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Entrevista com Júlio de Mello Filho

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Academic year: 2021

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Entrevista-Júlio de Mello

Franklin- Esta idéia de trazer o Júlio, aproveitando o momento em que ele está em Campinas, e conversar sobre grupo, com professores da Spag-Campinas, é uma antiga idéia que agora estamos colocando em prática. Agradecemos pela acolhida do Júlio ao nosso convite.

O Prof. Dr. Júlio de Mello Filho, a quem carinhosamente chamamos de Júlio, tem uma vasta experiência com grupos. É membro da Spag E Rio, tem vários livros e artigos publicados sobre medicina psicossomática, grupoterapia analítica, um excelente livro sobre Winnicott, etc. É professor universitário na UERJ, Universidade Estadual do Rio de Janeiro, e até hoje me lembro do prazer em ler um de seus primeiros livros, Concepção Psicossomática; visão atual, editado em 1979, se não me falha a memória, quando eu era residente de psiquiatria na Unicamp. O livro discorre sobre o trabalho com pacientes internados numa enfermaria geral de adultos, sempre trabalhando com grupos, não só com os pacientes internados, mas também com os membros da equipe clínica. Júlio, sem dúvida é um dos pioneiros no Brasil no trabalho com grupos, principalmente na clínica médica. Assim sendo vamos gravar esta nossa conversa com o Prof. Dr. Júlio de Mello Filho, um pioneiro na grupoterapia, a quem prezamos e admiramos.

Como organizador desta atividade passo a palavra aos colegas. Estamos com o espaço aberto para discutirmos qualquer assunto que vocês queiram sobre grupo.

Utilizando a prerrogativa de ser o organizador desta atividade eu gostaria de fazer a primeira pergunta para o Júlio, que é a seguinte:

Maria José - Posso interromper e fazer uma observação? Seria interessante registrar que hoje é dia 5 de novembro de 1996.

Franklin – Então já está registrado, e gravado.

Maria José- É terça-feira, e temos aqui a presença do professor Júlio de Mello Filho, do professor Wilton Viana, do professor Franklin, do professor Onildo da USP de Ribeirão Preto e eu, Maria José.

Franklin- Bem, para começarmos, Júlio, seria interessante falar um pouco sobre o histórico da psicoterapia analítica de grupo, não em termos de mundo, somente, mas em termos principalmente do Rio de Janeiro e Brasil, porque você faz parte desse movimento, é um dos pioneiros, e penso que é de suma importância saber sua opinião sobre os primórdios do movimento grupal no Brasil. Também é interessante e importante saber sua história pessoal como grupanalista.

Júlio- Obrigado pelo convite, o pessoal de Campinas é sempre muito gentil, e Campinas está se tornando um centro onde a grupoterapia analítica muito tem se desenvolvido nos últimos anos. Não é para fazer média não.

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Tenho tomado conhecimento dos trabalhos publicados, das teses de mestrado e doutorado defendidas sobre a grupoterapia, e sei que o pessoal de Campinas faz muito grupo, tanto no consultório privado, como no serviço público e na Unicamp. A Spag-Campinas é forte, tem muitos membros entre alunos e membros titulares e isso é muito bom para o movimento grupoterápico no Brasil.

Vamos então ao histórico.

Na década de 60, a psicoterapia de grupo, começou a aflorar na Europa, o Foulkes, os discípulos de Foulkes, não Bion. Bion escreveu um livro muito interessante, que o resto atrapalhou um “bocado”, mas realmente foi algo muito importante, um livro dele chamado “Experiências com Grupos” que circulou muito, (eu digo isso no prefácio que fiz para o livro da Spag-Campinas, organizado pelo Franklin, e gostei muito de falar sobre isso). Franklin: Gostei do jeito que você fala isso.

Júlio: Bion realmente é um guru, talvez devido a sua infância na Índia, mas é um guru que abandonou completamente a sua pesquisa, o seu estudo, o seu interesse pela grupoterapia, quase que passou a falar contra o grupo. Quase que falava contra o grupo, às vezes parecia falar com certo desprezo da grupoterapia, não desprezo de desinteresses, falava de alguns momentos importantes com grupos, mas instalado todo na Psicanálise, uma série de idéias muito terminais, que tinham aplicação no grupo, como “teoria das pulsões; as transformações”, mas ele não dava os requisitos, porque não trabalhou com grupo!

Wilton - Posso fazer um comentário?

Nessa época o que aconteceu foi o seguinte: A primeira vez que Bion veio a São Paulo, ele chegou num momento em que havia sido recentemente formado o grupo da Sppag, Sociedade Paulista de Psicoterapia Analítica de Grupo. Havia uma hostilidade enorme do pessoal da psicanálise individual com o movimento da sociedade de psicoterapia analítica de grupo. Tanto que você viu que a Noemi Silveira Rudolf veio do Rio de Janeiro, era analista didata lá, não foi aceita como didata em São Paulo, porque ela se uniu ao pessoal que fazia grupo, como Capisano, Miller de Paiva, Blay Neto, Oscar Resende de Lima, Richard Kanner, etc.

Então o Bion veio e trouxe as idéias dele sobre grupo, teve um efeito curioso. Em face da postura dele com os grupos, a Sociedade de Psicanálise de São Paulo começou a suavizar a hostilidade com os que faziam grupo. Esse mérito Bion teve, mas por outro lado, com toda razão, eu acho que isso é uma das coisas que chama a atenção, Bion, como era de se esperar, deu mais atenção aos que o convidaram e deram a maior parte da programação das atividades pra ele, que foi sobre psicanálise pura e individual. O pessoal de grupo não abriu espaço para o Bion, aqui em São Paulo. (Não foi o pessoal do grupo que convidou o Bion a São Paulo).

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Júlio- Bion nunca teve identidade de analista de grupo. É importante que se diga isso, como fiz no prefácio do livro da Spag-Campinas. Ele mesmo dizia: eu fiz experiências com grupos. Eu acho até que era um problema dele, inclusive com Melaine Klein, porque dizem as pessoas que Melaine Klein era abertamente contra o grupo. Dizem isso.

Maria José: E ela foi analista dele.

Franklin – Acho que o trabalho que Bion desenvolveu com psicóticos, posteriormente, tem a ver com sua vivência com os grupos, pois sabemos que nos grupos vivenciamos o tempo todo um funcionamento mental psicótico do grupo. O grupo promove uma intensa regressão em seus membros e conseqüentemente manifestações claramente psicóticas.

Júlio – Comentam que Melanie Klein, analista dele, na época, desencorajou-o a trabalhar cdesencorajou-om grupdesencorajou-os analíticdesencorajou-os. Esta história nunca ficdesencorajou-ou bem esclarecida.

Franklin – Nunca saberemos se é uma verdade ou como afirma Miller de Paiva, uma urdidura tanática, isto é, uma fofoca.

Júlio – Mas não há como negar, ele era do grupo, um dos pilares, o grande gênio do grupo. Por tudo isso ele fez, como ele mesmo diz, algumas experiências com grupos, parte dos experimentos no norte da Inglaterra, onde o grupo começou a se desenvolver com um grupo de soldados que estava em recuperação. Diz De Maré que é um dos discípulos de Foulkes, que Bion foi muito mal recebido nesta experiência, porque ele tinha aquela atitude de analista. O sujeito estava lá deprimido em recuperação de ferida de guerra, de traumatismo de guerra, ele chegava e ficava calado. A técnica dele era ficar calado. Uma técnica analítica absurda, que não se faz mais, ou dava interpretações analíticas como um guru.

No fim da vida ele ficou inteiramente diferente. Não trabalhava com memória e desejo, trabalhava com sensibilidade. No final da vida ele fez as sessões mais bonitas que eu já vi. Até mais bonitas que as do Winnicott, embora eu não compare um com o outro. Mas ele realmente foi evoluindo para uma posição mais humanista.

Na época em que fez os experimentos com grupos, e que originou o livro, ele foi quase expulso, porque não obteve resultados e aí ele se afastou e alguns anos depois, o Foulkes foi, aí que Foulkes, com a atitude dele de respeitar o grupo e conhecer o grupo, de conhecer a dinâmica de grupo, continuou com o trabalho.

