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PERiÓDICOS
ROBERTO VENTURA
(1957 - 2002)
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uarta-feira, 14 de A
gos-to, hora de ,alm oço. Sen-tara-m e a m esa, o telefone toca. Era do Rio: a am iga Luitgarde Cavalcanti
fala com voz. baixa e
estra-nha - soube depois que sofrera um a cirurgia
tireoidiana - dizendo ter notícia triste a dar: a
m orte de Roberto V entura naquela m adrugada, num acidente de estrada, ao dirigir de retorno de
São José do Rio Pardo, aonde fora participar, m ais um a vez, da 90ª Sem ana Euclidiana. Seu carro
batera atrás de um a carreta e tivera m orte no local.
Roberto participara lá, em São José do Rio Pardo, de um a m esa-redonda e m inistrara um a
aula no ciclo de estudos, atividades regulares da Sem ana Euclidiana, anual. V oltara para São
Paulo no dom ingo a fim de passar o D ia dos
Pais, cruzando os 266 km até a capital para
en-contrar Thom az, seu único filho. À noite, fora para Cam pinas, onde tinha com prom issos na U nicam p. M as retom ara para São José do Rio
Pardo na segunda-feira à noite para trabalhar
no Centro de Estudos e Pesquisas Euclidianos D r. O sw aldo G alotti, na terça-feira. À noite, jan-tara com colegas num restaurante e partira às
23:00h, para encontrar a m orte no cam inho de
volta, aos 45 anos, deixando a m ulher, a jorna-lista M árcia Zoladz, e ,« filho Thom az Zoladz
V entura, de 14 anos.
Escritor, ensaísta e crítico, Roberto V entu-ra (Rio, 1957 - São Paulo, 2002), era um dos
bons especialistas em Euclydes da Cunha e
Ca-nudos, sobre os quais escrevera já, em vários periódicos, inúm eros artigos e conferências.
N este ano do centenário de publicação de O s
MLKJIHGFEDCBA
S e r t õ e s ,a agenda 2002 deste Professor de Teoria
Literária e Literatura Com
-parada da U SP estava cheia
de com prom issos de parti-cipação em eventos e
de-bates sobre a data.
Roberto tivera um
percurso acadêm ico de prim eira ordem : aluno
do Colégio Santo Inácio e da U niversidade
San-ta Ú rsula, no Rio de Janeiro, onde se graduara em Letras, fazendo depois seu m estrado na PU
C-RJ. A conselhado por Silviano Santiago, seu orientador aí, faz doutorado em Línguas e
lite-raturas Rom ânicas, na Ruhr-Universitât, em
Bochum , A lem anha. Em seguida, desloca-se do
Rio para São Paulo onde, na U SP, orientado por João A lexandre Barbosa, faz novo D outorado
em Teoria Literária e Literatura Com parada. Roberto V entura era um pesquisador
sóli-do, de m irada analítica consistente, sem perder
a sensibilidade estética que lhe assegurava sua excelente form ação e sua perm anente busca.
D esde cedo, com eçara a publicar os resultados
de suas investigações num dom ínio m ulti-facetado, voltado para a vida cultural e literária
da história da inteligência brasileira. A inda em
sua fase carioca, em 1981, com apenas 24 anos de idade, m anifestação de seu talento e
precoci-dade, publica em cooperação com Flora
Süssekind, pela editora M oderna, o livro H i s t ó
-r i a e D e p e n d ê n c i a : c u l t u r a e s o c i e d a d e e m
M a n o e l B o m f i m , obra prim ordial para o
reco-nhecim ento e reavaliação desse brilhante ensaísta
das três prim eiras décadas do século X X , desse
original e rebelde -intérprete do Brasil-, ainda hoje estranham ente silenciado: o livro se com
-põe de excelente ensaio introdutório sobre sua
obra e de um a coletânea sistem ática de textos
EDUARDO DIATAHY
B
DE MENEZES·Escritor. Professor Titular da UFC e da UECE. Membro do Instituto Histórico do Ceará e da
Academia Cearense de Letras.
colhidos de fontes rarefeitas. Três anos m ais
tar-de, publica
MLKJIHGFEDCBA
E s c r i t o r e s , E s c r a v o s e M e s t i ç o s e m u m P a í s T r o p i c a l . Em 1991, pela Com panhia das Letras, sai seu estudo sobre a form ação dacríti-ca literária no país no final do século 19 e início
do 20, em torno da figura de Sílvio Rom ero e de suas polêm icas - E s t i l o T r o p i c a l : h i s t ó r i a c u l t u
-r a l e p o l ê m i c a s l i t e r á r i a s n o B r a s i l . Sua obra m ais recente, F o l h a E x p l i c a C a s a - G r a n d e
LKJIHGFEDCBA
& S e n z a l a ,de 2000; e acabara há pouco outro livro, F o l h a E x p l i c a Os S e r t õ e s , que a Publifolha lançará em setem bro deste ano. Deixa inconclusa sua
gran-de obra, na qual vinha trabalhando sem cessar há 10 anos: um nova biografia de Euclydes da
Cunha em que buscava fundir vida e obra desse
gênio trágico.
Eu o conhecia com o autor desde m uito.
Em pessoa, fizem os am izade na Sem ana
Euclidiana de 1996, em São José do Rio Pardo.
De cada vez que nos reencontram os, em Forta-leza, na Bahia, em Colônia (Alem anha), Roberto,
com seu jeito afável, discreto, cortês e genero-so, portava um a caderneta onde anotava tudo
quanto podia colher para o seu trabalho e
esta-146
R E V IS TA D E C ltNCiAS SO CIAIS V.33
~. 2va sem pre à cata de esclarecer dúvidas de suas
pesquisas sobre Euclydes. Por isso confiava nos
colegas para quem enviava freqüentes m ensa-gens por correio eletrônico, a fim de retificar
um a data ou fato, buscar docum entos que
des-sem suporte a afirm ações, etc.
Confesso m inha profunda tristeza com a
notícia de sua m orte. Num a bela conferência,
- E u c l y d e s d a C u n h a : a h i s t ó r i a c o m o t r a g é d i a » ,
que proferiu, em 2000, na Biblioteca Nacional,
vejo prenúncios agoureiros disso que os Gregos cham avam de m o i r a . M orto Euclydes da Cunha num a m anhã de dom ingo triste e chuvoso 05/ Agosto/1909), aos 43 anos, que estranho
fascí-nio sua figura agonística exercia sobre esse am
i-go de serena aparência? Fico a m editar sobre a
socrática m alícia do verso final de Vinícius de
M oraes, em seu grandioso e belíssim o poem a
· A M orte de M adrugada-, acerca do assassinato de García Lorca na Espanha franquista:
· A m o r t e é s i m p l e s d e m a d r u g a d a . . . »
Fortaleza, 23 de agosto de 2002.