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APOIO SOCIAL, QUALIDADE DE VIDA E SAÚDE MENTAL EM DOENTES COM PERTURBAÇÕES DO HUMOR

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Elisabete Maria Pereira Barbosa

APOIO SOCIAL, QUALIDADE DE VIDA E SAÚDE MENTAL EM DOENTES COM PERTURBAÇÕES DO HUMOR

Dissertação de Mestrado em Psiquiatria Social e Cultural, para obtenção do grau de Mestre, sob a orientação do Professor Manuel João Rodrigues Quartilho e coorientação do Professor Marco Daniel

Pereira, apresentada à Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra

Julho, 2018

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UNIVERSIDADE DE COIMBRA Faculdade de Medicina Mestrado em Psiquiatria Social e Cultural

APOIO SOCIAL, QUALIDADE DE VIDA E SAÚDE MENTAL EM DOENTES COM PERTURBAÇÕES DO HUMOR

Elisabete Maria Pereira Barbosa

Julho, 2018

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Elisabete Maria Pereira Barbosa

APOIO SOCIAL, QUALIDADE DE VIDA E SAÚDE MENTAL EM DOENTES COM PERTURBAÇÕES DO HUMOR

Dissertação apresentada à Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, para obtenção do grau de Mestre em Psiquiatria Social e Cultural, sob a orientação do Professor Doutor Manuel João Rodrigues Quartilho e do Professor Doutor Marco Daniel Pereira.

Coimbra, Portugal 2018

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Apoio social, qualidade de vida e saúde mental em doentes com perturbações do humor

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Resumo

A evidência empírica sugere que o apoio social produz benefícios na saúde mental reduzindo as comorbilidades psiquiátricas. A presente investigação teve como objetivo caracterizar o tipo de rede social dos doentes com perturbações do humor, correlacionar a qualidade de vida e saúde mental (sintomas de ansiedade e depressão) destes participantes, assim como, associar a composição da rede social com o apoio social percebido pelos doentes assim como com os indicadores de saúde mental e qualidade de vida. A amostra foi constituida por 59 doentes (62.7% do sexo feminino), com uma idade média de 53.6 anos, 29 frequentavam a consulta externa e 30 em regime de internamento do serviço de psiquiatria do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC, EPE). Foi realizado um estudo quantitativo, e aplicado um protocolo de avaliação composto por uma ficha de dados sociodemográficos e clíncios e pelos seguintes três questionários: (1) o questionário de qualidade de vida WHOQOL-Bref, (2) a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão e (3) o questionário de apoio social MOS Social Support Survey (MOS-SSS). Os resultados obtidos nesta investigação confirmam a premissa de que o apoio social está significativamente associado à qualidade de vida e saúde mental dos doentes com perturbações do humor, na medida em que quanto mais elevada a percepção de apoio social, mais elevada a percepção de qualidade de vida e menor a sintomatologia ansiosa e depressiva. Por outro lado, pudemos verificar uma associação significativa entre níveis mais elevados de sintomatologia psicológica e pior perceção de qualidade de vida. O presente estudo poderá tornar-se uma mais-valia no desenvolvimento de projectos de saúde mental que enfatizem a manutenção/obtenção de laços sociais promotores de saúde mental em doentes com perturbações do humor.

Palavras-chave: apoio social, qualidade de vida, saúde mental, perturbações do humor.

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Apoio social, qualidade de vida e saúde mental em doentes com perturbações do humor

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Abstract

The empirical evidence suggests that social support produces benefits in individuals’ mental health by reducing psychiatric comorbidities. The aim of this research was to characterize the type of social network of patients with mood disorders, to correlate the quality of life and mental health (symptoms of anxiety and depression) of these participants, as well as to examine the association between the composition of the patients’ social network with the support perceived by patients, as well as with the indicators of mental health and quality of life. The sample consisting of 59 patients (62.7% female), with a mean age of 53.6 years, 29 oupatients and 30 inpatients of the psychiatry department of Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC, EPE). A quantitative study was performed, and a protocol covering a sociodemographic and clinical form and the three followingquestionnaires was applied: the quality of life questionnaire WHOQOL-Bref, (2) the Hospital Anxiety and Depression Scale, and (3)and the social cupport questionnaire MOS Social Support Survey (MOS-SSS). The results of this research confirm the premise that social support is significantly associated with the quality of life and mental health of patients with mood disorders, specifically showing that the higher the perception of social support, the higher the perception of quality of life, and the lower the anxiety and depressive symptoms. In addition, a significant association between higher levels of psychological symptoms and worse perception of quality of life was also found. The present study may become an asset in the development of mental health projects that emphasize maintaining/securing social bonds that may promote mental health among patients with mood disorders.

Keywords: social support, quality of life, mental health, mood disorders.

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Apoio social, qualidade de vida e saúde mental em doentes com perturbações do humor

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Agradecimentos

Gostaria de agradecer a quem partilhou comigo este trabalho, e tornou possível a conclusão deste grande desafio.

A todos os participantes deste estudo por se disponibilizarem e aceitarem participar neste estudo.

Aos profissionais do HUC que, sempre atenciosos, se mostraram disponíveis me ajudar.

Ao Doutor Manuel Quartilho por estar sempre receptivo a responder a dúvidas e solucionar problemas no decorrer deste projecto.

Ao Doutor Marco Pereira pelo excelente apoio na orientação persistente realizada com todo o empenho, sabedoria e motivação, sem o qual este trabalho não teria sido possível.

Ao meu marido por partilhar comigo todos os momentos, bons e menos bons, pelas palavras de incentivo e motivação.

Á minha filha Letícia por ser a minha fonte de força e inspiração.

Muito Obrigada a todos!

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- Criar laços?

Exatamente, disse a raposa. Tu não és para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim.Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas.Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro.Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...

