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Sumário. Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 124/07.3TBVFC.L1.S1

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Supremo Tribunal de Justiça

Processo nº 124/07.3TBVFC.L1.S1 Relator: GRANJA FONSECA

Sessão: 29 Maio 2014 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

RESPONSABILIDADE CONTRATUAL PRESSUPOSTOS

CUMPRIMENTO DEFEITUOSO PRESUNÇÃO DE CULPA

ÓNUS DA PROVA DOCUMENTO AUTÊNTICO

PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MATÉRIA DE FACTO

Sumário

I - O valor probatório pleno do documento autêntico não respeita a tudo o que se diz ou se contém no documento, mas somente aos factos que se referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo e quanto aos factos que são referidos no documento com base nas percepções da entidade documentadora.

II - O STJ, enquanto tribunal de revista, apenas pode alterar a decisão sobre a matéria de facto, quando houver ofensa expressa de disposição legal que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou fixe a força de

determinado meio de prova (artigo 729º, n.º 2, do CPC).

III - A responsabilidade contratual é subjectiva, e pressupõe a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil: facto, ilícito, culpa, dano (danos

emergentes e lucros cessantes) e nexo de causalidade.

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IV - A culpa, face ao estatuído no n.º 1 do artigo 799º do CC, presume-se, recaindo sobre o devedor o ónus de provar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua.

V - Viola a obrigação de realizar uma viagem em segurança a ré que na prestação de um serviço (dar a observar ao autor a vida marinha,

nomeadamente cetáceos) numa embarcação que apenas dispunha de 10 lugares para passageiros, seguros e devidamente acomodados, permite o

embarque de 11 passageiros, tendo o último que se sentar na caixa à proa, por inexistir qualquer outro lugar disponível.

VI - Não ilide a presunção de culpa a ré que, em tal circunstancialismo, se limita a dar instruções e distribuir uma ficha informativa sobre a segurança, se da matéria provada resulta que, quando se deu o acidente, o autor estava sentado em cima da caixa situada à proa, de costas para a ondulação, por não existirem lugares suficientes para que todos os passageiros se sentassem – havendo sempre um passageiro que deixaria de ter a disponibilidade de um assento nas duas filas longitudinais, que traduzem a acomodação de

segurança, lugar que aliás foi rotativamente ocupado pelos diversos passageiros – se não resulta provado que o fizesse em desrespeito de instruções específicas da ré quanto àquelas regras de segurança.

Texto Integral

Acordam o Supremo Tribunal de Justiça:

1.

AA instaurou a presente acção declarativa de condenação para efectivação de responsabilidade emergente de acidente ocorrido no âmbito da actividade marítimo-turística, sob a forma de processo ordinário, contra BB - ..., C.R.L. e CC - …, L.da, pedindo que as Rés sejam condenadas solidariamente a pagar ao Autor as seguintes verbas:

a) - A título de rendimentos cessantes já verificados na data de instauração da presente acção, a quantia de € 61.396,92;

b) - A título de reembolso das despesas suportadas pelo Autor com a

assistência, consultas de fisiatria, sessões de fisioterapia e tratamentos, em consequência das lesões que sofreu no acidente, a quantia de € 603,00;

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c) - A título de rendimentos cessantes vincendos, calculados à razão mensal de

€ 1.000,00 por todo o período até que o Autor complete 65 anos de idade, a quantia de € 113.000,00;

d) - A título de indemnização pelos danos não patrimoniais já sofridos pelo Autor, no valor de € 150.000,00;

e) - Juros de mora, à taxa legal, contados sobre as importâncias pedidas nas alíneas anteriores, ou seja, sobre o total de € 324.999,92, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento;

f) - Todas as despesas que o Autor vier a ter de suportar com os cuidados e assistência de fisioterapia e com a intervenção cirúrgica ou intervenções cirúrgicas que o Autor vier a necessitar fazer, pelo montante a liquidar oportunamente em execução de sentença;

g) - A indemnização por danos não patrimoniais futuros, caso se demonstre que a capacidade física de locomoção ficou definitiva e inexoravelmente afectada pelo acidente dos autos, também pelo montante a liquidar em execução de sentença.

Fundamentando a sua pretensão, alegou, em síntese, que, no dia 5 de Agosto de 2004, o Autor contratou com a Ré CC, operadora marítimo-turística, o serviço por esta realizado e promovido, designado “DD e EE”, o qual consiste numa deslocação ou passeio de barco para a observação da vida marinha selvagem, nomeadamente observação de cetáceos, nos mares fronteiriços a Vila Franca do Campo – Açores.

Segundo os prospectos, as referidas deslocações são efectuadas em embarcações semi - rígidas, com capacidade para 12 pessoas sentadas, incluindo o skipper e a guia, colaboradores da Ré CC, a quem incumbe a pilotagem da embarcação e a direcção técnica e científica da viagem, correspondendo os 10 lugares disponíveis para passageiros a cadeiras devidamente almofadadas, orientadas no sentido da marcha, de forma a proporcionar maior comodidade e segurança e atenuar o impacto do movimento da embarcação e ondulação.

A Ré CC admitiu, no passeio que o Autor com esta contratou, onze

passageiros, acrescidos do skipper e da guia, solicitando, por isso, que um dos passageiros tomasse assento num banco de madeira, de reduzidas dimensões, situado na proa da embarcação, ou seja, orientado no sentido inverso ao da

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Esse banco foi utilizado por diversos passageiros que entre si se revezaram.

Por ocasião do regresso, o mar apresentava maior ondulação mas o skipper manteve, na volta, idêntica velocidade à que, na ida, imprimira à embarcação, não ignorando que, sendo utilizado o banco de madeira à proa por um dos passageiros, o impacto provocado pela ondulação poderia ter, pelo menos para este, consequências nefastas.

Na viagem de regresso, o banco de madeira era ocasionalmente ocupado pelo Autor, depois de ter sido utilizado como assento por outros passageiros.

Em dado momento, a proa da embarcação sofreu um violento impacto por força do embate numa contra – onda, tendo o Autor sido alvo de violento embate do próprio banco de madeira, tendo a forte pancada atingido o Autor quando este acompanhava o movimento da ondulação. Logo após o impacto, o Autor deixou de sentir as pernas, tendo tombado para o estrado da

embarcação.

O Autor sentia fortes dores nas costas, tendo permanecido toda a viagem sentado no estrado da embarcação, amparado pelas pernas de um dos passageiros.

A viagem de regresso, após o acidente, demorou cerca de uma hora, tendo o Autor, ao chegar a terra, sido transportado de ambulância para o Centro de Saúde de Vila Franca do Campo e, em face da gravidade das lesões sofridas, foi, de seguida, transportado para o Hospital de Ponta Delgada.

Em conformidade com o diagnóstico efectuado, do acidente resultou para o Autor traumatismo vertebro-medular, com consequente paraplegia, tendo o Autor sido transferido para o Hospital de S. José, em Lisboa, onde foi

submetido a intervenção cirúrgica em 9 de Agosto de 2004, na Unidade Vértebro - Medular.

Em 23 de Setembro de 2004, o Autor foi transferido para o Pavilhão N de Medicina Física e de Reabilitação do Hospital Curry Cabral, em Lisboa, para recuperação, pois, apesar da intervenção cirúrgica, o Autor tinha equilíbrio sentado mas não tinha equilíbrio em pé e necessitava de ajuda parcial nas actividades da vida diária, e deambulava em cadeira de rodas.

