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EDUCAÇÃO PARENTAL: ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO PROTETIVA E AS INTERFACES COM A EDUCAÇÃO AMBIENTAL

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE – FURG

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL

NARJARA MENDES GARCIA

EDUCAÇÃO PARENTAL: ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO PROTETIVA E AS INTERFACES COM A EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Rio Grande

2012

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NARJARA MENDES GARCIA

EDUCAÇÃO PARENTAL: ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO PROTETIVA E AS INTERFACES COM A EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Tese de doutorado apresentada à banca examinadora, como exigência para obtenção do título de Doutora em Educação Ambiental no Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental na Universidade Federal do Rio Grande - FURG.

Orientadora: Profª. Drª. Maria Angela Mattar Yunes Coorientadora: Profª. Drª. Ana Maria Tomas Almeida

Rio Grande

2012

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Ao meu amor Carlos pelo apoio e carinho,

E ao meu pai e a minha mãe pelo carinho e educação por toda a vida.

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AGRADECIMENTOS

Obrigada meu Deus...

... por mais uma meta alcançada e pelas experiências proporcionadas nesta trajetória.

... pela oportunidade de conhecer e conviver com pessoas maravilhosas, que me ensinaram a enxergar melhor a realidade e me deram força para enfrentar e superar os obstáculos que surgiram no caminho que me conduziu até este momento. Agradeço as famílias, os parceiros, os profissionais e os acadêmicos, que participaram dos programas de educação parental e possibilitaram a realização deste estudo. Agradeço imensamente por fazer parte de uma família que me protegeu nas situações adversas e me ensinou a ser uma pessoa melhor. E a minha segunda família representada pelos meus colegas de trabalho na FURG e os companheiros da equipe do Núcleo de Estudos e Atenção às Famílias (NEAF), em especial as minhas amigas Sheila, Priscila, Adriana, Sandra, Juana, Deise e Larissa, que me apoiaram desde o princípio e foram fundamentais para a concretização deste sonho.

... por colocar duas pessoas especiais na minha vida que me orientaram e me ensinaram a trilhar o caminho do conhecimento: Maria Angela Mattar Yunes e Ana Maria Tomás de Almeida. Agradeço a colaboração das professoras integrantes da minha banca de defesa, que com sabedoria contribuíram para a construção e realização deste estudo.

... por apontar as oportunidades e pelas escolhas bem sucedidas que fiz nesta trajetória,

como a definição da minha profissão docente; a decisão por cursar o doutorado; a passagem

pelo Programa Pó-graduação em Educação Ambiental; a chance de conhecer outras culturas e

outras possibilidades de educação parental no Doutorado Sandwich em Portugal; as

experiências como professora na universidade e o aprendizado a cada dia na relação de

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profissionalismo e amizade construída com os meus alunos. Agradeço a Universidade Federal do Rio Grande e as agências de fomento CAPES e CNPq por oportunizar estas experiências.

... por colocar na minha vida um anjo que tem me cuidado, protegido e, com muita paciência, tem me ensinado que o bem mais importante da vida é o amor. Agradeço o apoio do meu melhor amigo e companheiro Carlos, que me incentivou a trilhar este caminho e ajudou na caminhada até o final deste percurso.

.... e, por fim, eu agradeço ao Senhor por ter me proporcionado, ao longo dos quatro

anos de doutorado, a incessante vontade de aprender, de acreditar na humanidade, de construir

novos conhecimentos e de partilhar este aprendizado.

(6)

A vida é a arte do encontro, Embora haja tanto desencontro pela vida.

Vinícius de Moraes

(7)

RESUMO

Tendo em vista as problemáticas socioambientais que assolam a sociedade contemporânea torna-se cada vez mais relevante a formulação e realização de ações educativas com famílias, para que os vínculos de afeto e cuidado sejam fortalecidos entre as pessoas e destas com o ambiente. A educação nas famílias com foco no cuidado, na proteção e nos valores de preservação da vida pode contribuir para a formação de cidadãos mais conscientes e comprometidos com o ambiente. Tal proposição está diretamente relacionada com a perspectiva da Educação Ambiental, ao promover o cuidado nas relações com os outros seres vivos, humanos e não-humanos. As estratégias de intervenção em educação parental pressupõem o apoio e orientação de famílias para a qualidade das práticas e interações de educação e cuidado presentes no ambiente familiar. Estas ações ainda são escassas e realizadas de forma assistemática no Brasil. Diante desta realidade, foi elaborado o projeto de tese no Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental, na linha da Educação Ambiental não formal, tendo como temática o estudo das estratégias e abordagens metodológicas de educação parental e suas interfaces com a educação ambiental. O estudo teve como objetivos realizar o programa “Crescer Felizes em Família” no Brasil e acompanhar o programa “Mais Família” em Portugal, para investigar, compreender e refletir sobre as estratégias que constituem os processos envolvidos na aplicação de programas de Educação Parental. A metodologia escolhida para este estudo foi a “Inserção Ecológica” que propõe a imersão dos pesquisadores nos ambientes a serem estudados, tendo como procedimentos de coleta de dados: observação naturalista e participante, questionários estruturados, entrevistas. Para análise dos dados foram utilizados o SPSS (Statistical Package for Social Sciences) e Grounded-theory. Os resultados da avaliação das estratégias apontam que é preciso considerar os seguintes componentes na aplicação dos programas: a dinâmica de funcionamento da proposta, os facilitadores para a realização do programa e a satisfação e o impacto do mesmo na perspectiva da equipe de educadores e das famílias participantes. A análise comparativa dos programas apontou similitudes e diferenças nas condições socioculturais e organizacionais na aplicação da proposta educativa. Os programas estudados apresentaram os objetivos próximos com abordagens teórico-metodológicas diferenciadas.

Foram identificadas condições necessárias para adaptação dos programas de educação parental internacionais em contexto brasileiro, com destaque para os seguintes pontos: a elaboração dos mecanismos de divulgação da proposta para a melhor compreensão e adesão das famílias ao programa; a integração das ações em educação parental às políticas públicas municipais; a garantia do suporte dos profissionais que integram os serviços sociais e o auxílio na logística de implementação do programa. A promoção da participação comunitária das famílias, a abordagem sistêmica da proposta educativa e o uso de metodologias que tenham como base o diálogo e o respeito às diferenças foram ressaltadas como características dos programas de educação parental e mostram-se consistentes com os princípios da Educação Ambiental. Portanto, a proposição de programas de educação parental requer que sejam consideradas as condições socioculturais típicas de cada contexto atreladas à inserção dos projetos em políticas públicas municipais que devem defender o direito que todos os pais, mães e cuidadores têm a este apoio social e educativo.

Palavras-chave: Educação Ambiental; família; educação parental.

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ABSTRACT

Taking into account the socioenvironmental problems which are endangering in contemporaneous societies it has become increasingly more relevant to develop and implement educational activities with families in ways to promote affection and caring ties among individuals and between themselves and their environment. Family education focusing care, protection and life preservation values may contribute to the upbringing of environmentally conscious and engaged citizens. Such an assumption is directly linked to the Environmental Education approach and to the enhancement of care into relationships with other human and non-human beings. Intervention methodologies in parenting education entail support and guidance to families aiming the improvement of educational practices, activities and parent-child interactions and parental responsiveness in the family context. These initiatives are still scarce and carried out in rather non systematically ways in Brazil.

