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Anais do Sétimo Encontro Nacional de Acessibilidade Cultural

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Academic year: 2021

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Anais do Sétimo

Encontro Nacional de

Acessibilidade Cultural

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Sumário

Relato do Processo de Montagem do Espetáculo Acessível “A História do Peixe Grande” ... 4

Sensibilização e oficinas sobre Diversidade no Museu de Geodiversidade como estratégia para a acessibilidade em sua dimensão atitudinal ... 10

Por entre obras de arte, cafés e diferentes públicos: uma experiência transdisciplinar em acessibilidade cultural. ... 17

ALUNO FAZ FOTO? O fotografar na escola (especial) ... 24

Vivência Linguística, Cultural E Artística No Aprendizado De Libras Por Alunos Ouvintes De Artes: Relatos De Experiências Do Evento Artes & Libras Em Ciclo ... 29

Acessibilidade em Museus: O Estado da arte dos museus nacionais portugueses ... 41

Acessibilidade para pessoas com deficiência visual: Resultados do Memorial do Anglo UFPel ... 47

Terapia Ocupacional em Museus: Acessibilidade Cultural para pessoas com deficiência ... 52

Diagnóstico de Acessibilidade da Biblioteca do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro ... 57

Relato de experiência da Oficina de Sapatos em uma turma inclusiva (?) ... 64

Fotogrametria digital e modelagem escultural como documentação de um acervo museológico: o caso de uma conversadeira do Museu da Baronesa/Pelotas, RS ... 70

Jardim sensorial do Parque das Ciências: uma proposta de espaço para inclusão na interface com a alfabetização científica e educação para a sustentabilidade ... 77

ACESSIBILIDADE CULTURAL EM TEMPOS DE RESISTÊNCIA acesso, acessibilidade e cultura expressões da “questão social” contemporânea ... 82

Orientações para produção de LSE de vídeos em Libras ... 90

Museu da Baronesa para todos: uma questão de acessibilidade. ... 96

A consultoria musical na elaboração de roteiros de audiodescrição PARA concertos de música instrumental erudita: Um processo de musicalização ... 102

Acessibilidade comunicacional em vídeo-documentário: da criação (in-vitro) a validação de sinais-termo na LSB ... 109

Construindo Trajetórias Acessíveis para Pessoas Surdas na Plataforma OBAMA ... 116

Acessibilidade programática dentro de uma pró-reitoria de extensão: Desafios e Possibilidades ... 123

A Tribo da Lakota: explorando os sentidos - Um estudo sobre a acessibilidade e inclusão através da coletânea de livros infantis A Tribo da Lakota ... 128

Livros que tocam: a definição dos materiais na concepção de livros ilustrados táteis ... 135

TRADUÇÃO AUDIOVISUAL ACESSÍVEL: Língua de Sinais e Legendas para Surdos e Ensurdecidos para o ‘making of Boi Encantado uma história cantada’ ... 141

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Audiolivro na remição de pena pela leitura: um estudo com as apenadas do Presídio Regional de Pelotas ... 155 Os direitos culturais das pessoas com deficiência no Brasil ... 162 Representações das Casas Gêmeas por tecnologias de fabricação digital: uma contribuição para o acervo tátil do entorno da praça Cel Pedro Osório, Pelotas ... 168 Publicação de literatura multiformato para crianças ... 175 Design orientado para o tato: elaboração de guia para a representação de figuras táteis para o estímulo precoce em crianças deficientes visuais ... 181 Licenciatura em Teatro: por um currículo mais inclusivo ... 187 Subjetividade e emoção em um roteiro de audiodescrição ... 191 Apresentação e análise da confecção do mapa tátil da exposição “Memórias da Terra” no Museu da

Geodiversidade (IGEO/UFRJ) ... 197 Sensibilização e oficinas sobre Diversidade no Museu de Geodiversidade como estratégia para a

acessibilidade em sua dimensão atitudinal ... 204 Tecnologia como forma de acessibilidade e aproximação das comunidades surdas: o éthos surdo na

contemporaneidade. ... 211 Poéticas da voz e deficiência visual: O diálogo entre peça sonora, contação de histórias e audiodescrição na escola ... 220 Sensibilização em Acessibilidade Cultural: resultado Bonito (MS – Brasil) ... 226 PROJETO GETLibras: Experiência de interpretação Português-Libras na Parada de Luta LGBTI de Porto Alegre de 2019 ... 237

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Relato do Processo de Montagem do Espetáculo Acessível

“A História do Peixe Grande”

Report on the staging of the accessible play "The Tale of The Big Fish"

Aline Pereira Gomes da Silva Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ alinepereiragomes@gmail.com

Resumo

O presente trabalho é o relato do processo de montagem do espetáculo teatral “A história do peixe grande”, idealizado para ser acessível em sua estética às pessoas com deficiência. A proposta foi criar um espetáculo onde a percepção sensorial das pessoas cegas e surdas fosse a base para a criação de uma poética para a cena. Para tanto, estudamos a percepção sob o viés de Maurice Merleau-Ponty e as poéticas da arte contemporânea multissensorial. A metodologia utilizada foi a pesquisa participativa, na qual a pesquisadora é também autora, diretora e atriz espetáculo. Os registros foram realizados a partir de fotos, vídeos e entrevista com os participantes.

Palavras-chave: teatro; acessibilidade; multissensorial.

Abstract

The present work is the account on the process of setting up the theatre play “The tale of big fish”, designed to be accessible in its aesthetics to people with disabilities. The idea was to create a play where the sensory perception of blind and deaf people was the basis for the creation of poetics for the scene. For this, we have studied perception under the perspective of Maurice Merleau-Ponty and the poetics of multisensory contemporary art. The methodology used was participatory research, in which the researcher is also author, director and actress. The records were made from photos, videos and interviews with the participants.

Keywords: theater; accessibility; multisensory.

Introdução

A criação do espetáculo musical multissensorial “A História do Peixe Grande” nasceu da ideia de fazer um espetáculo infantil com objetivo de ser acessível a todos. A proposta foi pensar a estética da obra, desde a dramaturgia até a recepção do público, para ser acessível a pessoas com

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deficiência. Ou seja, o objetivo era que todos pudessem fruir o espetáculo à sua maneira, em equidade de oportunidades.

Geralmente, para se promover a acessibilidade de uma obra teatral tradicional, são utilizadas diversas tecnologias assistivas, tais como audiodescrição, estenotipia, tradução em Língua Brasileira de Sinais, etc. Esses recursos estão disponíveis para auxiliar a desobstruir as barreiras que se interpõem às peças de teatro. Pois entendemos as pessoas com deficiência, como “aquelas que têm impedimentos de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade como as demais pessoas” (BRASIL, 2007, p. 16).

Contudo nosso questionamento sempre foi se esses recursos proporcionam acessibilidade estética ou ficam limitados a dar acesso às informações e ao enredo do espetáculo. Para melhor compreendermos o que estamos chamando de experiência estética, utilizaremos a concepção de John Dewey (2010), que atribui ao espectador um papel ativo e criativo na formação da obra, sendo a recepção estética, para ele, uma ação de recriação do processo de produção. O artista cria apenas o "produto artístico", mas a "obra de arte" é o que ele provoca em quem o experimenta.

Sendo assim, o presente relato não trata da realização de um projeto de acessibilidade para um espetáculo teatral e sim da proposta de investigação de uma poética para a cena teatral a partir da lógica sensorial da pessoa com deficiência. Nele serão discutidas as referências utilizadas: a percepção segundo Maurice Merleau-Ponty e a arte multissensorial; as soluções propostas para a cena e as dificuldades encontradas no processo de montagem, que ainda segue em construção.