O Foulkes era um cara que tinha vivência em (Gestalt) psicoterapia de grupo, entendeu? Em dramatização, estudou tudo isso, tinha uma formação diferente. E era voltado para o grupo e para o social e não apenas para intrapsíquico. Aí o Foulkes chegou lá e deu certo o negócio. A partir daí o grupo começou a fazer psicoterapia analítica de grupo. Porque psicoterapia analítica? Isso foi uma conciliação com a IPA. Na verdade era

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psicanálise de grupo, entendeu? Psicoterapia analítica de grupo é um eufemismo. Eu faço psicanálise de grupo. Agora psicanálise de grupo não é como eu faço psicanálise individual, só baseada na transferência, entendeu? Naquele “setting”, o cara deitado lá, eu sentado, e eu só interpretando a transferência dele, positiva ou negativa. “Deus me livre!” Então, no grupo eu não faço só isso, eu converso com os pacientes, eu respondo a perguntas, interajo, e quando necessário eu interpreto, eu assinalo, e uso intervenções que eu considere psicanalíticas, para dar “insight” e para unir mais o grupo. Pensando o tempo todo não só no “insight”, mas também na coesão do grupo. Se eu der uma interpretação que proporcione “insight” e o grupo ficar todo espatifado, não acho uma boa, entendeu?

Então, o Foulkes começou e fez uma cruzada pelo mundo todo, não é? Ele teve muitos discípulos, todo mundo é discípulo dele. Wolf e Schwartz nos Estados Unidos são discípulos de Foulkes, De Maré, Ezriel, entre vários outros. São pessoas que desenvolveram o grupo em parte baseando-se nos princípios estabelecidos por Foulkes. Nenhum praticamente foi discípulo de Bion, e começaram a desenvolver técnicas.

O Ezriel propõe uma psicanálise de grupo, enquanto outros propõem a psicanálise em grupo e o Foulkes propõe uma psicanálise “by”, de grupo, isto é, pelo grupo, que eu acho a melhor. É uma psicanálise “by” de grupo, através do grupo, que não é do grupo, é através do grupo, da ação grupal, do “holding” grupal, da substância fundamental do grupo. Através da matriz grupal separa o tratamento de cada pessoa, não existe isso de fazer outro eu do grupo através do grupo, só dava interpretação grupal. (Foulkes satisfaz assim o tratamento psicanalítico de cada um, através do que chamou de matriz grupal. Você faz o tratamento de cada pessoa no grupo). Eu estou falando porque essas coisas eu vivi intensamente aqui como observador de terapeuta de grupo (destas questões técnicas, e essas dúvidas eu vivi intensamente). Fui observador do Carpilowski no Rio de Janeiro, uma pessoa maravilhosa, sensível, mas só interpretava o grupo. Ouvia pouco os pacientes – cindia. Os pacientes se queixavam dele para mim, eu era o observador. Diziam: “Mas Dr. Júlio, ele não me deu a palavra”. Eu dizia; “Mas você vem dizer isso a mim”. Eu, o observador ficava calado, e via como ele esquecia certos pacientes, preocupado só com o grupo. Mas o grupo era um grupo psicótico e mesmo assim caminhava. Um paciente ou outro se sentia mais rejeitado e saía, entendeu? Porque ele, paciente, precisava da problemática dele interpretada. Foi quando eu fiz um artigo que no Rio e no Brasil teve enorme repercussão e mostrava que você não podia dar interpretação só grupal. Você não diz ao camarada: “você vai sentar com o grupo, eu vou tratar o grupo”. Você tem que fazer o contrário. É como se você dissesse: “eu vou tratar você!” E você então começa com interpretações: porque o grupo... o grupo... Só fala do grupo como um todo, esquece os pacientes. Não é possível.

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Muitas vezes você vê o paciente no grupo, alguém do grupo faz um discurso, os outros estão calados, e aí o analista diz: Porque o grupo... Não é o grupo. O grupo está calado, não pensa assim, não diz nada, está com medo da liderança do outro, não é? Então não é o grupo, é uma pessoa, uma parte do grupo, você. Agora os outros ficaram calados. Por quê? Porque não disseram nada? (Não sabemos direito, é preciso ter cuidado, e não interpretar sempre o grupo como um todo).

Wilton - Eu vou propor que a gente possa discutir. O Júlio está levantando várias coisas preciosas, muito importantes e abre espaço para uma discussão bastante frutificante.

Júlio: Claro.

Wilton - O Júlio coloca, por exemplo, uma situação modelo. A pessoa faz um discurso num grupo, fala bastante, vamos supor que uma pessoa diga: “porque eu estava na minha casa, aí minha mulher fez uma cara feia, aí eu briguei com a minha mulher, aí meus filhos ficaram do lado da minha mulher, eu fui contra meus filhos, convenci meus filhos”, e mais um monte de coisas. Faz um discurso enorme, o grupo todo escuta e existe aí uma configuração. Alguém fez um relato, outros ouviram o relato e coisas foram faladas. Fica um silêncio, por exemplo, numa situação dessas. Como abordar essa situação?

Eu acho que aí eu e o Júlio talvez tenhamos maneiras diversas de enfocar e talvez os demais também.

Júlio - Claro, eu estou fazendo um discurso inicial. Podemos ampliar a discussão.

Wilton-Eu me lembro desse artigo do Júlio, dessa discussão toda, era uma postura que Carpilowski assumia e aí vários assumiram.

Júlio - E todo mundo assumia, os kleinianos todos assumiram. Wilton-Eles tinham a visão de encarar o grupo como uma pessoa. Franklin - É o que se chamou do grupo como um todo.

Wilton-Não, é o grupo como uma pessoa.

Júlio-Uma pessoa no sentido de um todo, uma pessoa, um self.

Wilton - Nesse sentido eu bato palmas a esta afirmativa, a essa abordagem do Júlio, porque quando estas pessoas encaravam o grupo como sendo uma pessoa, eles estavam loucos e alienados...

Júlio: Completamente.

Wilton: ...porque não estavam lidando com um grupo de pessoas que se vê, se ouve. Então voltando a este modelo de situação que o Júlio está colocando. Se uma pessoa fala no grupo, durante dez, quinze, vinte, trinta

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minutos, fala um monte de coisas, sobre a experiência de vida dele, na família dele, lá fora, com mulher, com filhos, etc., os outros ouvem, faz-se um silêncio, por exemplo, então, o terapeuta, o grupanalista, se dirigir a essa pessoa e trabalhar o conteúdo do discurso desta pessoa, isto não é grupanálise.

Franklin - Então pára um pouquinho. Eu quero colocar uma dúvida, uma questão sobre a qual estou muito motivado e tenho lido ultimamente e tem me impressionado muito. São as idéias de Eduardo Luiz Cortezão sobre grupanálise e principalmente um conceito que ele desenvolveu e chamou de níveis de experiência e interpretação.

O Cortezão tem um livro que se chama Grupanálise, editado recentemente, muito pouco conhecido dos brasileiros, em que ele coloca, em um capítulo, as várias etapas pelas quais passa uma sessão de grupo. Ele as chama, estas etapas, de comunicação subjetiva individual, comunicação subjetiva múltipla, comunicação associativa, interpretação genético-evolutiva, interpretação desenvolutiva, interpretação de significação e interpretação de criatividade.

Júlio - É, ele tem conceitos específicos de grupo, coisas que ninguém nunca escreveu.

Franklin - Exatamente. Continuando, por último o terapeuta entra com a interpretação na transferência e a interpretação comutativa. Essa interpretação comutativa eu acho nem sempre possível de ser feita. Então eu digo o seguinte. Não será interessante esperar que o grupo passe por todas essas fases, estas etapas, porque veja, tem momentos, em que o grupo tem interpretações de significação que são riquíssimas. Ou então interpretação de criatividade que também são riquíssimas e numa linguagem muitas vezes mais acessível aos membros do grupo do que a linguagem do grupoterapeuta, e o terapeuta entrar só no final. Isto sim seria grupanálise?

Estaria também alienado, louco, o grupanalista que deixasse de lado o poder terapêutico do grupo?

Júlio- Eu acho o seguinte. Eu acho que eu estou descrevendo a situação em que uma pessoa só faz um discurso, os outros ficam calados. Eu acho que você pode chegar e questionar porque ninguém disse nada, e de várias formas você pode questionar. Você pode começar de um modo diferente. Quando é um líder muito paranóico, você não o enfoca. Você pode dizer: “Peraí gente, o que vocês acham disso e porque não disseram nada?”. Entendeu?

Os grupanalistas que já conhecem mais o grupo podem ir mais adiante ainda. Depende do grau de “insight” do grupo. Mas é um grupo com pessoas diferentes, entendeu? E tem paciente boderline, é preciso ir com muito cuidado.Você tem que dar atenção a ele, senão ele saí, entendeu? E tem o problema do falso “self”.

