferir que “a Administração é a mais evidente parte do Govêrno; é o Govêrno em ação; é o executivo, operante, o mais visível aspecto do Govêrno, e, naturalmente, é tão antigo quanto o próprio Govêrno”.

Contudo, ao se admitir a Administração como Gerência relacionada à Política, será necessário fazer remissão a trabalhos de Koontz e O‟Donnell (1978); Pettigrew (1973); e Bacharach e Lawler (1980), que possibilitarão observações sobre a Gerência e a Política, os quais remetem a percepção de uma dialética de oposição e ao mesmo tempo de correspondência, que preserva a identidade tanto da Gerência quanto da Política, de tal modo a alcançar razoável complementaridade dialética (AZEVÊDO, 2006).

No Brasil, o comportamento do administrador público afeta diretamente a vida do cidadão, à medida que cabe ao governante a missão de gerenciar a máquina administrativa, a fim de atender à sua finalidade precípua de proporcionar qualidade e constância na oferta de serviços públicos, não somente aqueles serviços reconhecidamente essenciais, como distribuição de água, energia elétrica, saneamento, gás, combustível, telecomunicações, transporte coletivo, mas também os serviços sociais, a exemplo da saúde, da educação, do trabalho, da moradia, da segurança, do lazer e da propriedade.

A atribuição primordial da Administração Pública é, portanto, garantir resultados factíveis aos seus administrados, não se justificando sua presença senão para atender aos anseios da coletividade. A Constituição Nacional dispõe expressamente que incumbe ao Poder Público, a prestação de serviços públicos (MEIRELLES, 2006). Nesse sentido, o dever dos gestores do Estado não se esgota no controle da máquina administrativa interna, pessoal e materiais, mas alcança o dever de cumprimento de uma gama de ações, que a sociedade os delega por meio da Lei Maior (MELLO, 2007). Estes titulares, aos quais cumpre o dever de promoção da vontade superior do Estado e do cidadão, segundo Meirelles (2006) são denominados de agentes políticos, fiéis responsáveis pela boa condução do orçamento público municipal.

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3.4. Política Cognitiva

Em nenhum momento anterior, o processo de socialização humana esteve na situação de nossos dias, subordinado a uma política cognitiva exercida por complexos empresariais que agem sem nenhum controle, ambiente no qual o mercado desempenha o papel de força central modeladora da mente dos cidadãos (RAMOS, 1981). Neste sentido, os padrões cognitivos exigidos pelo mercado transformaram-se em políticas de cognição, induzida do modo particular das estruturas e estratégias das organizações formais, estendendo-se à sociedade como um todo. Deste modo, política cognitiva consiste no uso consciente ou inconsciente da linguagem distorcida, cuja finalidade é levar pessoas a interpretarem a realidade segundo os interesses dos agentes da distorção (RAMOS, 1981, p. 86-87).

Ramos (1981) expõe as posições de Platão e Aristóteles acerca da questão da política cognitiva no contexto da retórica. Platão era avesso ao uso da persuasão política e rememora que o retórico típico não queria conhecer a verdade das coisas, mas unicamente descobrir uma técnica de persuadir, adular a multidão, uma técnica a ser usada perante aqueles que não têm o hábito de pensar, uma vez que o retórico sofista não teria destaque como portador da verdade, dentre os sábios. A postura de Aristóteles foi a de admitir uma retórica dialética, advinda do conhecimento, voltada a formar uma cidadania esclarecida, apesar de ter nítida percepção entre o poder da palavra e o uso de máscaras em prol da política cognitiva, numa visão de subordinação da retórica à ética (RAMOS, 1981).

De acordo com Ramos (1981, p. 90) “A política cognitiva é a moeda corrente da sociedade centrada no mercado” facilmente absorvida pelo cidadão, e neste ambiente os laços comunitários e culturais sofrem colapso, cujo fenômeno conclama por explícita investigação acadêmica, que venha a considerar questões de ordem sociológicas, antropológicas, psicológicas, lingüísticas, de comunicação, dentre outras.