Durante o período de internamento, teve uma infecção urinária e uma tendinite dos adutores da coxa esquerda, vindo-lhe a ser concedida, a 7 de Dezembro de 2004, alta médica no Hospital Curry Cabral, necessitando,

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porém, de efectuar tratamentos diários, neste hospital, em regime

ambulatório, o que aconteceu ao longo do ano de 2005 até Julho de 2006, passando, a partir de Julho de 2006, tais tratamentos a serem efectuados três dias por semana.

Foram-lhe receitados tratamentos de reabilitação, designadamente,

mobilização articular, fortalecimento muscular, treino de equilíbrio, técnicas especiais de cinesioterapia e correntes interdiferenciais, cujos custos são suportados pelo Autor, assim como vem frequentando, desde 2007, consultas de fisiatria, suportando os respectivos custos.

O Autor tem material de osteossíntese entre as vértebras D9 a LI para

sustentar a coluna, mantém a paraplegia com diminuição acentuada da força nos abdutores das coxas, dos flectores dorsais, nos inversores, nos músculos tíbio - társicos e extensores dos pés. Faz marcha com o auxílio de duas

canadianas.

Desde a data do acidente, o Autor vem sentindo grande tristeza, desânimo e frustração, e permanente sofrimento físico e psicológico.

À data do acidente, o Autor desempenhava as funções de Director Comercial, sendo a sua remuneração mensal integrada por um montante fixo e um

montante variável, em função das comissões, auferindo, nos meses anteriores ao sinistro, uma remuneração mensal média de € 3.317,17.

A Ré CC, proprietária da embarcação a bordo da qual se registou o acidente dos autos, havia transferido para a Ré BB a sua responsabilidade civil,

destinada a cobrir os danos decorrentes da sua actividade, causados aos utilizadores e a terceiros, por acções ou omissões suas, dos seus

representantes ou das pessoas ao seu serviço.

Regularmente citadas, as Rés vieram contestar, defendendo-se nos seguintes termos:

A Ré CC - …, L.da é uma sociedade por quotas que tem por escopo principal a animação turística diversificada, promoção de serviços de índole cultural, desportiva, temática e de lazer e actividades conexas, onde se inclui a

organização de viagens de barco para observação de cetáceos, actividade para a qual a Ré está devidamente licenciada e exerce-a desde 2001, possuindo, para esse efeito, duas embarcações, semi - rígidas (isto é, com um casco rígido em fibra de vidro e dois pneumáticos em ypalon-neoprene cheios de ar), cada uma das quais com dois motores externos de 115 cavalos.

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As referidas embarcações encontram-se registadas na Capitania do Porto de Ponta Delgada, sendo ambas designadas por “FF”, divergindo na matrícula.

A embarcação que foi utilizada pelo Autor no seu passeio foi a designada “FF”, que tem uma lotação total de 14 pessoas, isto é, dois tripulantes e doze

passageiros.

No dia 5 de Agosto de 2004, aquela embarcação era tripulada por um

funcionário da Ré, habilitado com carta de navegador de recreio na categoria de Patrão de Costa, o qual que tem mais de dez anos de experiência de mar e, como auxiliar e a desempenhar as funções de guia, seguia uma funcionária da Ré, licenciada em Ciências do Mar/Biologia Marinha e habilitada com carta de navegador de recreio na categoria de marinheiro.

A embarcação "FF" dispõe de dois bancos longitudinais, com cinco lugares almofadados cada, orientadas no sentido Ré/Proa e ainda de dois lugares situados na parte traseira da embarcação, nos flutuadores, ambos juntos à consola de comando (situada na ré da embarcação) e em cada um dos bordos.

Os tripulantes da embarcação vão em pé, protegidos pela consola de comandos da embarcação.

Todos os passageiros que se façam transportar na embarcação são obrigados a viajar, sentados e com o colete salva vidas posto, desde o momento da partida até ao momento da chegada, tendo sido atribuído ao Autor um dos cinco lugares dos bancos longitudinais almofadados.

Nenhuma das embarcações da Ré está equipada com bancos de madeira, existindo à proa uma caixa (de proa), integrada no próprio casco da

embarcação, em fibra de vidro, destinada a guardar a palamenta da

embarcação (âncora, cabos de amarração, defensas ou bóias de protecção da embarcação, etc), e elementos de segurança, nomeadamente, estojo de

primeiros socorros, very-ligths, etc., mas essa caixa não é utilizada como assento.

Em cada saída, e ainda na marina de Vila Franca do Campo, os tripulantes fazem circular uma ficha informativa com descrição das medidas de segurança que devem ser adoptadas durante o passeio, sendo os passageiros, ainda, informados, oralmente pela guia, das regras de segurança, da obrigatoriedade de permanecerem sentados nos respectivos lugares, da obrigatoriedade de seguirem as instruções e recomendações de segurança que são transmitidas pela tripulação.

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Aquela saída, em que seguiu o Autor, não foi excepção, tendo, no início da viagem, sido feito circular a ficha informativa e foram, oralmente, explicadas pela guia todas as regras de segurança que deveriam ser observadas.

O único momento da saída, em que é permitido aos passageiros estarem de pé, é quando a embarcação está parada, e para observação dos cetáceos, isto de forma a facilitar a visualização e um melhor contacto dos passageiros com os animais.

A configuração da embarcação e a disposição dos bancos levam a que o espaço, de que os passageiros dispõem na embarcação, para se movimentar, seja exíguo, não permitindo, por isso, grandes movimentações, sendo esta limitação de espaço deliberada, na medida a impedir os passageiros de se movimentarem, pelo que, normalmente, quando estão em pé, estão limitados ao seu lugar, levantando-se apenas do seu lugar.

Sempre que a embarcação necessita de se movimentar, a tripulação dá

instruções aos passageiros para retornarem aos seus lugares, isto é, para que se sentem.

No dia do acidente, o dia estava limpo, com muito sol, o mar estava calmo, o vento ameno e a ondulação era fraca, tendo a embarcação estado parada em observação dos cetáceos.

Pretendendo o skipper pôr a embarcação em andamento para o regresso, solicitou a todos os passageiros que ocupassem os seus lugares e se

sentassem, principalmente ao Autor, que estava em pé, na proa da

embarcação, virado de frente para a ré e de costas para a ondulação e às duas crianças que junto a ele se encontravam, já que eram as pessoas que estavam em pé e fora dos seus lugares.

O Autor não deu importância àquelas instruções e permaneceu em pé, ao que a tripulação voltou a insistir com ele e com as crianças, para se sentarem, sem qualquer sucesso.

Perante isso, a guia dirigiu-se à proa da embarcação a fim de ir sentar as crianças no seu devido lugar e, nessa altura, ordenou, novamente, ao Autor para se sentar, ao que este, mais uma vez, não acatando a ordem que lhe era dada pelo membro da tripulação, permaneceu em pé, insistindo em

permanecer naquela zona da embarcação, virado de costas para a ondulação, e de frente para o grupo que o acompanhava, sem estar devidamente seguro.

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Nessa altura, surgiram, de forma absolutamente inopinada, duas ondas que elevaram a proa da embarcação, acima do que era costume face à ondulação que se fazia sentir, ao que o Autor se desequilibrou, tendo caído na

embarcação, magoando-se.

Logo após o acidente, o Autor foi assistido pelo skipper da embarcação e por uma das passageiras, que se apresentou como sendo enfermeira mas, face às muitas queixas com dores do Autor, o skipper comunicou via rádio para terra, a informar o sucedido, tendo a equipa de terra da Ré accionado o plano de emergência, o qual consistiu na comunicação aos Bombeiros locais de que chegaria um passageiro lesionado.

