Universidade
Católica de
Brasília
PRÓ-REITORIA
DE
PÓS-GRADUAÇÃO
E
PESQUISA
STRICTO SENSU
EM
EDUCAÇÃO
Mestrado
FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO SUPERIOR
DE CURSOS DE GRADUAÇÃO NA ÁREA DE SAÚDE
Autora: Dayse Souza da Silva
Orientadora:
Profª. Drª. Eunice Maria Lima Soriano de Alencar
DAYSE SOUZA DA SILVA
FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO SUPERIOR DE CURSOS DE GRADUAÇÃO NA ÁREA DE SAÚDE
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da
Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para a obtenção do Título de Mestre em Educação.
Orientadora: Profª. Drª. Eunice Maria Lima Soriano de Alencar
Ficha elaborada pela Coordenação de Processamento do Acervo do SIBI – UCB.
S586f Silva, Dayse Souza da.
Formação de professores da educação superior de cursos de graduação na área de saúde / Dayse Souza da Silva. – 2008. 100 f.: il. ; 30 cm.
Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2008. Orientação: Eunice Maria Lima Soriano de Alencar.
Aos meus pais Iliércio e Rita, que sempre me apoiaram nos desafios que tracei. Exemplos de vida e luta, carinho e companheirismo, amor e paciência. Certamente sem vocês eu não conseguiria chegar aonde estou, e não teria motivos para seguir em frente. Vocês são a inspiração!!!
Aos meus irmãos, amigos e colegas de trabalho pelas contribuições fraternas em todos os momentos.
Ao meu namorado, por compreender as ausências e os momentos de cansaço e estresse.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por iluminar meu caminho, por colocar pessoas maravilhosas em minha vida, por me dar forças em todos os momentos e por me manter firme na busca do resultado desse trabalho.
À professora Eunice Alencar, grande orientadora, exemplo de profissionalismo e competência, que durante todo o período de orientação me apoiou e me incentivou na construção do presente trabalho. Por ter aceitado esse desafio, por ter me dado confiança e segurança e por estar atenta às minhas fraquezas, me auxiliando a obter o melhor resultado. Certamente fez parte da minha formação profissional, mas principalmente da minha formação pessoal.
À professora Maria Lucia Marcondes Vasconcelos, sempre receptiva desde o primeiro momento, pela gentileza de vir a Brasília para contribuir com o presente trabalho.
Ao professor José Florêncio Rodrigues Júnior, que gentilmente aceitou compor a banca examinadora.
À professora Jacira Câmara, que me recebeu de braços abertos no Mestrado em Educação, acreditando que, mesmo não sendo da área pedagógica, eu poderia fazer parte do curso, e pelas contribuições ao projeto de dissertação.
Aos professores que participaram da pesquisa e para ela trouxeram grande contribuição.
À Iraci pelo apoio na coleta de dados, grande amiga e companheira em todos os momentos.
Aos colegas que trouxeram excelentes contribuições ao texto: Fernando Mariano, Tatiana Britto e Maria de Jesus Campelo.
À Universidade Católica de Brasilia, presente em mais uma etapa da minha vida.
Aos funcionários da UCB, pela atenção e auxílio nos momentos em que estive na instituição.
“Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.
Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo.
Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.”
RESUMO
SILVA, Dayse Souza da. Formação de professores da educação superior de
cursos de graduação na área de saúde. 2008. 100 folhas. Dissertação do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação - Universidade Católica de Brasília, 2008.
A pesquisa teve como tema a formação do docente da educação superior na área de saúde. Foi realizada entrevista semi-estruturada com 30 professores dos cursos de biomedicina, enfermagem e farmácia de uma instituição de educação superior particular de uma Região Administrativa do Distrito Federal. Objetivou-se identificar a forma de ingresso, os fatores que motivaram os bacharéis a optar por exercer a docência no nível superior, bem como investigar a satisfação, as práticas pedagógicas utilizadas, os conceitos sobre o “bom professor” e os problemas enfrentados na atividade docente. Os resultados do estudo apontam para a formação acadêmica, em detrimento da formação didático-pedagógica. Observou-se a predominância da exposição formal de conteúdos, no entanto, outras importantes técnicas de pedagogia ativa também foram apontadas. O fator motivador predominante para o ingresso foi o “gostar de ensinar”. E, a satisfação com a atividade docente predomina nos discursos apresentados, sendo que muitos dos que atuam também na área específica de formação referiram que poderiam optar por exercer exclusivamente a docência no nível superior. Dos que não optariam, o fator de destaque foi o fato de que a prática profissional complementa a atividade docente. E, para os docentes investigados, as principais características que representam o “bom professor” são o bom relacionamento com o aluno e o domínio do conteúdo. O problema enfrentado pelos professores e que foi apresentado com destaque diz respeito ao despreparo dos alunos que ingressam na educação superior. Conclui-se que ainda há muito o que evoluir em termos de formação do professor de nível superior, mas os dados mostram que um pouco já se avançou, principalmente quando se observa que a prática “bancária” de ensino, embora predominante nas respostas, não é a única utilizada pelos professores.
ABSTRACT
SILVA, Dayse Souza da. Teacher training for higher education courses in the
health sector. 2008. Brasília, 2008.
The research dealt with teacher training for higher education courses in the health sector. It involved semi-structured interviews with 30 teachers from the courses of biomedicine, nursing and pharmacy of a higher education institution in an administrative region of the Federal District, Brazil. The purpose was to identify access mechanisms to the career, motivating factors to higher education teaching, as well as teachers’ levels of satisfaction, pedagogical practices applied, notions regarding what makes a “good teacher”, and problems faced in the teaching activity. The results indicate that academic training prevails over didactic/pedagogical training. A prevalence of formal presentations of contents was observed, but other important active teaching techniques were also pointed out. The main motivating factor for entering the profession was “enjoying teaching”. Satisfaction with the teaching activity prevails in the discourses presented and many teachers who also work in their specific area of training mentioned they could opt for exclusively teaching in higher education. For those who would not, the main reason presented was that professional practice complements teaching. For the teachers interviewed, the main characteristics of a “good teacher” are a good relationship with students and a thorough knowledge of the subject. The biggest problem faced by teachers refers to students accessing higher education unprepared for it. The conclusion is that there is still a long way to go in regard to teacher training for higher education, but the data shows there have been some advances, especially if one considers that “banking” education practices, although prevailing in the answers, are not the only technique used by teachers.
Keywords: Higher education. Teacher training. Health sector.
