UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
MATEMÁTICA
Maria Wanderlândia de Lavor Coriolano
R
ETICULADOS DE
C
RAIG
T
RANSLADADOS
Maria Wanderlândia de Lavor Coriolano
R
ETICULADOS DE
C
RAIG
T
RANSLADADOS
Dissertacão submetida à Coordenação do Curso de Pós-Graduação em Matemática, da Universidade Federal do Ceará, para a obtenção do grau de Mestre em Matemática.
Área de concentracão: Matemática. Orientador: Prof. Dr. José Othon Dantas Lopes
Fortaleza
Coriolano, Maria Wanderlândia de Lavor
C831r Reticulados de Craig Transladados/Maria Wanderlândia
de Lavor Coriolano. – Fortaleza: 2011.
88f.
Orientador: Prof. Dr. José Othon Dantas Lopes
Área de concentração: Matemática
Dissertação(Mestrado)- Universidade Federal do Ceará,
Departamento de Matemática, Fortaleza,2011.
1.Álgebra
Ao meus pais Vanderlou e Fátima e ao meu namorado Renato,
Agradecimentos
A Deus, razão da minha existência e força maior nos momentos difíceis.
Aos meus pais(Vanderlou e Fátima), pelo amor, pelo esforço dedicado à minha educação, pelo incentivo que sempre me possibilitou a sonhar e crer que tudo é possível.
Aos meus irmãos(Wanderleya, Weyber e Júnior) por estarem sempre torcendo por mim.
Ao meu namorado Renato, pelo amor sincero, por apoiar-me durante essa etapa, com a sua compreensão e motivação.
Ao meu orientador, prof. Dr. José Othon Dantas Lopes, pela amizade sincera, paciência, por me ajudar no conhecimento obtido sempre me indicando o caminho a ser seguido nos momentos de maior dificuldade e por depositar sua confiança em mim diante desse trabalho.
Aos professores do Departamento de Matemática da UFC, em especial aos professores José Valter Lopes Nunes e José Afonso de Oliveira que acompanharam mais de perto o desenvolvimento desse trabalho.
Aos meus professores de graduação(Gladeston, Valdemiro, Enio, Jeanne, Mário Henrique, Manoel Bandeira, Henrique Fernandes), pelo carinho, amizade, incentivo e confiança que me motivaram a realização deste sonho.
Aos meus colegas do curso de Pós-Graduação, pelo agradável convívio, pelos risos sempre presentes que me ajudaram a superar os momentos difíceis.
Aos amigos, por estarem comigo em todos os momentos.
À banca examinadora: Prof. Dr. Trajano Pires da Nóbrega Neto e Prof. Dr. José Robério Rogério
À Andréa Costa Dantas, pelo carinho e atenção em todos os momentos.
Resumo
Seja p um número primo ímpar. Uma família de reticulados (p−1)-dimensional produzindo novos empacotamentos para vários valores de p no intervalo [149... 3001] é
apresentado. O resultado é obtido através da modificação da construção de Craig e considerando convenientemente escolhidos Z-submódulos de Q(ζ), onde ζ é raiz p-ésima primitiva da
unidade. Para p≥59, é mostrado que a densidade de centro do reticulado(p−1)-dimensional na nova família é pelo menos 2 vezes a densidade de centro do(p−1)-dimensional reticulado de Craig.
Abstract
Let p an odd prime. A family of (p−1)-dimensional over-lattices yielding new record packings for several values of pin interval[149...3001]is presented. The result is obtained by modifying Craig’s construction and considering conveniently chosen Z-submodules of Q(ζ), where ζ is a primitive pth root of unity. For p≥59, it is shown that the center density of
the (p−1)-dimensional lattice in the new family is at least twice the center density of the (p−1)-dimensional lattice in the new family is at least twice the center density of the (p−
1)-dimensional Craig lattice.
Sumário
Lista de Figuras
Lista de Siglas
Introdução p. 14
1 Preliminares p. 16
1.1 Divisibilidade em Anéis de Ideais Principais . . . p. 17
1.2 ϕ-Função de Euler . . . p. 19
1.3 Módulos . . . p. 24
1.4 Raízes da Unidade e Corpos Finitos . . . p. 31
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo . . p. 35
1.5.1 Elementos Inteiros sobre um Anel . . . p. 35
1.5.2 Elementos Algébricos sobre um Corpo e Extensões Algébricas . . . . p. 42
1.5.3 Elementos Conjugados e Corpos Conjugados . . . p. 45
1.6 Norma e Traço em uma Extensão . . . p. 48
1.7 Discriminante . . . p. 53
1.8 Corpos Quadráticos e Corpos Ciclotômicos . . . p. 59
1.8.1 Corpos Quadráticos . . . p. 60
1.9 Anéis Noetherianos e Anéis de Dedekind . . . p. 65
1.10 Norma de um Ideal . . . p. 71
2 Reticulados p. 74
2.1 Preliminares sobre Subgrupos Discretos doRn. . . p. 74
2.2 A Imersão Canônica de um Corpo . . . p. 83
2.3 Empacotamento Esférico . . . p. 88
3 Reticulados de Craig p. 97
3.1 Reticulados de Craig Transladados . . . p. 97
Lista de Figuras
1 reticuladoZ2 . . . p. 78
2 Região Fundamental deσ(Z√7) . . . p. 87
3 Região Fundamental deσ(h2−ii) . . . p. 89
4 Reticulado em dimensão 1 com a maior densidade . . . p. 90
Lista de Siglas
N: conjunto dos números naturais
Z: conjunto dos números inteiros
Q: conjunto dos números racionais
R: conjunto dos números reais
C: conjunto dos números complexos
∑: somatório
∏: produtório
a|b: adivideb
ϕ(n):ϕ-função de Euler para o inteiron
K,L: corpos
F(X),G(X),P(X),Q(X): polinômios
A≃B: Aé isomorfo aB
hF(X)i: ideal gerado pelo polinômioF(X)
A[x]: anel dos polinômios sobreAemx
A∗: Grupo das unidades do anelA
ker(σ): núcleo do homomorfismoσ
[L:K]: grau deLsobreK
N (p): norma de um idealp
NK|Q(α): norma do elementoα ∈Kem relação aQ
(ai j): matriz
det(ai j): determinante da matriz(ai j)
D(x1, . . . ,xn): discriminante de uman-upla
f(n):n-ésima derivada da função f
ζ: raiz p-ésima primitiva da unidade
card(X): cardinalidade de um conjuntoX
car(K): característica de um corpoK
Hβ: reticulado de baseβ
vol(Hβ): volume do reticuladoHβ
δ(Hβ): densidade de centro do reticuladoHβ
∆(Hβ): densidade de empacotamento do reticuladoHβ
σ(pi): reticulado de Craig [x]: inteiro mais próximo dex
x: conjugado complexo do elementox
α(x): conjugação complexa(α(x) =x)
a
Introdução
Entende-se por empacotamento esférico a disposição de esferas de mesmo raio no espaço euclidiano Rn de tal modo que a interseção de quaisquer duas esferas tenha no máximo um ponto.
A forma de dispor essas esferas no espaço, de modo que elas ocupem a maior fração desse espaço, ou seja, que esta distribuição tenha alta densidade, sempre foi um desafio para os matemáticos. Devido a importância dessa questão, durante o Congresso Internacional de Matemática, no ano de 1900, David Hilbert citou-a como sendo o 18oproblema de uma seleta lista de desafios que viriam ocupar destaque no desenvolvimento da ciência moderna.
Dentre os empacotamentos esféricos, aqueles cujo conjunto de centros das esferas constutui um subgrupo discreto de Rn de posto n despertaram particular interesse e são chamados empacotamentos reticulados.
Em 1948 com a publicação do artigo de Claude E. Shannon, foi estabelecido que o problema de encontrar empacotamentos esféricos densos em um dado espaço é equivalente a encontrar códigos corretores de erros eficientes. A partir daí, passaram-se a associar o estudo de códigos ao dos reticulados. Assim, muitas teorias evoluiram tendo o 18oproblema de Hilbert como ponto de partida, descrevendo vários modelos matemáticos com a finalidade de obter empacotamento esférico com alta densidade. Dentre tais modelos destaca-se o descrito por Hermann Minkowski, chamado método algébrico baseado na teoria algébrica dos números. Tal modelo consiste de um corpo de números Kde grau ne o seu anel dos inteirosAK, de onde obtém-se um homomorfismo deKemRn, com o auxílio dosnmonomorfismos deKemC, de modo que a imagem de um idealInão nulo deAK é um reticulado de postonnoRn.
15
Neste trabalho, vamos considerar certos Z-submódulos de Q(ζ), onde ζ é raiz p ésima
primitiva da unidade, pprimo, construídos a partir do idealh1−ζiido anel dos inteirosZ[ζ]e obteremos uma nova família{Tp}de reticulados que são translações dos reticulados de Craig.