De imediato, foi destacada uma ambulância com uma equipa médica

especializada, para a marina de Vila Franca do Campo, aguardando a chegada da embarcação e do Autor.

Depois de comunicar o sucedido, o skipper retomou o regresso imediato a terra, tendo a viagem de regresso sido feita de forma mais lenta, de forma a evitar o balanço da embarcação por causa da ondulação e a evitar o

agravamento de eventuais lesões sofridas pelo Autor, tendo durado cerca de uma hora.

Ao chegar a terra, encontrava-se já no pontão de recepção das embarcações a equipa médica e a ambulância à espera para evacuar o Autor, tendo o

transbordo da embarcação para a ambulância sido efectuado pela equipa médica especializada.

A gerência da Ré manteve, sempre, um acompanhamento do estado clínico do Autor, até este ter regressado a Lisboa.

O sucedido foi, formalmente, participado às autoridades marítimas pela gerência da “CC”, não só para se poder apurar os factos e a eventual responsabilidade da Ré, mas também porque tal constitui uma obrigação legal.

As autoridades marítimas instauraram o respectivo inquérito e concluíram pelo arquivamento do processo e isenção da Ré de qualquer responsabilidade.

O acidente deveu-se, em exclusivo, a culpa do Autor, não lhe sendo devida qualquer indemnização.

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Conclui pela procedência da contestação e consequente absolvição da Ré do pedido.

A Ré BB- ..., CRL, contestando, dá por reproduzida a descrição dos factos e do acidente constante da contestação apresentada pelo seu segurado, a 2a Ré, da qual resulta que o acidente se ficou a dever, exclusivamente, à actuação do Autor, que não respeitou as instruções de segurança que lhe foram

transmitidas pelo skipper e pela assistente a bordo da embarcação CC.

Afirma desconhecer os danos sofridos pelo Autor, alegando, quanto ao contrato de seguro, que o capital de responsabilidade civil coberto pela

apólice de seguro em causa corresponde ao valor mínimo legal de € 100.000, destinando-se o seguro a cobrir os danos decorrentes da sua actividade (dos Operadores Marítimo-Turísticos), causados aos utilizadores e a terceiros, por acções ou omissões suas, dos seus representantes ou das pessoas ao seu serviço, pelas quais possam ser civilmente responsabilizados.

A Ré Mútua celebrou ainda um outro contrato de seguro com a 2a Ré CC, do ramo Acidentes Pessoais - Grupo, cuja apólice nada tem a ver com a apólice acima referida, do ramo Marítimo-Turística.

Foi no âmbito desta segunda apólice, que cobre os riscos de Morte ou

invalidez permanente e despesas de tratamento e repatriamento, que o Autor recebeu os pagamentos a que se refere na petição inicial.

Conclui pela improcedência da acção, por não estarem reunidos os

pressupostos que conduzem à responsabilização da 2ª Ré CC, pelo acidente em causa, absolvendo-se, assim, ambas as Rés do pedido.

Por despacho pré-saneador de fls. 131-136, foi convidado «o Autor, a apresentar, querendo, novo articulado onde concretize e complete,

factualmente, o por si alegado nos artigos 13º, 14º, 19º, 21º, 22º, 23º, 76º, 78º e 85º da petição inicial, no prazo de 15 (quinze) dias» e «para, no mesmo prazo, vir esclarecer se no artigo 6º da Petição Inicial existe ou não um lapso de escrita - isto é, se ao referir-se a "realizado na tarde do referido dia 5 de Agosto de 2007" quereria ou não dizer "realizado na tarde do referido dia 5 de Agosto de 2004", atento o corpo do artigo 1º da Petição Inicial e se, a tratar-se de um lapso de escrita, pretenderá a sua rectificação».

Acatando tal convite, o Autor veio apresentar «novo articulado, devidamente alterado quanto à matéria alegada artigos 13º, 14º, 19º, 21º, 22º, 23º, 76º, 78º e 85º da petição inicial» e «requerer a rectificação do lapso de escrita

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constante do artigo 6º da petição inicial» (cfr. fls. 147 e articulado de fls.

150-165).

Notificadas as Rés, veio a Ré CC - …, L.da apresentar articulado de resposta, nos termos constantes de fls. 168-178.

Em pré - saneamento:

Consignou-se terem-se por não escritos os artigos 1º a 4º do articulado de resposta oferecido pela Ré CC, considerando-se os artigos 1º a 4º da

contestação à petição inicial apresentada, de fls. 50 e seguintes.

Deferiu-se a requerida rectificação do lapso de escrita constante do artigo 6º da Petição Inicial (Cfr. despacho de fls. 185-188).

Dispensada a realização de audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar e seleccionada a matéria de facto tida por relevante,

mediante elaboração dos Factos Assentes e organização da Base Instrutória, que foi objecto de reclamação apresentada pela Ré BB- ..., C.R.L., reclamação que foi deferida nos termos constantes do despacho de fls. 247-248.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, perante juiz singular - com documentação digital da prova -, tendo sido julgada a matéria de facto controvertida pela forma constante do despacho de fls. 689-691 e, por fim, foi proferida sentença em que se decidiu:

A) - Condenar a ré BB - ..., C. R. L., a pagar a AA a quantia de seiscentos e três euros para ressarcimento de dano patrimonial sob a forma de dano emergente pelas despesas que suportou em tratamentos e consultas e bem assim a

quantia de vinte e um mil quinhentos e sessenta e dois euros e sessenta e dois cêntimos para ressarcimento de dano não patrimonial sob a forma de lucro cessante, com juros à taxa de 4% desde a citação e até integral pagamento e bem assim as quantias que forem apuradas em liquidação a efectuar em execução de sentença para ressarcimento de dano não patrimonial e de dano patrimonial sob a forma de lucro cessante e bem assim de dano emergente sob a forma de despesas com tratamentos de fisioterapia ou com cirurgias que venha a efectuar, tudo com o limite, quanto à ré seguradora, de cem mil euros de capital garantido pelo seguro referido em F.

B) - Condenar ainda a ré BB - ..., C. R. L., no caso de insuficiência do capital segurado referido na alínea anterior, a pagar ao autor AA, com base no seguro referido em G), os valores que vierem a ser apurados em liquidação em

execução de sentença a título de dano patrimonial sob a forma de lucro

cessante por perda de salário e de danos emergentes sob a forma de despesas com tratamentos e até ao limite, respectivamente, de cinquenta e seis mil e

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quinhentos euros e cinco mil quinhentos e quatro euros e oitenta e sete cêntimos.

C) - Ainda no caso de insuficiência do referido em A) e B) deste dispositivo, condenar a ré CC - …, L.da a pagar as quantias que se liquidarem em

execução de sentença seja para ressarcimento de dano não patrimonial e de dano patrimonial sob a forma de lucro cessante e bem assim de dano

emergente sob a forma de despesas com tratamentos de fisioterapia ou com cirurgias que venha a efectuar, sempre a liquidar em execução de sentença e com o limite global do pedido.

D) - Sobre as quantias que se liquidarem em execução de sentença igualmente vencer-se-ão juros, desde aquela liquidação, à taxa de 4% se outra não for então a em vigor.

E) - As custas serão pela ré BB - ..., C. R. L. na parte que corresponde às quantias já liquidadas, por ela e pelo autor AA, provisoriamente em partes iguais, até ao limite da responsabilidade daquela ré por força dos citados contratos de seguro, e pelo mencionado autor e pela ré CC - …, L.da,

igualmente provisoriamente em partes iguais quanto ao remanescente e até ao valor do pedido.