Accounting for this reality, we conceptualized the project of this dissertation in the Postgraduate program of Environmental Education, in the strand of Informal Environmental Education, embracing the study of methodologies for parenting education and its interfaces with environmental education. The study had the goal of implementing the program

“Growing Happily in Family” in Brazil and monitoring the program “Mais Família” (More Family) in Portugal with the aim of investigating, understanding and reflecting about the methodologies which are involved in these parenting education programs. The chosen method for the study was the “Ecologial Engagement” (Inserção Ecológica) which leads the researchers to “go deep” into the context under investigation, while undertaking the data collection using naturalist and participant observations, structured questionnaires and interviews. For the analyses, both quantitative and qualitative methods were used and performed through SPSS (Statistical Package for Social Sciences) and the Grounded-theory.

The results evidenced the need to consider the following components in the program implementation: the dynamics of program functioning, the characteristics of facilitators who implement the sessions and the team and participants’ satisfaction with the program and its impact for the families and professionals. Between programs, a comparative analysis points out somesimilarities and differences on the sociocultural and organizational settings, which are embedded in the educational programs. The investigated programs presented goals which are closely related to different theoretical and methodological approaches. A set of approaches were identified regarding how to adapt international programs of parenting education to the Brazilian cultural context, among which we highlight the following elements: the formulation of mechanisms for program dissemination that increase the family understanding about the specificities of these programs and improve the family recruitment levels; the coordination of parenting education programs with social policies at a local level, the guarantee of support from professionals in social services and the logistic resources that enhance the family participation while the program is implemented. The promotion of family participation at a community level, the ecological systemic framework that underpins content and the use of methodologies that foster dialogue and respect for differences were evaluated as important characteristics of parent education programs, and showed to be consistent with the basic principles of Environmental Education. Therefore, the proposals of family social programs need to consider the sociocultural conditions that are singular of each context linked to the insertion of the projects in the local public policies which should defend the rights that all fathers, mothers and caretakers have to get this social and educational support.

Keywords: Environmental Education; family; parenting education.

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – Motivos da indicação e encaminhamento das famílias para o programa de educação

parental no Brasil... 72 FIGURA 2 – Número de participantes de acordo com o papel familiar no programa realizado no

Brasil... 72 FIGURA 3 – Configuração das famílias participantes no programa realizado no Brasil... 73 FIGURA 4 – Número de participantes responsáveis pela família monoparental no programa

realizado no Brasil... 74 FIGURA 5 – Número de filhos nas famílias participantes do programa realizado no Brasil... 74 FIGURA 6 – Registro fotográfico do curso realizado com a equipe de educadores do programa

realizado no Brasil... 76 FIGURA 7 - Número de famílias participantes por local no programa realizado no Brasil... 80 FIGURA 8 - Número de famílias que aderiram ao programa realizado no Brasil, de acordo com a

indicação e o encaminhamento dos serviços de apoio... 90 FIGURA 9 - Número de crianças participantes por local dos encontros no programa realizado no

Brasil... 94 FIGURA 10 - Avaliação dos facilitadores para a realização do programa na ótica das famílias

participantes do programa realizado no Brasil... 101 FIGURA 11 - Avaliação dos conteúdos do programa realizado no Brasil na ótica das famílias

participantes... 102 FIGURA 12 - Avaliação do grupo de apoio no programa realizado no Brasil na ótica das famílias

participantes... 102 FIGURA 13 - Avaliação do impacto do programa realizado no Brasil na função parental na ótica das

famílias participantes... 104 FIGURA 14 - Avaliação do impacto do programa realizado no Brasil na relação familiar e no

comportamento dos filhos na ótica das famílias participantes... 104 FIGURA 15 - Avaliação da postura e atuação da equipe de educadores na ótica das famílias

participantes do programa realizado no Brasil... 106 FIGURA 16 - Avaliação da satisfação sobre a participação no programa realizado no Brasil na ótica

das famílias participantes... 107 FIGURA 17 - Avaliação da satisfação sobre a participação no programa realizado no Brasil na ótica

das crianças participantes... 108 FIGURA 18 - Avaliação do apoio no programa realizado no Brasil na ótica das crianças... 109 FIGURA 19 - Avaliação da eficácia do programa realizado no Brasil na ótica das crianças

participantes... 109 FIGURA 20 - Número de famílias participantes de acordo com os locais dos encontros no programa

realizado em Portugal... 114 FIGURA 21 - Número de participantes de acordo com o papel parental na família no programa

realizado em Portugal... 114 FIGURA 22 - Motivos da indicação e encaminhamento das famílias para o programa de educação

parental em Portugal... 117

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 - Alguns exemplos de programas parentais na Espanha... 47 QUADRO 2 - Características do especialista e do mediador na formação parental... 51 QUADRO 3 - Conjunto de saberes e habilidades necessários aos profissionais de

apoio... ... 52 QUADRO 4 - Os módulos e sessões do modelo reduzido do Programa Crescer Felizes em

Família... 68 QUADRO 5 - Atividade 2 (Sessão 2 do Módulo 3) do programa abreviado “Crescer felizes em

família”... 84 QUADRO 6 - Atividade 1 (Sessão 1 do módulo 2) do programa “Crescer felizes em família”... 85 QUADRO 7 - Atividade realizada com as crianças do grupo 1 no programa realizado no Brasil... 95 QUADRO 8 - Análise estatística descritiva da satisfação do programa realizado no Brasil na

ótica das famílias participantes: Facilitadores para a realização do programa... 100 QUADRO 9 - Análise estatística descritiva da satisfação do programa realizado no Brasil na

ótica das famílias participantes: Conteúdos e grupo de apoio no programa... 101 QUADRO 10 - Análise estatística descritiva da satisfação do programa realizado no Brasil na

ótica das famílias participantes: Impacto do programa na função parental... 103 QUADRO 11 - Análise estatística descritiva da satisfação do programa realizado no Brasil na

ótica das famílias participantes: Relação com a equipe de educadores... 105 QUADRO 12 - Análise estatística descritiva da satisfação do programa realizado no Brasil na

ótica das famílias participantes: Importância da realização do programa... 106 QUADRO 13 - Avaliação do programa realizado no Brasil na perspectiva das crianças

participantes... 108 QUADRO 14 - Sessões do programa Mais Família, Mais Criança... 111 QUADRO 15 - Atividade da sessão 6 do programa “Mais família, mais criança” desenvolvido em

Portugal... 121 QUADRO 16 - Atividade da sessão 5 do programa “Mais família, mais criança” desenvolvido em

Portugal... 122 QUADRO 17 - Análise comparativa das condições de aplicabilidade de programas de educação

parental no Brasil e em Portugal: Dinâmica de funcionamento dos programas... 138 QUADRO 18 - Análise comparativa das condições de aplicabilidade de programas de educação

parental no Brasil e em Portugal: Os facilitadores para a realização dos

programas... 140 QUADRO 19 - Análise comparativa das condições de aplicabilidade de programas de educação

parental no Brasil e em Portugal: As famílias participantes... 144 QUADRO 20 - Análise comparativa das condições de aplicabilidade de programas de educação

parental no Brasil e em Portugal: Equipe de educadores e o apoio no grupo... 146 QUADRO 21 - Análise comparativa das condições de aplicabilidade de programas de educação