O principal objetivo do trabalho é mostrar que a densidade de centro dos empacotamentos reticulados dessa nova família é maior do que a densidade dos empacotamentos reticulados da família de Craig, para p ≥59. Para p≥59, a densidade de centro do reticulado p−1
dimensionalTpé pelo menos 2 vezes a do reticuladop−1 dimensional de Craig, para p≥97, a densidade de centro do reticulado p−1 dimensionalTpé pelo menos 3 vezes a do reticulado
p−1 dimensional de Craig e assim por diante. Como os reticulados da famíla de Craig tinham
as maiores densidades de centro conhecidas em dimensões p−1, onde 149≤p≤3001, então
a nova família obtida produz o novo recorde de empacotamentos em dimensões p−1, com
149≤ p≤3001
O trabalho é organizado da seguinte forma:
◮ No Capítulo 1, apresentamos alguns conceitos sobre divisibilidade em anéis de ideias
principais, de módulos,elementos inteiros sobre um anel, extensões algébricas, norma e traço de um elemento, discriminante de uma extensão, ideais fracionários de um anel, anéis Noetherianos e de Dedekind, norma de um ideal fracionário . Se destaca o fato de que todo ideal fracionário num anel de Dedekind se fatora de forma única como um produto de ideais primos do anel com potências inteiras.Além disso apresentamos algumas propriedades de corpos quadráticos e ciclotômicos.
◮ No Capítulo 2, apresentamos as definições de reticulado, empacotamento esférico,volume
e densidade de centro. Além disso, apresentamos o homomorfismo de Minkowski, que é um método de gerar reticulados no Rn, com a vantagem de serem reticulados manipuláveis.O estudo desses capítulos proporcionou-nos ferramentas necessárias para o estudo do Capítulo 3, no qual apresentamos o tema central da dissertação.
◮ No Capítulo 3, no qual finalizamos nosso trabalho, consideramosZ-submódulos deQ(ζ),
onde ζ é raiz p-ésima da unidade da unidade, p primo, construídos a partir do ideal h1−ζiideZ[ζ], obtendo assim uma nova família de reticulados denotada por{T
p}, que são translações dos reticulados de Craig. Mostraremos que a densidade de centro desses reticulados obtidos é maior do que a densidade de centro dos reticulados de Craig, para
Capítulo
1
Preliminares
Conteúdo
1.1 Divisibilidade em Anéis de Ideais Principais . . . p.17
1.2 ϕ-Função de Euler . . . p.19
1.3 Módulos . . . p.24
1.4 Raízes da Unidade em um Corpo e Corpos Finitos . . . p.31
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um
Corpo;Elementos Conjugados . . . p.35
1.5.1 Elementos Inteiros sobre um Anel. . . p.35
1.5.2 Elementos Algébricos sobre um Corpo e Extensões Algébricas . . . p.42
1.5.3 Elementos conjugados e Corpos Conjugados . . . p.45
1.6 Norma e Traço em uma Extensão . . . p.48
1.7 Discriminante. . . p.53
1.8 Corpos Quadráticos e Corpos Ciclotômicos . . . p.59
1.8.1 Corpos Quadráticos . . . p.60
1.8.2 Corpos Ciclotômicos . . . p.62
1.9 Anéis Noetherianos e Anéis de Dedekind . . . p.65
1.1 Divisibilidade em Anéis de Ideais Principais 17
Os resultados mostrados neste capítulo foram baseados no livro [Samuel 2008].
1.1 Divisibilidade em Anéis de Ideais Principais
Definição 1.1 Sejam A um domínio de integridade, K=na
b; a,b∈A, b6=0
o
seu corpo de
frações e x,y elementos deK
Dizemos que x divide y se existe a∈Ktal que y=ax. Equivalentemente, dizemos que x é
um divisor de y ou que y é múltiplo de x.
Notação:x|y
Definição 1.2 Dado x∈K, chamamos Ax o conjunto dos múltiplos de x. Assim, podemos dizer
que y∈Ax em vez de x|y ou ainda Ay⊂Ax
O conjuntoAxé chamado um ideal principal fracionário deKcom respeito aA. Sex∈A,
entãoAxé o ideal principal(ordinário) deAgerado porx.
A relação de divisibilidade possui as seguintes propriedades:
i. x|x
ii. Sex|yey|zentãox|z
Em geral, não podemos concluir que se x|ye y|x entãox=y. Podemos apenas dizer que
Ax=Ay, o que significa(sey6=0)que o quocientexy−1é um elemento invertível deA. Neste
caso,xeysão chamados de associados.
Definição 1.3 Os elementos deKque são associados de1A(identidade de A)são os elementos
invertíveis em A. Eles são chamados as unidades de A. Estes elementos formam um grupo com
a multiplicação e denotamos este grupo por A∗
Exemplo 1.1 Se A é um corpo, então A∗=A−(0)
Se A=Z, então A∗={1,−1}
Definição 1.4 Um anel A é chamado anel de ideais principais se é um domínio de integridade
1.1 Divisibilidade em Anéis de Ideais Principais 18
Exemplo 1.2 O anelZdos inteiros racionais é um anel de ideais principais.
Se K é um corpo, o anelK[X] de polinômios em uma variável sobre K é um anel de ideais
principais.
Vejamos algumas propriedades de divisibilidade em um corpo de fraçõesKde um anel de ideais principaisA.
i. Dois elementos arbitráriosuevdeKpossuem um máximo divisor comum(mmc), isto é, um elementodpara o qual vale a seguinte relação:
x|u e x|v ⇔ x|d (1.1)
ii. (Identidade de Bezout): Existem elementosa,b∈Atal que omdcdeuevpode ser escrito
da forma:
d=au+bv (1.2)
iii. Dois elementos arbitráriosu,vdeKpossuem um mínimo múltiplo comum(mdc), isto é, existe um elementom∈Kpara o qual é válida a relação:
u|x e v|x ⇔ m|x (1.3)
iv. Vale a seguinte relação entre omdce ommc:
mdc(u,v).mmc(u,v) =u.v (1.4)
Definição 1.5 Dois elementos a,b de A são chamados relativamente primos se mdc(a,b) =1
Lema 1.1 (Euclides) Sejam a,b elementos de um anel de ideais principais A. Se a divide bc e
a é relativamente primo com b então, a divide c.
Prova: Pela identidade de Bezout, existema′,b′tais que:
1=a′a+b′b⇒ c=a′ac+b′bc
Comoadividebc, entãoadivideb′bc
1.2 ϕ-Função de Euler 19
Logoadividea′ac+b′bce daíadividec.
O teorema a seguir mostra que existe uma única fatoração em produtos de primos.
Teorema 1.1 Seja A um anel de ideais principais eKseu corpo de frações. Então existe um
subconjunto P⊂A tal que todo x∈Kpode ser expresso unicamente da forma
x=u
∏
p∈P
pvp(x)
onde u é uma unidade em A e os expoentes vp(x)são elementos deZ, todos nulos, exceto para
um subconjunto finito deles.
(veja a demonstração no livro [Mollin 1999])
1.2
ϕ
-Função de Euler
Definição 1.6 Seja n≥1. Definimosϕ(n)como sendo o número de inteiros q,0≤q≤n, tal
que q e n são relativamente primos. Como 0 e n são divisíveis por n, basta considerarmos
1≤q≤n−1para todo n>1e definimosϕ(1) =1
A função assim definida é chamada função de Eulerϕ
Observação 1.1 a)Se p é primo, então temos que:
ϕ(p) =p−1
Pois, como p é primo, todos os elementos q, com1≤q≤ p−1são relativamente primos com
p.
b) Se n= ps, então os inteiros relativamente primos com n são todos os inteiros q, com
1≤q≤n−1os quais não são múltiplos de p. Temos que existem ps−1múltiplos de p entre1
e ps. São estes: 1.p,2.p,3.p,. . .
A quantidade de inteiros entre 1 e ps que são relativamente primos com ps é igual a ps
menos a quantidade de múltiplos de p entre1e ps. Logo,ϕ(ps) =ps−ps−1=ps−1(p−1)
Proposição 1.1 Seja n≥1 um número natural. O valorϕ(n)da função de Euler é igual ao
número de elementos de Z
nZ que geram este grupo. Também é igual ao número de unidades do anel Z
1.2 ϕ-Função de Euler 20
Prova: Sabemos que cada classe de congruênciamod nZ contém um único inteiro q tal que
0≤q≤n−1. Para cada inteiroqchameqsua classe residualmod nZ
Agora vamos mostrar as seguintes implicações:
I)qrelativamente primo comn⇒qé uma unidade do anel Z nZ
II)qé uma unidade do anel Z
nZ ⇒qgera o grupo aditivo Z nZ
III)qgera o grupo aditivo Z
nZ ⇒qrelativamente primo comn.
Suponha queqé relativamente primo comn. Assim, pela identidade de Bezout, temos que
existem inteirosx,ytais que:
qx+ny=1
Assim,qx+ny=1. Daí,qx+ny=1
Logo, qx=1, ou seja, qé uma unidade de Z
nZ. Agora, suponha queqé uma unidade em Z
nZ.
