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A proibição da eutanásia no Brasil: Uma análise sob o prisma do direito à vida e do conceito de vida

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Academic year: 2021

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UFF – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE DIREITO

JULIANA DE OLIVEIRA COUTINHO

A PROIBIÇÃO DA EUTANÁSIA NO BRASIL: UMA ANÁLISE SOB O PRISMA DO DIREITO À VIDA E DO CONCEITO DE VIDA

NITERÓI 2013

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UFF – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

JULIANA DE OLIVEIRA COUTINHO

A PROIBIÇÃO DA EUTANÁSIA NO BRASIL: UMA ANÁLISE SOB O PRISMA DO DIREITO À VIDA E DO CONCEITO DE VIDA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

ORIENTADOR: Prof. Manoel Martins Júnior

NITERÓI 2013

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JULIANA DE OLIVEIRA COUTINHO

A PROIBIÇÃO DA EUTANÁSIA NO BRASIL: UMA ANÁLISE SOB O PRISMA DO DIREITO À VIDA E DO CONCEITO DE VIDA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Aprovada em janeiro de 2013.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Manoel Martins Júnior – Orientador UFF – Universidade Federal Fluminense

Prof. Cláudio Brandão de Oliveira UFF – Universidade Federal Fluminense

Prof. Índio do Brasil Cardoso UFF – Universidade Federal Fluminense

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Dedico este trabalho aos meus amados pais, como forma de reconhecimento por todo esforço para que a minha educação fosse de qualidade.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, por tudo. Sem Ele não estaria aqui, e sem a Sua interseção, não teria ingressado nesta faculdade;

Aos meus pais, pelo amor e apoio incondicionais; e Ao meu orientador, pela condução deste trabalho.

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“A capacidade de raciocinar é um tipo especial de capacidade, pois pode nos levar a lugares que não se esperava ir.” (Peter Singer)

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RESUMO

Este trabalho propõe a reflexão acerca da proibição da eutanásia no Brasil, tema relevante que ao longo da História divide opiniões entre aqueles que a defendem e aqueles que a repudiam categoricamente. A eutanásia, permitida por lei em outros países, no Brasil, República Federativa que tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana e que consagra em sua Carta Política os direitos à vida e à liberdade, é tipificada como homicídio. Assim sendo, justificou-se a importância de tal análise.

Palavras-chave: Eutanásia, compaixão, vida, dignidade, liberdade, crime, homicídio, morte, direito

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ABSTRACT

This work proposes a reflection about the prohibition of euthanasia in Brazil through an analysis of the concept of life and the rights to life, to liberty and to dignity - all assured to the brazilian people by the Constitution.

Keywords: euthanasia, life, suffering, compassion, dignity, liberty, crime, homicide, death, right

(9)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

2 ETIMOLOGIA ... 12

3 ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICAS DA EUTANÁSIA ... 12

3.1 IDADE ANTIGA ... 12 3.2 IDADE MÉDIA ... 14 3.3 IDADE MODERNA ... 14 3.4 IDADE CONTEMPORÂNEA ... 14 4 CONCEITOS PERTINENTES ... 15 4.1 EUTANÁSIA ... 15

4.1.1 QUANTO AO TIPO DE AÇÃO ... 16

4.1.1.1 EUTANÁSIA ATIVA ... 16

4.1.1.2 EUTANÁSIA PASSIVA ... 16

4.1.1.3 EUTANÁSIA DE DUPLO EFEITO ... 16

4.1.2 QUANTO AO CONSENTIMENTO DO PACIENTE ... 17

4.1.2.1 EUTANÁSIA VOLUNTÁRIA ... 17

4.1.2.2 EUTANÁSIA INVOLUNTÁRIA ... 17

4.1.2.3 EUTANÁSIA NÃO VOLUNTÁRIA ... 17

4.2 ORTOTANÁSIA ... 17

4.2.1 RESOLUÇÃO N. 1.805/2006 DO CFM ... 17

4.3 DISTANÁSIA ... 18

4.4 MISTANÁSIA ... 18

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4.5.1 INÍCIO DA VIDA ... 19

4.5.1.1 TEORIA CONCEPCIONISTA ... 19

4.5.1.2 TEORIA DA NIDAÇÃO ... 20

4.5.1.3 TEORIA DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL ... 20

4.5.1.4 TEORIA DA PESSOA HUMANA TOUT COURT ... 20

4.5.1.5 TEORIA NATALISTA ... 20

4.5.2 FIM DA VIDA ... 20

4.6 BIOÉTICA E BIODIREITO ... 21

5 PAÍSES QUE PERMITEM A EUTANÁSIA ... 21

5.1 CASOS FAMOSOS ... 22

6 EUTANÁSIA NO BRASIL: CRIME ... 23

6.1. HOMICÍDIO ... 23 6.2 SUICÍDIO ASSISTIDO ... 24 7 PROJETO DE LEI 125/1996 ... 24 8 DIREITOS FUNDAMENTAIS ... 24 8.1 DIREITO À VIDA ... 24 8.2 DIREITO À LIBERDADE ... 25 8.2.1 AUTONOMIA ... 25 8.3 DIREITO À DIGNIDADE ... 25 9 ARGUMENTOS ... 25 9.1 PRÓ ... 26 9.2 CONTRA ... 26 10 CONCLUSÃO ... 27 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 29

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11 1. INTRODUÇÃO

O presente estudo, com foco no direito constitucional, tem o escopo geral de incutir no interlocutor a reflexão acerca da eutanásia, tema bastante controverso, através da ótica da bioética e do biodireito, com o objetivo final de analisar a proibição da eutanásia no Brasil (direito à vida) versus o direito à liberdade e à dignidade.