Antoine de Saint-Exupéry

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Índice

Lista de Tabelas 6

Lista de Siglas 7

Introdução 8

1. Apoio Social 11

1.1. Definições e dimensões do apoio social 11

1.2. Apoio social percebido, saúde mental e qualidade de vida 13 1.3. Avaliação e efeitos do apoio social na qualidade de vida de doentes com

perturbações do humor 16

2. Qualidade de Vida 19

2.1. Qualidade de vida: Análise e conceito 19

2.2. Qualidade de vida das pessoas com doença mental 23

2.3. Qualidade de vida das pessoas com perturbações do humor 25

2.3.1. Perturbações do humor 25

2.3.2. Impacto das perturbações do humor na qualidade de vida 27

3. Metodologia 30

3.1. Objetivos 30

3.2. Participantes 30

3.3. Procedimentos 32

3.4. Instrumentos 33

3.4.1. Ficha de dados sociodemográficos 33

3.4.2. WHOQOL-Bref 33

3.4.3. Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HADS) 38

3.4.4. MOS Social Support Survey (MOS-SSS) 34

3.5. Análise de dados 36

4. Resultados 37

5. Discussão 43

6. Conclusões, Contribuições e Forças do Estudo 47

7. Referências 50

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Lista de Tabelas

Quadro 1. Características sociodemográficas da amostra (N = 59) 31 Quadro 1. Alfa de Cronbach e número de itens de cada domínio de qualidade de

vida 34

Quadro 3. Alfa de Cronbach e número de itens de cada dimensão da HADS 35 Quadro 4. Alfa de Cronbach e número de itens de cada dimensão do Apoio social 36 Quadro 5. Resultados descritivos nas dimensões de apoio social 37 Quadro 6. Resultados descritivos dos domínios de qualidade de vida 37 Quadro 7. Resultados descritivos nas facetas específicas de qualidade de vida 38 Quadro 8. Resultados descritivos na sintomatologia ansiosa e depressiva 39 Quadro 9. Resultados descritivos tendo em conta os pontos de corte da HADS para a

sintomatologia ansiosa e depressiva 40

Quadro 10. Correlação entre a qualidade de vida os sintomas de ansiedade e

depressão 40

Quadro 11. Correlação entre o número de pessoas na rede social e as dimensões de

apoio Social 41

Quadro 12. Correlação entre as dimensões de apoio social e os domínios e faceta

geral de qualidade de vida 42

Quadro 13. Correlação entre as dimensões de apoio social e os sintomas de

ansiedade e depressão 42

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Lista de Siglas

APA - American Psychologycal Association

CHUC - Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra DGS - Direção Geral de Saúde

HADS - Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão MOS-SSS - Mos Social Suport Survey

OMS - Organização Mundial de Saúde

PAG - Perturbação de Ansiedade Generalizada POC - Perturbação Obsessiva-compulsiva PSPT - Perturbação Stress pós-traumático QdV - Qualidade de Vida

SPSS - Statistical Package for the Social Sciences WHO - World Health Organization

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Introdução

A atual conjuntura mundial revela uma incidência elevada de perturbações mentais, que são responsáveis por elevados níveis de incapacidade e sofrimento humano, apesar de estarmos perante uma área que continua a ser negligenciada pelo poder político. Este desinvestimento de recursos subentende “custos diretos e indiretos associados às perturbações psiquiátricas, decorrentes das despesas assistenciais e da diminuição da produtividade (e.g., desemprego, absentismo, baixas por doença, apoio a familiar doente), e têm um enorme impacto económico nos orçamentos públicos, podendo atingir cerca de 20% de todos os custos da saúde. Este facto ilustra a relevância que as políticas de saúde mental não podem deixar de assumir no contexto das políticas gerais de saúde dos países, em termos nacionais” (Direção Geral da Saúde [DGS], 2013, p. 7).

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS, 2017), 1 em cada 10 pessoas no mundo, 10% da população global, sofre de alguma perturbação de saúde mental, sendo esta uma tendência que deverá aumentar nos próximos anos. Neste contexto, as perturbações do humor assumiram relevância incontestável na última metade do século XX. Segundo o relatório da OMS Global burden of disease (2010), a depressão era a 4ª maior causa de morbilidade do mundo. Dado o impacto significativo na sociedade (e.g., incapacidade e disfunção) é essencial uma compreensão dos fatores sociais e culturais subjacentes a estas perturbações.

Portugal é um país com uma considerável prevalência de perturbações psiquiátricas em geral e das perturbações de humor em particular. Estas patologias tendem a ser mais frequentes em países com maiores desigualdades económico-sociais (DGS, 2013).

Com efeito, a crise que o país atravessou nos últimos anos teve um impacto grande naquelas desigualdades, alargando o fosso social e contribuindo, potencialmente, para o aumento da prevalência das perturbações do humor (Sousa, 2015).

Deste modo, avaliar a qualidade de vida (QdV) das pessoas com doença mental (ou o impacto que a doença mental tem nas diferentes dimensões de QdV) afigurou-se-nos de grande importância científica e social, pois poderá contribuir para melhorar as

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práticas atuais promovendo o bem-estar das pessoas com doença mental, particular- mente no nosso contexto geográfico e social. Tal como mencionado por Fleck (2010), nas décadas mais recentes tem havido uma preocupação crescente não só com a frequência e a severidade das doenças, mas também com a avaliação de medidas de impacto da doença e comprometimento das atividades diárias (Bergner et al., 1981), medidas de perceção da saúde (Hunt et al., 1985) e medida de disfunção/estado funcional (Ware et al., 1992). Neste âmbito, também as noções de felicidade, de satisfação pessoal e de bem-estar subjetivo têm sido encontradas quando se analisa o conceito de QdV. De acordo com Quartilho (2010), elas estão intimamente ligadas e coexistem nas diferentes interpretações de QdV.

Em relação ao apoio social, são vários os estudos que sublinham a sua importância na e para a saúde mental. Segundo Ramos (2002) “o suporte social pode exercer um papel essencial promovendo e mantendo a saúde física e mental” (p. 60). Matsukura, Marturano e Oishi (2002), a este propósito, salientaram a necessidade de desenvolver estudos no âmbito do apoio social, entendendo que esse constructo contribui de forma relevante para uma compreensão de processos saúde-doença, QdV e propostas de intervenções junto à população.

Fontes (2007) refere que com as alterações previstas em termos de assistência em saúde mental e psiquiatria, se reconhece a importância do apoio social, das relações sociais e redes sociais no que diz respeito à reconstrução de um dia a dia muitas vezes perturbado pelo sofrimento e como uma variável que interfere positivamente no tratamento, a partir de outros recursos oferecidos por outros atores sociais. De facto, como refere Freyre (2006), para se trabalhar em profissões da área da saúde é necessário ter um olhar mais abrangente, que alcance as relações em variados contextos (com a família, no trabalho, com os amigos), um olhar que alcance aspirações e esperanças, e um olhar que valorize os aspetos que não são observáveis nas análises e nos raios X, dado que estes "não acusam opressões, não acusam marginalização, não acusam desajustamento social, não acusam abandono" (p. 30).