Assim, existe um inteiroxtal queq x=1
Daí,a q x=ano anel Z
nZ, ondeaé um elemento arbitrário de Z
nZ, com 0≤a<n.
Segue quea=a xq= (ax)q, no grupo aditivo Z nZ.
Logo,qgera o grupo Z nZ
Suponha queqgera o grupo Z
nZ, então existe umxtal quex q=1. Logo,x q≡1(modn).
Daí, existe um inteiroytal que
x q−1=yn⇒1=x q−yn
Sejad=mdc(q,n), entãod|qed|ne daíd|x q−y n.
Logo,d|1
Portanto,mdc(q,n) =1
Pelas implicações acima demonstradas concluímos que ϕ(n) é igual ao número de elementos de Z
1.2 ϕ-Função de Euler 21
Lema 1.2 Seja A um anel, I e J ideais de A tal que I+J=A. Então I∩J=IJ e o
homomorfismo canônicoϕ:A→ A I ×
A
J induz um isomorfismoθ : A IJ →
A I ×
A J
Prova: Sabemos que em geral,IJ⊂I eIJ⊂J, entãoIJ⊂I∩J
Agora seja x∈I∩J. Como I+J =A, então existem elementosx1∈I e x2∈J tais que
x1+x2=1A
Daí,
x=x1x+x2x=x1x+xx2
Como,x1x∈IJ exx2∈IJ, entãox1x+xx2∈IJ
Logo,x∈IJe assimI∩J⊂IJ
Portanto,IJ=I∩J
Vamos agora provar que o homomorfismoϕ induz o isomorfismoθ.
Veja que kerϕ=IJ
De fato, seja x∈kerϕ, então ϕ(x) =0, ou seja, (x+I,x+J) = (0+I,0+J). Daí, x∈
I∩J=IJ e portanto kerϕ⊂IJ. Por outro lado sex∈IJ=I∩J, entãoϕ(x) = (x+I,x+J) =
(0+I,0+J)e daíx∈kerϕ.
Portanto, kerϕ=IJ
Vamos provar agora queϕé sobrejetiva, ou seja, mostraremos que para todo
w= (y+I,z+J)∈A
I × A
J, existex∈Atal que:
ϕ(x) = (x+I,x+J) = (y+I,z+J) =w
Considerex1∈Iex2∈Jtal quex1+x2=1Ae tomex=x1z+x2y
Assim,
x+I= (x1z+x2y) +I
Como x1z∈I, então x+I=x2y+I= (1A−x1)y+I, pois x1+x2 =1A. Logo, x+I = (y−x1y) +I=y+I, poisx1y∈I. De outra forma, dizemos quex≡y(mod I)
1.2 ϕ-Função de Euler 22
Comox1+x2=1A, entãox+J= (1A−x2)z+J= (z−x2z) +J
Logo,x+J=z+J, poisx2z∈J. De outra forma, dizemos quex≡z(modJ)
Portanto concluímos que para caday,z∈A, existe um elementox∈Atal quex+I=y+I
ex+J=z+J, ou seja,ϕ(x) = (x+I,x+J) = (y+I,z+J) =w.
Logo,ϕ é sobrejetiva. Assim, pelo Teorema dos isomorfismos de anéis, segue que
A kerϕ ≃
A I ×
A
J, ou seja, A IJ ≃
A I ×
A J
Portanto,ϕ induz o isomorfismoθ : A
IJ → A
I × A J
Lema 1.3 Seja A um anel e(Ii)1≤i≤rum conjunto finito de ideais de A tal que Ii+Ij=A∀i6= j.
Então existe um isomorfismo canônico de A I1. . .Ir
sobre
r
∏
i=1
A Ii
Prova: Pelo lema 1.2 temos que a afirmação está provado para o casor=2.
Vamos agora usar indução sobrer. PonhaJ=I2. . .Ir e mostraremos queI1+J=A.
Parai≥2, temos queI1+Ii=A, pois por hipóteseIi+Ij=A∀i6= j.
Daí, existem elementosxi∈I1eyi∈Iital que:
xi+yi=1A⇒1A= r
∏
i=2
(xi+yi) =c+y2. . .yr
onde cé a soma de termos cada um dos quais contém um menor xi como fator. Temos então quec∈I1
Comoy2. . .yr∈J, entãoc+y2. . .yr∈I1+J
Assim, 1A∈I1+Je daíI1+J=A
Pelo lema 1.2, segue que A
I1J é isomorfo a
A I1×
A J.
Pela hipótese de indução, temos que: A
J = A I2. . .Ir
é isomorfo a A
I2× ··· ×
A Ir .
Logo, A
I1I2. . .Ir
é isomorfo a A
I1×
A
I2× ··· ×
A Ir
Proposição 1.2 Sejam n e n′inteiros relativamente primos. Então o anel Z
nn′Z é isomorfo ao anel Z
1.2 ϕ-Função de Euler 23
Prova:Comone n′são inteiros relativamente primos, então existem inteirosx, ytais que:
nx+n′y=1. Comonx+n′y∈nZ+n′Z, então 1∈nZ+n′Z.
Daí,
nZ+n′Z=Z
Logo, aplicando o lema 1.2, segue o resultado.
Corolário 1.1 Se n e n′são inteiros positivos relativamente primos, entãoϕ(nn′) =ϕ(n)ϕ(n′)
Prova: Pela proposição 2.1, temos queϕ(nn′)é o número de unidades de Z
nn′Z
Por outro lado, pela proposição 1.2, temos que Z
nn′Z é isomorfo a Z nZ×
Z n′Z
Assim, o número de unidades em Z
nn′Z é igual ao número de unidades em Z nZ×
Z n′Z.
Sabemos que um elemento (α,β) do anel produto é invertível se e somente se, cada componenteα,β é invertível.
Assim, o número de unidades em Z
nZ× Z
n′Z é igual ao produto do número de unidades de Z
nZ com o número de unidades de Z n′Z
Logo, o número de unidades do anel Z
nZ× Z
n′Z é igual aϕ(n)ϕ(n′)
Daí, o número de unidades do anel Z
nn′Z é igual aϕ(n)ϕ(n′)
Portanto,ϕ(nn′) =ϕ(n)ϕ(n′)
Corolário 1.2 Seja n um inteiro positivo tal que n= pα11pα22. . .pαr
r onde os pi’s são primos.
Entãoϕ(n) =n
1− 1
p1
. . .
1− 1
pr
Prova: Temos que pαi
i e p
αj
j são primos entre si, para cadai6= j, i,j∈ {1, . . . ,r}
Assim, pelo corolário 1.1, temos que
ϕ(n) =ϕ(pα11. . .pαr
r ) =ϕ(p
α1
1 )ϕ(pα22). . .ϕ(pαrr)
Pela observação 1.1, segue que:
ϕ(pαi
i ) =p
αi−1
i (pi−1) =p
αi
i
1− 1
pi
1.3 Módulos 24
Logo,
ϕ(n) = ϕ(pα11)ϕ(pα22). . .ϕ(pαr
r )
= pα11
1− 1
p1
pα22
1− 1
p2
. . .pαr
r
1− 1
pr
= pα11pα22. . .pαr
r
1− 1
p1 1− 1
p2
. . .
1− 1
pr
= n
1− 1
p1 1− 1
p2
. . .
1− 1
pr
1.3 Módulos
Definição 1.7 Seja A um anel comutativo com unidade. Um grupo abeliano aditivo (M,+)
dotado de uma multiplicação escalar
A×M → M
(a,m) 7→ a.m
é dito um A-módulo se∀a1,a2∈A e∀m1,m2∈M satisfaz as seguintes propriedades:
a)1.m1=m1;
b) (a1.a2).m1=a1.(a2.m1);
c) (a1+a2).m1=a1.m1+a2.m1;
d)a1.(m1+m2) =a1.m1+a1.m2Se a∈A e m∈M, escreveremos também am para denotar o
elemento a.m
Definição 1.8 Um A-módulo M é dito ser um A-módulo livre quando existe uma família(xi)i∈I
de elementos de M, satisfazendo as seguintes condições:
a)A família(xi)i∈I é linearmente independente;
b)Todo elemento x∈M é escrito como combinação linear da família(xi)i∈I
Uma família (xi)i∈I satisfazendo as condições da definição 1.8 é chamada uma base do
A-módulo livre, onde o número de elementos da base é chamado o posto de M. Se I é um
conjunto finito, dizemos que oA-móduloMé finitamente gerado ou do tipo finito.
Definição 1.9 Seja A um anel comutativo e seja I um conjunto. Denotamos por A(I) o conjunto
das sequências (ai)i∈I, indexadas por I de elementos de A tais que ai=0, exceto para um
1.3 Módulos 25
Observação 1.2 Sejam A um anel , M é um A-modulo e (xi)i∈I uma família de elementos de
M. Para todo elemento (ai)i∈I de A(I) associamos o elemento
∑
iaixide M e assim obtemos a
aplicação linearψ :A(I)→M.
