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Dificuldade de aprendizagem e a formalização do conhecimento : Um olhar sobre o saber sistematizado

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Academic year: 2017

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Mestrado em Psicologia

DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM E A FORMALIZAÇÃO DO

CONHECIMENTO: UM OLHAR SOBRE O SABER SISTEMATIZADO

Virgínia Mello dos Santos

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Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Mestrado em Psicologia

DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM E A FORMALIZAÇÃO DO

CONHECIMENTO: UM OLHAR SOBRE O SABER SISTEMATIZADO

Virgínia Mello dos Santos

Dissertação

apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia, da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Psicologia.

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Agradecimentos

A minha orientadora, Profa. Dra. Tânia Rossi pelo cuidado e desvelo que me

dispensou, indicando a direção a ser tomada nas ocasiões de dificuldade e na árdua tarefa de

provar a minha capacidade de discernir e atender às exigências do trabalho.

À Profa. Dra. Sandra Francesca, pela confiança depositada em mim e as sugestões

oferecidas por ocasião da qualificação do projeto e finalização da pesquisa.

À Profa. Dra. Kátia Caiado, pela atenção, carinho e solicitude com que analisou o

trabalho, contribuindo com o produto final da pesquisa.

Ao Prof. Dr. Cristiano Muniz pela valiosa colaboração quando da construção da

rede de conceitos sobre o Sistema Monetário Brasileiro.

À Profa. Dra. Solange Amato pelo interesse em colaborar com a pesquisa ao

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Resumo

O objetivo deste estudo foi o de investigar se a estrutura de formalização do conhecimento científico ensinado na escola, nas séries iniciais, é indicador de dificuldade de aprendizagem, e se as concepções que o professor possui sobre desenvolvimento humano e aprendizagem e a compreensão da estrutura do conceito que ensina, influenciam na apresentação de conteúdos formalizados ao aluno. Para tanto, recorreu-se à abordagem histórico-cultural de Vygotsky, com a finalidade de compreender os processos desenvolvidos pela criança na construção de conceitos científicos e transformadores dos conceitos cotidianos. A teoria da atividade de Leontiev contribui no entendimento da aprendizagem, a partir das relações estabelecidas entre a criança e o contexto social em que vive. Estudo sobre estrutura de formalização de conceitos ensinados na escola constitui uma falha na literatura psicológica, especialmente quando se relaciona à dificuldade de aprendizagem. Para a efetivação do estudo, foi realizada uma pesquisa qualitativa envolvendo entrevista semi-estruturada obtida com 20 professores de 3ª. Série do Ensino Fundamental de escolas públicas do Distrito Federal, a fim de levantar suas concepções sobre aprendizagem e desenvolvimento. Um estudo de caso foi realizado desde o planejamento da aula até a execução de entrevista semi-estruturada com o professor regente acerca da avaliação de aprendizagem dos alunos, visando apreender os processos de ensino e aprendizagem gerados. As atividades de ensino, além de observadas, foram registradas em vídeo. As entrevistas e as observações foram submetidas à técnica de análise de conteúdo, e o registro em vídeo sujeitou-se à análise micro-genética. Os resultados apontaram que a dificuldade de aprendizagem pode ser gerada, dentre outros fatores, pela estrutura de formalização do conhecimento ensinado, quando o nível de generalização do conteúdo é absoluto e não degenerado, a ponto de se tornar incompreensível por quem aprende. Orientada na forma inversa, a estrutura de formalização pode gerar conhecimento, desde que o signo faça sentido para o aluno. Estudos sobre a estrutura de formalização do conhecimento contida na ação pedagógica e acerca da rede conceitual elaborada para a realização do estudo enquanto estrutura que viabilize a formação de processos pedagógicos sobre o sistema monetário foram sugeridos para se compreender a dificuldade de aprendizagem.

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Abstract

The objective of this study was to investigate if the structure of formalization of the taught scientific knowledge in the school, in the initial series, is indicating of learning difficulty, and if the conceptions that the teacher possesss on human development and learning and the understanding of the structure of the concept who teaches, influence in the presentation of legalized contents the pupil. For in such a way, the description-cultural boarding of Vygotsky was appealed to it, with the purpose to understand the processes developed for the child in the construction of scientific and transforming concepts of the daily concepts. The theory of the activity of Leontiev contributes in the agreement of the learning from the relations established between the child and the social context where it lives. Study on structure of formalization of concepts taught in the school it constitutes an imperfection in psychological literature, especially when one becomes related to the learning difficulty. For the realization of the study, a qualitative research was carried through involving interview half-structuralized gotten with 20 professors of 3ª. grade of basic teaching of public schools of the Distrito Federal in order to raise its concepcions on learning and development. A case study was observed since the planning of the lesson until the accomplishment of interview half-structuralized with the regent teacher concerning the evaluation of learning of the pupils, having aimed at to apprehend the processes of generated education and learning. The activities of education, beyond observed, had been registered in video. The interviews and the comments had been submitted to the technique of content analysis and the register in video subjected it the analysis micron-genetics. The results had pointed that the learning difficulty can be generated, amongst other factors, for the structure of formalization of the taught knowledge, when the level of generalization of the content is absolute and not depraved, I point of if to become incompressible for who learns. Guided in the inverse form, the formalização structure can generate knowledge, since that the sign makes sensible for the pupil. Studies on the structure of formalization of the knowledge contained in the pedagogical action and concerning the elaborated conceptual net for the accomplishment of the study while structure that makes possible the formation of pedagogical processes on the monetary system had been suggested to understand the learning difficulty.

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SUMÁRIO

ÍNDICE DAS FIGURAS x

ÍNDICE DAS TABELAS xi

INTRODUÇÃO 1

CAPÍTULO 1 – REFERENCIAL TEÓRICO 3

1.1Revisão de Literatura

1.1.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM 3

1.1.2 EPISTEMOLOGIA DA ESTRUTURA DO CONHECIMENTO 11

1.2 Pressupostos Teóricos 14

1.2.1 A FORMALIZAÇÃO DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO 14

1.2.2 A TEORIA DA ATIVIDADE 20

1.2.3 O CONCEITO DE MEDIAÇÃO SEMIÓTICA EM VYGOTSKY 25

1.2.4 A RELAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM 28

1.2.5 REDE CONCEITUAL DO CONTEÚDO ESCOLAR SISTEMA

MONETÁRIO BRASILEIRO 32

1.2.5.1 Considerações do Prof. Dr. Cristiano Muniz sobre a Rede de

Conteúdos Formais 34

1.2.5.2 Considerações da Profª.Dra. Solange Amato sobre a Rede de

Conteúdos Formais 36

1.2.5.3 Rede Genética Conceitual do Conteúdo Sistema Monetário

Brasileiro 38

CAPÍTULO 2 – METODOLOGIA 41

2.1 Contextualização Metodológica 41

2.2 Descrição do Método 42

2.3 Método 43

2.3.1 PARTICIPANTES 43

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2.3.3 CARACTERIZAÇÃO DA ESCOLA DO ESTUDO DE CASO 44

2.3.4 INSTRUMENTOS 46

2.3.5 PROCEDIMENTOS 47

2.3.6 ANÁLISE DOS DADOS 50

CAPÍTULO 3 - RESULTADOS: ANÁLISE E DISCUSSÃO 52 3.1 Concepções de Desenvolvimento e Aprendizagem

3.1.1 DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM DO CONTEÚDO 52

3.1.1.1 Os conteúdos ensinados interferem no desenvolvimento do aluno? 52

3.1.1.2 O que é desenvolvimento? 54

3.1.1.3 Conteúdos interferem no desenvolvimento do aluno X conceito de

Desenvolvimento 54

3.1.1.4 O que é aprendizagem? 55

3.1.1.5 Conteúdos interferem no desenvolvimento do aluno X conceito

de aprendizagem 56

3.1.1.6 Como você sabe que a criança aprendeu o conteúdo? 58 3.1.1.7 Conteúdos interferem no desenvolvimento X identificação da

aprendizagem do conteúdo 59

3.1.1.8 Que funções a aprendizagem deveria ter? 60

3.1.1.9 O que é aprendizagem X funções que a aprendizagem deveria ter 61 3.1.1.10 Conteúdos interferem no desenvolvimento X funções da

aprendizagem 62 3.1.1.11 Quais os motivos que dirigem a aprendizagem dos alunos? 63

