LARVAS DE CHAOBORUS SP COMO COLMATADORAS DE
LEITOS FILTRANTES NA ETA SERRA AZUL - JUATUBA - MG
Fernando Antônio Jardim(1)
Biólogo, formado pelas Faculdades Metodistas Integradas Izabela Hendrix, Belo Horizonte - MG. Supervisor do setor de Hidrobiologia do Laboratório Central da Divisão de Serviços de Apoio da COPASA-MG e mestrando do curso de Saneamento Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais.
Simoni de Oliveira Cavalieri
Bióloga, formada pelas Faculdades Metodistas Integradas Izabela Hendrix, Belo Horizonte - MG. Analista de Laboratório do Setor de
Hidrobiologia do Laboratório Central - Divisão de Serviços de Apoio - da COPASA-MG. José Mauro Salgado Braga
Biólogo, formado pelas Faculdades Metodistas Integradas Izabela Hendrix, Belo Horizonte - MG. Técnico analista do Setor de Hidrobiologia da Divisão de Serviços de Apoio da COPASA - MG.
Maria Beatriz Gomes e Souza Dabés
Bióloga, formada pela Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte - MG. Pesquisadora-Responsável da Keratella Estudos e Projetos Ambientais Ltda. - Montes Claros - MG.
Endereço(1): Companhia de Saneamento de Minas Gerais - COPASA - MG - Laboratório Metropolitano - Setor de Hidrobiologia - BR 040 - Km 445 - Trevo de Nova Lima - Belo Horizonte MG Tel: (5531) 2502383 Fax: (5531) 2502355 CEP: 31950640 -Brasil - e-mail: labo@copasa.com.br
RESUMO
A represa do sistema Serra Azul está situada a 50 Km de Belo Horizonte no município de Juatuba, na latitude de 200 00’00’’ S e longitude de 440 21’00’’ O e a uma altitude de 760 m. Possui uma área de 8.9 Km2 , em uma bacia de 2720 Km2. O seu clima é do tipo CWD, segundo Köeppen, com precipitação média mensal anual de 123.4 mm. Com relação à geologia da bacia, ocorrem rochas dos complexos granítico, magmático, filítico e série minas. A bacia é composta principalmente pelos ribeirões Serra Azul e Diogo e córregos Brejo, Jacui, Estiva, Potreiro e Curralinho, que alimentam o reservatório com uma vazão anual de aproximadamente 3.360 m3/ segundo. Quanto a morfologia, a barragem possui forma dendrítica com profundidade máxima de 38.0 m e uma profundidade média de 10.5 m. A Estação de Tratamento de Água (E.T.A) é do tipo clarificador de contato com a vazão nominal de 2700 l/s e atualmente tratando uma vazão de 1580 l/s, com captação de água na Represa Serra Azul. O principal objetivo deste trabalho consistiu em caracterizar a influência das larvas de Chaoborus sp., como colmatadoras de leitos filtrantes na E.T.A., nos períodos de outubro de 1997 a março de 1998, correlacionando com os parâmetros físico-químicos e operacionais como forma de avaliação global da eficiência da estação no mesmo período. Verificou-se que o desenvolvimento de larvas de Chaoborus sp. (Diptera), correlacionou-se positivamente com o acréscimo nos valores da temperatura, dosagem de cloreto férrico e cloro. Uma
correlação contrária foi obtida entre o acréscimo do número de larvas na água bruta e a remoção de cor, a redução do tempo carreira dos filtros e os valores de cloro residual na água tratada.
PALAVRAS-CHAVE: Larva de Chaoborus sp., Colmatação de Leitos Filtrantes.