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Eu tive um paciente de grupo, o Roberto, casado, uma história muito interessante. Este eu tive que passar para individual. Tem casos que passei da individual para grupo, mas este tive que mudar de grupo para individual.Era um caso de falso “self”. Cresceu muito protegido pelos pais, nunca fez muita coisa na vida. A mulher dele era uma mulher forte, mas usou essa força para trair o cara. Traiu com o maior amigo, e ele não agüentou, porque ele era dependente dela e também porque foi uma forma dela dizer: Roberto acorda, senão eu “roubo” teus amigos.

Ela era uma pessoa incrível. Eu estive com ela algum tempo atrás. Não era só uma mulher irresponsável, foi uma traição conjugal psicoterápica, sei lá o quê. O que eu ia falar? Ah, o Roberto chegou no grupo, depois de uns dois anos ele se integrou ao grupo e o grupo teve alta.Tinha cinco anos de terapia. E eu disse: “que maravilha, o grupo todo teve alta”. Dei alta para uns seis ou sete pacientes do grupo, Todo mundo nesse grupo teve alta.

Eu fico entusiasmado com certas coisas. Outro dia, eu fui fazer um trabalho chamado “A Alta no Grupoterapêutico”. Sabe quantas altas eu dei? Trinta e sete. Mas é alta mesmo. Não é alta quando o paciente quer sair e diz : “eu quero sair”. Tudo bem, saí. Não. É alta elaborada. O paciente deseja alta, eu desejo, o grupo deseja, a gente passa seis meses, no mínimo, conversando, como num processo psicanalítico individual.

Franklin - E qual é o seu critério para dar alta?

Júlio - O critério é a evolução sintomática, a evolução do “self”, a evolução nas relações objetais, posso continuar, mas de um modo geral era isso, o camarada teve um crescimento do “self”, os sintomas melhoraram, não estou dizendo que curou, e ele melhorou as relações objetais no grupo, está bem.. Tenho uma paciente que saiu, ficou ainda dois meses meio deprimida, enquanto resolvia uma situação conjugal. Dois meses fora do grupo, dois anos teve umas duas sessões comigo, individual, e depois me procurou dizendo: “Dr. Júlio, eu estou muito bem com meu marido, passou a depressão”, tudo bem, o que ela precisava não era tanto o grupo, era a relação com o marido, numa atitude diferente dela, entendeu? Agora, tudo isso o grupo deu subsídio a ela, para poder ter uma atitude diferente, então nisso tudo é para mostrar as questões do grupo, resultados, etc. E voltando a questão da evolução do grupo, tudo isso a gente vê depois, eu acho que a gente vê quem aprendeu no grupo, quem não ficou apenas interpretando o grupo como uma coisa, uma pessoa. Mas também tinha resultado. Agora, dava muito falso self – Roberto. O Roberto me procurou um ou dois anos depois. Que foi Roberto? “Tudo encenação... tudo encenação”, ele disse pra mim. Eu não estava tão bem quanto parecia, mas eu achava que estava, dizia. Uma confissão até bonita. Aí o Roberto fez três ou quatro anos individual e saiu muito ruim, deprimido, boderline. Mas a mulher não traiu mais ele, ele se dedicou aos filhos. Ele não se dedicava, porque tinha um ciúme desgraçado dos filhos, entendeu? Arranjou um emprego. Eu acho que até a saída ajudou. Ele disse: “agora sou eu comigo mesmo. Vou fazer

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“cooper”, vou ao clube”. Depois me procurou brevemente, não sei por quê, mas estava bem.

Esse paciente mostra uma das perspectivas negativas do grupo, que é a formação do falso “self” virtual. No meu entender, isso não é uma coisa tão freqüente, como pode existir numa análise individual, tudo isso, um conluio entre o analista e o terapeuta, o cara está ótimo e depois que ele saí, começa a fazer acting-out entendeu? É um exemplo de falso “self” que pode aparecer no grupo quando há muito silêncio. Isto tudo só para ilustrar a questão que levantamos sobre o silêncio no grupo e a interpretação sempre do grupo como um todo.

Agora, o que eu acho do grupo aqui no Brasil.

A grande influência foi dos argentinos, Grinberg, Langer e Rodrigué. Mas foram líderes de psicoterapia do grupo, vou frisar, do grupo. Olha a visão unicista, unívoca do grupo. Era o grupo como um todo de novo. Então era um livro rígido, com exemplos clínicos muito interessantes, mas foram pessoas que eu acho que se reuniram para fazer grupo e depois cada um tomou o seu caminho. Eu digo isso no seu prefácio (dirigindo-se para Franklin) (prefácio que Júlio de Mello Filho fez ao livro da Spag-Campinas, organizado pelo prof. Franklin).

Franklin - No seu...

Júlio - Tudo bem, é meu. (risos). O grupo teve uma capacidade de reunir os três. E como era complicada a América Latina naquela época. O Grinberg foi para a Espanha porque os filhos dele foram perseguidos pela polícia no período da ditadura argentina. A Maria Langer virou uma militante comunista, mas que militante. Eu a vi aqui no Brasil, no Instituto de Psiquiatria, mal vestida, com uma bolsinha de hippie, agora, brilhante nas idéias. Mas eu vi toda a rigidez dessa mulher, entendeu? Existia só para a política. Fazia grupo, mas com a finalidade política.

E o Rodrigué pirou de vez. Dizem que ele faz análise de bermudas na praia. Eu não sei, pode ser muita fofoca.

Wilton: Na Bahia.

Júlio: É muita fofoca no nosso meio. Ele se afastou de tudo, não tem mais conversa. Eles não conseguiram fazer um prefácio de um novo livro.

Franklin - Porque você acha que não conseguiram?

Júlio - Porque não conseguiram se unir, cada um foi por um caminho. Para se libertar da repressão.Cada um foi para um caminho, entendeu? Eu sei lá, se libertaram de certa repressão Argentina, que é um país de repressão, sei lá.

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Franklin - Júlio, você coloca no prefácio do livro da Spag-Campinas que você acha que esse foi um dos motivos que deixou os grupanalistas sentindo-se órfãos na América Latina. Você acha que foi realmente isso? Júlio - Foi um dos motivos. Primeiro, e isso eu tenho certeza, a influência ideológica, a técnica, foi o elemento mais importante. O livro deles era a nossa Bíblia. O Foulkes era anterior, mas a turma não lia. Lia Bion, (que era o livro do Grinberg, Langer e Rodrigué. E liam bem. O pessoal de grupo lia muito pouco). Lia outros autores. Malcom Pines praticamente não existia. Agora, a formação em grupanálise eram os seminários, eram boas observações, mas todo mundo muito rígido.

Que história é essa de observador não falar. Que maluquice. É maluquice. Eu tive depois experiência de terapia. Uma coisa linda. Eu tive uma co-terapeuta durante quatro anos, quando ela saiu do grupo, todo o grupo chorou, inclusive eu. Foi um arranco do “self” da gente. Uma pessoa maravilhosa. Eu disse a ela: “você é a melhor terapeuta do grupo, apenas você não quer fazer formação, mas você é melhor do que eu, você tem uma sensibilidade que eu não tenho, agora eu tenho outras qualidades, eu tenho amor ao grupo, uma dedicação, uma formação teórica, mas você tem uma sensibilidade que é uma coisa...”. Ela não quis estudar grupo. Por quê? Por causa da analista dela. A analista dela não deixou.

Wilton – Julio?

Júlio: Espere aí, isso é muito importante, deixa falar pô! Deixar eu falar a história da IPA. Quem tentou acabar com o grupo foi a IPA. Foi a IPA. A IPA proibiu, meu analista me disse: “você está com muito grupo, diminui e fica com um só”. Nunca disse isso, estou dizendo aqui. Meu analista disse isso. Franklin - Quem foi seu analista?

Júlio - Não vou dizer quem é (risos). Não, não vou dizer quem é. Não posso dizer, sou uma pessoa muito grata a ele, pois tive um paciente que teve um “acting out”, que tentou me matar, um caso sério e eu sou muito grato a ele.

Franklin - Mas, Júlio, deixe-me interromper você e perguntar o seguinte: Como você vê a posição do Blay Neto. Ele era um analista reconhecido, respeitado, membro da Sociedade de Psicanálise de São Paulo, e fazia grupo e individual, e aceitava isso.

Júlio – Isso foi em São Paulo, eu estou no grupo no Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro.