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – Dados de gênero, idade, titulação, locais de trabalho, quantidade de cursos e total de disciplinas sob responsabilidade dos docentes participantes da pesquisa... 47
TABELA 2 – Formas de ingresso e fatores motivacionais para a entrada na docência do nível superior... 54
TABELA 3 – Atividade profissional, opção pelo exercício exclusivo da docência, satisfação e motivos de satisfação ou insatisfação com a atividade acadêmica... 58
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ... 10
CAPÍTULO 1 – DEFINIÇÃO DO PROBLEMA ... 14
CAPÍTULO 2 – REVISÃO DE LITERATURA ... 17
2.1 A EDUCAÇÃO SUPERIOR E A ESTRUTURA ORGANIZATIVA ... 17
2.1.1 Dados sobre a educação superior no Brasil ... 19
2.2 LEGISLAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR .... 22
2.3 DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR ... 23
2.3.1 “Ensinar” e “aprender” na educação superior ... 27
2.4 PÓS-GRADUAÇÃO NO BRASIL ... 29
2.4.1 Destino dos mestres e doutores no Brasil ... 30
2.5 FORMAÇÃO DE PROFESSORES ... 31
2.5.1 Didática ... 34
2.6 PRÁTICA PEDAGÓGICA ... 35
2.6.1 Os quatro pilares da educação ... 37
2.6.2 O profissional de saúde e a sua atuação ... 38
2.7 ANDRAGOGIA ... 39
2.8 APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS E TEORIA DA PROBLEMATIZAÇÃO 40 2.9 ESTUDANTES DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ... 41
CAPÍTULO 3 – MÉTODO ... 44
3.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA ... 44
3.2 PARTICIPANTES ... 45
3.3 INSTRUMENTO ... 48
3.4 PROCEDIMENTOS E ANÁLISE DE DADOS ... 49
CAPÍTULO 4 – RESULTADOS ... 52
4.2 SATISFAÇÃO COM A DOCÊNCIA ... 54
4.3 FORMAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS UTILIZADAS PELOS DOCENTES ... 59
4.4 O “BOM PROFESSOR” NA PERSPECTIVA DOS DOCENTES ... 63
4.5 PROBLEMAS ENFRENTADOS NA DOCÊNCIA ... 64
CAPÍTULO 5 – DISCUSSÃO ... 66
5.1 EXPERIÊNCIAS NA ÁREA DE EDUCAÇÃO ... 66
5.2 MOTIVO DE INGRESSO NA DOCÊNCIA DE NÍVEL SUPERIOR ... 70
5.3 SATISFAÇÃO COM A PROFISSÃO ... 71
5.4 FORMAÇÃO DOCENTE E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS ... 72
5.5 O BOM PROFESSOR ... 78
5.6 PROBLEMAS NA DOCÊNCIA ... 79
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES ... 82
REFERÊNCIAS ... 85
INTRODUÇÃO
A educação superior no Brasil tem experimentado um crescimento ímpar ao
longo da última década, período em que o número de instituições de educação
superior (IES) cresceu quase três vezes. Esse fato sinaliza a existência de
indicadores que constituem potenciais elementos de investigação, sobretudo com
respeito à formação dos docentes para atender o aumento da demanda na
educação superior.
Diversos estudos (REZENDO et al., 1999; SILVA; RUFFINO, 1999; TULLIO,
1995; VASCONCELOS, 1994) apontam a necessidade de melhor preparação dos
docentes que atuam na educação superior ─ sobretudo sob o ponto de vista
didático-pedagógico, ─ para atender esse aumento significativo do número de
instituições. É importante ressaltar que em muitos cursos os professores são
bacharéis e não licenciados, ou seja, não tiveram em sua formação inicial disciplinas
de cunho pedagógico. Esse fato ocorre, por exemplo, na área de saúde, em que os
estudantes não cursam disciplinas voltadas para a docência, mas sim aquelas que
abordam os conhecimentos técnicos necessários ao exercício da profissão.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996), o
magistério na educação superior deve ser exercido, prioritariamente, por pessoas
com títulos de mestre ou doutor. No entanto, os cursos de pós-graduação stricto
sensu costumam oferecer mais disciplinas que levam à pesquisa e muito menos
aquelas voltadas para a docência. E isso acontece a despeito de o Plano Nacional
de Pós-Graduação estabelecer que, entre os objetivos da pós-graduação, está a
capacitação de docentes para as instituições de educação superior (BRASIL, 2004).
Nota-se que, com o aumento do número de instituições de educação superior,
especialmente das particulares, ocorre entre estas uma acirrada concorrência.
Dessa forma, para atender à nova demanda da educação superior e sobreviver
nesse mercado, que se torna cada vez mais competitivo, as instituições devem
buscar a qualidade de seus serviços. Ressalte-se que existe uma estreita relação
entre a qualidade do ensino em uma IES e o trabalho docente em sala de aula. O
aprendizagem. Por essa razão, com o aumento do número de instituições que
atendem esse nível de ensino, elas devem estar preparadas para o mercado em
questão, e nesse cenário um fator decisivo consiste na formação dos docentes.
É importante perceber que a qualidade de uma instituição de ensino aparece
muito mais na sala de aula do que em propagandas, aparece com a produção de
conhecimento e não com a reprodução de imagens. A sala de aula é um local de
construção, reconstrução e compartilhamento de culturas. Nesse sentido, o docente
desempenha papel primordial, visto que deve auxiliar no desenvolvimento do espírito
reflexivo e estimular a criatividade dos alunos. Mas, para isso, é fundamental que os
docentes tenham consciência do papel que desempenham na formação dos alunos,
e isso é muito mais fácil quando apresentam uma formação pedagógica que sirva
como um referencial sólido para suas atitudes em sala de aula.
É comum entre os professores dos cursos de graduação a utilização de
práticas pedagógicas de exposição verbal de conteúdos, que pouco valorizam o
processo reflexivo e exploratório por parte dos alunos. Ocorre apenas a transmissão
do conhecimento, como se isso fosse suficiente para fazer com que o futuro
profissional tenha habilidades satisfatórias para desempenhar suas atribuições no
mercado de trabalho. Isso se deve, entre outros fatores, à falta de preparo dos
docentes, o que não quer dizer que não dominem o conteúdo que ministram. Na
verdade, os profissionais que se tornam referência em uma dada área, em virtude de
sua atuação e sucesso na carreira, são convidados a ocupar salas de aula e
ministrar disciplinas. Isso é importante, pois esse profissional conhece bem a prática
e o mercado de trabalho. No entanto, somente o conhecimento técnico, por maior
que seja, não garante o êxito no ensino de uma disciplina, tendo em vista que o
preparo do ponto de vista pedagógico se mostra essencial.
Pesquisas realizadas com universitários do curso de agronomia apontam a
“falta de didática” como um dos problemas comuns entre os professores (TULLIO,
1995). Também em estudo realizado com docentes da área de saúde que
ministravam uma disciplina de didática em um curso de pós-graduação, percebeu-se
a prática pedagógica enraizada na concepção da educação bancária, objeto da
crítica de Paulo Freire (REZENDO et al., 1999). O estudo realizado por Silva e
comportamentos docentes de acordo com a percepção dos alunos, aponta que os
docentes ainda carecem de reflexão e discussão sobre a sua prática pedagógica.
Greco (2002) aponta dois elos fracos na cadeia da educação superior: o
despreparo didático-pedagógico de grande parte do corpo docente, que não
necessariamente significa despreparo técnico-científico ou má qualificação; e o perfil
dos alunos que procuram os cursos para aquisição de maior conhecimento e
oportunidades de trabalho, um perfil que denota carências educacionais e de
conhecimento. O presente trabalho se propôs a verificar o primeiro elo, ou seja, os
docentes da área de saúde.
Diante do exposto, fica clara a necessidade de pesquisas que visem
identificar a formação do docente da educação superior, abordando a prática
pedagógica, as dificuldades relacionadas ao dia-a-dia dos professores e as suas
motivações.
O presente estudo, resultado da pesquisa realizada com docentes da
educação superior em saúde, está dividido em seis capítulos. O primeiro capítulo
traz a apresentação do problema da pesquisa e seus objetivos, bem como a
exposição dos motivos que levaram ao desenvolvimento deste trabalho.
O segundo capítulo trata da revisão da literatura, e nele são apresentados os
autores que fundamentam a pesquisa. São abordados os temas relativos ao
panorama da educação superior no Brasil, a pós-graduação, legislações e políticas
públicas e a formação dos professores. Buscou-se, além de expor informações
essenciais sobre a formação do docente da educação superior, também caracterizar
os alunos que fazem parte desse nível de ensino e suas particularidades, que
influenciarão o desenvolvimento das atividades pelos docentes em sala de aula.
O terceiro capítulo contém informações detalhadas sobre o método utilizado
na pesquisa. São explicitadas as técnicas tanto de coleta quanto de análise de
dados.