Para a realização da pesquisa, a metodologia utilizada foi a observação participativa, onde a pesquisadora também é autora, diretora e atriz no processo criativo. Sendo assim, para a coleta de dados foram utilizados os recursos de diário de campo, para registrar as atividades propostas, bem como a filmagem de ensaios, exercícios e laboratórios realizados no processo e entrevistas com os demais participantes do espetáculo.

1. Fundamentação Teórica

1.1 A percepção do mundo

O homem percebe o mundo por meio de seus sentidos: visão, tato, audição, paladar, cinestesia etc.; que são gerados a partir do corpo, como explica Maurice Merleau-Ponty (1990, p. 92): “perceber é tornar algo presente a si com a ajuda do corpo”. Ou seja, na visão fenomenológica do filósofo, a percepção do mundo não é criada ou dita, mas “[...] ao contrário: o mundo é aquilo que nós percebemos” (MERLEAU-PONTY, 2006, p. 14). Nessa perspectiva, pode-se dizer que a experiência perceptiva de cada sujeito vem da relação de seu corpo com os objetos, com as pessoas, com o mundo. Então a ausência ou a perda de um dos sentidos gerará uma nova forma de percepção, uma experiência perceptiva particularmente diferente.

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Sendo assim, a aposta em uma poética multissensorial para o espetáculo “A História do Peixe Grande” foi uma escolha para que cada indivíduo pudesse perceber o espetáculo à sua maneira.

1.2 A arte multissensorial

A partir das décadas de 1960 e 1970, não se podia mais definir se a arte tinha uma forma substancial ou se era um conjunto de ideias de como perceber o mundo, devido à multiplicidade de atitudes e abordagens. As obras contemporâneas articulam diferentes linguagens e a experiência proposta ao espectador não é mais passiva, e sim um convite a construir junto a obra de arte, proporcionando uma pluralidade de significados, pois cada pessoa interpreta a partir de sua percepção de mundo, já que “todo ponto de vista é a vista de um ponto” (BOFF, 1997).

O teatro desse período descobre outras teatralidades, ou seja, outras formas de se pensar a cena teatral, que passa a ter diversos enunciadores, tais como a música, o figurino, a luz, o cenário, etc., num jogo de signos. O texto dramático perde, então, sua hegemonia na construção dos espetáculos e passa a ser um de seus componentes:

A percepção linear e sucessiva, característica do teatro moderno é substituída pela percepção simultânea, em que várias cenas e elementos de linguagem se sobrepõem, engendrando uma construção cênica que desafia o espectador a decodificar, relacionar e interpretar um conjunto cada vez mais complexo e multifacetado de elementos de significação. (DESGRANGES, 2006, p. 145).

É uma nova forma de utilização dos significantes do teatro que provoca uma nova forma de relação com o espectador, por meio de uma experiência partilhada.

2. O Processo de Montagem

2.1 A construção da dramaturgia

A história escolhida para ser o enredo do espetáculo conta a trajetória de uma menina, Liana, que tem muito medo de água. Ela é filha de um pescador e se vê tendo que vencer um grande desafio: ser levada pelo Peixe Grande, o rei dos peixes, para o fundo do rio, por conta de uma promessa feita por seu pai para salvar sua família da fome. Por se tratar de uma história de tradição oral, e não de um texto dramático, foi possível termos liberdade para criar a dramaturgia já pensando na acessibilidade.

Portanto, o texto teatral foi estruturado de tal forma para que não fosse preciso o uso de audiodescrição, “técnica onde a linguagem visual (imagens) é transformada em linguagem verbal (texto)” (SARRAF, s/d), pois todas as descrições de movimento mais significativas na cena estão na boca dos atores-personagens-narradores, numa atuação rapsódica. O conceito de rapsódia, criado e desenvolvido por Sarrazac no livro O futuro do drama, (2002) é uma clara alusão aos rapsodos, que na antiguidade grega narravam as epopeias homéricas.

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2.2 A direção de movimento

Tanto a direção de movimento quanto a preparação corporal dos atores foi feita pela atriz e bailarina surda Flávia Óliver, que iniciou o trabalho propondo aos atores que contassem a história sem nenhuma fala, apenas com gestos, num exercício pertinente ao teatro físico, “que também pode ser caracterizado como uma versão singular da mímica pós-moderna”. (GUINSGURG, P.158). O resultado da atividade foi muito satisfatório, pois mesmo sem falas, a história conseguiu ser contada e entendida.

Após esse momento, quando inserimos o texto, detectamos a necessidade de uma frontalidade na máscara facial do ator. Ou seja, todas as falas no espetáculo são ditas para frente, com objetivo de proporcionar a leitura labial para pessoas surdas.

Passado o primeiro momento de estranhamento da proposta por parte do elenco, composto por Aline Gomes, Celo Miguez, Luciano Moreira e Victor Nalin, o resultado foi a criação de um jogo teatral pulsante entre os atores e uma estética única para a peça.

2.3 Música

Como o espetáculo é um musical, diversas partes da narrativa são cantadas, sendo acompanhadas pelo violonista cego Jonas Santiago (figura 1), responsável também pela criação dos climas sonoros para as cenas. Jonas também participou de outros momentos do processo criativo, funcionando como consultor cego para diversos aspectos da cena.

Figura 1. Foto da cena. Descrição da imagem: À esquerda, quatro personagens narradores, sendo dois homens e duas mulheres. Três estão em pé e uma está sentada, olhando para o boneco, que é uma cachorra. À direita, do outro lado do palco, o músico Jonas Santiago sentado em uma cadeira tocando violão, com óculos escuros. E ao seu lado esquerdo, o intérprete de Libras, com roupa preta.

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2.4 O uso do espaço/ cenário

A partir da necessidade da visita guiada ao cenário criado por Tiago Costa, iniciamos o projeto de construção de um tapete sensorial, para que o passeio pela casa da Liana, pelo rio e pelos outros elementos de cena ficasse mais significativo. Este recurso está sendo criado com diversas texturas e aromas, sendo um grande piso podotátil.

2.5 Recursos táteis e olfativos

Além do tapete sensorial, há também algumas surpresas como o rio de tecido leve e aromatizado que passa por cima da cabeça do público.

Também estão disponíveis ao toque os figurinos e adereços dos personagens, que foram pensados pelo figurinista Ricardo Bessa e o aderecista Leonardo Diniz.

Figura 2. Rio de tecido perfumado passando pela plateia. Apresentação no Sesc Quitandinha. Descrição da imagem: Fotografia horizontal da cena. Em primeiro plano, o tecido fino azul claro com tiras de plástico passa por cima das cabeças de crianças e adultos, que com as mãos o levam adiante. Ao fundo, duas personagens femininas observam o movimento. Por trás delas, a casa cor de rosa do cenário, com uma porta e uma janela de tecido claro. A apresentação acontece embaixo de uma tenda branca. Ao fundo, vê-se árvores.

3. Análise dos Resultados

A estreia do espetáculo se deu no dia 29 de abril de 2019, na I Mostra de Arte Singular, evento produzido pela PAR Produção em parceria com a Federação de Teatro Associativo do Estado do Rio de Janeiro - FETAERJ, através da co-gestão Chacrinha Em Cena, no qual participaram projetos de desenvolvimento e difusão de produtos culturais e artísticos, em que parte ou totalidade dos seus integrantes fossem pessoas com deficiência.