Vamos então falar do grupo no Brasil e no Rio de Janeiro. No Rio Grande do Sul foi dizimado. Porque quem dominava o grupo era o homem mais rígido que eu conheci na minha vida, que é o Zimmermann, David Zimmermann, um homem dedicado, sério, é preciso dizer isso, levou um golpe que tiraram ele da liberdade, nojento, quase que matam o homem, porque ele

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não merecia aquilo, aí eu fui naquele Centro de Estudos.Tiveram que criar o Centro de Estudos Ciro Martins para salvar ele e o assistente dele, senão ele morria. Criaram para salvar o homem. Era kleiniano, rígido, rígido, rígido. Outra coisa que arrasou o grupo foi Kleinianismo. Os grandes líderes do Brasil, isso é importante dizer, foram Valderedo no Rio de janeiro e Zimmermann no Sul. Valderedo não era tão rígido, mas era kleiniano também, é o amor ao Kleinianismo. Só pensavam em objeto interno, tudo isso é importante, eu estou falando assim pô, eu tenho formação Kleiniana, estou brincando, entendeu? Pô, que objeto interno coisa nenhuma, isso é brincadeira! Objeto interno é bonito se você pensa num único objeto interno num objeto externo que ele tenha, que é óbvio, mas que muita gente não vê, eu não vou ver pó, acabou com o homem, acabou – a casa dele, o “esterco” que ela serve, pois é (risos), e por aí vai! A empregada, qual é a relação com a empregada,entendeu? Um cliente meu de grupo que era amante da empregada, então pó, como é que fica isso? A mulher mais importante para ele não era a mulher dele, era a empregada dele, era amante dela! Tive que ver aquela situação lá, de grupo.

Então eu acho que o grupo se desfez no mundo todo, não foi só aqui no Brasil, não.Está certo? Também se desfez por problemas internos entre o pessoal de grupo.O grupo tem uma estrutura teórica fragilíssima. E a Psicanálise, estudando, estudando,... o que é que o grupo produziu? Nada! Qual é um livro bom sobre grupo que nós temos? Temos Cortesão só, e Cortesão brilhantou no Brasil, mas não temos mais nada, que é mais que se tem? Temos um livrozinho, chamado Grupo sobre Grupo Zimerman, o outro Zimerman, e o Osório, estão tentando reparar o que aconteceu. Estão escrevendo sobre grupo. A sociedade lá em Porto Alegre era tão rígida que ninguém podia entrar. Quando se sentiram ameaçados aí abriram a sociedade e passou a ser uma entidade aberta. Zimerman foi fazer a formação em Santa Catarina. Coisa horrorosa. São os bastidores da psicanálise no Brasil. No Rio não era tão rígido assim. Minha sociedade não era tão cruel. Não iam dizer o Júlio de Mello não é um analista. É um analista de m. porque faz grupo.

O grupo caiu muito porque todo mundo só quer fazer individual, ninguém quer fazer grupo.

Franklin-Os pacientes?

Júlio – Sim, os pacientes. O paciente quer individual porque a idéia dele,desculpe se eu estou falando demais, fica chato, é que na realidade ele precisa de um “holding”, conta muito com o terapeuta, quer ter uma mãe só pra ele e o grupo vai tomar a vez dele.

Wilton - E como você responde ao paciente que diz a você que prefere individual?

Júlio - Não, eu discuto com ele. Se ele for um paciente candidato a grupo, eu vou e mostro isso a ele, com jeito,entendeu? Mas geralmente ele diz:

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“Está bom doutor, vamos fazer uma experiência”. Outras vezes não, ele fica na dele, só quer individual.

E terceiro elemento muito importante: O grupo não penetrou na mídia.Eu digo tudo isso, estou sintetizando aqui, falo mais no prefácio do livro do Franklin. Um elemento importantíssimo, realmente o grupo não penetrou na mídia, porque os jornalistas são analisados só por analistas lacanianos. Olha, que piada! É assim mesmo, todos fazem análise com lacanianos, e lacaniano não gosta de grupo.

A psicanálise, quem sabe talvez daqui a dez anos, porque estará sem paciente, faz uma aliança com a gente, mas se fizer é estratégica, entendeu? Vão dizer: esse pessoal de grupo também está sem paciente, vamos nos aproximar deles, chamar o cara de grupo aqui pra falar. Pode ser, não sei quando, mas por enquanto não. Agora, não tem espaço na mídia, a mídia não dá bola. Uma amiga minha, analista, falou num congresso uma coisa importante, foi um sucesso. A TV Globo, ou o Jornal Globo, através de um jornalista sério ligou para ela para fazer uma entrevista, ela disse; “Estou à disposição. Mas ele disse:” olha são quatro ou cinco linhas, porque a psicanálise não dá mais “ibope”, a psicanálise não nos interessa, então são quatro ou cinco linhas, você quer?”. Ela disse não. Assim ela me contou, agora, verdade, agora, semana passada. Então a gente não tem espaço na mídia como é que a gente vai crescer. O paciente não quer, terapeuta de grupo são muito poucos, muitos terapeutas de grupo não acreditam no grupo. Não acreditam no grupo, continuam acreditando no individual. Eles fazem grupo, mas não têm uma identidade de terapeuta de grupo, entendeu?

A análise individual é cara, não dá para fazer quatro sessões de análise por semana, Vamos fazer então uma formação em grupo. Mas não fazem, pois não acreditam no grupo. Não acreditam no grupo, mas eles fazem grupo como terapeuta. É um absurdo!

Agora, uma última questão que está arrasando a gente: terapia alternativa. Está acabando com a psicanálise, com tudo no Rio de Janeiro. O paciente vem a mim e faz a comunicação: “Doutor eu vou experimentar um tal de Floral de Bach”. Diz assim pra gente, com essa ingenuidade. Eu vou experimentar um tal de Floral de Bach, doutor. Não diz que é porque é mais barato e é mais rápido. Diz; “Eu pensei, pensei, vou experimentar um tal de Floral de Bach”. Nem pergunta minha opinião. Então a terapia alternativa está acabando com a psicanálise. Eu tenho uma moça, que é meio psicopata, não é completamente psicopata. Tipo interessante para psicóloga. Estava fazendo individual, tinha muito dinheiro, tinha amiga lacaniana, a moça estava no quarto ano de psicologia, botaram ela em formação lacaniana, me tomaram a moça, botaram em formação lacaniana! Ela disse: “Doutor Júlio, eu não posso continuar, eu vou pagar muito, estou separada do meu marido. Ele me largou, entendeu?”. Agora, ela tinha uma dificuldade na questão de sedução comigo, mas é uma

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atuação dela, mas você vê a atuação do grupo Lacaniano (econômicas, mas foi seduzida, você vê a atuação do grupo lacaniano).

Franklin - Por que tomaram? Eu não entendi.

Júlio - Tomaram porque ofereceram a formação lacaniana para uma moça no quarto ano de psicologia. Isso não existe, ela ainda não entendia nada, nada, nada de nada. Estava no quarto ou terceiro ano de psicologia, acho que era quarto, entendeu? Era ingênua, tomaram mesmo, eles fazem isso mesmo, seduzem e levam a pessoa.

Outro exemplo, Luana, uma moça que se tratava comigo, alguns traços psicopatas, mas dava para ir, fazia individual, estava há três meses em análise. Aí ela me disse que fulana de tal, que inclusive é minha amiga, a chamou pra fazer tarô, tarô! Eu ainda fiquei uns quinze dias analisando isso com ela. Não adiantou. Ela foi, me largou. Era uma pessoa que gostava da análise, entendeu? Gostava, queria fazer, não estava enrolando não.Vocês vêm como está isso, como a turma está tomando o nosso lugar desse jeito, essa turma da terapia alternativa.

Então está bom, desculpe se falei demais, vocês não perguntaram essas coisas.

Wilton - Não é que você falou demais, eu acho que você colocou problemas graves, vários, de uma vez só. Eu não concordo muito com você da dificuldade do pessoal de grupo com as sociedades de psicanálise. O que me parece que aconteceu, e eu vivi isso em São Paulo, vivi a criação da Sociedade de Psicoterapia Analítica de Grupo de São Paulo. Ela começou de início como uma empresa particular, com um grupo de cinco, seis colegas, amigos nossos, que formaram uma empresa particular. Surgiram criticas, pressões e eles pararam. Pouquíssimo tempo, depois começaram novamente a surgir as reuniões, que de início foram na casa do Miller (Prof. Dr. Luiz Miller de Paiva). Ai surgiu a idéia, que foi logo acatada, de que deveríamos, apesar de sermos todos analistas, e eu era o mais novato, nos tornarmos alunos. Escolhemos um professor comum que foi o Guilhermo Ferschtut, que vinha da Argentina uma vez por mês e passava quatro a cinco dias em São Paulo e nos dava aulas teóricas, seminários clínicos. Cada um de nós marcava quantas horas quisesse de supervisão com ele. E assim ficamos de dois anos e meio a três anos, mais ou menos. Aí surgiu a SPPAG, Sociedade Paulista de Psicoterapia Analítica de Grupo. Franklin-Ficaram dois ou três anos fazendo o que?