Por requerimento de fls. 721-723, veio a Ré BB – ..., CRL requerer, ao abrigo do disposto no artigo 667º nº 1 do CPC, a correcção do manifesto erro, e onde se escreveu na sentença proferida, até ao limite de € 56.500 e € 5.504,87, deve ler-se até ao limite de € 1.500 e € 4,876.

Sobre tal requerimento recaiu o despacho de fls. 731 do seguinte teor:

«Não se trata de qualquer lapso ou erro material (artigo 667º do CPC) o apontado pela ré BB - ..., C R. L.. Trata-se, antes, de decisão consciente do subscritor da sentença quanto ao modo como interpretou o contrato em causa, tal como descrito nos factos assentes. A ré poderá não concordar, mas isso é matéria de impugnação e não de reforma, em razão do que mantenho a decisão em causa sem lhe beliscar o conteúdo».

Inconformadas com a sentença, recorreram as Rés BB- ..., C.R.L. e CC - …, L.da, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 26/09/2013, confirmado a sentença recorrida.

De novo inconformada, recorre de revista, apenas, a Ré CC - ..., L.da, finalizando a alegação com as seguintes conclusões:

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1ª - Sendo a ilicitude da ora recorrente - inobservância de regras de segurança - decretada porque "o simples facto de os lugares sentados para passageiros serem apenas 10 e em duas filas longitudinais de 5, leva à conclusão de que essa é a lotação “de segurança para aquela embarcação e actividade" (sic) – nº 2 dos factos e do direito da douta decisão em 1ª instância;

2ª - Que da "concatenação racional e lógica dos depoimentos coincidentes das testemunhas e ponderada a credibilidade das mesmas com o teor do

documento junto a fls. 64-66 e com os actos investigados extrai-se (…) que naquele dia concreto a embarcação não tinha os doze lugares para

passageiros, correspondente a 12 cadeiras, mas somente 10 cadeiras" (sic a fls. 31 do douto acórdão);

3ª - Apesar do teor de documentos de fls. 179 e 259 que são documentos autênticos – artigo 371º, nº 1 do Código Civil;

4ª - É usar presunção probatória onde a lei não admite - artigos 351º e 394º, nº 1 do Código Civil, a fortiori.

5ª - Viola o regime da alínea b) do nº 1 do artigo 712º do C.P.C., na redacção ao tempo, a douta decisão que, mantém inalterada a resposta negativa ao quesito 75º, apesar de dos autos resultar prova bastante para a alteração requerida, e no sentido de dar tal matéria como documentalmente provada.

6ª - Alterada que deve ser a resposta ao quesito 75º para dele constar que

"esta embarcação tem lotação de catorze pessoas, onde se incluem doze passageiros …”;

7ª - Porque a douta sentença considerava "a lotação "de segurança" para aquela embarcação e actividade” (sic), um máximo de 10 passageiros.

8ª - E a autoridade marítima, no seu relatório, preocupa-se com um facto - seguirem sentados os passageiros - que se deu como provado: que toda a viagem "dez passageiros seguiam sentados, em duas filas longitudinais de 5 cadeiras cada, seguindo um outro sentado" [em local diverso]... "(quesitos 6 a 10,14,16, 79 a 81 e 84 a 86" (sic a págs. 26 do douto acórdão).

9ª - Parece ser insuficiente - como se julga ter explanado de 34 a 36 acima - a matéria de facto para imputar ilicitude na conduta da Ré;

10ª - A menos que se provasse que os lugares onde podiam seguir sentados o 11º e o 12º passageiros autorizados a serem transportados, conforme licença

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emitida pela autoridade que fazia assegurar a segurança, não seriam os que se quesitam no item 80º, reportado ao artigo 17º da contestação da aqui

recorrente.

11ª – Ou que a viagem em lugar previsto para além das 10 cadeiras em "filas longitudinais", oferecesse para o Autor menores condições de segurança, pois que as da comodidade do assento - (versão da testemunha GG, extratada a páginas 29 do douto acórdão) mesmo sacrificado” (sic) - não relevam em sede de ilicitude.

12ª - Mediante o exposto, o douto acórdão em crise violou, por errada

interpretação e aplicação, nomeadamente, as normas dos artigos 371º nº 1, 394º e 351º, todos do Código Civil.

Termos em que, deve ser revogado o douto acórdão, pois que, afastada que fica - após a alteração à resposta ao quesito 75° - a ilicitude por violação de regra de segurança que fundamenta a tese das instâncias, se deve concluir pela improcedência da acção, a menos que se entenda ordenar a baixa para reanálise ou ampliação da matéria de facto.

O Autor não contra – alegou.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

2.

Após reapreciação pelo Tribunal da Relação da matéria de facto, que foi

objecto de impugnação, consubstanciada na resposta conjunta aos quesitos 6º a 10º, 14º, 16º, 79º a 81º e 84º a 86º da Base Instrutória e à resposta negativa ao quesito 75º da Base Instrutória, foi integralmente confirmada a matéria de facto que a 1ª Instância havia considerado provada.

Deste modo, as instâncias consideraram provados os seguintes factos:

DOS FACTOS ASSENTES:

1º - A Ré CC - …, L.da é uma sociedade por quotas, cujo objecto social consiste em animação turística diversificada, promoção de serviços de índole cultural, desportiva, temática, lazer e actividades conexas (alínea A).

2º - A Ré CC - …, L.da encontra-se registada na Autoridade Marítima

Portuguesa e é titular de licença especial emitida pela Direcção Regional de Turismo dos Açores (alínea B).

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3º - No exercício da sua actividade, a Ré CC - …, L.da desenvolve e divulga o serviço denominado “DD & EE" (alínea C).

4º - O serviço “DD & EE” consiste na realização de passeios de barco para observação da vida marinha selvagem, tais como cetáceos, na costa marítima, junto a Vila Franca do Campo (alínea D).

5º - Em 5 de Agosto de 2004, o Autor contratou com a Ré CC - …, L.da a

realização de um passeio de barco para observação da vida marinha selvagem, ao abrigo do programa “DD & EE” (alínea E).

6º - No dia 5 de Agosto de 2004, a Ré CC - …, L.da tinha a responsabilidade civil emergente de acidentes decorrentes da actividade marítimo-turística causados a utilizadores e a terceiros, por acções ou omissões suas, dos seus representantes ou das pessoas ao seu serviço, pelas quais possam civilmente ser responsabilizados, transferida para a Ré BB - ..., por contrato de seguro titulado pela apólice n.º 85/20183, com o capital de responsabilidade civil coberto de € 100.000,00 - cfr. apólice de seguro junta a fls. 92 (alínea F).

7º - No dia 5 de Agosto de 2004, a Ré CC - …, L.da outorgou um contrato de seguro de acidentes pessoais - grupo, com a Ré BB - ..., por contrato de seguro titulado pela apólice nº. …, apólice que cobre riscos de morte ou invalidez permanente e despesas de tratamento e repatriamento até ao limite de € 60.000,00 e € 6.000,00, respectivamente - cfr. apólice de seguro junta a fls.

107 (alínea G).

8º - A Ré BB - ..., ao abrigo da apólice de seguro descrita em G) reembolsou o Autor de despesas de tratamento e repatriamento por este efectuadas, no valor de € 495,13 - cfr. documento de fls. 108 (alínea H).

