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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.475.272 - GO (2014/0201927-6)

RELATOR : MINISTRO NEFI CORDEIRO

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS RECORRIDO : J O C (PRESO)

ADVOGADO : LINDOMAR LOURENÇO DO CARMO SILVA

DECISÃO

Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado de Goiás, com base na alínea "a" do permissivo constitucional, em face de acórdão do Tribunal de Justiça – que deu provimento ao apelo defensivo, para absolver J O C da condenação pela prática do delito previsto no art.

217-A, caput, Código Penal –, assim ementado (fls. 388/390):

APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL.

VIOLÊNCIA PRESUMIDA. PRESUNÇÃO RELATIVA. ABSOLVIÇÃO.

RELAÇÃO DE NAMORO. VIABILIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA. 1 - A simples circunstância da vítima ser menor de quatorze anos não basta para que se afirme como caracterizado o estupro, sendo relativa a presunção de violência, notadamente, quando a ofendida, por manter relação de namoro com o apelante, consente ou adere para a realização da relação sexual, constituindo um verdadeiro contrassenso, em certos casos em que não se observa a ingenuidade da vítima, entender que a mesma sofreu violência. Desse modo, se o acervo probatório demonstrou a capacidade de autodeterminação e vontade consciente da vítima menor de quatorze anos para a prática do ato sexual e, de consequência, a ausência de innocentia consilii, inexiste a violência ficta e, tampouco, a tipicidade da conduta. CRIMES DOS ARTIGOS 240 E 241-A, DO ECA.

MITIGAÇÃO DA PENA-BASE. POSSIBILIDADE. 2 - A Magistrada de singela instância, ao analisar as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, do Código Penal para fixação das penas-base, laborou em erro ao sopesar como desfavoráveis a "personalidade, as circunstâncias e o comportamento da vítima", em relação aos delitos previstos nos artigos 240, caput, e 241-A, ambos do Estatuto da Criança e do Adolescente, devendo elas, portanto, serem revistas.

Reconhecida as atenuantes da menoridade e da confissão espontânea, entretanto, em razão da Súmula 231, do STJ, manteve-se as penas-base no patamar redimensionado. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA, ALTERADO DE OFÍCIO. 3 - Em razão do afastamento da condenação pelo delito de estupro de vulnerável e, pelo redimensionamento das reprimendas dos crimes de fotografar e filmar cenas de conteúdos pornográficos, envolvendo criança ou adolescente e divulgá-los na internet, deve ser o regime inicial de cumprimento da

DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO

Edição nº 1590 - Brasília, Disponibilização: Quarta-feira, 17 de Setembro de 2014 Publicação: Quinta-feira, 18 de Setembro de 2014

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sanção corpórea, ser alterado, para o semiaberto, nos termos do disposto no artigo 33, § 2º, alínea "b", do CP.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO, ABSOLVENDO O APELANTE EM RELAÇÃO AO DELITO DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL, REDIMENSIONADAS AS PENAS APLICADAS PELOS CRIMES DOS ARTIGOS 240 E 241-A, DO ECA, MODIFICANDO, DE OFÍCIO, O REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA PARÁ O SEMIABERTO.

Sustenta o representante do Parquet que o acórdão recorrido teria negado vigência ao art. 217-A do Código Penal, uma vez que a presunção de vulnerabilidade, de que trata esse artigo, é absoluta, não podendo ser relativizada pelo consentimento da ofendida na prática de atos sexuais.

Requer, assim, o provimento do recurso, a fim de que seja restabelecido, no ponto, o decreto condenatório.

Contra-arrazoado e admitido na instância de origem, manifestou-se o Ministério Público Federal pelo provimento do recurso.

É o relatório. DECIDO.

O recurso é tempestivo, e a matéria foi devidamente prequestionada.

Consta dos autos que o recorrido foi condenado, como incurso nos arts.

217-A, caput, na forma do art. 71, 240, caput, e 241-A, todos do Código Penal, à pena total de 22 (vinte e dois) anos e 2 (dois) meses de reclusão, no regime inicial fechado, além do pagamento de 270 (duzentos e setenta dias-multa).

O Tribunal a quo, ao apreciar a apelação da defesa, absolveu o recorrido pelo crime de estupro de vulnerável, praticado, em continuidade delitiva, contra vítima menor de 14 (catorze) anos de idade, sob os seguintes fundamentos (fls. 360/381):

Consta da denúncia, que desde o mês de outubro de 2011, no interior de sua residência, na cidade de Anápolis-GO, o apelante, por várias vezes, manteve conjunção carnal com a adolescente R A M, com apenas 12 (doze) anos de idade, nesta época, bem como fotografou e filmou cenas pornográficas envolvendo a vítima.