Wilton - Fazendo a formação, o Blay, o Miller , o Capisano, eu.

Júlio - Formação discutível, uma vez por mês, discutível. Mas era o que eles tinham.

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Wilton-Formação . Nós tínhamos ali um curso oficioso de psicoterapia analítica de grupo.

Franklin-Mas não era análise pessoal de grupo?

Wilton – Não. Análise pessoal de grupo cada um tinha feito a sua. Eu tinha feito em Ribeirão Preto uma psicoterapia de grupo, dois anos e pouco, ao tempo do Departamento de Formação de Psicoterapia de Grupo.

Júlio: Com quem? Foi com esse cara aí, se for com ele pode dizer. Wilton: Quando o Júlio coloca o assunto...

Júlio:Pô. Não diz com que foi que fez análise de grupo?

Wilton: Foi com o David Azoubel. Depois eu me tornei psicanalista antes deles. O David hoje é analista didata em São Paulo. Nesse tempo o pessoal que fazia grupo em São Paulo era um pessoal francamente hostilizado pela Sociedade de Psicanálise de São Paulo, que tinha um grupo de poder como tem em toda instituição, tinham um grupo determinado.

Júlio: Então o Júlio tem alguma razão.

Wilton: Você tem toda a razão. Agora o que aconteceu? Surgiu a Sociedade de Psicoterapia de Grupo de São Paulo numa espécie de formação reativa à imagem e semelhança da Sociedade Psicanalítica de São Paulo.

Júlio: Sociedade de Psicoterapia Analítica de Grupo.

Wilton: É, mas surgiu com um sistema estrutural de funcionamento... Júlio: Identificado.

Wilton: Exatamente.

Júlio: Totalmente, maciçamente, igual, falso self.

Wilton: Igual. Rigidez, dominação, local onde o Onildo e o Franklin fizeram formação, e experimentaram isso lá.

Franklin – E chegamos até o final da formação.

Wilton: Houve uma natureza de estruturação institucional e isto aconteceu em São Paulo, aconteceu no Rio de Janeiro, em Porto Alegre, aconteceu em diversos lugares, e o que ocorreu: esta rigidez institucional não teve capacidade para sobreviver a psicodinâmica do grupo dentro da instituição. Resultado. Isso implodiu. Agora por que isso não tem acontecido tanto na sociedade de psicanálise, que se mantém?

Júlio: Em São Paulo.

Wilton: É. Nas sociedades de grupo, quando este fenômeno brota, muitas delas se diluem. Desfizeram-se. Agora, nas sociedades de psicanálise tem

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havido um fenômeno curioso. Por mais violentas que sejam as eclosões de ódio na instituição...

Júlio: Os conflitos.

Wilton: ... É, eles agüentam e a instituição sobrevive. Júlio: Muito bom o que você está falando.

Wilton: Agora, nas instituições de grupo os analistas explodiram com as instituições, por quê? Porque eles ficaram sobrevivendo nas sociedades de psicanálise. Então eles não precisavam das instituições de grupo. Os psicanalistas foram os responsáveis pela destruição das sociedades de grupo em São Paulo, Rio de Janeiro.

A sociedade de grupo em São Paulo hoje é um arremedo. Está tentando sobreviver, mas é um arremedo. Em Porto Alegre também e em vários outros lugares. Agora, teve um fenômeno curioso.

Júlio: E Campinas? Não é um arremedo também?

Wilton: Espera aí. Eu vou chegar em Campinas.Você se lembra em 1976 quando eu lhe pedi a indicação de dois colegas do Rio de Janeiro para dar um curso de psicoterapia de grupo em Recife e Fortaleza? E você me indicou o Molina e o Garrido? Estes dois viajaram a Recife e Fortaleza durante um ano e meio a dois anos a Recife e Fortaleza. Implantaram lá um curso de psicoterapia de grupo. Uma vez por mês eles davam um curso de quatro a seis horas de psicoterapia de grupo. Lá em Recife e Fortaleza ficaram pessoas que o Garrido e Molina conseguiram mostrar para eles o que era grupo.

Júlio:Até por que não tinha sociedade de psicanálise lá.

Wilton: Esse é o detalhe. Tinha em Recife. O Azevedo foi para lá, fundou a sociedade e que começou a hostilizar o nosso curso...

Júlio: Na verdade é muito prático.

Wilton: ...mas saiu-se mal, porque nós não pudemos ir atrás, em Salvador. Júlio: Não era o Azevedo, era o Lins.

Wilton: É. Era o Lins, é verdade. Júlio: José Lins de Almeida.

Wilton:Em Recife teve uma coisa curiosa. Um dos alunos do curso de psicoterapia de Recife era o Gilberto Freire. O curso era dado lá em Apicú, veja, onde não tinha sociedade de psicanálise estruturada e o ensino da psicoterapia de grupo foi instalado sem psicanalista ligado a sociedade de psicanálise participando, a eclosão do ódio foi trabalhada e ....

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Júlio - Por que não tinha sociedade de psicanálise porque o cara fazia acting-out, brigava, brigava, tratava bem e saía.

Wilton: Exatamente.

Franklin – E onde entra Campinas nisso?

Wilton – Espera aí que eu vou chegar em Campinas.

Júlio: O que você está falando é muito importante, você está sendo brilhante, esse “troço” tem que sair (publicado).

Wilton: O que aconteceu no Rio, Porto Alegre e São Paulo, que os psicanalistas fundaram uma sociedade de grupo, não totalmente convencidos de fazer um trabalho de psicoterapia ou grupanálise, eles fundaram a sociedade de grupo para terem um lugar onde seriam didatas, porque não eram pessoas que conseguiam a função didática dentro da sociedade, ou como David Zimmermann no Rio Grande do Sul. David Zimmermann era um analista didata do Rio Grande do Sul. Ele tinha um prestígio, tinha uma série de coisas e começou com a psicoterapia de grupo. Desenvolveu contato com Buenos Aires e começou a andar, mas dentro de um tacão de dificuldades.

Júlio - Davizinho ou Davizão? Wilton – Davizão.O David velho.

Wilton: Então, em função disto que o Júlio citou, das frustrações dele na universidade e de outras coisas, desanimou com o grupo, e o Osório ficou desamparado lá. E o Osório (não) conseguiu prosseguir sozinho.

Júlio: Osório e Davizinho.

Wilton:Bom, agora o que aconteceu em Campinas? Campinas começou a ter um desenvolvimento do grupo de estudos de grupo sem ter ninguém que fosse ligado a uma outra sociedade, exceto nós quem éramos, eu era membro, eles também, (dirigindo-se para Franklin e Onildo), e todos participávamos da sociedade de grupo de São Paulo, mas não ligados ao grupo de poder da Sociedade de Grupo de São Paulo. Resultado, nós aqui em Campinas, todo ódio que surgiu, e nós temos brigas, temos discussões, temos conchavos, temos diz que diz. Nós fazemos fofocas pelas costas, fazemos fofocas pela frente, temos brigas com alunos. Só que tem uma coisa. Ninguém sai da arena, porque não tem para onde ir.

Júlio: Muito bem!

Wilton: Ninguém evacua na instituição e vai para a sala de outra instituição.

A sociedade de psicoterapia analítica de Campinas tem bom futuro, porque ela tem uma base. Ela não é uma instituição formada.

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Júlio: Tem um outro mecanismo, uma parte, esta é a evasão, uma parte importante, a turma faz este movimento, pois se perdeu a clientela de grupo antes da individual. O sujeito está sem clientela de grupo, fica chateado e vai para a individual. Agora também na individual não vai ter mais nada. Também não há mais pessoas na nossa sociedade ligada a individual. Todas hoje em dia são ligadas ao grupo (ou: ou são livre atuadores ou ligados a outras instituições). Não tem mais a oportunidade de fazer este “acting out”. Vou para a individual, pois grupo é porcaria, não me dá paciente. É uma técnicazinha de m. desculpe falar assim, e eu lá realmente na individual vou ter uma coisa nova, maravilhosa.

Wilton; Então essa noção de desapreço pelo grupo foi uma tentativa de descarga que os psicanalistas fizeram, sentindo-se rejeitados eles transferiram a rejeição para a técnica e a instituição ou grupal. E acabaram com ela e voltaram para a sociedade de psicanálise. Acontece que a teoria, a clínica....