9º - O Autor nasceu em 3 de Novembro de 1951 (cfr. certidão do assento de nascimento, a fls. 149 (alínea I).

10º - O HH possui carta de navegador de recreio na categoria de "Patrão de Costa" - cfr. doc. de fls. 67 e 68 (alínea J).

DAS RESPOSTAS AOS QUESITOS DA BASE INSTRUTÓRIA:

11º - Os passeios de barco para observação da vida marinha selvagem ao abrigo do serviço "DD & EE" são efectuados em embarcações semi - rígidas (resposta quesito 1º).

(15)

12º - A Ré CC admitiu no passeio em que o Autor ingressou, na tarde de 5 de Agosto de 2004, onze passageiros, acrescidos do skipper e da guia (resposta ao quesito 5º).

13º - Dez dos passageiros seguiam sentados, em duas filas longitudinais de 5 cadeiras cada, seguindo um outro sentado em cima de uma caixa situada à proa, virado para a ré da embarcação, local onde seguia o Autor quando se deu o acidente e que tinha sido ocupado anteriormente por um outro

passageiro (resposta aos quesitos 6º a 10º, 14º, 16º, 79º a 81º e 84º a 86º).

14º - No regresso, o mar apresentava maior ondulação que a registada no início do passeio (resposta ao quesito 11º).

15º - A proa da embarcação sofre impactos na água provocados pelas ondas e contra - ondas (resposta ao quesito 13º).

16º - A proa da embarcação sofreu violento impacto por força do embate numa contra - onda (resposta ao quesito 15º).

17º - Por força desse impacto, o Autor foi projectado no ar e caiu no chão da embarcação, cerca de 0,5 m mais abaixo do local onde ia sentado (resposta aos quesitos 17º a 21º).

18º - Como consequência directa do descrito em 17º a 21º, o Autor sofreu esmagamento da dorso-lombar (resposta ao quesito 22º).

19º - Como consequência directa do descrito em 17º a 21º, o Autor deixou de sentir as pernas (resposta ao quesito 23º).

20º - E tombou para o estrado da embarcação (resposta ao quesito 24º).

21º - A viagem de regresso, após o acidente, demorou cerca de uma hora (resposta ao quesito 25º).

22º - Durante a viagem o Autor sentiu fortes dores nas costas (resposta ao quesito 26º).

23º - Ao chegar a terra, o Autor foi transportado de ambulância para o Centro de Saúde de Vila Franca do Campo (resposta ao quesito 27º).

24º - Como consequência das lesões sofridas, o Autor foi transportado para o Hospital de Ponta Delgada (resposta ao quesito 28º).

(16)

25º - Como consequência directa do descrito em 17º a 21º, o Autor sofreu traumatismo vertebro-medular, com fractura D12, com consequente

paraplegia (resposta ao quesito 29º).

26º - O Autor foi transferido para o Hospital de S. José, em Lisboa (resposta ao quesito 30º).

27º - Onde foi submetido a intervenção cirúrgica em 9 de Agosto de 2004, na Unidade vertebro - medular (resposta ao quesito 31º).

28º - Na sequência de tal intervenção ao Autor foi realizada laminectomia D12, osteossintese D10-D11-L1-L2, com parafusos transpediculares, barra, corrector transverso, e enxerto postero-lateral (resposta ao quesito 32º).

29º - Em 23 de Setembro de 2004, o Autor foi transferido para o Pavilhão N de Medicina Física e de Reabilitação do Hospital Curry Cabral, em Lisboa

(resposta ao quesito 33º).

30º - À data de 23 de Setembro de 2004, o Autor apresentava parapésia com força muscular a nível das articulações coxo-femurais grau 1-2, a nível dos joelhos, flexores 1-extensores 3 (resposta ao quesito 34º).

31º - Nas articulações tíbio-társicas, o Autor apresentou flexão plantar (resposta ao quesito 35º).

32º - O Autor apresentou deficit motor mais marcado à esquerda (resposta ao quesito 36º).

33º - O Autor apresentou reflexos O. T., simétricos nos membros superiores e menos vivos nos membros inferiores (resposta ao quesito 37º).

34º - Os reflexos cutâneo plantares eram indiferentes e o tónus e a

sensibilidade profunda não se encontravam alterados (resposta ao quesito 38º).

35º - O Autor apresentava hipostesia a partir do 1/3 inferior das pernas (resposta ao quesito 39º).

36º - Na coxa esquerda, o Autor apresentou hipostesia no 1/3 médio e hiperstesia no 1/3 inferior (resposta ao quesito 40º).

37º - O Autor tinha equilíbrio sentado (resposta ao quesito 41º).

38º - O Autor não tinha equilíbrio em pé (resposta ao quesito 42º).

(17)

39º - O Autor necessitava de ajuda parcial nas actividades da vida diária (resposta ao quesito 43º).

40º - Tinha controlo de esfíncteres (resposta ao quesito 44º).

41º - Deambulava em cadeira de rodas (resposta ao quesito 45º).

42º - Durante o período de internamento teve infecção urinária a E. Cloi, tratada com Trimetroprim-sulfa (resposta ao quesito 46º).

43º - O Autor sofreu uma tendinite dos adutores da coxa esquerda (resposta ao quesito 47º).

44º - Em 7 de Dezembro de 2004, o Autor teve alta médica no Hospital Curry Cabral (resposta ao quesito 48º).

45º - Na data descrita em 48º, o Autor apresentava força a nível dos flexores e adutores das articulações coxo-femurais de grau 4, abdutores e extensores de grau 2 e, nos joelhos, extensores de grau 4 e flexores de grau 3 (resposta ao quesito 49º).

46º - Ao nível dos pés mantinha extensores da tíbio-társicas e dedos (resposta ao quesito 50º).

47º - O Autor fazia marcha com andarilho e seguia as actividades da vida diária de modo independente (resposta ao quesito 51º).

48º - Durante o ano de 2005 e até Julho de 2006, o Autor efectuou tratamentos diários no Hospital Curry Cabral, em regime ambulatório (resposta ao quesito 52º).

49º - A partir de Julho de 2006, os tratamentos passaram a ser efectuados três dias por semana (resposta ao quesito 53º).

50º - O Autor frequenta, desde 2007, consultas de fisiatria (resposta ao quesito 54º).

51ª - Ao Autor foram receitados tratamentos de reabilitação tais como

mobilização articular, fortalecimento muscular, treino de equilíbrio, técnicas especiais de cinesioterapia e correntes interdiferenciais (resposta ao quesito 55º).

52º - É o Autor que suporta os custos dos tratamentos referidos em 54º e 55º

(18)

53º - Já despendeu em consultas a quantia de € 135,00 (resposta ao quesito 57º).

54º - Já despendeu em tratamentos quantia de € 468,00 (resposta ao quesito 58º).

55º - O Autor tem material de osteossíntese entre as vértebras D9 a LI para sustentar a coluna (resposta ao quesito 59º).

56º - Mantém a paraplegia com diminuição acentuada da força nos abdutores das coxas, dos flectores dorsais, nos inversores, nos músculos tíbio-társicos e extensores dos pés (resposta ao quesito 60º).

57º - O Autor marcha com o auxílio de duas canadianas (resposta ao quesito 61º).

58º - O Autor tem sentido tristeza, desânimo e frustração desde 5 de Agosto de 2004 (resposta ao quesito 62º).

59º - Logo após o acidente, o Autor sentiu ansiedade, angústia e apreensão pelo seu estado de saúde e pela eventualidade da sua não recuperação (resposta ao quesito 63º).