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Essa apresentação foi de suma importância para dialogar com outros grupos que também são compostos por pessoas com deficiência, e para levantar parte dos recursos para a montagem, que não teve patrocínio. Porem a maior surpresa foi perceber que na plateia do evento, no dia da nossa apresentação, não havia nenhuma pessoa com deficiência. Sendo assim, ficamos impossibilitados de concluir a pesquisa, pois o teatro só se completa com a presença do público e depois continua se transformando por meio da interação e do diálogo com o espectador, que como vimos, nessa proposta, também é criador.

4. Considerações Finais

Acreditamos que o processo de montagem não seja um fim, mas um ponto de partida, pois certamente a obra irá se modificar com a interação do público, principalmente do público com deficiência, que dará suas impressões e sugestões. Nossa proposta foi fazer uma provocação, dar um pontapé inicial ao investigar a criação de um espetáculo que tivesse a deficiência como um provocador para a poética da cena, e para isso foi necessário pesquisar uma nova estética, a partir dessa outra condição sensorial da existência.

Registramos aqui a necessidade da continuação dessa pesquisa, agora com o enfoque na recepção do público com deficiência. Na verdade do público em geral, pois trata-se de um espetáculo feito para todos, onde o propósito é sempre unir, estarmos juntos na nossa diversidade.

Referências

BOFF, Leonardo. A águia e a galinha. Vozes, 1997.

BRASIL. Deficiência. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Brasília: CORDE, 2007. DESGRANGES, Flávio. A pedagogia do teatro: provocação e dialogismo. São Paulo: Editora Hucitec, 2006.

DEWEY, John. Arte como experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2010.

FÍSICO. In: GUINSBURG, J., FARIA, João Roberto, LIMA, Mariâgela Alves. Dicionário do teatro brasileiro. São Paulo: Perspectiva: Edições SESC SP, 2009.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da Percepção. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006. SARRAF, Viviane. Audiodescrição para exposições, museus, centros culturais e centros de

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Sensibilização e oficinas sobre Diversidade no Museu de Geodiversidade

como estratégia para a acessibilidade em sua dimensão atitudinal

Awereness raising and workshops about Diversity at the Museu da Geodiversidade

as a strategy for accessibility in its attitudinal dimension.

Tatiana Fonseca, Graduada em Terapia ocupacional; Nathally Rosário, Graduanda em Arquitetura e Urbanismo;

Aline Castro, Doutora em Geologia; Damiane Santos; Especialista em Acessibilidade Cultural; Patricia Dorneles, Pós-doutorado em Terapia ocupacional. Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ

tatianacbfto@gmail.com; ndearosario@gmail.com; aline@geologia.ufrj.br; damiane@igeo.ufrj.br; patricia.dorneles.ufrj@gmail.com.

Resumo

Este trabalho é um relato de experiência com foco nas sensibilizações e oficinas realizadas no Museu da Geodiversidade (IGEO/UFRJ) pelo projeto de extensão “Um museu para todos: adaptação da exposição Memórias da Terra (MGeo-IGEO/UFRJ) para a inclusão da pessoa com deficiência”. O projeto possui um forte caráter transdisciplinar entre os conhecimentos da geografia, geologia, museologia, terapia ocupacional, arquitetura e urbanismo, letras-LIBRAS e ciências da computação. As propostas de sensibilização e as oficinas têm como objetivo a apresentação e discussão da acessibilidade cultural para pessoa com deficiência com enfoque na dimensão atitudinal e tem se mostrado muito potente para se pensar e oportunizar a inclusão de pessoas com deficiências em ambientes culturais. Por meio dessas ações tem sido possível contribuir para a promoção da cidadania e do direito cultural da pessoa com deficiência dentro da instituição e transpor tais discussões através do caráter extensionista do projeto que busca a articulação com a comunidade, indo além dos muros institucionais.

Palavras-chave: Museu da Geodiversidade; Acessibilidade; Dimensão Atitudinal.

Abstract

This paper is an experience report focusing on awareness raising and workshops held at the Geodiversity Museum (IGEO / UFRJ) by the extension project “A museum for all: adaptation of

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the Memories of the Earth (MGeo-IGEO / UFRJ) exhibition to include disabled person ”. The project has a strong transdisciplinary character among the knowledge of geography, geology, museology, occupational therapy, architecture and urbanism, LIBRAS letters and computer sciences. Awareness raising proposals and workshops aim to present and discuss cultural accessibility for people with disabilities with a focus on the attitudinal dimension and have shown very potent to think about and facilitate the inclusion of disabled persons in cultural environments. Through these actions it has been possible to contribute to the promotion of citizenship and cultural rights of persons with disabilities within the institution and to transpose such discussions through the extension character of the project that seeks articulation with the community, going beyond the institutional walls.

Keywords: Museu da Geodiversidade; Accessibility; Attitudinal Dimension.

Introdução

O Museu da Geodiversidade vem traçando trajetórias em torno da acessibilidade cultural dentro do projeto de extensão “Um museu para todos: adaptação da exposição Memórias da Terra (MGeo-IGEO/UFRJ) para a inclusão da pessoa com deficiência”. Por ser um espaço cultural e apresentar possibilidades de fruição singulares, traz a urgência de se refletir sobre a diversidade humana que ali pode ocupar. A Declaração Universal de Direitos Humanos¹ aponta que toda pessoa tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do processo científico e de seus benefícios, bem como a proteção dos interesses morais e materiais das mesmas.

No Brasil há legislações e normas vigentes que visam garantir o acesso ao conhecimento científico. A equipe do Museu da Geodiversidade vem articulando parcerias dentro e fora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) de diversos modos. Nos ambientes culturais da UFRJ o desenvolvimento de capacitações e sensibilizações tem sido cada vez mais frequentes com o objetivo de quebrar barreiras atitudinais (SASSAKI, 2009). Dentro do Museu da Geodiversidade, tais iniciativas buscam envolver não só os estudantes e profissionais da instituição de modo interdisciplinar, mas em sua função extensionista convida a comunidade buscando incluir as pessoas com e sem deficiências a se aproximarem das discussões sobre cidadania cultural.

Desse modo ao pensar e repensar espaços compartilhados para que eles sejam de fato inclusivos e favoreçam as pessoas a fruírem das experiências sem necessidade de recursos que ocasionem exclusão, segregação ou apenas a integração das pessoas com deficiências nos mais diversos ambientes. Tal dinâmica por ser muito complexa exige de muita discussão, a qual não é possível sem a participação de sujeitos engajados.

1. Fundamentação teórica

Com base nos conceitos desenvolvidos por Sassaki (2009), a acessibilidade se dá por meio de seis dimensões que se atravessam. São elas: a arquitetônica relativa às barreiras físicas; a

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programática que são através de políticas públicas, normas, legislações e etc; a comunicacional nos meios de informação entre pessoas; metodológica nas diversas possibilidades dentro dos processos de aprendizagem na educação, lazer e trabalho; instrumental referente às barreiras nas ferramentas, utensílios, instrumentos e etc. e a atitudinal no que se referem aos estigmas, preconceitos, estereótipos e discriminação que podem ser resultado da falta de conhecimento sobre aspectos plurais e singulares das pessoas com deficiência. Tendo como base essas dimensões essa proposta se dá no aspecto atitudinal em vista que as relações sociais que se mostram como diferencial nas dinâmicas que ocorrem nos diversos espaços.