Proposição 1.3 (xi)i∈I é um conjunto linearmente independente se e somente se
ψ :A(I)→M é injetiva
Prova:⇒)Sejam(ai)e(bi)dois elementos deA(I), assim
ψ((ai)) =ψ((bi))⇒
∑
iaixi=
∑
ibixi⇒
∑
i(ai−bi)xi=0
Como, por hipótese o conjunto(xi)i∈I é linearmente independente, entãoai−bi=0∀i∈I
Daí,ai=bi∀i∈I
Logo, os elementos(ai)e(bi)são iguais.
Portantoψ é injetiva.
⇐)Seψ é injetiva, entãokerψ ={0}
Daí,ψ((ai)) =0⇒ai=0∀i∈I. Isto significa que
∑
i
aixi=0⇒ai=0∀i∈I
Logo, o conjunto(xi)i∈I é L.I
Proposição 1.4 (xi)i∈I gera M se e somente seψ é sobrejetiva
Prova:
⇒)Suponha que (xi)i∈I geraM. Assim, todo elemento deM é escrito como combinação linear de(xi)i∈I
Daí, para todoy∈M, temos que existe(ai)i∈I tal quey=
∑
iaixi
Tomandox= (ai)∈A(I), segue queψ(x) =
∑
iaixi=y
Logo,ψ é sobrejetiva.
⇐)Dadoy∈M, temos que existex= (ai)i∈I ∈A(I)tal queψ(x) =y, poisψ é sobrejetiva.
Assim,
∑
i
1.3 Módulos 26
Logo, todoy∈Mé escrito como combinação linear de(xi)i∈I
Portanto,(xi)i∈I geraM.
Teorema 1.2 Seja A um anel e M um A-módulo. As seguintes condições são equivalentes:
a) Toda família não vazia de submódulos de M contém um elemento maximal(com relação à
inclusão)
b)Toda sequência crescente(Mn)n>0(ainda para a relação de inclusão)de submódulos de M
é estacionária, isto é, existe n0tal que Mn=Mn0 ∀n≥n0
c)Todo submódulo de M é do tipo finito.
Prova: Para demonstrarmos essas equivalências, vamos provar as seguintes implicações: a)⇒
c) c)⇒b b)⇒a)
a)⇒c)
Seja E um submódulo deM e seja Φ a coleção consistindo de todos submódulos do tipo finito deE. Temos queΦnão é vazio, pois(0)∈Φ
Pora), segue queΦcontém um elemento maximalF.
Parax∈E,F+Axé um submódulo do tipo finito de E, poisAxé um conjunto gerado por
xeF é um submódulo do tipo finito deE.
Temos queF+Axé gerado pela união de{x}e qualquer conjunto finito de geradores deF.
ComoF⊂F+AxeF é maximal, entãoF+Ax=F.
Logo,x∈F, e assimE⊂F.
Daí,E=F.
Portanto,E é do tipo finito.
c)⇒b)
Seja (Mn)n≥0 uma sequência crescente de submódulos de M. Assim, E = [ n≥0
Mn é um
submódulo deM.
Porc)este submóduloEcontém um conjunto finito de geradores{x1, . . . ,xq}.
Para todoi, existe um índicen(i)tal quexi∈Mn(i)
1.3 Módulos 27
Daí,E⊂Mn0 e entãoE =Mn0(pois,Mn0 ⊂E)
Para n≥0, as relações de inclusão Mn0 ⊂Mn ⊂E e a igualdade E =Mn0 implica que
Mn=Mn0.
Logo, a sequência(Mn)n≥0é estacionária a partir den0
A equivalência de a) e b) é um caso particular do lema seguinte sobre conjuntos parcialmente ordenados.
Lema 1.4 Seja T um conjunto parcialmente ordenado. As seguintes afirmações são
equivalentes:
a)Todo subconjunto não vazio T contém um elemento maximal.
b)Toda sequência crescente(tn)n≥0de elementos de T é estacionária.
Prova:
a)⇒b)Suponha que todo subconjunto não vazio deT contém um elemento maximal.
Sejatqo elemento maximal da sequência crescente(tn)n≥0
Como a sequência(tn)é crescente, então paran≥qtemos quetn≥tq.
Sendotnmaximal, segue quetn=tq∀n≥q
Logo, toda sequência(tn)n≥0de elementos deT é estacionária.
b)⇒a)Suponha que exista um subconjuntoSdeT que não contém um elemento maximal.
Então para todox∈S, o conjunto dos elementos deSque são maiores do quexé não vazio.
Pelo axioma da escolha, existe uma aplicação f :S→Stal que f(x)>x∀x∈S.
ComoSé não vazio, podemos escolhert0∈Se definir por indução a sequência(tn)n≥0 da formatn+1= f(tn)
Esta sequência é estritamente crescente e não é estacionária. (contradição!)
Logo, todo subconjunto não vazio deT contém um elemento maximal.
Corolário 1.3 Em um anel de ideais principais A, toda família não-vazia de ideais contém um
1.3 Módulos 28
Prova: Se considerarmosAcomo um módulo sobre si mesmo, seus submódulos são ideais.
Como todos os ideais são principais, eles sãoA-módulos gerados por um único elemento,
assim sãoA-módulos do tipo finito.
Logo, segue o resultado pela implicaçãoc)⇒a)do teorema 1.2
Definição 1.10 A dimensão do subespaço gerado por M é chamado de posto de M. Se M é
livre e admite uma base possuindo n elementos, então o posto de M é n.
Teorema 1.3 Seja A um anel de ideais principais, M um A-módulo livre de posto n, e M′ um
submódulo de M. Então:
a)M’ é livre de posto q,0≤q≤n
b)Se M′6= (0), existe uma base{e1, . . . ,en}de M e elementos não nulos a1, . . . ,aq∈A tal que
{a1e1, . . . ,aqeq}é uma base de M′e tal que aidivide ai+1, 1≤i≤q−1
Prova: SeM′= (0), o teorema é imediato, pois será livre, de posto 0.
Vamos considerarM′6= (0)
SejaL(M,A)o conjunto das formas lineares emM.
Para u∈L(M,A), temos que u(M′) é um submódulo de A, ou melhor, um ideal de A. Podemos escreveru(M′) =Aau, comau∈A, pois os ideais deAsão principais.
Seja u∈ L(M,A) tal que Aa
u é maximal entre Aav, onde v ∈ L(M,A), isto pode ser
considerado pelo corolário 1.3.
Tomemos uma base{x1, . . . ,xn}deMque identificaMcomAn.
Seja pri:M→Aa projeção dai-ésima coordenada, isto é, pri(xj) =δi j
ComoM′6= (0), para pelo menos umi, 1≤i≤n, temos que pri(M′)6= (0)
Assim,au6= (0). Por construção, existee′∈M′tal queu(e′) =au.
Vamos mostrar que para todov∈L(M,A), tem-seau|v(e′).
De fato, se d =mdc(au,v(e′)), então d=bau+cv(e′), com b,c∈A. Daí, d =bu(e′) +
cv(e′) = (bu+cv)(e′), poisu(e′) =au. Comobu+cv é uma forma linear emM, entãoAau ⊂
Ad ⊂u(M′) (temos queAau ⊂Ad, pois todos os múltiplos deausão também múltiplos ded, já
qued|au).
Pela maximalidade de Aau, temos que Ad =Aau e daíau|v(e′). Em particular,au|pri(e′)e
1.3 Módulos 29
Ponhae= n
∑
i=1
bixi, entãoe′=aue
Comoau=u(e′) =u(aue) =auu(e), segue queu(e) =1 (note queau6=0)
Mostraremos que:
1)M=ker(u) +Ae
2)M′= (M′∩ker(u)) +Ae′, ondee′=auee as somas são diretas
Prova 1): Já temos que ker(u) +Ae⊂M, basta mostrarmos queM⊂ker(u) +Ae
Para todox∈M,x=u(x)e+ (x−u(x)e). Temos queu(x−u(x)e) =u(x)−u(x)u(e)
Como u(e) =1, então u(x)−u(x)u(e) =u(x)−u(x) =0. Daí, u(x−u(x)e) =0 e assim
x−u(x)e∈ker(u). Logo,Ae+ker(u)⊂M
Obviamente,Ae∩ker(u) = (0). Assim,Ae+ker(u) =M, onde a soma é direta.
Prova 2): Como(M′∩ker(u)) +Ae′⊂M′, basta mostrar que
M′⊂(M′∩ker(u)) +Ae′
Dadoy∈M′,u(y) =bau, comb∈A
Temos que:
y=baue+ (y−baue) =baue+ (y−u(y)e) =be′+ (y−u(y)e)
Veja que: y−u(y)e∈ker(u), poisu(y−u(y)e) =u(y)−u(y)u(e) =u(y)−u(y) =0.