Nestas condições, os padrões de mercado para pensamento e linguagem tendem a tornar-se equivalentes a padrões gerais de pensamento e linguagem, a padrões de vida. Assim, as organizações são sistemas epistemológicos e estão a desempenhar um papel ativo sem precedentes, ao passo que não sofrem resistência alguma quanto a influencia que exercem sobre a vida dos cidadãos, ao valer-se de

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Página 139 de 215 uma poderosa ferramenta denominada política cognitiva (RAMOS, 1981). Tais sistemas organizacionais têm por metas a atualização pessoal. Pois há, no entanto, uma tensão contínua entre os sistemas organizacionais e os atualizadores, e afirmar que o indivíduo deve buscar equilíbrio orgânico com a empresa corresponde a recomendar a deformação da pessoa humana (RAMOS, 1981).

O homem parentético seria altamente preocupado com a „atualização de seu potencial‟, entrando em fortes conflitos com as atividades que não correspondessem às suas necessidades de atualização pessoal (AZEVÊDO, 2006). Do ponto de vista da psicologia centrada no indivíduo “o homem é doente - não apenas o neurótico ou psicótico, mas igualmente aquele que é chamado de homem „normal‟ - porque esconde o seu eu real na transação com os outros, equipara os papéis que desempenha nos sistemas sociais à própria identidade” (JOURARD, 1964, apud RAMOS, 1981, p. 99-100).

A psicologia sociomórfica motivacional utilizada e depois perpetuada pela disciplina organizacional existente representa um aspecto da síndrome comportamentalista detida na sociedade de mercado. A sociedade de mercado impõe ao homem que possua um emprego, no qual se estabelece a divisão do trabalho, pois todo homem vive numa base de troca ou, de alguma forma, torna-se um comerciante, e a própria sociedade passa a ser aquilo que constitui, de fato, uma sociedade comercial (SMITH, 1965). Neste sentido, a política cognitiva constitui dimensão inevitável dessa hipertrofia do mercado, e a teoria administrativa, aceitando a presente estrutura de emprego como um traço permanente da economia, falha em compreender a difícil situação organizacional dos cidadãos americanos (RAMOS, 1981).

3.5. O período eleitoral, as contribuições trazidas pelos estudos econômicos e o uso da Política Cognitiva em período eleitoral

O período eleitoral é estabelecido no Brasil pela Constituição Federal de 1988, quando a cada quadriênio deve existir uma eleição de representantes políticos para comandar a administração pública, ou seja, aqueles que deverão governar e legislar no próximo período legislativo ou mandato.

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Página 140 de 215 A Lei Federal nº 9.504/97 representa um marco regulatório para as eleições na União, nos Estados e nos Municípios. Pela Constituição Federal e por essa Lei são definidas disciplinas de como e quando se conduzir ao processo eleitoral, bem como que as eleições serão realizadas e fiscalizadas pelos Tribunais Eleitorais, no âmbito Federal e no âmbito Estadual. O período eleitoral prevê limitações e sanções severas às ações dos candidatos enquanto governantes, porém mesmo assim, verifica-se razoável condição de vantagem, destes em relação aos demais, em termos de uso da política cognitiva e da máquina administrativa governamental em prol daquele que anseia a permanência no cargo.

O comportamento político, ao buscar, a qualquer custo, o resultado de mantença no poder, pela via de manipulação do eleitor laico, expõe a fragilidade do sistema político contemporâneo. Este fenômeno é vislumbrado, inclusive, em países desenvolvidos da América do Norte e da Europa. Estudos como o de Baber e Sen (1986, apud BATISDA; BEYAERT; BENITO, 2008), deixam suas contribuições ao investigar o ciclo eleitoral na Albânia e inferir que em um ambiente pré-eleitoral, sob o ponto de vista político, o sucesso depende de outros fatores, que não, a macroeconomia. Também Blais; Blake e Dion (1992) elaboraram estudos sobre a hipótese de influência da EBC nos déficits públicos na Índia e verificaram que certas medidas aparentemente "populares" antes de uma eleição contrapõem-se a medidas com reflexos "impopulares" percebidas após as eleições. Ainda na década de setenta, Nordhaus (1975, p. 182) chamava os eleitores de “míopes” ou que tinham “memória cadente de eventos passados”, e, por isso, facilmente eram enganados por políticos.

Salienta-se que pesquisadores concentram-se na referida questão, principalmente no nível do governo central, pois perceptível é ser mais fácil usar ferramentas como o orçamento disponível para aumentar as chances eleitorais do que, por exemplo, investir esforços para aumentar a Produto Interno Bruto, em certas condições especiais, a evidenciar a presença da política cognitiva.