3.1.1.12 Funções que a aprendizagem deveria ter X motivos que dirigem a

aprendizagem 65 3.1.1.13 O que é aprendizagem X motivos que dirigem a aprendizagem 66

3.1.2 DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM 67

3.1.2.1 Características da dificuldade de aprendizagem 67 3.1.2.2 Características da dificuldade de aprendizagem X motivos que

dirigem a aprendizagem 69

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3.1.2.4 Alunos com dificuldade de aprendizagem 70 3.1.2.5 Modo de funcionamento do aluno com dificuldade de aprendizagem

diante de um conteúdo a ser aprendido (como os alunos reagem) 71 3.1.2.6 Características da dificuldade de aprendizagem X modo de

funcionamento do aluno com dificuldade de aprendizagem 72 3.1.2.7 Intervenção junto ao aluno com dificuldade de aprendizagem 73 3.1.2.8 Modo de funcionamento X intervenção ao aluno com dificuldade

de aprendizagem 74

3.1.2.9 Características da dificuldade de aprendizagem X intervenção ao

aluno com dificuldade de aprendizagem 75

3.1.3 PROCEDIMENTOS DE ENSINO 75

3.1.3.1 Procedimentos para introduzir um conceito novo em sala de aula 75 3.1.3.2 Como as crianças com dificuldade de aprendizagem deveriam

proceder para que aprendessem o conteúdo ensinado? 78

3.1.3.3 Procedimentos para introduzir um conceito novo X procedimentos do aluno com dificuldade de aprendizagem diante do conteúdo a ser

aprendido 78 3.1.3.4 Recurso utilizado pelo professor na elaboração do Plano de Ensino 79

3.1.3.5 Estrutura do Plano de Aula 81

3.1.3.6 Material utilizado na elaboração do Plano de Aula 81 3.1.3.7 Procedimentos para introduzir um conceito novo X material utilizado

na elaboração do Plano de Aula 82

3.1.3.8 Conhecimentos prévios necessários para o ensino do conteúdo

Sistema Monetário Brasileiro 84

3.1.3.9 Procedimentos para introduzir um conteúdo novo X conhecimentos Prévios necessários para o ensino do conteúdo Sistema Monetário

Brasileiro 85 3.2 Desenvolvimento e Aprendizagem na Estrutura de Formalização do Conceito 86

3.2.1 ESTUDO DE CASO 86

(9)

3.2.1.3 Observação focada no aluno – registro em vídeo da aula 95

3.2.1.4 Avaliação de aprendizagem focada no aluno 105

3.2.1.5 Entrevista final focada no aluno e no professor 108

CONSIDERAÇÕES FINAIS 112

REFERÊNCIAS 118

ANEXOS 122

(10)

ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1 Rede de Conteúdos Formais 33

Figura 2 Rede Genética de Conceitos 36

Figura 3 Rede de Conceitos Formais 38

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ÍNDICE DE TABELAS

Tabela 1 Conteúdos interferem no desenvolvimento X conceito de desenvolvimento 55 Tabela 2 Conteúdos interferem no desenvolvimento X conceito de aprendizagem 57 Tabela 3 Conteúdos interferem no desenvolvimento X identificação de aprendizagem

do conteúdo 60

Tabela 4 O que é aprendizagem X funções que a aprendizagem deveria ter 62 Tabela 5 Conteúdos interferem no desenvolvimento X funções que a aprendizagem

deveria ter 63

Tabela 6 Funções que a aprendizagem deveria ter X motivos que dirigem a

aprendizagem 65 Tabela 7 O que é aprendizagem X motivos que dirigem a aprendizagem 67

Tabela 8 Características da dificuldade de aprendizagem X motivos que dirigem

a aprendizagem 69

Tabela 9 Características da dificuldade de aprendizagem X modo de funcionamento

do aluno com dificuldade de aprendizagem 73

Tabela 10 Modo de funcionamento X intervenção ao aluno com dificuldade de

aprendizagem 74 Tabela 11 Características da dificuldade de aprendizagem X intervenção ao aluno

com dificuldade de aprendizagem 75

Tabela 12 Procedimentos para introduzir um conceito novo e procedimento do

aluno com dificuldade de aprendizagem diante do conteúdo a ser aprendido 79 Tabela 13 Procedimentos para introduzir um conceito novo X material utilizado

na elaboração do Plano de Aula 82

Tabela 14 Procedimentos para introduzir um conceito novo X conhecimentos

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INTRODUÇÃO

A dificuldade de aprendizagem é um fenômeno que interpõe ao ato educativo, principalmente, no contexto escolar. A freqüência do não aprender é fato comum no cotidiano das escolas brasileiras de ensino fundamental, que pode levar ao fracasso escolar a partir da dificuldade da criança em apropriar-se do conhecimento que lhe é ensinado.

Dificuldade de Aprendizagem é uma expressão, genericamente utilizada, que se refere a um conjunto de dificuldades significativas na aquisição, no uso e na compreensão dos conhecimentos ensinados na escola. Diante da recorrência desse fenômeno, educadores, pais e os próprios alunos se sentem importunados e questionam o porquê do não aprender. Contudo, inúmeras causas têm sido apontadas como obstáculos para que ocorra a aprendizagem, a principal delas, o aluno, o culpado por seu próprio fracasso.

Almeida e cols. (1995) ressaltam que a relação ensinar-aprender e seus componentes permeiam, basicamente, toda a trama da instituição escolar. A escola é o ambiente onde o conhecimento científico sistematizado é disponibilizado e, por meio do qual, a criança organiza seu pensamento e administra as formas organizadas dos conceitos científicos, que passam a influenciar os conceitos do cotidiano. Entretanto, os conceitos do cotidiano, elaborados pela criança, estão impregnados por suas próprias experiências (Vygotsky, 1996), ou seja, a aquisição desses conceitos é o resultado da relação assistemática mediada entre a criança, o objeto a ser conhecido e o outro social.

Mas, para que o conceito científico possa cumprir seu papel, é necessário que aquele seja compreendido, não só pela criança, mas antes, por quem ensina. A estrutura e o nível de abstração deste conhecimento devem ser conhecidos pelo professor, que passa a perceber que o saber científico não é algo tão simples. O alto nível de generalização e abstração do conhecimento ensinado na escola, aliado ao fato de o professor não conhecer as especificidades da criança diante da própria estrutura do conhecimento, pode gerar dificuldade na aprendizagem.

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sujeitos às regras operatórias bem definidas. Quando se fala de formalização, quer dizer também realizar alguma coisa, segundo fórmulas ou formalidades. A formalização do conhecimento é o símbolo que resulta de uma teoria formada de signos. Desta forma, os níveis altos de generalidade e abstração do conhecimento contribuem para a estabilidade de significados visando à consolidação e solidez do conhecimento.

No cotidiano escolar, o conhecimento científico – revestido do conteúdo formalizado, as características da aprendizagem infantil e o significativo número de crianças portadoras de dificuldade de aprendizagem nas séries iniciais, aponta a essencialidade deste estudo em verificar se a formalização do conhecimento ensinado é determinante da aprendizagem. E, em que condições de aprendizagem a aquisição de conceitos pela criança é possível.

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CAPÍTULO 1 – REFERENCIAL TEÓRICO

1.1 Revisão de Literatura

1.1.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM

A dificuldade de aprendizagem trespassa o dia-a-dia da vida escolar de muitas crianças e, a despeito de inúmeros estudos realizados com o objetivo de encontrar suas causas, este é um fenômeno que ainda assola o cotidiano escolar. A literatura aponta que se trata de um fenômeno multicausal e que é necessário compreender a relação entre suas múltiplas causas e determinações.

Alguns estudos (por exemplo, Medeiros e col. 2000; Linhares, 1998; Marturano, Linhares & Parreira, 1993) alertam que não se pode perder de vista a presença de distorções inerentes ao próprio sistema educacional e às influências ambientais que funcionam como contexto para as manifestações comportamentais e as peculiaridades do indivíduo que pode apresentar, no sistema escolar, o sintoma de não aprender.