O quarto capítulo traz os resultados e a análise dos dados obtidos com o
estudo. São apresentados os motivos que levaram o professor a trabalhar na
educação superior, a satisfação com o exercício da docência, a influência de
disciplinas de caráter didático-pedagógico cursadas por esses docentes e suas
características de um bom professor conforme a percepção dos docentes
pesquisados e os problemas enfrentados na docência. O quinto capítulo, sobre as
discussões, busca comparar os resultados com os obtidos em outros estudos, bem
como formular hipóteses.
O último capítulo apresenta as principais conclusões da pesquisa, tanto sobre
a formação do docente quanto sobre suas ações e dificuldades em sala de aula.
Nesse capítulo também são apresentadas sugestões para os problemas destacados
na pesquisa.
CAPÍTULO 1 – DEFINIÇÃO DO PROBLEMA
O domínio específico da profissão docente define a identidade profissional do
professor e reflete o entendimento sobre as suas funções e o modo como devem ser
desempenhadas (COSTA, 2007). Para atuar em educação, é relevante que o
professor tenha conhecimento de diferentes abordagens de ensino ou tendências
pedagógicas capazes de orientar a prática em sala de aula. Essas tendências e
abordagens, por sua vez refletem o caráter ideológico que perpassa o sistema
educacional de contextos determinados. Por meio da consciência crítica, os
docentes devem reavaliar os modelos educacionais e analisar as influências
exercidas por eles na sua prática educativa (SILVA; RUFINO, 1999).
A formação de professores vem sendo muito discutida nos últimos anos,
especialmente a dos que atuam na educação básica; porém, com relação aos
docentes de instituições de educação superior, poucos estudos se dedicam à
análise do papel da formação em seu exercício profissional (AZANHA, 2004; DIAS;
LOPES, 2003; PEREIRA, 1999; SCHEIBE, 2004; SILVA, 2004; VASCONCELOS,
2000). E, ainda conforme afirma Vasconcelos (2000), “a questão da formação
docente é sempre ignorada” ou pouco abordada em documentos legais, tais como a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/1996).
E, conforme Souza (1991, p. 59), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação é
“[...] a lei básica do sistema de ensino. Ela o organiza, indica seus fins e
procedimentos, fundamenta seus princípios, sugere linhas de políticas de ação,
prevê sua administração e lhe confere significado e poder [...]”. E ainda cabe
ressaltar que os docentes da educação superior, de modo geral, têm dado pouca
relevância à sua formação como professores, isto é, à sua preparação para a função
de ensino (REZENDO et al., 1999; VASCONCELOS, 2000).
De acordo com Costa (2007), a educação superior em saúde tem sido, nas
últimas décadas, alvo de críticas. Isso se deve, entre outros fatores, à maneira
engessada como a formação de novos profissionais de saúde vem ocorrendo. A
contribuem para o desenvolvimento de uma sociedade de sujeitos sociais
construtores de sua própria história. A concepção que prevalece é a de uma
educação para o ajustamento, a adaptação às normas e padrões de comportamento
considerados “adequados”, em que aos educandos é imposta uma condição de
passividade e subordinação à autoridade do educador (REZENDO et al., 1999).
Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira – INEP apontam um aumento quantitativo nas instituições de educação
superior, tanto no número de matrículas de alunos quanto de docentes. Dessa
forma, tornam-se pertinentes as investigações sobre a formação desses professores
e a profissionalização da carreira docente (BRASIL, 2007b).
O interesse pelo tema e a escassez de estudos relativos à formação de
docentes da educação superior na área de saúde levaram ao desenvolvimento do
presente estudo.
O objetivo geral da pesquisa consiste em investigar a formação do docente da
educação superior de cursos da área de saúde, sua capacitação
didático-pedagógica, sua satisfação com a atividade docente e possíveis problemas por ele
enfrentados.
E os objetivos específicos são:
- identificar como se deu o ingresso e verificar os fatores que motivaram a
opção pela docência;
- investigar a satisfação com a atividade docente;
- verificar se os docentes cursaram disciplinas de caráter pedagógico voltadas
para a educação superior e, em caso positivo, quais as principais contribuições
dessas disciplinas para a sua atuação;
- investigar as ações ou estratégias pedagógicas utilizadas pelos docentes;
- verificar a percepção do docente da educação superior em saúde sobre as
características do “bom professor”;
- identificar os possíveis problemas que os docentes da educação superior
enfrentam em sua atuação.
As questões da pesquisa são:
a) Como se deu o ingresso e quais motivos levaram os profissionais de
b) Os docentes estão satisfeitos com a atuação na educação superior?
c) Estão os docentes que atuam na educação superior em saúde preparados
para exercer tal atividade do ponto de vista didático-pedagógico?
d) Quais as práticas pedagógicas utilizadas pelos docentes da educação
superior em saúde?
e) Quais as concepções dos docentes acerca do “bom professor”?
f) Quais os problemas enfrentados pelos docentes em sua prática de sala de
aula?
A escolha da educação superior em saúde deveu-se à prática docente
vivenciada e à percepção das dificuldades no processo ensino-aprendizagem dos
profissionais dessa área com formação em grau de bacharelado e escassos
CAPÍTULO 2 – REVISÃO DE LITERATURA
2.1 A EDUCAÇÃO SUPERIOR E A ESTRUTURA ORGANIZATIVA
A educação brasileira se divide em nível básico e superior. O primeiro deve
desenvolver o educando, formando-o para o exercício da cidadania e fornecendo-lhe
os meios para uma progressão no trabalho ou em estudos posteriores. Essa
modalidade é subdividida em educação infantil, ensino fundamental e ensino médio.
Já a educação superior, aberta a pessoas que tenham concluído o ensino médio, é
ministrada em Instituições de Ensino Superior (IES) públicas ou privadas. Na
educação superior se incluem diferentes tipos de cursos, desde a graduação até a
pós-graduação (NEVES, 2002).
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996, p. 14-15) estabelece
que a educação superior tem por finalidade:
estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo; formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua; incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando o desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão da cultura, e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que vive; promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação; suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração; estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade; e promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.
A educação no Brasil tem como órgão principal o Ministério da Educação,
composto por uma grande estrutura na qual incluem secretarias, órgãos e autarquias
a ele vinculados ou subordinados. O ministério tem sob sua competência a política
nacional de educação, a educação infantil, a educação em geral (compreendendo
tecnológica, educação de jovens e adultos, educação profissional, educação
especial e educação a distância, exceto ensino militar), a avaliação, informação e
inquérito educacional, a pesquisa e extensão universitárias, o magistério e a
coordenação de programas de atenção integral a crianças e adolescentes (BRASIL,
2008d). Neste trabalho serão citados aqueles órgãos diretamente relacionados à
educação superior, conforme os comentários a seguir.
O funcionamento da educação superior no Brasil é regulado por normas
publicadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), que são as Diretrizes
Curriculares. O CNE é um órgão colegiado integrante da estrutura de administração
direta do MEC e foi criado nos termos da Lei nº 9.131, de 24 de novembro de 1995.
Esse órgão possui funções normativas, deliberativas e de assessoramento ao
Ministro da Educação no desempenho das funções e atribuições do poder público
federal em matéria de educação. Está na pauta do CNE formular e avaliar a política
nacional de educação, zelar pela qualidade do ensino, velar pelo cumprimento da
legislação educacional e assegurar a participação da sociedade no aprimoramento
da educação brasileira (BRASIL, 2008c).