parental no Brasil e em Portugal: Satisfação e eficácia na percepção dos

participantes... 147

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO... 13

2. FAMÍLIA E PARENTALIDADE... 19

2.1. Família: Ambiente simbólico... 19

2.2. Olhar sistêmico sobre as interações familiares... 20

2.3. O processo de humanização das relações familiares... 22

2.4. Discursos tradicionais, modernos e “pós-modernos” sobre a educação nas famílias.. 24

2.5. Parentalidade e as expectativas sociais sobre a educação nas famílias... 28

2.6. As dimensões da parentalidade... 30

3. APOIO FAMILIAR E EDUCAÇÃO PARENTAL... 34

3.1. Como as famílias aprendem a função e os papéis parentais?... 34

3.2. Histórico do atendimento às famílias em situação de risco no Brasil: Regulação versus fortalecimento familiar... 35

3.3. Educação Parental: Definições e níveis de atuação... 42

3.4. Programas de educação parental: As experiências no Brasil e em outros países... 45

3.5. A formação dos educadores para a orientação familiar... 49

3.6. Avaliação de programas de educação parental... 53

4. EDUCAÇÃO PARENTAL COMO OBJETO DE ESTUDO NO CAMPO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL... 55

4.1. Contribuições da Educação Ambiental para a educação parental... 55

4.2. A participação como princípio para a educação parental... 58

5. MÉTODO... 60

5.1. Procedimentos e estratégias metodológicas... 60

5.1.1. Observação Naturalista e Participante... 60

5.1.2. Diário de Campo... 61

5.1.3. Questionários Estruturados para o programa realizado no Brasil... 62

5.1.4. Entrevistas para o programa realizado em Portugal... 63

5.2. Análise dos Dados... 63

5.2.1. Grounded-Theory ou Teoria Fundamentada nos Dados... 63

5.2.2. Análise quantitativa dos dados no SPSS... 64

5.2.3. Critérios para a análise dos dados... 64

6. OS PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO PARENTAL NO BRASIL E EM PORTUGAL... 66

6.1. Etapa 1 – Realização do programa “Crescer felizes” no município do Rio Grande, Brasil... 66

6.1.1. O município de Rio Grande e os serviços de apoio familiar... 69

6.1.2. Participantes... 70

(12)

6.1.3. Equipe de educadores... 75

6.1.4. Dinâmica de funcionamento do programa... 78

6.1.5. Facilitadores para a realização do programa... 89

6.1.6. Satisfação e Eficácia do programa... 96

6.2. Etapa 2 – Acompanhamento do Programa “Mais família, mais criança” em Guimarães, Portugal... 110

6.2.1. O município de Guimarães e os serviços de apoio familiar... 112

6.2.2. Participantes... 113

6.2.3. Equipe de educadores... 117

6.2.4. Dinâmica de funcionamento do programa... 119

6.2.5. Facilitadores para a realização do programa... 126

6.2.6. Satisfação e Eficácia do programa... 130

7. AVALIAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE APLICABILIDADE DE PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO PARENTAL EM DIFERENTES CONTEXTOS... 138

8. SUGESTÕES PARA A ELABORAÇÃO, REALIZAÇÃO E AVALIAÇÃO DE PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO PARENTAL... 150

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS... 156

REFERÊNCIAS... 161

ANEXOS... 175

(13)

1. INTRODUÇÃO

Diante dos desafios contemporâneos e das problemáticas socioambientais que assolam a sociedade torna-se cada vez mais relevante a formulação e realização de ações educativas direcionadas para o fortalecimento das famílias no cuidado e educação de crianças e adolescentes. A educação nas famílias com foco no cuidado, na proteção e nos valores de preservação da vida pode contribuir para a formação de cidadãos mais conscientes e comprometidos com o ambiente. Diante destas considerações e questões levantadas, justifica- se a construção de alternativas e propostas de educação familiar na perspectiva da Educação Ambiental não formal, e que tenham como foco atender, ouvir e orientar grupos familiares através de processos interativos e dialógicos.

O comprometimento com a temática e a construção de uma proposta de educação familiar surgiu na minha trajetória acadêmica a partir de experiências no contato direto com famílias em situação de pobreza dos diferentes bairros do município de Rio Grande/ RS. Eram visíveis as marcas das condições de vida precária pela falta de políticas públicas eficientes que atendessem as reais necessidades dessas populações. Ao ouvir e buscar compreender modos de vida familiar, investigar processos de enfrentamento das adversidades, os sistemas de crenças e as dinâmicas de organização de famílias em situação de pobreza (YUNES, MENDES & ALBUQUERQUE, 2005; GARCIA & YUNES, 2006; YUNES, GARCIA &

ALBUQUERQUE, 2007), podia-se perceber elementos que enfocavam a busca da saúde integral da família. Esta ótica se diferenciava de outros estudos que apontavam apenas para os fatores de risco ligados às vidas de grupos sociais em situação de pobreza. Focar a saúde e os processos de resiliência nesses grupos é consoante com o atual movimento da Psicologia Positiva (SHELDON & KING, 2001) que busca desfocar sintomas e psicopatologias, para estudar virtudes e potencialidades dos seres humanos.

Na minha dissertação de mestrado “Educação nas famílias de pescadores artesanais:

transmissão geracional e processos de resiliência” (GARCIA, 2007) foi possível identificar os

significados da educação no ambiente familiar e compreender as múltiplas variáveis presentes

nas interações entre pais e filhos, como: o ensino para o convívio social; o cuidado expresso

para proteção e prevenção de enfermidades, acidentes ou perigos eminentes; o ensino

(14)

informal e a preparação para o trabalho e a constituição de papéis femininos e masculinos nas tarefas domésticas e na própria atividade pesqueira. A análise realizada demonstrou que tais variáveis se constituem em processos proximais (BRONFENBRENNER, 1979/ 1996) nas situações em que os membros familiares estão engajados em atividades, interações e relações interpessoais constantes e progressivamente mais complexas e que envolvem reciprocidade e afetividade em período estável de tempo (GARCIA, 2007). Nestas situações a educação nas famílias investigadas influencia e contribui para o desenvolvimento de crianças e adultos pertencentes a estes grupos familiares.

A partir destes resultados apontei algumas considerações e sugestões para a Educação Ambiental com famílias, ou seja, a formulação e a realização de programas de atenção e de educação psicoeducacional de famílias que tenham como paradigma os princípios da Educação Ambiental. Dentre as considerações/sugestões:

“Realizar encontros sistemáticos com pais ou responsáveis pelo cuidado infantil no ambiente familiar (como avós, irmãos mais velhos, tios, etc.) para que estes possam ter um espaço de reflexão sobre as suas práticas educativas com crianças e adolescentes. Nestes encontros, as famílias teriam um tempo/espaço dedicado a contar suas experiências no cuidado/educação e pensar sobre novas possibilidades de educação para o desenvolvimento infantil. Para que estes encontros possam contribuir para repensar e não apenas reproduzir os exemplos de práticas educativas, sugere-se a participação de um profissional especializado na área da educação familiar como mediador das interações” (GARCIA, 2007, p.74).

Diante destas considerações e questões levantadas na minha dissertação de mestrado, juntamente com o convite de integrantes da área da Saúde do Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente (CAIC)

1

e o Programa Saúde da Família (PSF), em novembro de 2006, surgiu a proposta de Educação Familiar

2

“Encontros Dialógicos com Famílias”. O atendimento diário às famílias que vivem em um bairro de baixa renda próximo à universidade possibilitou que os profissionais envolvidos percebessem a necessidade de um espaço para conversas e esclarecimentos de dúvidas sobre cuidados e a educação de crianças e adolescentes. Esta proposta de Educação Familiar integrou uma das diversas ações realizadas pelo Programa de Atenção à Juventude e seus Familiares

3

, realizado em parceria dos centros de ensino, pesquisa e extensão vinculados à FURG: CAIC (Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente), CEP-Rua (Centro de estudos Psicológicos sobre Meninos e Meninas de Rua) e NEAF (Núcleo de Estudos e Atenção às Famílias). Através desta colaboração de núcleos, o referido Programa buscou desenvolver projetos educativos,

1

Neste centro funciona escola, posto de saúde, ações culturais e projetos de geração alternativa de renda.