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No âmbito da inserção social de doentes com doença mental, segundo Tucci, Kerr- Corrêa e Dalben (2001), “os problemas encontrados na reinserção social de pacientes psiquiátricos são, geralmente, atribuídos às condições inadequadas de seu processo de integração na comunidade, como: falta de acompanhamento médico frequente e contínuo; falta de programas comunitários; falta de atividade ocupacional; ausência de apoio social de pessoas próximas; falta de centros extra-hospitalares para atendê-los em momentos de crise ou assisti-los em domicílio” (p. 80). Numa revisão da literatura efetuada por Baptista, Baptista e Torres (2006), os autores encontraram estudos que demonstravam que o apoio social é um fator de redução de diversas perturbações psiquiátricas/psicológicas, tais como depressão, ansiedade e esquizofrenia, podendo estar associado ao desenvolvimento e tratamento desses problemas. Assim, podemos afirmar que mais investigação sobre o papel do apoio social poderá ser um contributo importante para a prevenção das doenças e promoção de saúde.

Justificamos esta investigação pelo facto de existirem lacunas científicas no que respeita à abordagem destes dois constructos no contexto das doenças afectivas. É, neste sentido, expectável que este trabalho se possa tornar uma mais-valia para que futuramente se possam conceber e desenvolver projetos de saúde mental pública focados na prevenção de doença e promoção de saúde, devidamente ajustados às necessidades deste tipo de população.

O presente estudo encontra-se estruturado em duas partes: uma primeira parte de contextualização teórica e uma segunda focada na investigação empírica. Em primeiro lugar, apresenta-se uma contextualização aos conceitos centrais no presente estudo – apoio social e qualidade de vida – enquadrando-os no contexto da saúde mental e, em particular, das perturbações do humor. Posteriormente, faremos uma descrição geral e breve das perturbações do humor. Na segunda parte será apresentada a metodologia, onde se descreve e caracteriza a amostra do estudo, os procedimentos e instrumentos utilizados, bem como os procedimentos de análise de dados. Em seguida apresentam- se os resultados do presente estudo e no ponto seguinte a discussão dos mesmos. Por fim, são traçadas as considerações finais.

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1. Apoio Social

1.1. Definições e dimensões do apoio social

Uma motivação humana fundamental é a necessidade de construir laços fortes e duradouros ao longo da vida. Numa extensa investigação, Baumeister e Leary (1995) encontraram evidências de um desejo básico para formar vínculos sociais, ainda que sob condições de aparente adversidade. Estes autores indicaram ainda que os indivíduos resistem a perder os vínculos e a quebrar laços, ainda que não exista uma razão material ou pragmática para os manter e mesmo quando mantê-los é difícil. A evidência parece mostrar também que a necessidade de pertença molda as emoções e as cognições: concretamente, qualquer mudança nos padrões de pertença causa emoções de tal modo fortes e marcantes que suporta a hipótese da necessidade de pertença. Segundo os mesmos autores, défices ao nível do processamento cognitivo sobre as suas relações pessoais (atuais ou possíveis) têm diversas consequências em termos da saúde das pessoas, o que é consistente com a ideia de que a pertença se trata de uma necessidade e não apenas de uma vontade. De forma específica, os problemas de saúde, quer física quer psicológica, são mais comuns entre as pessoas que possuem escassos vínculos sociais. Neste sentido, torna se relevante, no âmbito deste estudo, perceber a relevância que o apoio social tem na saúde mental e QdV dos doentes com perturbações do humor.

Neste contexto, torna-se importante, em primeiro lugar, abordar o conceito de apoio social. Existem várias abordagens ao conceito de apoio social na literatura, o que torna este constructo difícil de definir, dado que “abarca vários tipos e categorias, provém de diversas fontes, possui diferentes dimensões e componentes” (Carvalho, Pinto- Gouveia, Pimentel, Maia, & Mota Pereira, 2011, p. 333). Em seguida, apresentam-se algumas definições de apoio social que têm sido apontadas na literatura.

Uma das primeiras definições partiu da visão de Cobb (1976), que definiu apoio social como sendo a informação que leva o indivíduo a acreditar que é amado e que as

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pessoas se preocupam com ele, a informação que faz com que o individuo acredite que é apreciado e que tem valor e a informação que faz com que o indivíduo acredite que faz parte de uma rede de comunicação e de obrigações mútuas. House (1981, cit.

in Macedo, 2013) sugeriu uma tipologia de funções do apoio social, traduzindo-as em apoio emocional (a amizade, o amor); apoio instrumental (serviços); apoio informativo (sobre o que o rodeia) e apoio de apreciação (informações sobre a autoavaliação). Na mesma linha de pensamento, para Helgeson (2003), o apoio social divide-se em: apoio emocional (e.g., presença de pessoas disponíveis para conversar, escutar, preocupar- se, simpatizar, promover confiança ao indivíduo, este apoio pode advir da família, amigos ou profissionais de saúde); apoio instrumental (e.g., ajuda nas tarefas domésticas, empréstimo de dinheiro, aquisição de equipamentos); e apoio informativo (e.g., dar informações, conselhos e orientações).

Uma outra conceptualização é feita por meio da divisão do apoio social em formal e informal. Como apoio social informal encontram-se os indivíduos mais próximos (e.g., familiares, amigos, vizinhos) e, como apoio social formal encontram-se as organizações (e.g., hospitais, associações, serviços de saúde) e os profissionais de diferentes áreas (e.g., médicos, assistentes sociais, psicólogos) (Miller & Jeff-Darlington, 2002). Neste contexto, destacamos o apoio familiar como o primeiro e principal apoio do individuo

“qualificado como uma instância mediadora entre o indivíduo e a sociedade, o suporte familiar teria como algumas de suas funções reunir e distribuir recursos para a satisfação das necessidades básicas além de funcionar como um amortecedor de impactos sociais na vida de seus integrantes” (Rigotto, 2006, p. 9). Antunes e Fontaine (2005) referem-se ainda ao apoio emocional prático dado pela família e/ou amigo na forma de afeto, companhia, assistência e informação, ou seja, tudo que faz o indivíduo

“sentir-se amado, estimado, cuidado, valorizado e seguro” (p. 1). Com efeito, quando nos referimos ao apoio social reportamo-nos a uma “vasta gama de comportamentos, funções e ações ou atividades, pelo que se foram constituindo distintas perspetivas de análise do conceito e um quadro conceptual complexo” (Guadalupe, 2003, p. 75).