Júlio: Mas também por que não tinham pacientes, ou às vezes, não tinham a capacidade de serem líderes, isto é muito importante o que eu estou dizendo, ou no seu grupo, não tinham experiência, até por condições de liderança, ou na sociedade. Eu vi muitos caras que ficaram marginais na sociedade. Olhando, olhando, olhando e de repente saiam e iam para a individual. E fica marginal lá também. Mas, pelo menos, é a ultima cartada, entendeu? Lá ele acha que vai resolver as coisas.

Wilton: Agora, eu acho que este assunto tem muito a ver se a gente puder desenvolver o raciocínio, nesta conversa, sobre a psicodinâmica grupal e a evolução do indivíduo no grupo, ou através do grupo, ou como parte do grupo tem um tipo de evolução. Você citou uma coisa aqui Júlio, você falou várias vezes do aspecto do uso do grupo pelo paciente como uma fase de transição. Você como um winnicottiano, aí você está podendo nadar de braçada muito mais do que eu. No meu enfoque um paciente de grupo é um objeto transicional dele próprio e o grupo é para ele um objeto transicional. Júlio: É claro (Concordo).

Wilton: E neste aspecto que vem uma condição muito séria para o grupanalista membro da instituição de grupo, seja ele um professor, seja ele um profissional. Por que quando se trata de ser membro de uma instituição de grupo o indivíduo não pode continuar na transicionalidade. Então ele tem que abrir mão do faz de conta, através do qual ele consegue lidar com fantasias e uma série de conteúdos e ele tem que por o pé no chão, e estacionar. Não há mais transição.

Júlio: Brilhante.

Wilton; Eu gostaria de ouvir você um pouco sobre isso, porque no meu ponto de vista Campinas se mantém porque esta transicionalidade continua limitada entre nós todos.

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Júlio: Limitada por quê?

Wilton: No sentido de utilidade que ela apresenta. Nós não sabemos como vai ser, por exemplo, a jornada neste próximo sábado. Nós temos um programa, ela está lá, temos expectativas, e cada um de nós vai participar daquilo lá. Sabemos que vamos, mas não pré-determinamos o que cada um vai fazer e o que vai acontecer.E o depois vai ser um fim de semana de aula, de trabalho. Então a jornada vai ser transicional, uma transição.Então este jogo do estabilizado e do transicional é que me parece que começa a surgir na nossa instituição como algo que nós começamos a achar o caminho. Por exemplo, surgiu a proposta de se fazer, na época que era a época da nossa jornada, fazer a jornada da ABPAG. Nós concordamos, mas fizemos o seguinte; vamos fazer a nossa jornada no segundo semestre. A jornada foi um evento científico, transitório e transicional ela é um meio de manter a instituição, onde o aluno apresenta trabalho em paridade com o professor. No meu ponto de vista os psicanalistas que fundaram a sociedade de grupo usaram a sociedade de grupo como objeto transicional e a jogaram fora.

Júlio: Como espaço transicional. Eu acho que esta visão de grupo como espaço transicional, modéstia à parte, fui eu quem produziu, você sabe disso. O grupo é um espaço transicional, mas isso nunca foi dito. Foi dito por Käes, modéstia à parte de um modo muito mais pobre do que eu mostrei.O grupo tem esta transicionalidade, porque não há nada tão transicional como o grupo.

Wilton: Verdade.

Júlio: O grupo é o espaço transicional para as pessoas, cada um tem seus aspectos, cada sessão é inteiramente nova, está em movimento. Só não é transicional no sentido de que é uma transição com terapia. É uma transição de uma sessão para outra, na vida da pessoa, mas se for transicional como terapia, não é uma terapia analítica, é um grupo breve. A gente faz isso na Universidade do Estado do Rio de Janeiro-UERJ, com grupos de pacientes psicossomáticos, heterogêneo, pacientes com enfisema, dermatites, eles fazem seis meses de grupo, eu queria que fosse um ano, mas eles fazem seis meses.É um espaço transicional, entendeu? É uma transição na vida do indivíduo, na relação com aquela doença. Agora, o que você está trazendo é muito interessante. A instituição como espaço transicional. Primeiro a instituição é transicional, pois o aluno chega lá, tem uma fase de estudante, depois ele é membro, agora, ela nunca deveria ser transicional, porque ela se chama transição porque não é uma forma da psicanálise acabar entendeu? É transicional, como você disse muito bem, como esta reunião aqui agora, a gente não sabe o que é, ela é transicional, é transição para alguma coisa, isso é muito bom, é criativa, é sinal de criatividade, e é importante que o que a gente não sabe a gente vai ver, vai constatar. Agora a patologia é usar o grupo como espaço transicional para cair fora. Isso é patologia.

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Wilton: Porque aí você dá mais espaço transicional, ele perdeu a autoridade dele e põe em você, o indivíduo transforma o espaço transicional numa espécie de latrina, porque para ele não é transicional, será sempre algo que ele não quer mais.

Júlio: É muito bom o que você está dizendo porque isso é uma patologia da transicionalidade. Por exemplo, os meninos estão jogando bola, chega um menino para jogar bola e pega a bola. Isso é uma atitude transicional, mas não é transição a favor do grupo, é uma atitude transicional a favor dele.Então isso não é transicional. Transicional é uma coisa que evolui. Wilton: Mas...

Júlio: Espera aí, deixa eu falar algo que eu acho que é importante.

Franklin: A transicionalidade tem um sentido de desenvolvimento, de ir para frente, de evolução.

Júlio: A transicionalidade começa quando a criança está vivendo as angústias da separação, do desmame. O que é que a criança sabe inconscientemente? Ela começa a sentir vontade de morder a ponta do travesseiro. Ela começa a olhar para o ursinho, a mãe dá o ursinho para ela. Isso tudo é inconsciente. Ela começa a substituir a mãe por alguma coisa, mas é alguma coisa com a qual ela vai ter uma relação, entendeu? O bonito é isso.

Wilton: Ela não larga a relação.

Júlio: É, não larga. Um jangadeiro em Recife que vê a mulher traindo ele e vai para o mar infindo, ninguém sabe para onde, isso não é transicional. Isso é uma fuga. Agora, se ele se torna um jangadeiro melhor, naquela fase em que ele está se separando, com as pessoas, com os amigos, é uma atitude transicional. O transicional não é para a patologia.

Franklin: São situações em que o indivíduo usa o trabalho, usa outras formas de transicionalidade.

Júlio:O paciente terminal, isso eu nunca disse, estou dizendo aqui, que faz uma relação nova com o terapeuta, que leva ele a buscar um sentido novo na vida, isso é transicional. Eles criaram uma transição entre ele e a morte, entendeu? É muito interessante ver essa patologia como sociedades (científicas), como coisa transicional e as defesas. Quando o cara diz: a sociedade é uma merda e eu vou embora, é uma defesa. Agora o uso é transicional porque o uso é transitório interrompido.Agora é fácil, como eu digo: “o cara, na hora que o jogo está abrindo, pega a bola e vai embora” – é o que o cara missalande faz né? “Esta sociedade aqui está uma m., eu vou para outra. Ele está depreciando, denegrindo a gente, fazendo identificação projetiva, no aspecto kleiniano e idealizando uma outra sociedade.Vai ser uma miséria, vai ser uma maravilha (miséria neste sentido eu estou dizendo). É muito interessante o que você está trazendo.

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Wilton: Este indivíduo interrompe a transicionalidade para ele e ele perde aquilo que a instituição de grupo tem de riqueza, de se manter como uma transição dinâmica e continuamente transformadora e produtiva. Como você citou. O aluno entra como aprendiz, ele se forma, ele se desenvolve, ele cria e clientela dele, ele usa a técnica fora, continua ligado a instituição e a movimentos de grupanálise. Hoje, nós temos hoje, se você prestar atenção, mais instituições de grupanálise, poucas ainda, mas mais gente fazendo grupanálise. Bom, não é?

Júlio: Muito bom.

Wilton: Poucas ainda, mas estão funcionando. A gente tem instituições que estão tendo congresso com mais regularidade.

Júlio:Um pouquinho mais.

Wilton: Estão acontecendo mais regiões com grupos. Não importa se tem dois ou três em Campo Grande, dois ou três no Pará.

Júlio: Pará nada, “pelo amor de Deus”, morreu. Campo Grande, sim. Wilton: Mas tem.

Júlio: Recife está moribundo, mas Porto Alegre está ressurgindo. Daqui a pouco vai ter um Congresso lá.

Franklin: Vamos ter um Congresso Brasileiro da Abpag em junho, em Gramado.