Localiza-se no campus universitário e próximo a bairros periféricos no município de Rio Grande.

2

Expressão utilizada para referir os programas de atendimento e apoio educacional aos grupos familiares.

3

Este programa é financiado pelo Programa de Extensão Universitária – PROEXT/ MEC/ Sesu.

(15)

culturais e profissionalizantes que promovessem atenção integral e orientação psicológica, social e educacional às crianças, adolescentes e seus familiares.

Os encontros reflexivos e dialógicos com pais ou responsáveis pelo cuidado infantil no ambiente familiar (avós, irmãos mais velhos, tios, etc.) foram realizados no período de treze meses em um dos bairros de baixa renda do entorno da universidade. Os pesquisadores começaram a inserção participando de atividades na comunidade: reuniões na igreja, na associação de cada bairro, encontros de planejamento familiar (atividade coordenada pelos profissionais do Programa Saúde da Família) e visitas a domicílios que foram realizadas para se conhecer e compreender a realidade vivida pela população do bairro, além de explicar a proposta educativa através de convites feitos casa a casa.

Logo após estas visitas, foram iniciados encontros quinzenais sistemáticos com os interessados, sob a coordenação de duas profissionais e uma acadêmica que realizava as anotações no diário de campo. Nos encontros, os representantes dos grupos familiares ficavam em um círculo, o que contribuía para a visualização e diálogo entre os participantes.

Nestes círculos eram propostas conversas sobre temas definidos no encontro anterior. Estas conversas eram estimuladas inicialmente por uma história ou fato (verídico ou fictício) contado pelos coordenadores/ mediadores dos encontros dialógicos. A partir disso, eram propostas questões para discussão, que incentivavam os relatos de experiências e a reflexão crítica do tema pelos participantes. Foram conduzidas conversas sobre diferentes temas escolhidos pelos participantes, mas manteve-se o foco nos relatos e discussões acerca das práticas educativas em família e as situações cotidianas que influenciavam no cuidado/

educação.

Ao longo dos encontros, outras estratégias de atenção às famílias foram emergindo

pelas circunstâncias apresentadas. Uma delas foi a realização de encontros com grupos

menores nas residências de uma das famílias que estava enfrentando situações consideradas

de alto risco e difíceis de serem relatadas diante de um grupo maior de pessoas. Por exemplo,

em um desses casos a mulher/ mãe não conseguia sair de casa em função de uma forte

depressão ocasionada pelas dificuldades de lidar com o filho adolescente, que estava

utilizando drogas e cometendo pequenos furtos. Diante dessa problemática, foi

espontaneamente formado um grupo de atenção e diálogo com a nossa participação,

juntamente com a agente comunitária e mais três vizinhas próximas. Encontros foram

realizados na casa desta mulher/mãe em situação expressa de grande dificuldade. As vizinhas

desempenharam papel fundamental na recuperação dessa mulher, inclusive ajudando-a nos

afazeres do dia-a-dia, levando-a ao médico, cuidando de tarefas básicas. Observou-se que a

(16)

formação do grupo, as reflexões que surgiram e a situação explícita de apoio contribuiu para o fortalecimento desta mulher/mãe para o enfrentamento das adversidades na educação do filho.

Tal metodologia de atenção possibilitou a melhora dos vínculos desta família com os vizinhos e com a nossa equipe. Aos poucos, este pequeno grupo pode voltar a se reinserir no grupo maior dos encontros dialógicos com outras famílias da comunidade.

A partir desta experiência, surgiram outras indicações de famílias que primeiramente pediam para serem atendidas na sua residência ou em um ambiente mais restrito onde poderiam contar sua história de vida até conseguir construir vínculos e segurança para exporem suas experiências em um grupo maior. A busca por sigilo e atendimento individual chamou a atenção da equipe, que formulou outra estratégia de educação familiar no ano de 2008: os “Plantões de Atendimento Psicoeducacional”.

Os plantões de atendimento psicoeducacional foram construídos em parceria com os Conselhos Tutelares e visavam diagnosticar e compreender as particularidades, necessidades e prioridades do fenômeno da parentalidade nos contextos de risco, bem como possibilitar as interações entre os acadêmicos e os grupos atendidos. Com a proposta de envolver segmentos da rede de apoio social, os encaminhamentos das famílias em situação de risco foram realizados pelos três Conselhos Tutelares e dez Escolas Públicas da cidade de Rio Grande, RS. Cada Conselho Tutelar ficou responsável por indicar oito famílias e cada escola cinco famílias. Os encontros com os grupos familiares foram realizados em quatro locais de diferentes áreas de abrangência do município, sendo destes três escolas públicas e um espaço público de responsabilidade do governo municipal. Foram realizados atendimentos individuais em espaços reservados, sendo possível ouvir as histórias de vida das famílias e realizar um diagnóstico sobre as configurações familiares, os conflitos e as necessidades dos grupos atendidos. A maioria das famílias que aderiram ao projeto relatou conflitos na relação entre pais e filhos e dificuldades no cuidado e educação de crianças e adolescentes, principalmente em relação aos limites na infância e drogadição na fase da adolescência.

Através desta experiência ficou evidente a necessidade de parcerias que efetivamente atuassem como rede de apoio social que assegurasse a educação parental e o fortalecimento dos grupos para a resolução dos conflitos familiares.

Diante das experiências e estratégias de educação familiar vivenciadas por nosso

grupo de pesquisa e extensão, surgiu o interesse em realizar um programa de educação

parental. As estratégias educativas realizadas ao longo do meu percurso acadêmico foram

informais e emergiam de acordo com as necessidades dos grupos atendidos. Parecia

importante enfocar a educação de processos de resiliência parental e, por isto, decidiu-se

(17)

utilizar como estratégia um programa reconhecido em outro contexto cultural distinto e que apresenta como pressuposto o fortalecimento e preservação dos vínculos familiares. O programa Crescer Felizes em Família: Apoio Educativo para o Desenvolvimento Infantil (RODRIGO, MÁIQUEZ, BYRNE, RODRÍGUEZ, RODRÍGUEZ & PÉREZ, 2008) vem sendo desenvolvido na Espanha e possui estratégias específicas que possibilitam compreender as interações, discursos e dinâmicas do processo educativo familiar e destes com a rede de apoio e seus profissionais. Além disso, com a possibilidade de realizar um estágio na Universidade do Minho, em Portugal, país este que também tem apresentado ações significativas e políticas direcionadas ao atendimento educativo das famílias, acompanhei o desenvolvimento de um programa de educação parental no contexto português. Foram realizadas observações do programa “Mais Família, Mais Criança” desenvolvido no município de Guimarães, no norte de Portugal, por profissionais da rede de apoio social. Este programa apresenta objetivos comuns ao programa aplicado no Brasil, o que facilita e proporciona um parâmetro para reflexão sobre as condições de aplicabilidade das estratégias educativas.

Portanto, este estudo teve como objetivos aplicar o programa abreviado “Crescer Felizes” no Brasil e acompanhar o programa “Mais Família” em Portugal, para investigar, compreender e refletir sobre as estratégias que constituem os processos envolvidos na aplicação de programas de Educação Parental. Ademais, foram avaliados os seguintes elementos: a dinâmica de funcionamento dos programas (conteúdos, metodologia, os motivos de encaminhamento, o perfil e a participação das famílias); os facilitadores para a realização dos programas (o suporte da rede de apoio social, a postura e atuação da equipe de educadores, a organização dos encontros); e a satisfação e o impacto do programa na perspectiva da equipe de educadores e das famílias participantes. Cabe ressaltar que estes critérios surgiram a partir das experiências anteriores de realização dos programas supracitados, tendo em vista os elementos que se mostraram necessários para a implementação das propostas. A presente pesquisa delineou outros fatores ecológico- sistêmicos que podem influenciar no desenvolvimento de programas de educação parental.