De acordo com Vaz-Serra (1999, cit. in Rodrigues, 2008), o apoio social apresenta seis tipos de funções, que referimos de seguida: (1) apoio afetivo - produz um sentimento

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de estima, respeito e consideração independentemente das falhas pessoais de cada um; (2) apoio emocional - permite que a pessoa se sinta segura e apoiada nas várias etapas da vida; (3) apoio percetivo - ajuda o individuo a pensar realisticamente e de forma clara sobre situações problemáticas, tornando a solução eficaz; (4) apoio informativo - que constitui o conjunto de informações e conselhos que permitem a pessoa encontrar o caminho mais adequado para a resolução de problemas diários; (5) apoio instrumental – transmissão de ferramentas através da prestação concreta de bens e de serviços; e (6) apoio de convívio social - permite que a pessoa tenha passe momentos de lazer, de aprendizagem em grupo, estimulam o sentimento de pertença a uma comunidade.

De acordo com Guadalupe (2003), outra característica associada ao apoio social é a regulação e controlo social que se manifesta pela pressão exercida pelos diferentes membros, entre si, no sentido de lembrar e reafirmar responsabilidades, normas e papéis. Esta permite a neutralização de desvios de comportamentos que se afastam do que é ditado pelo coletivo. Neste sentido, por um lado, é uma função que favorece a socialização dos indivíduos mas que, por outro lado, facilita a exclusão grupal aquando do desvio. Esta função assume cargas positivas ou negativas, sendo totalmente dependente do contexto em que se insere. Numa perspetiva macrossocial, esta função é entendida com carácter adaptativo e normalizador (Guadalupe, 2003).

Importa ainda ressalvar, sendo esta uma área de estudo complexa, que a existência de uma rede social não é sinónimo da existência efetiva de apoio. Como referiu Coimbra (1990, cit in Guadalupe, 2009), “as redes sociais podem assumir outros caracteres no sentido em que permitem proteger ou não os seus membros, podem nomeadamente mostrar-se como redes destrutivas ou inócuas” (p. 82).

1.2. Apoio social percebido, saúde mental e qualidade de vida

Os sentimentos de solidão e abandono encontram-se intrinsecamente associados a um menor sentimento de bem-estar psicológico e de satisfação com a vida, traduzindo-se

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muitas vezes em perturbações de humor. Nesta âmbito, o apoio social assume-se como uma medida importante que permite que o indivíduo tenha a perceção do quanto ele pode depender dos outros para apoio de diferentes naturezas (e.g., emocional, instrumental) e do quanto este é necessário e importante para o seu bem- estar e bem-estar psicológico dos seus pares, num sistema de trocas mútuas. Isto é particularmente importante nos contextos de doença. Por exemplo, um indivíduo com uma doença crónica necessita de partilhar o seu sofrimento com a sua família ou com outras pessoas próximas significativas, como os amigos ou colegas de trabalho, com o intuito de obter ajuda no seu processo de adaptação ao estado de doente crónico (Silva et al., 2002). Neste sentido, podemos afirmar que poder contar com alguém disponível a ajudar nos cuidados, escutar, conversar, aconselhar, informar e solucionar as situações é essencial.

Os estudos que se têm debruçado sobre a relação entre apoio social e saúde podem ser englobados em quatro grandes categorias (Singer & Lord, 1984): (1) o apoio social protege contra as perturbações induzidas pelo stresse – esta abordagem agrupa uma versão forte e uma versão fraca. A primeira afirma que variável apoio social impede que o stresse afete negativamente o indivíduo, enquanto a fraca afirma que o stresse afeta toda a gente, mas que na existência de apoio social esse efeito negativo é reduzido. Nesta abordagem, o apoio social é visto como mediador ou moderador do stresse; (2) a não existência de apoio social é fonte de stresse – esta abordagem considera que a falta de apoio social é, ela própria, geradora de stresse; (3) a perda de apoio social é um acontecimento stressor – nesta perspetiva, considera-se que quando se tem apoio social e se o perde o stresse surge; e, por fim, (4) o apoio social é benéfico - é uma perspetiva de certo modo contrária às anteriores, no sentido em que considera que o apoio social torna as pessoas mais fortes e em melhor condição para enfrentar as adversidades da vida, ou seja, que o apoio social é um recurso, quer perante, quer na ausência, de fontes de stresse.

Os estudos realizados por Spiegel (1995, 1997) acerca da associação entre apoio social e bem-estar físico demonstraram que “a probabilidade de morte entre indivíduos com menos ligações sociais é o dobro da probabilidade de morte entre os indivíduos com

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laços mais fortes, mesmo quando se tem em conta hábitos como o tabagismo, consumo de álcool, atividades físicas, obesidade e uso de programas de prevenção”

(cit. in Rodrigues & Milton, 2009, p. 94).

Os estudos realizados ao longo dos anos referem que as pessoas socialmente isoladas apresentam uma saúde mais debilitada e uma taxa de mortalidade muito superior às pessoas com muitos contactos sociais, revelando assim o isolamento social como um fator de risco tão relevante quanto o tabagismo, a obesidade, a inatividade física e os elevados níveis de colesterol (Hockenbury & Hockenbury, 2003). Em 1979, Berkman e Syme no estudo prospetivo de Alameda County mediram o apoio social de 4700 homens e mulheres, entre os 30 e 69 anos de idade, seguidos ao longo de nove anos, concluindo que um maior grau de apoio social predizia um decréscimo na taxa de mortalidade. Por outro lado, este estudo mostrou que os sujeitos que tinham um índice baixo de redes sociais dependentes de laços íntimos apresentavam, nos nove anos seguintes, um risco de mortalidade duas vezes superior ao dos indivíduos que tinham um índice alto de redes sociais.