As Diretrizes Curriculares da educação superior são orientações para a
elaboração dos currículos dos cursos universitários e devem ser respeitadas por
todas as instituições de ensino superior. Entre outros aspectos, essas diretrizes
pretendem que os cursos superiores abandonem a característica presente em
muitos deles, de serem meros transmissores de conhecimentos, e passem a
preparar efetivamente os alunos para que tenham condições de exercer a profissão,
atuando no mercado de trabalho. As diretrizes devem contemplar os seguintes itens:
perfil do formando/egresso/profissional; competência/habilidades/atitudes;
habilitações; conteúdos curriculares; organização do curso; estágios e atividades
complementares; acompanhamento e avaliação (BRASIL, 2008c).
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(INEP) é uma autarquia vinculada ao Ministério da Educação e faz parte da
administração indireta. Esse órgão tem como missão promover estudos, pesquisas e
avaliações sobre o sistema educacional brasileiro, com o objetivo de subsidiar a
elaboração e implantação de políticas públicas para a educação. Na área de
e realizar a avaliação direta dos cursos de graduação, em especial por meio do
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) (BRASIL, 2008b).
A Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) é
também uma autarquia vinculada ao Ministério da Educação e faz parte da
administração indireta. A Capes desempenha importante papel para a expansão e
consolidação da pós-graduação stricto sensu no Brasil. O órgão possui quatro linhas
básicas de atividades: a avaliação da pós-graduação stricto sensu, o acesso à
produção científica e a divulgação desta, os investimentos na formação de recursos
de alto nível no país e no exterior e a promoção da cooperação científica
internacional (BRASIL, 2008a).
2.1.1 Dados sobre a educação superior no Brasil
Segundo dados do último censo da Educação Superior realizado pelo Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, há no Brasil
242.795 docentes qua atuam em tal nível de ensino. Desse total, 58.618 são
doutores, 86.294 são mestres, 70.554 são especialistas, 27.289 possuem apenas a
graduação e 40 são de notório saber (BRASIL, 2007b).
É importante notar que no ano de 1991 existiam no Brasil 133.135 docentes
na educação superior: 17.712 doutores, 29.046 mestres, 43.850 especialistas e
42.527 graduados. Dessa forma, percebe-se um aumento de 82% no quantitativo de
docentes entre os anos de 1991 e 2006. O aumento desse número foi mais
acentuado a partir de 1998, tendo sido o crescimento entre 1991 e 1998 da ordem
de 24% e de 1998 a 2006 de 82,3%. Esses dados foram acompanhados também
pelo aumento no número de instituições de educação superior (IES), principalmente
das instituições particulares. No ano de 1991, havia no Brasil 893 IES, sendo 671
particulares e 222 públicas, e no ano de 2006 esse número já era igual a 2.398, das
quais 2.141 particulares e 257 públicas. O incremento entre 1991 e 1998 foi de
11,7% e entre 1998 e 2006 foi de 146,4% (BRASIL, 2007b). Em suma, a expansão
particulares, mantendo-se e, em alguns casos, diminuindo a participação do setor
público com respeito a esse nível (ALGEBAILE, 2004; LOCH; REIS, 2004;
MARTINS, 2000; NASCIMENTO JÚNIOR, 2006; SGUISSARDI, 2006).
Essa evolução no número de IES (ANDRADE; STRAUHS, 2006; BERALDO;
VELOSO, 2007; LOCH; REIS, 2004; NASCIMENTO JÚNIOR, 2006) pode ser
entendida a partir de alguns fatores, entre eles o processo de redefinição das
funções de Estado, iniciado no primeiro mandato do presidente Fernando Henrique
Cardoso. Cria-se uma nova estrutura administrativa, destacando-se o processo de
privatização,
transfere-se para o setor privado a tarefa da produção que, em princípio, este realiza de forma mais eficiente. Finalmente, através de um programa de publicização, transfere-se para o setor público não-estatal a produção dos serviços competitivos ou não-exclusivos de Estado, estabelecendo-se um sistema de parceria entre Estado e sociedade para seu financiamento e controle. Deste modo o Estado reduz seu papel de executor ou prestador direto de serviços, mantendo-se, entretanto, no papel de regulador e provedor ou promotor destes, principalmente dos serviços sociais como educação e saúde, que são essenciais para o desenvolvimento, na medida em que envolvem investimento em capital humano; para a democracia, na medida em que promovem cidadãos; e para uma distribuição de renda mais justa, que o mercado é incapaz de garantir, dada a oferta muito superior à demanda de mão-de-obra não-especializada (BRASIL, 1995, p. 13).
Entre os fatores que levaram o governo a promover um processo de
privatização da educação superior no Brasil estão o crescimento demográfico, a
expansão do ensino médio (antigo segundo grau), a insuficiência das vagas
existentes nas instituições públicas e a ampliação da expectativa de promoção
social, sendo a educação superior considerada como o caminho “mais curto” para
alcançar uma condição social melhor (SOARES, 2002c; VAHL, 1980). Já a
Constituição Federal de 1998 traz em seu artigo 209 a previsão de que a oferta de
ensino superior seja livre à iniciativa privada, desde que cumpridas as normas gerais
da educação nacional e mediante a autorização e avaliação da qualidade pelo poder
público (BRASIL, 1990).
Diante do exposto, e também com a aprovação da nova Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDB), permitiu-se a entrada de empresas com fins lucrativos no
setor educacional. Dessa maneira, e, em virtude do investimento público abaixo da
demanda, abriu-se caminho para o surgimento e crescimento de instituições
particulares no setor (ALENCASTRO; FOCHEZATTO, 2006; BRASIL, 1996;
de descentralização que leva à distribuição de poder na sociedade, de modo que se
retira ou diminui o poder de uns e se acrescenta para outros. Nesse caso,
aumenta-se o poder das instituições particulares de ensino, incluindo-aumenta-se novos atores e
definindo-se novas formas de poder na sociedade. Tal processo é considerado uma
política que visa conseguir determinados fins, podendo ser bom ou ruim,
progressista ou conservador de acordo com quem o utilize e conforme contribua ou
não para a resolução dos problemas que geraram essa medida (CASASSUS, 1995).
Nota-se que, com essa expansão da educação superior, as pessoas que
pertenciam às camadas mais baixas de renda passaram a ter oportunidade de
freqüentar faculdades e universidades e, no caso dos trabalhadores, de alcançar
qualificação ou certificação (ALGEBAILE, 2004; NASCIMENTO JÚNIOR, 2006).
Percebe-se ainda que as mudanças na estrutura produtiva e a globalização trazem
como conseqüência novas exigências educacionais para a realização eficaz das
atividades, bem como a demanda por maior qualificação profissional (NASCIMENTO
JÚNIOR, 2006; VASCONCELLOS; OLIVEIRA; BERBEL, 2006).
Essa expansão não é negativa tendo em vista que, conforme mencionado,
pelo menos teoricamente cria possibilidades de acesso à educação superior para
uma parcela maior da população, que de outra forma não conseguiria ingressar
nesse nível de ensino. No entanto, a expansão ocorreu em detrimento da qualidade,
com a criação de um grande número de instituições educacionais sem corpo
docente qualificado e sem a infra-estrutura mínima necessária ao seu funcionamento
(MICHELOTTO; COELHO; ZAINKO, 2006). Tudo isso pode ser percebido conforme
os dados das últimas avaliações da educação superior realizadas pelo INEP, por
meio do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (ANDES, 2008). Pinto
(2004, p. 730), ao analisar esse processo, afirma que se produziu “uma privatização
e mercantilização sem precedentes, com graves conseqüências sobre a qualidade
do ensino oferecido e sobre a eqüidade”.
Houve um aumento, conforme destacado, na oferta de educação superior por
escolas particulares, principalmente no período noturno. Nelas, 67% das matrículas
são para esse período, ao passo que no sistema público predomina a matrícula no
período diurno, com 64% do total. É importante ressaltar que a oferta de vagas
seleção. Dessa forma, pessoas com carências de conhecimentos ingressam na
educação superior, inviabilizando a realização de um trabalho pedagógico de nível
razoável (GRECO, 2002; PINTO, 2004; SOARES, 2002b).