Além disso,y−u(y)e=y−baue=y−be′∈M′. Logo,y−u(y)e∈M′∩ker(u)
Daí,y=be′+ (y−u(y)e)∈(M′∩ker(u)) +Aee portanto,M′= (ker(u)∩M′) +Ae
Agora, provaremos o itema)do teorema usando indução sobre o postoqdeM′.
Seq=0,M′= (0)e não há o que provar.
Seq>0, entãoM′∩ker(u)tem postoq−1, pela afirmação(2)e assim é livre pela hipótese de indução.
1.3 Módulos 30
deM′∩ker(u). Logo,M′é livre.
Para provarb), usaremos indução sobre o postondeM.
Sen=0, é trivial. Por(a), temos queker(u)é livre e de poston−1, pois em(1)a soma é direta.
Aplicaremos a hipótese de indução no módulo livreker(u)e no seu submóduloM′∩ker(u)
SeM′∩ker(u)6= (0), existeq≤n, uma base{e2, . . . ,eq}doker(u)e elementos não-nulos
a2, . . . ,aq deAtal que {a2e2, . . . ,aqeq} é uma base paraM′∩ker(u) e tais queai divideai+1, 2≤i≤q−1.
Mantendo as notações acima, fixemosa1=auee1=e
Daí,{e1, . . . ,en}é uma base paraM, (pela afirmação 1) e{aie1, . . . ,aqeq}é uma base para
M′(pela afirmação 2 e pelo fato quee′=a1e1). Resta mostrar quea1|a2.
De fato, sejav∈L(M,A), definida pela relação: v(e1) =v(e2) =1 ev(ei) =0 parai≥3
Assim,a1=au=auv(e1) =v(aue) =v(e′)∈v(M′)
Daí,Aau⊂v(M′)
Pela maximalidade deAau, temos queAa1=Aau =v(M′)
Comoa2=a2v(e2) =v(a2e2)∈v(M′) =Aa1, entãoa2∈Aa1
Logo,a1|a2
Corolário 1.4 Seja A um anel de ideais principais e E um A-módulo do tipo finito.
Então E é isomorfo ao produto A I1×
A I2×
A In
, onde os I′s são ideais de A tal que I1⊃I2⊃ ··· ⊃In
Prova: ComoE éA-módulo do tipo finito, então considere {x1, . . . ,xn}um conjunto finito de
geradores deE.
Pelo que vimos na proposição 1.4, existe um homomorfismo sobrejetorψ:An→E.
Assim, pelo teorema dos isomorfismos, segue que An
kerψ ≃E
Pelo teorema 1.3, existe uma base {e1, . . . ,eq} de An, um inteiro q≤ n, e elementos não-nulos a1, . . . ,aq de A tal que {a1e1, . . . ,aqeq} é uma base de kerψ e ai divide ai+1, para todo 1≤i≤q−1.
Ponhaap=0 paraq+1≤p≤n, então
An
kerψ é isomorfo ao produto
∏
i AeiAaiei
1.4 Raízes da Unidade e Corpos Finitos 31
e Aei
Aaiei
é isomorfo a A
Aai
Logo, An
kerψ é isomorfo ao produto dos A Aai
.
Pondo,Ii=Aai, temos que
An
kerψ é isomorfo ao produto dos A Ii
ComoEé isomorfo a A
n
kerψ, entãoE é isomorfo ao produto dos A Ii
, ou seja,
E≃ A I1×
A
I2× ··· ×
A In
Corolário 1.5 Seja G um grupo finito comutativo. Então, existe x∈G cuja ordem é igual ao
mínimo mútiplo comum das ordens dos elementos de G.
Prova: Um grupo comutativo é umZ-módulo(a operação sendo a adição)
Pelo corolário 1.4, temos queG≃ Z
a1Z× ··· ×
Z anZ
(pois, os ideais deZsão principais e daí são da formaaiZ), ondea1Z⊃a2Z⊃ ··· ⊃anZ.
Assim,a1|a2|. . .|an. Temos queai6=0∀i, pois caso contrário,Gseria infinito.
Sejay=1∈ Z
anZ
e ponhax= (0, . . . ,0,y). A ordem dexéan, pois a ordem de 1∈ Z anZ
é
an
Paraz= (z1, . . . ,zn)∈G, temos queanz=0, poisanz1=0, anz2=0, . . . ,anzn=0, já que
a1|a2|. . .|an
Logo,ané um múltiplo da ordem deze o menor múltiplo.
Portanto,xé o elemento procurado.
1.4 Raízes da Unidade e Corpos Finitos
Teorema 1.4 SejaK um corpo. Todo subgrupo finito G do grupo multiplicativo K∗ consiste
das raízes da unidade e é cíclico.
Prova: Pelo corolário 1.5, existez∈Gcuja ordemné o mínimo múltiplo comum da ordem
dos elementos deG. Daí,yn=1∀y∈G.
Como um polinômio de graunsobre um corpo tem no máximonraízes no corpo, então o
1.4 Raízes da Unidade e Corpos Finitos 32
Por outro lado, tendoz ordemn, segue queGcontém osnelementos: z,z2, . . . ,zn=1, os quais são todos distintos.
Logo,Gé constituído das raízes da unidade e é cíclico(gerado porz).
Definição 1.11 Se um corpoK contém n raízes n-ésimas da unidade, elas formam um grupo
cíclico de ordem n, isomorfo a Z
nZ. Um gerador deste grupo é chamado raiz n-ésima primitiva da unidade.
Assim, toda raizn-ésima da unidade é portanto uma potência de uma raiz primitiva. Pela
proposição 1.1, o número dessas raízes primitivas éϕ(n).
Seja K um corpo. Existe um único homomorfismo de anéis ψ :Z →K, definido por:
ψ(n) =1+1+···+1
| {z }
n vezes
, paran≥0 eψ(−n) =−ψ(n)
Seψ é injetiva, ela identificaZcom um subanel deK, entãoKtambém contém o corpo de fraçõesQdeZ. Neste caso, dizemos queKtem característica zero.
Seψ não é injetiva, seu núcleo é um ideal deZ, ou seja, seu núcleo épZ, com p>0, pois todo ideal deZé principal. Assim, Z
pZ é identificado com um subanel deK.
Daí, Z
pZ é um corpo e então pZé um ideal primo. Logo, pé um número primo.
Dizemos neste caso queKé de característica p.
EscreveremosFppara representar
Z
pZ. O subcorpoQouFpdeKé o menor subcorpo
deKe é chamado o subcorpo primo deK.
Para todo número primo p, existem corpos de característica p, ou seja,Fp.
Proposição 1.5 Se Ké um corpo de característica p6=0, então p.x=0∀x∈Ke(x+y)p=
xp+yp
Prova: Como a característica deKé p6=0, então para todox∈K, temos que: p.x= (p.1)x=
0.x=0
1.4 Raízes da Unidade e Corpos Finitos 33
(x+y)p = p
∑
j=0
p j
xjyp−j
=
p
0
x0yp+ p−1
∑
j=1
p j
xjyp−j+
p p
xpy0
= xp+yp+ p−1
∑
j=1
p j
xjyp−j
O coeficiente binomial
p j
é um inteiro, seu valor é p!
j!(p−j)!
Como o número paparece no numerador, mas não no denominador, então
p j
é múltiplo de ppara todo 1≤ j≤ p−1.
Logo,
p j
xjyp−j=0∀1≤ j≤p−1, ou seja,
p−1
∑
j=1
p j
xjyp−j=0.
Portanto,(x+y)p=xp+yp.
Teorema 1.5 SejaKum corpo finito. Se q=card(K), então:
a)A característica deKé um primo p,Ké um espaço vetorial de dimensão finita s sobre
Fpe q=ps
b)O grupo multiplicativoK∗é cíclico de ordem q−1.
c)xq−1=1∀x∈K∗e xq=x
∀x∈K
Prova:a)ComoZé infinito eKé finito, entãoψ:Z→Knão é é injetiva. Daí,Knão pode ter
característica zero.
Logo,KcontémFp, com pprimo e sua característica é p.
Temos queKé um espaço vetorial sobreFpcuja dimensãosdeve ser finita, caso contrário,
Kseria um corpo infinito.
1.4 Raízes da Unidade e Corpos Finitos 34
Logo, o número de elementos deKé ps, ou seja,q=ps
b)Pelo teorema 1.4, segue queK∗é cíclico, de ordemq−1
c)Como a ordem de K∗ éq−1, entãoxq−1=1 ∀x∈K∗. Sendo qa ordem de K, segue
quexq=x∀x∈K
Teorema 1.6 (Chevalley) SejamK um corpo finito, F(X1, . . . ,Xn) um polinômio homogêneo
de grau d sobre K e suponha d <n. Então, existe um ponto (x1, . . . ,xn)∈Kn diferente da
origem(0, . . . ,0)tal que F(x1, . . . ,xn) =0
Prova: Considereq=card(K)e p=car(K), entãoq=ps, pelo teorema 1.5.
