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Direito de Propriedade: Será o Direito de Propriedade um Direito de 2ª Classe?

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Academic year: 2022

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Direito de Propriedade:

Será o Direito de Propriedade um Direito de 2ª Classe?

Hoje facilmente compreendemos que muitos dos “direitos”, concebidos no Século XVIII com toda a generalidade de aplicação, -- em face da gradual massificação das nossas Sociedades e da crescente complexidade das relações entre os cidadãos que as constituem - tenham agora que sofrer certas limitações cuja necessidade se foi verificando, gradualmente e caso a caso.

É, por exemplo, ponto assente e repetidamente confirmado pela letra de muitas constituições inclusive na Carta dos Direitos Fundamentais Europeus, que o Direito de Propriedade deverá sofrer condicionamentos que, ou submetem a posse desses bens aos interesses colectivos superiores, ou constituem limitações à sua livre utilização.

Tal se deve à necessidade de “preservação dos interesses colectivos”, feita pelos governos em nome dos Estados, segundo dois princípios fundamentais que a estes assistem:

o “poder de expropriação” por utilidade pública, interesses sociais ou interesses gerais;

o “poder de autoridade” destinado a permitir, por um lado, defender colectivamente todos os membros da Comunidade a que correspondem contra males que lhe venham do exterior e, por outro lado, impedir que cada membro dela, no livre exercício dos seus direitos individuais, possa causar danos ou prejuízos a outro ou a outros membros da mesma Comunidade.

Todavia em toda a parte se verifica que estes condicionamentos devem ser convenientemente ponderados, porque, quanto ao primeiro daqueles princípios -- o

“poder de expropriação” -- a definição dessa “utilidade pública”, ou desses

“interesses sociais” ou “gerais”, cabe na competência exclusiva de órgãos executivos, naturalmente com critérios a tal respeito diferentes de local para local e, no mesmo local, de época para época, em face da alteração das personalidades que os constituem e dos respectivos critérios políticos.

Quanto ao segundo -- o “poder de autoridade” --, não parece em princípio lógico admitir que os governos interfiram, por exemplo, no livre exercício do Direito de Propriedade de um cidadão quando tal exercício não prejudique o similar exercício de direitos de qualquer outro.

Isto porque, se assim fosse, por um lado corresponderia a investir esses governos com “direitos” que lhes não tinham sido conferidos pela Comunidade e, pelo outro -- como dizia uma decisão de um tribunal americano -- porque “se o Direito de Propriedade pode ser regulamentado em certa medida, quando tal regulamentação vai demasiadamente longe, tal pode classificar-se como uma apropriação”.

Cabe agora considerar, (não deixando de ter em conta essa dificuldade da sua justa e homogénea definição), as consequências de tais limitações na evolução das Comunidades em que o Direito de Propriedade com elas é praticado.

Segundo o inquérito feito anualmente pela Heritage Foundation a 150 países de todo o mundo relativamente, por um lado, a todos os aspectos, legais jurídicos e processuais, que em cada país podem dar lugar a limitações do Direito de Propriedade e, por outro, ao valor do rendimento médio anual e real dos respectivos cidadãos (PIB per capita em condições de paridade do poder de compra – p.p.p.), a

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expressão gráfica dessa estatística, correspondente ao ano de 2003, é a seguinte, para cada um dos 4 grupos de países, reunidos segundo o grau de protecção do Direito de Propriedade, a saber: fraca, moderada, razoável, e forte.

Parece assim apurar-se estatisticamente que as limitações introduzidas pelos condicionamentos legislativos ao Direito de Propriedade reduzem também, na medida em que o fazem e muito sensivelmente, a prosperidade e o bem-estar das populações envolvidas.

Por outro lado no âmbito das relações internacionais, temos podido observar como a União Europeia, assumindo um papel de mentor de elementares regras de conduta, tem prestigiosamente imposto, para efeitos das suas normas de convívio, o padrão do respeito pelos “Direitos do Homem”, na sua globalidade, como base da sua aceitação (ou não aceitação) relativamente aos procedimentos dos governos de nações que lhe são estranhas. Isto em perfeita coerência com a codificação desses mesmos direitos, que não deixou de fazer para o seu âmbito através da instituição da Carta do Direitos Fundamentais Europeus, onde, como é sabido, o Direito de Propriedade é objecto do Artº 17.

E, mais uma vez coerentemente, é com base nesta Carta que a Comissão Europeia analisa, cuidadosa e criteriosamente, as candidaturas de adesão dos seus novos membros; basta citar as razões que têm sido invocadas por muitos detractores da admissão da Turquia e as difíceis alterações estruturais a que este país tem tido que sujeitar-se para sustentar as suas pretensões a essa inclusão para testemunhar a importância que a União confere ao respeito por esses direitos.

Mesmo fora desse âmbito, e para não citar senão os casos dos dois países mais importantes, todos se recordam das sanções impostas à China a quando dos incidentes na praça de Tianamen e da pressão diplomática que, no mesmo sentido, é exercida constantemente pela União junto da Rússia do Sr. Putin.

Ora é em face de todo este enquadramento conceptual e jurídico, que apesar de tudo, vamos encontrar, mesmo no conjunto dos 15 países membros que constituíam a União até há pouco, claros desrespeitos pelo já referido Artº 17 da mesma Carta.

Será que estamos mais uma vez em presença de um exemplo dos velhos hábitos de Frei Tomás: “- Faz o que ele diz, mas não faças o que ele faz” ?. Não parece ser o caso, visto que, ao invocar genericamente os “Direitos do Homem”, não vemos depois a União abordar, analisar, e criticar as práticas desses países especificamente no tocante ao Direito de Propriedade mas, (se não somente, pelo menos mais explicitamente) quanto aos chamados “direitos políticos” e “direitos sociais”. E, nesse caso, está assim implicitamente a estabelecer uma distinção entre aquele – o Direito de Propriedade - e estes últimos – os direitos políticos” e os

“direitos sociais” - os quais, por via dela, assumem também implicitamente, uma certa prioridade.