2.2 LEGISLAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO
SUPERIOR
De acordo com Morosini (2000), o silêncio é a principal característica da LDB
de 1996 ao tratar do tema da formação didática do professor universitário.
Vasconcelos (2000, p. 17) também faz críticas à LDB no que diz respeito à formação
do docente da educação superior, pois esse documento “não faz nenhuma alusão à
formação didático-pedagógica como pré-requisito para a formação, ingresso e
promoção na carreira docente do magistério superior”. A mesma autora também
relata a preocupação com o “amadorismo pedagógico”, ou seja, o fato de muitos
docentes considerarem que o dom e o conhecimento específico da disciplina são
suficientes para atuarem.
A docência nesse nível de ensino tem sido considerada uma caixa de
segredos: as políticas públicas são omissas sobre o processo de ensino, posto sob a
responsabilidade da instituição de educação superior, que por sua vez pressupõe a
liberdade acadêmica do docente (MOROSINI, 2000).
Ainda de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em seu artigo
66, a preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de
pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado. No entanto,
conforme já tratado, não há maiores especificações a respeito de tal formação
(BRASIL, 1996).
É importante ressaltar que o governo não estabelece diretamente as normas
de capacitação didática dos professores da educação superior. O que ele faz são
avaliações de outros indicadores nesse nível de ensino, o que reflete o êxito da
pedagogia universitária. Ou seja, a política de capacitação fica sob a
percebe por parte das instituições é um movimento nas suas políticas para buscar a
qualificação didática dos professores, tendo em vista as avaliações de desempenho
dos alunos implantadas pelo governo, de forma que está provada a relação entre o
desempenho didático do professor e o desempenho do aluno (MOROSINI, 2000).
O Plano Nacional de Pós-Graduação (BRASIL, 2004) indica que nas
universidades federais no ano de 2003, 43,3% dos docentes possuíam o doutorado
e 28% dos docentes somente o mestrado. Nas estaduais, 37% eram doutores e 28%
tinham o título de mestre, devendo-se ressaltar a participação destacada das
universidades estaduais paulistas nesse contexto. Nas municipais, apenas 12%
eram doutores e 34,8% eram mestres. Nas instituições particulares, que absorviam,
em 2003, 71% do alunado de graduação, constata-se que nas instituições sem fins
lucrativos (comunitárias, confessionais e filantrópicas) 14,7% de seu quadro era
constituído de doutores e 40% de mestres. No setor privado com fins lucrativos,
apenas 9,3% eram doutores e 38,7% eram mestres. Tais dados evidenciam a
necessidade de investir fortemente na titulação dos docentes que atuam nas IES,
tendo como parâmetro a melhoria do ensino em sua fase atual e a necessidade de
expansão qualificada.
O interesse pelo sistema de ensino superior deve-se à sua importância para a
modernização e desenvolvimento do país (SGUISSARDI, 2006). É preciso, no
entanto, melhorar continuamente. A pós-graduação deve estar interligada com a
educação superior no sentido de se assegurar que docentes qualificados,
pesquisadores e recursos humanos de alto nível sejam formados (MARTINS, 2000).
Isto contribuirá para que os objetivos estabelecidos para educação superior sejam
alcançados, conforme prescrito na LDB.
2.3 DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR
É fato que a expansão da rede particular de ensino tem sido muito superior à
da federal e estadual. Percebe-se também uma acirrada competição entre as
para que uma instituição possa atingir bons resultados e sobreviver nesse nicho de
mercado (ANDRADE; STRAUHS, 2006). A formação de professores faz parte das
ações que importarão sucesso das IES. Processos de seleção bem conduzidos e
programas de capacitação docente servem tanto para melhorar o nível do corpo
docente, quanto para aprimorar a formação dos alunos e, por conseqüência, a
qualidade da instituição (SANGHIKIAN, 2007).
É importante perceber que o professor nasceu em uma determinada época,
em uma dada circunstância, e em um certo local, fatores que interferem no seu
modo de ser e de agir. Suas experiências e sua história são pontos determinantes
de seu comportamento cotidiano. É também importante ressaltar que o
conhecimento do docente é construído no dia-a-dia na escola, mas também provém
de outros âmbitos. A respeito disso, Freire (1996, p. 69) afirma que “toda prática
educativa demanda a existência de dois sujeitos, um que, ensinando, aprende, outro
que, aprendendo, ensina”. Ressalta-se ainda que as influências que o docente
recebe com a participação em movimentos sociais, religiosos, sindicais e
comunitários podem ter mais alcance do que a própria formação docente que
recebeu academicamente (CUNHA, 1989).
Cabe ressaltar que as ações dos docentes são baseadas em experiências
pessoais, reflexões geradas pelo processo de auto-avaliação, além de valores e
concepções que o docente possui, conforme aponta o estudo realizado por
Vasconcellos, Oliveira e Berbel (2006) sobre as práticas avaliativas de docentes de
cursos de licenciatura que foram considerados por seus alunos como bons
avaliadores. Sendo assim, o educador necessita ter conhecimentos de diferentes
abordagens de ensino ou tendências pedagógicas, que podem nortear a prática
docente. Para isso, deve possuir consciência crítica e reavaliar as influências que
exerce em sua prática pedagógica (SILVA; RUFFINO, 1999).
Em estudo realizado por Rezendo et al. (1999), buscou-se caracterizar as
práticas docentes (nível de planejamento, execução e avaliação de atividades e de
ensino-aprendizagem) utilizadas por professores de cursos da área de saúde. Os
resultados da pesquisa apontam a ênfase na transmissão de informações, cargas
horárias elevadas, pouca integração com as outras disciplinas dos cursos e aulas
formação pelos professores da educação superior. Esse pressuposto se baseia no
pensamento de que “para ser bom professor, basta conhecer bem o assunto”.
Masetto (2003) também menciona a importância da reflexão sobre a estrutura
organizativa da educação superior no Brasil, em que, desde o início até os dias
atuais, o domínio de conteúdos e as experiências profissionais vêm sendo
considerados os requisitos únicos para a docência nesse nível de ensino.
Esse pensamento de que para ser um bom professor da educação superior é
suficiente ter boa comunicação e sólidos conhecimentos relacionados à disciplina a
ser lecionada vigorou por muito tempo. Justificava-se por ser o corpo discente
composto por adultos, ou seja, estudantes que não exigem dos professores mais do
que competência para transmitir conhecimentos e sanar dúvidas (GIL, 2007;
REZENDO et al., 1999).
Nota-se também que os programas de mestrado e doutorado estão
organizados a partir da perspectiva da especialização em determinado recorte do
conhecimento e na capacitação para a pesquisa. Parece haver nesse aspecto um
imaginário de que a docência é atividade científica, e que basta o domínio do
conhecimento específico e o instrumental para a produção de novas informações
para que se cumpram os seus objetivos. Nesse caso, o professor, ao obter a sua
formação em nível de pós-graduação, em geral constrói uma competência
técnico-científica em alguma área de seu campo de conhecimento, mas fica o prejuízo de
uma visão mais ampla, abrangente e integrada de sociedade (CUNHA, 2000).
Historicamente, por parte das autoridades, tampouco houve grande interesse
com relação à formação docente. A preocupação era formar bons pesquisadores,
pois a idéia que se tinha era de que, quanto melhor pesquisador fosse, mais
competente professor seria. Atualmente, poucas pessoas envolvidas com questões
educacionais aceitam essa justificativa (GIL, 2007).