A palavra “eutanásia” deriva da expressão grega euthanatos, o que em termos gerais significa boa morte, tendo sido utilizada pela primeira vez no século XVII pelo filósofo inglês Francis Bacon na sua obra “Historia vitae et mortis”, ao prescreve-la como tratamento mais adequado aos enfermos incuráveis que padeciam de exacerbado sofrimento.

Contudo, o marco inicial da prática da eutanásia a que se tem registro remonta à Idade Antiga, na Grécia. Platão era um de seus defensores. Porém, tratava-se de uma falsa eutanásia, haja vista que o objetivo era puramente eugênico, isto é, visava somente o aperfeiçoamento racial.

Ao longo das Idades Média e Moderna, a prática da eutanásia seguiu acontecendo, porém com menos registros e mais proximidade com a sua definição literal. Na Idade Média, por exemplo, soldados utilizavam um punhal denominado “misericórdia” para pôr fim à agonia dos gravemente feridos na guerra, como forma de compaixão.

Hoje, Idade Contemporânea, não raramente há nos noticiários registros da prática da eutanásia em países que a permitem e, também, nos países em que é considerada crime, como no Brasil, sendo fato que em ambos os casos, há uma forte repercussão social, e as respectivas populações e as populações expectadoras retomam o debate deste assunto-tabu.

Isto porque envolve questões éticas, religiosas e jurídicas, dentre outras, que não conseguem ser superadas. De um lado, os contrários à prática defendem a sacralidade da vida etc.; de outro lado, os favoráveis argumentam pela autonomia (liberdade) e qualidade de vida (vida digna).

O ordenamento jurídico brasileiro não permite a eutanásia, que configura crime de homicídio doloso, previsto no art. do CP, com base no direito à vida. Entretanto, o mesmo ordenamento prevê, no Texto Maior, os direitos à liberdade e à dignidade, sendo esta, inclusive, fundamento da República Federativa do Brasil.

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12 A partir do exposto nesta introdução e de uma breve exposição histórica da prática da eutanásia que se segue, bem como dos conceitos mais pertinentes à matéria, da legislação pátria e comparada e de casos famosos, este trabalho busca cumprir os objetivos propostos acima.

2. ETIMOLOGIA

Etimologicamente, a palavra “eutanásia” tem origem grega, pois deriva da expressão euthanatos, onde EU significa bom ou boa e THANATOS traduz morte.

Todavia, o conceito foi inicialmente utilizado, de forma a corresponder de fato com o seu significado, por Francis Bacon no século XVII, filósofo inglês considerado o fundador da ciência moderna, ao prescrever em sua obra Historia vitae et mortis, como tratamento mais adequado para os enfermos acometidos por doenças incuráveis que se encontravam atormentados em estado de sofrimento contínuo.

Para Bacon, “o médico deve acalmar os sofrimentos e as dores não apenas quando este alívio possa trazer cura, mas também quando pode servir para procurar uma morte doce e tranquila”, e deveria “possuir a habilidade necessária a dulcificar com suas mãos os sofrimentos e a agonia da morte”.

3. ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICAS DA EUTANÁSIA

A prática da eutanásia não é recente, tendo seus primeiros registros na Grécia Antiga, tendo perpetuado-se ao longo dos anos, até os dias atuais.

3.1 IDADE ANTIGA

Admitida através dos costumes, os registros iniciais da prática da eutanásia datam da Grécia Antiga. Entretanto, em verdade, se tratava de uma falsa eutanásia, tendo em vista que o seu propósito era puramente eugênico, ou seja, finalidade de aperfeiçoamento racial, e sem a preocupação de produzir uma morte tranquila.

Prova histórica deste fato encontra-se no 3º livro de “A República”, diálogo Socrático escrito por Platão, onde este pregava o sacrifício de velhos, fracos e inválidos, sob a justificativa do fortalecimento do bem-estar e da economia coletiva. Em Atenas, por volta de 400 a.C., em seus discursos, Platão preocupava-se com a seleção dos melhores homens e mulheres e aconselhava aos magistrados que promovessem o enlace entre eles para que gerassem espécies aperfeiçoadas.

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13 Ainda em Atenas, o Senado tinha poderes absolutos para decidir sobre a eliminação dos idosos e dos incuráveis, que em cerimônias especiais eram envenenados através de uma bebida chamada conium maculatum.

Há referências textuais em Xenofonte e Plutarco (“Vidas Paralelas”), historiadores gregos, de que em Esparta, sociedade guerreira por excelência, a fim de evitar cargas inúteis, era prática comum, e até mesmo obrigatória, que nascituros malformados ou fora dos padrões da cidade fossem mortos, sendo atirados do alto do Monte Taigeto ou lá abandonados.

O professor de cultura grega Paul Cartledge da Universidade de Cambridge, afirma que “o infanticídio era prática comum na Grécia Antiga, mas Esparta era a única a praticá-lo colocando a decisão nas mãos do Estado, e não nas dos pais”, sendo a palavra final do conselho dos anciãos: “eles é que decidiam se a criança estava apta a continuar viva ou teria de ser morta”.