SejaV ⊂Kno conjunto dos zeros deF, isto é, o conjunto dos pontos(x
1, . . . ,xn)∈Kn tal queF(x1, . . . ,xn) =0. Usaremos o símboloxpara representar um ponto(x1, . . . ,xn)∈Kn.
Pelo teorema 1.5(c), temos que: F(x)q−1=0∀x∈V eF(x)q−1=1∀x∈Kn−V
Assim, o polinômio G(x) =F(x)q−1 é a função característica deKn−V com valores em
Fp. O número, módulo p, de pontos deKn−V será então dado pela soma
∑
x∈KnG(x).
Vamos calcular esta soma e mostrar que ela vale zero(mod p).
Se isso ocorrer, então teremos quecard(Kn
−V)é um múltiplo de p.
Comocard(Kn) =qn= (pn)n=pnsé também um múltiplo de p, entãocard(V)é também um múltiplo de p. Já temos queV contém a origem, então se p|card(V), necessariamenteV
contém outros pontos(pois, p≥2).
Assim, para provar este teorema é suficiente mostrar que
∑
x∈KnG(x) =0∈Fp.
Agora, para calcular
∑
x∈KnG(x), observe que o polinômio Gé uma combinação linear dos
monômiosMα(X) =X1α1. . .Xnαn.
Para determinar
∑
x∈KnG(x)é suficiente calcular
∑
x∈Kn
Mα(x) =
∑
x∈Kn
xα11. . .xαnn =
∑
x1∈Kx1α1
!
. . .
∑
xn∈Kxαn
n
!
Logo, o problema reduz-se ao cálculo de somas da forma
∑
z∈Kzβ, comβ ∈N. Consideremos os seguintes casos:
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 35
Consequentemente,
∑
z∈Kzβ =
∑
z∈K1=q=0(mod p)
b)Paraβ >0, o termo 0β é 0, assim a soma reduz a
∑
z∈K∗zβ
ComoK∗é um grupo cíclico de ordemq−1, pelo teorema 1.5b), então sejawgerador de K∗.
Assim,
∑
z∈K∗
zβ = q−2
∑
j=0
wβj, que é a soma de uma progressão geométrica. Analisemos os
seguintes casos:
b)′Sewβ 6=1. Neste caso,β não é múltiplo deq−1. Daí,
q−2
∑
j=0
wβj=w
β(q−1)−1
wβ−1 =0,pois w
q−1=1
b)′′ Sewβ =1, isto é, seβ é um múltiplo deq−1. Assim,
q−2
∑
j=0
wβj=1+1+···+1
| {z }
q−1vezes
=q−1
Segue pora),b)′eb)′′que
∑
x∈Knxα11. . .xαn desaparece a menos que todosα
i’s são não-nulos
e múltiplos deq−1. Assim, o grauα1+···+αndo monômio é no mínimo(q−1)n.
Mas, comoG=Fq−1, entãoGpossui grau(q−1)d e(q−1)d<(q−1)n, poisd<n
Assim, não podemos ter osαi’s não nulos e múltiplos deq−1.
Logo,
∑
x∈Kn
Mα(x) =0 para todo monômio Mα(x) que aparece em G com coeficientes
não-nulos.
Portanto,
∑
x∈KG(x) =0 e isto prova o teorema.
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos
sobre um Corpo
1.5.1 Elementos Inteiros sobre um Anel
Teorema 1.7 Seja R um anel, A um subanel de R e x um elemento de R. As seguintes afirmações
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 36
a)Existem a0, . . . ,an−1∈A tal que
xn+an−1xn−1+···+a1x+a0=0,
isto é, x é uma raiz de um polinômio com coeficientes em A
b)O anel A[x]é um A-módulo do tipo finito.
c)Existe um subanel B de R que contém A e x e que é um A-módulo do tipo finito.
Prova:a)⇒b)
SejaMumA-módulo deRgerado por 1,x, . . . ,xn−1
Pora), temos que existema0, . . . ,an−1∈Atal que
xn=−an−1xn−1− ··· −a1x−a0 (1.5)
Assim,xn∈M. Multiplicando a equação 1.5 porxj, obtemos:
xn+j=−an−1xn+j−1− ··· −a1xj+1−a0xj
Vamos mostrar quexn+j∈M. Para isto, usaremos indução sobre j≥0.
Para j≥0, está provado, pois já vimos quexn∈M
Para j=1, temos que:
xn+1=xn.x=−an−1xn− ··· −a1x2−a0x (1.6)
Comoxn∈M, então pela equação 1.6 temos quexn+1∈M
Suponha quexn+(j−1)∈M.
Temos que:
xn+(j−1)=−an−1x(n−1)+(j−1)− ··· −a1xj−a0xj−1
Daí,
xn+j=xn+(j−1).x=−an−1x(n+j)−1− ··· −a1xj+1−a0xj
Logo,xn+j∈M∀j≥0
ComoA[x]é umA-módulo gerado porxk,k≥0, então temos queA[x] =M.
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 37
b)⇒c)Basta tomarB=A[x]
Já sabemos porb)queA[x]é umA-módulo do tipo finito. Além disso,A⊂A[x]ex∈A[x]
c)⇒a)
ComoB é umA-módulo do tipo finito, então seja{y1, . . . ,yn}o conjunto de geradores de
B.
Assim,B=Ay1+···+Ayn
Comox∈BeBé subanel deR, entãoxyi∈Bpara todoi=1, . . . ,n
Logo,xyi= n
∑
j=1
ai jyjpara todoi=1, . . . ,neai j∈A, 1≤i,j≤n
Seδi j =0 parai6= jeδi j =1 parai= j, podemos escrever:
xy1 = n
∑
j=1
δ1jxyj
xy2 = n
∑
j=1
δ2jxyj
...
xyn = n
∑
j=1
δn jxyj
Assim,xyi= n
∑
j=1
δi jxyj, comi=1, . . . ,n
Daí,xyi= n
∑
j=1
ai jyjequivale a dizer que n
∑
j=1
δi jxyj= n
∑
j=1
ai jyj
Logo,
n
∑
j=1
(δi jx−ai j)yj=0,i=1, . . . ,n
Considere este sistema denequações lineares em(y1, . . . ,yn)e tomed=det(δi jx−ai j)
Assim, pela regra de Cramer, temos quedyj=0, para todo j=1, . . . ,n
Como 1∈B, podemos escrever 1= n
∑
j=1
cjyj, comcj∈A
Logo,d=d.1=d
n
∑
j=1
cjyj= n
∑
j=1
cjdyj=0
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 38
d=det
δ11x−a11 δ12x−a12 . . . δ1nx−a1n
δ21x−a21 δ21x−a22 . . . δ2nx−a2n
... ... . .. ...
δn1x−an1 δn2x−an2 . . . δnnx−ann
=det
x−a11 −a12 . . . −a1n
−a21 x−a22 . . . −a2n
... ... ... ...
−an1 −an2 . . . x−ann
Deduzimos quedé da forma 0=d=xn+b1xn−1+···+bn, ondebi∈A
Isso prova quexé inteiro sobreA.
Definição 1.12 Seja R um anel e A um um subanel de R. Um elemento x∈R é chamado inteiro
sobre A se satisfaz uma das condições(e portanto todas as condições) do teorema 1.7
SejaP∈A[X]o polinômio mônico tal que P(x) =0. A relaçãoP(x) =0 é chamado uma equação de dependência inteira dexsobreA.
Exemplo 1.3 O elemento x=√2deRé inteiro sobreZ. A relação x2−2=0é a equação de
dependência inteira.
Proposição 1.6 Seja R um anel, A um subanel de R, e seja (xi)1≤i≤n um conjunto finito de
elementos de R. Se, para todo i, xié inteiro sobre A[x1, . . . ,xi−1](em particular todos os x′is são
inteiros sobre A), então A[x1, . . . ,xn]é um A-módulo do tipo finito.
Prova: Vamos usar indução sobre n. Para n=1, já temos que x1 é inteiro sobre A[x1], por
hipótese. Assim, pelo itemb)do teorema 1.7, segueA[x1]é umA-módulo do tipo finito.
Suponha queB=A[x1, . . . ,xn−1]é umA-módulo do tipo finito, entãoB= p
∑
j=1
Abj.
O cason=1 implica queA[x1, . . . ,xn−1][xn] =B[xn]é umB-módulo do tipo finito.
Assim,B[xn] = q
∑
k=1
Bck
Daí,A[x1, . . . ,xn] = q
∑
k=1
Bck= q
∑
k=1 p
∑
j=1
Abj
!
ck=
∑
j,kAbjck
Logo,(bjck),1≤ j≤p,1≤k≤qé um conjunto finito de geradores paraA[x1, . . . ,xn]
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 39
Corolário 1.6 Seja R um anel, A um subanel de R, x e y elementos que são inteiros sobre A.
Então x+y, x−y e xy são inteiros sobre A.
Prova: Temos quex+y, x−yexypertencem aA[x,y]. Comox, ysão inteiros sobreA, então
pela proposição 1.6, temos queA[x,y]é umA-módulo do tipo finito.