INTRODUÇÃO
Dentre os organismos zooplanctônicos que podem causar problemas de colmatação de leitos filtrantes em estações de tratamento de água, as larvas de Chaoborus da classe Diptera é citadas como uma das principais (BRANCO 1986). Estes organismos são elementos constantes no plâncton de ambientes lênticos em regiões temperadas e tropicais, sendo comuns em reservatórios brasileiros. Estas larvas realizam periódicas migrações verticais, permanecendo grande parte do tempo na superfície do sedimento e deslocando para a coluna d’água durante a noite. De modo geral, alimentam-se de algas e organismos menores nos primeiros estágios de crescimento e os crustáceos são preferencialmente consumidos nos últimos. ARCIFA (1997), analisando um reservatório no sudeste brasileiro, encontrou um aumento considerável destas larvas na estação chuvosa-quente (outubro a abril), em cujo conteúdo estomacal de mais de 1000 indivíduos foram encontrados pequenos flagelados, Peridinium, rotíferos, Bosmina tubicen e jovens de Daphnia gessneri. Estas larvas são providas de câmaras traqueais aeríferas, que permitem que o organismo flutue na coluna d’água, e papilas anais que absorvem água e íons (MARGALEF 1983). Nas E.T.A. (s) usuais, o processo de decantação (quando existente) não retêm os organismos que permanecem no sobrenadante e são encaminhados para os filtros, provocando a colmatação.
A Estação de Tratamento de Água (E.T.A.) estudada, tem por finalidade adequar a água bruta da Represa Serra Azul aos padrões estabelecidos pela portaria 036/90 do Ministério da Saúde para água potável. Esta E.T.A., que possui o tratamento de água por clarificação de contato, projetada para operar em uma vazão nominal de 2.700 l/s (atualmente trata 1580 l/s), é composta de medidor de vazão tipo pitô, caixa de pré-cloração, sendo que na primeira caixa de mistura, recebe o cloreto férrico e a cal reação, esta última quando necessária. A água floculada segue para vinte filtros com uma taxa de filtração de 135 m3/m2.dia, de camadas simples (de areia), com filtração descendente.
O principal objetivo deste trabalho foi identificar os possíveis fatores que influenciam o desenvolvimento das larvas do inseto Chaoborus sp e correlacionar com os parâmetros hidrobiológicos, físico-químicos e operacionais como forma de avaliação global da eficiência da estação.
METODOLOGIA
As amostras destinadas a análises físico-químicas de rotina foram coletadas na torneira do laboratório e do reservatório de compensação. As amostras para as análises hidrobiológicas foram coletadas na estação de amostragem próxima a torre de tomada e nos filtros.
As amostragens foram efetuadas com as seguintes freqüências:
Diária ( duas em duas horas) para pH, temperatura, cor, turbidez e cloro residual; Mensal para fitoplâncton e zooplâncton qualitativo/ quantitativo e clorofila a.
As coletas e as análises físico-químicas e hidrobiológicas, foram realizadas segundo as Normas Técnicas da COPASA-MG e o Standard Methods -1995. Os resultados de cada enumeração ao microscópio foram expressos em número total de organismos por mililitro, sendo em paralelo efetuada uma listagem do número de organismos. Os dados foram correlacionados numa escala temporal, com os resultados das análises físico-químicas (pH, Cor, Turbidez, cloro residual e temperatura da amostra) e operacionais (vazão, tempo de carreira, dosagem de cloreto férrico, cloro e cal correção). Os resultados obtidos foram avaliados por rejeição da hipótese nula com 95% de confiança e pelo coeficiente de correlação de Pearson ® conforme LUDWIG et. al (1988). Para melhor visualização gráfica todos os valores estão representados em escala logarítmica, de acordo com von SPERLING et al (1996).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na figura 1, observa-se uma queda das populações de Copepoda (representada principalmente pelas larvas-Nauplius Cyclopoida e Thermocyclops minutus), Cladocera( Daphnia gessneri e Diaphanosoma birgei) e Rotifera (Ascomorpha eucadis e Ptygura libera), durante o período de incremento das larvas.
Figura 1 - Composição dos grupos do zooplâncton e abundância das larvas de
Chaoborus sp, Represa Serra Azul, Juatuba/MG, out/97 a mar/98.
-2,00 -1,50 -1,00 -0,50 0,00 0,50 1,00
Out-97 Nov-97 Dez-97 Jan-98 Fev-98 Mar-98
data
log (org/l)
ROTÍFERA (log org/l) CLADOCERA (log org/l) COPÉPODA (log org/l) Chaoborus sp.(log org/l)
Chaoborus sp
Os indivíduos do gênero Chaoborus sp tem importante papel na reciclagem dos nutrientes de ambientes aquáticos, pelo fato de habitarem o sedimento e a coluna d’água e serem
consumidos pelos peixes(ESTEVES, 1988). As larvas adultas são carnívoros e localizam suas presas seguindo estímulos mecânicos, alimentando-se principalmente de microcrustáceos, influindo assim na comunidade planctônica. Segundo estudos, o consumo do zooplâncton pelas larvas, pode alcançar uma densidade diária de 10% do total presente no corpo d’água. Este hábito alimentar foi confirmado pelos dados obtidos e representados na figura 1, onde o aumento da densidade das larvas coincidiu com a queda do zooplâncton.