60º - O diagnóstico apresentado ao Autor, no Hospital de Ponta Delgada, fê-lo temer pela sua integral recuperação (resposta ao quesito 64º).

61º - À data de 5 de Agosto de 2004, o Autor desempenhava as funções de director comercial ao serviço da empresa "II - …, L.da" (resposta ao quesito 65º).

62º - Auferia remuneração mensal composta por um montante fixo e um montante variável, em função das comissões (resposta ao quesito 66º).

63º - De Janeiro a Julho de 2004, o Autor auferiu uma remuneração mensal média de € 2.000, bem como um total de € 2.029,03 de comissões (resposta ao quesito 67º).

64º - Entre Agosto de 2004 e Julho de 2005, o Autor auferiu, a título de

subsídio de doença, a quantia mensal de € 1.553,10 (resposta ao quesito 68º).

65º - Após Agosto de 2005 e até à data de entrada em juízo da petição inicial, o Autor auferia, a título de subsídio de doença, a quantia mensal de € 1.641 (resposta ao quesito 69º).

(19)

66º - Quantia que deixou de auferir desde 8 de Agosto de 2007, uma vez atingido o limite para a baixa subsidiada (resposta ao quesito 70º).

67º - Ao Autor será atribuída uma pensão provisória de invalidez (resposta ao quesito 71º).

68º - A Ré possui duas embarcações semi - rígidas, uma designada "FF", com a matrícula PD- e outra designada "FF II", com a matrícula PD-… (resposta ao quesito 73º).

69º - O passeio marítimo em que o Autor participou, em 5 de Agosto de 2004, foi realizado na embarcação semi - rígida designada "FF", com a matrícula PD- (resposta ao quesito 74º).

70º - No passeio marítimo realizado em 5 de Agosto de 2004, a embarcação

"FF" foi tripulada pelo HH, funcionário da Ré desde 2001 (resposta ao quesito 76º).

71º - HH tem mais de dez anos de experiência de mar (resposta ao quesito 77º).

72º - Na ocasião descrita em 74º, seguia na embarcação "FF", como guia, a funcionária da Ré, JJ, licenciada em Ciências do Mar/Biologia Marinha e habilitada com a carta de navegador de recreio na categoria de marinheiro (resposta ao quesito 78º).

73º - Os tripulantes da embarcação seguiram em pé, protegidos pela consola de comandos da embarcação (resposta ao quesito 82º).

74º - Todos os passageiros são obrigados a viajar sentados e com o colete salva vidas colocado, desde o início do passeio até ao momento da chegada (resposta ao quesito 83º).

75º - Antes da partida, na Marina de Vila Franca do Campo, os tripulantes fizeram circular pelos passageiros uma ficha informativa com a descrição das medidas de segurança a adoptar durante o passeio (resposta ao quesito 87º).

76º - Os passageiros foram informados pela guia da necessidade de observar as regras de segurança, da obrigatoriedade de permanecerem sentados nos lugares e de seguirem as instruções e recomendações de segurança

transmitidas pela tripulação (resposta ao quesito 88º).

(20)

77º - Os passageiros somente podiam estar em pé quando a embarcação está parada (resposta ao quesito 89º).

78º - Para facilitar a observação de cetáceos (resposta ao quesito 90º).

79º - No dia 5 de Agosto de 2004, no passeio em que participou o Autor, estava sol (resposta ao quesito 91º).

80º - Na ocasião descrita em 91º, o mar estava calmo (resposta ao quesito 92º).

81º - Na ocasião descrita em 91º, o vento era ameno (resposta ao quesito 93º).

82º - Na ocasião descrita em 91º, a ondulação era fraca (resposta ao quesito 94º).

83º - Aquando da observação dos cetáceos a embarcação estava parada (resposta ao quesito 95º).

84º - Logo após o acidente, o Autor foi assistido pelo "skipper" da embarcação e por uma das passageiras (resposta ao quesito 111º).

85º - Face às queixas com dores do Autor, o "skipper" comunicou, via rádio, para terra, a informar o sucedido (resposta ao quesito 112º).

86º - A Equipa de terra comunicou aos Bombeiros de Vila Franca do Campo, que destacaram uma ambulância com uma equipa médica especializada para a marina de Vila Franca do Campo, de forma a aguardar a chegada da

embarcação (resposta ao quesito 113º).

87º - Após comunicar o acidente à equipa de terra, o "skipper" retomou o regresso a terra (resposta ao quesito 114º).

88º - O que ocorreu de forma mais lenta (resposta ao quesito 115º).

89º - Por causa da ondulação e para evitar o agravamento de eventuais lesões sofridas pelo Autor (resposta ao quesito 116º).

90º - Ao chegar a terra a equipa médica e a ambulância já se encontravam no pontão de recepção das embarcações (resposta ao quesito 117º).

91º - O transbordo do Autor da embarcação para a ambulância foi efectuado pela equipa médica especializada (resposta ao quesito 118º).

(21)

92º - A gerência da Ré CC acompanhou o estado clínico do Autor até este ter regressado a Lisboa (resposta ao quesito 119º).

93º - A Ré CC participou o acidente às autoridades marítimas (resposta ao quesito 120º).

94º - As autoridades marítimas instauraram um inquérito e concluíram pelo arquivamento do processo, pois “o acidente deveu-se a causa fortuita”, mas

“não desresponsabilizando dos factos a empresa e respectiva tripulação da embarcação, que deveria fazer cumprir as normas de segurança a bordo, não apenas recomendando, mas antes exigindo, que todos os passageiros se mantivessem nos lugares sentados para o efeito, sob pena de a embarcação não prosseguir viagem enquanto todas as condições de segurança não estivessem criadas” (resposta ao quesito 121º).

95º - A Ré CC faz passeios marítimos para observação de cetáceos há mais de seis anos (resposta ao quesito 122º).

96º - Nesse hiato temporal, a Ré CC transportou cerca de dez mil pessoas e nunca existiram acidentes (resposta ao quesito 123º).

DOS FACTOS QUE FORAM TIDOS COMO PROVADOS POR ACORDO DAS PARTES EM SEDE DE AUDIÊNCIA DE DISCUSSÃO E JULGAMENTO (cfr. fls.

683):

97º - O Autor recebeu da Ré BB - ... a quantia de € 3.500, a título de

indemnização por invalidez permanente ao abrigo do seguro de acidentes pessoais a que se reporta a alínea G) da matéria assente.

3.

No recurso de apelação interposto pela CC - …, L.da, a recorrente suscitava duas questões:

a) - Do pretenso erro de julgamento do juízo probatório subjacente às

respostas restritiva e negativa dadas à matéria de facto constante dos quesitos 6º a 10º, 14º, 16º, 75º, 79º a 81º e 84º a 86º da Base Instrutória.

b) - Do alegado erro (de direito) de julgamento decorrente da não

consideração do invocado incumprimento pelo Autor das regras de segurança que lhe foram transmitidas e que o mesmo apreendeu.

No recurso de revista, suscita a recorrente de novo duas questões:

(22)

a) – A resposta negativa dada ao quesito 75º deve ser alterada para dele constar que “esta embarcação tem lotação de catorze pessoas, onde se incluem doze passageiros e dois tripulantes”.

b) – Alterada essa resposta, deverá ser afastada a responsabilidade contratual da Ré, “dada a inexistência de violação de regras de segurança, que

fundamenta a tese das instâncias”.

4.

A recorrente, volta a recorrer da matéria de facto, restringindo, porém a impugnação à resposta negativa dada ao quesito 75º da Base Instrutória.