Wilton: Por outro lado você encontra em todas as faculdades, é comum, em quase todas as regiões você encontra alguém que faça psicoterapia de grupo. Alguém que usa reuniões com grupos. Então está surgindo espontaneamente, felizmente, independente dos psicanalistas ligados ao litígio dentro das sociedades de psicanálise, está surgindo uma visão do grupo como instrumento de trabalho.

Júlio: Está, mas muito devagar a passos de tartaruga.

Onildo: Das várias coisas que foram conversadas até agora, eu estou entendendo que nós conversamos até agora sobre grupos nos quais se pode aplicar os conceitos psicanalíticos. Parece-me que é disso que nós falamos até agora. Falou-se de grupanálise, se falou de psicoterapia analítica de grupo e os exemplos que o Júlio trouxe, situações de clientes que ele tratou em grupo, de grupos que ele deu alta. Eu estou entendendo que nós estamos falando até agora de grupos que selecionam clientes que suportam a intervenção psicanalítica. Os clientes que suportam o exame da transferência.Nós estamos falando deste tipo de grupo. Estes clientes são clientes que têm uma integração de ego mínima necessária para poder lidar com o sofrimento que é produzido quando você interfere, por exemplo, com uma interpretação. Então eu estou achando que nós estamos falando deste tipo de cliente. Agora, quando o Júlio fala que existe um

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outro tipo de cliente no qual você aplica o grupo também e estes grupos duram seis meses, nós estamos falando de psicoterapia de grupo de tempo limitado. Seis meses, se você botar uma sessão por semana, se for uma sessão de uma hora e meia, que é muito...

Júlio: Lá é feita a cada quinze dias.

Onildo: A cada quinze dias? Então diminui a freqüência mais ainda. Mas é psicoterapia de grupo de tempo limitado. Aí nós estamos começando a falar em ampliar o conceito, as oportunidades de aplicação de grupo por um outro ramo, ampliando o uso do grupo. Eu queria juntar isso como uma outra coisa que você comentou que além das sociedades de psicoterapia analítica de grupo, ou das sociedades que se propõem a formar psicoterapeutas de grupo, os grupos não ficam apenas ligados a estas sociedades. Por exemplo, em Ribeirão Preto existem psicoterapeutas de grupo estabelecidos há pelo menos vinte e cinco anos, trabalhando em consultório com grupos.

Franklin: Psicoterapeutas de grupo ou psicoterapeutas analíticos de grupo? Onildo: Psicoterapeutas de grupo. Trabalham com grupo e que selecionam um tipo de clientela, são psiquiatras clínicos de sucesso, pessoas que têm uma clínica que vara anos, que têm um conceito, têm uma clientela grande, que o procura em função do sucesso dele como clínico, e dentre esta clientela eles formam grupos, e nestes grupos, eles não se fecham única e exclusivamente nos conceitos da psicoterapia analítica de grupo. Eles usam grupo no sentido mais amplo. Então, são aqueles pacientes que se beneficiam com o tratamento medicamentoso, mas que não podem pagar uma sessão por semana, individual para fazer o seguimento psicoterápico. Então eles fazem o seguimento psicoterápico em grupo e ao mesmo tempo esses pacientes são medicados. Então, em Ribeirão Preto, pelo menos têm dois psiquiatras clínicos que fazem isso, eu prefiro não citar o nome dos dois.

Júlio: Um é você! Franklin: Um é você? Onildo: Não, não sou eu!

Júlio: Claro que é! Ele diz que não, mas é ele!

Onildo: O outro nível que o Júlio levantou agora, e eu acho que é muito importante para sair um pouco da abrangência da sociedade de psicoterapia analítica de grupo é a Universidade. Quando ele fala desses grupos aplicados durante seis meses, são grupos aplicados dentro da universidade.

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Onildo: Breve grupal. É a psicoterapia de grupo de tempo limitado. Então existem experiências importantes no Brasil, se as sociedades acabam, muitas vezes a universidade mantém estas experiências. Por que? Por que lá dentro tem um psicoterapeuta de grupo e este psicoterapeuta tem uma oportunidade muito grande, tanto para ensinar psicoterapia de grupo, como para aplicar, porque existe uma clientela disponível. Por exemplo, a residência médica de Psiquiatria, você tem jovens que estão começando e se você propõe e tem condições de atender em grupo, você vai ter pessoas que vão se interessar e vão entrar nos conceitos de grupo, aplicando na prática. Isso também é muito importante no Brasil.

Wilton: Onildo....

Onildo: Então quando nós falamos apenas nas sociedades e aí também rememorando algumas coisas que vão aparecer em um dos capítulos do livro que nós estamos publicando, e que o Júlio está prefaciando, por exemplo, na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, por um acaso do destino apareceu lá em 1957 um psicoterapeuta de grupo de orientação psicanalítica que foi o Professor Hernan Davanzo. É um espaço que existiu, que existe. Agora, este espaço que existiu lá não deixou, por exemplo, o Guido Hetem, que atende na cidade atualmente, foi um sujeito que viu pela primeira vez se fazer psicoterapia de grupo através do Professor Hernan Davanzo. O Dr. Bechelli que atende em psicoterapia de grupo lá em Ribeirão Preto, nestas condições que não tem a abrangência da psicoterapia analítica de grupo trabalhou com o Dr. Guido Hetem em consultório e aprendeu a fazer grupo com o Dr. Guido Hetem. Então a amplitude do grupo vai além das sociedades. Agora, o que as sociedades podem fazer é o que está sendo feito aqui em Campinas, de organizar isso e dar uma abrangência maior.

Wilton: Posso te interromper?

Onildo: Agora, outra coisa que o Júlio introduz que eu acho que é muito importante, é quando você fala que se faz grupo que tem a duração de seis meses. Estes grupos estão sendo feitos dentro da instituição. E quando você faz grupo dentro da instituição, eles não obedecem necessariamente aqueles grupos dos quais o Júlio estava falando, que são os grupos de consultório. Qual a diferença do grupo de consultório para o grupo de instituição? Eu entendo que quando o Júlio diz que aquela cliente dele o abandonou depois de três meses de terapia, aquela cliente fez um relacionamento transferencial com ele Júlio, com ele psicoterapeuta. Quando você recebe o paciente na instituição para aplicar psicoterapia de grupo, além desta transferência que ele vai fazer com quem está coordenando o grupo, este grupo de seis meses, estes clientes também vão ter um vinculo, que eu também acho que é transferencial, com o conjunto da instituição. E isto cria uma complexidade diferente para você manejar isto tudo e o Júlio deve saber.

Júlio: Diminui a importância do terapeuta, não entendo isso. (FITA 2)

Wilton: Se você hoje for fazer um levantamento em São Paulo, em todos os hospitais, em todas as universidades, em todos os serviços públicos, vocês

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vão ver que se faz grupos em muitos locais.Conversei com o Osório há uns quatro ou cinco anos atrás para saber como estava Porto Alegre.

Franklin: Em Porto Alegre estão recomeçando, com um pessoal muito bom, formaram o Ceapeg, em sintonia com o Zimerman e o Osório.

Onildo: É interessante que a esta altura, o Zimerman é didata e o Osório também, então eles não têm mais o que temer.

Júlio: Não, eles não têm mais o que temer. Eles têm uma posição muito independente. Têm livro publicado, têm clientela garantida.

Wilton: Em São Paulo houve a instalação de uma sociedade, uma rigidez que foi se desenvolvendo, formaram vários colegas, alguns completaram a formação com todos os requisitos...

Franklin: Apesar da rigidez formaram muita gente.

Wilton: Outros não completaram a formação, mas de qualquer maneira a psicoterapia analítica de grupo em São Paulo está em dezenas de lugares, sendo praticada, gente estudando, gente fazendo, que não tem nada a ver com a SPAG de São Paulo, nem com o movimento da ABPAG. Então o problema gravíssimo que existe para nós quando falamos de psicoterapia analítica de grupo e psicoterapia de grupo é que nós perdemos um pouco a humildade...

Júlio: Apoio você.

Wilton: ...e temos a tendência de usar como argumento para o nosso raciocínio só o campo operacional que a nossa visão atingiu.

Júlio: Eu vou pedir um aparte e vou continuar. Wilton; Então continua.

Júlio: Esse ponto é importantíssimo. Isso se deve a que a psicoterapia analítica de grupo de um modo geral surgiu antes das outras formas. Quando surgiu ainda não existia o que a gente chamou de psicoterapia de grupo breve, focal, homogênea, heterogênea. Não existia. Começou a ter junto com a gente a dramatização. Gestalt existia, mas não aqui no Brasil. Então a tendência da gente era liderar o movimento, entendeu? Eu acho que isso não é uma paranóia, não? A gente viu que não lidera mesmo.