Também o que se percebe hoje é que a dimensão humana é bastante
valorizada pelos discentes, bem como a identificação com o que se faz, ou seja, com
a atividade de magistério. Em estudo realizado por Feitoza, Cornelsen e Valente
(2007), a respeito das características do “bom professor”, com uma amostra de
alunos do curso de arquivologia, verificou-se que conhecer os conteúdos e a área de
confiança. No entanto, isso nem sempre é suficiente para formar pessoas com bom
nível de conhecimento. Entre as características técnicas, o domínio do assunto
aparece em 30,52% das respostas, a didática em 17,89%, o dinamismo em 14,73%
e a experiência em 11,57% das respostas que caracterizam um “bom professor”.
Rego (2001, p. 567), abordando a eficácia comunicacional de professores em
duas universidades politécnicas de Portugal, verificou em seu estudo que:
tanto os docentes, como os estudantes valorizam fundamentalmente: a) a linguagem simples e atrativa, a ilustração da exposição lectiva com exemplos práticos, a postura participativa, o empenho e o apoio socioafetivo; b) a preparação das aulas, a organização das mesmas, e a competência no mêtier.
Segundo Calderón (apud SANGHIKIAN, 2007, p. 1), “o fato de se ter um título
de mestre ou doutor, ou ser um especialista bem-sucedido, não siginifica que esse
profissional seja um educador nem que tenha habilidades e competências em
termos didático-pedagógicos”. Para tanto, as instituições precisam também estar
preocupadas com a formação de seu corpo docente, pois educadores
despreparados arranham seriamente a imagem da IES.
As deficiências dos professores da educação superior aparecem em estudos
realizados com docentes desse nível de ensino. Pesquisa realizada por Tullio
(1995), com professores do curso de engenharia agronômica, apontou que 71% dos
docentes investigados não apresentavam qualquer formação pedagógica, cabendo
observar que na amostra pesquisada 84,4% eram doutores. O estudo sugere, entre
outras medidas, a inclusão das disciplinas “metodologia do ensino superior” ou
“didática” como obrigatórias em cursos de pós-graduação.
Nota-se que os professores da educação superior têm dado pouco valor à sua
formação como professores, ou seja, para as funções de ensino (REZENDO et al.,
1999). Talvez a forma como alguns cursos de pós-graduação são estruturados
acabe por valorizar menos a atividade acadêmica e mais as atividades de pesquisa.
Alguns dos problemas reconhecidos também dizem respeito ao fato de que os
professores geralmente têm a docência como segunda fonte de renda, trabalham
como horistas e passam pouco tempo na IES (BERBEL, 1994; GIL, 2007). Greco
(2002), conforme já abordado anteriormente, destaca que não há uma pedagogia da
educação superior ou uma exigência de que os docentes sejam conhecedores da
como “bico” para complementar o orçamento e muitas vezes agem sem
compromisso com a instituição em que atuam. E, mesmo sendo excelentes
profissionais do ponto de vista técnico, falta-lhes preparo para a tarefa de ensinar.
É também comum entre os professores, a repetição de modelos das
experiências positivas vivenciadas (CASTANHO, 2002; CUNHA, 2001; JANUARIO,
2007; VASCONCELLOS; OLIVEIRA; BERBEL, 2006). Conforme Freire (1996), a
experiência vivenciada pelo professor enquanto discente, seja no passado ou no
período atual, é fundamental para a sua prática como docente.
No entanto, não se pode prescindir da formação pedagógica para o exercício
do magistério superior. Para sanar esse problema, algumas instituições que
ministram cursos de pós-graduação já estão inserindo em sua oferta cursos de
Docência do Ensino Superior, ou inserindo disciplinas que alcancem esse tema,
conforme sugerido no estudo de Tullio (1995) citado anteriormente. E, também
nesse sentido, a Capes recentemente colocou como obrigatório o estágio de
docência no ensino superior para pós-graduandos bolsistas (MIZUKAMI, 2006).
2.3.1 “Ensinar” e “aprender” na educação superior
Conforme Masetto (2003), a docência universitária ainda coloca sua ênfase
no processo de ensino. Por isso, a organização do currículo continua estagnada, as
disciplinas são conteudísticas e são oferecidas apenas aquelas relativas a assuntos
técnicos e profissionalizantes, com pouca abertura para outras áreas de
conhecimento, para temas transversais e pouco incentivo à investigação científica. A
metodologia concentra-se na transmissão oral dos conteúdos e a avaliação é usada
como averiguação do que foi assimilado. No entanto, se a ênfase fosse dada ao
processo de aprendizagem (desenvolvimento e crescimento da pessoa em sua
totalidade), ocorreria a valorização de um currículo flexível, a interdisciplinaridade e
a metodologia participativa por parte dos docentes e alunos, o que facilitaria o
alcance dos objetivos propostos pela educação superior.
Abreu e Masetto (1985) esclarecem que, quando se decodifica o termo
ou habilidades, mostrar, orientar, guiar, dirigir. Ou seja, todos esses verbos colocam
o professor como agente principal e responsável pelo ensino. Já quando se
decodifica o termo aprender, encontra-se: buscar informações, rever a própria
experiência, adquirir habilidades, adaptar-se às mudanças, descobrir significados
nos seres, fatos e acontecimentos, modificar atitudes e comportamentos. Tais
termos apontam o aluno como responsável pela sua aprendizagem. Dessa forma, é
importante que o professor da educação superior reflita sobre a participação na
criação e organização do aprendizado dos alunos, pois seu papel é, na verdade, o
de facilitador da aprendizagem.
Ou seja, em uma situação de aprendizagem o centro do processo não está
naquele que ensina, mas sim, naquele que aprende. Dessa forma, o aprendizado do
aluno é influenciado pela maneira como o professor procura adequar as estratégias
de ensino às necessidades e às expectativas dos estudantes (GIL, 2007).
Para Cunha e Leite (1996), a aprendizagem é a construção individual e social
dos sujeitos, podendo ser resultado da ação pedagógica realizada em aula e
manifesta nas representações dos alunos através de suas abordagens de estudo.
O fazer aprender ocorre por meio da comunicação e com a aplicação. “O
professor é um profissional da aprendizagem, da gestão de condições de
aprendizado e da regulação interativa em sala de aula” (PAQUAY et al., 2001, p.
26).
É importante também ressaltar que o docente que tem sua formação básica
em bacharelado geralmente não cursou disciplinas relacionadas ao magistério,
como ocorre nos casos dos cursos da área de saúde, por exemplo. Geralmente, os
cursos de mestrado e doutorado também não contemplam, ou pouco contemplam
essas disciplinas. Dessa forma, o educador entra em sala de aula sem ter noções
básicas de como se processa a aprendizagem, ou onde entra o ensino no processo
(TULLIO, 1995). Conforme Barros e Silva (apud TULLIO, 1995, p. 594),
De acordo com Morosini (2000), um dos condicionantes mais fortes da
docência universitária diz respeito ao estabelecimento a que o professor está ligado.
A missão da instituição e as funções que são priorizadas tornam diferente a
atividade do professor, dependendo também da mantenedora, se particular ou
governamental, se federal, estadual ou municipal.
Os serviços de apoio pedagógico que as instituições de educação superior
colocam à disposição de seus docentes são uma alternativa de suporte. Esse
serviço busca atender e orientar o professor em suas necessidades concretas do
dia-a-dia. Esse sistema pode alcançar resultados até mais satisfatórios do que as
disciplinas de cunho pedagógico nos cursos de pós-graduação, pois ocorre uma
particularização do atendimento, estudo e discussão das situações concretas e reais
do ensino (BERBEL, 1994).