Invoca o erro de julgamento probatório, considerando que a matéria que integra esse quesito se encontra provada pelos documentos de fls. 179 e 259, que são documentos autênticos, havendo, por isso, manifesta violação da alínea b) do n.º 1 do artigo 712º do Código de Processo Civil.

Vejamos:

O fundamento principal do recurso de revista e que directamente se integra nas funções essenciais do Supremo Tribunal de Justiça é a violação de lei substantiva nas suas variantes de erro na determinação da norma aplicável, erro de interpretação e erro de aplicação.

No capítulo da apreciação das provas, a regra contida no n.º 2 do artigo 729 do Código de Processo Civil conexa com as funções prioritárias atribuídas ao Supremo Tribunal de Justiça, é a de que não pode interferir na decisão da matéria de facto, da exclusiva competência das instâncias.

Todavia, sem embargo de outras intervenções previstas nos artigos 729º e 730º, considerou-se que o Supremo Tribunal de Justiça não deveria ficar

indiferente a erros de apreciação da prova que resultem da violação do direito probatório material, podendo constituir fundamento de revista a violação de disposição expressa que exija certa espécie de prova ou a violação também expressa que fixe a força de determinado meio de prova, tal como dispõe o artigo 722º, n.º 2 CPC.

Assim, se a este Supremo Tribunal de Justiça é vedado sindicar o uso feito pela Relação dos seus poderes de modificação da matéria de facto, já lhe é, todavia, possível verificar se, ao usar tais poderes, agiu ela dentro dos limites traçados pela lei para os exercer (artigo 712º, n. os 1 e 2 CPC).

(23)

No caso concreto, perguntava-se “se esta embarcação tem lotação de catorze pessoas, onde se incluem doze passageiros e dois tripulantes” (quesito 75º/

artigo 12º da contestação da Ré CC.

Tal como consta da fundamentação do acórdão recorrido, à matéria deste quesito responderam as testemunhas KK, GG, LL, MM e NN e foram tomados em consideração os documentos de fls. 64 a 66, 179 e 259.

O documento de fls. 64 a 66 é a licença de exploração turística (…) donde consta a fls. 65, verso, que a embarcação CC tem as seguintes acomodações:

“10 lugares sentados (estrutura fixa em duas linhas paralelas/longitudinais, em 2 secções de 5 lugares. Banco para skipper, arrumos para pertences dos clientes. Escada de acesso”.

Por sua vez, o documento de fls. 179 é o certificado de lotação de segurança, emitido pelo capitão do porto, onde se refere que o total de tripulantes desta embarcação é de 2 pessoas e o total de pessoas autorizadas a embarcar é de 12 pessoas, sendo o documento de fls. 259 uma informação prestada pelo

“Capitão do Porto”, dirigida ao funcionário do tribunal, referindo que a lotação da embarcação “CC” é de doze passageiros e dois tripulantes.

Temos, assim, que tanto o documento de fls. 64 a 66 como o de fls. 179 são documentos autênticos, pois se presume que provêm da autoridade ou oficial público a quem são atribuídos.

Importa, porém, realçar que o valor probatório pleno do documento autêntico não respeita a tudo o que se diz ou se contém no documento, mas somente aos factos que se referem como praticados pela autoridade ou oficial público

respectivo e quanto aos factos que são referidos no documento com base nas percepções da entidade documentadora.

Consta da fundamentação do acórdão que, tomando em consideração, por um lado, “a aparente contradição entre os documentos de fls. 179 e 259 com o de fls. 65, verso, relativos à lotação da embarcação CC”, e tomando, por outro lado, em conta “a descrição feita por todos os passageiros (que) foi unânime, quer quanto ao facto de haver 10 lugares sentados, quer quanto à existência de cadeiras”, tive de admitir que essa embarcação tinha sido alterada

posteriormente ao acidente”.

Significa isto que, no apontado circunstancialismo, está vedado ao Supremo Tribunal de Justiça alterar a resposta ao mencionado quesito 75º.

(24)

5.

5.1.

Na sentença recorrida concluiu-se que, no âmbito do contrato de prestação de serviços celebrado entre o Autor e a Ré CC - …, L.da, a Ré não logrou provar que, apesar do seu cumprimento defeituoso {decorrente da admissão de mais passageiros do que devia e de ter acomodado um deles em condições

inseguras em termos de nele terem sido causados danos físicos), a culpa do deflagrar do acidente não fora sua, ou melhor das pessoas que utilizou para cumprimento da obrigação, antes se tendo apurado, positivamente, factos de que emerge a culpa da Ré (ou, o que é mais correcto, das pessoas que utilizou no cumprimento da prestação).

Por seu turno, vem a Ré CC - …, L.da / ora recorrente sustentar que o Autor não cumpriu a sua obrigação, para além da de pagar o preço, de respeitar as regras de segurança que lhe foram transmitidas e que ele apreendeu, tendo concorrido para a produção dos danos”.

Para a recorrente o comportamento do Autor consubstanciava uma causa excludente da culpa da Ré, pelo que, sendo ilidida a presunção de culpa sobre ela impendente, tal circunstância conduziria à respectiva exoneração do dever de indemnizar.

Considerou o acórdão recorrido, tendo em devida conta os factos provados, que, de facto, quando a embarcação foi embatida pela contra – onda, o Autor ocupava o lugar em cima da caixa situada à proa, que anteriormente fora ocupado por outro passageiro mas acrescentava que a embarcação não

dispunha de qualquer outro tipo de assento (por estarem todos ocupados), não se tendo igualmente demonstrado que o Autor haja desrespeitado qualquer ordem da tripulação para que não ocupasse aquele lugar.

Assim, não se vislumbrando qualquer desrespeito das regras de segurança pelo Autor, ficava afastada a conclusão extraída pela Ré de que o Autor teria contribuído com o seu comportamento para a produção do acidente.

No recurso de revista, a Ré CC compreendeu que a sua tese só poderia vingar se fosse alterada a resposta ao quesito 75º, nos termos acima referidos.

Mantendo-se inalterada essa resposta naturalmente que não pode deixar de improceder a revista, confirmando-se o douto acórdão recorrido, que, com a devida vénia, nesta parte se transcreve:

(25)

5.2.

“Não se mostrando questionada a qualificação do contrato celebrado entre o Autor e a Ré CC - …, L.da como contrato de prestação de serviços (dando esta a observar ao Autor a vida marinha, nomeadamente cetáceos, e assegurando- lhe a realização da viagem em condições de segurança), cabe então indagar da responsabilidade contratual da Ré CC - …, L.da emergente do cumprimento defeituoso da prestação que sobre ela impendia.

O cumprimento defeituoso integra-se no instituto do não cumprimento, traduzindo-se numa forma de violação de deveres obrigacionais, sejam eles principais, secundários ou acessórios de conduta.

Daí que nele, tal como na falta de cumprimento, a culpa do devedor se

presuma (artigo 799º, nº 1, do Código Civil), e este se torne responsável pelo prejuízo que causa ao credor (artigo 798º do Cód. Civil).

Assim, a responsabilidade contratual, à luz do disposto no aludido artigo 798º do Código Civil, assenta nos seguintes pressupostos:

A falta de cumprimento de uma obrigação contratual por parte do devedor;

A sua imputação subjectiva ao mesmo devedor, a título de culpa, a qual se presume juris tantum, nos termos do artigo 799º do Código Civil;

A ocorrência de danos, a título de danos emergentes ou lucros cessantes, objectivamente imputáveis ao ilícito contratual (artigo 564º, nº 1, do Código Civil).