A presente tese de doutoramento realizado no Programa de Pós-Graduação em

Educação Ambiental, na linha da Educação Ambiental não formal, tendo como temática o

estudo das estratégias de educação parental e suas interfaces com a educação ambiental. Este

estudo parte das seguintes questões de pesquisa: É possível replicar um programa de

Educação Parental realizado em outra cultura no contexto brasileiro? Como se realiza um

programa de educação familiar e parental em outra cultura? Quais as condições socioculturais

(18)

e organizacionais necessárias para a realização de programas nesta temática? Quais as contribuições dos pressupostos da Educação Ambiental para a formulação e aplicação de ações em educação parental? A avaliação das estratégias neste trabalho se justifica devido a escassez de políticas públicas brasileiras com o foco na educação parental. Cabe ressaltar, a importância da formação de educadores que possam atuar com famílias em espaços comunitários e que estas questões sejam inseridas na pauta de discussões governamentais.

Em resumo, foi realizado um estudo que agregue e associe pesquisa e intervenção para

oferecer reais condições para profissionais e famílias refletirem e construirem ações

educativas dialógicas e emancipatórias, de enfrentamento à violência e à negligência

intrafamiliar, e focada na resiliência parental e familiar. Uma das metas deste trabalho é

também apontar as contribuições da perspectiva da Educação Ambiental para a formulação

e/ou potencialização de programas educativos familiares e comunitários.

(19)

2. FAMÍLIA E PARENTALIDADE

2.1. Família: Ambiente simbólico

Ao longo dos anos, vários estudos foram realizados com intuito de compreender as relações, as dinâmicas, as configurações familiares e suas influências para o desenvolvimento de crianças, adolescentes, adultos e idosos. A partir destas discussões muitos significados foram sendo produzidos, constituindo histórias e identidades culturais sobre ser e estar em família. Os significados atribuídos evidenciam muitas polêmicas e divergências, em meio às discussões sobre a importância das relações familiares e a desagregação ou enfraquecimento das mesmas. Diante disso, percebe-se a inexistência de um conceito único no campo científico ou cultural e de uma estrutura concreta que defina família, pois este é um ambiente simbólico construído por representações sociais e relações e vinculações humanas. Como afirma Nitschke (1999): “Falar em família é mergulhar em águas diferentes e variados significados para as pessoas, dependendo do local onde vivem, de sua cultura e, também, de sua orientação religiosa e filosófica, entre outros aspectos” (p.41).

Sarti (2004) também aborda a temática família como uma realidade simbólica, que ordena e organiza formas de pensar e viver. A família convive e se constitui como um ambiente condicionado por elementos físicos, biológicos, econômicos, sociais, simbólicos e culturais. Indubitavelmente, o meio ambiente familiar contribui para o processo educativo e formativo dos seus integrantes (GARCIA, 2007). Por “meio ambiente” entende-se que “é o lugar determinado ou percebido, onde os elementos naturais e sociais estão em relações dinâmicas e em interação. Essas relações implicam processos de criação cultural e tecnológica e processos históricos e sociais de transformação do meio natural e construído” (REIGOTA, 1994, p.14). Sendo assim, a família se constitui em um ambiente percebido, construído simbolicamente pelas diferentes culturas, apresentando representações socioculturais diversas.

Ecologia é uma palavra de origem grega: oikos, que significa casa, lugar onde se vive.

A família é um oikos, não de forma concreta, mas simbólica. Diante da diversidade de formas

de ser e estar em família, Almeida (1987) apresenta contribuições para compreender este

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ambiente como uma representação social que os diversos grupos e sociedades fazem das relações de aliança e de consangüinidade, se referindo à família como uma realidade simbólica, que expressa valores e significados que transcendem as fronteiras do grupo e torna- se uma mentalidade, uma maneira de se situar e dar sentido a vida.

2.2. Olhar sistêmico sobre as interações familiares

O princípio I que consta no inciso I do Plano Nacional de Educação Ambiental (BRASIL, 1999) apresenta o enfoque humanista, holístico, democrático e participativo que podem embasar o processo educativo na perspectiva ambiental seja através de práticas formais ou não-formais. Este princípio colabora para a compreensão e potencialidades da educação no ambiente familiar.

O princípio holístico e sistêmico na perspectiva da Educação Ambiental traz o enfoque para o conjunto de elementos humanos e não-humanos na sua mútua relação, em que o todo é muito mais do que a soma das partes (VELASCO, 2006, 2007). Tais considerações, em conjunto com a Abordagem Bioecológica do Desenvolvimento Humano de Urie Bronfenbrenner, apresentam contribuições significativas para as discussões sobre o ambiente familiar em Educação Ambiental, pois possibilitam a formação de um olhar holístico e sistêmico (relações complexas e intrínsecas entre o ser e o mundo, entre o local e o global) sobre as situações e interações humanas no mundo.

Na Abordagem Bioecológica do Desenvolvimento Humano, proposta por Bronfenbrenner e Morris (1998), Bronfenbrenner e Evans (2000), o desenvolvimento humano resulta de processos de interação recíproca entre o ambiente e as características da pessoa em desenvolvimento (BRONFENBRENNER, 1999, 2005; NARVAZ & KOLLER, 2004). O ambiente é composto por contextos ecológicos, desde os mais proximais até os mais distais, situados no espaço e tempo social e historicamente determinados. Nesse sentido, o modelo explicativo do desenvolvimento humano deve ser composto e compreendido na ótica de quatro dimensões inter-relacionadas: Processo, Pessoa, Contexto e Tempo.

O Processo traz a ênfase para os processos proximais entendidos enquanto formas

particulares de interação entre o organismo e o ambiente e que ao longo do tempo se operam

de formas progressivamente mais complexas. Estes processos tanto podem ser conduzidos por

relações interpessoais, bem como pela interação da pessoa em desenvolvimento com objetos e

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símbolos, sem a presença de outras pessoas. Os processos proximais são caracterizados por cinco aspectos:

“1) para que o desenvolvimento ocorra é necessário que a pessoa esteja engajada em uma atividade; 2) para ser efetiva, a interação deve acontecer em uma base relativamente regular, através de períodos prolongados de tempo; 3) as atividades devem ser progressivamente mais complexas, daí a necessidade de um período estável de tempo; 4)para que os processos proximais sejam efetivos, deve haver reciprocidade entre as relações interpessoais; 5) para que a interação recíproca ocorra, os objetos e símbolos presentes no ambiente imediato devem estimular a atenção, a exploração, a manipulação e a imaginação da pessoa em desenvolvimento (BRONFENBRENNER, 1999; NARVAZ & KOLLER, 2004, p. 54).

Estes cinco aspectos podem se constituir como direcionamento de análises dos processos educativos nas famílias. Ou seja, a educação nas famílias deve pautar-se por processos proximais que possibilitem o desenvolvimento do grupo familiar e de seus membros.