2.4 PÓS-GRADUAÇÃO NO BRASIL
O Parecer 977 de 1965 do Conselho Federal de Educação estabeleceu a
estrutura do sistema nacional de pós-graduação com as seguintes características
para os cursos stricto sensu:
é de natureza acadêmica e de pesquisa e mesmo atuando em setores profissionais tem objetivo essencialmente científico, enquanto a especialização, via de regra, tem sentido eminentemente prático-profissional; confere grau acadêmico e a especialização concede certificado (BRASIL, 1965, p. 166).
A seguir são apresentadas as características dos cursos de pós-graduação
stricto sensu, conforme Neves (2002, p. 49):
Mestrado: mesmo tomado como etapa preliminar para obtenção do grau de doutor (embora não seja condição indispensável à inscrição no curso de doutorado), constitui grau terminal, com duração mínima de um ano, exigência de dissertação em determinada área de concentração na qual revele domínio do tema e capacidade de concentração, conferindo o
diploma de Mestre. Mestrado profissional: dirige-se à formação profissional,
da área e os fins do curso. Doutorado: constitui-se no segundo nível de formação pós-graduada, tendo por fim proporcionar formação científica ou cultural, ampla e aprofundada. Desenvolve a capacidade de pesquisa, com duração mínima de dois anos, exigência de defesa de tese, em determinada área de concentração, que contenha trabalho de pesquisa, com real contribuição para o conhecimento do tema, conferindo o diploma de Doutor.
É importante ressaltar que, de acordo com o Plano Nacional de
Pós-Graduação 2005-2010:
entre 1976 e 2004, o número de cursos recomendados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) saltou de 673 para 2.993, o que representou um aumento de 5,6% ao ano. Destaca-se o crescimento do doutorado, que praticamente duplicou no período de 1996 a 2004. O segmento público é responsável por 82% da oferta dos cursos de mestrado e por 90% dos cursos de doutorado. Por sua vez, o segmento privado cresceu de forma expressiva na pós-graduação, passando de 87 cursos para 346 no mestrado e de 44 para 96 no doutorado, no período de 1996 a 2004. O número de alunos matriculados também conheceu um aumento expressivo, uma vez que passou de 37.195 em 1987 para 112.314 em 2003, representando um crescimento de 300% no período. O crescimento foi expressivo e constante, nos últimos treze anos, tanto no mestrado quanto no doutorado. O número de titulados no mestrado aumentou em 757% e o de doutorado em aproximadamente 932%, no período de 1987 a 2003 (BRASIL, 2004, p. 27-30).
No Brasil, há atualmente 3.840 cursos de pós-graduação divididos em 2.309
de mestrado, 1.302 de doutorado e 229 de mestrado profissional (BRASIL, 2007a).
De acordo com os dados do INEP, no Brasil 57.681 docentes atuam na área de
saúde e bem estar, sendo 15.609 doutores, 20.287 mestres, 17.469 especialistas,
4.309 graduados e 7 de notório saber (BRASIL, 2007b).
O objetivo da qualificação docente consiste na melhora da qualidade e
eficiência do sistema. De acordo com o Soares (2002a), na última década, houve um
esforço por parte das instituições de educação superior buscando a titulação de
seus professores, conforme apresentado anteriormente. No entanto, o que se
percebe é que muito ainda se deve avançar.
2.4.1 Destino dos mestres e doutores no Brasil
De acordo com Velloso (2004), há pouco mais de 20 anos, o principal destino
de mestres e doutores no país era a universidade. No entanto, pesquisa realizada
é diferente. A proporção de mestres que atuam na academia está em torno de
apenas 30%. Aparentemente, os mestrados em todas as áreas vêm
desempenhando o papel de atrair para a academia graduados antes inseridos
profissionalmente nos mais diversos setores econômicos. Ingressam no doutorado
50% dos mestres titulados nas áreas básicas, 36% dos titulados como mestre nas
áreas tecnológicas e 30% dos titulados nas áreas profissionais. E, diferentemente do
que ocorre entre os mestres, constata-se entre os doutores forte predomínio das
atividades acadêmicas. No conjunto dessas áreas, cerca de 75% dos doutores
trabalham em universidades e instituições de pesquisa.
O Plano Nacional de Pós-Graduação 2005-2010, a partir desses dados,
identifica alguns desafios, entre eles a flexibilização do modelo de pós-graduação, a
fim de permitir o crescimento do sistema. Ainda de acordo com o plano, o sistema
deve ter quatro vertentes: a capacitação do corpo docente para as instituições de
educação superior, a qualificação dos professores para a educação básica, a
especialização de profissionais para o mercado de trabalho público e privado e a
formação de técnicos e pesquisadores para empresas públicas e particulares
(BRASIL, 2004).
Para Velloso (2004), a diversificação do modelo de formação permite duas
interpretações: a ampliação da modalidade profissional, para atender à demanda de
profissionais que não pertecem à academia, ou o oferecimento ampliado de opções
nos programas com vocação acadêmica.
De acordo com o plano, os objetivos da pós-graduação nos próximos anos
são o fortalecimento das bases científica, tecnológica e de inovação, a formação de
docentes para todos os níveis de ensino e a formação de quadros para mercados
não acadêmicos (BRASIL, 2004).
2.5 FORMAÇÃO DE PROFESSORES
A diversidade de seus alunos tem sido uma característica marcante da
raça, classe social ou religião, mas também na presença de indivíduos com idade
superior à média tradicional, portadores de necessidades especiais ou pessoas com
orientação homossexual assumida. E é provável que um grande número de
professores não esteja preparado para lidar com essa diversidade, necessitando de
uma revisão em seus valores e mudança nas atitudes em relação a determinadas
situações (GIL, 2007). Conforme Tardif (2002), os saberes que servem como base
para o ensino não estão limitados a conteúdos bem circunscritos que precisam de
uma formação especializada. Abrangem, na verdade, uma grande variedade de
objetos, de questões, de problemas, que não correspondem ou pouco correspondem
ao que foi aprendido como conhecimento necessário para ensinar.
Assim sendo, o professor universitário deve ter competência para solucionar
eficazmente situações ligadas a contextos culturais, profissionais e condições
sociais. Gil (2007) lista algumas características importantes para esse profissional:
ter os conhecimentos técnicos e visão de futuro; perceber-se como mediador do
processo de aprendizagem, organizando e dirigindo as situações de aprendizado;
ser transformador, multicultural, intelectual, reflexivo, capaz de trabalhar em equipe,
aberto para o que se passa na sociedade, capaz de enfrentar os deveres e dilemas
éticos e capaz de gerar sua própria formação contínua.
Masseto (2003) também identifica competências consideradas como básicas
para que o professor possa atuar na educação superior: competência em
determinada área do conhecimento e domínio na área pedagógica. A competência
compreende os conhecimentos básicos em determinada área, bem como a
experiência profissional prática. Esses conhecimentos podem ser atualizados por
intermédio da participação em eventos científicos, tais como simpósios, congressos,
cursos de aperfeiçoamento e especialização. Convém observar, no entanto,
conforme Nóvoa (1992), que a formação do docente não deve ser construída
apenas por acumulação de cursos, de conhecimentos ou de técnicas, mas, através
de um trabalho de reflexão crítica sobre as práticas e de reconstrução constante da
identidade. Freire (1996, p. 22) afirma que essa reflexão é exigência da relação
entre teoria e prática, caso contrário a teoria vira “blablablá e a prática, ativismo”. A
formação deve oferecer meios para que o professor possa ter pensamento
professor perceba que a formação é um investimento pessoal que visa à construção
de sua identidade profissional (NÓVOA, 1992).
Outro aspecto importante da formação dos docentes diz respeito à sua
atividade como pesquisador. Pesquisar e refletir sobre suas ações docentes pode
promover mudanças em sua forma de agir, e pesquisar sobre o ensino também
pode levá-lo a ampliar sua consciência (PIMENTA, 1997).