No contexto nacional, desde a Constituição de 1988, foram consolidados direitos fundamentais para pleno desenvolvimento da cidadania do povo brasileiro. No que diz respeito à pessoa com deficiência, apenas nos anos 2000 com a lei de nº 10.098 surgem às primeiras orientações em relação a providências à promoção da acessibilidade. Na continuidade das políticas públicas em 2008 o Brasil se torna signatário da Convenção Internacional das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas ocorrida em 2007.

Em 2015 com a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI) – Lei nº 13.146, passa a se discutir a deficiência através do modelo social deixando de lado modelo médico. Com isso muito do que se relacionava à ineficiência no modelo médico, passa a ser visto como diversidade no modelo social, entendendo também as deficiências das estruturas sociais para a fruição das pessoas com deficiência e passa a considerar o contexto a que essa pessoa está inserida. Dessa forma, buscou-se garantir o direito em diversas camadas do contexto social, tais como saúde, educação, moradia, trabalho, assistência social, transporte e à mobilidade, a cultura, ao esporte, ao turismo e ao lazer.

No que diz ao direito de acesso à cultura, Oliveira e Sarraf (2016, p. 152) afirmam:

A garantia do direito de acesso à cultura para pessoas com deficiência promove uma nova dinâmica no universo da arte e das manifestações culturais, uma vez que acolhe e celebra a diversidade de nossa sociedade e elimina barreiras de atitude que ainda existem, mas que devem ser superadas.

Dentro dos espaços culturais uma estratégia para trabalhar a dimensão atitudinal é através de capacitações, sensibilizações, rodas de conversa entre outras atividades de interação dialógica entre pessoas com e sem deficiência. O que permite abordar aspectos relativos às diversas especificidades humanas, bem como as deficiências dos espaços compartilhados que não dão condições de fruição estética as pessoas com deficiência. Através dessa construção coletiva é possível de forma interdisciplinar gerir tais espaços, tendo em vista a importância da participação ativa de pessoas com deficiência para se pensar e implantar políticas públicas.

2. Metodologia e análise de dados

As atividades de sensibilizações e as oficinas foram organizadas pela equipe do MGeo envolvida com o projeto de extensão “Um museu para todos: adaptação da exposição Memórias da Terra (MGeo-IGEO/UFRJ) para a inclusão da pessoa com deficiência”, sendo uma das atividades

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realizada pela equipe junto a disciplina de Acessibilidade Cultural do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em parceria com o Projeto ReAbilitArte.

A divulgação das atividades ocorreu por meio digital através de redes sociais abertas ao público em geral e internamente foi realizado a divulgação através de materiais impressos e digitais entre estudantes e profissionais da instituição. Foram desenvolvidas as seguintes ações:

O curso de extensão “Aprendendo a lidar com a diversidade” foi realizado após a elaboração da cartilha “Aprendendo a lidar com a diversidade” desenvolvida pela equipe do MGeo e que traz aspectos relativos a pessoa idosa, o autismo, a deficiência visual, a deficiência física e mobilidade reduzida, a deficiência intelectual, a paralisia cerebral, a surdez e a deficiência auditiva. O curso foi realizado em 04 de agosto de 2015, com carga horária de 8 horas e foi organizado por residentes, graduandas e docentes de Terapia Ocupacional. A ação de sensibilização teve como público-alvo professores da rede pública de ensino, profissionais de áreas culturais, a equipe de profissionais e os mediadores do MGeo. Entre os objetivos do curso estavam: discutir acessibilidade cultural, abordar a dimensão das barreiras atitudinais para recepção e atendimento com qualidade de pessoas com deficiência em museus e espaços culturais, viabilizar a cartilha, promover a divulgação das propostas do MGeo e buscar a consolidação de parcerias, visando a formação de público.

No primeiro momento foram apresentados aspectos gerais da deficiência, políticas culturais e sobre Tecnologia Assistiva e suas possibilidades no processo de inclusão. Os visitantes foram convidados a utilizar alguns recursos como tapa olho, cadeira de rodas, imobilizadores de membros superiores e inferiores, fones de ouvido e óculos (que de diferentes formas reduziam a visão dos participantes), e visitar o espaço expositivo para poder perceber como as limitações podem dificultar a fruição estética.

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Figura 1 - Atividade de mediação no MGeo.

Figura 2 - Mediação com participantes da 1ª capacitação.

[Início da Descrição. Figura 1: Foto do participante tocando o Geodo de ametista que tem cor roxa na parte central e em suas extremidades coloração mais esbranquiçada. Figura 2: Há três pessoas na foto, uma sendo conduzida na cadeira de rodas e outras duas acompanhando logo atrás. Fim da descrição]

Outras edições do curso foram realizadas em diferentes formatos dependendo da disponibilidade de horário dentro de eventos realizado no IGEO.

Na 8ª Semana de Integração Acadêmica que ocorreu em 2017 foi oferecida uma oficina de sensibilização com formato bem menor, mas com o mesmo público diverso, que incluía alunos, servidores e a comunidade externa ao público que participava da Semana de Ciência e Tecnologia. Uma turma de jovens do ensino regular experimentou o espaço expositivo do Museu da Geodiversidade com recursos que traziam limitações funcionais. O retorno sobre do grupo após a atividade foi positivo, alguns estudantes falaram como o fone de ouvido dificultou a comunicação com colegas, assim como o incômodo de não conseguir enxergar durante o percurso.

Nos dias 12 e 13 de novembro de 2018 ocorreu a “Sensibilização Sobre Acessibilidade Cultural No Museu Da Geodiversidade” para os funcionários do IGEO e público interessado para retomada das discussões sobre a dimensão atitudinal nas relações do cotidiano.

No dia 17 de julho de 2019 ocorreu dentro da programação de treinamento dos bolsistas do Museu da Geodiversidade a Sensibilização sobre acessibilidade e aspectos gerais de algumas deficiências junto a discussões de estratégias na mediação em prol da acessibilidade.

As ações vêm possibilitando a criação de um espaço para discutir e refletir acerca de algumas das deficiências humanas existentes, e o direito ao acesso a espaços de cultura e o alcance do conteúdo abordado. As atividades se mostraram muito positivas com os mediadores que puderam perceber e repensar as mediações a partir da experiência. Importante ressaltar o cuidado de não se criar estigmas sobre pessoas com deficiência, a vivência foi realizada para que os participantes possam compreender como limitações interferem na independência e autonomia dentro de espaços em um breve momento e colaborar na construção de um Museu da Geodiversidade mais inclusivo.

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As atividades precisam envolver tanto o público, como os profissionais e todas as pessoas com e sem deficiência que se relacionam das diversas formas com o espaço, seja visitando, recebendo, etc. Ao possibilitar espaços culturais democráticos se abre cada vez mais a convivência com a diversidade humana composta por etnia, língua, orientação sexual, gênero, deficiência ou qualquer outro atributo.

Experiências compartilhadas contribuem não apenas dentro dos espaços culturais, a troca de conhecimento gera uma sabedoria capaz de modificar as estruturas sociais necessárias para ir de encontro a espaços mais inclusivos e democráticos.

3. Perspectivas futuras

Ao compreender a importância das sensibilizações e oficinas dentro das discussões sobre acessibilidade e buscar cooperar para espaços compartilhados mais inclusivos dentro e fora do Museu da Geodiversidade, pretende-se continuar a realização de tais atividades todo semestre alterando seu formato sempre que necessário para melhor alcance das ações. Desse modo criando espaços para pensar ações, troca de conhecimentos e experiências de vida, permitindo maior percepção sobre aspectos relativos a diversidade humana e fruição estética.