E tais pressupostos em que assenta a responsabilidade contratual

reconduzem-se aos factos constitutivos da obrigação indemnizatória, cujo ónus probatório incumbe a quem invoca o direito (in casu, o Autor), nos termos do nº 1 do artigo 342º do Código Civil.

Porém, no que respeita à culpa, face àquela presunção legal estatuída no nº 1 do artigo 799º do mesmo Código, recai sobre o devedor o ónus de provar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua.

E tal culpa do devedor é apreciada nos termos gerais da responsabilidade civil, conforme disposto no nº 2 do mesmo artigo 799º do Código Civil, o que significa que vigoram para a responsabilidade contratual tanto os critérios de fixação da inimputabilidade estabelecidos no artigo 488º do mesmo diploma,

(26)

como o princípio básico de que a culpa do devedor se mede em abstracto (artigo 487º, nº 2, do Código Civil), tendo como padrão a diligência típica de um bom pai de família e não em concreto, de acordo com a diligência habitual do obrigado[1].

Do que exposto fica, decorre que a Ré CC - …, L.da / ora recorrente, com vista a afastar a sua responsabilidade, teria de fazer prova de que usou de toda a diligência que é exigida a uma pessoa normal, tendo como padrão a conduta de uma pessoa «medianamente cuidadosa, atendendo à especialidade das diversas situações», sendo que «por homem médio» não se entende o puro cidadão comum, mas o modelo de homem que resulta do meio social, cultural e profissional daquele indivíduo concreto, isto é, «o homem médio que

interfere como critério da culpa é determinado a partir do círculo de relações em que está inserido o agente»[2].

5.3.

Aqui chegados, há agora que valorar o comportamento do Autor e o da Ré CC -…, L.da.

Ora, da factualidade assente, no que ora releva, decorre que a Ré CC obrigou- se a prestar um serviço (dar a observar ao Autor a vida marinha,

nomeadamente cetáceos), assegurando-lhe a realização da viagem em condições de segurança;

A Ré CC permitiu o embarque de 11 passageiros numa embarcação que apenas dispunha de 10 lugares (para passageiros) seguros e devidamente acomodados.

Deste espectro fáctico decorre claramente que a Ré CC, por um lado, ao colocar 11 passageiros na embarcação "FF", que apenas dispunha de 10 lugares (para passageiros) seguros e devidamente acomodados - sabendo, assim, que não dispunha, para um desses 11 passageiros, de lugar seguro e devidamente acomodado, e que tal passageiro teria que se sentar na caixa à proa, por inexistir qualquer outro lugar disponível -, violou aquela obrigação respeitante à realização da viagem em condições de segurança; por outro, não logrou provar que tivesse usado de toda a diligência que era exigida -sendo insuficiente para caracterização de tal grau de diligência, a circunstância de a Ré ter distribuído uma ficha informativa sobre a segurança e ter dado,

inclusive, algumas instruções sobre a segurança -, nem que a circunstância de

(27)

a embarcação levar 11 passageiros fosse irrelevante na perspectiva da ocorrência da queda do Autor.

5.4.

Se o comportamento do Autor poderá, ainda, consubstanciar causa excludente da culpa da Ré, sendo ilidida, então, a presunção de culpa sobre ela impendente (o que conduziria à respectiva exoneração do dever de indemnizar).

Do factualismo apurado decorre que, quando se deu o acidente, o Autor estava sentado em cima da caixa situada à proa, por não existirem lugares suficientes para que todos os passageiros se sentassem (havendo sempre um passageiro que deixaria de ter a disponibilidade de um assento nas duas filas

longitudinais, que traduzem a acomodação de segurança).

O Autor seguia sentado naquela caixa, tendo tal lugar sido anteriormente ocupado por um outro passageiro.

Concomitantemente, não se encontra provado que a Ré, por intermédio dos seus empregados, tivesse colocado quaisquer obstáculos a que o Autor se sentasse nessa caixa situada na proa (quer recriminando-o por se colocar naquele lugar, quer sugerindo-lhe qualquer outro lugar para se sentar, que se revelasse mais seguro para o Autor).

Também se não encontra provado que o Autor estivesse em pé, na proa da embarcação, virado de frente para a ré (parte traseira da embarcação) e de costas para a ondulação e que não tivesse acatado as solicitações e

insistências do skipper e da guia para se sentar (contra - versão apresentada pela Ré em sede de contestação e que não logrou provar).

Neste contexto factual, em que o Autor ocupa o lugar em cima da caixa situada à proa, que anteriormente fora ocupado por outro passageiro, e que não dispunha de qualquer outro tipo de assento (por estarem todos ocupados), não se vislumbra qualquer desrespeito das regras de segurança pelo Autor, pelo que afastada fica a conclusão extraída pela Ré de que o Autor teria contribuído com o seu comportamento para a produção do acidente”.

Perante o que se deixa transcrito, bem andou o acórdão não só ao confirmar a sentença recorrida a qual havia concluído que a Ré não logrou demonstrar que a culpa no deflagrar do acidente se devia ao não acatamento pelo Autor dos avisos que, reiteradamente, lhe haviam sido feitos em viagem como também

(28)

não logrou demonstrar que o Autor tenha contribuído, de qualquer outro modo, com o seu comportamento para a produção do acidente.

6.

I - O valor probatório pleno do documento autêntico não respeita a tudo o que se diz ou se contém no documento, mas somente aos factos que se referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo e quanto aos factos que são referidos no documento com base nas percepções da entidade documentadora.

II - O STJ, enquanto tribunal de revista, apenas pode alterar a decisão sobre a matéria de facto, quando houver ofensa expressa de disposição legal que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou fixe a força de

determinado meio de prova (artigo 729º, n.º 2, do CPC).

III - A responsabilidade contratual é subjectiva, e pressupõe a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil: facto, ilícito, culpa, dano (danos

emergentes e lucros cessantes) e nexo de causalidade.

IV - A culpa, face ao estatuído no n.º 1 do artigo 799º do Código Civil, presume-se, recaindo sobre o devedor o ónus de provar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua.

V - Viola a obrigação de realizar uma viagem em segurança a ré que na prestação de um serviço (dar a observar ao autor a vida marinha,

nomeadamente cetáceos) numa embarcação que apenas dispunha de 10 lugares para passageiros, seguros e devidamente acomodados, permite o

embarque de 11 passageiros, tendo o último que se sentar na caixa à proa, por inexistir qualquer outro lugar disponível.

VI - Não ilide a presunção de culpa a ré que, em tal circunstancialismo, se limita a dar instruções e distribuir uma ficha informativa sobre a segurança, se da matéria provada resulta que, quando se deu o acidente, o autor estava sentado em cima da caixa situada à proa, de costas para a ondulação, por não existirem lugares suficientes para que todos os passageiros se sentassem – havendo sempre um passageiro que deixaria de ter a disponibilidade de um assento nas duas filas longitudinais, que traduzem a acomodação de

segurança, lugar que aliás foi rotativamente ocupado pelos diversos passageiros – se não resulta provado que o fizesse em desrespeito de instruções específicas da ré quanto àquelas regras de segurança.

7.

(29)

Pelo exposto, na improcedência da revista, confirma-se o acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 29 de Maio de 2014 Granja da Fonseca (Relator) Silva Gonçalves

Fernanda Isabel Pereira _______________

[1] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Volume II, 6ª edição, página 98 e seguintes.

[2] Almeida e Costa, Direito das Obrigações, 9ª edição, página 535.

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