Silva (2002) e Almeida e cols. (1995) apontam que é fundamental entender o problema da dificuldade de aprendizagem e do fracasso escolar a partir de uma visão sistêmica, em que se considere o sistema no qual a criança está inserida, bem como as intra e inter-relações nele estabelecidas. Nesse contexto, ações pedagógicas que focalizem o planejamento de curso e a estrutura curricular podem auxiliar na prevenção e no combate às dificuldades escolares dos alunos.

Almeida e cols. (1995) afirmam que, na realidade, seria melhor referir-se a dificuldades no aprendizado, pois as dificuldades de aprendizagem são decorrentes de uma constelação de fatores de ordem pessoal, familiar, emocional, pedagógica e social que só adquirem sentido quando referidos à história das relações e interações do sujeito com seu meio, inclusive e, sobretudo, o escolar. A tentativa de precisar esse fenômeno conceitualmente gera, pois, expressões como dificuldade de aprendizagem ou dificuldades no aprendizado.

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expressões utilizadas para fazerem referência a um conjunto de dificuldades significativas na aquisição e no uso da compreensão dos conhecimentos ensinados na escola. Para Paín (1985), as dificuldades de aprendizagem são aquelas apresentadas ou só percebidas no momento de ingresso da criança no ensino formal.

Dificuldade de aprendizagem remete a outro fenômeno: o fracasso escolar. Um dos principais agravantes do fracasso escolar está na associação que vincula o insucesso escolar a outros comprometimentos (Medeiros e cols., 2000), como prejuízos de ordem emocional e comportamental (Graminha, 1994), dificuldades afetivo-sociais, relacionados ou não à escola e a alterações de processos cognitivos (Linhares e outros, 1993), problemas nas áreas de percepção, atenção, memória, associação e fixação de informações (Ross,1979).

Todavia, parece haver um relativo acordo de que, quando se trata especificamente da dificuldade de aprendizagem, o termo deve-se referir às crianças que freqüentam a escola e apresentam problemas de aprendizagem dos conteúdos escolares, afastada a possibilidade de serem portadoras de defeitos físicos, sensoriais, intelectuais ou emocionais (Medeiros e col. 2000; Linhares, 1998; Marturano, Linhares & Parreira,1993; Ross, 1979).

Vale ressaltar, entretanto, que o esforço de conceituação tem função apenas descritiva e não explica o problema. Ao designar-se alguém como portador de dificuldade de aprendizagem, tem-se a possibilidade de cessarem os esforços no sentido de ajudá-la, porque a designação é considerada como uma descrição e, ao mesmo tempo, explicação do problema.

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ressalta que as diversas diferenças individuais existentes criam diferentes formas de aprendizagem: aprendizagem discriminativa, por associação de pares, por determinação de relações; perceptiva e incidental que, quando identificadas e respeitadas, promoverão a aprendizagem.

Pain (1985) considera o problema de aprendizagem como um sintoma, pois o não-aprender não se configura como um quadro permanente, mas caracteriza-se como uma reação a uma descompensação e nenhum fator específico é determinante de seu surgimento. Por isso, a não-aprendizagem não significa o contrário de aprender e sim um sintoma de uma carência funcional da estrutura pessoal do sujeito. Fatores fundamentais precisam ser levados em consideração no diagnóstico de um problema de aprendizagem: fatores orgânicos específicos, psicógenos e ambientais, que se inter-relacionam.

Apesar dos conceitos de dificuldade de aprendizagem elencados revelarem diversas visões sobre o tema, a medicina também identifica a dificuldade de aprendizagem, caracteriza-a e formula definições que têm o poder de atingir cultural, social e psicologicamente o sujeito portador da dificuldade de aprendizagem. O profissional da saúde mental ao especializar-se em diagnosticar e tratar a dificuldade de aprendizagem necessitou padronizar, senão uniformizar teste e procedimentos de identificação da síndrome por meio de manuais médicos, tais como o DSM IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) e CID 10 (Código Internacional de Doenças - Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamentos).

A fronteira entre as categorias distúrbio e dificuldade de aprendizagem reside na existência da manifestação de subnormalidade geral na primeira e na sua inexistência na segunda. Quanto ao problema de aprendizagem, tal como o preceitua Pain (1985), tende a ser considerado inespecífico e difuso, pois pode contemplar ambas as características simultaneamente, ou apenas uma delas.

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Diante desse quadro e por tradição de se buscarem recursos na biologia ou na medicina ao se defrontarem com problemas do comportamento humano ainda não resolvido, é usual os profissionais da saúde mental utilizarem testes padronizados e critérios diagnósticos advindos do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM IV e da Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID 10 nos quais se encontram descrições clínicas e diretrizes diagnósticas.

Na visão sócio-histórica do desenvolvimento humano (Vygotsky, 1998), há concordância de que a possibilidade de aprender é uma função combinada de um aparato biológico e psicológico com funcionamento adequado e da garantia de condições sócio-culturais igualmente adequadas. Atendidos esses requisitos primários, não menos importantes são as características particulares das pessoas que aprendem que irão compor com as anteriores arranjos e combinações complexas. Dificuldades de aprendizagem indagam, necessariamente, o que é aprender.

Aprender é tomar conhecimento de alguma coisa. É reter na memória, mediante o estudo, a observação ou a experiência. Quem aprende se torna apto ou capaz dealguma coisa, em conseqüência de instrução recebida (Ferreira, 1995). Esse significado dicionarizado apresenta um processo que envolve a recordação de um material ou conteúdo, que foi retido na memória por intermédio do estudo, da observação, da experiência da pessoa ou de instrução (causa). Admite, pois, que haja um esforço do sujeito para aprender e/ou de alguém encarregado da instrução.

Dessa capacidade de evocação deverá ocorrer uma mudança de comportamento, a ser revelada em forma de capacidade ou aptidão de realização de algo (efeito). Ainda que não esteja atrelada a correntes psicológicas específicas, essa formulação pode ser considerada sócio-cultural já que pressupõe a existência de um objeto a ser conhecido, de um sujeito que o conhecerá e de um terceiro a quem caberá instruir para que a aprendizagem se efetive. Em outras palavras, um mediador atravessa a relação do sujeito cognoscente com o objeto cognoscível, tornando-a indireta.

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reação a uma ação ao aprender, transcende a mera aparência fornecida pela evocação do material aprendido, mesmo que a aprendizagem se mostre na ação.

Ao mencionar a reação ou efeito em resposta a alguma ação ao aprender qualquer operação particular, o ato de aprender ocorre quando o sujeito adquire a capacidade de construir determinada estrutura específica, independentemente da variação da matéria com que trabalha e independentemente dos diferentes elementos que constituem essa estrutura. O aprendizado é, assim, mais do que a aquisição de capacidade para recordar ou pensar; é a aquisição de muitas capacidades especializadas para pensar sobre várias coisas.

O aprendizado não altera a capacidade global de focalizar a atenção em um só elemento da aprendizagem, em vez disso, desenvolve outras capacidades de focalizar a atenção sobre várias coisas. Em decorrência, o processo de aprendizagem suplanta a mera atuação apenas para formar hábitos e demanda uma atividade de natureza intelectual que permite a transferência de princípios estruturais implícitos na execução de uma tarefa para outra série de tarefas diversas.

O aprendizado humano para Vygotsky (1998), pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual o sujeito penetra na vida intelectual daquelas que as cercam. Por isso, a aprendizagem é um momento intrinsecamente necessário e universal para que se desenvolvam as características humanas não-naturais mas, formadas historicamente.

Os estudos realizados por Vygotsky (1998), de acordo com a abordagem sócio-histórica sobre o desenvolvimento cognitivo, incluíam a investigação do efeito da instrução escolar formal sobre o desenvolvimento do pensamento. A instrução era vista fundamentalmente diferente da aprendizagem espontânea no contexto cotidiano. A estrutura da aprendizagem escolar proporciona o tipo de experiência cultural na qual os processos psicológicos superiores, tais como atenção voluntária e a memória lógica são formados.