ComoA[x,y]é um subanel deRque contémAex+y,x−y,xy∈A[x,y]e além disso,A[x,y] é umA-módulo do tipo finito, então pelo itemc)do teorema1.7 temos quex+y,x−yexysão
inteiros sobreA.
Corolário 1.7 Seja R um anel e A um subanel de R. O conjunto A′dos elementos de R que são
inteiros sobre A é um subanel de R que contém A.
Prova: Sex,y∈A, então xeysão inteiros sobreA. Pelo corolário 1.6, segue quex+y, x−y,
xysão inteiros sobreA, ou seja,x+y,x−y,xypertencem aA′. Assim,A′é um subanel deA.
Vamos provar agora queA⊂A′.
De fato, se a ∈A, temos que a é raiz do polinômio mônico P(X) = X−a que possui
coeficientes emA.
Logo,aé inteiro sobreA, ou seja,a∈A′.
Portanto,A⊂A′.
Definição 1.13 Seja R um anel, A um subanel de R. O anel A′ dos elementos de R que são
inteiros sobre A é chamado o fecho inteiro de A em R.
Definição 1.14 Seja A um domínio de integridade eKseu corpo de frações. O fecho inteiro de
A emKé chamado o fecho inteiro de A.
Definição 1.15 Seja B um anel e A um subanel de B. Dizemos que B é inteiro sobre A se todo
elemento de B é inteiro sobre A, ou seja, se o fecho inteiro de A em B é o próprio B.
Proposição 1.7 (Transitividade) Seja C um anel, B um subanel de C e A um subanel de B. Se
B é inteiro sobre A e C é inteiro sobre B, então C é inteiro sobre A.
Prova: Sejax∈C. Entãoxé inteiro sobreB. Assim, existe uma equação de dependência
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 40
PonhaB′=A[b0, . . . ,bn−1], entãoxé inteiro sobreB′.
ComoBé inteiro sobreA, osb′is são inteiros sobreA. Logo, pela proposição 1.6, temos que
B′[x] =A[b0, . . . ,bn−1,x]é umA-módulo do tipo finito.
Portanto, pelo itemc)do teorema 1.7, segue quexé inteiro sobreA.
Portanto,Cé inteiro sobreA.
Proposição 1.8 Seja B um domínio de integridade e A um subanel de B tal que B é inteiro sobre
A. Para que B seja um corpo é necessário e suficiente que A seja um corpo.
Prova: Suponha que Aé um corpo e sejab∈B, b6=0. Como Bé inteiro sobreA, então
pelo teorema 1.7, segue queA[b]é umA-módulo do tipo finito.
Daí,A[b]é um espaço vetorial de dimensão finita sobreA.
Por outro lado, a aplicação f :A[b]→A[b]dada por f(y) =byé uma transformaçãoA-linear
deA[b]
Veja que: i)f é injetiva
De fato, sejamy1,y2∈A[b]
f(y1) = f(y2)⇒by1=by2⇒by1−by2=0⇒b(y1−y2) =0
ComoA[b]é domínio de integridade eb6=0, segue quey1−y2=0, ou seja,y1=y2
Logo, f é injetiva.
ii) f é sobrejetiva
Com efeito, SendoA[b]de dimensão finita e f injetiva, segue pelo Teorema do Núcleo e da
Imagem que f é sobrejetiva.
Assim, existeb′∈A[b]tal quebb′=1. Isto mostra que∀b∈B−(0),bé invertível emB.
Logo,Bé um corpo.
Reciprocamente, suponha queBé um corpo e tomea∈A−(0).
ComoA⊂B, entãoapossui um inversoa−1∈B. SendoBinteiro sobreA, temos quea−1
satisfaz a equação de dependência inteira:
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 41
Multiplicando a equação acima poran−1, obtemos:
a−1 + an−1+···+a1an−2+a0an−1=0
a−1 = −(an−1+···+a1an−2+a0an−1)
Logo,a−1∈A
Portanto,Aé um corpo.
Definição 1.16 Um anel A é chamado integralmente fechado se é um domínio de integridade e
além disso, ele é seu próprio fecho inteiro. Em outras palavras, todo elemento x do corpo de
fraçõesKde A que é inteiro sobre A pertence a A.
Proposição 1.9 Seja A um domínio de integridade e K seu corpo de frações. Então o fecho
inteiro A′de A, isto é, o fecho inteiro de A emKé integralmente fechado.
Prova: Precisamos mostrar que o fecho inteiro deA′é o próprioA′.
Temos que o fecho inteiro deA′é inteiro sobreA′. Por outro lado,A′é inteiro sobreA.
Logo, pela proposição 1.7, temos que o fecho inteiro deA′é inteiro sobreA.
Portanto, o fecho inteiro deA′é o próprioA′
Proposição 1.10 Todo anel de ideais principais é integralmente fechado.
Prova: SejaAum anel de ideais principais. Assim,Aé domínio de integridade, basta agora
mostrar que o fecho inteiro deAé o próprioA.
Seja x um elemento do corpo de frações de A que é inteiro sobre A. Assim, x satisfaz a
equação de dependência inteira:
xn+an−1xn−1+···+a1x+a0=0, ai∈A
Escrevax=a
b, comaebrelativamente primos, ou seja,mdc(a,b) =1
Substituindox= a
b na equação de dependência inteira acima, obtemos:
a
b
n
+an−1
a
b
n−1
+···+a1a b
+a0 = 0
an+bnan−1a n−1
bn−1+···+bna1
a b+b
n
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 42
Assim,
an=−b(an−1an−1+···+a1abn−2+a0bn−1)
Logo, b divide an. Como b é relativamente primo coma, então b divide a, basta aplicar
repetidamente o lema de Euclides.
Portanto, comomdc(a,b) =1 eb|a, temos quebé uma unidade emA, ou seja,x= a
b ∈A
Logo,Aé integralmente fechado.
1.5.2 Elementos Algébricos sobre um Corpo e Extensões Algébricas
Nesta seção apresentamos as definições de elemento algébrico, extensão algébrica e polinômio minimal. SejaRum anel eKum subcorpo deR
Definição 1.17 Dizemos que um elemento x∈R é algébrico sobre K, se existem elementos
a0,a1, . . . ,an∈K, nem todos nulos tais que anxn+···+a1x+a0=0, ou seja, x é raiz de um
polinômio não nulo, com coeficientes emK. Um elemento de R que não é algébrico é chamado
transcendental sobreK.
Definição 1.18 Se todo elemento de R for algébrico sobreK, dizemos que A é algébrico sobre
K. Se R é um corpo, então dizemos que R é uma extensão algébrica deK.
Observação 1.3 Na definição 1.17, podemos supor que an 6= 0. Assim, a−n1 ∈ K e daí,
multiplicando anxn+···+a1x+a0=0por a−n1, obtemos uma equação de dependência inteira.
Portanto, sobre um corpo, algébrico=inteiro
Definição 1.19 Dado um corpoLe um subcorpoKdeL, chamamos a dimensão[L:K]o grau
deLsobreK
Observação 1.4 ParaK⊂R e x∈R, pelo teorema 1.7 b), temos que:
x é algébrico sobreK⇔[K[x]:K]é finito.
Observação 1.5 Seja L um corpo eK um subcorpo de L, então pelo 1.7 c), temos que Se o
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 43
Definição 1.20 Todo corpo extensão de Q de grau finito é chamado um corpo numérico
algébrico, ou simplesmente um corpo numérico.
Proposição 1.11 Seja K um corpo, L uma extensão algébrica de K e M uma extensão
algébrica deL. EntãoMé uma extensão algébrica deK. Além disso,
[M:K] = [M:L][L:K]
Prova: Pela proposição 1.7, segue queMé uma extensão algébrica deK. Vamos mostrar
agora que[M:K] = [M:L][L:K]
Seja(xi)i∈I uma base deLsobreKe(yj)j∈J uma base paraMsobreL.
Vamos mostrar que(xiyj)(i,j)∈I×J é uma base paraMsobreK.
Pela proposição 1.6, temos que(xiyi)(i,j)∈I×J geraMsobreK.
Daí, a relação
∑
i,jai jxiyj=0, comai j ∈Kimplica que∑ ∑ai jxi
yj=0
Como(yj)j∈J é L.I, então∑ai jxi=0, para todo j.
Consequentemente,ai j=0∀(i,j)∈I×J, pois(xi)i∈I é L.I.
Logo,(xiyj)(i,j)∈I×J é uma base paraMsobreK.