Com efeito, da análise da literatura verifica-se que diversos estudos comprovaram que apoio social e saúde estão linearmente associados. Barrios (1999, cit. in Pietrukowicz, 2001), a este propósito, salienta dois tipos de efeitos do apoio social na saúde e no bem-estar do indivíduo. Os primeiros designam-se por efeitos diretos, e nestes o apoio social tem um efeito evidente sobre o bem-estar, independentemente do nível de stresse (por outras palavras, quanto maior o grau do apoio social, menor será o mal- estar psicológico e, em oposição, quanto menor for o nível de apoio social, maior será a incidência de perturbação, independentemente dos acontecimentos de vida indutores de stresse). Os segundos efeitos designam-se de efeitos indiretos, e nestes o apoio social funciona como uma variável moderadora de outras variáveis que influen- ciam o bem-estar. Por outras palavras, este efeito considera que, quando as pessoas estão expostas a acontecimentos de elevado stresse, poderão ser influenciadas negativamente, principalmente quando o seu nível de apoio social é baixo.

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A investigação existente demonstrou também que quando o apoio social diminui, há um comprometimento do sistema de defesa do corpo do paciente, que o faz muitas vezes regredir no processo de cura, ou recuperação da doença tratada no momento.

Nesta perspetiva, o apoio social funciona como um mediador do stresse isto é, à medida que o doente se sente aceite, acolhido, cuidado pelas pessoas que estão ao seu redor e possui um grau de significação para ele, o nível de stresse face à doença é controlado, e muitas vezes até reduzido, estando mediado por essa relação entre o doente e sua rede social (Aragão et al., 2009).

Em síntese, o apoio social permite que as pessoas tenham mais saúde. Quando estamos sozinhos, inevitavelmente, a tendência natural é preocuparmo-nos mais com a doença. Por outro lado, quando criamos laços de afetividade, aumentamos a nossa capacidade de enfrentar situações difíceis e dolorosas, aumentando assim a possibi- lidade de uma vida melhor. Portanto, os riscos de adoecer por problemas associados a fatores psicológicos tendem a ser reduzidos (Pietrukowicz, 2001). Podemos deste modo concluir que quando a perceção de que o apoio social é satisfatória, este desempenha um papel fundamental na dimensão psicológica do ser humano, o que leva à recuperação da doença e à promoção da qualidade de vida.

1.3. Avaliação e efeitos do apoio social na qualidade de vida de doentes com perturbações do humor

Existe um grande interesse por parte da comunidade científica em estudar a relação entre o apoio oferecido pela família e o apoio social e, mais do que isso, de como as perceções destas formas de apoio podem estar associadas a uma função amorte- cedora e preventiva em casos de situações estressantes vivenciadas pelos indivíduos, como é o caso da doença mental (Cardoso & Batista, 2014). Como ressaltam Barth, Schneider e Känel (2010), evidências empíricas mostram que a baixa percepção de apoio social pode constituir um dos fatores que contribuem para o desenvolvimento de patologias como depressão, perturbações de ansiedade, proporcionando assim menor qualidade de vida e bem- estar psicológico.

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No que diz respeito à avaliação do apoio social, alguns autores são unanimes na ideia de que, estamos perante um conceito com características multifacetadas, cuja definição e operacionalização se torna complexa. De forma geral, a avaliação do apoio social remete para a questão da perceção de apoio recebido e a sua avaliação dá-se por meio da investigação do quanto as pessoas percebem o apoio vindo de outros indivíduos de sua rede social, podendo em alguns casos, fazer distinção entre essas pessoas, tais como, membros da família, da comunidade ou grupos específicos. Outras avaliações entendem que o apoio social deve ser avaliado não só relativamente à quantidade de pessoas que prestam apoio regularmente, mas também à qualidade de tais interações, ou seja, não é apenas importante a perceção do apoio recebido pelos sujeitos, mas também a satisfação com o mesmo (Agneessens, Waege, & Lievens, 2006). As pessoas com perturbações do humor, têm em geral uma rede social mais reduzida e pouco recíproca, estando mais expostos ao isolamento social (Barron,1996).

Corroborando esta ideia, Rodrigues e Madeira (2009), numa revisão teórica sobre apoio social e saúde mental, constataram que pessoas que têm baixa perceção de apoio social, ou seja, que possuem uma rede social escassa, apresentam frequente- mente sintomas de doença mental, nomeadamente sintomas depressivos.

Rueger, Malecki e Demaray (2010) realizaram uma revisão de estudos que apoiaram a hipótese de que o apoio social pode contribuir para o desenvolvimento de relações sociais adequadas e vinculação segura dos indivíduos e que uma perceção positiva do apoio social e familiar associa-se a baixos índices de depressão e baixa autoestima. Em contrapartida, estes autores salientaram que quanto menor a perceção de apoio social e familiar, maior tendem a serem os índices de sintomatologia depressiva e sofrimento psíquico.

Brown et al. (1973, cit. in Cobb, 1976), num estudo comparativo entre mulheres com doenças afetivas, em que metade tinha um confidente (definido como uma pessoa, usualmente do sexo masculino, com quem a mulher tinha uma relação intima e de confiança) e em que a outra metade não tinha, concluiu que o grupo das mulheres que não tinha confidente apresentava 10 vezes mais possibilidades de estarem deprimidas do que o grupo que tinha confidente.

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Num estudo com doentes com perturbações afetivas realizado por Tucci et al. (2001), verificou-se que os doentes que tiveram o pior resultado em termos de adaptação social foram os doentes bipolares e os doentes com depressão dupla, com destaque para a dimensão de isolamento social, significativamente mais elevada entre estes dois grupos de indivíduos. Os doentes bipolares apresentaram a maior percentagem (20.6%) sendo considerados os menos adaptados socialmente. Por outro lado, os doentes com depressão dupla apresentaram-se com um grau de desadaptação grave em 15.3%. Os unipolares apresentaram uma pequena diferença em relação aos doentes distímicos, com vantagem para esses últimos.

Verifica-se que ter redes de apoio social disponíveis, reduz o isolamento social das pessoas com doença mental, protege os sujeitos dos estados patológicos, prevenindo a doença mental e aumentando a esperança de viver (Cobb, 1976).