Ainda entre os povos antigos, na Birmânia, os velhos eram enterrados vivos, assim como os enfermos incuráveis. Já na Índia, estes eram levados até a beira do rio Ganges, onde, após terem as suas narinas e a boca obstruídas com barro, espécie de lama sagrada, eram arremessados para morrerem. Os celtas, em sua maioria indivíduos altos e fortes, eliminavam as crianças deformadas e os velhos, pois consideravam-nos desnecessários à sociedade já que não contribuíam para o enriquecimento da nação. Em Roma, pais eram ordenados a matar os próprios filhos no caso de nascerem disformes, pois o Estado tinha o direito de não permitir cidadãos “monstruosos”. Lá, também era comum que deficientes mentais fossem jogados ao mar.

Porém, na mesma Roma e no Egito, começam a aparecer sinais da prática de uma eutanásia mais piedosa. Isto porque no Egito, Cleópatra criou uma “Academia” para estudar formas de morte menos dolorosas. E em Roma, depois do combate no circo romano, o imperador Júlio Cesar decretou que os gladiadores gravemente feridos fossem mortos se os césares voltassem o polegar para baixo (pollice verso - forma de autorização à morte), a fim de não prolongar a agonia, o que demonstra compaixão, equivalendo, para Giuseppe Del Vecchio, à verdadeira eutanásia.

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14 3.2 IDADE MÉDIA

As informações sobre a prática da eutanásia na Idade Média são escassas, mas sabe-se que durante as guerras, soldados usavam um punhal pequeno e afiado denominado “misericórdia”, com o qual livravam do sofrimento atroz e do ultraje os feridos de morte, demonstrando, também, compaixão; e que populações norte-americanas, que eram nômades devido à fatores ambientais, sacrificavam enfermos e anciãos para não os abandonar ao ataque de animais selvagens, uma vez que não poderiam mais acompanhar os demais.

Sabe-se também que praticava-se a eutanásia em contaminados pelas inúmeras epidemias e pestes, que se alastravam com muita facilidade devido ao grande estado de miséria em que se encontrava a população durante o período de decadência do feudalismo.

3.3 IDADE MODERNA

Nesta era histórica, convém mencionar o pedido feito por Napoleão Bonaparte, na campanha do Egito, ao cirurgião Degenettes, para que matasse com ópio os soldados infectados pela peste, tendo o mesmo se recusado sob o argumento de que a função do médico não era matar, e sim curar. A história, no entanto, ensina que o objetivo de Napoleão era de poupar os moribundos de serem capturados pelos turcos.

3.4 CONTEMPORÂNEA

Na era contemporânea, muitos são os registros da prática da eutanásia, bem como há muitos estudos, artigos, discussão doutrinária, teses etc. a respeito do tema.

Na então Prússia, em 1.859, houve a discussão do Plano Nacional de Saúde, onde foi proposto que o Estado deveria prover os meios para a realização da “boa morte” em pessoas que se tornaram incompetentes para solicitá-las.

Em 1.884, Enrique Ferri, criminologista italiano, imprimiu um trabalho sugestivo, publicado no Arquivo de Lombroso, intitulado “L’omicidio-suicidio”, em que aborda a responsabilidade jurídica daquele que dá a morte a alguém com o seu consentimento. No Brasil, inúmeras teses foram desenvolvidas entre 1.914 e 1.935 na Faculdade de Medicina da Bahia, e também nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo.

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15 Em 1.931, na Inglaterra, o Dr. Millard propôs uma lei para legalização da eutanásia voluntária, que foi discutida até 1.936, quando a Câmara dos Lordes a rejeitou. Esta proposta serviu, posteriormente, de base para o modelo holandês (a Holanda permite a prática da eutanásia).

O Uruguai, em 1.934, incluiu a possibilidade da eutanásia no seu Código Penal, através da possibilidade do “homicídio piedoso”, em vigor até hoje. A doutrina do Prof. Luiz Jimenez de Asúa, penalista espanhol, serviu de base para a legislação uruguaia.

Durante a segunda guerra mundial, em 1.939, a Alemanha Nazista implantou através de Adolf Hitler, a “Aktion T 4”, programa de eliminação de recém-nascidos e crianças de até três anos com retardo mental, deformidades físicas e outras condições limitantes, sendo dever dos médicos e parteiras notificar a autoridade sanitária para verificação de tais casos, que eram examinados por uma junta médica de três profissionais, procedendo-se à eliminação quando houvesse unanimidade. Este tipo de eutanásia trata-se do mesmo tipo registrado na Idade Antiga, ou trata-seja, falso, primitivo, eugênico: visava uma higienização social.

A Igreja Católica, em 1.956, posicionou-se contra à eutanásia por esta ser contrária à “lei de Deus”. No entanto, em 1.957, o Papa Pio XII, numa alocução a médicos, aceitou a possibilidade de que a vida possa ser encurtada como efeito secundário à utilização de drogas para diminuir o sofrimento de pacientes com dores insuportáveis. Esta possibilidade traduz a eutanásia de duplo efeito.

4. CONCEITOS PERTINENTES

A fim de evitar possíveis confusões e de proporcionar um melhor esclarecimento a respeito do tema proposto, se faz imperioso elucidar alguns conceitos pertinentes à matéria.