Não é possível deixar de destacar a importância de compreender a acessibilidade e a inclusão como um processo na instituição. É necessário pensar acessível sempre e não apenas adaptar o que é feito com barreiras existentes. O espaço ou o conteúdo tem que ser pensados para atender a todos. Ter uma equipe sensível ao tema e comprometida com as questões referentes à pessoa com deficiência ajuda muito, mas mudar a forma de trabalhar e incluir a acessibilidade em todo o processo é determinante. Não é possível mais pensar a acessibilidade apenas para atender às normas e à legislação. Essa não é uma tarefa fácil, mas é o caminho para se contribuir para uma sociedade mais justa.

1 A Declaração Universal dos Direitos Humanos, que delineia os direitos humanos básicos,

foi adotada pela Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948.

Referências

BRASIL. LEI Nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Brasília, DF, jul. 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm. Acesso em: jul.2018. BRASIL. Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. Brasília, DF, set. 2000. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/lei10098.pdf Acesso em: set. 2018.

Centro de Informação das Nações Unidas para o Brasil - Rio. Declaração Universal dos Direitos Humanos. 2009. p. 16.

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Nada sobre nós sem nós: relatório final 16 a 18 de outubro de 2008/. Oficina Nacional de Indicação de Políticas Públicas Culturais para Inclusão de Pessoas com Deficiência – Rio de Janeiro, RJ: ENSP/FIOCRUZ, 2009. 124 p.

OLIVEIRA, A. S.; SARRAF, V. P. Do direito à Cultura, ao Esporte, Turismo e ao Lazer. In: SETUBAL, J. M.; FAYAN, R. A. C. (Organizadores). Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – Comentada. Campinas: Fundação FEAC, 2016. p. 146-153. ISBN: 978-85-69685-03-6.

RESENDE, A. P. C., VITAL, F. M. de P. A convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência Comentada. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, 2008. 164 p.

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Por entre obras de arte, cafés e diferentes públicos: uma experiência

transdisciplinar em acessibilidade cultural.

Between Works of arts, cafés and diferente audiences: a transdisciplinar

experience in cultural acessibility.

Angeli, Andréa A. C. (doutora em Psicologia Social e Institucional- UFGRS); Nascimento, Luciana A. (terapeuta ocupacional voluntária– UFSM). Departamento de Terapia Ocupacional. Centro de Ciências da Saúde. Universidade Federal de Santa Maria – UFSM. dea_amparo@yahoo.com.br; lunascimento.to@gmail.com

Resumo

O TOCCA: Programa transdisciplinar em Terapia Ocupacional, Corpo, Cultura e as Artes – desenvolve atividades de ensino, pesquisa e extensão entre os cursos de dança bacharelado e terapia ocupacional da Universidade Federal de Santa Maria. Suas ações procuram observar, mapear e inventar dispositivos que, dentre outros, propiciem uma ampliação das experiências de fruição e produção culturais. O TOCCA possui dois eixos de ação: Um corpo no mundo e

Caminhando. Neste trabalho se apresentará uma das ações do eixo um corpo no mundo que

acontece no Museu de Arte de Santa Maria (MASM), e se volta à constituição e execução de práticas transdisciplinares junto ao setor educativo promovendo fruição em arte de modo acessível a diversos públicos no espaço museológico.

Palavras-chave: Terapia Ocupacional; Interface Arte-Saúde; Acessibilidade Cultural.

Abstract

TOCCA: Transdisciplinary Program in Occupational Therapy, Body, Culture and the Arts, develops teaching, research and extension activities between dance and occupational therapy courses at the Federal University of Santa Maria. Its actions seek to observe, map and invent devices that, among others, provide an expansion of experiences of cultural enjoyment and production. TOCCA has two axes of action: One Body in the World and Walking. This work will present one of the actions of the axis “a body in the world” that takes place at the Santa Maria Museum of Art (MASM), and turns to the constitution and implementation of transdisciplinary practices with the education sector promoting fruition in art accessible to various audiences in the museum space.

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Keywords: Occupational Therapy; Art-Health Interface; Cultural Accessibility.

Introdução

O TOCCA: Programa transdisciplinar em Terapia Ocupacional, Corpo, Cultura e as Artes – desenvolve atividades de ensino, pesquisa e extensão entre os cursos de dança bacharelado e terapia ocupacional da Universidade Federal de Santa Maria, e conta com a colaboração de artistas de diversas áreas, antropóloga e terapeutas ocupacionais na composição de suas proposições. O programa está dividido em dois eixos: Um corpo no mundo e Caminhando. Um corpo no mundo é conduzido por artistas e terapeutas ocupacionais. Busca promover a criação em arte por meio de diferentes linguagens, o cuidado de si e a promoção à saúde, a construção de participação social e cultural. Procura oferecer acesso à fruição em artes e uma ampliação de repertório neste universo, bem como, desenvolver/pesquisar metodologias de criação em arte. Em Caminhando, de outro lado, experimenta-se das linguagens clínicas e das tecnologias de atenção em terapia ocupacional que potencializem tecer vínculos entre sujeitos, construir espaços mais cooperativos, desobstruir processos criativos, promover convívio entre as diferenças e a afirmação de modos singulares de fazer e existir cotidianamente. Este subprojeto toma a clinica também como criação.

Apresentaremos, aqui, um relato reflexivo das ações desenvolvidas no eixo Um corpo no mundo, desenvolvidas junto ao Museu de Arte de Santa Maria. Esta ação conta com a terapeuta ocupacional voluntária no TOCCA, com estagiários de terapia ocupacional (UFSM), estagiários de artes visuais no MASM (UFSM), equipe do educativo do MASM. Conta, ainda, com o apoio e presença do diretor do museu. O Museu de Arte de Santa Maria (MASM) foi criado em 1992, dando início a organização de um campo museológico na cidade e encontra-se no centro da cidade, oferecendo-se como um lugar de fácil acesso a população em geral. É também um importante equipamento da Política Municipal de Cultura, por ser um dos poucos museus por onde circula a produção de arte contemporânea, fomentando e ampliando o contato da população, em especial, com o resultado de trabalhos de artistas locais. O trabalho no MASM dedica-se ao desenvolvimento de ações voltadas a acessibilidade cultural e a ressignificação deste espaço na cidade para públicos variados, já que apesar de sua importância, o museu conta com pouca visitação.