A Pessoa, segundo o modelo bioecológico de desenvolvimento, é constituída tanto por características determinadas biopsicologicamente quanto por características que foram construídas na interação com o ambiente. Nesse sentido, o desenvolvimento humano depende de mudanças e estabilidades destas características bio-psico-ambientais da pessoa. Estas características são produtoras e produtos do desenvolvimento.A família constitui-se pela interação de um grupo de pessoas, em que cada membro deste grupo com suas singularidades pode contribuir (ou não) para o desenvolvimento familiar. Do mesmo modo que cada pessoa possui características específicas, a família apresenta-se como uma pequena sociedade com características próprias e mecanismos, processos e modos de vida particulares construídos na interação com outros contextos ecológicos de desenvolvimento (GARBARINO &

ABRAMOWITZ, 1992).

A terceira dimensão do desenvolvimento humano é o contexto que compreende quatro níveis ambientais, denominados microssistema, mesossistema, exossistema e macrossistema.

O microssistema é representado por contextos em que ocorrem interações face-a-face pela pessoa em desenvolvimento; o mesossistema a inter-relação entre os microssistemas; o exossistema um contexto ecológico que envolve ambientes não freqüentados ativamente pela pessoa ou grupo, mas que também desempenham influências indiretas ao desenvolvimento humano; e, finalmente, o macrossistema que é composto pelo conjunto de ideologias, valores, crenças, religiões, formas de governo, políticas públicas, culturas presentes no cotidiano das pessoas que influenciam seu desenvolvimento (BRONFENBRENNER, 1979/1996).

A família enquanto microssistema está inter-relacionada com os diferentes contextos

ecológicos de influência. A educação presente no contexto familiar pode ser influenciada por

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fatores que atuam indiretamente sobre as relações interpessoais dos seus membros, como, por exemplo, quando o pai tem que cumprir horas extras na empresa em que trabalha, chega tarde e não tem tempo de brincar com seu filho. Neste caso, a criança não tem acesso ao ambiente de trabalho do pai, mas seu desenvolvimento pode ser influenciado por este contexto exossistêmico.

O tempo apresenta-se como um elemento fundamental para o desenvolvimento humano. Tanto as alterações e mudanças no curso de vida, as transições biológicas e sociais relacionadas a aspectos culturalmente estabelecidos, bem como da ocorrência de eventos históricos influenciam a dinâmica dos processos entre pessoa e ambiente. O estudo de diferentes gerações do grupo familiar permite compreender as linearidades e transições da transmissão cultural ao longo do tempo do ciclo de vida de famílias, bem como as tentativas de estabilização e mobilização destes grupos diante dos acontecimentos sócio-históricos.

2.3. O processo de humanização das relações familiares

O princípio humanista sugere o enfoque para as discussões da Educação Ambiental que apontam a preocupação com o processo de humanização das relações entre os seres humanos e destes com o mundo em que se inserem. A humanização pode ser entendida como um processo em que os homens e mulheres enquanto seres inacabados aprendem, ao longo de toda a vida, a ser mais (FREIRE, 1987) o que possibilita reflexão-ação voltada para o respeito e a valorização da vida na relação com os outros e com os contextos que os cercam. Isso significa contrapor a alienação nas relações humanas, negando a visão utilitária do ser humano enquanto um “instrumento” para ter algo ou “escada” para chegar a algum lugar.

Outro exemplo que posso apontar é no meu estudo de mestrado (GARCIA, 2007), em que foram detectadas relações entre pais e filhos mediadas por punições e autoritarismo em busca da obediência das crianças e adolescentes. Homens e mulheres da segunda geração das famílias entrevistadas relataram situações conflituosas e violentas vivenciadas na infância em que eram agredidos física e psicologicamente por seus pais: “Eu mesmo cansei de tanto apanhar dele. Ficava na rua com uma lona por cima, pra não entrar dentro de casa. Se eu entrasse dentro de casa, eu apanhava. Ele (pai) dava que chegava a sair sangue das perna.

Eu apanhei um bocado. Depois de apanha, se pegasse nojo dos pais, não podia nem olhar

pro pai” (Roberto/ segunda geração/ família da zona urbana). “Se a mãe chamasse era um

grito só, se desse dois o pau entrava. Se ela repetisse já sabia que ia levar quando chegasse.

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A mãe chamava eu ficava... Já sabia que ia apanhar né?!” (Elizabete/ segunda geração/

família da zona rural). São situações que demonstram que muitas vezes a família educa de forma “desumanizante” e que o princípio humanista da EA pode colaborar para conscientizar e reverter esta posição dos grupos familiares.

A humanização das relações familiares é uma construção cultural e subjetiva, por isso presenciamos situações discrepantes, que vão desde ações extremamente protetivas, como uma mãe que, mesmo sem saber nadar, se atira no lago para salvar o filho, até atitudes criminosas como uma mãe que vende a filha e explora sexualmente ou o pai que é acusado de atirar a criança do sexto andar depois de estrangular. São situações cotidianas que nos desafiam a pensar sobre as complexidades que as envolvem.

O cuidado no exercício da parentalidade não deve ser pensado apenas como uma obrigação moral dos pais, mas principalmente como uma atitude existencial que constitui o ser humano na relação com o outro significativo. “Sem cuidado, ele deixa de ser humano”

(BOFF, 1999). Não cuidar dos filhos ou negligenciar a ocupação, preocupação e responsabilização parental é algo desumano e inaceitável na nossa sociedade. Por isso, não depende apenas da ordem moral, da convivência social ou da legislação vigente. O cuidado no ambiente familiar depende prioritariamente da humanização das relações entre pais e filhos e do cuidado que se expressa nas relações sociais em geral

No ambiente familiar e nas relações destes grupos com os serviços de apoio social não podem existir relações alienadoras, mas sim humanizadoras. Em estudo realizado por Yunes, Garcia & Albuquerque (2005, 2007) junto a agentes sociais que atuam diretamente com famílias identificou-se crenças pessimistas destes profissionais sobre a educação existente no contexto familiar. Assim, a situação de pobreza das famílias associada à negação e reconhecimento dos valores e sistema moral e educacional de cada grupo, faz com que os profissionais desconsiderem as competências das mesmas. Tais idéias fazem com que, muitas vezes, as relações e o atendimento dos trabalhadores sociais sejam pautados por uma postura opressora, em que pretende-se impor um modelo de ser e agir como família, sem considerar as especificidades e escolhas destes grupos familiares.

A família enquanto um importante contexto de educação e desenvolvimento humano

propicia interações significativas entre as pessoas e destas com os outros contextos ecológicos

(BRONFENBRENNER, 1979/ 1996; RODRIGO & PALACIOS, 1998). O ambiente familiar

foi “inventado” pela humanidade para suprir as suas necessidades de produzir vínculos

afetivos. A educação familiar na perspectiva da educação ambiental deve estar direcionada

para o cuidado da família, tendo em vista que este é um ambiente de cuidado, educação e

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desenvolvimento humano. Nesse sentido, cuidar/ educar a família é contribuir para o processo de humanização das relações familiares, ou seja, possibilitar que estes grupos possam refletir sobre suas práticas, aumentar o repertório de possibilidades de superação das adversidades e promover o cuidado dos ambientes de vida.

Portanto, as famílias podem contribuir para pensar as relações dos seus membros com o mundo em que estão inseridos, mas para isso mostra-se relevante a relação e participação destes grupos em outros contextos educativos, como escolas, associações de bairro, sindicatos, clubes e entidades. Estas relações contribuem para a conscientização e a formação de uma visão holística do ambiente em que estão inseridos. Os programas sociais podem possibilitar a reflexão crítica dos grupos familiares sobre os contextos ecológicos de influência e que em todos os níveis sociais a educação deve estar direcionada para que as pessoas, grupos e comunidades compreendam e participem da busca por uma melhor qualidade de vida no contexto em estão inseridos.