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Dessa forma, pode se falar, descritivamente, que há condições externas e internas da aprendizagem. A condição externa refere-se aos estímulos que o sujeito recebe do meio, estímulos que constituem legítimas influências socioculturais, imanente à construção da aprendizagem. Já as condições internas se dividem em três planos inter-relacionados: o primeiro, faz referência ao corpo, como estrutura neurofisiológica que se usa para aprender; o segundo, refere-se a condições cognitivas de aprendizagem – estruturas orgânicas capazes de organizar os estímulos do conhecimento; e o terceiro, está ligado à dinâmica do comportamento – o efeito ou mudança do comportamento.

A este último plano que sustenta as condições internas da aprendizagem, Paín adiciona a atuação fundamental da afetividade, do desejo e das estruturas inconscientes que compõem o curso da aprendizagem. Por este aspecto, aprender implica, além de uma estrutura psíquica objetivante - lógica e intelectual, outra subjetivante – simbólica e carregada de desejo. A dimensão afetiva compõe um todo orgânico com a cognição.

Enquanto as condições externas ao indivíduo definem o campo do estímulo, as condições internas definem o sujeito. Se estas condições estiverem minimamente satisfeitas, então a aprendizagem efetivamente acontecerá e será mais rápida quanto maior for a necessidade do sujeito, pois aquilo que o compele de modo absoluto a aprender é compensado pela aprendizagem real.

Pain (1985) admite que a aprendizagem e o ensino são processos intimamente ligados entre si. Essas atividades fundamentais, quando se trata do conhecimento científico sistematizado, ocorrem dentro da escola, de forma planejada e deliberada. Os resultados da aprendizagem são revelados pelo indivíduo que aprende, expresso por meio de manifestações externas e internas, que muitas vezes denunciam o sucesso ou o fracasso da aprendizagem.

(20)

Este modo, a transferência de princípios, consiste em aprender de início, uma idéia geral, que pode depois servir de base para reconhecer problemas subseqüentes como casos especiais da idéia adquirida. Bruner afirma que esse tipo de transferência está no âmago do processo educativo – a contínua ampliação e aprofundamento do saber em termos de idéias básicas e gerais. Contudo, a continuidade da aprendizagem produzida por este tipo de transferência está na dependência de como se domina a estrutura da matéria estudada, ou seja, deverá o aprendiz ter em mente, com clareza, a natureza geral do fenômeno com que está lidando.

Uma definição filosófica é encontrada em Abbagnano (1982), para quem a aprendizagem é efeito de uma técnica qualquer, simbólica, emotiva ou de comportamento que resulta em mudança nas respostas de um organismo ao ambiente de forma a melhorá-las, tendo em vista a conservação e o desenvolvimento do próprio organismo. A operação cognitiva dirige-se a um objeto e tende a instaurar, com o próprio objeto, uma relação da qual venha a emergir uma característica efetiva deste.

Conhecer, para o mesmo autor, é uma modalidade de verificação ou participação do sujeito na apreensão ou construção do objeto a ser conhecido, ou seja, espécie de “reminiscência”, associação das coisas entre si pela qual o espírito ou o organismo pode, após haver captado uma coisa, captar também outra que a esta se encontra vinculada. A aprendizagem emanaria de uma relação direta do sujeito que conhece (corpo e espírito já aptos, por natureza, a conhecer) com o objeto a ser conhecido (que conteria as propriedades a serem impressas no sujeito).

Abbagnano (1982) declara que a definição filosófica de aprendizagem é considerada pela psicologia moderna, apesar de uma variedade de teorias a respeito. Piaget (1974), por exemplo, ao focalizar o desenvolvimento das estruturas lógicas, afirma que aprendizagem - distinta da maturação - é um processo adaptativo que se desenvolve no tempo, em função das respostas dadas pelo sujeito a um conjunto de estímulos anteriores e atuais. Os estímulos são concebidos como percepções e sinais. As respostas são movimentos, atos e trabalhos e a ligação entre os estímulos e a resposta, concebida como uma construção.

(21)

enquanto se processa, mas somente depois que se realiza. Não é um comportamento, mas uma alteração de comportamento formada por um sistema de fases inter-relacionadas. Para o autor, aprendizagem nada mais é do que a designação que adotamos quando observamos aumento de especialização ou de conhecimento.

Ancorado na teoria da comunicação, Drouet (1990) segue a mesma linha de raciocínio e define aprendizagem como parte de um processo social de comunicação, composto por elementos básicos: comunicador ou emissor (o professor); mensagem ou conteúdo; receptor da mensagem (o aluno); e o meio ambiente, onde acontece a aprendizagem. A falha em qualquer desses elementos pode gerar obstáculos na comunicação, o que poderá causar problemas na aprendizagem.

Há um conjunto de fatores que promovem a aprendizagem que constitui a chamada “prontidão para aprendizagem”. Para que a aprendizagem ocorra, o sujeito deverá ter: saúde física e mental; motivação; domínio de determinados pré-requisitos; maturação; inteligência; concentração ou atenção e memória. Drouet condiciona a aprendizagem ao amadurecimento da criança sob os aspectos: intelectual – estágio de desenvolvimento da inteligência; afetivo-social – (capacidade de adaptação) e sensório-psiconeurológico – estimulação do meio e fatores orgânicos.

Bruner (1976) entende que a idéia de “prontidão” é um tanto perigosa para o ensino, principalmente porque se tem ensinado a prontidão, ou criado oportunidade para estimulá-la sem se limitar a esperar por ela. Assim, a prontidão consistiria em dominar as habilidades elementares que permitissem atingir as superiores. O ensino consistiria num programa voltado para desenvolver no aluno os pré-requisitos necessários à aprendizagem, ou seja, especializa-se o ensino com o objetivo de tornar o aluno pronto para aprender.

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Enquanto conceito nuclear, a aprendizagem constitui um dos temas centrais da psicologia educacional e importante foco de atenção na área do conhecimento. As tentativas de sua definição ensejam tradições epistemológicas e, não raro, abrem portas para formulações teóricas distintas.

1.1.2 EPISTEMOLOGIA DA ESTRUTURA DO CONHECIMENTO

Segundo Japiassu (1977), a epistemologia procura estudar a condição de possibilidade de produção do conhecimento, tanto do ponto de vista lógico, quanto dos pontos de vista sociológico, lingüístico e ideológico, mas é um conceito empregado de modo bastante flexível. Essa flexibilidade vai variar de acordo com os pressupostos filosóficos ou ideológicos dos autores, em conformidade com os países e os costumes.

O conceito de epistemologia, para Japiassu (1977), designa ora uma teoria geral do conhecimento; ora estudos mais restritos que interrogam sobre a gênese e a estrutura das ciências, tentando descobrir as leis de crescimento dos conhecimentos. Pode-se referir a uma análise lógica da linguagem científica ou ainda examinar as condições reais de produção dos conhecimentos científicos. Para o autor, qualquer que seja a acepção que se der para o termo epistemologia, a verdade é que ela não pode e nem pretende impor dogmas aos cientistas. O papel da epistemologia é de investigar a gênese e a estrutura dos conhecimentos científicos, ou mais precisamente, de tentar pesquisar as leis reais de produção desses conhecimentos.

Epistemologia, sob o aspecto semântico é a teoria ou ciência da origem, natureza e limites do conhecimento científico, apesar de haver controvérsias. Canguilhem, citado por Machado (1981), definiu a epistemologia como histórica e, ainda, como uma consciência crítica dos métodos de um saber adequado a seu objeto. Por isso, epistemologia é uma investigação sobre os procedimentos de produção de um conhecimento, considerando os aspectos históricos que justificam a definição do objeto de estudo. Admitindo-se que as ciências nascem e evoluem em circunstâncias históricas e determinadas, cabe à epistemologia perguntar-se sobre as relações existentes entre a ciência e a sociedade, entre a ciência e as instituições científicas, entre as diversas ciências.

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funções clássicas: a primeira é a de situar o lugar do conhecimento científico dentro do domínio do saber; a segunda diz respeito ao estabelecimento dos limites do conhecimento científico já que este não pode tudo conhecer; e a terceira refere-se à busca da natureza da ciência. Sua função essencial é submeter à prática dos cientistas a uma reflexão das ciências em via de se fazerem, em seu processo de gênese, de formação e de estruturação progressiva.