4.1 EUTANÁSIA

Como a etimologia sugere, eutanásia pode significar boa morte, morte fácil, morte doce, sem dor nem sofrimento, morte grata etc., e nas palavras de Ricardo Oxamendi, em seu livro “El Delito”, pode significar piedade homicida, homicídio caritativo, morte benéfica, direito de morrer, morte libertadora, suprema caridade, dentre outros.

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16 Nas palavras de Hubert Lepargneur, o conceito pode ser definido como “o emprego ou abstenção de procedimentos que permitem apressar ou provocar o óbito de um doente incurável, a fim de livrá-lo dos extremos sofrimentos que o assaltam”.

Para Luiz Jimenez de Asúa, renomado professor espanhol já mencionado anteriormente, a eutanásia é a “morte que alguém proporciona a uma pessoa que padece de uma enfermidade incurável ou muito penosa, e a que tende a extinguir a agonia demasiado cruel ou prolongada”.

Segundo o estudioso paraense Lameira Bittencourt:

A eutanásia é tão-somente a morte boa, piedosa e humanitária, que, por pena e compaixão, se proporciona a quem, doente e incurável, prefere mil vezes morrer, e logo, a viver garroteado pelo sofrimento, pela incerteza e pelo desespero.

Há ainda que se conceituar a eutanásia quanto às suas modalidades. 4.1.1 EUTANÁSIA QUANTO AO TIPO DE AÇÃO

Nestes casos, considera-se o modus operandi. 4.1.1.1 ATIVA

Trata-se do ato deliberado de provocar a morte sem sofrimento do paciente, por fins humanitários (ex.: aplicação de injeção letal)

4.1.1.2 PASSIVA

Na também chamada eutanásia indireta, a morte do doente ocorre por uma omissão proposital, isto é, não se inicia uma ação médica ou se interrompe uma medida extraordinária que garantiriam a continuação da sobrevida (ex.: não colocar ou retirar o paciente de um respirador)

4.1.1.3 DE DUPLO EFEITO

Este tipo ocorre nos casos em que a morte é acelerada como consequência de ações médicas que buscavam amenizar dores insuportáveis (ex.: emprego de morfina para controle dor, gerando, secundariamente, depressão respiratória e óbito)

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17 4.1.2 EUTANÁSIA QUANTO AO CONSENTIMENTO DO PACIENTE

4.1.2.1 VOLUNTÁRIA

Também chamada de libertadora, é praticada em resposta à vontade expressa do enfermo – o que para alguns seria sinônimo de suicídio assistido.

4.1.2.2 INVOLUNTÁRIA

Ocorre quando o ato é realizado contra a vontade do paciente – ou o equivalente à homicídio para os que a repudiam. Para Helga Kuhse, eutanásia involuntária se caracteriza como aquela “que se pratica a uma pessoa que havia sido capaz de outorgar ou não o consentimento à sua própria morte, mas não o fez, seja por não ter sido solicitado, seja por ter rechaçado a solicitação, devido ao desejo de seguir vivendo”. 4.1.2.3 NÃO VOLUNTÁRIA

A vida é abreviada sem que se tenha conhecimento da vontade do paciente. 4.2 ORTOTANÁSIA

Do grego orthos (normal, correta) + thanatos (morte), a ortotanásia, que não deve ser confundida com a eutanásia passiva, configura-se como a adoção de cuidados paliativos adequados aos pacientes nos momentos finais de suas vidas, sem o prolongamento artificial das mesmas.

4.2.1 RESOLUÇÃO 1.805/2006 DO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA

O Conselho Federal de Medicina aprovou a prática da ortotanásia através da Resolução n. 1.805/2006, em seu artigo 1º:

Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal.

Liminar que suspendia esta Resolução, proferida nos autos da Ação Civil Pública n. 2007.34.00.014809-3, em trâmite no TRF da 1ª Região, foi revogada e a ação foi

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18 julgada improcedente. Desta forma, após anos sem efetividade, a partir de 09/12/2010 esta Resolução pôde voltar a ser aplicada.

4.3 DISTANÁSIA

O termo distanásia foi inicialmente proposto por Morache em 1904 e, etimologicamente, contém a idéia de “dupla morte”, aquele que “morre duas vezes”. A distanásia consiste no emprego de todos os meios terapêuticos possíveis, inclusive os extraordinários e desproporcionais, no doente agonizante, já incapaz de resistir, e no curso natural do fim de sua vida, levando a um processo de morrer prolongado e com sofrimento físico e/ou psicológico.

Tais meios são empregados na expectativa duvidosa de prolongar-lhe a existência, sem a mínima certeza de sua eficácia, nem da reversibilidade do quadro. Portanto, distanásia é a morte lenta, ansiosa, e com muito sofrimento.

Alguns assumem-na como antônimo de eutanásia, o que seria correto dizer se levado em consideração somente o significado literal de ambas, e equivocado se o conteúdo moral estiver em tela, já que ambas são tidas como eticamente inadequadas pela maioria das pessoas.