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2. Qualidade de Vida

2.1. Qualidade de vida: Análise e conceito

O termo qualidade de vida, por se tratar de uma construção que contempla aspetos da subjetividade, fomentou ao longo das últimas décadas muitas discussões e originou várias conceptualizações na literatura científica (e.g., Canavarro, 2010; Minayo, 2000;

Pereira, Teixeira, & Santos, 2012; Quartilho, 2010; Seidl & Zannon, 2004). Na literatura científica tem-se observado uma proliferação de conceitos para a QdV, advindos da multidisciplinariedade dos diversos campos de saber, o que dificultou a elaboração de uma definição globalmente aceite (Canavarro, 2010; Cummins, 1997; Farquhar, 1995;

Quartilho, 2010). Perante estas informações, entendemos a QdV, tal como o apoio social, como um constructo imbuído de um elevado nível de complexidade, sendo necessária uma abordagem multifatorial e multidisciplinar.

Ao falar do conceito de QdV, referimo-nos a um termo cada vez mais expressado na linguagem popular, sendo consensual que cada pessoa apresenta uma definição de QdV, tendo em conta as suas experiencias e interpretação pessoal do que considera ser o seu bem-estar. Na verdade, a “qualidade de vida é uma vaga e etérea entidade, algo sobre a qual muita gente fala, mas que ninguém sabe claramente o que é”

(Campbell, 1976, cit in Seidl & Zannon, 2004, p. 581).

Nesta linha de pensamento, a QdV foi definida pelo grupo de QdV da OMS como “a perceção do indivíduo sobre a sua posição na vida, no contexto da cultura e do sistema de valores nos quais ele vive, e em relação a seus objetivos, expetativas, padrões e preocupações” (WHOQOL Group, 1994, p. 28). Este constructo é remetido, assim, para o plano individual de cada pessoa, tendo em conta os seus valores e necessidades, consubstanciados pelo ambiente cultural em que se insere. Esta definição de QdV é uma definição que resulta de um consenso internacional, representando uma perspetiva transcultural, bem como multidimensional, e comtempla a influência da saúde física e psicológica, nível de independência, relações sociais, crenças pessoais e

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suas relações com características do respetivo meio na avaliação subjetiva da QdV individual (WHOQOL Group, 1993, 1994, 1995, 1998).

De acordo com Houaiss e Vilar (2002), o termo QdV pode ser analisado segundo os seus dois componentes: “qualidade” e “vida”. “Qualidade” significa propriedade que determina a essência ou natureza de um ser ou coisa. Quando nos referimos a este termo lembramo-nos, não apenas do termo “característica”, mas também dos valores, como felicidade, sucesso, dinheiro, saúde e bem-estar. Por sua vez, “Vida” é descrita como a característica que representa os organismos cuja existência evolui do nascimento até à morte.

A construção do conceito de qualidade de vida fundamentada nos modelos em que é atualmente considerada partiu de diversas propostas, com aplicações práticas distintas, o que valoriza a discussão para uma melhor compreensão do conceito. A este propósito, o modelo Global da Qualidade de Vida de Felce e Perry (1995) reflete diversas assunções sobre QdV: é “composta por uma homogeneidade de fatores, independentemente das populações ou grupos de referência; é experienciada quando as necessidades de uma pessoa são satisfeitas e quando ela tem oportunidade de enriquecimento pessoal em áreas que valoriza; tem componentes subjetivos e objetivos, mas é a perceção que o indivíduo tem do seu bem-estar que primeiro e melhor a reflete; é baseada em necessidades e opções individuais; é um constructo multidimensional, influenciado por fatores pessoais e ambientais, tais como as relações íntimas, a vida familiar, os amigos, o trabalho, a vizinhança, a localidade de residência, a habitação, a educação, a saúde, o nível de vida e o estado de uma nação”

(Canavarro, 2010, p. 11).

Na literatura existente, os conceitos de felicidade, satisfação com a vida, bem-estar e qualidade de vida tendem a ser utilizados indiferenciadamente, variando nas dimensões que abrangem consoante autores. Para Westaway, Olorunju e Rai (2007) as dimensões ponderadas acerca da satisfação pela vida ou bem-estar subjetivo são padrão de vida, saúde, realização pessoal, relações interpessoais, segurança, segurança futura e integração na sociedade. O bem-estar subjetivo, por sua vez,

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segundo Quartilho (2010), é um conceito específico, afetivo e cognitivo, definido pela presença de níveis relativamente elevados de afeto positivo, níveis relativamente baixos de afeto negativo e uma avaliação globalmente positiva da vida, ou satisfação com a vida. No entanto, como refere Canavarro (2010), “os conceitos de felicidade, satisfação com a vida e bem-estar subjetivo, apesar de mutuamente relacionados e ligados à noção de qualidade de vida, traduzem-se também em constructos não raras vezes contestados, quer pela sua ambiguidade, quer pela sua utilidade restrita e aplicabilidade limitada” (p. 6).

Por outro lado, salientamos o Modelo Integrativo da Qualidade de Vida, proposto por Grazin e Haggard (2000), que valoriza as experiências pessoais dos indivíduos, o meio físico e social em que habitam, e que cruza estas variáveis com as características e comportamentos intrínsecos de cada sujeito. Este modelo engloba o eixo pessoal (e.g., fatores demográficos, atitudes, valores), o ambiental (incluindo aspetos físicos e sociais) e o da experiência subjetiva de vida (e.g., saúde mental).

Segundo Day e Jankey (1996, cit. in Pereira et al., 2012), os estudos de QdV podem ser classificados em quatro abordagens gerais: (1) socioeconómica: considera os elementos económicos e sociais como indicadores de uma “vida boa” ou de uma “vida com qualidade, tais como escolaridade, habitação, poder económico ou sucesso; (2) psicológica: esta abordagem preconiza as reações subjetivas dos indivíduos, tendo em conta a sua vivência pessoal e avalia fatores como felicidade e satisfação; a limitação desta abordagem é desconsiderar o contexto ambiental, reforçando apenas os aspetos subjetivos da QdV; (3) médica: aposta na concretização de melhores condições de vida para as pessoas doentes. Avalia, no geral, o impacto do estado de saúde na QdV dos doentes, tendo como base a cura das doenças; e (4) geral ou holística: esta abordagem integra os fatores multidimensionais que integram a QdV, tendo em consideração as diferenças pessoais de cada pessoa. Aqui, conceitos como valores pessoais, interesses e inteligência são valorizados. Esta abordagem relaciona a QdV com a saúde.