Para Japiassu (1977), as indagações epistemológicas encontram relação com a aprendizagem do conhecimento escolar, visto que é, na escola, que o conhecimento científico sistematizado é socializado e aprendido. Neste ponto, aprender pressupõe um problema central da epistemologia: saber se o conhecimento poderá ser reduzido a puro registro dos dados anteriormente organizados pelo sujeito ou se o sujeito poderá intervir no conhecimento do objeto.

Ao se firmar uma posição relativamente a este problema, tem-se duas vertentes ou categorias distintas de sistematização da construção do conhecimento. De um lado, as epistemologias genéticas, em que o acordo entre sujeito e objeto deverá ser estabelecido progressivamente. O conhecimento deve ser analisado do ponto de vista dinâmico e em sua estrutura evolutiva.

De outro lado, têm-se as epistemologias não-genéticas em que o acordo entre sujeito e objeto deve ser feito desde a origem, não sendo aceita a perspectiva histórica. O conhecimento deve ser estudado do ponto de vista estático e em sua estrutura atual. Em cada uma dessas categorias há subclasses que se organizam conforme o acordo interposto entre o sujeito e o objeto.

Há posições idealistas em que o sujeito antecede o objeto; tem primazia sobre ele e, ao sujeito, de per si, cabe a tarefa de conhecer. Já para as posições materialistas mecanicistas, o objeto se impõe ao sujeito e se dá a conhecer, com primazia do objeto sobre o sujeito. Um acordo denominado “solução de compromisso” preconiza que conhecimento advém da interação entre o sujeito e objeto. Atualmente as epistemologias consideradas mais significativas adotam essa última formulação.

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escola, ou ainda a responsabilidade recai sobre o professor cuja formação é considerada precária a ponto de não alcançar sucesso no ensino (Patto, 1991).

Pretende-se, neste estudo, focalizar a interação entre a criança (sujeito que aprende) e o objeto (conhecimento a ser aprendido) e, considerando a impossibilidade de conhecer o real diretamente enquanto sujeito, e sim por meio de um sistema simbólico que representa a realidade, outra dimensão será pontuada, a intervenção do outro social que, ao mediar o conhecimento, atribui significações e possibilita ou não compreensão e internalização do que deve ser aprendido. Tem-se, neste ponto, a imbricação no ato de ensinar-aprender, dos aspectos relacionados ao sujeito, ao objeto e ao processo mediacional a que o sujeito é exposto.

Em se tratando de conhecimento científico, a escola é o ambiente onde ocorre sua sistematização de modo a torná-lo compreensível à criança. As formas organizadas dos conceitos científicos, uma vez apreendidas, interferem com os conceitos formados no cotidiano, conceitos estes impregnados por suas próprias experiências. Entretanto, o processo de educação escolar é qualitativamente diferente do processo de educação em sentido amplo. Segundo Vygotsky (1996), na escola, a criança está diante de uma tarefa particular, cujo objetivo é entender as bases dos estudos científicos, ou seja, entender um sistema de concepções científicas. O domínio deste conhecimento a tornará apta a compreender a complexidade do mundo que a cerca.

Mas, para que o conceito científico possa explicar o conceito cotidiano é necessário que aquele seja organizado de modo a possibilitar o entendimento das relações entre os conceitos ordenados e subordinados que lhe estão subjacentes. Ainda que seja, em primeira instância, apresentado com um alto grau de abstração, a estrutura de formalização com que o conceito será expresso e os processos mediacionais que darão acesso aos conceitos ordenados e subordinados merecem ser investigados. Em acréscimo, o conceito deverá ser compreendido, primeiro, por quem ensina. A estrutura e a forma de abstração deste conhecimento devem ser conhecidas pelo professor.

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matéria que ensina. Professores, relativamente bem preparados, não têm oportunidade para aprender suas matérias daquele modo especial que vem do exercício de ensiná-la. Pois ensinar é um meio admirável para aprender-se.

Se estas acepções são verdadeiras, então ensinar o saber científico não é algo simples. A dificuldade de aprendizagem pode ser gerada pela estrutura de generalização e abstração do conhecimento ensinado, aliado ao fato de o professor não conhecer adequadamente o conteúdo e as especificidades da criança diante do conhecimento. As atividades de ensino a que se dedica podem revelar suas concepções de desenvolvimento e aprendizagem e explicar os processos mediacionais de que se vale na relação de ensino.

As concepções são modalidades de representação de um dado objeto ou fenômeno que exprimem as crenças, valores e atitudes em relação a estes. São constituídos socialmente e servem de base às práticas sociais.

Diante do que foi argumentado, indagar se a estrutura de formalização do conhecimento a ser ensinado pelo professor, pode dificultar a aprendizagem do aluno, tendo como suporte a identificação da estrutura de formalização do conteúdo a ser ensinado, por intermédio das relações que o professor estabelece entre conceitos subordinados e ordenados do conteúdo e seus níveis de generalização/abstração, pressupõe identificar se a estrutura de formalização do conhecimento científico, mais especificamente, do conceito de Sistema Monetário Brasileiro, pode gerar dificuldades de aprendizagem em alunos da 3ª. Série do ensino fundamental, conteúdo selecionado como foco deste estudo, sistematizado e ensinado na escola.

1.2 Pressupostos Teóricos

1.2.1 A FORMALIZAÇÃO DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO

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Este nível de convencionalidade é o resultado do processo de construção do conhecimento. Quando se estuda ciência exata, principalmente, procura-se apropriar de acumulações organizadas de informações. Estas acumulações não são a ciência em si mesma, mas, os produtos dela, segundo Skinner (1998). A organização dos conceitos que dá forma a um determinado conhecimento denota o grau de abrangência do conceito.

Vygotsky (2001) diz que um conceito é mais do que um simples hábito mental, mas um ato real e complexo de pensamento. É, em termos psicológicos, um ato de generalização. Para a aquisição do conceito, é necessário o desenvolvimento de funções psicológicas superiores que vão permitir não apenas a memorização e assimilação simples do conceito. Do ponto de vista psicológico, há total inconsistência da concepção, segundo a qual os conceitos são apreendidos pela criança em forma pronta no processo de aprendizagem escolar e assimilado da mesma maneira como se assimila uma habilidade intelectual qualquer.

A estrutura de formalização do conhecimento, normalmente, não tem sido considerada ao se estudar a dificuldade de aprendizagem, a não ser lato sensu. O conhecimento, na forma como se apresenta, ou seja, revestido do rigor científico e representado simbolicamente, pode estar sendo ensinado à criança sem as devidas adaptações a seu contexto histórico-cultural e sem o devido reconhecimento dos processos que ela percorre para aprender os conceitos científicos.

O conceito científico é definido pela abordagem de Vygotsky (1996) como conceito adquirido por meio do ensino, como parte de um sistema organizado de conhecimentos, particularmente relevantes nas sociedades letradas, onde as crianças são submetidas a processos deliberados de instrução escolar no decorrer. Entretanto, as crianças, antes de entrar na escola ou quando estão fora dela, são capazes de desenvolver conceitos cotidianos ou espontâneos, que são conceitos desenvolvidos no decorrer da atividade prática da criança, de suas interações sociais imediatas.

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o nível categorial, próximo àquele expresso pelo professor. E quebrar a estrutura rígida do conhecimento já formalizado a ponto de torná-lo passível de ser internalizado, requer investimentos no lócus simbólico que se interpõe entre intersubjetividades. Requer que o professor conheça sua própria lógica, a lógica e o modo de funcionamento do aluno, no ato de ensinar e aprender.

Paulovich (1998) admite que os conceitos matemáticos são bons exemplos de conceitos científicos; possuem uma hierarquização que possibilita verificar que eles fazem parte de um sistema a ser submetido à consciência e ao controle deliberado do indivíduo. Estudos específicos a respeito da aquisição de conceitos científicos, especialmente referentes ao ensino da Matemática, têm suscitado discussões no que concerne à assimilação de formas conceituais rígidas.