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Independentemente da consideração da natureza, justificação e da medida em que se verificam essas limitações neste Direito Propriedade, tomado individual e isoladamente, parece oportuno também observar em que medida se admitem (ou não) similares critérios relativamente a outros Direitos paralelos, em princípio de importância equivalente ao dele.

Tomemos por exemplo o caso da “liberdade de expressão” como Direito também fundamental.

Ao admitirmos - hipoteticamente e igualitariamente -- a aplicação a este dos dois tipos de limitações praticados relativamente ao Direito de Propriedade:, -- regulamentação por “razões de interesse geral” e a sua expropriação por utilidade pública” -- tal aqui corresponderia, pura e simplesmente, ao estabelecimento de uma censura no primeiro caso, que poderia chegar, no segundo caso, a uma completa eliminação do uso desse Direito de Expressão, em troca de uma justa indemnização.., coisa que , tal como é geralmente sentido, seria hoje em dia reconhecido como completamente inaceitável e até imoral…

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Alguns casos da Jurisprudência americana -- que constitui nos EU uma outra forma de legislatura na tradição da Common Law -– proporcionam-nos uma nova possibilidade de analisar o critério que, modernamente e até há pouco (1932-1987), vinha a ser assumido também do outro lado do Atlântico, no tratamento - em paralelo ou em conjunto - dos dois Direitos em causa.

Foi paradigmático o caso (Pennsylvania vs. Tate), apresentado em 1981 ao Supremo Tribunal da Pensilvânia, que opunha um grupo de manifestantes à entidade proprietária do espaço onde aquele se tinha querido manifestar, sem sua autorização ou contra normas por ela estabelecidas.

Nele entravam assim em nítida colisão com o Direito de Propriedade e o Direito de Livre Expressão. A resolução do Tribunal, redigida pelo Juiz Conselheiro Roberts, estabelecia que o Direito de Propriedade se devia considerar como subordinado ao Direito de Livre Expressão…

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Paralelamente ao que acima fizemos na análise das consequências, para o progresso das nações, das limitações e condicionamentos impostos ao Direito de Propriedade, vejamos agora quais as possíveis consequências estremas, na vida dos povos, por via da não limitação do Direito de Livre Expressão.

Não necessitamos, neste caso, de imaginar cenários mais ou menos discutíveis nem de procurar estatísticas mais ou menos sofisticadas: basta-nos observar o que recentemente tem sucedido em diversos países, como consequência da livre publicação neles das chamadas “caricaturas de Maomé”.

Foram óbvias as consequências imediatas dessa liberdade de expressão, em termos de convivência de grupos de credos diferentes, de paz social, de ordem pública e de livre prática de religiões, aspectos esses que se supõe unanimemente considerados como “bens públicos”ou de “interesse geral”.

E ainda não podemos prever as consequências a menos curto prazo dessas publicações, perante a possibilidade de exploração das situações gradualmente por elas criadas, no desenvolvimento das reacções emocionais correspondentes, exploração essa sempre possível de realizar por várias das facções, em termos de poder ocasionar situações ainda mais graves com enquadramentos generalizados.

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Chegamos assim à conclusão de que, enquanto relativamente a este último Direito –- o Direito de Livre Expressão -- os nossos princípios políticos nos impedem de o condicionar (não direi já de o expropriar…), mesmo quando essa não-limitação acarreta para a Comunidade o prejuízo de interesses fundamentais , quanto ao Direito de Propriedade, ambas as possibilidades de limitação existem e, pelo que nos tem sido possível verificar até agora, cada vez em maior grau, (evolução que segundo o Prof. Steven Eagle até se designa por “progressismo”) mesmo quando a não-limitação correspondente trás sensíveis benefícios para a mesma Comunidade, como o provam as estatísticas da Heritage Foundation.

Será que, nas Cartas ou Declarações de Direitos Fundamentais dos diversos países, se passou realmente a considerar (mas sem que tal conste explicitamente), o Direito de Propriedade como um “direito de 2ª classe?

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A explicação de tal aparente incoerência é todavia possível -- aliás assim com toda a coerência -– numa perspectiva completamente diferente.

É que com a limitação do Direito de Propriedade -- sempre “progressista” perante as massas -- a classe política consegue uma captação de simpatias sempre superior à da hipótese contrária: a de acautelar o respeito por esse Direito.

Isto enquanto que a não-limitação do Direito de Expressão é o que lhe permite a máxima produtividade da sua acção política através da divulgação da sua argumentação, dos seus programas, das suas atitudes, por forma a disso resultar o maior número possível de votantes em seu favor.

E afinal é a classe política que dita os critérios fundamentais com que são elaboradas e interpretadas as leis…

Ate quando e em que medida poder-se-ão manter divergências entre os mais permanentes interesses dos povos e os das classes políticas que os governam?

Só o nível de cultura e de informação dos povos o determinará, em conjugação com o já hoje generalizado processo democrático - coisa que, a partir de 1981 e sobretudo depois da queda do “muro de Berlim”, já começou a suceder, segundo um estudo feito para o CATO Institute pelo Prof. Steve Eagle, catedrático de Direito da Universidade George Mason, estudo esse que tem o título: “O nascimento do movimento a favor do Direito de Propriedade”.

Por fim, resta salientar que é já esta a era em que actualmente vivemos e que é nesta conformidade que temos de actuar.

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