Wilton: Não lidera.

Júlio: Agora, a psicoterapia de grupo contribui, muito mais que o behaviorismo. A dramatização contribui pra burro! É que ninguém sabe disso. No meu ensino de psicologia médica o que mais contribui é a dramatização. Você pega uma aluno, e vai falar para ele a relação , bom, você é o doente, você é o médico, “pronto, está aí”, todo mundo se identifica, todo mundo aproveita, entendeu?

Franklin: Tudo bem aproveita, mas isso porque é só adolescente, se fosse adulto, não sei se daria certo.

Júlio: Se fosse velho não aproveita? “Deus me livre!” Aquele velho lá, com doença pulmonar crônica: “trepa em cima da tua mulher, e todo mundo...” aposto que ia aproveitar. Num grupo já tive experiência e que o cara... Franklin: Dramatização é bom para adolescente, adolescente gosta.

Júlio: Tudo bem, se você também está me ensinando que dramatização não é tão importante, quanto a faixa etária, é um conhecimento que eu não tenho, e é muito bom, depois a gente pode conversar sobre isso.

Franklin: Para a criança e o adolescente é bom, agora para o adulto...

Júlio: Não quero conversar agora porque não é pertinente, agora é muito importante o que você está dizendo, depois a gente vai conversar porque eu gosto muito e preciso aprender, mas então, a gente não tem esta hegemonia, você está dizendo a mesma coisa e o caminho seria o quê? Renunciar? Talvez! Agora, a gente tem que saber, como psicoterapeuta analítico de grupo, que a gente tem influência muito grande na formação,

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mas que a gente precisa do grupo, então a formação do psicoterapeuta analítico de grupo que não tem grupo operativo, é m., entendeu? É m..., tem que ter seis meses de grupo operativo, entendeu? Tem que ter seis meses de grupo homogêneo, tudo faz parte, até porque ele, de repente ele vai formar um grupo homogêneo de alcoólatras ou então fica uma coisa assim, um grupo sempre heterogêneo de neuróticos, fica uma coisa pobre, entendeu? Desculpa, era isso o que eu queria dizer porque são coisas fundamentais que a gente está dizendo, e que isto não está registrado no Brasil, em parte alguma do Estado.

Wilton: Júlio aqui nós temos seis meses de estudo só de Narcisismo no grupo, é uma disciplina e grupo operativo, tem um ano.

Júlio: Olha aí, vocês têm um curso muito forte, a gente tem que entender porque que essa cidade cresceu tanto, entendeu? Muito mais do que São Paulo, mais do que a gente lá do Rio, mais antigo...

Franklin: Sobre isso que eu gostaria de falar uma coisa, que eu acho que é fundamental que se fale, eu assumi uma postura neste nosso curso de grupo que eu não sei se os outros professores entenderam, mas eu, pelo menos, tenho uma noção muito clara, para mim, eu faço um grupo de reflexão no primeiro ano e no segundo ano, e eu percebi o seguinte, que nenhum outro relacionamento além das instituições, além dos professores aqui, existe uma crise violenta, uma violência enorme, uma briga, desentendimento, uma guerra que não tem tamanho, então o grupo de reflexão tem um papel fundamental para que o aluno consiga entender porque que ele briga com o professor, porque que ele briga com a instituição.

Júlio: Coisa fundamental. Isso é Psicopedagógico e é terapêutico, ao mesmo tempo.

Franklim: Porque que ele cria esse atrito violento! Wilton: Ele vive a experiência grupal.

Franklin: Quando ele começa a entender isso, ele consegue elaborar um pouco isto, eu faço isso no primeiro e no segundo ano, aí ele fica para o segundo ano, ele não abandona o primeiro ano.

Júlio: Olha, meu querido, eu vou fazer um aparte que está na hora, eu estou organizando um Congresso de Psicopedagogia e se você tiver experiência , naturalmente, em psicopedagogia também, para trazer, eu estou convidando, e eu já vou lhe convidar direto e você vai falar deste grupo, experiência que você tem de grupo em São Paulo no primeiro e no segundo ano, é fundamental isso, mal está começando a se fazer no Brasil.

Onildo: Numa Associação de Psicoterapia Analítica de Grupo!

Franklin: Veja, porque eu acho isso, já me disseram o seguinte: “Não. Você não precisa fazer grupo de reflexão, porque eles vão fazer análise pessoal, só que não vão.

Júlio: “Ai meu Deus”, que brincadeira ele está dizendo.

Franklin: Não, é porque o cara fica no primeiro ano, ele não vai fazer análise pessoal, ele fica no primeiro ano e ele, muitas vezes, ele fica só fazendo curso teórico, não vai nem para supervisão, nem para análise pessoal.

Júlio: Olha, eu hoje em dia faço uma brincadeira com meu alunos, baseado em Perestelo. Perestelo tinha um assistente dele que chegava e dizia: “Perestelo, entrei em análise, você é o analista” e ele dizia: “Ai, Deus me livre! Não podia me dar notícia pior”.Porque ele queria que todo mundo ficasse onde estava, sem fazer análise, sem ser analista, análise ainda vá lá, e pudesse desenvolver seu caminho né? Um protologista, era o que nós todos desejamos, como isso é difícil, eu realmente faço... estou fazendo

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análise pessoal, “Deus me livre!, meus pêsames, precisou de análise, muitas vezes, sem precisão, “meus pêsames!”, faz essa brincadeira pra ver se o pessoal não entra em análise, assim, sem necessidade. É sério, aí se der toda experiência, “Deus me livre!”isso Davanzo teve isso, uns pontos negativos, com tudo de bom que ele tinha, mas todo mundo tinha, na década de cinqüenta tinha né? Isso se chama idealização né? A gente não quer que todo mundo pertença à Sociedade de Psicoterapia Analítica, todo terapeuta de grupo, a idealização já tive essa Behaviorista, não, de três em três meses vai lá, uma reunião dessas, uma conversa dessas. Psicoterapia de Grupo é muito amplo, pode até ter começado com a Psicoterapia Analítica de Grupo, em parte, Moreno não começou, entendeu? Levi também não começou, mas em parte começou, mas não é “costa grande” né? Isso é muito importante, a gente dizer isto, porque interessa a ideologia, entendeu? Eu adotei esta ideologia, não por prepotência, por idealização, entendeu? Nem narcisismo, idealização, a vontade de ser paizão, vou ajudar este pessoal todo, todo mundo do Rio de Janeiro faz Psicoterapia de Grupo, vai se relacionar com a gente, vai participar, mas é muito importante, por isso que nós estamos ficando aqui até esta hora, entendeu?

Onildo: Para definir isto aí, pelo menos na Sociedade de Psicoterapia de Grupo, eles chegam num acordo tácito... todo mundo que fez Psicoterapia Analítica de Grupo fala do Pratt, a Psicoterapia de grupo se considera que começou nos Estados Unidos, no hospital geral de Boston, no ambulatório, tratando com pacientes.

Franklin: 1905. Onildo: 1905.

Júlio: Aí eu discordo do Onildo, eu discordo uma única coisa que ele disse, ele foi brilhante, que você está em desenvolvimento de Pratts, não está p... nenhuma. É inteiramente diferente.

Wilton: Não, não está não, não, não foi isso. Júlio: Então entendi errado.

Onildo: O Pratts percebeu que colocando aquelas pessoas, que conversava,...

Wilton: Ele está apoiando idéia, está concordando... Onildo: Espera aí!

Wilton: A única discordância que eu tive é que o Pratts, não fez as seleções no Hospital, John Hephim que foi feita lá em Ribeirão Preto para pacientes não tratados, e o fenômeno foi o mesmo, então que esta seleção de preparar uma clientela para psicoterapia de grupo eu questiono, eu acho que a seleção acontece naturalmente.

Júlio: Mas você colocar um cara naifi no grupo ou que nem foi dito, Wilton: Não é diferente...

Júlio: “Ai meu Deus!” coloca um naifi no grupo, ele sai correndo, “pelo amor de Deus”.

Wilton: Não, é diferente , é diferente, tem uma coisa que você citou, o caso do psicopata, e alguns tipos de diagnósticos colocados no grupo, de pessoas que não têm condições de lidar. Eu tenho uma capacidade, realmente, para lidar, eu acho que é possível num grupo, colocar um psicopata, ou um psicótico, eu acho que não colocar muitos, porque estabelece um conluio, um subgrupo, fica difícil.

Júlio: É claro, você é muito corajoso, em colocar um. Bom, eu não gosto. Wilton: Eu acho que um é tolerável, depende do terapeuta, eu acho que tudo depende do terapeuta,...

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