Resultados de pesquisas do ensino da Matemática, em alunos de 6ª. Série do ensino fundamental, realizado por Vasconcelos (2000), por exemplo, tentam mostrar que, apesar dos avanços da ciência, os professores continuam utilizando métodos ultrapassados que impossibilitam a aprendizagem, principalmente no que se refere ao distanciamento entre a ciência matemática sistematizada e a matemática utilizada cotidianamente. Este fenômeno se deve às limitações na formação do professor, a qual só o preparou para “ensinar” e esperar do aluno apenas a reprodução do que foi ensinado. Para a autora, a atitude do professor dos pontos de vista ético, humano, pedagógico e científico, determina o sucesso educativo do aluno e possibilita ou não que o professor estimule a construção do conhecimento matemático.

O formalismo da matemática é responsável pela reduzida articulação entre a ciência e a vida, causando um problema de significação. A mensagem matemática, segundo Vasconcelos, é veiculada de tal forma e espartilhada pela simbologia que não permite a captação de sua essência. Assim, a forma/meio suplanta de longe o significado/fim, tornando-se obstáculo à compreensão. Afirma, ainda, que ultrapassar essa dificuldade e inadequação do ensino da Matemática implica modificações de suas finalidades, conteúdos e métodos.

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promover a resolução de problemas com a aplicação da matemática. O anseio de tornar significativo o conteúdo ministrado na escola não deve, entretanto, ser confundido com sua utilidade imediata (de ordem pragmática). Antes, devem-se buscar níveis mais elevados de reflexão que revelem os pressupostos, os resultados, a utilização, o lugar, o alcance, os limites e a significação sócio-cultural do conhecimento científico.

Os cientistas elaboram o conhecimento científico, e os sistemas de educação selecionam o que deve ser ensinado pelo professor nas escolas. Os próprios cientistas interrogam sobre sua responsabilidade social e também a dos técnicos, no que diz respeito ao significado real da ciência a partir do poder atribuído ao conhecimento científico e não no saber como tal (Japiassu, 1977). Paira cada vez mais uma suspeita sobre o número crescente de conseqüências do desenvolvimento científico: a degradação das relações individuais nas sociedades industrializadas, a utilização das pesquisas científicas para fins destruidores, a possibilidade de manipulação crescente dos indivíduos, a utilização dos cientistas e de seus produtos para fins repressivos e outras formas danosas de emprego da ciência.

A formalização dos conteúdos científicos e sua forma de apresentação nas escolas podem estar falando acerca de uma de suas significações básicas, manifestas como um poder onipotente, como um saber mágico, intervindo em todos os domínios da vida. Para Japiassu (1977), a verdadeira significação da ciência não reside mais no saber enquanto tal, mas no poder que a ele confere e é na experiência de seu próprio poder que a ciência se constitui como saber.

Isto se aplica não só aos conceitos ensinados nas escolas, cujo caráter cada vez mais operatório pressupõe sempre uma experimentação, como também às teorias, pois estas só são reconhecidas como verdadeiras na medida em que são verificadas pela experiência, operacionalmente, tanto sob o aspecto intrínseco à própria teoria, na medida em que resolve equações ou fazendo e funcionar operadores, quanto sob o aspecto experimental, quando constrói dispositivos experimentais e fazendo medidas. Por esta razão, na ciência, não se distingue mais a consciência do saber da consciência do poder, porque conhecer cientificamente consiste em saber que se sabe fazer. O poder do conhecimento já se transformou em conhecimento do poder.

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– a verdade e suas maravilhas tecnológicas), sendo por isso que a ciência exerce fascinação e poder sobre a mentalidade do homem comum. A ciência, do ensino fundamental ao meio universitário, é ensinada em uma língua hermética e incompreensível, em que só os especialistas estão habilitados a tomar decisões, pois só eles sabem e só têm valor seus pareceres. A verdade se identifica com o conhecimento científico, pois é objeto de conhecimento, aquilo que pode ser repetido em condições de verificação experimental.

A forma como este conhecimento sistematizado é disponibilizado, especialmente em relação a sua estrutura de formalização e cientificidade comparada ao contexto no qual se manifesta, pode ser um elemento que dificulta a compreensão e assimilação deste conhecimento. Diante disso, não se pode perder de vista como esse conhecimento foi concebido, especialmente sob os aspectos histórico, cultural e ideológico, identificando a origem, a função, os limites e os alcances deste saber. São estes os pressupostos e os condicionamentos socioculturais de qualquer atividade científica e também de seu ensino.

Japiassu (1977) afirma que a trajetória de uma descoberta científica de seu ponto inicial até os resultados considerados relevantes e sistematizados é inversamente proporcional ao esforço de apresentação dessa descoberta na escola. Ao cientista é dada a oportunidade de gerar hipóteses, experimentar, refletir e construir o conhecimento científico, para posteriormente, sistematizá-lo de maneira formalizada. Caberá à criança em idade escolar reproduzir, em exíguo espaço de tempo, toda essa trajetória, de maneira abstrata e, em seguida, realizar generalizações que permitam a transferência do conhecimento para as atividades gerais da vida. Pode-se afirmar que, mesmo soando absurdas, as escolas assim funcionam e continuam formando novos cientistas e promovendo a socialização do conhecimento científico. Mas, seguramente, não é uma escola para todos e em que todos têm a oportunidade de aprender e de se desenvolver.

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Ora, conhecimento científico e tecnológico não são entidades gerais que povoam consciências amorfas, ao contrário, existem sistemas específicos que possuem a propriedade de influir sobre as pessoas e dotar suas consciências de forma e conteúdos específicos. Mas, a consciência é constituída no embate da criação, compreensão e transformação da realidade física e social na qual a pessoa está imersa. Em decorrência, a atividade e a organização da consciência são determinadas por essa realidade. Trata-se de um fenômeno há muito explicitado por Vygotsky (2001), para quem os fenômenos psicológicos possuem natureza histórico-cultural; são modelados pela atividade humana, servem de orientação, transformação e reestruturação da própria realidade. As funções psicológicas superiores tais como, abstração e generalização, raciocínio e resolução de problemas são funções interdependentes e mutáveis da consciência, processos que se constituem e se desenvolvem em atividades concretas e práticas.

A gênese e o desenvolvimento do pensamento abstrato se dão, pois, na vida social. As sociedades produtivas exigem uma consciência geral mais sofisticada e aguda para participar de formas sociais e econômicas mais sistemáticas e complexas. Esta capacidade de generalizar e desenvolver o pensamento abstrato será possível se a aprendizagem for adequada a ponto de levar o sujeito à compreensão geral da estrutura de determinada matéria ou conteúdo.

Bruner (1973) diz que captar a estrutura da matéria de ensino em estudo é compreendê-la de modo que permita relacionar, de maneira significativa, muitas outras coisas com ela. Aprender estrutura, em suma, é aprender como as coisas se relacionam. Como exemplo, o ensino da álgebra em Matemática. As três propriedades implicadas no trabalho com equações são comutação, distribuição e associação. Uma vez que o aluno capte as idéias contidas nessas três propriedades, está em condições de reconhecer em que casos novas equações a resolver não são de modo algum novas, mas apenas variações sobre um tema familiar. Saber os nomes formais dessas operações é menos importante, para a transferência, do que ser capaz de aplicá-las.

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compreendê-los e explicá-los e se estruturam, fundamentalmente, em proposições e conceitos que as definem. O ensino e aprendizagem da estrutura fundamental de toda e qualquer matéria que se ensina, mais do que simples domínio de fatos e técnicas, estão no centro do clássico problema da transferência. O mais importante é que se ofereçam condições de aprendizagem dessas estruturas.

Ensinar a operar com o pensamento abstrato descontextualizado e estabelecer relações semânticas são objetivos fundamentais do processo de escolarização. Sem a educação formal, o pensamento se reveste de características que o atam ao que é contextual. O conhecimento e o pensamento ficam presos a situações específicas e imediatas (enlaces reais, imediatos e práticos). Cabe à escola desenvolver o pensamento por meio do aprendizado, libertando-o das finalidades imediatas da ação e criar condições para a formulação de idéias complexas.