Na área da saúde, o interesse pelo conceito QdV é relativamente recente e decorre, em parte, dos novos paradigmas que têm influenciado as políticas e as práticas do

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setor da saúde nas últimas décadas (Seidl & Zannon, 2004). Na opinião de Fleck (2008), e no que respeita ao contexto de saúde, o interesse sobre a QdV advém fundamental- mente dos avanços da investigação na medicina moderna que se traduziu em novos e mais eficazes tratamentos que permitiram um controlo dos sintomas ou uma desaceleração do curso natural da doença, promovendo a QdV como uma medida relevante de resultados em saúde. Neste contexto, e depois da conceptualização de QdV pela OMS, e de acordo com Vaz Serra (2010) “o doente deixou de ser considerado um simples “armazém de doença” (p. 31). No processo de cura deixou de ser suficiente aspirar apenas à remoção dos sintomas. Começou a ser necessário ter igualmente em conta o bem-estar físico, mental e social do indivíduo”. Neste sentido, compreende-se a relevância de avaliar a QdV em contextos de saúde e doença.

A fim de se obter uma possível uniformização da abordagem ao conceito de QdV, na década de 90, a OMS propôs a formação de um grupo para discutir este conceito e desenvolver um instrumento transcultural para o avaliar (Skevington, Sartorius, Amir,

& WHOQOL Group, 2004). O primeiro instrumento desenvolvido por este grupo foi o WHOQOL-100 (WHOQOL Group, 1994, 1995). Este instrumento foi composto por 100 perguntas destinadas a uma avaliação genérica da QdV, e encontra se estruturado em seis grandes domínios: Físico; Psicológico; Nível de Independência; Relações Sociais;

Ambiente; e Espiritualidade. Cada campo engloba facetas específicas acerca da avaliação da QdV e da saúde global de cada pessoa (Canavarro, Pereira, Moreira, &

Paredes, 2010). Posteriormente, foi desenvolvida uma versão mais breve do WHOQOL- 100, denominada de WHOQOL-Bref (e composto por 26 itens), que foi utilizado no presente estudo e será descrito na parte metodológica deste trabalho.

Temos em Portugal, exemplos promotores do conhecimento científico na área da QdV, através do Centro Português de Avaliação da Qualidade de Vida da OMS. Publicações recentes evidenciam esse trabalho, envolvendo estudos na área da QdV em pessoas da população geral (Gameiro et al., 2010), mas também em populações com diagnósticos psiquiátricos, tais como depressão major (Gameiro, Carona, Silva, & Canavarro, 2010), perturbação bipolar (Figueira, Gameiro, & Leitão, 2010) e esquizofrenia (Vaz-Serra, Pereira, & Leitão, 2010); presença de sintomatologia depressiva (Gameiro et al., 2008);

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pessoas infetadas com o vírus da imunodeficiência humana (VIH; Pereira & Canavarro, 2010); doença oncológica do aparelho locomotor (Paredes, Simões, & Canavarro, 2010); cancro da mama (Silva, Moreira, Canavarro, & Pinto, 2010); paralisia cerebral (Carona, Canavarro, Pereira, & Gameiro, 2010) e em contextos de reprodução medicamente assistida (Moura-Ramos, Gameiro, & Canavarro, 2010).

2.2. Qualidade de vida das pessoas com doença mental

Foi a partir dos anos 80 do século XX que o conceito de QdV começou a adquirir um domínio crescente na área da saúde, aumentando a sua pertinência em todas as ações médicas (Lowy & Bernhard, 2004). Este facto deveu-se à constante procura e superação de novos desafios por parte da ciência médica de modo a melhorar as expectativas de vida dos doentes.

Associado a este facto está também a recente promoção da descentralização dos serviços de saúde mental, de modo a permitir a prestação de cuidados mais próximos das famílias e da própria comunidade. Com efeito, as medidas do Programa Nacional para a Saúde Mental da Direção Geral de Saúde (DGS, 2017, p. 14) têm como objetivo

“promover a descentralização dos serviços de saúde mental, de modo a permitir a prestação de cuidados mais próximos das pessoas e a facilitar uma maior participação das comunidades, dos utentes e das suas famílias. Nesta linha, e como mencionado por Hespanha, Portugal, Nogueira, Pereira e Hespanha (2012) confluem que “alguns fatores são fundamentais: a desdiferenciação dos cuidos de saúde mental, no sentido de passarem a incluir dimensões não exclusivamente clínicas, a sua descentralização e integração nos cuidados gerais de saúde, o reconhecimento da natureza complexa da doença mental (entre o biológico e o social), a manutenção (sempre que possível) das pessoas com perturbação mental no seu meio ou a sua reinserção social quando institucionalizadas e o envolvimento da família e outros cuidadores informais no processo terapêutico” (p. 234).

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O projeto Global Burden of Disease indica que existem “níveis significativos e crescentes de transtornos mentais entre a população adulta global. Entre as mulheres, a depressão major é a principal causa dos anos vividos com dependência, enquanto a ansiedade ocupa o sexto lugar nesta lista. Por outro lado, entre os homens, a depressão major ocupa o segundo lugar, os distúrbios do uso de drogas no 7º lugar, os distúrbios do uso de álcool são 8º e os níveis de ansiedade 11º. Estima-se que um em quatro ou cinco jovens (entre 12 e 24 anos) sofra de transtorno mental em qualquer ano, não obstante variações substanciais na prevalência entre regiões” (WHO, 2014, p.23).

As perturbações mentais atingem pessoas em todas as culturas do mundo, variando a sua identificação de acordo com a forma como cada paciente a interpreta e a expõe ao clínico. As principais consequências desta doença fazem-se sentir em diferentes domínios da vida da pessoa, afetando claramente a sua qualidade de vida (Quartilho, 2001).

No European Study of Epidemiology of Mental Disorders (2002), que pretendia avaliar o impacto das doenças mentais na QdV concluiu que, para além das doenças mentais terem um impacto mais negativo na QdV do que as condições clínica físicas, também entre as doenças mentais algumas tinham mais impacto que outras. Tendo em conta o género, idade e comorbilidade física, as cinco doenças mentais identificadas como tendo um impacto mais negativo na QdV foram a distimia, o episódio depressivo major, a perturbação de pânico, a fobia social e a perturbação stresse pós-traumático (Alonso et al., 2004).