Os resultados obtidos para dosagem de clorofila a, (figuras 2) demonstraram que o aumento da abundância das larvas foi acompanhado pelo incremento da produtividade primária nas águas da represa. Pesquisas realizadas em lagos americanos constataram que a abundância destas larvas foram correlacionadas positivamente com o aumento do estado trófico do ambiente. Figura 2 - Clorofila a versus larvas de Chaoborus sp.(org/l), Represa Serra Azul, Juatuba/MG, out/97 a mar/98.
-2,0 -1,5 -1,0 -0,5 0,0 0,5 1,0 1,5
Out-97 Nov-97 Dez-97 Jan-98 Fev-98 Mar-98
data
log
Chaoborus sp.(log org/l) Clorofila a (log ug/l)
Figura 3 - Comparação entre o número de Chaoborus sp. (Org/l) e a remoção de cor da água bruta, E.T.A. do sistema Serra Azul, Juatuba/Mg, out/97 a mar/98.
-2,00 -1,50 -1,00 -0,50 0,00 0,50 1,00 1,50 2,00 2,50
Out-97 Nov-97 Dez-97 Jan-98 Fev-98 Mar-98
DATA
LOG
Cor água bruta(log% rem) Chaoborus sp.(log org/l)
Das correlações de Pearson calculadas foram selecionadas cinco por rejeição da hipótese nula, as quais estão descritas abaixo:
A cor na água para abastecimento público acima de 15,0 uH *, não é tolerável por razões estéticas, sendo o padrão estabelecido pela portaria no. 036/ do Ministério da Saúde, de valor máximo igual a 5,0 uH. Durante o período de análise a cor da água tratada do sistema não ultrapassou o intervalo de 2,5 uH., enquadrando-se desta forma, dentro dos padrões de potabilidade para este parâmetro. A correlação entre a redução deste parâmetro e o número de Chaoborus sp. da água bruta pode ser observada na figura 3.
O tempo de carreira dos filtros é o correspondente ao intervalo entre as lavagens (20 a 40 horas), dependendo das características da água que chega ao filtro e das condições de operação. Esta operação de lavagens é feita em contra-corrente, por inversão de fluxo (de baixo para cima). Durante o período estudado o tempo médio de carreira dos filtros foi de 33:00 horas e observou-se uma correlação contrária com a ocorrência de larvas de Chaoborus sp ( figura 4).
Figura 4- Comparação entre o número de Chaoborus sp. (Org/l) e o tempo de carreira dos filtros, E.T.A. Serra Azul, Juatuba/MG, out/97 a mar/98.
-2,00 -1,50 -1,00 -0,50 0,00 0,50 1,00 1,50 2,00 1/10/97 1/11/97 1/12/97 1/1/98 1/2/98 1/3/98 data
log Tempo carreira(log)
Chaoborus sp.(log org/l)
Observa-se que quanto maior a área do filtro impactada pelas larvas menor é o tempo de carreira. Esta verificação comprova a capacidade das larvas de Chaoborus em colmatar filtros em estações de tratamento de água.
Consumo de Cloreto Férrico - Nas águas de superfície, em que a remoção de turbidez, cor orgânica e bactérias é o principal objetivo do tratamento, a coagulação é importante para a eficiência total da estação. Segundo VIANNA (1994), o cloreto férrico é o resultado do ataque de aparas de ferro pelo ácido clorídrico, fornecido sob a forma líquida com a concentração variando entre 39 a 45% peso por peso.(correspondente a aproximadamente 570 g de FeCl3 por litro de solução). Durante o experimento a dosagem
média deste sal coagulante foi de 7,0 mg/litro, sempre triplicando este valor quando o número de Chaoborus aumentava, como visto na figura número 5.