A educação escolar, segundo Ratner (1995), em todas as sociedades letradas, enfatiza princípios abstratos que são preenchidos por exemplos intercambiáveis, em contraposição à observação cotidiana que se constrói a partir de experiências de sistematização não formal. O pensamento de pessoas das sociedades iletradas funciona pautado no respeito às atividades de importância prática imediata. Entretanto, as operações cognitivas não são intrinsecamente gerais, pois podem se generalizar caso as atividades desenvolvidas socialmente delas necessitarem. A estrutura formal do conhecimento apresentado nas escolas pode estar na contramão da história: impedindo crianças de se desenvolverem e de gerarem conhecimento

original e profícuo para uma nação. Aí reside seu conteúdo ideológico.

É tarefa da psicologia, assim, estudar o nível de abstração de processos específicos, em contextos igualmente específicos, considerar que a generalidade e particularidade de processos abstratos são questões empíricas, derivadas de relações concretas (Ratner, 1995). A teoria da atividade de Leontiev (1978) apresenta contribuições importantes acerca da relação entre aprendizagem, desenvolvimento e contexto social e pode projetar luz à análise em foco.

1.2.2 A TEORIA DA ATIVIDADE

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básicos de Vygotsky, especialmente no que diz respeito à relação homem-mundo enquanto construída historicamente e mediada por instrumentos (Oliveira, 1997).

A atividade foi definida pelo autor, como a formação sistemática e unidade de análise para as ciências humanas. A atividade é um sistema coletivoderivado de um objeto e de um

motivo realizando-se por meio de ações individuais dirigidas por objetivos, que, por sua vez,

efetiva-se através de operações rotineiras, que dependem das condições da ação. Para entender e facilitar o desenvolvimento, é necessário estudar e modificar sistemas coletivos de atividade completos, seus objetos e motivos, e não apenas ações e habilidades isoladas.

Oliveira (1997) descreve a concepção de Leontiev sobre as atividades humanas. Toda atividade humana é uma forma de relação do homem com o mundo, dirigidas por motivos e por fins a serem alcançados. Atividade envolve a noção de que o homem orienta-se por objetivos individuais, mas por meio de objetivos coletivos, agindo de forma intencional e por intermédio de ações planejadas. O planejamento das ações humanas é a principal característica que distingue o homem dos outros animais.

Duarte (2003) esclarece que Leontiev, na tentativa de resolver a diferença entre a estrutura da atividade desenvolvida pelos seres humanos e a estrutura da atividade animal, apesar de ambas terem sempre algum motivo, formulou o conceito de atividade caracterizando os motivos humanos e a consciência como cultural e historicamente desenvolvidas, e por isso, qualitativamente diferentes dos motivos dos animais, sendo que para os animais, a atividade desenvolvida é para atender as necessidades estritamente biológicas.

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Hedegaard et all (1999) ressalta que Leontiev conceituou atividade como um processo coletivo, formado por ações que constituem processos orientados para objetivos individuais do sujeito e estruturado por operações com função psíquica especificada, determinada pelo predomínio das condições materiais e pelos recursos disponíveis. Como processo coletivo, a autora explica que a atividade, nesta situação, está voltada para o atendimento de necessidades do sujeito participante de um grupo, em que todos os componentes são beneficiados de alguma forma e vêem seus interesses atendidos.

Leontiev (1978) destaca a atividade de cada indivíduo ocorre num sistema de relações sociais e de vida social, em que o trabalho ocupa lugar central, uma vez que o trabalho é o propulsor da consciência humana. A atividade psicológica interna do indivíduo tem sua origem na atividade externa. Os processos mentais humanos adquirem uma estrutura ligada aos meios e métodos sociais e históricos formados, transmitidos no processo de trabalho cooperativo e de interação social. Atividades mentais internas surgem da atividade prática desenvolvida na sociedade humana com base no trabalho e assim, são formadas no decorrer do desenvolvimento de cada sujeito, em cada geração.

A atividade, por caracterizar-se sempre por sua orientação para o objeto, preenche um propósito específico. A força de direção da atividade é seu motivo: o motivo é o que direciona a atividade, aquilo pelo qual o homem trata de alcançar com um objetivo determinado – suas necessidades, desejos e interesses. Para Leontiev (1978) não pode haver atividade sem motivo. Atividade desmotivada não é atividade vazia de motivo: é atividade com motivo que está subjetivamente e objetivamente oculto. O motivo expresso pelo indivíduo, por meio de uma ação, está ligado ao seu contexto histórico, social e cultural.

Ao analisar a estrutura da atividade humana, Leontiev distingue três níveis de funcionamento: a atividade propriamente dita, as ações e as operações, sendo o motivo um dos pilares da tríade de sustentação da atividade humana. A atividade é uma forma complexa de relação homem-mundo, que envolve finalidades conscientes e atuação coletiva e cooperativa.

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independente da atividade, pois a mesma ação pode ser realizada em diferentes atividades e um mesmo motivo pode dar origem a diferentes ações. A ação é dirigida por metas e desempenhada por diversos indivíduos envolvidos na atividade.

Leontiev (1978) também chama de ação aos processos em que o objeto e o motivo não coincidem. A origem de uma ação é encontrada na relação entre atividades, enquanto que cada operação é resultado da transformação de uma ação, ou seja, a inclusão de uma ação em outra. A ação é um processo, cujo segmento se encontra naquela atividade em que a ação está incluída. O resultado da atividade como um todo, satisfaz à necessidade do grupo, levando também à satisfação das necessidades de cada indivíduo, mesmo que cada uma tenha se dedicado apenas a uma parte específica da tarefa em questão.

Um exemplo, apresentado pelo autor, ilustra a diferença entre atividade e ação. Se um homem lê um manual de história somente para passar num exame, o estudo, neste caso, constitui uma ação. O tipo fundamental de trabalho é a preparação para o exame. Contudo, o processo de leitura do livro – considerado, neste caso, como ação – pode converter-se numa atividade, se o sujeito motivado pelo interesse, continuar trabalhando, mesmo sabendo que o exame tenha sido suspenso.

A operação de uma ação, relacionada à atividade, refere-se às circunstâncias específicas, às condições que estão em volta de sua execução, constituindo o meio pelo qual uma ação é realizada. A operação é composta de dois aspectos da atividade: a orientação, que inclui o resultado final da atividade, e a modalidade de sua realização. Esta composição corresponde às condições nas quais se encontra o objeto que estimula o sujeito a realizar a atividade (Leontiev,1978).

O modo de desempenhar uma ação ou a operação da atividade humana, muitas vezes

revela o modo de funcionamento do organismo motivado. A operação refere-se ao aspecto prático da realização das ações, às condições em que são efetivadas e aos procedimentos para realizá-las. A operação, além de seus aspectos intencionais sobre o que deve ser realizado, também inclui seu aspecto operacional, o como, de que modo pode ser realizado, que é determinado não pela meta em si, mas pelas condições objetivas e ambientais.

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individuais dos sujeitos, que necessitam atender aos seus interesses, às ações estruturadas em processos pelos quais ocorre a atividade e finalmente, às operações que revelam as condições de realização da atividade. Enquanto a atividade em seu conjunto se caracteriza por seu motivo, as ações se determinam por objetivos e as operações respondem às condições da atividade.

Neste ponto, é importante lembrar que a aquisição de uma estrutura formal de conhecimento demanda processos cognitivos, requer processos afetivos, da ordem dos motivos, orientados por objetivos específicos, além de serem efetivados de acordo com as circunstâncias de realização da aquisição conceitual. A teoria da atividade de Leontiev conjuga os elementos que promovem a compreensão do processo de aprendizagem de conceito, na medida em que apresenta elos entre desejo, ação e condição.

Para Vygotsky, a atividade tem estrutura instrumental e origem social. O instrumento mediatiza a atividade, conectando o sujeito com o mundo dos objetos e com o mundo social. Atividade é um sistema com sua estrutura e transformações internas próprias e seu próprio desenvolvimento. Sua real função é orientar o sujeito no mundo dos objetos, colocá-lo na realidade objetiva e transformar isto numa forma subjetiva, permitindo a transição do objetivo para o subjetivo (Leontiev, 1978).