Portanto,[M:K] = [M:L][L:K]
Observação 1.6 Sejam R um anel, K um subcorpo de R e x um elemento de R. Escrevemos
K[X] para o anel de polinômios em uma variável sobre K. Existe um único homomorfismo ϕ :K[X]→R tal queϕ(X) =x eϕ(a) =a∀a∈K. A imagem deϕ éK[x]
Assim, a definição de elemento algébrico pode ser reformulada da seguinte forma:
Proposição 1.12 Um elemento x é algébrico sobreK⇔kerϕ6= (0)
Prova: ⇒)Se xé algébrico sobre K, então existem elementosa0, . . . ,an∈K, nem todos
nulos tal queanxn+···+a1x+a0=0
ComoImϕ =K[x]eanxn+···+a1x+a0∈K[x], então existe um polinômioanXn+···+
a1X+a0∈K[X]tal queϕ(anXn+···+a1X+a0) =anxn+···+a1x+a0=0
Logo,anXn+···+a1X+a0∈Kerϕ
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 44
⇐)Suponha quexnão é algébrico sobreK, então seanxn+···+a1x+a0=0, temos que
a1=a2=···=an=0
TomeP=anXn+···+a1X+a0∈kerϕ
Daí,ϕ(P) =ϕ(anXn+···+a1X+a0) =0. Assim,anxn+···+a1x+a0=0
Sendoxtranscendental sobreK, temos quean=···=a1=a0=0.
Logo,P=0
Portanto,kerϕ = (0)
Definição 1.21 SejamK⊆R um subcorpo de R e x um elemento de R. O polinômio mônico e
de menor grau emK[X]que tem x como raiz é chamado de polinômio minimal de x sobre Ke
seu grau é[K[x]:K]
Observação 1.7 Como K[X]é um anel de ideais principais, então kerϕ é um ideal principal
gerado pelo polinômio mimimal de x sobreK, ou seja, kerϕ=hF(X)i
Proposição 1.13 Seja F(X)o polinômio minimal de x sobreKe G(X)∈K[X]. Assim, G(x) =0
se e somente se F(X)divide G(X)emK[X]
Prova: ⇒)SejaG(X) =anXn+an−1Xn−1+···+a1+a0∈K[X]
Assim,
ϕ(G(X)) = ϕ(anXn+an−1Xn−1+···+a1X+a0)
ϕ(G(X)) = anxn+an−1xn−1+···+a1x+a0
ϕ(G(X)) = G(x) =0
Logo,G(X)∈kerϕ=hF(X)i
Portanto,F(X)divideG(X)
⇐)SeF(X)divideG(X)∈K[X], entãoG(X) =F(X)Q(X)para algumQ(X)∈K[X]
Assim,
ϕ(G(X)) =ϕ(F(X)Q(X)) =ϕ(F(X))ϕ(Q(X))
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 45
Logo,anxn+an−1xn−1+···+a1x+a0=0, ou sejaG(x) =0
Observação 1.8 Pelo teorema dos isomorfismos, temos que K[X]
hF(X)i ≃K[x]
Proposição 1.14 Seja Kum corpo e P(X)∈K[X]um polinômio não constante. Então existe
uma extensão algébricaK′deKde grau finito tal que P(X)fatora emK′[X]em um produto de
polinômios de grau1
Prova:Vamos usar indução sobre o graukdeP(X).
Sek=1, então o resultado é verdadeiro, poisP(X)é um polinômio de grau 1.
SejaF(X)um fator irredutível deP(X). Temos que existe uma extensãoK′′ de grau finito
sobreK, isto é, K[X]
hF(X)i contendo um elementoxtal queX−xdivideF(X)emK′′[X].
Daí,X−xtambém divideP(X).
Assim, P(X) = (X−x)P1(X) comP1(X)∈K′′[X]. Como P1(X) possui grauk−1, então pela hipótese de induçãoP1(X)fatora em produto de polinômios lineares em uma extensãoK′ de grau finito sobreK′′.
Pela proposição 1.11,K′é de grau finito sobreK.
Logo,P(X) = (X−x)P2(X), ondeP2(X)é a fatoração deP1(X)em produto de polinômios lineares em uma extensãoK′deK.
1.5.3 Elementos Conjugados e Corpos Conjugados
Definição 1.22 Dados dois corpos L e L′ ambos contendo um corpo K, chamamos todo
isomorfismoϕ :L→L′tal que ϕ(a) =a ∀a∈KumK isomorfismo deL emL′. Neste caso,
dizemos queLeL′sãoK-isomorfismos. Se eles são algébricos sobreKdizemos que eles são
conjugados sobreK.
Definição 1.23 Dadas duas extensõesLeL′deK, dizemos que dois elementos x∈Le x′∈L′
são conjugados sobreKse existe umK-isomorfismoϕ:K(x)→K(x′)tal queϕ(x) =x′. Talϕ
é única. A existência deϕ significa que x e x′são ambos transcendentais sobreKou são ambos
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 46
Exemplo 1.4 Seja F(X) um polinômio irredutível de grau n sobreK e sejam x1, . . . ,xn suas
raízes na extensãoK′deK. Então os x′is são dois a dois conjugados sobreK.
Lema 1.5 Seja K um corpo de característica zero ou um corpo finito e F(X) ∈K[X] um
polinômio mônico irredutível
Considere F(X) = n
∏
i=1
(X −xi) sua decomposição em produto de fatores lineares na
extensãoK′deK. Então as n raízes x1, . . . ,xnde F(X)são distintas.
Prova: Suponha, por absurdo que asn-raízes deF(X)não são todas distintas. Assim,F(X)
possui uma raiz múltipla. Daí,F(X)possui uma raiz comum com seu derivadoF′(X).
Logo,F(X)divideF′(X)
Como grauF′<grauF eF divideF′, entãoF′(X)é o polinômio nulo. Daí,
F′(X) =nXn−1+ (n−1)an−1Xn−2+···+a1=0
Isto significa quen.1=0 e j.aj=0 para todo j=1, . . . ,n−1. Mas isso não pode ocorrer em um corpoKde característica zero.
SeKtem característicap6=0, então a relaçãon.1=0 e j.aj=0∀j=1, . . . ,n−1 significa que pdividene queaj=0 para todo jque não é múltiplo de p.
Logo,F(X)é da forma:
F(X) =Xqp+bq−1X(q−1)p+···+b1Xp+b0, bi∈K,
pois os termosajque não são zero são os termos em que jé da formaqp−q,qp−2p, . . . ,qp−
qp.
Se cada um dosb′is é umap-potência, isto é,bi=cipcomci∈K, então pela proposição 1.5, temos:
F(X) = (Xq+cq−1Xq−1+···+c0)p
Logo,F(X)não é irredutível. absurdo!
Portanto, asnraízesx1, . . . ,xndeF(X)são distintas.
1.5 Elementos Inteiros sobre um Anel; Elementos Algébricos sobre um Corpo 47
sempre é verdade, pois seKé um corpo finito com característica p6=0, então a aplicação
f :K → K
x 7→ xp
é injetiva. Pois, xp=yp⇒xp−yp=0⇒(x−y)p=0⇒x−y=0⇒x=y
ComoKé finito e f é injetiva, segue que f é sobrejetiva. Assim,∀z∈K, existe um único
x∈Ktal que f(x) =z, ou seja, xp=z
Definição 1.24 Os corposKde característica p6=0para os quais x7→xpé sobrejetiva, ou seja,
para os quais todo elemento deKé uma p-ésima potência são chamados corpos perfeitos.
Pelo que vimos anteriormente, os corpos finitos são perfeitos. Por convenção, os corpos de
característica zero são também perfeitos.
Teorema 1.8 SejaK um corpo de característica zero ou um corpo finito. ConsidereK′ uma
extensão deKde grau finito n e C um corpo algebricamente fechado contendoK. Então existe
nK-isomorfismos distintos deK′em C
Prova: Se o corpo extensãoK′ deKé da formaK′=K[x], comx∈K′então o polinômio
minimalF(X)dexsobreKé de graun. Ele possuinraízesx1, . . . ,xnemC, todas distintas(pelo lema anterior). Como os x′is são dois a dois conjugados sobre K então para cadai=1, . . . ,n
temos umK-isomorfismoσi:K[x]→Ctal queσi(x) =xi. Neste caso o teorema fica provado.
Vamos agora usar indução sobre o grau n deK′. Sejax∈K′ e considere os corposK⊂ K[x]⊂K′e ponhaq= [K[x]:K]
Podemos assumir que q>1, pois K6=K[x]. Pelo que vimos anteriormente, existem q K-isomorfismos distintosσ1, . . . ,σqdeK[x]emC.
Como K[xi] =K[σi(x)] e K[x] são isomorfos (pois x e xi são conjugados) e além disso
K[x]⊂K′, então é possível construir uma extensãoK′
ideK[σi(x)]e um isomorfismoτi:K′→
K′
ique extendeσi(veja [Endler 2005]). Temos queK[σi(x)]é um corpo finito(pois,K[σi(x)]é uma extensão finita deKeKé característica zero ou um corpo finito).
Como [K′
i :K[σi(x)]] = [K′ :K[x]] =
n
q <n, então pela hipótese de indução temos que
existem n
q K[σi(x)]-isomorfismos distintosθi j deK ′
iemC.
Logo, asnaplicações compostasθi j◦τiresultaq.
n
q =nK-isomorfismos deK
′emC. Eles