Essa pesquisa sobre a sua atuação segue a abordagem denominada
“professor reflexivo”, ou seja, ele deve constantemente rever suas ações. A prática
da reflexão sustenta o progresso e é também sua conseqüência. E por essa ação
recíproca a reflexão constitui o fundo, o final e o investimento de toda formação. A
reflexão sobre o trabalho pelo docente implica uma reflexão sobre ele próprio, e
talvez seja também a grande barreira, representa um engajamento crítico e uma
auto-avaliação. Tais reflexões são passíveis de suscitar remanejos, além da
renúncia a imagens, valores, crenças e convicções (PAQUAY et al., 2001). Essa
tendência de reflexão apresenta-se como um novo paradigma na formação dos
docentes, sedimentado em uma política de preparo pessoal e profissional (NUNES,
2001).
Pimenta (1997, p. 23) fala em “reflexão sobre a reflexão na ação”, pois esse
procedimento promove o alargarmento da consciência. Conforme a autora, essa
reflexão leva a uma elaboração teórica de saberes por parte do professor,
possibilitando a criação de novos hábitos e de uma cultura renovada.
Cabe ressaltar que os professores da educação superior devem estar
preparados e comprometidos para também formar pessoas com autonomia
intelectual, apaixonados pela busca do saber e cujas atitudes tenham reflexos
sociais positivos (SILVA; ALENCAR, 2003). O professor precisa ter tolerância para
lidar com toda a diversidade apresentada no ensino superior, percebendo o outro
como pessoa e estimulando-o a construir seus próprios projetos pessoais,
semeando valores que lhe darão sustentação (MACHADO, 2000). É também
importante que o docente perceba que o conhecimento irá emergir mais facilmente
para o aluno quando houver algum tipo de relação com o prazer. Os resultados
positivos para a educação serão alcançados quando estiver presente a preocupação
de novos conhecimentos e a habilidade para acessar fontes inovadoras de
informação a respeito dos diversos assuntos (ASSMANN, 1998). Assim sendo, para
que se possa entender a educação, a melhoria pedagógica e o compromisso do
docente devem caminhar juntos.
No entanto, é no domínio da área pedagógica que se situa, no mais das
vezes, a maior deficiência dos docentes da educação superior. O professor ou
nunca teve oportunidade de entrar em contato com essa área, ou a vê como
desnecessária para sua atividade de ensino (MASETTO, 2003).
Dessa forma, é importante que os cursos que preparam professores se
caracterizem por serem geradores de profissionais excelentes, aptos a
desempenhar com sucesso o seu papel de construtores da cidadania (SOUZA;
ALENCAR, 2006).
De acordo com Cornu e Vergnioux (1992), citados por Pimenta (1997, p.
56-57), “a partir do momento em que iniciam as preocupações com a formação dos
professores, a didática passa a ocupar importante lugar nas discussões”.
2.5.1 Didática
Ressalte-se que a pedagogia é a ciência que tem por objetivo a reflexão,
organização e o estudo sistemático do processo educativo. E a didática é um ramo
da pedagogia. Enquanto a primeira pode ser entendida como a ciência da educação,
entende-se a segunda como a ciência do ensino.
Quando se fala em formação de professores, a didática é assunto sempre
presente, pois se costuma afirmar que muitos docentes não têm didática para
ensinar. Mas, afinal, o que vem a ser a didática?
A didática é uma disciplina que cuida do estudo do processo de ensino,
dentro do qual os objetivos, conteúdos, métodos e formas de organização da aula se
relacionam entre si e criam condições para se garantir uma aprendizagem
significativa. A didática ajuda o docente na direção e orientação das tarefas do
sociopolíticos, de forma que o ensino seja articulado para preparar o aluno para a
vida social (LIBÂNEO, 2002).
O papel do professor, conforme Libâneo (2002, p. 6), é “planejar, selecionar e
organizar os conteúdos, programar as tarefas, criar condições de estudo dentro da
classe, incentivar os alunos”. Ou seja, o professor dirige as atividades de forma que
os alunos se tornem os sujeitos ativos do processo de aprendizagem. Assim,
professor e alunos desempenham atividades direcionadas por aquele, de forma que
estes assimilem ativamente os conteúdos e desenvolvam suas habilidades
intelectuais.
Entendendo-se o termo de modo flexível, a didática pode ser compreendida
como uma “atitude teórica e prática de abordagem das questões do ensinar ou do
aprender”. De modo geral a didática está mais voltada para as situações de
ensino-aprendizagem (PIMENTA, 1997, p. 56-57).
Diante do exposto, a compreensão da didática se faz premente no processo
de formação do docente. No entanto, o que se percebe é que o ensino da didática
ainda tem caráter altamente mecanicista. Conforme Rays (2002), no ensino da
didática tanto a dimensão técnica quanto a política devem ser trabalhadas dentro de
um mesmo contexto, para que esse ensino venha a ser mais significativo e assuma
seu real papel nas escolas.
2.6 PRÁTICA PEDAGÓGICA
Deve ser tarefa do docente da educação superior reforçar a curiosidade e a
capacidade crítica do educando e, principalmente, ensiná-lo a pensar. Nesse
sentido, o professor não pode ser um mero transmissor de informações, repetidor de
frases e idéias. O entendimento de algo não é transferido, e sim, co-participado. É
importante que o professor estimule a participação dos alunos por meio de
perguntas, refletindo a partir de um dado tema, e que a relação entre professor e
aluno se torne dialógica. Ou seja, não é o caso de se ter apenas o professor
aberta em que a aula se torne desafiadora e não cansativa. Assim, o bom professor
consegue “enquanto fala, trazer o aluno até a intimidade do movimento de seu
pensamento” (FREIRE, 1996, p. 86). É estratégico que a aprendizagem ativa seja
ressaltada em detrimento da aprendizagem receptiva, e dessa forma se possa
ultrapassar a mera “aquisição do conteúdo prescrito”. Mas um grande problema
nisso é que os professores foram muitas vezes formados em ambientes passivos,
onde, como regra, se pratica a aprendizagem receptiva (DEMO, 2000).
Mager (1979) afirma que, se o aluno não estiver influenciado para tornar-se
diferente do que era antes da aprendizagem que será empreendida, nenhum
objetivo será alcançado. Ainda conforme o mesmo autor, o mais importante no
processo não é o que o docente tem que ensinar, mas que o aluno sinta o desejo de
fazer uso daquilo que lhe foi ensinado. Para isso, o docente deve fazer o possível
para que, ao final da ação educativa, o aluno tenha mais sentimentos favoráveis do
que desfavoráveis sobre aquilo que foi ensinado.
Nesse sentido, Assmann (1998) afirma que não se pode comparar o ato de
ensinar com a prática de uma transfusão de sangue, em que esse entra no
organismo do indivíduo e há o sistema circulatório que se encarrega de utilizá-lo da
melhor maneira possível. Dificilmente o conteúdo que um professor tenta transferir a
um aluno será aproveitado pelo sistema neuronal se não houver uma aprendizagem.
Quem ensina deve mostrar as pistas para que se chegue ao aprendizado, mas não
deve dar todas as informações prontas. É importante que o complexo sistema
neuronal seja ativado ao máximo.
Tem-se observado na educação um descompasso com o avanço
paradigmático que a sociedade apresenta. Conforme citado anteriormente, os
professores da educação superior tendem a repetir os modelos que tiveram em sua
formação, muitas vezes sem refletir se é o melhor modelo a ser utilizado. Assim, se
observarmos como as aulas se processam nesse nível de ensino, pode-se perceber
modelos engessados de exposição da matéria, de acordo com os quais deve haver
uma memorização do conteúdo transmitido. Dessa forma, os alunos não são
estimulados a desenvolver sua capacidade de criar, construir e reconstruir