A parceria com o espaço museológico iniciou em 2017 com a elaboração conjunta de uma oficina de fotografia aberta a uma população heterogênea, e que tradicionalmente não frequentava o museu, pessoas com deficiência, sofrimento psíquico e/ou em situação de vulnerabilidade social começam a circular naquele espaço apoiadas pelos estagiários de terapia ocupacional. Na sequência desta ação construiu-se uma oficina de criatividade, aberta a diferentes públicos, e que como metodologia desenvolvia atividades expressivas baseadas na exposição em contexto. Cria-se uma aproximação com os artistas expositores que nos apoiam na proposição das atividades. O ano de 2018, porém, é marcado por novas experiências junto ao setor educativo do museu, buscando compreender a dificuldade da população em acessar o espaço museológico, as necessidades de diferentes públicos com deficiências para acessar as exposições, os limites

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orçamentários e técnicos para implementar recursos de acessibilidade. Foram realizados estudos da equipe sobre o tema e a capacitação da terapeuta ocupacional em audiodescrição por meio de parceria com o núcleo de acessibilidade da UFSM, em braile e em libra por meio de estudos, e aprofundamento do conhecimento acerca das políticas culturais vigentes. Nesse processo, a equipe entrou em contato com diferentes instituições da cidade: de saúde, de assistência social e de educação/educação especial convidando grupos e pessoas para a visitação guiada ao museu. Os grupos vinham para visitação e, posteriormente, se fazia uma roda de conversa para escuta das demandas dos sujeitos com relação à circulação e apropriação do espaço museológico. Houve aprendizado e desenvolvimento conjunto de estratégias, com a equipe do MASM, para as visitas guiadas. Junto aos estagiários de terapia ocupacional se fez o exercício da construção de uma maquete do museu para facilitar sua apresentação para determinados públicos. Em conjunto com a equipe do MASM se traça para 2019 uma nova metodologia de ação. Durante um ano, a mesma instituição trará um grupo uma vez ao mês para visita guiada e realização de atividade pós-visita no setor educativo. A equipe passa a se reunir semanalmente para a construção conjunta da monitoria e ações educativas, pensando os diferentes públicos frequentadores do museu. Observa-se um crescimento importante da equipe no que tange ao desenvolvimento transdisciplinar de saberes e de práticas voltadas a promoção do acesso aos bens culturais e fruição em arte no espaço museológico.

1. Fundamentação teórica

O terapeuta ocupacional, ao longo da trajetória da profissão no Brasil, passou a ter no conceito de cotidiano, advindo das ciências sociais, a base para a construção do raciocínio clinico. O modo como os sujeitos vivem e agem, como significam suas ações, como compartilham a vida e com quem, por onde circulam socialmente e como tecem suas redes de suporte, como tem acesso ou não aos bens de direitos e como isso se exprime na vida do dia a dia, dentre outros, apontam para a leitura e desenvolvimento de procedimentos terapêuticos ocupacionais.

Atuar no e a partir do cotidiano convoca dos terapeutas ocupacionais a construção de outros dispositivos de cuidado que possam produzir novos modos de conviver (Ferigato, Silva e Lourenço, 2016), mas também, disponibilidade para construir artesanalmente o cuidado, para inventar a clínica. Neste sentido, se consolidam práticas em diferentes espaços públicos e na interface com outros campos de conhecimento: parques, centros de convivência, oficinas e casas de cultura, museus, praças, dentre outros, que passam a ser habitados por trabalhos que buscam garantir direitos básicos, tais como, os de acesso à saúde, a circulação e participação social, a fruição e a produção cultural. (Castro, E. et al., 2016). A pergunta chave das ações passa a ser “Como instaurar espaços de encontro onde seja possível a criação de novos lugares, ou seja, a produção de subjetividades a partir da diferença?” (Valent e Castro, 2016, p.844).

Na década de 90 novos pensamentos no campo das políticas públicas culturais trouxeram o alargamento do conceito de cultura, representado por ações culturais com perspectiva da democratização e da cidadania cultural. Assim, os novos conceitos passam a apontar “como responsabilidade do Estado, o estímulo e promoção de condições para que a população crie e frua da

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invenção cultural, rompendo com os monopólios das iniciativas culturais, com a separação geográfica, o estigma sociocultural.” (Dorneles, 2011, p.107). É com a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais da UNESCO (2005) e, posteriormente, com as ações: “Loucos pela Diversidade” e “Nada sobre nós sem nós”, que se estreitam as relações entre as ações culturais com o campo de Terapia Ocupacional, no sentido da cidadania cultural e dos direitos humanos. Dorneles (2013) chama atenção ao desafio de implementar o direito cultural de fruir com a produção estética, artística e cultural com acessibilidade. Assim, se fortalece a busca e investigação de ferramentas de acessibilidade nos contextos e produtos culturais, utilizando a audiodescrição, a reprodução da exposição em recursos táteis, da sensorialização de obras, da comunicação em libras e estenotipia, entre outros. Aponta Serraf (2018) que para os espaços serem acessíveis “é necessário criar e adequar espaços, serviços e produtos que promovam oportunidades equitativas para todos os públicos, independentemente da condição física, comunicacional e intelectual das pessoas (...) (p.24-25)” Nesta direção, torna-se indispensável pensar e construir metodologias para o acesso de todos e todas.

2. Metodologia

A equipe do programa busca construir espaços de trocas e de constante avaliação por meio de grupos de estudos, supervisão e reuniões com os estudantes em estágio e voluntários, reuniões clínicas para a discussão de casos em conjunto com sujeitos das instituições parceiras. De outro lado, busca-se o registro constante das ações por meio de anotações, fotografias e vídeos das ações desenvolvidas, que são analisados nas supervisões e reuniões da equipe de trabalho. Deste modo, todos (equipe e sujeitos) podem cooperar na leitura da realidade e análise dos acontecimentos, integrando teoria e prática, discussões com os sujeitos da atenção e supervisão do grupo de trabalho. Utiliza-se da cartografia como método na análise das linhas de força que compõem o território do programa, para a construção da intervenção e produção de conhecimento com o vivido. Por meio da cooperação se desmancham espaços disciplinares ou a manutenção de saberes, circunscritos a determinadas áreas do conhecimento, deseja-se o encontro com o (s) outro (s) e a invenção de linguagens, ações que deem conta de exprimir as necessidades vividas em cada espaço em que estão as atividades do programa. Um saber no entre surge e se afirma em cada local.

O programa tem por linhas de análise da cartografia de suas atividades em todos os níveis alguns vetores, abaixo descritos. Por meio deles a partir dos relatos de experiências nas reuniões, observamos, procuramos material teórico que ajude a pensar e analisamos as proposições.

Desautomatizar – promover a tomada de consciência dos clichês, dos modos de fazer que

estejam automatizados pelas repetições cotidianas, dos valores nos quais estamos imersos e que repetimos de modo pouco/nada crítico.

Sensibilizar – acordar os sentidos do corpo para os diferentes modos de expressão e de

percepção do mundo. Provocando uma ampliação do repertório por meio do contato com atividades artísticas, histórias, imagens. O trabalho, portanto, investe na potencialização dos

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processos criativos por meio da sensibilização, aproximação, apreciação de obras de arte (artes plásticas, literatura, artes do corpo) e da experimentação em atelier de diferentes linguagens expressivas e atividades corporais.

Agir/produção de si e do mundo - possibilitar a experimentação com diferentes linguagens

de modo a suscitar a invenção e a construção de um projeto pessoal em um coletivo.

Construir coletividades e cooperar – despertar e promover o desenvolvimento de redes

cooperativas na realização das atividades, estimulando a produção de vínculos pautados pelo respeito à diferença.

No MASM, atua-se com reuniões semanais com a equipe do setor educativo, observando a exposição e as estratégias de monitoria de modo crítico em relação à promoção de acesso à fruição, bem como, construindo atividades e propostas que facilitem a apropriação da experiência no museu, aproximando os sujeitos da produção de cultura e arte. Em reuniões mensais, analisamos as proposições e tecemos conjuntamente direções para o próximo mês, tendo em vista os artistas e suas produções. O museu tem uma circulação de exposições que mudam de uma a duas vezes no mês.