4.4 MISTANÁSIA

Também chamada de eutanásia social, o termo mistanásia foi sugerido por Leonard Martin, com o intuito de denominar a morte miserável, fora e antes da hora. O autor afirmou o seguinte:

“Dentro da grande categoria de mistanásia, quero focalizar três situações: primeiro, a grande massa de doentes e deficientes que, por motivos políticos, sociais e econômicos, não chegam a ser pacientes, pois não conseguem ingressar efetivamente no sistema de atendimento médico; segundo, os doentes que conseguem ser pacientes para em seguida, se tornar vítimas de erro médico; e, terceiro, os pacientes que acabam sendo vítimas de má-prática por motivos econômicos, científicos ou sociopolíticos. A mistanásia é uma categoria que nos permite levar a sério o fenômeno da maldade humana.”

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19 4.5 VIDA

Na ADI 3.510, que tratava da análise do art. 5º da Lei n. 11.105/2005 (Lei de Biossegurança), o STF teve que enfrentar a definição do conceito de vida. O artigo em tela trata da permissão, para fins de pesquisa e terapia, da utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento.

Os argumentos do PGR eram no sentido de que a Lei de Biossegurança violava o direito à vida e a dignidade da pessoa humana, partindo da ideia de que a vida humana começa a partir da fecundação (Teoria Concepcionista).

Após mais de 3 (três) anos, em 29/05/2008 o STF entendeu que as pesquisas com célula-tronco embrionária, nos termos da lei, não violam o direito à vida. Isto porque, segundo o Ministro Relator Carlos Ayres Britto, que foi seguido por outros 5 (cinco) Ministros, a vida humana começaria com o surgimento do cérebro que, por sua vez, só apareceria depois de introduzido o embrião no útero da mulher.

A constatação pelo STF de que a vida começa com a existência do cérebro, estaria estabelecida, também, no artigo 3º da Lei de Transplantes (Lei n. 9.434/1.997), que estabelece a possibilidade de transplante depois da morte desde que se constate a morte cerebral. Para esta lei, o fim da vida estaria ligado à morte cerebral, logo, o início da vida se caracteriza pelo início da atividade cerebral, o que corrobora o entendimento do STF.

Portanto, o conceito de vida pode ser entendido resumidamente como atividade cerebral.

Juridicamente, para o ordenamento jurídico brasileiro, a vida trata-se de bem indisponível.

4.5.1 INÍCIO DA VIDA

O início da vida, assim como a eutanásia, é um dos temas mais controversos entre as comunidades científica, filosófica e religiosa. Portanto, além da teoria adotada no Brasil, se faz importante expor as principais teorias sobre a matéria.

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20 De acordo com esta teoria, a fecundação do óvulo pelo espermatozoide, já é o suficiente para caracterizar o início da vida. O artigo 4, 1, do Pacto de San José da Costa Rica (Decreto n. 678/1992), prevê a tutela dos direitos desde a concepção. O artigo 2º do CC/ 2002 seguiu a mesma linha: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.”

4.5.1.2 TEORIA DA NIDAÇÃO

Após a fecundação, o zigoto inicia um lento deslocamento das trompas para o útero, onde precisa fixar-se para desenvolver-se. O processo de fixação chama-se nidação e ocorre entre 4 (quatro) e 15 (quinze) dias. Portanto, para esta teoria, o início da vida estaria ligado à efetiva nidação.

4.5.1.3 TEORIA DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL

Para o Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, vida, no sentido de existência em desenvolvimento de um indivíduo humano, começa, de acordo com reconhecidas descobertas biológico-fisiológicas, no décimo quarto dia depois da concepção, momento em que as células começam a formação da placa neural e de outros tecidos, passando o feto a ter capacidade neurológica de sentir dor e prazer.

4.5.1.4 TEORIA DA PESSOA HUMANA TOUT COURT

Para esta teoria, a transição da “pessoa humana em potencial” para a pessoa humana com capacidade de existir fora do útero, que ocorre entre a 24ª e a 26ª semana de gestação, configura o início da vida.

4.5.1.5 TEORIA NATALISTA

Segundo a teoria natalista, o início da vida se dá a partir do nascimento – com vida. 4.5.2 FIM DA VIDA

Até pouco tempo atrás, o conceito de morte era compreendido como a paralisação da função cardíaca e respiratória. Hoje, o critério diagnóstico de morte é a paralisação das funções cerebrais.

Para os médicos neurologistas, a revisão do conceito tornou-se imperiosa devido à capacidade da medicina moderna em prolongar indefinidamente uma vida por meios artificiais.

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21 Segundo a Declaração de Sidney, publicada quando da 22ª Assembleia Médica Mundial em Sidney, na Austrália em 1.968, e emendada pela 35ª Assembleia Médica Mundial em Veneza, Itália, em 1.983, o momento da morte, na maioria dos países, é de responsabilidade do médico, que poderá determiná-lo utilizando critérios clássicos conhecidos por estes profissionais, mediante a constatação da cessação definitiva das funções espontâneas cardíacas e respiratórias, bem como a cessação irreversível de toda a função cerebral.

Como dito anteriormente, este também é o entendimento da Lei de Transplantes brasileira.

4.6 BIOÉTICA E BIODIREITO

A Bioética é o estudo relacionado à biologia, medicina e ética, o qual busca investigar todas as condições necessárias para uma administração responsável do profissional de saúde em relação à vida humana em geral, como as esferas da autoridade do paciente e do médico, os limites das intervenções e experiências aceitáveis. Esta disciplina está intimamente ligada ao biodireito.