Segundo restou apurado, o apelante aproveitava-se da ausência da genitora da vítima, a qual saía para trabalhar no período vespertino, e a levava para sua casa para manterem relações sexuais, sendo que eles eram namorados.

Compulsando os autos, verifica-se que restou comprovado que o apelante manteve conjunção carnal com a menor R A M, de forma que a materialidade e autoria encontram-se comprovadas pelo Relatório de Avaliação de Constatação Prévia (fl.

17) e Laudo de Exame de Conjunção Carnal (fls. 44/46), os quais atestaram "que não houve violência e ruptura himenal antiga", bem

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como pelas declarações da vítima, testemunhas e do próprio recorrente.

No entanto, ao afirmar que manteve relações sexuais com o apelante a vítima afirmou que elas foram consentidas. Confiram-se:

[...]

Embora o comportamento do apelante mereça, sem dúvida, críticas, não há como querer acolher a tese de que, o ato por ele praticado, em razão de manter relação sexual com vítima, menor de 14 (quatorze) anos de idade, por si só, seja considerado crime, de estupro de vulnerável, conforme dispõe o artigo 217-A, do Código Penal.

Neste ponto, cumpre esclarecer que, o apelante, tanto na fase inquisitorial, quanto em Juízo, assume que mantinha relações sexuais com a vítima, pois eles eram namorados, porém, não acha que praticou estupro, uma vez que ela consentia.

O ato foi consentido e aqui é que se enfrenta o maior problema: a lei penal, tanto a antiga como a de hoje (Lei no 12015/2009), não atribui validade ao consentimento de menor de 14 (quatorze) anos de idade para a prática de relações sexuais ou de atos libidinosos.

A maioria dos doutrinadores, entende que tal presunção tem caráter relativo, não bastando a idade da vítima para a configuração do delito, devendo-se analisar, em cada caso concreto, outras circunstâncias, tais como o discernimento da ofendida, sua autodeterminação sexual, e compleição física, comportamento etc. Por outro lado, corrente minoritária, defende que apenas a menoridade caracteriza a violência presumida, sendo, portanto, de caráter absoluto, de forma que qualquer ato sexual praticado com uma menor de 14 (quatorze) anos enseja a prática do crime em comento.

No entanto, no caso dos autos, deve-se reconhecer que essa última não é a melhor das soluções. A análise de alguns fatores, aliados às peculiaridades da situação sub judice, permitem concluir que a vítima possuía condições de entender o ato sexual.

Inicialmente, cumpre relembrar que o Direito não deve ser estático, todavia, em razão das forças das inúmeras transformações sociais, nem sempre consegue acompanhá-las. Assim, o Direito erige-se tantas vezes em óbice ao desenvolvimento da sociedade, sendo, portanto, nesse aspecto, inegável o valor da jurisprudência, pois esta comumente vem à frente do legislador e é para ele fonte de inspiração.

[...]

À partir do interrogatório do acusado, bem como das declarações da vítima, percebe-se que esta tinha total conhecimento do estava acontecendo, e que deixou claro que não foi forçada a nada.

Assim, entendo que a vítima, apesar de menor de 14 (quatorze) anos de idade (12 para 13 anos na época do fato), não era totalmente

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ignorante quanto à práticas sexuais, tendo bastante conhecimento referente às relações.

[...]

Logo, a presunção de violência, que objetiva proteger a suposta inocência dos menores de 14 (quatorze) anos, com a ideia de que basta haver a relação sexual para estar configurado o estupro de vulnerável, deve ser analisada de forma relativa, não mais como absoluta, tendo em vista o grau de conhecimentos obtido por nossos adolescentes, como no caso em questão, onde a vítima tinha pleno entendimento da situação, tendo ela consentido com o ato e mantido uma relação com o recorrente durante meses.

In casu, os fatos ocorreram na vigência da Lei no 12.015/2009, que tomou típica a conduta de "ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos", criando a figura do "estupro de vulnerável", prevista no artigo 217-A, do Código Penal. E que tal norma revogou o artigo 224, que tratava da presunção de violência quando a vítima era menor de 14 (quatorze) anos. Assim, ao contrário do entendimento da Juíza a quo, a perspectiva dos autos não poderia ser examinada sob o prisma da relativização da presunção de violência.

Sendo assim, embora a vítima contasse com menos de 14 (quatorze) anos quando manteve relação sexual com o apelante, tal circunstância, por si só, não tem o condão de caracterizar o crime de estupro de vulnerável (artigo 217-A, do Código Penal).