3. Análise de dados e discussão dos resultados

Durante o ano de 2019 foram acompanhados três diferentes grupos e seus processos, ligados a diferentes instituições de faixa etárias distintas. Ao longo deste período no Museu de Arte de Santa Maria, nota-se o fortalecimento dos agentes da proposta, bem como a relação de todos os envolvidos para com a instituição museológica. Após um tempo é possível perceber que há um pequeno volume de visitantes variável de acordo com a itinerância das obras e artistas, ou seja, pouquíssimos grupos habitualmente visitam o museu. A partir da proposta da manutenção dos grupos visitantes, que mensalmente se fazem presente, as mudanças institucionais emergem, a saber, maior participação de profissionais do museu e seus estagiários na construção das ações educativas e monitorias, o desejo de conversar sobre o que propor e de levar as atividades das segundas para outros grupos de pessoas que frequentam o espaço, a compreensão da necessidade de discutir acessibilidade cultural no segmento de patrimônio cultural do conselho municipal de cultura, dentre outros. Assim, ocorre uma maior articulação da equipe, por meio de reuniões semanais com a equipe local, e mensais com a equipe gestora, desde modo, envolvendo desde o setor administrativo até a diretoria na tarefa de pensar as estratégias de aproximação do publico com as obras e o processo criativo do artista. O raciocínio deixa de ser só o de permitir uma abertura da sensibilidade a partir das características de cada público, e passa a incluir necessidades reais de cada usuário para a acessibilidade, e também, a apresentação repertório para uma possível alfabetização visual do público. Discute-se junto, às vezes com a presença do artista, sobre as características das obras e da linguagem mais presente no trabalho, e a partir disso, desenvolvem-se desenhos para as monitorias e atividades de apropriação no educativo. Interessante notar, que as monitorias passaram a contar com estagiários de terapia ocupacional e de artes visuais trabalhando juntos.

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O acompanhamento da visita mediada e da atividade educativa com os grupos tem proporcionado vivencias de cenas que respondem e provocam a ampliação das ações. Com o trabalho pode-se constatar que boa parte dos sujeitos frequentadores de instituições que acolhem pessoas com deficiência, em sofrimento psíquico e/ou em situação de vulnerabilidade social não havia estado em um museu antes, incluindo até mesmo alguns responsáveis técnicos que acompanham os grupos. Muitos revelam alegria no retorno, curiosidade com as novas exposições, desejo pelas atividades expressivas do educativo mostrando um novo engajamento com o espaço museológico.

4. Considerações finais

Parece-nos que as estratégias de mediação devam ser atividades que explorem vivências lúdicas e expressivas, que acolham os diferentes modos de ver e sentir favorecendo a diversidade de modos de experimentar a fruição de espaços e obras, e que ampliem a sensibilidade dos frequentadores do museu, assim como suas capacidades perceptivas e cognitivas. Nesta direção, que o frequentador possa construir diálogos singulares com as obras, ao mesmo tempo em que tenha acesso a outras conversas já estabelecidas com elas.

Tem interessado nossa equipe, criar dispositivos que favoreçam contágios entre modos de percepção do mundo produzidos por sujeitos com capacidades perceptivas, motoras, subjetivas, cognitivas diversas. Que pode a obra provocar no ver e no sentir? Que museu se pode experimentar nesses diferentes lugares e posições?

Em um segundo movimento, observamos que será necessário imaginar estratégias para a melhor apropriação da fruição por parte de pessoas com deficiências. E desta maneira, ampliar e estimular a leitura do objeto cultural pelo público fruidor, levando-o a perceber, analisar, interpretar, criticar, enfim, decodificar esse objeto, explorando-o e apropriando-se desta experiência de modo significativo na vida.

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ALUNO FAZ FOTO? O fotografar na escola (especial)

Student makes photo? Photographing at (special) school

Anelise Barra Ferreira, Doutora em Educação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS anelisefe@gmail.com

Resumo

“Aluno faz foto?” é o nome/provocação que conduz a pesquisa de Doutorado realizada no Curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com a orientação da Prof.ª Dra. Susana Rangel Vieira da Cunha, concluída em 2012. Este estudo partiu de questionamentos sobre a minha prática pedagógica como professora da Oficina de Fotografia de uma escola especial para pessoas com deficiência intelectual, foi desenvolvida com duas turmas nos anos de 2009 e 2010, compreendendo dezessete alunos, de nove a dezenove anos de idade. As questões centrais desta pesquisa-ação foram: como o ensino do fotografar pode potencializar experiências de expressão e de autoria na escola e como os alunos que estudam na escola especial estabelecem relações com a fotografia e com o processo de fotografar. Para as análises foram utilizadas contribuições dos Estudos Culturais e dos Estudos da Cultura Visual. Esta pesquisa propõe a linguagem fotográfica como parte do currículo escolar e reconhece o fotografar como metodologia pedagógica que potencializa experiências de expressão e de autoria para os alunos.

Palavras-chave: educação especial; ensino; fotografia.

Abstract

“Student does photo?” Is the name / provocation that drives the PhD research conducted at the Pedagogy Course of the Federal University of Rio Grande do Sul, under the guidance of Prof. Susana Rangel Vieira da Cunha, completed in 2012. This study came from questions raised in my pedagogical practice as a Photography Workshop teacher at a special school for people with intellectual disabilities developed with two classes in 2009 and 2010, comprising seventeen students, from nine to nineteen years old. The central questions of this action research were: how can the teaching of photography potentiate experiences of expression and authorship at school and how students who study in special schools establish relationships with photography and the process of photographing. For the analysis, contributions from Cultural Studies and Visual Culture Studies were used. This research proposes photographic language as part of the school curriculum

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and recognizes photography as a pedagogical methodology that enhances students' experiences of expression and authorship.

Keywords: special education; teaching; photography.

Aluno faz foto? O fotografar na escola (especial)

A fotografia é um campo de estudo pessoal, uma atividade de lazer que passou a intervir no meu fazer na sala de aula como professora de uma escola especial, inicialmente como recurso para a documentação das atividades desenvolvidas, vindo a compor a minha proposta pedagógica.

A câmera e as imagens despertavam o interesse e atenção dos alunos, eles solicitavam fazer as suas fotos. Formou-se a necessidade em oferecer uma Oficina de Fotografia para quem quisesse aprender/criar com o processo de fazer fotos. Este projeto iniciou em 1999, e o período de 2007 a 2012 foi dedicado à pesquisa no Curso de Doutorado da Faculdade de Educação da UFRGS, com a orientação da Dr.ª Susana Rangel Vieira da Cunha.

A tese foi nomeada como “Aluno faz foto? - O fotografar na escola (especial)”, este título em forma de questão é uma provocação perante a necessidade de refletirmos sobre uma pedagogia do fotografar e representa comentários de senso comum frente à possibilidade ou não de pessoas com deficiência intelectual produzirem as suas imagens.

A pesquisa acompanhou dois anos da Oficina de Fotografia (2009/2010), envolvendo dezessete alunos, na faixa etária entre nove e dezenove anos. A Oficina, em uma perspectiva inclusiva ofereceu sete vagas para alunos vindos de escolas regulares da comunidade e os demais eram matriculados na escola especial sede da pesquisa. A metodologia utilizada foi de abordagem qualitativa, com um desenho próprio orientado pela Pesquisa Baseada em Arte e pela Pesquisa Cartográfica.

As questões centrais investigadas discorreram sobre como o ensino do fotografar pode potencializar experiências de expressão e de autoria na escola e como os alunos que estudam na escola especial estabelecem relações com a imagem fotográfica e com o processo de fotografar.