Biodireito é o ramo do direito que trata da teoria, da legislação e da jurisprudência relativa às normas reguladoras da conduta humana em face aos avanços da medicina e da biotecnologia. Seu principal objetivo é o de garantir a proteção da dignidade da pessoa humana, fazendo uso sempre do princípio da razoabilidade. Os pilares desta disciplina jurídica encontram-se em três áreas específicas: direito civil, direito penal e, principalmente, direito constitucional.

5. PAÍSES QUE PERMITEM A EUTANÁSIA

A Europa foi o continente que mais avançou na discussão acerca da eutanásia, tendo em vista que 8 (oito) países legalizaram a sua prática ou ao menos toleram. São eles a Holanda, a Bélgica, Luxemburgo, Suécia, Suíça, Alemanha, Áustria e França.

O primeiro deles a legalizar a eutanásia, que inclusive foi o primeiro país do mundo a fazê-lo, foi a Holanda, que o fez no dia 01/04/2002. Meses depois, em setembro do mesmo ano, a Bélgica também legalizou a prática da “boa morte”.

No entanto, apesar da Holanda ser o primeiro país a legaliza-la em 2002, desde 1.934 o Uruguai permite a sua prática, tendo em vista que o seu código penal não sanciona quem pratica o “homicídio piedoso”, desde que o faça após reiteradas súplicas do

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22 enfermo e conte com “antecedentes honráveis”. O país seguiu a doutrina do Prof. Luiz Jimenez de Asúa, penalista espanhol, como mencionado no item 3.4.

Em março de 2009, a prática foi legalizada em Luxemburgo. Na Suécia é autorizada a assistência médica ao suicídio.

Já na Suíça, a eutanásia não é permitida por lei, mas é tolerada: um médico pode administrar uma dose letal de medicamento no doente terminal que deseja morrer, devendo a manifestação de vontade partir do paciente.

Na Alemanha e na Áustria, a eutanásia passiva não é ilegal, desde que o paciente esteja de acordo.

Na França, o Conselho Nacional da Ordem dos Médicos anunciou em fevereiro de 2013 que um colégio médico deve permitir uma “sedação terminal” aos pacientes em fim de vida que tenham feito “pedidos persistentes, lúcidos e reiterados”.

Outro país que já se posicionou favorável à eutanásia foi Israel, legalizando-a em dezembro de 2.005 para doentes terminais, desde que sejam maiores de 17 (dezessete) anos e que possam expressar sua vontade.

Além destes países, há 3 (três) estados dos EUA que permitem a eutanásia: Washington, Oregon e Vermont.

5.1 CASOS FAMOSOS

O caso da americana Terri Schiavo teve repercussão global. Em 2005, após 15 (quinze anos) em estado vegetativo permanente, decorrente de uma parada respiratória que privou o seu cérebro de oxigênio, Terri teve a sonda que a alimentava desligada e, em 13 (treze) dias, faleceu. Os seus pais eram contra, porém, depois de 7 (sete) anos de batalha judicial, o marido, Michael, obteve a permissão para que a eutanásia fosse praticada na esposa. O caso aconteceu no Estado da Flórida e despertou comoção nacional.

Outro caso famoso foi o da italiana Eluana Englaro que em 2009, depois de 17 anos em coma, vítima de um acidente, também teve sua alimentação suspensa e faleceu dias depois. Os pais de Eluana conseguiram na justiça a autorização.

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23 Já o belga Nathan Verhelst, morreu por eutanásia aos 44 anos em novembro de 2013, após alegar transtornos físicos e psicológicos "insuportáveis" depois de realizar um procedimento cirúrgico para mudança de sexo.

O jovem Vincent Humbert, de 20 anos, sofreu um grave acidente de automóvel em 2000, do qual resultou um coma que durou nove meses. De seguido foi-lhe diagnosticado que se encontrava tetraplégico, cego e surdo, sendo o único movimento corporal o seu polegar direito, com o qual se comunicava. Deste modo, solicitava aos médicos a prática da eutanásia. Com a negativa, Vincent pede ajuda à mãe para o matar, com o auxílio do médico, o que ocasiona a prisão de sua mãe. O jovem escreve um livro com o seu polegar, de 188 páginas, intitulado “Eu peço-vos o direito de morrer”. Vale lembrar que na França é permitida uma “sedação terminal” aos pacientes em fim de vida, o que não era o caso de Vincent, apesar de todo o sofrimento do rapaz.

6. EUTANÁSIA NO BRASIL: CRIME

Hoje, não há na legislação brasileira expressa menção à eutanásia, nem mesmo no Código Penal, que data de 1.940. Sabe-se que um projeto de reforma da lei penal tramita no CN, e que o mesmo trata de alguns assuntos-tabu, como a descriminalização do usuário de drogas, porém, o legislador permaneceu inerte quanto à eutanásia.

Apesar da falta de previsão legal, de acordo a doutrina e a jurisprudência, a prática da eutanásia no Brasil é enquadrada nos artigos 121 e 122 do CP que, respectivamente, são tipos penais de homicídio e suicídio assistido.

6.1 HOMICÍDIO

A eutanásia pode configurar homicídio simples ou qualificado, a depender da conduta do agente.