Oliveira (1997) considera que se podem reconhecer, na teoria da atividade de Leontiev, vários conceitos presentes nas principais formulações de Vygotsky. A própria idéia da atividade está baseada na concepção do ser humano como sendo capaz de agir de forma voluntária sobre o mundo, de forma intencional, buscando atingir determinados fins. Esse modo de funcionamento psicológico é a base dos processos psicológicos superiores humanos, que envolvem relações entre indivíduos e o mundo, que não são diretas, mas mediadas pela cultura. A interação social é indispensável para o desenvolvimento das formas de atividade de cada grupo cultural. O indivíduo internaliza os elementos de sua cultura por meio da construção de seu universo intrapsicológico a partir do meio ou contexto em que vive.

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mediadores da aquisição deste conhecimento. A concepção de mediação vygotskyana auxilia na compreensão do funcionamento dos processos psicológicos superiores humanos e de que forma o sujeito os desenvolve para se apropriar do conhecimento.

1.2.3 O CONCEITO DE MEDIAÇÃO SEMIÓTICA EM VYGOSTY

As formas superiores de relação do homem com o ambiente ocorrem por intermédio do pensamento, da linguagem e das relações lógicas. Implicam a intervenção de um terceiro elemento, ou seja, dos signos. A significação, enquanto processo de atribuir e internalizar sentidos e significados, pressupõe a criação e o uso de signos através dos quais se constroem novas conexões mentais.

Vygotsky (1996) preconiza que a relação do homem com o meio, ancora-se nos processos mentais elementares que constituem o substrato biológico. O desenvolvimento mental superior é constituído por meio da mediação semiótica, ou seja, a relação entre o sujeito e o objeto de conhecimento é interceptada por elementos simbólicos, denominados signos.

Na medida em que este estímulo auxiliar possui a função específica de ação reversa, ele confere à operação psicológica formas qualitativamente novas e superiores, permitindo aos seres humanos, com auxílio de estímulos extrínsecos, controlarem seu próprio comportamento. O uso de signos conduz os seres humanos a uma estrutura específica de comportamento que se destaca do desenvolvimento biológico e cria novas formas de processos psicológicos enraizados na cultura.

Os signos medeiam estímulos imediatos e o comportamento manifesto, promovendo tipos de mediação. Ratner (1995) enuncia três espécies de mediação: a consciência – ou atividade mental; a cooperação social – socialidade, e, os instrumentos – tecnologia. A consciência é uma percepção relativamente abrangente das coisas e processa a informação. A socialidade é a atividade conjunta, coordenada com outros indivíduos, que envolve cooperação, partilha e cuidado com os outros indivíduos. Os instrumentos são implementos físicos utilizados para aumentar os poderes naturais do organismo físico.

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organismo e meio, tornando-as mais complexas. A relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas uma relação mediada (Oliveira, 1997). As funções psicológicas superiores apresentam uma estrutura tal que entre o homem e o mundo real existem mediadores, ferramentas auxiliares da atividade humana. Estas ferramentas admitem dois estímulos: o signo e o instrumento, que envolvem uma atividade mediada.

Esclarecendo as bases epistemológicas do conceito de mediação, Coutinho (1997) afirma que essa idéia está fundamentada na teoria marxista da produção segundo a qual o desenvolvimento humano é o resultado da atividade do trabalho. De acordo com Marx, o trabalho é um ato que se passa entre o homem e a natureza: o homem age sobre a natureza modificando-a com a força motriz de seu corpo. Para realizar essa atividade frente ao mundo da natureza externa, o homem cria instrumentos, ou seja, ferramentas mediadoras. O machado, por exemplo, é uma ferramenta mediadora, melhor do que a mão humana, para cortar madeira. Este instrumento mediador é também um objeto social, porque carrega consigo a função e o modo de utilização para o qual foi criado.

Ao mesmo tempo em que o homem atua no mundo material modificando-o, ele se modifica intrinsecamente pelo desenvolvimento de seu funcionamento mental. O materialismo dialético defende a tese de que o conhecimento está enquadrado na filosofia da práxis: os sentimentos, o entendimento, a consciência, o pensamento, enfim, todo o psiquismo humano dependem da atividade material do trabalho. Por isso, tais fenômenos psíquicos passam por um processo sócio-histórico de construção.

A partir da constatação de que os instrumentos ou ferramentas são mediadores, orientados externamente para regular a ação do homem frente à natureza, Vygotsky (1996) estende este conceito mediacional para os signos (como por exemplo, a palavra machado), que passam a ser considerados instrumentos psicológicos ou mediadores internos para a interação entre o psiquismo das pessoas. Mediação semiótica significa, assim, a intervenção de signos na relação do homem com o psiquismo dos outros homens e é responsável pelo desenvolvimento das funções psicológicas superiores, que distinguem o homem dos outros animais.

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pelo fato de que as funções psicológicas mais sofisticadas não estão presentes nas crianças pequenas, pois essas serão construídas ao longo do processo de desenvolvimento.

As origens das funções superiores devem ser buscadas nas relações sociais entre o indivíduo e os outros homens, pois o fundamento humano é social e, portanto, histórico. Os elementos mediadores na relação entre homem e mundo são fornecidos pelas relações entre os homens. Os sistemas simbólicos, especificamente, a linguagem, exercem um papel fundamental na comunicação entre os indivíduos e no estabelecimento de significados compartilhados que permitem interpretações dos objetos, eventos e situações do mundo real.

Bruner (1976) reitera as formulações de Vygotsky sobre o sistema semiótico de comunicação humana de que a linguagem é, no conhecimento, o meio mais poderoso de que dispomos para efetuar transformações no mundo, para mudar sua forma, através de recombinações, sob o ponto de vista da possibilidade.

Ripper (1994), em seu estudo sobre o processo ensino-aprendizagem numa perspectiva sócio-histórica, salienta a relevância da atividade mediada na internalização das funções psicológicas, dando origem ao chamado comportamento superior. Refere-se, a autora, a Vygotsky (1978) que caracteriza o uso de signos e de instrumentos como atividade mediada, que irá orientar o comportamento humano na internalização dessas funções. Mas, a mediação por signo e instrumento é de natureza diversa, enquanto o signo constitui uma atividade interna dirigida para o controle do próprio sujeito, o instrumento é orientado para o exterior, a fim de controlar a natureza.

Tanto o controle do comportamento como o da natureza acarreta mudanças no funcionamento cognitivo, o primeiro ocasionando a emergência das funções superiores e o segundo, a relação do homem com seu ambiente: o homem muda a natureza e essa mudança altera sua própria natureza. Ocorre um movimento dialético, entre o homem e seu artefato.

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ambiente pressupõem uma relação direta com um estímulo do meio, representada pela fórmula E ---> R (estímulo-resposta), como por exemplo, a sucção do seio materno ou a

retirada repentina da mão de uma superfície quente. Estes reflexos automáticos são considerados atividades de sinalização.

Por intermédio da mediação semiótica, que atua na construção de processos mentais superiores, ocorre uma construção prolongada e complexa decorrente de uma série de transformações qualitativas em que um estágio é precondição para um estágio posterior. Estas transformações, ligadas, entre si, por processos evolutivos e dialéticos são o resultado da apropriação das produções culturais de uma sociedade através de relações com os membros desta sociedade.

Assim, por meio da mediação de instrumentos e de signos o homem atua no mundo físico e social, conhecendo-o, modificando-o, interagindo, aprendendo, comunicando aos outros suas experiências e construindo sua própria consciência, além de desenvolver esforços de adaptação e solução de problemas. A escola representa o lócus potencial onde se planejam e se desenvolvem atividades sistemáticas, semioticamente mediadas, com o objetivo de gerar aprendizado.

1.2.4 A RELAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM

O desenvolvimento humano e a relação com a aprendizagem é o foco central da teoria vygotskyana. Para Vygotsky (1996), o aprendizado está relacionado ao desenvolvimento; é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas. É o aprendizado que possibilita a constituição de processos internos de desenvolvimento fomentados pelo contato do indivíduo com certo ambiente cultural. Nesse sentido, a aprendizagem precede e cria condições para o desenvolvimento.

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Fig. 1 - Rede de Conteúdos Formais
Fig. 2 - Rede Genética de Conceitos
Fig. 3 - Rede de Conteúdos Formais
Fig. 4 - Rede Genética Conceitual do Sistema Monetário Brasileiro
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