Galera e Teixeira (1997) num estudo com 102 doentes, concluíram que a doença mental estava associada ao mau desempenho nas seguintes áreas: trabalho - dificuldades de inclusão no mercado de trabalho, dificuldades em completar tarefas exigidas; família - problemas de relacionamento com os elementos da família, isolamento; saúde/doença - dificuldades em aderir ao tratamento, procurar apoio médico; social - problemas em interagir em ambientes públicos; e moradia - falta de condições financeiras.

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Esta incapacidade tem variadíssimas razões, alguns dos seus sintomas como a falta de concentração e a baixa motivação para realizar as tarefas do dia-a-dia combinado com a irritabilidade pode trazer efeitos desastrosos nas relações familiares e de trabalho (Patel et al., 2010)

A importância de estudos em sujeitos com perturbação mental prende-se com a necessidade de entender melhor as limitações e o sofrimento ligados às doenças mentais, de modo a minimizar o sofrimento destas pessoas. Por outro lado, existe uma carência de informação na população geral, que explica a necessidade de promoção da literacia em saúde mental.

2.3. Qualidade de vida das pessoas com perturbações do humor

2.3.1. Perturbações do humor

Portugal é um país com uma considerável prevalência de perturbações psiquiátricas em geral e das perturbações de humor em particular. Estas patologias tendem a ser mais frequentes em países com maiores desigualdades económico-sociais (Programa Nacional para a Saúde Mental, 2013). O humor é o estado basilar do indivíduo, o seu estado de espírito. Produz influência na nossa perceção do mundo, o que se traduz nos comportamentos e vivências relacionais dos indivíduos (Correia, 2013). Os doentes que sofrem de perturbações do humor apresentam características frequentes de alteração do humor e da afetividade, o que provoca uma enorme carga de sofrimento e incapacidade (Saraiva et al., 2014).

A depressão refere-se a uma ampla gama de problemas de saúde mental caracterizada por sintomas emocionais negativos (perda de interesse e prazer - anedonia) e sintomas cognitivos, físicos e comportamentais associados (Sampaio et al., 2014). Os principais sintomas de depressão são a tristeza, desânimo, angústia, falta de vontade, choro com facilidade e anedonia, sendo esta última muito característica deste quadro psicológico.

Outros sintomas importantes são alterações no apetite, no peso e no sono, diminuição

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da libido, agitação ou retardo psicomotor. O padrão de pensamentos do doente deprimido está, com frequência, relacionado com sentimentos de inferioridade, desvalorização, incompetência, culpa, assim como dificuldade na tomada de decisões e dificuldades de concentração. Estes pensamentos podem estar ainda relacionados com ideações suicidas (Andretta & Oliveira, 2011). O doente descreve-se a si mesmo como triste, vazio, sem esperança, sendo difícil tentar alterar o seu estado de humor, pois o doente sente-se deprimido em todas as situações da vida diária (Saraiva et al., 2014).

Nas perturbações do humor, salienta-se também a relevância da perturbação bipolar.

De acordo com a OMS, a perturbação bipolar é a sexta causa de incapacidade a nível das doenças globais, e a terceira entre as doenças mentais, seguida da depressão unipolar e da esquizofrenia. A carga desta doença mental é muitas vezes causada pelas comorbilidades psiquiátricas e físicas e pela baixa adesão ao tratamento. De acordo com Costa (2008), a incapacidade funcional provocada pela perturbação bipolar é semelhante à de muitas doenças crónicas.

A prevalência da distimia é de sensivelmente 3 a 6% da população em geral sendo uma das condições mais comuns observadas na prática clínica (Spanemberg & Juruena, 2004). Podemos definir distimia, como uma forma persistente ou crónica de depressão ligeira; os seus sintomas são semelhantes aos do episódio depressivo, mas tendem a ser menos intensos e durar mais tempo. Os doentes descrevem o seu humor e a si mesmo como tristes. O carácter crónico desta perturbação faz com que os sintomas façam parte da rotina do doente e associam-se em geral a uma baixa autocrítica – “eu sempre fui assim” - causando uma dificuldade acrescida na identificação destes indivíduos pelo clínico (APA, 2013).

Com frequência, as perturbações do humor apresentam comorbilidade com as perturbações de ansiedade. As perturbações de ansiedade dizem respeito a um grupo de distúrbios mentais caracterizados por sentimentos de ansiedade e medo, incluindo perturbação de ansiedade generalizada (PAG), perturbação de pânico, perturbações fóbicas, incluindo a fobia social, perturbação obsessiva-compulsiva (POC) e perturbação de stresse pós-traumático (PSPT). Tal como na depressão, os sintomas

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destes quadros psiquiátricos podem variar de ligeiros a graves. A duração dos sintomas tipicamente experimentados por pessoas com perturbações de ansiedade torna-a mais uma doença crónica do que episódica (Carvalho, 2017). A proporção da população global com perturbações de ansiedade, em 2015, foi estimada em 3,6%. Tal como acontece com a depressão, são mais comuns entre as mulheres (4,6% vs. 2,6% nos homens, a nível global). As taxas de prevalência não variam substancialmente entre os grupos etários, embora haja uma tendência observável para menor prevalência entre as pessoas mais idosas. O número total estimado de pessoas que vivem com distúrbios de ansiedade no mundo é de 264 milhões. Este total para 2015 representa um aumento de 14,9% desde 2005, em resultado do crescimento da população e do envelhecimento (Carvalho, 2017).

2.3.2. Impacto das perturbações do humor na qualidade de vida

Os indivíduos com perturbações do humor possuem marcadas incapacidades como menor autonomia nas atividades de vida diárias, o que se pode traduzir em níveis mais elevados de dependência de terceiros e maior incapacidade de integração laboral e social, o que afeta no global, a sua qualidade de vida.

Fleck et al. (2012), num estudo que avaliou a saúde física e emocional de 2.201 doentes deprimidos mostrou uma associação entre uma maior intensidade de sintomatologia depressiva e maior comprometimento psicológico, social e físico. As conclusões do estudo revelaram ainda que os indivíduos com mais intensidade de sintomas depressivos avaliaram a sua saúde como pior e estavam menos satisfeitos com ela do que aqueles com menor intensidade de sintomas depressivos.

Rapaport, Clary, Fayyad e Endicott (2005) avaliaram o impacto das perturbações de humor e ansiedade na QdV dos indivíduos, comparando-os com um grupo de controlo sem perturbação psiquiátrica. Neste estudo, os autores concluíram que todos os doentes com perturbação psiquiátrica apresentavam pior perceção de QdV que os do

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