De acordo com o §1º do art. 121 do CP, se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou seja, no caso da eutanásia praticada por compaixão e piedade, tratar-se-ia de homicídio simples, punível com pena de reclusão de 6 (seis) a 20 (vinte) anos, podendo o juiz reduzi-la de um sexto a um terço por haver uma atenuante.

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24 No entanto, se praticada por um dos motivos enumerados nos incisos do §2º do mesmo dispositivo legal, estaria se falando de homicídio qualificado, punível com pena de 12 (doze) a 30 (trinta) anos de reclusão.

6.2 SUICÍDIO ASSISTIDO

O suicídio assistido ocorre quando uma pessoa solicita o auxílio de outra para alcançar o óbito, caso não seja capaz de sozinha tornar fato sua disposição de morrer. Neste caso, o enfermo está, em princípio, sempre consciente – manifestando sua opção pela morte. A eutanásia no Brasil, também pode ser enquadrada no art. 122 do CP, que dispõe sobre o induzimento, a instigação e o auxílio ao suicídio (ou suicídio assistido) , com pena de reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos se o suicídio for consumado, e de 1 (um) a 3 (três) anos de reclusão se da tentativa de suicídio, resultar lesão corporal grave.

7. PROJETO DE LEI N. 125/1996

O Brasil já chegou a ter uma iniciativa parlamentar favorável à eutanásia, o projeto de lei n. 125/1996, cujo autor fora o senador Gilvam Borges, do PMDB. O projeto pretendia liberar a prática em algumas situações. No mesmo ano de sua propositura, foi submetido ao crivo do Congresso Nacional, mas não prosperou e três anos depois foi arquivado.

A título de curiosidade, no sentido contrário, o deputado Osmânio Pereira propôs a proibição clara da eutanásia no país, definindo-a, inclusive, como crime hediondo, porém a proposta também foi arquivada.

8 DIREITOS FUNDAMENTAIS 8.1 DIREITO À VIDA

A vida é um verdadeiro pressuposto dos demais direitos fundamentais, uma vez que todos os direitos fundamentais dependem de vida para poderem ser exercidos. Por isso, apesar de não haver hierarquia normativa, afinal todas estão no mesmo plano – da

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25 Constituição, axiologicamente é comum a vida ser colocada como o principal direito fundamental.

José Afonso da Silva, renomado constitucionalista, tece que “de nada adiantaria a constituição assegurar outros direitos fundamentais, como igualdade, a intimidade, a liberdade, o bem estar, se não erigisse a vida humana um desses direitos”.

O direito à vida, previsto de forma genérica no art. 5º, caput, da CRFB, abrange tanto o direito de não ser morto, privado de vida, portanto, o direito de continuar vivo, como também o direito de se ter uma vida digna quanto à subsistência, cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção.

A Carta Magna é taxativa quanto à inviolabilidade do direito à vida. 8.2 DIREITO À LIBERDADE

São diversas as vertentes de liberdade consagradas no art. 5º da Carta Magna, como a liberdade de pensamento, liberdade de profissão, liberdade de informação etc.

Na visão de Daniel Sarmento, esse direito possui uma concepção dualista: a liberdade como autonomia privada (liberdades individuais) e a liberdade como soberania popular. Como nos ensina Daniel Sarmento: “os particulares são titulares de uma esfera de liberdade juridicamente protegida, que deriva do reconhecimento de sua dignidade”. 8.2.1 AUTONOMIA

Para o Prof. Rodrigo Padilha, o princípio da legalidade genérica previsto no inciso II do art. 5º, qual seja, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (liberdade de ação e omissão),

“Consagra o princípio da autonomia privada em que o Estado não pode interferir na vida do ser humano a não ser nos aspectos essenciais para estabelecer a pacificação social, como normas contratuais, penais etc.”

8.3 DIREITO À DIGNIDADE

Prevista no art. 1º, III, da CRFB, a dignidade da pessoa humana é um dos cinco fundamentos da República Federativa do Brasil. Este fundamento é a base do art. 5º do

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26 Texto Maior, que dispõe sobre os direitos e garantias fundamentais. Ou seja, trata-se referência constitucional unificadora dos direitos fundamentais inerentes à espécie humana.

9. ARGUMENTOS

Tema de notória controvérsia, a eutanásia divide opiniões entre os que a defendem e os que a repudiam categoricamente. A seguir, passa-se a expor os principais argumentos de ambas as posições.

9.1 PRÓ

Dois são os principais pontos de apoio dos defensores da eutanásia: os princípios da qualidade de vida e da autonomia pessoal, que vão ao encontro dos direitos à dignidade e à liberdade consagrados pela Carta da República e já abordados neste trabalho.

9.2 CONTRA

Uma das mais contundentes objeções à eutanásia é o princípio da sacralidade da vida, que surgiu juntamente com o nascimento do judaísmo e do cristianismo. Segundo a premissa absoluta sacralidade, a vida consiste em um bem – concessão da divindade ou manifestação de um finalismo intrínseco da natureza –, possuindo assim um estatuto sagrado, isto é, incomensurável do ponto de vista de todos os “cálculos” que possam, eventualmente, ser feitos sobre ela, não podendo ser interrompida, nem mesmo por expressa vontade de seu detentor.

Uma outra leitura possível para o argumento da sacralidade é a de que a vida é sempre digna de ser vivida, ou seja, estar vivo é sempre um bem, independentemente das condições em que a existência se apresente.