Neste estudo, entende-se a existência de uma diversidade de modos de pensar, ser e estar em família, e, por isso, não se pretende gerar conceitos ou definições estanques, mas refletir sobre algumas representações históricas e culturais sobre família no que tange à educação e produções culturais da infância e da adolescência nestes ambientes.

2.4. Discursos tradicionais, modernos e “pós-modernos” sobre a educação nas famílias

Na atualidade, há um consentimento de toda a sociedade sobre a relevância da tarefa educativa atribuída às famílias. Mas, nem sempre foi assim. A educação nas famílias sofreu alterações significativas ao longo da história, principalmente no que se refere às expectativas sociais sobre os papéis exercidos pelos membros do grupo familiar e concepções de infância e de cuidado.

Até aproximadamente o século XVI, a educação dos filhos não gerava muitas

preocupações nas famílias. A criação das crianças pequenas, muitas vezes, era encargo dos

criados e amas-de-leite. Tão logo adquiriam um desembaraço físico, eram logo misturadas aos

adultos e partilhavam de seus trabalhos e jogos (ARIÈS, 1981; SILVA, 1998). De acordo

com Biasoli-Alves & Sigolo (1992), durante séculos a educação se dava pela simples

convivência das crianças com os adultos, em que estas eram afastadas de seus pais e inseridas

nas tarefas dos adultos para que assim, aprendessem ajudando-os.

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A partir do século XVI, com o aparecimento do sentimento de infância e de família, e com o desenvolvimento do modo de produção capitalista e o surgimento das primeiras escolas, aumentaram as preocupações dos familiares e a expectativa social com relação à educação e o cuidado das crianças (ARIÈS, 1981; BIASOLI-ALVES & SIGOLO, 1992;

MACEDO, 1994; RIBEIRO & RIBEIRO, 2003). O costume de vida e organização social da Modernidade emergiu na Europa e foi disseminado pelo mundo, influenciando e modificando-se com as especificidades culturais de cada país. Segundo Eisenstadt (2001), a modernização das relações sociais apresenta um caráter híbrido e contraditório, favorecendo o surgimento de “modernidades múltiplas” não estáticas.

Almeida (1987) aponta que a chegada do modelo ou “idéia” de família nuclear no Brasil se propagou no século XIX, tal como chegaram outras idéias, como o liberalismo e o iluminismo, os progressos tecnológicos da Revolução Industrial, o Capitalismo, o marco civilizatório e a universalização da escolarização. No entanto, este modelo chega e encontra uma realidade totalmente diferente daquela em que este havia sido gerado. Apesar das especificidades que caracterizam a chegada do modelo de família nuclear tradicional no Brasil e as diferenciam do contexto social europeu existente na época, este modelo trouxe parâmetros sobre o grupo familiar e suas funções na sociedade.

Algumas alterações na educação das crianças surgem a partir das mudanças no modelo e concepções de ser família e ser criança. Novos padrões de relações no ambiente familiar são criados em conseqüência do modelo de família nuclear tradicional burguesa, novas formas de amor e autoridade se evidenciam na criação dos filhos – aleitamento materno, atenção constante, alimentação regular, limpeza meticulosa e intenso carinho (ARIÈS, 1981). Os papéis dos integrantes do grupo familiar são definidos a partir desta configuração nuclear: o pai provedor do sustento da família, a mãe responsável pelo cuidado da casa e dos filhos e os (poucos) filhos obedientes e estudiosos.

“Ressignificaram-se, nesse momento, as relações emocionais dos pais com os filhos.

O amor maternal foi considerado natural nas mulheres, incentivadas a criar com os filhos um vínculo tão profundo de modo que a vida interior da criança fosse trabalhada para a perfeição moral. Ela deveria ser uma mãe perfeita, para que os filhos também o fossem” (SILVA, 1998, p.57).

Paralelamente aos pressupostos modernos sobre a constituição e dinâmica familiar

emergiu a concepção moderna de infância. Através da globalização mundial destes modelos,

buscou-se definir, normatizar, homogeneizar e controlar as crianças no estabelecimento de

padrões de cuidado e das atividades infantis. Sarmento (2004) explica que “normatização” da

infância compreende um conjunto prescritivo de saberes sobre a criança que é parte integrante

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do seu processo de institucionalização na primeira modernidade e a partir do qual se convencionaram os padrões de normalidade/ anormalidade. Com isso, os adultos poderiam realizar uma “administração simbólica da infância” (SARMENTO, 2004), estabelecendo um conjunto de normas, atitudes e prescrições que negam determinadas ações, capacidades ou poderes à criança. As crianças modernas apresentam um caráter “não-social” ou “pré-social”

(BUCKINGHAM, 2002), que as exclui da sociedade dos adultos e as submetem às decisões e regulações destes.

Os papéis parentais também são definidos a partir destes padrões modernos de cuidado da infância. Como aponta Marchi (2007), inerente à construção do modelo moderno de família, evidenciou-se a construção da imagem ideal da ‘mãe moderna’ que não se resume à da ‘boa mãe’ (embora a contenha) mas exige o desempenho do papel da ‘mãe educadora’.

Nesse sentido, pais e mães tornaram-se os principais responsáveis pelos “estímulos e prestação de cuidados” da criança e pela “harmonia” da família. Assim, criou-se um modelo moderno “ideal” de criança e família.

Apesar das diversas mudanças ocorridas ao longo dos séculos nos contextos sócio- culturais, este modelo idealizado de família e de educação das crianças ainda hoje persiste nas mentalidades dos grupos sociais. A família pensada como modelo ideal a ser seguido, muitas vezes, diverge da família vivida e condicionada pelas situações e experiências do cotidiano familiar e social (SZYMANSKI, 1995, 1998, 2000, 2004).

Alguns autores da Sociologia apontam que nas últimas décadas iniciou-se uma transição da condição moderna para a pós-modernidade ou “Modernidade Líquida”

(BAUMAN, 2001), percebido como um tempo de fluidez que questiona os princípios e pressupostos do pensamento social e político estabelecidos e desenvolvidos a partir do Iluminismo. Os autores apontam que as mudanças ocorridas não significam a passagem de um tempo a outro, mas apenas uma “modernidade diferente” (BAUMAN, 2001) ou

“conseqüências da modernidade” (GIDDENS, 1991) ou uma nova forma denominada

“sociedade de risco” (BECK, 2001). Comumente, todos estes autores apontam “rupturas sociais” ou sintomas de transformação em curso nas sociedades modernas, como a flexibilização da produção e da participação no mundo do trabalho; declínio das instituições e do Estado – Nação, e com isso o aumento do individualismo; descrença no poder da razão e da ciência; novas formas de entender o tempo e o espaço; ritmo extremo e alcance global;

sentimentos generalizados de incerteza, insegurança e risco; expansão e fragmentação das

redes de conhecimento (MARCHI, 2007). Existem polêmicas e divergências em torno destes

sintomas ou rupturas sociais, mas são questões que não podem ser negadas ou omitidas nas

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discussões sobre a organização social, pois afetam as vidas das famílias.

Diante das condições e rupturas pós-modernas, como pode ser caracterizada a família contemporânea? Segundo De Antoni, Baroni & Koller (2007), o conceito de família na atualidade se diferencia do conceito tradicional que é voltado apenas para a presença dos laços consanguíneos e hereditários. A família contemporânea está relacionada muito mais ao sentimento de pertencimento e aos laços afetivos que predominam nas relações intrafamiliares. Nesse sentido, aponta que os filhos passam a ser o elo principal nas relações familiares, pois representam um vínculo que “não pode” ser rompido. A família contemporânea vivencia um conflito entre, de um lado, a afirmação da individualidade e, de outro, o respeito às obrigações e às responsabilidades próprias dos vínculos familiares (SARTI, 2004).