[...]

Assim, a relativização da presunção de violência, através de uma análise pormenorizada das circunstâncias nas quais se deu a conduta, que demonstre a capacidade de autodeterminação e vontade consciente da vítima para a prática do ato sexual e afaste, de consequência, a tipicidade do crime de estupro pela ausência de violência ficta, se mostra como medida conivente com a realidade social hodierna e, inclusive, com os preceitos constitucionais.

[...]

Assim, resta patente nos autos que a vítima possuía discernimento suficiente para reagir aos eventuais impulsos sexuais do apelante. O seu consentimento é relevante no caso concreto. Desse modo, a presunção de violência deve ser afastada, pois a sua aquiescência desconfigura o crime de estupro no conceito adotado pelo Código de 1940.

Dessa forma, deve ser levado em consideração diversos fatos trazidos aos autos, tais como: que as relações sexuais aconteceram de forma voluntária, consentida e fruto de aliança afetiva; que a menor não era mais virgem e já contava com certa experiência sexual; que em nenhum momento houve violência ou grave ameaça à vítima; e por fim, que as condutas sexuais do apelante não se amoldam a nenhuma previsão típica e, por isso, deve ser absolvido

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Edição nº 1590 - Brasília, Disponibilização: Quarta-feira, 17 de Setembro de 2014 Publicação: Quinta-feira, 18 de Setembro de 2014

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com base no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal

No entanto, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que, na sistemática em vigor com a edição da Lei n. 12.015/09, a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menor de 14 (quatorze) anos de idade, configura o delito previsto no art. 217-A do Código Penal, sendo irrelevante, para a sua configuração ou não, a aquiescência da adolescente ou mesmo o fato de a ofendida já ter mantido relações sexuais anteriores.

Confiram-se as ementas dos seguintes julgados:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART.

217-A DO CP. OCORRÊNCIA. ESTUPRO DE VULNERÁVEL.

VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS. CONSENTIMENTO. IRRELEVÂNCIA.

AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Pacificou-se a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, segundo o sistema normativo em vigor após a edição da Lei n.º 12.015/09, a conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos configura o crime do artigo 217-A do Código Penal independentemente de grave ameaça ou violência (real ou presumida), razão pela qual tornou-se irrelevante eventual consentimento ou autodeterminação da vítima para a configuração do delito.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1363531/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 27/06/2014, DJe 04/08/2014)

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. ART. 217-A DO CP. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PROTEÇÃO À LIBERDADE SEXUAL E À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. CONTINUIDADE DELITIVA. VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS. RELACIONAMENTO AMOROSO. CONSENTIMENTO DA VÍTIMA E PRÉVIA EXPERIÊNCIA SEXUAL. VIDA DISSOLUTA. IRRELEVÂNCIA PARA A TIPIFICAÇÃO PENAL. PRECEDENTES. CASSAÇÃO DO ACÓRDÃO A QUO. RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA.

1. O cerne da controvérsia cinge-se a saber se a conduta do recorrido - que praticou conjunção carnal com menor que contava com 12 anos de idade - subsume-se ao tipo previsto no art. 217-A do Código Penal, denominado estupro de vulnerável, mesmo diante de eventual consentimento e experiência sexual da vítima.

2. Para a configuração do delito de estupro de vulnerável, são irrelevantes a experiência sexual ou o consentimento

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Edição nº 1590 - Brasília, Disponibilização: Quarta-feira, 17 de Setembro de 2014 Publicação: Quinta-feira, 18 de Setembro de 2014

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da vítima menor de 14 anos. Precedentes.

3. Para a realização objetiva do tipo do art. 217-A do Código Penal, basta que o agente tenha conhecimento de que a vítima é menor de 14 anos de idade e decida com ela manter conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso, o que efetivamente se verificou in casu.

4. Recurso especial provido para condenar o recorrido em relação à prática do tipo penal previsto no art. 217-A, c/c o art. 71, ambos do Código Penal, e determinar a cassação do acórdão a quo, com o restabelecimento do decisum condenatório de primeiro grau, nos termos do voto.

(REsp 1371163/DF, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 01/08/2013) Estando o acórdão recorrido em dissonância com a jurisprudência desta Eg. Corte, impõe-se a sua reforma.

Ante o exposto, nos termos do art. 557, § 1º-A, do CPC, c/c o art. 3º do CPP, dou provimento ao recurso especial, para, no tocante ao delito previsto no art. 217-A do Código Penal, restabelecer a sentença condenatória.

Publique-se.

Intime-se.

Brasília (DF), 10 de setembro de 2014.

MINISTRO NEFI CORDEIRO Relator

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