Porém, para Ludwig Wittgenstein, surge uma questão: afirmar de maneira genérica e peremptória que a vida é algo bom em si mesmo, é extremamente perigoso, pois, afinal, a detecção de semelhanças não pressupõe a existência de gerais.

O argumento do slippery slope também é utilizado pelos contrários à eutanásia. Este argumento, traduzível em português como ladeira escorregadia, pretende justificar que

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27 não devem ser feitas “concessões” aparentemente inócuas em temas controversos, sob pena de se abrir precedente para atitudes de inequívoco malefício.

Oposições alicerçadas no argumento “escorregadio” incluiriam: (1) a potencial desconfiança – e subsequente desgaste – na relação médico-paciente; (2) a possibilidade de atos não inspirados em fins altruístas (por exemplo, questão de herança, pensões, seguros etc.); (3) a ocorrência de pressão psíquica (o pensamento pelo enfermo de que sua condição é um “estorvo” para os familiares, a título de exemplo), que poderia deixar os pacientes, cuja morte se aproxima, sem perspectiva outra que não a eutanásia; e (4) a erosão definitiva do respeito à vida humana, tomando-se como base o exemplo do nazismo.

Entretanto, análises minuciosas do argumento da “ladeira escorregaria” acabaram por demonstrar que o impedimento refere-se muito mais à inexorabilidade do fenecer do que, propriamente, ao fato de “deslizar” em direção a um mau uso da prática.

Outro argumento utilizado para rebater a eutanásia é o da Supremacia da Constituição, tendo em vista que o constituinte originário zelou pela inviolabilidade da vida, sendo a mesma um bem indisponível, ou seja, que não se pode abrir mão. No entanto, este argumento pode ser desconstruído através da definição dos conceitos de vida e fim da vida.

10. CONCLUSÃO

O escorço histórico apresentado nos indica que, na verdade, a eutanásia praticada na Idade Antiga, nos primórdios da civilização, era falsa, pois tinha como finalidade o aperfeiçoamento racial e a eliminação de “estorvos” e “cargas inúteis”, o que incluía idosos saudáveis e bebês com deficiências físicas, sem a menor preocupação com a forma de sacrificá-los, ou seja, em total desconformidade com o que a própria etimologia da palavra sugere: boa morte, sem dor ou sofrimento. Tratava-se, na verdade, de uma eugenia.

No entanto, ao longo dos anos, mais especificamente na transição da República para o Império Romano, sob o comando de Júlio César, sinais foram aparecendo de que a verdadeira eutanásia estava sendo praticada, isto é, alguém dando a outrem a morte por piedade e compaixão, a fim de livrar-lhes o sofrimento insuportável.

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28 Antes admitida pelos costumes, hoje, países como a Holanda e o Uruguai, dentre outros, permitem a eutanásia por lei. O Brasil, no entanto, segue proibindo-a, configurando a sua prática crime de homicídio, punível com pena de reclusão.

A República Federativa do Brasil traz na sua Carta Política, a dignidade da pessoa humana como um de seus fundamentos. Fundamento, este, princípio-matriz do art. 5º do referido diploma, que trata dos direitos fundamentais, dentre eles o direito à liberdade e à vida.

O direito à vida deve ser assegurado pelo Estado na sua dupla acepção: direito de permanecer vivo e direito de se ter uma vida digna quanto à subsistência. Baseado no entendimento do Pretório Excelso, o início da vida se dá com o surgimento do cérebro, o que pressupõe concomitante princípio de atividade cerebral; e o fim da vida, se dá com a ausência total das funções cerebrais, baseado na Lei de Transplantes brasileira, na opinião de neurologistas, e no próprio entendimento do STF sobre o começo da vida, utilizando-se a lógica inversa.

Tendo em mente essas informações, conclui-se por uma pequena contradição no ordenamento jurídico pátrio quanto à proibição da eutanásia, pois, os pacientes que tenham a sua morte cerebral atestada, deveriam ter permissão para a “boa morte”, já que com a intervenção de aparelhos, poderiam ter seus órgãos ativos por até uma semana. De fato, quanto aos outros casos, isto é, enfermos com atividade cerebral, ainda que acometidos por doenças incuráveis e/ou em estado terminal, permitir por lei a eutanásia, seria ir de encontro à CR, haja vista a existência de vida – ou sobrevida. Lei neste sentido seria inconstitucional.

Dessa forma, enquanto o entendimento do STF sobre o conceito de vida se mantiver, não há a possibilidade de eutanásia no Brasil para pacientes que tenham alguma atividade cerebral.

Porém, colocando-se de lado os aspectos jurídicos existentes no Brasil e as tecnicidades dos conceitos expostos, esta monografanda entende que os pacientes incuráveis e/ou em estado terminal que encontrem-se em sofrimento e agonia insuportáveis, deveriam ter a liberdade de escolha de morrer com dignidade.

A eutanásia, frise-se, é um assunto de extremada controvérsia, que ainda precisa ser muito explorado, refletido e debatido pela bioética, pelo biodireito, por toda

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29 comunidade jurídica, enquanto operadores do direito que buscam o justo e o correto, e por toda a sociedade brasileira e internacional, enquanto seres pensantes e questionadores, afinal, o povo unido e conscientizado tem força para transformar (quase tudo) o que não concorda – além de ter o direito à uma vida e morte dignas.

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