“O Estado estima que os homens e as mulheres podem fazer o que quiserem enquanto cônjuges, mas não enquanto pais. A autonomização deve afetar o menos possível as relações pedagógicas. (...) Pouco importa sua história matrimonial, o homem e a mulher devem ficar unidos enquanto pais” (SINGLY, 2007, p.80).

Segundo Peixoto (2007), alguns elementos culturais da contemporaneidade serviram como mobilizadores das mudanças no interior da família, como: a inserção da mulher no mercado de trabalho, o controle da fecundidade por meio da contracepção, aumento no número de divórcios, uniões livres e recomposições familiares, uniões tardias. Alguns destes elementos se contrapõem às idéias disseminadas na modernidade e constroem um novo olhar sobre a família da atualidade. Diante disso, alguns autores apontam a existência de um sentimento de crise em relação à família, evidenciando-a muitas vezes como “desestruturada”

ou “libertária” – aqui evidenciada pela sua “crise da autoridade” na educação das crianças (RENAUT, 2005), e às crianças, através do “desaparecimento da infância” (POSTMAN, 1999; NARODOWSKI, 1999) ou da concepção da “criança-problema” (SIROTA, 2006).

Exemplo disto, na década de setenta, com o movimento no processo de aprovação da lei do divórcio, “havia correntes que chegaram a prognosticar o fim da família” (WAGNER &

LEVANDOWSKI, 2008, p.89). Este sentimento se mostra evidenciado nos discursos dos grupos sociais que de certa forma demonstram um saudosismo das relações familiares e da infância “de outros tempos”.

Contrária a esta idéia de crise ou desaparecimento da família e da infância, neste

estudo proponho uma visão crítica e reflexiva sobre a família vivida (SZYMANSKY, 1998) e

as diferentes infâncias. As famílias apresentam diversas estruturas, configurações e modos de

convívio que variam de acordo com as condições sociais, culturais e identitárias

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(SZYMANSKI, 1996; BENINCÁ, 1997; YUNES, 2001a; GARCIA & YUNES, 2006). As crianças são atores sociais que vivenciam infâncias diretamente relacionadas com os lugares, as classes sociais, as gerações, os papéis exercidos, os modos de comunicação, dentre outros fatores (SARMENTO, 2004; SINGLY, 2004; PROUT, 2005; SOLON, 2006; MARCHI, 2007; MÜLLER, 2007). Sendo assim, não existe um modelo ideal de ser família, de ser mãe/

madrasta, de ser pai/ padrasto, avós, de ser criança. Existe sim uma multiplicidade de organizações e modos de ser e estar em família e em sociedade. Nesse sentido, o que está em crise não é a família e a infância, mas sim as concepções modernas que definem estes construtos.

2.5. Parentalidade e as expectativas sociais sobre a educação nas famílias

A educação nas famílias é percebida, no senso comum, como algo natural e como uma habilidade inata das pessoas, geralmente determinada como tarefa feminina (GOMES, 1994;

SZYMANSKI, 1996; SILVA, 1998). No entanto, a educação familiar se constitui em processo social, histórico e cultural, presente no cotidiano de vivências e na transmissão geracional de saberes, valores, hábitos, normas e padrões de convivência (BENINCÁ, 1997;

BENINCÁ & GOMES, 1998; SIMIONATO-TOZO & BIASOLI-ALVES, 1998).

Na atualidade, há uma expectativa social e uma incorporação/ identificação, na maioria das vezes, pelos membros da família sobre os papéis que exercem e sobre os principais valores e atitudes que podem ser perpetuados dentro deste ambiente (como o amor, o afeto, o cuidado, etc.). Segundo Bronfenbrenner, “o papel é uma série de atividades e relações esperadas de uma pessoa que ocupa uma determinada posição na sociedade e de outros em relação àquela pessoa” (1996, p.68). Assim, tornar-se pai/ mãe, avó/ avô, filho/

filha, irmão/ irmã gera uma série de expectativas sobre como exercer tais papéis. De acordo com Bornholdt & Wagner (2005):

“A integração da criança na família envolve o ensino de habilidades sociais e a transmissão de normas culturais. Este é um processo que, gradualmente, leva os progenitores a olharem para si e a partir de suas vivências anteriores, buscarem modelos (ou antimodelos) em como exercer a parentalidade. Esse olhar pode representar a espera de que o filho tenha oportunidades, no mínimo iguais, ou, em algumas ocasiões, exatamente opostas às suas vivências em épocas anteriores. Neste sentido, esse é um momento que a evolução da vida favorece um encontro com o passado” (p.83).

O papel dos pais na educação das crianças e adolescentes pode ser representado pelo

conceito de parentalidade. Este é um conceito recente, que deriva do verbo Latino "parere" -

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"para produzir, desenvolver ou educar”, amplamente utilizado em países de língua inglesa através do construto “parenting”. No Brasil e em outros países latinos, o uso deste conceito ainda é pouco conhecido e está restrito ao meio acadêmico, embora haja evidências de que o uso pode estar se alargando para outros setores da sociedade. Um certo número de autores, como Bronfenbrenner (1979), Belsky (1984) e Furstenberg (1985), têm procurado identificar os elementos teóricos da parentalidade. Com base, nestes estudos a parentalidade pode ser definida como atividades, processos e interações intencionais destinadas a assegurar a sobrevivência e o desenvolvimento das crianças no ambiente familiar (HOGHUGHI, 2004).

Embora o conceito de parentalidade ou “parenting” esteja sendo mais utilizado como referência para os estudos sobre as interações entre pais, ou outros cuidadores adultos com as crianças, este pode estar numa relação inversa de cuidado, por exemplo, filhos adultos que cuidam dos pais idosos. Ou, ainda, não é exclusividade destes sujeitos, pois, dependendo da situação, pode ser praticada por enfermeiros, professores e outros prestadores de cuidados, para não apenas crianças, mas também outras pessoas que possam necessitar de cuidados especiais (CLARKE-STEWART et. al. 1995). Em alguns países de língua inglesa, o conceito foi alargado também as interações sociais através das expressões “corporate parenting" ou

“society parenting”, não apenas em relação às empresas comerciais cuidar de seus empregados, mas também de responsabilidade das autoridades públicas para as crianças que têm necessidades especiais, que vivem sob a guarda do Estado ou em situações de alto risco (HOGHUGHI, 2004). Nesta perspectiva, o que se percebe é que, no uso deste conceito, preocupa mais a compreensão sobre o denvolvimento dos processos, atividades e interações que envolvem o cuidado/ educação do que quem faz isso. Apesar desta generalização do conceito a outras interações que não exclusivamente entre pais e filhos, ainda predominam as investigações e o uso do construto como definição para as interações educativas e de cuidado presentes no ambiente familiar, sendo o foco deste estudo.

O conceito de parentalidade tem integrado as discussões do Conselho da Europa.

Fundado em 1949, este Conselho é uma organização internacional da União Européia

representada por vinte e sete Estados-membros e que apresenta por missão promover os

direitos do homem, a democracia e o Estado de direito. Estabelece princípios democráticos

dos direitos humanos e promove convenções e recomendações sobre a proteção das pessoas

na Europa, o que inclui crianças e adolescentes. Um comitê representativo do Conselho da

Europa esteve presente na Convenção dos Direitos das Crianças em 20 de novembro de 1989,

onde foi reafirmada a importância de se tratar especificamente do papel da família na

promoção dos direitos da criança e da relevância da formulação de políticas públicas para a

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