Destaca-se que o custo agregado ao consumo de cloreto férrico, devido ao prejuízo à floculação pelas larvas de Chaoborus, gira em torno do triplo da média de consumo anual.
Figura 5 - Comparação entre o número de Chaoborus sp. (Org/l) e o consumo de cloreto férrico, E.T.A. Serra Azul, Juatuba/MG, out/97 a mar/98.
-2,00 -1,50 -1,00 -0,50 0,00 0,50 1,00 1,50 1/10/97 1/11/97 1/12/97 1/1/98 1/2/98 1/3/98 data log Dosagem cloreto(LOG) Chaoborus sp.(log org/l)
A Demanda de Cloro é definida como a diferença entre a quantidade de cloro adicionado à água e aquele livre ou combinado disponível. Ao final do processo, o cloro residual deve permanecer para indicar a extensão da reação. Na E.T.A. observou-se que mesmo com o acréscimo da dosagem de cloro gasoso na água bruta do sistema, durante o aumento das larvas, ocorreu uma redução do cloro residual livre na água tratada (figura 6).
Figura 6- Comparação entre a dosagem de cloro, o cloro residual livre e número de
Chaoborus sp. (Org/l), E.T.A. Serra Azul, Juatuba/MG, out/97 a mar/98.
-2,00 -1,50 -1,00 -0,50 0,00 0,50 1,00 1/10/97 1/11/97 1/12/97 1/1/98 1/2/98 1/3/98 data log Dosagem cloro(LOG) Cloro residual(log) Chaoborus sp.(log org/l)
A Temperatura da Água mostrou uma correlação positiva com o aumento de larvas nas águas da represa. Estudos realizados na represa Monte Alegre/SP, ARCIFA (1997), constatou que a população de Chaoborus sp declina na estação seca-fria e aumenta no verão. Este fato foi também observado em trabalhos realizados por outros autores, como WETZEL, 1975; MARGALEF, 1983; REYNOLDS, 1984 in SASTRE, et al, 1994.
CONCLUSÕES
A análise dos dados obtidos permite verificar a ocorrência de algumas correlações importantes entre os parâmetros biológicos, físico-químicos e operacionais. Foi evidenciado que as larvas de Chaoborus contribuem para a colmatação de leitos filtrante em E.T.A.s e no presente estudo, duplicaram-se em número durante o verão. Já que a correlação negativa encontrada entre o total de Chaoborus e o tempo de carreira dos filtros, comprovou o postulado de que quanto maior o número de larvas menor é o tempo de filtração. Outra evidência verificada foram as relações ente o aumento do número de larvas, a cor da água e a produtividade primária, concomitante com a diminuição do zooplâncton. Este comportamento pode ser explicado pelo maior crescimento das algas no período quente do ano, época em que o efeito de predação do zooplâncton herbívoro – já que as larvas carnívoras diminuiram sua população. A cor da água, por sua vez, foi maximizada pelo aumento do fitoplâncton, ocorrendo maior demanda do consumo de Cloreto Férrico e Cloro Gasoso, produtos utilizados como coagulante e oxidante, respectivamente.
A considerar o acréscimo no custo de produção da água potável causado pelo aumento das larvas de Chaoborus, recomenda-se monitorar alguns parâmetros identificados como relacionados com estes insetos:
− Tempo de carreira dos filtros;
− Temperatura da água;
− Abundância das larvas de Chaoborus;
− Abundância do Fitoplâncton e Zooplâncton;
− Teor de Clorofila a;
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Water and Wastewater. 19th ed. Washington,APHA/WEF/AWWA, 1995. 1400p.
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York: John Wiley & Sons, 1988. 337 p.
8. MARGALEF, R. Ecologia. Barcelona, Omega, 1983.
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12. VIANNA, M. R. Hidráulica Aplicada às Estações de Tratamento de Água. 3ª ed. Belo Horizonte, Imprimatur, 1997.
13. von SPERLING, M., HELLER, L., NASCIMENTO, N.O. Investigação Científica em Engenharia Sanitária e Ambiental - a análise preliminar dos dados. Revista Engenharia Sanitária e Ambiental. Belo Horizonte, v.1, n.3 , parte 2, jul/set 1996.