O corpo teórico contou com contribuições dos Estudos Culturais (Maura Corsini, André Giroux) dos Estudos da Cultura Visual (Suzana Rangel, Fernando Hernández, Irene Tourinho). Diferentes campos de conhecimento relativos a linguagem fotográfica foram leituras que também produziram efeito na pesquisa, destaco as produções de Roland Barthes, André Rouillé, Rafael Dieh, Luis Eduardo Achutti, Patricia Kirst e Vanessa Maurente.

Saliento neste registro a potência dos alunos fazerem imagens, visto que estudantes de uma escola especial ao fotografarem interrogam as expectativas sobre as suas possibilidades de aprendizagem. Essa potência torna-se mais explicita e importante em termos de intervenção quando os sujeitos se encontram em situação nas quais suas possibilidades enunciativas podem ser consideradas restritas pela sua condição estrutural (DIEHL, 2007, p. 56).

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A tese contesta o entendimento comum de que pessoas com deficiência intelectual não são capazes de se expressar pelo fotografar. Dúvida recorrente entre os familiares, a comunidade e até por colegas da área que se admiravam perante as imagens produzidas pelos participantes da pesquisa. A possibilidade de utilizarem um equipamento que a princípio seria sofisticado pela tecnologia e exigiria certo domínio surpreendia, principalmente por serem alunos dos quais normalmente não é esperado que pudessem aprender a lidar com uma “máquina”.

Embora o imaginário social faça vislumbrar um grupo de pessoas infantis, sem condições de participação e de efetivação de suas próprias escolhas, os participantes da pesquisa pelas suas fotos não concebiam e nem denotavam a existência desta classificação.

A identidade e a diferença têm que ser ativamente produzidas. Elas não são criaturas do mundo natural ou de um mundo transcendental, mas do mundo cultural e social. Somos nós que as fabricamos, no contexto de relações culturais e sociais. A identidade e a diferença são criações sociais e culturais (SILVA, 2000).

A fotografia tornou-se um dispositivo de visibilidade das escolhas, dos modos de estabelecer relações, de expressão criativa dos seus autores, de exercício de pertencimento ao grupo em que viviam, assim como de novos sentidos diferenciados de uma suposta “identidade não eficiente”.

O fotografar estava à disposição de todos que, por uma mesma forma de expressão enunciavam que participavam dos mesmos movimentos, grupos, gestos culturais aos quais atestaram pertencimento pelas fotos.

As imagens denotam hábitos comuns ao seu grupo social, como indivíduos que olhavam revistas e assistiam televisão, que viam novelas, que viviam e participavam deste cotidiano. Jovens e crianças que pertenciam à mesma rede cultural partilhavam o mesmo conjunto de valores, tradições que lhes mobilizavam sentimentos e atitudes - nela estavam inseridos. Entendiam o que lhes acontecia e o que viviam de forma semelhante, atribuíam sentido as mesmas coisas, utilizavam e aceitavam códigos culturais análogos por nela pertencerem.

A cultura é um campo de produção de significados no qual os diferentes grupos sociais, situados em posições diferenciadas de poder, lutam pela impossibilidade de seus significados á sociedade mais ampla. A cultura é nessa concepção, um campo contestado de significados (SILVA, 2007, p. 134). A cultura está em transformação, sempre aberta a conflitos e produção de sentidos, identidades peculiares a cada grupo (CORAZZA, 2001).

O fotografar e as imagens a que os alunos têm acesso são parte dessa cultura. As fotografias por eles realizadas referiam-se a jovens, mulheres, homens, pessoas com Síndrome de Down, alunos, professores, cabelereiros, modelos, pessoas com transtorno global do desenvolvimento, indivíduos com sonhos, amores, dúvidas, entre tantas identidades que os/nos habitam e podem “vir a ser”.

As expressões pessoais e poéticas na fotografia frente às propostas de intervenção pedagógica na Oficina propunham outro significado ao campo utilitário e informacional que massivamente compreende o campo fotográfico: “Coloca a subjetividade no meio, modificando os modos de ver e as maneiras de mostrar” (ROUILLÉ, 2009).

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A experimentação de diversos modos de se relacionar e fazer as imagens fotográficas orientava o planejamento das aulas. Possibilitavam refletir sobre a "imaginação fotográfica" como forma de produção de conhecimento que articula técnica, tecnologia, estética e visão de mundo (MARTINS, 2008).

A imagem está sempre ligada, muitas vezes profundamente a um sujeito, um ‘eu’, em suas ações, sentimentos e percepções, em suas infinitas singularidades (ROUILLÉ, 2009, p. 206). Os alunos tinham possibilidade de inscreverem-se em um suporte que lhes oferecia reconhecimento, eram protagonistas do seu fazer, sentir, viver.

O aluno atribuía sentido a determinada cena no ato de fazer as imagens fotográficas, inscrevia sua escolha. O que diferia da produção de uma foto que os/nos surpreendesse pelas suas “boas qualidades”; compreendia a singularidade da sua experiência, o seu modo de responder e dar sentido ao que lhe acontecia, passava, e ao “passar transformava”. O acontecimento era comum/coletivo, mas o “saber da experiência” era particular (LARROSA, 2002).

As fotos mostravam o que lhes tocava e o que lhes acontecia. Os alunos participavam do mesmo grupo de estudo da Oficina, mas a relação que estabeleciam ao fotografar era singular, o modo como respondiam ao que lhes passava os autorizava a dizer “fui eu que fiz”.

O autor constituía-se no processo de fotografar, como “o produto do ato de fazer a sua obra” (BARTHES, 1988, p. 51). O fazer a imagem e a existência desta perante o olhar do outro lhe conferia esta qualidade.

Os participantes da pesquisa deixavam a sua marca em um suporte que lhes dava visibilidade e reconhecimento, como protagonista do seu fazer, sentir, viver. Outras visibilidades podiam ser produzidas: as suas vontades, desejos, sonhos combinavam-se com o que viam; com o que fazia ou não sentido e constituía a sua experiência-vida. A sua singularidade sobressaía à “singularidade do objeto fotografia” e se expressava pela imagem compartilhada pelo seu grupo de convivência, que neste caso era a escola.

A Oficina de Fotografia na Escola Especial desafiava construir com os alunos [e comigo] outras histórias de aprender e de ensinar. O ensino do fotografar provocava a experimentação de uma posição diferenciada por quem a faz, a de autor, produtor de uma realidade (TITTONI, 2010, p. 65). O aluno (a escola) ampliava a sua posição de expectador para a de produtor das imagens.

Este estudo possibilitou dar palavras e novos sentidos para esta vivência de ensino e de aprendizagem, destacando a importância do fotografar como parte do currículo escolar, demarcou na escola o fotografar como prática pedagógica. Proposta constituída por redes de relações articuladas pelo professor com os alunos: no planejamento, pelo fazer, pelo acaso, considerando a flexibilidade das propostas, tendo como referência as artes visuais e cênicas, constituindo parceria com instituições relacionadas as artes, a ciência, a criação - prazer ao ensinar/aprender.

As fotos feitas pelos participantes da pesquisa apresentavam o “seu olhar” o qual difere de quem “os olha”. Possibilitava vê-los para além da “marca social da deficiência”, as imagens questionavam a posição do espectador visto que a “não eficiência” encontra-se na maneira como

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são olhados. A câmera em suas mãos constituiu outras visibilidades. As suas fotografias não discriminavam pessoas “com” e “sem” deficiência intelectual.

Referências

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