4. O cultivo de uma atitude parentética, em resposta à política

cognitiva

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Página 141 de 215 Estudo que despertavam preocupação relacionada às condições patológicas do homem foram levados a cabo por Guerreiro Ramos, que denunciou “a impotência do homem contemporâneo para alcançar a sua realização pessoal nos típicos arranjos sociais da época, apontando, assim, para a urgente tarefa de se pôr em questão os sistemas sociais” (AZEVÊDO, 2006, pp. 242-243). Nesse sentido, as considerações guerreirianas culminaram por propor um esforço integrado à formulação de atitudes parentéticas por parte do homem contemporâneo.

Dentre estas suposições de Guerreiro Ramos, ao retomar a distinção feita por Weber, Manheim e Voegelin, Azevêdo (2006, p. 245) destaca a “racionalidade noética” ou substantiva, procurando demonstrar que uma sociedade somente poderia vir a se transformar em uma boa sociedade à proporção que a “razão noética” assumisse o “caráter de força criadora” e exercesse “influência sobre a vida humana”. É desta forma, que a vida humana poderia voltar a ter a sua essência restaurada para o propósito do viver bem, não alienado.

O homem parentético, portanto, é definido como um ser racional no sentido noético ou substantivo, que cultiva o empenho em atualizar as suas potencialidades (AZEVÊDO, 2006). Este homem, ao viver “de acordo com os imperativos éticos dessa razão, o homem transcede a condição de um ser puramente natural e socialmente determinado, e se transforma num ator político” (RAMOS, 1981, p. 28).

5. Considerações finais

A distorção que o termo política sofreu ao longo da história, provocou (in)volução na vida boa do ser humano, ora por parte das mudanças de consciência sobre si mesmo, ora quanto ao ambiente em que está inserido, devido às pressões que o mercado, deliberadamente exercidas mediante uma política cognitiva corrosiva à vida humana associada como um todo.

A ciência política, no curso dos tempos, alcançou diversos sentidos, desde a essência mais excelente do bem viver até a fase de crítica política cognitiva praticada na atualidade, nos mais diversos setores da sociedade moderna, seja ela por parte da imprensa, do comércio, no ambiente organizacional, e mesmo pelos representantes do poder público, representantes fiéis da antiga polis.

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Página 142 de 215 Como se pode perceber o modelo de mercado vai-se impregnando, cada vez mais, na mente humana como algo normal e pertencente à sua natureza, e apesar de patológico, o modelo de sociedade centrada no comércio e no mercado, fato reconhecido por diversos sociólogos, pode rechaçar a vida humana conduzindo o homem a um modelo de homem que vive como um animal, o homem zoomórfico, alienado e escravo do sistema.

Numa construção metodológica, pautada em aglutinada base bibliográfica, originária, principalmente, da economia política e da sociologia, percebe-se que a política cognitiva está presente nas ações dos governos, especialmente a conduzir o comportamento dos agentes políticos enquanto candidatos, em períodos eleitorais.

De acordo com o que preconiza Azevêdo (2006), a sociedade precisa converter-se aos padrões ensinados pelos filósofos da antiguidade, que destacaram o homem parentético como portador de uma “racionalidade noética” ou substantiva, que procurava construir uma boa sociedade à proporção que a “razão noética” assumisse o “caráter de força criadora” e exercesse “influência sobre a vida humana”. Sendo assim, propõe-se, mediante este ensaio, reconduzir a mente humana para um retorno a um novo padrão de vida humana, quando percebidas as condições patológicas provocadas pelo mercado. Essa é uma proposta de restauração da essência do humano e do seu viver bem, não alienado.

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Sobre os autores

Luciane Maria Gonçalves Franco - Doutoranda em Gestão Urbana no Programa

de Doutorado em Gestão Urbana na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Atualmente atua como Analista de Controle no Tribunal de Contas do Estado do Paraná. E-mail: lutc@tce.pr.gov.br

Cristiano do Nascimento - Pesquisador na área científica de Ciências Contábeis,

com foco de pesquisas em Contabilidade Gerencial e Contabilidade Pública. E-mail: cristiano.do.nascimento@live.com

Referências

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